13 A CIDADE E O RIO: estudo socioambiental e estrutural urbano da cidade de Formiga (MG). LEMOS JÚNIOR, Clésio Barbosa E-mail: [email protected] Professor e Orientador do Centro Universitário de Formiga - UNIFOR/MG LUZ, Daniel Henrique Campos E-mail: [email protected] Bolsista FAPEMIG - Centro Universitário de Formiga - UNIFOR/MG ALMEIDA, Jéssica Oliveira E-mail: [email protected] Bolsista FAPEMIG - Centro Universitário de Formiga - UNIFOR/MG CÂMARA, Kézya E-mail: [email protected] Bolsista FAPEMIG - BIC JÚNIOR - Centro Universitário de Formiga – UNIFOR/MG Introdução Quando no espaço urbano o rio conforma um elemento integrante da paisagem, geralmente, os habitantes o incorporam como símbolo do lugar e este passa a fazer parte do imaginário coletivo. A construção deste imaginário vincula-se, frequentemente, à função do rio na fundação da cidade e ao papel desempenhado na viabilização do crescimento local. Assim, estudar e planejar os espaços urbanos que margeiam corpos d’água aparece como uma exigência no território urbano contemporâneo. Os rios estruturam os territórios urbanos e consolidam a forma, o uso e a cultura de cada cidade onde estão inseridos gerando paisagens culturalmente exclusivas, no entanto, nos tempos atuais, mais precisamente a partir da década de 1950, com a intensificação do processo de urbanização o tratamento que as populações têm dado a esses espaços configura, muitas vezes, em total descaso chegando até mesmo a se tornarem invisíveis na paisagem, frente às intervenções às quais são submetidos que vão desde aterros a canalizações. Alguns estudiosos atribuem tal comportamento à compreensão dos rios como um limite ao crescimento das cidades e/ou um obstáculo a ser transposto. O fato é que os rios e suas margens veem sendo constantemente desvalorizados e essa realidade é Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo claramente percebida no Rio Formiga, situado na cidade mineira que lhe dá o nome e objeto deste estudo. Objetivos O principal objetivo do estudo que deu origem ao artigo científico do qual foram retiradas as informações contidas neste resumo expandido foi fazer um estudo sobre o Rio Formiga, localizado na cidade de Formiga que, por sua vez, está estabelecida na região centro oeste do Estado de Minas Gerais, destacando os itens que a população local considera com sendo seus principais problemas e potencialidades. Fundamentação Teórica Sobre a paisagem A discussão da paisagem é um tema recorrente na Geografia e aparece como um conceito caro a esta ciência porque foi capaz de dar-lhe a unidade e identidade enquanto disciplina. O termo paisagem além de carregar consigo um significado polissêmico é tomado por várias disciplinas, dentre elas a Arquitetura e Urbanismo. Desde o século XIX a paisagem vem sendo discutida para se entender, dentre outras coisas, as relações sociais e naturais em um determinado espaço. Pode-se dizer que a compreensão do termo se deu em duas fases: a primeira, no início do século XX com a escola francesa na qual a paisagem era capaz de fornecer boa carga de informação sobre a organização social nela compreendida e a segunda, em meados do século XX com o desenvolvimento dos transportes e meios de comunicação, da circulação de mercadorias e capitais, fazendo com que: (...) a paisagem perdesse seus fundamentos locais para refletir as relações das redes de economia e sua simbologia universalizante. (...) Entenda-se que uma medida econômica situada nos centros mundiais de decisão pode modificar a paisagem situada a milhares de quilômetros. (YÁZIGI, 2002, p. 19). É fato que dentro da Geografia, a interpretação do que é uma paisagem diverge diante das múltiplas abordagens, entretanto, também é fato que a abordagem da dimensão cultural nesta discussão amplia o contexto do debate científico uma vez que trata de questão que fundamenta a modernidade. Para Iná Elias de Castro (2002) o debate acerca do conceito de paisagem ganhou corpo e, consequentemente, ficou mais substancial diante da amplitude que alcançou, assim como, em função da inclusão de noções como simbolismo, representação, imaginário e percepção. Para a autora, a paisagem apresenta-se de maneira dual, ou seja, possui uma dimensão concreta, pois representa aquilo que se vê, assim como, possui uma dimensão da representação do sujeito que codifica a observação. A paisagem resultado desta observação é fruto de um processo cognitivo, mediado pelas representações do Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 14 imaginário social, pleno de valores simbólicos (CASTRO, 2002). Por sua vez, Lucrécia Ferrara (2002) colabora com o entendimento quando em seu estudo intitulado: “Os lugares improváveis”, discute a visualidade e a visibilidade, estas definidas como categorias do modo de ver. A visualidade corresponde à imagem do mundo físico e concreto, já a visibilidade a elaboração reflexiva do que é fornecido visualmente transformado em fluxo cognitivo. Referenciando os conceitos linguísticos pode-se dizer que o entendimento da paisagem passa por duas compreensões a denotativa e a conotativa. Por denotação entende-se o sentido original, impessoal, sem considerar o contexto, postura daqueles que entendem a paisagem e os seus elementos com funções e significados claros. Por conotação entende-se outro significado, passível de interpretações diferentes dependendo do contexto em que for empregada, postura de perspectivas contemporâneas, interpretativas, que são ambíguas na compreensão dos elementos. Apoiada neste argumento, cada dimensão da paisagem representa uma compreensão distinta, possuidora de um discurso limitado, no entanto, as relações estabelecidas entre as distintas compreensões permitem uma interpretação mais abrangente, ou seja, semiótica, produzida a partir de um processo de significação. Enfim, percebe-se que o olhar sobre a paisagem requer um comportamento para além das questões geográficas, necessita de uma abordagem de caráter multidisciplinar. Conforme nos alerta o Professor Milton Santos (2008): “a paisagem é o conjunto de formas que num dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza”. Assim, entende-se que a paisagem é muito mais que um objeto disponível para estudo é a representação da experiência cotidiana das pessoas e como tal deve ser defendida como um patrimônio, um legado, com o qual se deve criar vínculos de afetividade. Sobre os rios urbanos Sabe-se que os recursos hídricos são essenciais à vida, da mesma forma à existência das cidades. Os rios sempre estiveram presentes na formação e desenvolvimento dos espaços urbanos e suas estruturas são a base para o desenvolvimento local, seja do ponto de vista ambiental e ecológico, seja do ponto de vista social e cultural. Nas palavras de Lúcia Maria Costa: (...) são verdadeiros corredores ecológicos urbanos. (...) o papel dos cursos d’água é fundamental na paisagem das cidades, pois são estruturas vivas na paisagem, com seu ritmo e tempo próprios. Por isso é importante que se pense o rio como algo a ser considerado na paisagem, de forma a conservar suas características e dinâmica naturais (COSTA, 2006, p. 47). Conforme nos alerta a autora, “os diferentes tratamentos, usos e apropriações dos rios urbanos em diferentes cidades nos mostram as especificidades culturais e Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 15 muitos outros valores, com uma repercussão direta na qualidade da paisagem”. Esta postura reflete diretamente nas formas de intervenção e apropriação dos espaços urbanos, mas infelizmente, o que temos visto em nossas cidades é exatamente o contrário, os rios não têm sido respeitados pelos processos de urbanização e, principalmente, pelos planos urbanísticos. Desta realidade extrai-se a importância de projetos que tratem os espaços com rios urbanos considerando os valores que são inerentes aos corpos d’água, a saber: ecológico, ambiental, social, cultural e recreacional. A propósito da ação dos técnicos pode-se dizer que, aparentemente, o desejo de se fazer prevalecer a supremacia do conhecimento humano sobre a natureza os tem levado a elaborarem planos que fatalmente desrespeitam as condicionantes naturais. Parece inadmissível alterar um projeto em função “apenas” de uma condicionante física. Planejar não é tarefa fácil principalmente na contemporaneidade diante da complexidade, intensidade e velocidade da urbanização pela qual passa o planeta, mas insistir em não planejar configura uma incoerência de custos demasiado elevados. Um bom projeto urbanístico resulta de um trabalho multi e transdisciplinar onde técnicos, das mais variadas áreas, devem empregar seus maiores esforços para conceber um instrumento cíclico e dinâmico de integração e convergência das ações e estratégias no espaço urbano. Esta ferramenta, também conhecida como planejamento urbano integrado, se faz mister para as cidades contemporâneas, em especial para aquelas que possuem rios urbanos. Metodologia A metodologia de trabalho foi pautada na revisão bibliográfica e no trabalho de campo. Este consistiu na aplicação de um questionário semiestruturado com as seguintes características: Seção A - Local da entrevista: nesta parte do questionário é possível identificar o bairro onde mora o entrevistado; Seção B - Perfil do entrevistado: com os dados desta seção foi possível traçar o perfil do entrevistado; Seção C - Visão geral sobre a cidade: nesta parte da entrevista foi permitido identificar a opinião do entrevistado sobre os serviços oferecidos na cidade de Formiga (MG); Seção D Visão sobre o Rio Formiga: nesta seção do questionário foi possível identificar a noção que o entrevistado tem do Rio Formiga, assim como, a(s) sugestão(ões) do entrevistado para uma possível intervenção no Rio. Os questionários foram aplicados pelos bolsistas durante o mês de janeiro de 2015. Foi entrevistado um total de 400 pessoas. Os dados encontrados foram organizados e tabulados no período de 09 a 13 de fevereiro de 2015. Resultados Finais Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 16 A seguir aparecem três quadros com valores percentuais que foram organizados a partir da síntese dos dados encontrados na pesquisa. Para tanto, foi considerada a amostra de 400 entrevistados como o valor de 100%. QUADRO I – PERCENTUAL SOBRE VISÃO DOS SERVIÇOS ITEM EDUCAÇÃO SAÚDE SEGURANÇA CULTURA/LAZER TRÂNSITO TRANSPORTE PÚBLICO COMÉRCIO ÓTIMO 24% 1% 1% 1% 1% 1% 6% BOM 27% 9% 10% 11% 12% 26% 62% REGULAR 38% 27% 45% 30% 27% 43% 29% Fonte: autores PÉSSIMO 11% 64% 43% 57% 59% 26% 3% NÃO SE APLICA 1% 1% 4% - QUADRO II – PERCENTUAL SOBRE VISÃO DO RIO FORMIGA ITEM O RIO FORMIGA EMBELEZA A CIDADE? O RIO FORMIGA PODE EMBELEZAR A CIDADE? O RIO FORMIGA É VALORIZADO PELA POPULAÇÃO? O RIO FORMIGA É UM PROBLEMA PARA O CRESCIMENTO DA CIDADE? VOCÊ JÁ FOI ATINGIDO PELAS ENCHENTES DO RIO FORMIGA? VOCÊ ACHA QUE DEVE SER FEITA ALGUMA MODIFICAÇÃO NO RIO FGA? Fonte: autores PERCENTUAL SIM NÃO 0,4% 95,6% 84% 16% 8% 92% 29% 71% 15% 85% 90% 10% QUADRO III – PERCENTUAL DE INTERVENÇÕES SUGERIDAS ITEM CANALIZAÇÃO DO RIO TRATAMENTO DO ESGOTO LIMPEZA FREQUENTE DAS MARGENS CUIDADO COM A NASCENTE REQUALIFICAÇÃO URBANA PERCENTUAL 17,8% 21,9% 29,7% 3,3% 27,3% Fonte: autores Considerações Finais Formiga (MG), assim como a maioria das cidades brasileiras que possuem rios urbanos, engrossa as estatísticas de descaso com os recursos hídricos, basta dizer que 51,6% dos entrevistados apontaram o esgoto e a falta de limpeza do Rio Formiga como problemas a serem sanados com urgência. Apesar da constatação da existência de dificuldades o desejo de mudança por parte da população é bastante evidente e os dados encontrados permitem-nos tecer os seguintes comentários: quando 95,6% dos entrevistados dizem que o Rio Formiga não embeleza a cidade tendemos a avaliar a resposta como uma rejeição, contudo, quando 84% destes mesmos entrevistados dizem que pode vir a embelezar e 71% diz que o rio não é um problema para o crescimento da cidade a rejeição passa a ser refutada. Por outro lado, quando 90% dos entrevistados reconhecem a necessidade de uma intervenção no Rio Formiga confirmamos o desejo de mudança por parte da população, destacando que 82,2% das sugestões dadas além de coerentes, apresentam uma postura adequada quanto ao tratamento que deve ser dado a um rio urbano, exceto pelos 17,8% que sugeriram a canalização do rio. Ainda sobre as propostas de intervenções sugeridas chama-nos a atenção o fato de praticamente 1/3 dos entrevistados sugerirem uma requalificação Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 17 urbana. Tal informação, além de mostrar um bom grau de conhecimento da população acerca das potencialidades da cidade também mostra a importância de se pensar uma ação no espaço urbano do município obedecendo aos princípios do planejamento integrado e, principalmente, levando em consideração os valores ecológico, ambiental, social, cultural e recreacional do Rio Formiga. Há quem diga que os números refletem a realidade, acreditamos nisso! Assim, de maneira geral, podemos sintetizar os dados encontrados na pesquisa como um convite à ação. No que compete a nós, pesquisadores e estudiosos do espaço urbano, salientamos a importância de ações integradas e pensadas no bojo da totalidade. Bibliografia CASTRO, D. G. 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