man-HSH 01-92

Propaganda
Guia de Prevenção
das DST/Aids
e Cidadania para
Homossexuais
organizadora:
Lilia Rossi
Ministério da Saúde
Secretaria de Políticas de Saúde
Coordenação Nacional de DST e Aids
Setembro 2002
Série Manuais, n. 52
©2002. Ministério da Saúde.
É permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada a fonte.
Série Manuais; n. 52 – CN-DST/AIDS
Tiragem: 2.000 exemplares
Coordenador do Programa Nacional de DST e Aids
Paulo R. Teixeira
Presidente da República
Fernando Henrique Cardoso
Assessora de Comunicação da CN–DST/AIDS
Eliane Izolan
Ministro de Estado da Saúde
Barjas Negri
Assessora Responsável pela Unidade de Prevenção da CN-DST/AIDS
Denise Doneda
Secretário de Políticas de Saúde
Cláudio Duarte da Fonseca
Organizadora: Lilia Rossi
Editor: Dario Noleto
Revisora : Nágila Paiva
Projeto gráfico e capa: Claudia Balaban
Diagramação e arte-final: Alissom Lázaro de Araújo
Elaboração, distribuição e informações:
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Secretaria de Políticas de Saúde
Coordenação Nacional de DST e Aids
Av. W3 Norte SEPN 511, bloco C
CEP: 70750-000, Brasília – DF
E-mail: [email protected] Home page:
http://www.aids.gov.br
Disque Saúde / Pergunte Aids: 0800 61 1997
Coordenadores Adjuntos
Alexandre Grangeiro e Raldo Bonifácio
Publicação financiada com recursos do Projeto AD/BRA 99 EO2 UNDCP
Catalogação na fonte – Editora MS
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Coordenação Nacional de DST e Aids. Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para
Homossexuais/Secretaria de Políticas de Saúde, Coordenação Nacional de DST e Aids. – Brasília: Ministério da Saúde, 2002.
145 p.: il. – (Série Manuais, n. 52)
1. Prevenção. 2. Homossexuais. I. Brasil. Ministério da Saúde. II. Brasil. Secretaria de Políticas de Saúde. Coordenação Nacional de DST e Aids. III. Título. IV.
Série.
NLM JC 571
Prefácio
Desde o surgimento da aids no início da década
de 80, os homossexuais foram, em nível mundial,
o grupo populacional mais atingido pela epidemia.
Associando diferentes fatores que vão desde
as características comportamentais até o estilo
de vida, o risco e a vulnerabilidade dos/as homossexuais face à infecção pelo HIV/aids, foram
significativamente acentuados pela falta de informação, pelo estigma e pelo preconceito da sociedade.
Mas foram também os homossexuais os protagonistas das primeiras e urgentes respostas para
o enfrentamento dessa epidemia que ultrapassava
as fronteiras da saúde, revertendo e (des) construindo o imaginário social que os vinculou,
equivocadamente, à culpa, à proibição,
à doença e à discriminação.
As ações do movimento homossexual, voltadas
para a assistência e prevenção do HIV/aids,
se caracterizaram, desde o início da epidemia,
pela rápida e ampla mobilização e envolvimento
de seus ativistas e simpatizantes, responsáveis
pela criação de estratégias inovadoras e eficazes
– como as oficinas de sexo seguro – e por abordar,
de forma pioneira, questões inerentes à diversidade e à livre orientação sexual, à sexualidade,
à solidariedade, ao exercício da cidadania plena e,
à defesa dos direitos humanos, incluindo
os das pessoas que vivem com HIV/aids.
Foram os programas de prevenção -governamentais ou não-governamentais- direcionados
aos homossexuais, os precursores de uma nova
e efetiva política que possibilitou a formação
e a consolidação da parceria entre as instâncias
governamentais e a sociedade civil organizada.
Essa política que, no Brasil, se iniciou a partir
da criação do Programa Nacional de Controle
das DST e Aids e paulatinamente se evidenciou
junto aos diferentes movimentos sociais organizados
foi estratégia fundamental para o combate do
avanço da epidemia pelo HIV/aids e para
a promoção e valorização de importantes
mudanças sociais.
Esse Guia de Prevenção das DST/Aids
e Cidadania dos Homossexuais, cuja origem
está associada ao Manual do Multiplicador
Homossexual - publicação de uma série histórica
editada pelo Ministério da Saúde, em 1996 -se
propõe a resgatar a experiência acumulada pelos
vinte anos de combate à epidemia pelo HIV/aids
junto aos gays, lésbicas, travestis e transgêneros,
ao mesmo tempo que se afirma como um instrumento valioso para todos aqueles que planejam,
executam e avaliam programas de prevenção
das DST e da aids. É, portanto, uma publicação
dedicada a todas as pessoas que almejam conhecer
um pouco mais da história desse movimento
e dos indivíduos que o compõem e, sobretudo,
para aquelas que também desejam trabalhar
em prol da saúde integral e do exercício
da cidadania do povo brasileiro.
Desejamos que esta publicação impulsione
a reflexão e a discussão -nas organizações
não-governamentais, associações de classe,
instâncias governamentais e políticas- sobre
a transformação de uma situação de marginalidade
e violência vivenciada durante muito tempo pelos
homossexuais, sensibilizando e mobilizando
a sociedade para a luta pelos direitos humanos,
sem restringi-las, portanto, a uma classe
ou movimento.
A partir da apropriação das informações
aqui descritas, sobre a sexualidade e a homossexualidade, acreditamos ser possível encontrar
outros aliados para o enfrentamento da epidemia
do HIV/aids e para a construção de uma
sociedade mais justa e solidária.
Paulo Roberto Teixeira
Coordenador Nacional de DST e Aids
Apresentação
Esse documento pretende ser um guia ou
uma referência para o planejamento e para
a implantação de ações educativas direcionadas
aos homossexuais, no campo da saúde sexual,
cidadania e da prevenção das DST/aids. Assim,
tem como objetivo principal subsidiar técnica
e conceitualmente o desenvolvimento de programas
e ações nessas áreas que tenham como alvo
prioritário os homossexuais. Para tanto, esse
documento privilegia a descrição de conceitos,
de fatos e da história da homossexualidade
no Brasil. Além desse objetivo, visa, também,
reforçar a necessidade de se combater qualquer
atitude preconceituosa, discriminatória ou que
cerceie a liberdade individual e coletiva e
a necessidade e de se promover o exercício
da cidadania, independentemente do tipo
de ação em saúde que se pretenda realizar.
Destinado aos profissionais das áreas de saúde,
de direitos humanos e de assistência social,
lideranças homossexuais, agentes de saúde,
multiplicadores de informação e todas as pessoas
que trabalham na prevenção das DST e aids,
em organizações governamentais ou não-governamentais, este Guia foi estruturado em três partes.
A primeira é voltada para a reflexão sobre o papel
e as representações sociais das homossexualidades, a construção da sexualidade e do preconceito, as diferentes formas de se vivenciar
um tipo de orientação sexual e para a identificação de fatores que vulnerabilizam os homossexuais frente às DST/aids. A segunda parte revisa
as relações entre o estigma, a homossexualidade,
a violência e os direitos humanos, sugere ainda
algumas metodologias para as intervenções
educativas e, descreve a trajetória do movimento
homossexual brasileiro e sua interface com
a epidemia da aids. Por fim, a terceira parte
é destinada a fornecer informações básicas
(de forma resumida) sobre o surgimento e o perfil
da epidemia do HIV/aids no Brasil e no mundo
e sobre os principais fatos que marcaram a história do movimento homossexual em nosso País.
Além disso, descreve mais detalhadamente
os direitos fundamentais do ser humano
e das pessoas que vivem com HIV/aids.
Esse Guia traz, ainda, uma relação de grupos que
desenvolvem ações de prevenção das DST/aids
e de defesa dos direitos humanos junto aos homossexuais, na perspectiva de que tais instâncias
possam vir a ser parcerias úteis para todos
os que pretendem atuar nesse campo.
Para a concepção e a elaboração desse documento,
o Ministério da Saúde contou com a contribuição
efetiva de um grupo de lideranças do movimento
homossexual brasileiro, com expressiva e reconhecida atuação no desenvolvimento de projetos
ou ações de promoção da saúde, de prevenção
das DST/aids e de defesa dos direitos humanos
e da cidadania em nosso País.
Embora o termo homossexual possa ser vinculado à definição de diferentes especificidades
da orientação sexual, identificando, assim, gays,
lésbicas, travestis, transformistas, transexuais
e garotos de programa. Optamos por dirigir
esta reflexão prioritariamente aos homossexuais
masculinos, compreendendo nesse universo
os gays e as diferentes formas de expressão
da homossexualidade masculina.
Porém, com a perspectiva de que informações
mais amplas sobre outras maneiras de vivenciar
a sexualidade é fator relevante para o processo
de formação e/ou aperfeiçoamento do trabalho
de prevenção das DST/aids, sempre que possível,
algumas características das lésbicas, travestis
e transexuais, serão aqui referenciadas.
Dentre outros fatores, sua importância está
no fato de que para a vigilância epidemiológica
e para as ações de prevenção das DST/HIV/aids
este termo permite abranger os homossexuais
e bissexuais, sem explicitar nesse conjunto os
homens que não se reconhecem ou se assumem
como pertencentes a essas categorias.
A palavra gay – originária da língua inglesa
e que significa alegre – já era um termo utilizado
na Espanha desde a Idade Média como sinônimo
de “rapaz alegre”. No Brasil, seu equivalente em
português se deu com o termo gaiato, significando
também engraçadinho. Embora a grafia dessa
palavra em português “guei” já tenha sido dicionarizada, optamos aqui por mantê-la na sua forma
original (gay), tendo em vista que ela já foi completamente incorporada ao cotidiano de nossa
sociedade. Ainda em relação às diversas terminologias utilizadas para o trabalho de prevenção
das DST/aids, não podemos deixar de referendar
o amplo uso – por parte de organizações governamentais e não-governamentais – do termo
Homens que fazem Sexo com Homens (HSH).
Uma outra questão de fundamental importância
na concepção desse Guia não pode deixar de ser
aqui mencionada: embora cientes da relevância
do uso de linguagem inclusiva, visando garantir
a identificação dos dois gêneros – masculino
e feminino – nessa publicação não foi possível
contemplar essa característica de linguagem.
Os objetivos, o público-alvo e a necessidade
de tornar os textos divulgados nesse Guia o mais
compreensível e atraente à leitura, foram fatores
determinantes para impedir de fazermos
distinção dos gêneros, sempre que necessário.
Finalmente, é preciso enfatizar a intenção desse
Guia em fornecer elementos que permitam compreender e atuar na multiplicidade de realidades
que compõem o universo homossexual, buscando,
assim, qualificar novas discussões e intervenções
educativas para o enfrentamento da epidemia
pelo HIV/aids e garantir o respeito pela
orientação sexual.
Denise Doneda
Assessora Responsável pela Unidade
de Prevenção da CN-DST/AIDS
Sumário
Prefácio _________________________________03
Apresentação ____________________________07
Capítulo I
A Construção Social da Sexualidade ___________________ 13
Capítulo II
Homossexualidade e Vulnerabilidade ao HIV/Aids_______ 21
Capítulo III
Expressões das Homossexualidades____________________ 31
Capítulo IV
Metodologias de Intervenção__________________________55
Capítulo V
Direitos Humanos___________________________________ 73
Capítulo VI
O Movimento Homossexual e a Aids ___________________89
Capítulo VII
História da Aids – Breve Resumo _____________________ 105
Anexos
História da Homossexualidade no Brasil ______________ 125
Declaração Universal Direitos Humanos ______________ 131
Direitos Fundamentais das Pessoas
que Vivem com HIV/Aids____________________________ 132
Direitos Sexuais ___________________________________ 134
Grupos Homossexuais no Brasil ______________________ 136
Referências Bibliográficas___________________________ 139
Sobre os Autores ________________________ 145
A construção social
da sexualidade
A construção social da sexualidade
15
A construção social da sexualidade
“Cada cultura constrói a sua aids própria e específica,
bem como as respostas a ela”.
(Herbert Daniel)
Diferentemente dos outros seres vivos, que já
nascem programados para a vida a partir de uma
carga de informações gené ticas que os informa
como se comportar e agir perante as diferentes
situações, o ser humano vem ao mundo desprovido
de tudo isso. O modo de se comportar e de agir
nos é dado socialmente: aprendemos com os nossos
pais, com a comunidade da qual fazemos parte
e na escola. Como não somos simples folhas
em branco, na qual a sociedade vai escrevendo
uma história, também inventamos e recriamos
o que nos é socialmente oferecido: a cultura.
Por isso, a humanidade é tão plural. Atualmente,
com a rápida circulação de imagens e informações
em revistas, televisão e internet, percebemos,
cada vez mais, como diferentes sociedades
vêm desenvolvendo modos diversos
de existir
no mundo.
Antes de abordarmos o que aqui nos interessa
–a sexualidade– façamos o exercício de refletir
sobre a diversidade em outro campo da existência
humana. Pensemos um pouco na diversidade
alimentar: saciar a fome é necessidade básica
para qualquer ser humano, não há como negar.
Mas, o que utilizar da natureza para se alimentar,
o modo de se obter o alimento e como prepará-lo,
é elemento variável no tempo e no espaço.
As culturas possuem gostos e formas alimentares
as mais diversas. É claro que as possibilidades
oferecidas pelo ambiente em termos da geografia,
do clima, da flora e da fauna irão desempenhar
papel importante na construção da diversidade
das culturas, mas o que nos chama a atenção,
é mesmo a criatividade humana: podemos encontrar e/ou comer em uma mesma casa o quibe
árabe, o sushi japonês, a pizza italiana e a feijoada
brasileira. Em um mesmo país a pluralidade de
pratos é igualmente grande. No Brasil, por exemplo,
temos o acarajé, o tutu à mineira,o baião de dois,
a manissoba, a polenta e a buchada: pratos
associados às diferentes culturas que convivem
no País e que, portanto, expressam gostos
culturalmente construídos.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
16
Capitulo 1
Por outro lado, as diferentes culturas também
ditarão quais alimentos podem ou não podem
ser comidos: quem nunca ouviu falar, por exemplo,
que manga com leite faz mal? No judaísmo e
no islamismo a carne do porco é um alimento proibido e, no candomblé filhos de diferentes orixás
são proibidos de comer determinadas comidas.
Tais proibições estão associadas à forma
pela qual diferentes grupos sociais pensam
a existência humana no mundo.
Para além dessas proibições e mergulhando no
interior de uma mesma “comunidade alimentícia”,
veremos que os gostos individuais também variam:
há, por exemplo, baianos que gostam de acarajé
com pimenta, outros não suportam pimenta e
ainda aqueles que não suportam acarajé porque
o gosto não lhes agrada; há os que adoram camarão
e aqueles que são alérgicos a tal fruto do mar.
Assim, observamos que nas escolhas alimentares,
um fator de suma importância é o prazer. Prazer
que envolve aspectos visuais (cores e formas),
paladar, temperatura e aroma, entre outras
coisas que são, em parte, ensinadas culturalmente,
em parte desenvolvidas por cada pessoa.
Com a sexualidade não é diferente. Ela assume
formas as mais diversas, de acordo com as culturas e com o que a trajetória pessoal e a criatividade individual determinam. Cada sociedade
possui um conjunto de regras, de padrões de
comportamentos e de concepções sobre o que
é e para que serve a sexualidade. Tal conjunto
de regras e padrões, que é informado, apreendido
e utilizado pelos indivíduos, constitui o que chamamos de “cultura sexual”. Essa cultura sexual
informará, entre outras coisas, quem pode (e quem
não pode) fazer sexo com quem, em termos
de parentesco, de idade e de status social,
dentre outros indicadores.
Tomando alguns exemplos de diferentes sociedades, vemos que no início do século XX no Brasil,
entre os nossos avós, era comum o casamento
de rapazes mais velhos com mulheres mais novas
(entre 12 e 15 anos) que logo iniciavam a vida
sexual e reprodutiva. Atualmente, a gravidez
na adolescência é, na maioria das vezes, considerada como um problema, sendo o casamento
e as primeiras relações sexuais esperadas
ou postergadas para o final da juventude.
Vemos, portanto, que os padrões mudam com
o tempo e de acordo com os diferentes espaços
geográficos e culturais.
Na Nova Guiné, entre os baruia, o sexo oral entre
os homens de diferentes gerações e status é uma
regra social e culturalmente aceita: nesse grupo
cultural existe a crença de que a energia vital
é transmitida pelo esperma, assim, os homens
mais novos e as mulheres devem ser alimentados
pelos homens mais velhos com essa energia.
Na Grécia Antiga, entre os atenienses, apenas
os homens eram considerados cidadãos e tinham,
portanto, direito e acesso ao conhecimento.
Era comum e legítimo o relacionamento sexual
entre o professor e o aluno, considerado o relacionamento amoroso mais sublime entre dois homens.
Voltando ao Brasil contemporâneo, no candomblé
a sexualidade é entendida como um processo
de troca de energias (“axé”) e para lidar com
as divindades é preciso estar cheio dessa energia.
Desta forma, em determinados períodos rituais,
o ato sexual é proibido sem haver, contudo, interdições referentes à homossexualidade ou à bissexualidade, que são reconhecidas como formas
legítimas de vivenciar a sexualidade humana.
Homossexualidade não é crime:
No Brasil, não há
lei que criminalize a
homossexualidade. Nem o
Código Penal, nem a Constituição
Federal proíbem o sexo entre
pessoas do mesmo sexo, maiores
de 18 anos. Existem leis estaduais
e municipais que proíbem o
preconceito e a discriminação por
orientação sexual.
A partir desses exemplos, podemos verificar
que a sexualidade, assim como a alimentação,
é socialmente construída e, dessa forma,
é passível de assumir várias formas: as regras
e os padrões mudam com o decorrer do tempo
e da história, e de acordo com as características
dos diferentes grupos sociais. Estando integrada
ao modo como a cultura mais ampla pensa a existência do ser humano no mundo, a sexualidade
tem a ver com religião, com gênero (relação entre
homens e mulheres), com economia, com política,
com moral e, também (como no caso da alimentação), com aspectos mais individuais, da ordem
do desejo e do prazer. Vejamos então como
algumas dessas instituições e instâncias sociais
(religião, gênero, política etc.), que influenciam
a construção da sexualidade, interagem
no caso brasileiro.
Homossexualidade não é doença:
Em 1985, o Conselho Federal
de Medicina retirou a
homossexualidade da lista dos
desvios sexuais. Ninguém pode
ser obrigado a submeter-se a
exames ou tratamentos visando
mudar sua orientação sexual.
Primeiramente, precisamos considerar que
vivemos em uma sociedade extremamente plural,
onde várias culturas convivem em interação
e onde podemos pensar o sexo a partir de vários
pontos de vista, que podem falar numa única
voz ou divergirem.
A construção social da sexualidade
19
Sendo assim, podemos entender tais pontos
de vista como modelos1 que utilizamos para construir, entender e agir em termos da vida sexual.
No caso brasileiro, a religião é um exemplo desses
modelos. A moral cristã, que predomina em nosso
País, de modo geral associa a sexualidade ao
pecado, exceção feita apenas para fins de reprodução. Fugindo a esse padrão, qualquer outra
forma de sexualidade é imediatamente entendida
como pecado: o sexo anal, o sexo oral e mesmo
as carícias, quando realizadas por casais heterossexuais ou por pessoas do mesmo sexo, assumem
caráter pecaminoso, sendo que o peso maior
desse “pecado” recai sob essas últimas relações.
Há também um conjunto de imagens e idéias
que cuidam de regular - e muitas vezes de modo
danoso - as relações entre homens e mulheres:
os sociólogos chamam esse modelo de “sistema
de gênero”. A grosso modo, neste mapa os homens
são concebidos como supostamente
superiores às mulheres.
1
O termo modelo utilizadro nesse capítulo é entendido pelas ciências sociais por mapa
ou roteiro de interação.
Vale ressaltar que os valores atribuídos aos
homens e às mulheres não vêm da fisiologia
dos corpos, pois, como tudo na vida dos seres
humanos, o que cabe aos homens e às mulheres
lhes é atribuído culturalmente. Assim, esse modelo
é usado para pensar e orientar a maioria das relações sociais (trabalho, vida familiar, lazer etc).
Quando ele é utilizado para pensar a vida sexual,
os seres humanos (sejam homens ou mulheres)
são classificados em penetrantes e penetrados(as),
em comedores e comidos(as), em ativos(as)
e passivos(as). No entanto, há de se salientar
que esse modelo não determina apenas as posições
sexuais na cama,mas valora essas posições de
modo que o ativo é supostamente mais poderoso
e melhor do que o passivo. Mesmo quando
as relações e parcerias sexuais acontecem entre
pessoas do mesmo sexo, esse tipo de mapa vigora,
e tende-se a identificar quem é o passivo ou ativo
na relação, ou, quem é o “homem” e quem
é a “mulher”.
Um terceiro modelo é aquele que se preocupa,
sobretudo, com a biofisiologia dos corpos
e com a finalidade da sexualidade para
a sociedade e para as pessoas.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
20
Capitulo 1
Embora calcado num discurso mais científico,
esse modelo pode assumir grande carga de moralismo e assim estigmatizar (marcar negativamente)
algumas pessoas simplesmente pelo fato de não
se comportarem como o previsto, mesmo que tal
comportamento não tenha nenhum efeito nocivo
para as pessoas ou para a sociedade. Nesse modelo,
na verdade, temos envolvidas várias áreas do saber:
a medicina, a psicanálise, a sexologia e a psicologia,
entre outras. Embora alguns desses campos do
saber tenham evoluído no sentido de não mais
entender a homossexualidade como crime ou como
doença, o discurso higienista do começo do século
parece permanecer enraizado no senso comum
(conjunto de saberes utilizados, no dia-a-dia,
pelas pessoas para entender o mundo) colocando
a sexualidade como tendo, sobretudo, fins reprodutivos e as outras formas de sua prática vistas
como doença ou perversão.
Nesse conjunto, um outro modelo vale ser
enfocado, já que nele o entendimento da
sexualidade identifica como elemento mais
importante o prazer que os corpos e as brincadeiras sexuais podem oferecer.
Esse modelo considera os elementos de outros
modelos, enfatizando, no entanto, a transgressão
dos limites e colocando a “sacanagem” e o “entre
quatro paredes vale tudo,” como pontos-chave
de orientação. Nele, formas de práticas eróticas,
abominadas em outros modelos, são plenamente
legítimas. Portanto, o sexo oral, o cunilingus
e o sexo anal são definidos como fontes privilegiadas de prazer.
Outros tantos modelos podem ser identificados,
incluindo aqueles utilizados por grupos específicos
(por exemplo, o modo como o candomblé
pensa a sexualidade).
A partir desse referencial sobre a construção
social da sexualidade humana o que aqui
nos interessa, sobretudo, é a compreensão
da relação entre sexualidade e transmissão
do HIV/aids, possibilitando entender o caminho
da infecção entre as pessoas com práticas
homossexuais e, assim, identificar estratégias
que possam ser utilizadas na prevenção das DST/
HIV/aids nesse grupo populacional.
Homossexualidade
e vulnerabilidade
ao HIV/aids
Menor risco
Homossexualidade e
vulnerabilidade ao HIV/aids
Abstinência sexual
“Todos somos responsáveis por tudo;
é preciso pensar globalmente, mas agir localmente”
(Betinho)
Menor risco
Sexo com camisinha
Sexo oral sem camisinha:
boca/pênis
Penatrativo
Sexo oral sem barreira:
boca/ânus
Receptivo
Penatrativo
Sexo com
penetração
sem camisinha
vaginal
Receptivo
Penatrativo
anal
Receptivo
Maior risco
Maior risco
Como sabemos, as formas de se infectar pelo HIV
são pelo contato com o sangue e outros fluidos
corporais. À medida que envolve o contato de
vários desses fluidos (esperma, secreções vaginal
e anal, sangue) com as frágeis mucosas bocal,
vaginal e anal (que quase sempre apresentam
fissuras durante o sexo), o ato sexual, quando
praticado de forma desprotegida, possibilita a
entrada facilitada do vírus no organismo humano.
A importância do uso do preservativo (camisinha)
durante as relações sexuais, reside no fato de ele
impedir o contato entre os fluidos corporais
e eventuais fissuras, barrando, dessa maneira,
o caminho de entrada do vírus no corpo humano.
Algumas práticas sexuais são consideradas
de menor ou maior risco, por possibilitarem maior
ou menor chance de infecção. O diagrama ao lado
mostra a hierarquia de prevenção do HIV/aids,
segundo os diferentes tipos de práticas sexuais.
Sexo sem penetração (masturbação e
carícias)
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
24
Capitulo 2
Atualmente, podemos falar de práticas ou
comportamentos de risco, porém, nunca
de grupos de risco. O que isso significa? Significa
que independentemente da orientação sexual
–seja ela heterossexual, bissexual ou homossexualalgumas práticas sexuais podem levar mais
facilmente à infecção pelo HIV, enquanto outras
oferecem menor chance para a infecção. Contudo,
alguns grupos populacionais podem, devido às
desigualdades sociais, se tornar mais susceptíveis
a epidemia pelo HIV/aids. Este fenômeno é chamado de vulnerabilidade social. Analisando dados
epidemiológicos sobre as pessoas infectadas pelo
HIV/aids, podemos identificar fatores que
determinam a maior vulnerabilidade de alguns
segmentos populacionais. No caso brasileiro,
por exemplo, a epidemia tem crescido entre
os jovens, as mulheres, no interior do País e entre
pobres, continuando estabilizada em patamares
elevados entre homossexuais e bissexuais. Por
que isso? O que faz os homossexuais masculinos
serem mais vulneráveis à epidemia do HIV/aids
do que outros grupos populacionais?
Já observamos que alguns dos principais modelos
utilizados para a construção e entendimento
da sexualidade no Brasil, vão julgar como pecado,
doença ou mesmo crime, a conduta dos homossexuais masculinos e femininos –mesmo que
de um ponto de vista ético, a homossexualidade
não ameace a existência dos indivíduos ou da
sociedade. Na verdade, são essas concepções,
muitas vezes apregoadas com o intuito de manter
a suposta “ordem e bons costumes”, que ameaçam
a existência das pessoas, à medida que as coloca,
por exemplo, em situação de maior propensão
à violência e às doenças sexualmente transmissíveis, como a aids. Vejamos mais de perto,
no entanto, como a maior vulnerabilidade
é processada entre as pessoas com práticas
homossexuais.
Um primeiro ponto a ser considerado é o estigma
que marca os homossexuais de forma negativa,
sendo eles vistos como “marginais” – pervertidos,
criminosos e pecadores – pela sociedade em geral.
Esse estigma atinge diretamente a auto-estima
dos homossexuais, uma vez que todos precisamos
sempre do respaldo da sociedade em que
vivemos para reforçar o significado de
nossas atitudes.
Homossexualidade e vulnerabilidade ao HIV/aids
25
A baixa auto-estima, fruto dessa valoração negativa
que a sociedade impõe aos homossexuais, leva-os,
muitas vezes, a vivenciarem um sentimento
de inadequação social e/ou psicológica. Esse
sentimento, algumas vezes evolui para distúrbios
psicológicos mais graves, como a depressão
e mesmo o suicídio. A baixa auto-estima também
pode levar os homossexuais a optarem por via
paralela a essa, apresentando uma total despreocupação no cuidado consigo próprio, que
se traduz, por exemplo, pelo exercício de práticas
sexuais pouco seguras. Esse estigma também
pode ser associado às situações de violência física
geradas, muitas vezes, pelo simples fato de o
homossexual demonstrar sua orientação sexual
por meio de maneirismos (da ordem do feminino
ou do masculino). No caso dos homens, a questão
se agrava quando na falta da possibilidade e legitimidade sociais do amor e do sexo entre iguais,
eles buscam ambientes isolados e perigosos
para a prática do sexo casual, correndo o risco
de violência por parte da polícia, de bandidos e,
por vezes, dos próprios parceiros. Tais situações
geram, também, menor possibilidade de negociação do sexo seguro, como uma medida de
prevenção e de cuidado com a saúde.
Na verdade, o estigma afeta os homossexuais
desde muito cedo. Em princípio, poderíamos
esperar que a família, como um dos principais
agentes na socialização dos indivíduos, fornecesse informações corretas sobre a sexualidade,
dando total apoio aos jovens no início de sua vida
afetiva e sexual. Porém, na verdade, observamos
que quando a homossexualidade dos filhos
é revelada, ocasiona a reprodução do estigma
social, fazendo com que a família aja de modo
danoso e até mesmo violento: essa é mais uma
atitude que aumenta a situação de vulnerabilidade dos jovens homossexuais.
Neste sentido, estudos entre adolescentes têm
mostrado que os jovens homossexuais são mais
suscetíveis aos riscos de abuso físico, problemas
escolares, fuga de casa e problemas psicológicos,
além da infecção pelo HIV. Mesmo na escola,
onde várias campanhas voltadas para a educação
sexual e a prevenção são desenvolvidas, é comum
haver uma explícita discriminação contra
os jovens homossexuais ou, na maioria das vezes,
pouca consideração por parte dos programas
informativos e dos profissionais de educação,
em relação à presença de jovens com práticas
homossexuais entre seu público-alvo.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
26
Capitulo 2
O repasse de informações é geralmente pensado
e direcionado para o público heterossexual. Assim,
o medo de se expôr em sala de aula faz com que
os jovens homossexuais e bissexuais deixem
de levantar questões próprias de seu universo,
temendo retaliações ou gozações dos companheiros de sala e impedindo que suas dúvidas
sejam esclarecidas. Para completar esse quadro
de isolamento dos jovens homossexuais, soma-se
o fato de ainda existirem muitos profissionais
de saúde com uma visão preconceituosa em
relação à homossexualidade, sendo, portanto,
responsáveis pelo afastamento desse público
usuário homossexual do serviço de saúde, negando
a ele o acesso ao preservativo, à informação,
aos exames e ao cuidado com a saúde.
Esse mesmo estigma, observado nos jovens
homossexuais em ambiente escolar, pode ser
transportado para o mercado de trabalho:
os jovens homossexuais e os homossexuais que
demonstram sua preferência sexual com maneirismos considerados femininos, têm muito mais
dificuldade de obter emprego do que os heterossexuais. Isso, muitas vezes, é um fator determinante
para que eles procurem alternativas de trabalho
no mercado informal, sendo o exercício da prostituição uma das opções mais freqüentes.
As diferenças entre as classes sociais –que
aparentemente não teriam conseqüências diretas
na sexualidade do indivíduo– exercem poderosa
força nesse campo. Por exemplo, uma pessoa
com prática homossexual de classe média e alta
tem muito mais acesso à informação e aos serviços
de saúde do que aquela proveniente de classes
sociais mais desfavorecidas. Da mesma forma,
quando cruzamos a homossexualidade com as
relações raciais existentes na nossa sociedade,
podemos perceber que os homossexuais negros
estão em situação de maior vulnerabilidade
social do que aqueles de cor branca.
Outro ponto importante a se considerar é o fato
de muitos homens que mantêm, ocasionalmente
ou freqüentemente, práticas homossexuais
não se reconhecerem como homossexuais ou
bissexuais. Uma das principais conseqüências
desse fato associa-se à maior vulnerabilidade
desses homens ao HIV/aids, já que não se sentem
sujeitos à infecção. Aqui, a ação da ideologia
do gênero, que divide os seres em ativos e passivos,
exerce sua força, agindo também na hora da
negociação do uso do preservativo: não é raro
que os ativos, por se considerarem homens e/ou
heterossexuais (e assim supostamente imunes
ao HIV), se neguem a usar o preservativo com
seus parceiros e parceiras (fixos ou ocasionais).
Homossexualidade e vulnerabilidade ao HIV/aids
27
Para falar das expressões da homossexualidade
ou das identidades sexuais é preciso enfatizar
a distinção entre as práticas sexuais (fazer sexo
com pessoas do mesmo sexo) e os papéis e crenças
socialmente compartilhadas e utilizadas pelas
pessoas para se apresentarem diante de grupos
e pessoas. É preciso, sobretudo, colocar a homossexualidade no plural e se falar em homossexualidades. Contudo, também devemos considerar
que identidade não é apenas construção pessoal.
As pessoas constróem suas identidades a partir
do que lhes é oferecido coletivamente: usam
rótulos (por exemplo, os termos veado, homossexual, entendido, boiola, maricona, frutinha,
copinho, lésbica, gay, sapata, lady, bicha, biba,
homem, macho etc) e códigos (maneirismos,
linguajar, vestuário etc) construídos socialmente
para informar à coletividade e a determinadas
pessoas, sua orientação sexual e como se percebem enquanto indivíduos. Chamamos isso
de estereótipos.
Por exemplo, há homossexuais masculinos que
no cotidiano se comportam e usam vestimentas
consideradas femininas, para demonstrar sua
orientação sexual (são nomeados como pintosas
ou fechativas); outros se “transformam” usando
roupas femininas apenas para realizar shows
em boates (os transformistas);
há aqueles que se travestem por se perceberem
interiormente mulheres, a despeito da anatomia
dos seus corpos (travestis); e ainda outros que
se mostram fisicamente super masculinizados
para demonstrar que são ativos (bofes). Mas
é preciso observar que nem sempre o estereótipo
que associa a masculinidade com atividade
e feminilidade com passividade, condiz com
as preferências concernentes às práticas sexuais
vividas entre quatro paredes: podemos encontrar,
por exemplo, o homem super masculinizado
que gosta de ser penetrado e aquele efeminado
que é ativo na relação sexual – ressaltando ainda
que nem sempre a relação sexual funciona à base
da penetração, existindo relações homossexuais
que se concretizam por meio de carícias
e/ou masturbação.
Tudo irá depender das especificidades do local
e das características culturais das comunidades.
Essa é mais uma razão para que o trabalho de
educação em saúde sexual priorize a atenção
no modo pelo qual as pessoas expressam, em
termos de identidade, suas homossexualidades.
Ou seja, deve-se observar os maneirismos,
as roupas, o linguajar e os rótulos utilizados
para nomear as diferenças encontradas
e as crenças que justificam a pluralidade
de expressões da homossexualidade.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
28
Capitulo 2
É preciso, ainda, destacar a importância de
se pensar em outro uso para o termo identidade:
todos nós usamos rótulos sociais para classificar
os outros, mesmo que estes não se percebam
em tal classificação. Devemos ter clareza de que,
embora seja realmente importante a mobilização
em torno da garantia da identidade homossexual
- visando ao fortalecimento da luta pelos direitos
humanos - nosso objetivo nas ações de educação
é repassar informações sobre saúde sexual e prevenção das DST/HIV/aids. Assim, nesse trabalho
procura-se obter mudanças das crenças (o que
são as doenças sexualmente transmissíveis, o HIV,
o modo como se transmite e o que leva as pessoas,
e sobretudo os homossexuais, a se tornarem mais
vulneráveis à infecção) e dos comportamentos
(prática do sexo mais seguro) a fim de controlar
o avanço da epidemia. Nesse processo, é fundamental considerar e respeitar a forma pela qual
cada um dos sujeitos das intervenções se dizem
e se pensam. Muitas vezes, a ênfase dada a determinada terminologia (homossexual, HSH ou gay,
por exemplo) pela qual algumas pessoas não
se reconhecem (ou possuem mesmo verdadeira
aversão) pode levar o trabalho de educação
|em saúde sexual a não surtir o efeito desejado.
Cabe enfatizar que se queremos verdadeiramente
avançar rumo a uma sociedade mais igualitária
e saudável em todos os sentidos, devemos lutar
cada vez mais, para que princípios que garantam
a vida e qualidade de vida das pessoas, independentemente de sua orientação sexual, prevaleçam
na (re)construção de modelos que possibilitem
a interação social de forma mais justa e solidária.
Podemos refoçar, portanto, que o repasse de
conhecimentos sobre saúde sexual e prevenção
do HIV/aids só surtirá o efeito desejado (ou seja,
mudança de crenças e de comportamentos a fim
de controlar a epidemia) se conseguirmos refletir
e nos conscientizar coletivamente (nós, multiplicadores de informação e a comunidade em que
trabalhamos) sobre o papel das desigualdades
sociais na trajetória da epidemia; se conseguirmos
agir em favor da vida e da qualidade de vida
das pessoas, independentemente de orientação
e da identidade sexual, percebendo e mostrando
como as desigualdades sociais e algumas perversas
proposições morais agem de modo danoso,
colocando em risco a vida das pessoas e da sociedade e, se conseguirmos desenvolver o sentimento
comunitário e de solidariedade, fomentando
ações em favor do resgate da cidadania plena
para toda e qualquer pessoa (homens e mulheres;
homossexuais, bissexuais e heterossexuais; transgêneros e transexuais; pessoas soropositivas e
soronegativas; crianças, jovens, adultos e idosos).
Homossexualidade e vulnerabilidade ao HIV/aids
29
Por outro lado, se o trabalho de educação
em saúde sexual e prevenção das DST/HIV/aids
for realizado de forma que as informações sejam
sempre relacionadas às linhas de desigualdade
social já descritas aqui, as pessoas poderão perceber que sem uma mobilização coletiva não há
como quebrar tais desigualdades que têm vulnerabilizado os homossexuais – seja frente ao HIV/
aids, seja com a violência ou com outras formas
de exclusão social. Também poderão perceber
afinidades -podendo não ser, necessariamente,
associadas à identidade ou comportamento
sexuais- que as unem, sobretudo pelo fato
de terem seus direitos diminuídos e assim
sua qualidade de vida ameaçada.
Assim, as pessoas-alvo de nossa intervenção
buscarão uma maior integração nas diferentes
frentes de luta existentes, voltadas para a
garantia da cidadania. No caso de não se
conseguir concretizar essa realidade com tal
grau de mobilização das pessoas, o sucesso
na divulgação de informações corretas sobre
a homossexualidade, o sexo mais seguro e
a infecção pelo HIV/aids aos mais longínquos
lugares do País, já determina a importância
do trabalho de educação em saúde sexual
e prevenção das DST/HIV/aids.
Expressões das
homossexualidades
Expressões das homossexualidades
Sentir desejo por pessoas do mesmo sexo não
significa dizer que todos pensam e agem de
forma idêntica. Como já vimos, da mesma forma
que existem diferenças no processo alimentar,
há diversas formas de viver a homossexualidade.
A diversidade existente, por exemplo, na expressão
da heterossexualidade, é encontrada também na
homossexualidade, que possui diferentes formas
de compotamento, estilos de vida e estereótipos.
Ser homossexual ou gay não é, portanto, somente
sinônimo de uma maior feminização, assim como
ser heterossexual não pressupõe apenas a existência
de figuras masculinizadas ao extremo. Os homossexuais podem ser divididos em três grandes
grupos: os gays, os bofes e os garotos de programa. Nesse capítulo o principal desafio
é identificar e compreender essas diferentes
expressões da homossexualidade. No entanto,
para completar esse conjunto de informações,
a descrição das características de lésbicas,
travestis e transexuais também foram elementos
incorporados, uma vez que são maneiras
de expressar a sexualidade, tema principal
para o trabalho de prevenção
das DST/HIV/aids.
Ser homossexual ou gay não é,
portanto, somente sinônimo de
uma maior feminização, assim
como ser heterossexual não
pressupõe apenas a existência de
figuras masculinizadas ao extremo.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
34
Capitulo 3
A palavra gay (popularmente sinônimo de bicha
ou entendido) muito utilizada para definir os
homossexuais masculinos no geral, é o termo
universal preferido pelos homossexuais do
mundo inteiro e, define um comportamento
variado de viver, incluindo outras categorias:
os enrustidos, as fechativas, os assumidos e
os militantes. Além de conhecer as características
de cada uma dessas categorias, é preciso ter
cuidado para empregar cada um dos termos
apresentados aqui, seja no convívio com os
homossexuais, seja nas ações de prevenção: entre
o grupo tais termos são usados com frequência
e naturalidade, porém, se usado por pessoas
externas ao grupo podem ser encarados
como insultos.
Os gays enrustidos (ou incubados) são considerados
integrantes de uma grande parcela da população
masculina. Esse é o gay que não se assume ou
mesmo que não percebe sua homossexualidade.
São vários os motivos para que isso ocorra:
a rejeição familiar, o medo da perda de emprego
e amigos, as restrições religiosas etc. Entre os
enrustidos estão os bissexuais: homens casados
ou não, que levam uma vida dupla procurando
gays, garotos de programa ou travestis para
relações sexuais esporádicas.
Nessa categoria dos enrustidos, encontra-se
tanto o entendido -que é exclusivamente homossexual, mas que só se assume nos guetos ou locais
de frequência homossexual- como também
o homem que pertence, de fato, ao universo heterossexual (podendo ser pai de família, casado,
noivo etc), mas que precisa realizar desejos da
ordem da homossexualidade (mesmo que não
tenham ou admitam essa identidade). Nessas duas
categorias, o trabalho de promoção da saúde sexual
e prevenção das DST/HIV/aids torna-se bem mais
difícil, seja pelo pouco acesso e visibilidade dessas
categorias, seja pelas naturais dificuldades
em conciliar a vida dupla que levam.
Os assumidos se dividem em bichas fechativas,
entendidos e militantes. Os mais visíveis socialmente
são aqueles rapazes bem feminilizados que
não têm como esconder sua androginia psicossocial, embora não se vistam de mulher (também
se chamam entre si, de monas se jovens ou mariconas, se idosos). Como o próprio nome já diz,
as bichas fechativas (ou bichinhas) são aquelas
que se mostram e se exibem, se situando indefinitivamente na fronteira entre o masculino
e o feminino.
Expressões das homossexualidades
35
Por isso também sofrem grande discriminação
e são alvo de atos de violência. Essa é muitas
vezes a primeira etapa de comportamento para
chegar a se assumir como travesti. Geralmente as
fechativas não mantêm relações sexuais
entre si, estando sempre à procura do homem
super masculinizado, ou o bofe.
Entre os assumidos que necessariamente não
são efeminados, estão os entendidos: homens
ou rapazes que gostam de outros homens iguais
a si, que têm identidade homossexual e que decidiram se assumir socialmente (ou, sair do armário).
Geralmente, os entendidos são independentes de
suas famílias, trabalham e têm um bom nível
socioeconômico e cultural. Podem ser facilmente
encontrados e acessados em locais de freqüência
homossexual (bares, boates, saunas, cinemas)
ou em outros ambientes não específicos da classe
(empresas, organizações não-governamentais,
serviços públicos, escolas, universidades etc).
Ainda entre os assumidos, há o grupo dos gays
militantes ou ativistas, que têm vínculos com
os grupos de defesa dos homossexuais e que,
além de ter a identidade homossexual, se mostram
e destacam como figura pública.
O ativista cumpre o papel de ser representante
da classe, protagonista das ações voltadas para
a defesa dos direitos humanos, para a promoção
da saúde e para o enfrentamento da epidemia
pelo HIV/aids. Essa categoria, portanto, é extremamente importante para o trabalho de prevenção
das DST/HIV/aids, devendo ser sempre parceira
das ações nesse campo.
Uma outra categoria é constituída pelos bofes:
homens e rapazes com aparência masculina,
que não se assumem como gays, mas que mantêm
relações sexuais (ocasionais ou freqüentes) com
gays ou travestis. Essa categoria se divide no bofe
heterossexual exclusivo (que por curiosidade
transou uma ou duas vezes com homossexuais,
mas por não ter gostado da experiência, se assumiu
definitivamente como heterossexual), no bofe
bissexual (que gosta de transar igualmente com
gays e com mulheres, sem interesse comercial)
e no bofe profissional (grupo que se divide entre
aqueles que ocasionalmente transam com gays
em troca de dinheiro ou presentes e aqueles
que exercem a prostituição como profissão).
Aqueles que integram este último grupo do bofe
profissional também são chamados de
garotos de programa ou michês.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
36
Capitulo 3
A prática da prostituição masculina é muito
menos institucionalizada do que a feminina,
assim os garotos de programa são mais marginalizados socialmente, seja pelo exercício da sua
atividade profissional, seja pelo fato de se relacionarem com outros homens sexualmente.
Outra diferença que se destaca entre estes dois
cenários, é a habitual ausência dos gerentes
sexuais (ou cafetão) no universo dos garotos
de programa. Por outro lado, assim como acontece
no contexto feminino, a prostituição masculina
passa também pela clandestinidade, se manifestando sob formas legais ou semi-legais (as casa
de massagem, os bordéis, as saunas, os serviços
em domicílio por meio de anúncios de jornal
e internet), que muitas vezes substitui a rua
como única opção para ponto de prostituição.
Mas é preciso também considerar que os garotos
de programa são nômades, não restringindo
suas atividades a um único ponto e transitando
entre esses dois universos da prostituição
(de rua e locais fechados).
Um considerável número de garotos de programa
não são ou não se consideram homossexuais e,
essa recusa muitas vezes valoriza ou atende aos
desejos de seus clientes que têm fantasias em
manter relações sexuais com um suposto heterossexual disposto a uma experiência homossexual.
Em geral, a faixa etária clássica para o exercício
da prostituição masculina oscila entre 15 e
25 anos, sendo que os clientes desse comércio
sexual têm idade média acima de 35 anos.
Na relação prostituto-cliente, na prostituição
masculina, a superioridade socioeconômica
do cliente é compensada pela valorização
do “garoto de programa” super másculo e viril,
em detrimento da inferiorização do cliente que
é homossexual.
Por fim, cabe salientar que nem todos os garotos
de programa exercem a prostituição como
única fonte de subsistência. Alguns moram
com a família, outros têm trabalho fixo e,
nesses casos, a renda da prostituição é considerada como um complemento para as despesas
mensais, para saldar dívidas ou para concretizar
algum objetivo de consumo. Esses são os garotos
de programa ocasionais.
Como toda classificação, essas informações
sobre as principais categorias dos homossexuais
no Brasil pode, muitas vezes, restringir a diversidade e a complexidade existente nas diversas
realidades locais. Assim, esta síntese deve ser
considerada como ponto de referência para
o trabalho de educação em saúde sexual e prevenção
das DST/HIV/aids, sendo necessário observar
e verificar se tais tipologias são compatíveis com
o contexto onde a ação será desenvolvida.
Expressões das homossexualidades
Lésbicas
Lésbicas
As lésbicas –como outras expressões das homossexualidades vistas nesse capítulo– não se
constituem em grupo homogêneo, uniforme,
com a mesma identidade, organização, comportamentos e características. Assim, as primeiras
perguntas que surgem em relação às mulheres
que fazem sexo com mulheres são: como identificar
e quem são as lésbicas? Sem hesitar, podemos
dizer que elas são nossas avós, mães, tias, filhas,
a vizinha do apartamento ao lado, a dona da
padaria, a colega de estudos ou de trabalho,
a médica da família, a professora de nossos filhos,
a engenheira, a vereadora, a ativista, a prostituta
etc. Com quem elas se parecem? Com qualquer
mulher, de qualquer raça, de qualquer idade,
e qualquer altura, de qualquer peso, de qualquer
aparência. Como se vestem? De forma esportiva,
formal, sofisticada, de vestido, de calça comprida,
sem maquiagem, com alguma ou muita maquiagem.
São, enfim, simplesmente mulheres que se sentem
atraídas por outras mulheres em diferentes
momentos de suas vidas (na adolescência, na
vida adulta, na terceira idade), ou por toda a vida,
seja de forma exclusiva ou não.
Em geral, sentem sua inclinação sexual por
outras mulheres na adolescência, mas, sobretudo
por causa do preconceito e da repressão familiar,
muitas não concretizam seus desejos nessa época,
só iniciando namoros na idade adulta. Algumas
namoram rapazes primeiro, às vezes até casam,
têm filhos, descasam, casam de novo e, por fim,
decidem-se por uma parceira, ou porque tiveram
finalmente coragem de viver sua orientação
sexual ou simplesmente por haver se apaixonado.
Outras, ainda, vão encontrar o amor na pessoa
de outra mulher já quando avós e com esse amor
vivem até o resto de seus dias. Isso sem falar nas
mulheres que, durante toda a vida, alternam parceiros e parceiras, e aquelas que, mesmo casadas
com homens, mantêm também relações com
outras mulheres.
As diferentes visões que essas mulheres têm de si
mesmas dependem de suas diferentes experiências
de vida, onde estão inclusas a questão racial,
de classe, de nível educacional e, de aspectos
inteiramente subjetivos como personalidade
e temperamento individuais. Algumas podem até
introjetar as antigas visões da homossexualidade
como doença ou, se tiverem formação religiosa
tradicional, como pecado.
37
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
38
Capitulo 3
A grande maioria, contudo, considera-se perfeitamente normal e, cada uma a seu modo, procura
lutar contra o preconceito. As mais ativistas, atuantes em movimentos de direitos humanos e pela
livre orientação sexual, costumam identificar-se
como “lésbicas”, palavra resgatada das diferentes
acepções negativas que o termo assumiu no passado,
e redefinida positivamente a partir de sua origem,
ligada à poetisa Safo de Lesbos, que escreveu
versos em louvor de suas pupilas no final do séc.
VII a.C.. Algumas preferem chamar-se de sapatas,
outra palavra resgatada da acepção negativa
do termo “sapatão”, e redefinida positivamente,
inclusive com abreviações e diminutivos como
“sap” e “sapinhas”. Outras preferem denominarse entendidas ou como homossexuais (sem a
conotação de enfermidade) e gays (essas duas
últimas denominações, embora mais aplicadas
para e por homens, também são utilizadas por
algumas mulheres lésbicas).
Embora possamos detectar avanços em relação
ao acesso à informação, à educação e à saúde,
muitas lésbicas –como a grande maioria das brasileiras heterossexuais– ainda desconhecem
o próprio corpo, seus direitos humanos, sexuais
e reprodutivos e as diferentes especificidades
de sua saúde.
Ainda é possível, por exemplo, encontrar mulheres
–lésbicas ou não– que nunca ouviram falar
de suas doenças específicas ou da necessidade
de realizar exames ginecológicos e de prevenção
periódicos e regulares. Mesmo considerando que
a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis entre lésbicas ainda esteja inserida na
categoria de “baixo risco”, não podemos inferir
que esse grupo é inume à infecção pelas
DST/aids.
A violência sofrida pelas lésbicas é histórica,
se manifesta de diferentes formas, em vários
campos e é considerada uma grave violação
da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A origem da violência contra as lésbicas pode ser
vinculada à imposição do modelo de sociedade
patriarcal e machista, onde a heterossexualidade
é colocada como única possibilidade aceita social
e culturalmente para o exercício da sexualidade.
Assim, a heterossexualidade é imposta às mulheres
(por meio dos diferentes modelos de interação
social -família, escola, meios de comunicação etc)
e, portanto, considerada como a maior violência
sofrida pelas lésbicas. É importante destacar esta
questão para que possamos melhor compreender
os principais problemas vivenciados por essas
mulheres, em relação à manutenção de
sua saúde.
Expressões das homossexualidades
Lésbicas
Dado o preconceito dos profissionais de saúde
contra a homossexualidade e a idéia de que
mulheres que se relacionam com mulheres não
precisam de cuidados ginecológicos, as mulheres
lésbicas vão menos aos ginecologistas e estes
solicitam menos exames (como por exemplo
o Papanicolau), além de perguntar ou não perguntar
nada sobre a vida sexual das pacientes. Não há
nada nas relações entre mulheres que as torne
imunes a quaisquer doenças. O baixo nível de
DST apresentado entre essa população, deve-se
simplesmente ao fato de as relações se darem,
geralmente, com uma única parceira por períodos de tempo prolongados, o que dificulta a
disseminação de doenças. Mulheres que se relacionam com mulheres que têm várias parceiras,
em curto período de tempo, correm o mesmo
risco que qualquer outro segmento populacional,
se não praticar sexo seguro, de contrair doenças
sexualmente transmissíveis de forma mais
freqüente. Assim, as doenças sexualmente transmissíveis também podem estar vinculadas às
relações lésbicas, incluindo aí a aids. Porém, em
se tratando desta última doença, existem poucos
casos registrados no Brasil e no mundo, cujo
agente de infecção seja única e exclusivamente
a relação sexual lésbica.
Assim percebemos como pode ser complicado,
para um profissional de saúde, deixar se levar
pelas idéias que tem sobre todas as mulheres
serem heterossexuais ou sobre o que seria uma
lésbica, em vez de perguntar simplesmente com
quem a paciente se relaciona e como se relaciona.
Na formação da visão estereotipada sobre
as lésbicas, percebemos que entram componentes
como a homossexualidade ser sinônimo de
doença -implicando a imagem de uma mulher
sempre masculinizada e desequilibrada– ou que
as mulheres são menos sexuais do que homens
ou mesmo assexuadas (devido à inexistência
da relação pênis-vagina).
Enfim, a partir do relato das pacientes a/o profissional de saúde pode indicar um tratamento que
leve em consideração fatores palpáveis, como
com quem a mulher se relaciona e como, idade,
época em que começou a menstruar ou parou
de menstruar, se já amamentou ou não, além
do exame clínico-padrão.
39
Deve se ter em mente que as relações entre
mulheres também possibilitam a transmissão
de doenças sexuais e informar as mulheres
de como preveni-las (recomenda-se para sexo
seguro uso de luvas de látex para penetração
e de barreira também de látex, feitas a partir
de camisinhas, para sexo oral) bem como prevenir
o câncer de mama pela prática do auto-exame
mensal para detecção de nódulos. Como a maior
parte das mulheres que se relacionam com mulheres
não têm filhos e não amamentaram -e esse fator
vem sendo considerado como fator de risco para
esta enfermidade-, tal recomendação se torna
particularmente importante. O/a profissional
de saúde também deve lembrar que os exames
de pacientes lésbicas precisam ser completos,
incluindo coleta de secreção para exame de
Papanicolau, exame das mamas, exame de toque,
além da recomendação de visitas ginecológicas
periódicas.
Os direitos humanos das mulheres que se amam
passam, intrinsecamente, pela questão dos direitos
da mulher, sendo a livre orientação sexual parte
da luta pelos direitos sexuais de todas as mulheres.
A luta das mulheres lésbicas tem de se dar, necessariamente, em duas frentes: a da igualdade entre
os sexos e a do fim das restrições à sexualidade
feminina, em que se inclui o fim das restrições às
práticas sexuais entre mulheres. Evidentemente,
as lutas pela igualdade dos direitos das pessoas
homossexuais, no que se refere à garantia de
trabalho, de acesso à saúde, bem como de direito
à propriedade, à sucessão patrimonial, benefícios
previdenciários, entre outros direitos, também
beneficiam as mulheres que se relacionam
com outras mulheres.
Para uma correta análise e compreensão das vivências lésbicas e um adequado encaminhamento
das questões dessa população, faz-se necessário,
portanto, que busquemos transcender os rótulos
utilizados para defini-la e passemos a trabalhar
com as mulheres reais que a conformam em
sua imensa variedade. Precisamos transcender
a idéia de que as lésbicas não são mulheres
de verdade e que suas práticas sexuais seriam
sinônimo de doença, anormalidade ou pecado.
Expressões das homossexualidades
Lésbicas
Nas últimas décadas, grupos e ativistas lésbicas
vêm se mobilizando de diferentes formas
para garantir sua participação e visibilidade em
encontros nacionais e internacionais, em debates
e seminários e na mídia. Essa estratégia, somada
a outras desse movimento social, é considerada
de extrema importância para refletir, esclarecer
e aprofundar questões relacionadas à melhoria
da condição de vida das lésbicas. Nesse sentido,
é importante destacar alguns dos fatos da trajetória
desse movimento, como sua participação em
1980 na passeata de protesto contra a violência
policial, homofóbica e racial cometidas por
delegado de polícia de São Paulo, e, sua aliança
com o movimento negro em 1993 para protestar
publicamente contra a discriminação racial e por
orientação sexual. Além disso, não se pode deixar
de ressaltar a participação de ativistas lésbicas
nas comemorações do dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher.
Como veremos mais adiante, a organização social
das lésbicas acontece no final da década de 70,
em São Paulo, a partir da criação de uma ”facção
lésbica-feminista” no Somos -Grupo de Afirmação
Homossexual, primeira instituição do gênero
formada no Brasil.
Em maio de 1980, devido a divergências políticas,
essa facção se desvincula do Somos, tornandose um grupo independente de curta duração,
que, no entanto, gerou um outro, o Grupo Ação
Lésbica Feminista, cujas atividades se prolongaram até 1990. Nos anos 80, outras tentativas
de organização não conseguiram se sustentar, mas,
a partir da década de noventa, vários grupos, em
distintos pontos do País, consolidaram-se e vêm
apresentando uma atuação marcante na luta
pela visibilidade e cidadania das lésbicas.
Travestis
Falando em sexualidade humana, conhecemos
dois gêneros (o masculino e o feminino) e
os travestis são aquelas pessoas que incorporam
esses dois gêneros, sendo o homem/mulher ou
o macho/fêmea. As travestis são também pessoas com características que propiciam maior
visibilidade perante a sociedade, sendo portanto,
mais facilmente discriminadas.
41
A travesti é um homem,
no sentido fisiológico,
mas se relaciona com o mundo
como mulher:
seu corpo é moldado
com formas femininas,
socialmente exerce o papel
da mulher e usa seu órgão
genital em suas relações sexuais,
podendo inclusive
exercer papel sexual ativo.
A travesti é um homem, no sentido fisiológico,
mas se relaciona com o mundo como mulher:
seu corpo é moldado com formas femininas,
socialmente exerce o papel da mulher e usa seu
órgão genital em suas relações sexuais, podendo
inclusive exercer papel sexual ativo.
Com a travesti, o sexo erótico ultrapassa as
barreiras do sexo biológico, na busca não apenas
do prazer, mas também de uma identidade específica, ousando derrubar alguns limites sociais
com a transformação de seu corpo. No entanto,
geralmente não definimos se travesti é um
homem ou uma mulher, ela é uma travesti,
o que a faz única no contexto social.
Na relação das patologias psiquiátricas ainda
consta o termo travestismo, lembrando que
o sufixo “ismo” significa disfunção ou desvio.
O travestismo é, portanto, considerado pela
medicina como um desvio de conduta. Por não
considerar essa patologia imposta, as travestis
usam o termo travestilidade como forma de
suprimir o peso implícito de doença, vinculado
à essa expressão da homossexualidade.
Expressões das homossexualidades
Travestis
Mas, para a medicina, ser travesti ainda é
sinônimo de ser portador de “transtorno de
preferência sexual”, sendo este transtorno descrito no Código Internacional de Doenças (CID)
por duas classificações patológicas1: “travestismo
fetichista” 2 e “transtornos múltiplos da preferência
sexual” 3. Embora tais classificações internacionais
não sejam seguidas ao pé da letra pela psicologia clínica - tendo sua função voltada para a instrumentalização e padronização da linguagem
de relatórios administrativos- são formas de
definição das travestis que refletem conceitos e
padrões usados pela sociedade, fazendo com que
elas continuem tendo sua condição associada à
anomalia e reforçando, ainda mais, o preconceito
social.
Para as travestis também existem várias formas
de expressão, contemplando no seu universo tipos
diferentes de identificação. Porém, a principal
característica que permeia esse universo é abrigar
num corpo masculino, espírito e mente femininos
e possuir a genitália masculina, que não lhe traz
nenhum constrangimento.
1
As travestis vivem a bissexualidade dentro da
homossexualidade, ou seja, são ativas e passivas
(penetram e são penetradas), incorporando
em um mesmo corpo físico e mental, o masculino e o feminino, forma dúbia que é expressa
na sua própria aparência. A grande maioria
das travestis feminilizam seus corpos graças à
ingestão de hormônios ou aplicações de silicone
(ser bombada) e se apresentam cotidianamente
como mulheres, incorporando vestuário, nomes
e trejeitos da ordem do feminino. Nesse universo,
no entanto, também existem as transformistas,
homens que se travestem (ou se montam) para
fazer shows ou performances artísticas, mas
que no cotidiano se vestem e se portam como
homens, mantendo em segredo essa vida dupla.
As transformistas podem, eventualmente, optar
por se travestir visando ao exercício da prostituição (batalhar ou fazer pista). As drag-queens
são aquelas que se travestem numa condição
exagerada e/ou humorística da imagem feminina
-seja para realizar shows, seja para se realizar
e divertir as pessoas- a partir de formas satirizadas
de representar a mulher. E, por fim, as cross-dresser
que são homens sem orientação homossexual
que se vestem de mulher para realizar fantasias
e desejos sexuais com suas parceiras.
CID-10 - F65.1 e F65.6
2
“Vestir roupas do sexo oposto, principalmente com o objetivo de obter excitação sexual e de criar a aparência de pessoa do sexo oposto.
O travestismo fetichista se distingue do travestismo transexual pela sua associação clara com uma excitação sexual e pela necessidade de se remover
as roupas uma vez que o orgasmo ocorra e haja declínio da excitação sexual. Pode ocorrer como fase preliminar no desenvolvimento do transexualismo”.
3
“Por vezes, uma pessoa apresenta mais de uma anomalia de preferência sexual sem que nenhuma delas esteja em primeiro plano.
A associação mais freqüente agrupa o fetichismo, o travestismo e do sadomasoquismo” .
43
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
44
Capitulo 3
Muito cedo, grande parte das travestis se distancia
da família devido à rejeição familiar existente
em relação a sua orientação sexual. Com poucas
exceções, a família é ainda mais intolerante com
essa forma de expressão da homossexualidade,
dificultando ou impedindo a convivência familiar
para as travestis. A expulsão de casa, atitude bastante comum no histórico pessoal das travestis,
leva-as a buscar na prostituição de rua seu meio
de subsistência. Por vezes, com o passar do tempo,
a atitude intransigente da família é substituída
por certo grau de aceitação, advindo principalmente
pela ajuda financeira que grande parte das travestis fornece aos seus parentes mais próximos.
Mesmo com isso, é comum a travesti viver distante
do ambiente familiar, sendo a mãe seu único
contato com a família. Resultados de pesquisa
realizada junto a 165 travestis de Fortaleza4,
mostram que 66% delas têm a pratica do sexo
comercial como sua exclusiva fonte de renda,
90% fazem programas (mesmo que eventualmente) e 40% são arrimo de família, mantendo
com seu trabalho seus familiares.
Por outro lado, as travestis, de uma forma geral,
possuem baixa escolaridade, visto que o processo
de hormonização e/ou aplicação de silicone no
corpo para torná-lo mais feminino, se inicia ainda
na adolescência, sendo difícil suportar, portanto,
as chacotas ou violências que este processo gera
no ambiente escolar. Esse fato é determinante
para o abandono dos estudos muito cedo, ocasionando baixa ou nenhuma qualificação educacional e profissional das travetis.
Para o trabalho de educação em saúde sexual e
prevenção das DST/HIV/aids é preciso conhecer
outra particularidade do universo das travestis:
exercendo ou não a prostituição, elas utilizam
linguagem própria que acrescenta ao português
várias palavras e/ou expressões do candomblé,
do nagô e do iorubá, criando assim um “dialeto”
próprio que usam no seu cotidiano5. É comum,
por exemplo, a utilização de frase como “não
aquedar no ilê ocó que não cata” ou “aquendar
o baco só com ochó de neca”, o que traduzindo
quer dizer “não levar para casa um homem que
não conhece” e “transar só com camisinha”.
Para além dessa característica, observa-se que
o período noturno facilita o acesso ao grupo, que
se concentra geralmente em pontos de prostituição ou bares.
4
Grupo de Resistência Asa Branca., 2001
5
Maiores informações sobre essa linguagem podem ser encontradas na cartilha “Diálogo das Bonecas”, do Grupo Astral do Rio de Janeiro, 1998.
Expressões das homossexualidades
Travestis
“Na calada da noite voam as borboletas e as
sereias mostram suas curvas, como fruto proibido e de fácil acesso erótico” 6. Uma vez que a
maioria das travestis exerce a prostituição como
profissão, a noite é o espaço para contato com
elas, sendo que para o trabalho de prevenção das
DST/HIV/aids se deve observar basicamente as
mesmas características que encontramos junto
às profissionais do sexo (dificuldade na adesão
às atividades feitas durante o dia, pouca disponibilidade de tempo e/ou atenção para ações que
acontecem durante o período de batalha, baixa
auto-estima, pouca aceitabilidade para materiais
informativos com textos longos e sem ilustração,
pouco ou nenhum acesso aos serviços
de saúde etc).
Estando grande parte desse segmento populacional inserido na prostituição de rua, sua
vulnerabilidade em relação à infecção pelo
HIV/aids é bastante expressiva, devido à possibilidade de práticas sexuais de maior risco - como
por exemplo, o sexo anal desprotegido mediante
acréscimo no valor do programa - e também
às constantes aplicações de silicone - feitas em
grande parte sem seguir princípios básicos de
higiene e biossegurança.
6
DUTRA, Janaína., 2000.
Assim, o trabalho de promoção à saúde e prevenção das DST/HIV/aids deve pautar-se não
só na promoção do uso do preservativo em todas
as relações sexuais, mas também na redução de
danos à saúde, devido à utilização de hormônios
e silicone. Além disso, qualquer intervenção
comportamental no campo da prevenção das
DST/HIV/aids junto às travestis, deve levar
em consideração que apenas a distribuição de
preservativos e o repasse de informação não
determinam a mudança de comportamento
ou a redução dos índices de infecção. É fundamental que o trabalho com este grupo populacional priorize também – e muito mais que em
outros grupos – ações paralelas voltadas para
a melhoria da qualidade de vida, para o aperfeiçoamento e/ou formação profissional, para
maior acesso à educação e, para a promoção
dos direitos humanos.
A parcela de travestis que não vive da prostituição
está ligada às profissões da área da estética
feminina (como cabeleireira, maquiadora ou
manicure) ou, são costureiras e empregadas
domésticas. Há também, atualmente, um conjunto
de travestis que desempenha funções sociais,
a partir do vínculo com grupos homossexuais
e/ou associações de classe.
45
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
46
Capitulo 3
Nesse sentido, a trajetória da epidemia pelo
HIV/aids viabilizou a inserção e a participação
efetiva das travestis nas ações de prevenção
e/ou assistência desenvolvidas pelas organizações
não-governamentais. Assim, durante os últimos
dez anos, percebe-se uma maior organização das
travestis em movimento social, que conta, em
2001, com doze associações não-governamentais
específicas em todo o País. Essas associações
de classe permitem o desenvolvimento de ações
no campo da promoção à saúde e à prevenção
das DST/aids, além da ampliação de sua atuação
com atividades voltadas para a garantia de renda
alternativa (com cursos de corte e costura,
artesanato, nutrição e informática) e acesso
ao ensino regular. Dessa forma, o exercício da
cidadania e a luta contra o preconceito e a discriminação são duas questões básicas que devem ser
vinculadas ao trabalho de educação em saúde
sexual e prevenção das DST/HIV/aids junto às
travestis. Nesse sentido, é preciso sempre considerar que, a esse grupo específico, se vincula uma
maior carga de discriminação por parte da
sociedade, dos profissionais de saúde e do próprio
meio homossexual, bem como maior índice
de violência por parte de policiais e de clientes.
7
Boletim do Quiimbanda-Dudu, do Grupo Gay da Bahia, 2001 – número 3.
Historicamente duas travestis se destacaram
pelo pioneirismo e pela ousadia de suas atitudes.
Nesse sentido, a primeira a ser lembrada é
Madame Satã (João Francisco dos Santos),
nascida em 1900. Cozinheira, garçonete e estrela
do teatro rebolado nos anos 30, Madame Satã
foi figura contraditória na sociedade da época,
sendo pioneira na determinação de ir contra os
padrões heterossexistas e na defesa do orgulho
de ser uma travesti. Embora tenha enveredado
por caminhos da marginalidade e da violência,
Madame Satã certamente foi percursora da
afirmação do direito à androginia7. A segunda
travesti que não pode deixar de referendada
é Brenda Lee (Cícero Caetano) assassinada
em 1996, por seu companheiro, em função de
disputa por seus recursos financeiros. Brenda
Lee foi a primeira travesti a disponibilizar
espaço de convivência e moradia para as travestis
infectadas pelo HIV e/ou doentes de aids, em São
Paulo. Criou, portanto, a primeira casa de apoio
que até hoje abriga pessoas excluídas do meio
social e familiar, e que vivem com HIV/aids.
Por fim, não podemos deixar de registrar nesse
Guia, uma referência ao Grupo Astral do Rio de
Janeiro, e à Geovana Baby, pelo importante papel
social e atuação política na construção e consolidação do movimento brasileiro das travestis.
Expressões das homossexualidades
Travestis
Essa organização política e social das travestis,
embora seja fato recente como trajetória de
movimento social organizado, atualmente busca
abrir espaços de atuação e garantir maior respeito
à cidadania das travestis. Considerando as
dificuldades existentes no campo da profissionalização e da educação, essa organização social
é um processo mais difícil e lento, dependendo
também de uma maior qualificação, amadurecimento e mobilização das travestis. Em que pese
esse fato, as travestis já possuem associações
de classe, definindo assim um movimento social
específico já que não pertencem e não desejam
ser tuteladas por outros existentes, como o de
mulheres, o das profissionais do sexo e o movimento homossexual. A constituição e crescente
atuação desse movimento social das travestis
deve ser, portanto, uma estratégia reforçada
e fortalecida pelo trabalho de prevenção das
DST/HIV/aids, visando maior sensibilização
e adesão às práticas preventivas e ao cuidado
com a saúde.
8
Transexuais
Sabemos que o sufixo “ismo” indica doença ou
patologia na área médica. No caso do transexualismo, ele é classificado como uma patologia que
em como denominação médico-científica o termo
“disforia de gênero”. A palavra disforia pode ser
traduzida como um “desconforto”, nesse caso
especifico, um desconforto de gênero. Na lista
do Código Internacional de Doenças - CID,
a disforia de gênero aparece sob número F.64.0,
da resolução de 1993. O indivíduo transexual tem
como característica principal o desejo constante
e intenso de modificar seu sexo genital. Entendese que uma pessoa transexual 8 possui a genitália
de determinado sexo (masculino ou feminino),
porém, sua psique é oposta a ele. Assim, o transexual homem para mulher é aquele que nasceu
com a genitália masculina (pênis), mas sua psique
é feminina (se mulher para homem, temos uma
pessoa que nasceu com a genitália feminina
(vagina), mas sua psique é masculina, determinando que ela se perceba interna e externamente
como um homem).
Para facilitar o entendimento do tema e a própria leitura, ao longo desse texto iremos utilizar os termos: a/uma transexual (transexual homem para
mulher), o/um transexual (mulher para homem) e os transexuais (transexual homem para mulher ou mulher para homem).
47
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
48
Capitulo 3
As transexuais vivem grande parte de suas vidas
(quando não toda ela) numa grande angústia
interna, uma vez que têm a sensação de possuírem uma alma feminina ou masculina, encarcerada num corpo físico oposto a tal realidade
interna. Isso se traduz também numa angústia
extrema, não compreendida cultural e socialmente, sendo muitas vezes, até mesmo
banalizada.
É importante enfatizar que a transexualidade
ou transexualismo, diferentemente da orientação
sexual, é uma patologia que necessita ser tratada
como qualquer outra. Esse tratamento deverá
ser terapêutico, chegando ao cirúrgico na maioria
dos casos, quando existir essa possibilidade
no contexto local.
Para o diagnóstico de transexualidade, o profissional de saúde tem de, no mínimo, observar
as seguintes características durante o exame
do/a paciente:
(I) desconforto com o sexo anatômico natural;
(II) desejo expresso de eliminar os genitais,
perdendo assim as características primárias
e secundárias do próprio sexo e ganhar aquelas
do sexo oposto;
(III) permanência desse distúrbio de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos; e,
(IV) ausência de outros distúrbios mentais.
No Brasil, a cirurgia de mudança de sexo foi aprovada em caráter de estudo científico em 1997, conforme Resolução n.º 1.482/97 do Conselho Federal
de Medicina (CFM), deixando de ser considerada
como crime, já que, de acordo com os procedimentos
cirúrgicos brasileiros, não existe a mutilação do
pênis, mas sim a construção de uma neovagina.
Conforme essa resolução legal, as cirurgias só
podem ser praticadas em hospitais universitários
ou hospitais públicos adequados à pesquisa,
devendo obedecer normas rígidas estabelecidas
pelo CFM. Dentre elas, a seleção dos pacientes
para a cirurgia de redesignação sexual deverá
ser precedida de avaliação por uma equipe multidisciplinar, constituída por psiquiatra, endocrinologista, cirurgião, psicólogo e assistente social.
Após um acompanhamento desse conjunto
de profissionais por dois anos, é obrigatório ainda
definir o diagnóstico clínico da transexualidade,
possuir uma avaliação psicológica, garantir
a maioridade do/a paciente (mais de 21 anos)
e ter a comprovação de ausência de características físicas inadequadas para a cirurgia.
No tratamento cirúrgico e terapêutico para
as pessoas transexuais é imprescindível ter muita
atenção quanto às questões de ordem ética.
Atualmente, existem hospitais cujos procedimentos
demonstram que o processo cirúrgico visa, quase
que exclusivamente, ao lucro e à popularidade,
e não aos benefícios que a cirurgia trará para
o/a paciente. Assim, antes de se iniciar qualquer
tratamento, é importante buscar informações
seguras que certifiquem a idoneidade do hospital
escolhido, comprovando também que a instituição
segue as regras estabelecidas pelo CFM e que
o acompanhamento pós-operatório é garantido,
caso sejam necessários retoques e/ou acompanhamento psicológicos após à cirurgia. No Brasil,
embora exista um número significativo de
transexuais, a visibilidade do grupo populacional
ainda é muito pequena.
O indivíduo transexual
tem como
característica principal
o desejo constante
e intenso de modificar
seu sexo genital.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
50
Capitulo 3
Muitos transexuais vivem seu cotidiano com
a imagem do seu sexo genital (como uma mulher
ou como um homem). Se as características físicas
de uma transexual, por exemplo, forem femininas,
elas facilmente viverão em sociedade como uma
mulher sem serem notadas como transexuais.
No entanto, há situações e características da natureza humana que denunciam aspectos masculinos
em uma transexual, como por exemplo o pomo
de Adão, os pêlos faciais e a tonalidade da voz.
Neste caso, elas podem ser confundidas e identificadas socialmente com as travestis, já que
é essa a referência mais comum das pessoas.
No caso de um transexual, os aspectos denunciadores de sua condição podem ser os seios (quase
sempre escondidos por baixo de roupas largas)
ou ainda o tom de voz feminina.Na infância,
os transexuais são vistos pela família e pela
sociedade como um menino afeminado (“mariquinha”) ou como uma menina com jeito de
moleque (“mulher- macho”). Ambas as situações
são carregadas de atitudes e valores preconceituosos e discriminatórios. No entanto, a adolescência é a fase da vida mais dolorosa para os
transexuais, pois nesse período se percebem
como pertencentes ao outro gênero.
9
Além disso, é também nessa fase que o desenvolvimento de hormônios é mais ativo, fazendo com
que as características físicas masculinas ou
femininas surjam de forma mais evidente. Essa
transformação natural do ser humano, nos transexuais fortalece o sentimento de inadequação ao
mundo social, tornando-os ainda mais revoltados
e insatisfeitos, já que não podem associar o corpo
que possuem sua alma e psique.
A diferença entre a travesti e a transexual,
é identificada pelo fato de a travesti não possuir
a identidade sexual feminina, apesar de poder
desempenhar papel sexual9 feminino. A travesti
se sente confortável com seu sexo genital e não
expressando o desejo de alterá-lo. Por outro lado,
a transexual possui a identidade sexual feminina,
assim como a identidade de gênero, e portanto,
na maioria dos casos, seu maior desejo é realizar
a cirurgia de feminilização da genitália (neocolpovulvoplastia), garantindo para si uma vida
mais adequada, com maior conforto e felicidade.
Voltamos a enfatizar que o papel sexual feminino não significa que a pessoa seja “ativa ou passiva” no ato sexual. O papel sexual está relacionado à forma sexual
pela qual ela se expressa, no caso feminina. O que também não pode ser confundido com papel social, pois a travesti é vista socialmente como tal, independente
de ter um estereotipo feminino. Vale a pena citar a definição de papel sexual da Dra. Marlene Inácio (psicóloga clínica, do Hospital das Clínicas de São Paulo): “ ...
ao papel sexual pertence tudo aquilo que o indivíduo faz para indicar aos outros e a si próprio em que grau é um homem ou uma mulher, o que inclui, mas não
se limita, a excitação e resposta sexuais. O papel sexual é a expressão pública da identidade sexual.” . Cabe também fornecer nessa publicação o contato da Dra.
Marlene Inácio, do Departamento de Endocrinologia de Desenvolvimento do HCSP: +11 3289.1491 ou +11 3069.6383.
Expressões das homossexualidades
Transexuais
É importante lembrar que uma transexual não
está necessariamente associada aos estereótipos
dos modelos fotográficos e figuras públicas
(por exemplo, Roberta Close). Existem transexuais
em qualquer atividade profissional, independente
da grande dificuldade que encontram para
se inserir no mercado de trabalho. Essa dificuldade está principalmente relacionada ao fato de
seus documentos legais identificarem sempre o
nome de nascimento (feminino ou masculino),
que geralmente não é compatível com o modo
pelo qual se apresentam fisicamente (como
uma mulher ou homem). Esse tipo de conflito é
comum para todas as pessoas transexuais, assim
como para as travestis.
A vida sexual dos transexuais não difere daquela
vivenciada pelos demais seres humanos: eles
sentem desejo e têm suas próprias fantasias
sexuais. Entretanto, pode-se dizer que a vida
sexual dos transexuais tem certas limitações
devido às peculiaridades e complexidades de sua
condição.
Podemos observar, entre outras coisas, que os
transexuais têm necessidade de parceiros/as
com elevado grau de sensibilidade por viverem
uma grande angústia e desconforto em relação
ao seu sexo genital, os transexuais dificilmente
fazem uso dessa genitália nas relações sexuais,
não permitindo também que seus órgãos genitais
sejam tocados/acariciados ou mesmo que sejam
vistos despidos.
Lembramos novamente que a transexualidade
não está inscrita no campo da orientação sexual e,
deste modo, a orientação sexual dos transexuais
dependerá exclusivamente de sua história de vida.
Na maioria dos casos, os transexuais têm como
orientação sexual a heterossexualidade, ou seja,
uma transexual deseja um parceiro heterossexual.
No entanto, não devemos excluir a possibilidade
da existência de uma transexual bissexual ou
ainda homossexual, já que sua orientação sexual
independe de sua patologia (a transexualidade).
Porém, é preciso enfatizar que é pouco comum
ver uma transexual já readequada (possuindo
genitália feminina) exercer a prática homossexual
(uma transexual com uma outra mulher ou um
transexual com outro homem).
51
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
52
Capitulo 3
De que forma trabalhar a prevenção às DST/aids
entre esse grupo populacional tão específico?
Não é tão complicado como em princípio pensamos.
Como já vimos anteriormente, os transexuais
podem ser encontrados em qualquer contexto
social. No entanto, ao contrário do que se pensa,
os pontos de concentração gay não são, necessariamente, os locais ideais para encontrá-los.
Poderemos localiza-los mais facilmente em hospitais fazendo tratamentos, inseridos em alguma
instituição e/ou movimento social ou ainda
associados de alguma forma às travestis. Independentemente do local onde se possa encontrar
os transexuais, é importante lembrar que estamos
diante (na maioria dos casos) de pessoas
heterossexuais. Outro fator fundamental para
o sucesso na abordagem do transexual é jamais
usar o artigo/pronome contrários à sua forma
de expressão. Ou seja, a transexual não deve ser
nunca identificada por “ele” ou “o”. Da mesma,
o transexual não deve ser tratado por “ela” ou “a”.
Considerando a importância dessa primeira
abordagem para o sucesso de qualquer ação preventiva, é necessário respeitar e observar a forma
pela qual a pessoa se apresenta, o que indicará
como gosta de ser tratada.
É importante também procurar saber se a pessoa
abordada tem parceiro/a fixo ou não, visando direcionar melhor o trabalho de prevenção. Muitos
transe-xuais são casados e se relacionam (sexual
e afetivamente) somente com seus companheiros/as.
Isso não significa, porém, que não existam transexuais com mais de um parceiro/a. Por outro
lado, o exercício da prostituição, por parte dos
transexuais, é muito pouco freqüente, devido
às características já apresentadas.
A relação sexual entre a transexual e o parceiro
possuiu muitas variações. Há aquelas transexuais
que gostam e aceitam o sexo anal, o fazendo com
prazer e há outras para quem esse tipo de prática
sexual é apenas uma forma de satis-fazer os desejos
de seus parceiros, não sendo identificada como
uma fonte de prazer e conforto para si própria.
As transexuais já readequadas (operadas) preferem a relação vaginal, já que essa adequação
e esse tipo de relação sexual são desejos sempre
presentes em suas vidas e se tornaram, enfim,
uma realidade. A proteção contra as DST/aids
para os transexuais estará sempre centrada
na utilização do preservativo masculino por
seu parceiro e por si próprio (em se tratando
do transexual já readequado). Ainda não existem
estudos sobre a utilização e eficácia do preservativo feminino para neovaginas.
Expressões das homossexualidades
Transexuais
Como já vimos, o universo dos transexuais
é bastante complexo e, sendo assim, nenhuma
outra abordagem terá efeito mais positivo do que
aquela feita por outros transexuais. No entanto,
deve-se observar o gênero dessa pessoa transexual
para definir o trabalho de pares. Ou seja, o trabalho
direcionado para as transexuais deve ser realizado
por outra transexual e, aquele dirigido ao transexual feito por outro transexual, de forma
a preservar e respeitar as diferenças e peculiaridades de cada gênero e/ou sexo. Embora seja
aconselhável que o trabalho de prevenção das
DST/HIV/aids seja feito por pares, não se deve
descartar a possibilidade das intervenções serem
feitas também por outras pessoas: no caso de
uma transexual que já passou pela cirurgia da
feminilização da genitália, o trabalho de prevenção pode ser feito por outras mulheres e,
para o transexual que já tenha passado pela redesignação da genitália, a intervenção poderá ser
realizada por homens. De qualquer forma, o trabalho de prevenção das DST/aids junto aos transexuais deve ser centrado na promoção da saúde
e da prática do sexo mais seguro garantindo,
em primeiro lugar, espaço para ouvir o relato
da sua experiência de vida e/ou prática sexual.
O uso de drogas entre a população de transexuais
não é uma variável a ser considerada no trabalho
de prevenção das DST/aids, já que se observa
um grau bastante pequeno de transexuais que
utilizam drogas lícitas ou ilícitas, injetáveis
ou não. É claro que isso não exclui a possibilidade
de existir transexuais usuários/as de drogas,
no entanto, esse não é um aspecto relevante para
o trabalho de prevenção das DST/HIV/aids junto
a esse grupo populacional.
No Brasil existem várias organizações
não-governamentais com trabalhos voltados
para as minorias sexuais e a livre orientação
sexual. Muitos transexuais estão inseridos na
militância ou exercem seu ativismo de forma
isolada, podendo também estar vinculadas
às ONG/aids ou aos grupos homossexuais,
já que ainda são poucas as organizações específicas de/para transexuais. Porém, qualquer
instituição/ equipe que trabalhe com minorias
sexuais é capaz de realizar um trabalho de prevenção das DST/HIV/aids junto aos/às
transexuais.
53
Metodologias
de intervenção
Metodologias de intervenção
57
Metodologias de intervenção
Como sabemos, o HIV é transmitido pelo do sexo
desprotegido, além de outras formas de transmissão.
Ao longo da epidemia no Brasil, até os dias de hoje,
cerca de 70% dos casos de aids foram decorrentes
da infecção por relações sexuais sem preservativo.
Sendo assim, nos deparamos com algumas perguntas. O que faz, por exemplo, com que alguém
use ou não camisinha? Experiências comunitárias
e diferentes estudos realizados sobre a prevenção
às DST/HIV/aids nos mostram algumas evidências. A primeira delas é que não basta apenas
dispor da camisinha –embora isso seja fundamental– mas, na prevenção, e no uso sistemático
do preservativo, outros fatores têm influência
direta, tais como a pessoa estar bem, com
auto-estima elevada, ter seus direitos de cidadania respeitados, estar bem consigo mesma,
na família, no trabalho, no amor e na comunidade.
É o que hoje costuma se chamar de
“empoderamento”.
Como podemos intervir sobre o comportamento
de uma pessoa? Para que serve a intervenção
comportamental? São as primeiras questões
que surgem diante desse assunto. Podemos dizer
que a intervenção comportamental é sempre
um conjunto de possibilidades para sugerir
e apontar alternativas de comportamento que,
no caso da prevenção das DST/HIV/aids, visa
a diminuir ou a eliminar os riscos de se infectar
pelo HIV/aids nas relações sexuais. As ações de
intervenção comportamental devem ser pautadas
no respeito à autonomia das pessoas diante de sua
orientação sexual, de suas práticas sexuais,
e de respeito à expressão plena de seu afeto
e desejo. Na intervenção comportamental não
podem ser inseridas posturas de julgamento
moral, de valores ou religioso, que enveredem
pela intolerância à homossexualidade, ao
sexo comercial ou a qualquer outro tipo de
comportamento. Muito menos é possível se
vincular à intervenção comportamental intenções de “cura” da homossexualidade ou de
condenação da prática do sexo comercial.
A intervenção comportamental
é sempre
um conjunto
de possibilidades
para sugerir e apontar
alternativas de
comportamento que,
no caso da prevenção
das DST/HIV/aids,
visa a diminuir
ou a eliminar os riscos
de se infectar pelo HIV/
aids nas relações sexuais.
A prioridade nas intervenções para educação
sexual e prevenção das DST/HIV/aids deve estar
centrada, dentre outras coisas, no reforço
da necessidade de proteção e de negociação
do uso da camisinha. Com os usuários de drogas,
a perspectiva de redução de danos à saúde deve
se sobrepor às tentativas, na maioria das vezes
frustradas, de incentivo ao abandono completo
do uso de drogas, embora tal alternativa possa
ser oferecida.
Cidadania e Prevenção
Todos os dias, alguém com práticas homossexuais
sofre alguma discriminação, seja com piadas
ou situações vexaminosas em locais públicos,
seja por ter uma oportunidade de trabalho negada
pelo fato de ser homossexual. Mais graves ainda
são os índices de agressões físicas, espancamentos
e assassinatos, que geralmente são acompanhados
de negligência e impunidade policial e judicial.
Metodologias de intervenção
Cidadania e Prevenção
Esse quadro de discriminação tem um forte
efeito negativo sobre o empoderamento do
homossexual, agindo da mesma forma negativa
nos esforços em torno da prevenção das DST/aids.
Isso determina a importância da associação entre
a intervenção comportamental para pessoas
com práticas homossexuais, e a luta social
pelos direitos humanos e igualdade, perante
a lei, de gays, lésbicas, travestis, transexuais
e bissexuais.
Quando o respeito às diferenças permeia
o objetivo central da intervenção, é igualmente
importante também considerar a relação entre
as diversas vivências da homossexualidade
e o universo local ou regional, incluindo aí
as diferenças existentes entre ser homossexual
em áreas urbanas –com as variantes entre
as metrópoles, as cidades pequenas e as cidades
médias- e a vivência da homossexualidade
nas áreas rurais. No caso das intervenções
junto aos gays, aos outros homens com práticas
homossexuais, às travestis, às transexuais e às
lésbicas, é muito importante perceber e agir
de acordo com a pluralidade das vivências
da homossexualidade, de seus costumes, códigos
de comunicação, valores e relações sociais.
À medida que a intervenção atinge um universo
heterogêneo, refletindo as questões já pontuadas
sobre gênero, identidade sexual, raça, origem
geográfica e condição socioeconômica-cultural,
atuará da mesma forma diante de uma parcela
significativa de homossexuais ou bissexuais
portadores do HIV/aids. Considerando esse fato,
é importante o repasse de informações corretas
e atualizadas sobre a prevenção primária (ou seja,
a prevenção para as pessoas que não estão
infectadas com o HIV/aids), bem como sobre
a prevenção secundária (voltada para as pessoas
portadoras do HIV ou aids).
Como sabemos, o segmento masculino da
população homossexual e bissexual ainda é
muito atingido pela infecção do HIV/aids.
Assim, é importante pensar a soropositividade
como uma realidade vivenciada por muitas
pessoas, possibilitando conduzir uma abordagem
que vise desmitificar a aids, reforçando os cuidados
com a saúde e as formas para evitar o adoecimento.
Nesse sentido, aproveitar o relato e experiências
das pessoas que vivem com HIV/aids é uma
excelente estratégia para guiar as ações
de prevenção.
59
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
60
Capitulo 4
É imprescindível, porém, garantir o compromisso ético quanto ao sigilo da soropositividade
-amparado pelo artigo 5º da Constituição Federal–
já que somente a pessoa portadora de HIV/aids
tem o direito de revelar ou não sua condição
sorológica.
A solidariedade é uma palavra que já foi bastante
banalizada após duas décadas de epidemia, porém,
nunca é tarde para resgatarmos seu valor.
Assim, a intervenção comportamental também
tem missão importante nessa (re)construção
da solidariedade, seja visando as ações de
prevenção, seja a reforçando no cotidiano
das pessoas.
Conhecendo e atuando na comunidade
Como já vimos, um dos primeiros passos para
o desenvolvimento do trabalho de educação
sexual e prevenção às DST/HIV/aids junto
aos homossexuais associa-se à necessidade
de conhecer a comunidade a ser trabalhada.
Por menor que seja a cidade, sempre existe
uma praça, um bar ou mesmo um salão de beleza
(cabeleireiro), que são pontos de encontro
de homossexuais.
Desta forma, buscar informações sobre os locais
e horários de maior freqüência dos diferentes
grupos (gays, lésbicas, travestis, garotos de
programa, etc), sobre as características do local
(qual o grupo que o visita com maior freqüência)
e sobre as áreas de prostituição, é a base inicial
para qualquer tipo de ação dessa natureza.
A coleta de tais informações pode viabilizar
a produção de um roteiro ou “guia homossexual”
do bairro, cidade ou região em que o trabalho
acontecerá, identificando o tipo de local (bares,
boates, praças, cinemas, banheiros públicos, saunas)
e fornecendo endereços, horários de freqüência,
tipos de homossexuais que costumam estar
em cada um dos locais identificados.
Após a realização de visitas preliminares a esse
“roteiro homossexual” e com a realização de contatos iniciais durante tais visitas, é importante
avançar na abordagem do público-alvo, procurando conhecer mais profundamente alguém
e estabelecendo laços de confiança e respeito
para a troca de experiências.
Metodologias de intervenão
Conhecendo e atuando na comunidade
Uma boa estratégia é tentar identificar na
comunidade homossexual visitada, uma pessoa
com características de liderança (que seja mais
extrovertida, mais informada sobre as novidades
da “cena gay local”, mais conhecida no meio)
que possa ajudar na comunicação com as demais
pessoas a serem abrangidas na intervenção.
A partir desse passo, pode-se ir ampliando
as relações/abordagens e conhecendo melhor
o restante do grupo.
Deve-se tentar fazer uma reunião informal em
local apropriado para reunir as pessoas-alvo das
ações (pode ser até mesmo numa praça ou num
bar). Nesse momento o trabalho a ser feito deve
ser apresentado e o grupo convidado a integrá-lo,
enfatizando-se a importância da prevenção das
DST/HIV/aids para o cotidiano da comunidade.
Esse bate-papo com algumas das pessoas contatadas previamente pode ajudar muito para
o início efetivo das atividades de intervenção.
Feitos esses contatos preliminares, se as intervenções estiverem vinculadas a um cronograma
de médio e longo prazo para a realização das
atividades, deve-se fazer um cadastramento
da população-alvo.
O cadastramento nada mais é do que a produção
e preenchimento de uma pequena ficha de
identificação, onde constam: nome da pessoa,
nome pelo qual quer ser chamada (especialmente
no caso das travestis e transexuais), idade,
endereço, telefone e orientação/identidade sexual
(gay, travesti, transexual, lésbica ou bissexual)
da pessoa. Com esses dados, é possível definir
alguns referenciais da comunidade a ser trabalhada, como a faixa etária e a distribuição por
sub-grupos homossexuais. Para se conhecer
mais ainda a comunidade, podemos também
incluir outros elementos no instrumento do
cadastramento, como por exemplo, grau de
escolaridade, ocupação, se a pessoa tem documentos e quais. Tais informações podem delinear
o perfil social, educacional, profissional e cidadão
da comunidade. Nesse ponto, é importante ressaltar
que o fato da pessoa possuir a documentação
básica de todo cidadão (carteira de identidade,
CPF, carteira de trabalho, etc) é um importante
elemento de conquista e exercício da cidadania.
61
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
62
Capitulo 4
Paralelamente a esse cadastramento, é funda-mental
estabelecer contatos com os grupos homossexuais
existentes na cidade onde a intervenção será realizada. As organizações não-governamentais são
parte expressiva da comunidade homossexual,
envolvidas diretamente na luta pela garantia
da cidadania e da prevenção das DST/HIV/aids.
Caso não existam grupos locais que defendam
a livre expressão sexual, incentivar os homossexuais a se organizarem e constituírem um grupo
que lute por seus direitos (incluindo a saúde)
é algo que deve fazer parte das preocupações
do trabalho a ser desenvolvido.
Da mesma forma, conhecer outras instituições
que trabalham com DST/aids, governamentais
ou não, mesmo que não sejam efetivamente
grupos homossexuais, também é importante
para inserir a intervenção programada no
contexto das ações de prevenção das DST/aids
dirigidas à população da cidade. As unidades
de saúde que prestam atendimento ambulatorial
e hospitalar em DST/aids e os (CTA) Centros
de Testagem e Aconselhamento, devem ser previamente identificados e visitados. Em municípios
onde não existam esses tipos de atendimento,
deve-se identificá-los em localidades próximas.
As visitas aos locais de freqüência homossexual
(aqueles listados no guia) deverão ocorrer
nos horários de maior presença do segmento
que se deseja trabalhar, devendo também ser
garantida a regularidade das visitas, nos dias/
horários marcados e divulgados junto ao grupo
atendido. Da mesma forma, todas as outras
atividades (oficinas, reuniões, debates, etc)
também devem ser previamente informadas,
discutidas e avaliadas com o grupo e/ou lideranças
alvo das ações de prevenção. A distribuição gratuita
de preservativos masculinos deve sempre estar
acompanhada de material informativo-educativo
especifico sobre seu uso correto, sobre a infecção
das DST/HIV/aids e sobre direitos humanos.
Orientações sobre o atendimento nas unidades
especializadas em DST/aids é outro elemento
fundamental na intervenção comportamental.
Dependendo das políticas públicas em DST/aids
locais, a ação dirigida aos homossexuais poderá
ser pioneira, enquanto trabalho de prevenção
na cidade ou região. Pode-se então, partir dessa
grave realidade (não existir ação governamental
para o combate à epidemia do HIV/aids) para
iniciar diálogo com os poderes públicos locais
-especialmente a Secretaria de Saúde- visando
garantir a implantação de tais ações, ampliando
as intervenções já realizadas e passando a abranger
também outros segmentos da população.
Metodologias de intervenção
Conhecendo e atuando na comunidade
O conhecimento sobre as DST, especialmente
a aids, as formas de se prevenir, os tratamentos,
as experiências de prevenção bem-sucedidas,
enfim, todas as questões que envolvem a epidemia do HIV requerem uma constante atualização
de conhecimento. As Secretarias de Saúde estaduais
e municipais, as Coordenações de DST/Aids,
as divisões de epidemiologia, a Coordenação
Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde
e as ONG, são fontes importantes para se manter
o conhecimento sobre tais assuntos atualizado.
Mas, sem dúvida alguma, uma das principais
fontes de atualização de conhecimento é a própria comunidade. Além de informações corretas
e atualizadas sobre a epidemia, o trabalho de
educação em saúde sexual e prevenção das DST/
aids deve interagir no cotidiano das pessoas, tendo
uma perspectiva de aprendizado e crescimento
coletivo. Assim, a comunidade juntamente com
os responsáveis pela ação, identificarão os
caminhos mais adequados para a construção
da intervenção comportamental. Portanto, o
responsável pela ação nunca deve se considerar
como o “dono da verdade” ou de todo o conhecimento, já que é seu público-alvo -de acordo com
suas condutas, comportamentos e práticas–
quem irá apontar as melhores alternativas para
que o trabalho de prevenção tenha sucesso.
A intervenção comportamental é também um
processo de troca de experiências, de compartilhamento de idéias e informações, de busca para
se fortalecer individual e coletivamente e, assim
garantir a efetiva prevenção das DST/HIV/aids.
Pesquisa comportamental
De acordo com o que já pontuamos, o interesse
em conhecer melhor os grupos homossexuais
deve sempre perpassar qualquer intervenção
comportamental, como forma de direcionar
as mensagens de prevenção e de incentivar
o exercício da cidadania. Uma das maneiras
de por em prática esse interesse é a realização
de pesquisas. A observação cotidiana da comunidade beneficiada com seu trabalho, é a primeira
alternativa para se levantar maiores informações
sobre o modo de vida, crenças, valores, comportamento sexual e nível de informação sobre
DST/ aids das pessoas da comunidade, bem como
para se obter um perfil com as características
pessoais e coletivas do grupo em questão. Isso
é o que chamamos em metodologia de pesquisa,
de observação participante, ou seja, o trabalho
de observação associado a uma ação integrada,
envolvida com o grupo e atividades programadas.
63
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
64
Capitulo 4
Para isso, deve-se registrar as observações sobre
a comunidade em relatórios de campo, onde
constarão informações sobre a data e local da
intervenção, as principais atividades desenvolvidas, os materiais informativos distribuídos, o
número de preservativos fornecidos e as principais ocorrências. Informações sobre os encaminhamentos de pessoas abordadas para unidades
de tratamento de DST/aids ou para a realização
de teste de HIV, são extremamente importantes na avaliação do nível de interesse e de
envolvimento da população-alvo com o trabalho.
A vulnerabilidade de uma pessoa ou de um
grupo diante do HIV/aids, conceito definido
pelo cientista social Jonathan Mann1, é composta
pela interação entre diversos fatores individuais,
sociais e políticos. Assim, o pouco ou nenhum
acesso à informação, à autonomia, à auto-estima,
ao trabalho, à escola e à aceitação social,
são alguns dos vários elementos que compõem
a vulnerabilidade. Diante disso, buscar maiores
informações sobre tais questões, possibilitará
a realização de uma intervenção mais qualificada,
com impacto diferenciado e positivo na realidade
do indivíduo e do grupo como um todo.
1
Uma primeira etapa para a coleta de informações
sobre todos esses componentes pode ser a elaboração de um questionário, a ser aplicado junto
ao grupo, de forma individual. A aplicação e resultados desse questionário possibilitarão identificar,
por exemplo, como a ausência de trabalho está
interferindo na prática preventiva para as DST/
aids ou ainda, o quanto a ocorrência de discriminações tem afetado a auto-estima e o cuidado
com a saúde. O modelo do questionário deve
incluir elementos vinculados às informações
demográficas do/a entrevistado/a (idade, cor,
profissão, escolaridade, religião, local de moradia,
situação econômica), assim como questões sobre
a homossexualidade da pessoa em relação a sua
identidade sexual (se é assumido ou não, se tem
parceiros fixos ou parceiros eventuais, por exemplo).
É importante incluir também questões sobre
o conhecimento das DST/HIV/aids, suas formas
de transmissão e de prevenção, as situações
de risco para o HIV/aids nas relações sexuais e,
sobre o uso de drogas com sua influência
na saúde e na prevenção. Levantar informações
sobre a prática do sexo comercial (enquanto profissional do sexo e/ou cliente) é outro importante
dado que ajudará na intervenção.
Jonathan Mann et alli. A Aids no Mundo. Relume-Dumará – ABIA. Rio de Janeiro.1993.
Metodologias de intervençâo
Pesquisa comportamental
Na seleção das pessoas a serem entrevistadas,
deve-se buscar englobar pessoas com diferentes
práticas e identidades homossexuais (gays,
travestis, transexuais, bissexuais, lésbicas)
pois assim a amostra da entrevista ficará
mais expressiva.
O questionário deve ter questões objetivas
(do tipo “sim ou não”), bem como perguntas
abertas (subjetivas). Ele deve ser anônimo,
sem identificação alguma da pessoa entrevistada.
Pode-se solicitar o auxílio de um profissional
da área social (sociólogo, antropólogo, psicólogo,
etc) para a elaboração do questionário, sua
aplicação (orientando os entrevistadores)
e análise dos resultados. Para se obter essa ajuda,
uma boa alternativa é o contato com as universidades locais, cujos departamentos dos cursos
da área social podem apoiar e orientar a pesquisa.
É fundamental aplicar previamente o questionário
junto a um pequeno grupo do público-alvo, inserido o universo maior que será pesquisado. Esse
teste prévio do instrumento de coleta da dados,
permitirá avaliar a eficácia do questionário
e a eventual necessidade dele ser alterado.
A tabulação/análise dos resultados, além de subsidiar o trabalho de prevenção junto ao públicoalvo definido, comporá o relatório da pesquisa
a ser divulgado junto às autoridades de saúde
(principalmente da área de DST/aids) e ONG/
aids. Esse documento pode também ser divulgado
na mídia local (jornal, TV, rádio), como um instrumento adicional para reforçar a necessidade
de implantação de políticas públicas. Assim, para
a ação que envolva uma intervenção comportamental sistemática, uma pesquisa inicial identificará melhor as características do público a ser
abordado. Ao término da intervenção, uma boa
opção é aplicar outro questionário -dessa vez
mais reduzido- visando levantar resumidamente
as mesmas informações do questionário aplicado
no início do trabalho, para comparar as diferenças
e avanços ocorridos no início e no fim da ação,
referentes aos principais temas/questões abordados junto ao público-alvo.
65
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
66
Capitulo 4
Parcerias e alianças
É importante enfatizar que a primeira e mais
importante aliança a ser valorizada no trabalho
de intervenção comportamental, é aquela estabelecida com as pessoas-alvo do trabalho. As ações
devem ter o envolvimento, a aceitação e a participação da comunidade homossexual, como meta
fundamental. Essa parceria política e pautada
na realização do trabalho de intervenção para
a prevenção das DST/aids e promoção da cidadania, deve ter na mobilização comunitária sua
principal aliança e seu mais importante defensor.
Se o trabalho for importante, se tiver suas metas
alcançadas e se alcançar resultados satisfatórios,
a comunidade atendida será a primeira a valorizá-lo e defendê-lo. Desta forma, a intervenção
deve priorizar o incentivo e o apoio às ações
protagonistas da população-alvo, voltadas à luta
pelos direitos humanos, contra a discriminação
e preconceito e pela implantação de programas
governamentais de saúde que atendam as necessidades das pessoas com orientação homossexual.
A prevenção deve estar, portanto, incluída num
contexto de luta social por cidadania.
Partindo dessa aliança firmada com a comunidade, é interessante estreitar os laços entre
as lideranças desse grupo e outras pessoas que
possam estar à frente do trabalho de prevenção,
após o término dessa etapa da intervenção.
Isso é o chamamos de sustentabilidade política
para o trabalho de intervenção.
Outra importante aliança a ser feita, nessa perspectiva de maior envolvimento da comunidade,
é com os grupos homossexuais e de defesa dos
direitos humanos. Tal aliança é peça indispensável,
na medida em que esses grupos desenvolvem
atividades de promoção da cidadania, e que portanto podem ser fortes parceiros na prevenção
das DST/aids. Nos municípios onde não existam
grupos homossexuais o trabalho de intervenção
possivelmente incentivará o surgimento de um
grupo desse tipo. Isso deve ser considerado como
um desafio e uma nova perspectiva do trabalho,
sendo também uma contribuição valiosa para
sua continuidade.
Metodologias de intervenção
Parcerias e alianças
As ONG que trabalham com aids (mesmo não
sendo especificamente grupos homossexuais)
assim como os Fóruns de ONG/aids, também
são parceiros em potencial para a intervenção
programada, podendo ajudar no desenvolvimento
e consolidação do trabalho. As coordenações
de DST/aids (nacional, estaduais e municipais)
e as Secretarias de Saúde são importantes referências para a obtenção de material informativoeducativo, de preservativos e também de apoio
técnico, político e financeiro para a realização
do trabalho. Além da responsabilidade com
a resolução de demandas da sociedade em torno
das ações em DST/aids, tais instâncias podem
-em parceria com os grupos homossexuais
ou lideranças da comunidade– auxiliar a estruturar e implantar a intervenção programada.
Deve-se buscar também alianças com os estabelecimentos comerciais usados pelo público-alvo
ou onde a intervenção será realizada (boates,
bares, salões de beleza, cinemas de pegação,
saunas). Essa aliança deve englobar a autorização
para realização do trabalho e para a presença
da equipe no estabelecimento, bem como
eventual apoio financeiro para a produção
de material informativo específico.
Deve-se sempre avaliar esse mercado “rosa”
-como chamamos o mercado voltado para os
gays, lésbicas e simpatizantes (GLS)- como um
potencial parceiro da ação programada, já que
além do lucro pelos seus serviços, deve ter
a saúde e a cidadania de seus clientes como
preocupação social constante.
Na relação existente entre as ações em saúde e a
cidadania, as casas parlamentares e suas respectivas Comissões de Direitos Humanos, bem como
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) podem
também apoiar o trabalho previsto, associando-o
à apresentação de leis que versem sobre a livre
expressão sexual. Por exemplo, a apresentação/
aprovação de lei para proibição de discriminação
em estabelecimentos comerciais e, de leis específicas que garantam as ações em DST/aids para
gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros (GLBT).
O apoio jurídico para episódios que envolvam
discriminações em virtude da orientação homossexual, como veremos no próximo capítulo,
pode ser solicitado nessas comissões
de direitos humanos.
67
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
68
Capitulo 4
Nos casos de discriminação em ambiente
de trabalho, as Delegacias Regionais (DRT)
do Ministério da Trabalho, por meio de seus
Núcleos de Igualdade, fiscalizam e punem
empresas que, nas relações de trabalho,
agem com exclusão diante dos homossexuais.
Por fim, vale ressaltar que algumas técnicas
de abordagem para a intervenção comportamental devem ser priorizadas, como por exemplo,
a necessidade do contato ser realizado de maneira
natural, evitando que a pessoa abordada se sinta
intimidada, invadida ou incomodada com a presença e intervenção da equipe de trabalho. Uma
outra preocupação relaciona-se ao uso de técnicas
diversificadas, fazendo com que as visitas/intervenções junto à população atendida não se torne
monótona ou repetitiva: cada visita/ intervenção
deve incorporar alguma alteração ou novidade
(como um material informativo diferente), estimulando a discussão sobre diferentes assuntos
ou aprofundando alguma questão específica.
Oficinas de sexo mais seguro
A idéia do “sexo seguro” foi criada pela comunidade gay dos Estados Unidos com o surgimento
da aids, para divulgar um conjunto de cuidados
e práticas sexuais visando diminuir ou eliminar
os riscos da infecção pelo HIV/aids. Com isso,
várias técnicas e dinâmicas foram sendo elaboradas para a disseminação de tais cuidados
e práticas, com o objetivo de tornar a idéia do sexo
seguro mais atrativa, fazendo com que os homossexuais a adotasse em sua prática sexual. E assim,
criou-se as oficinas de sexo seguro, cujo objetivo
é incentivar o uso do preservativo, fornecer
informações sobre seu uso correto com acessórios adequados e, ensinar como evitar algumas
práticas sexuais de maior risco privilegiando
outras mais seguras.
A primeira questão importante das oficinas
de sexo seguro é a criação de um clima bem
favorável a sua realização, onde os participantes
se sintam à vontade e confiantes para eventualmente relatar sua prática e conduta sexuais.
Por isso é indispensável reunir, além dos instrutores da oficina, somente os participantes da
oficina, favorecendo a criação de clima mais
propício a um debate sincero e construtivo
sobre sexo e prevenção das DST/HIV/aids.
Metodologias de intervenção
Oficinas de sexo mais seguro
Há diversos formatos para a oficina de sexo
mais seguro, terminologia mais empregada
atualmente. Porém, seja qual for a oficina
realizada, algumas etapas devem ser obrigatoriamente cumpridas:
1) A apresentação dos/as participantes,
por meio de dinâmica.
Por exemplo, formar pares, e cada pessoa
-após alguns minutos de conversa entre siser apresentada por seu par ao grupo.
Ou ainda: cada pessoa escolhe uma letra
do seu nome (o nome pelo qual gosta
de ser chamado/a) e fala uma qualidade
ou virtude sua;
2) A realização de dinâmica para discutir
práticas e “posições” sexuais e suas relações
de risco para o HIV/aids.
Por exemplo, pede-se aos/as participantes que
escrevam numa folha de papel uma prática
ou uma atividade sexual qualquer. Determinase três blocos de “alto risco”, “médio risco”
e “nenhum risco” e a partir da leitura e debate
do que cada um/a escreveu, cada atividade
é agrupada em determinado grau da “situação
de risco” para a infecção pelo HIV/aids;
3) A demonstração do uso correto do preservativo.
Essa etapa é imprescindível para que seja
mostrada a maneira correta de se usar a
camisinha, como guardá-la, as formas de
verificar sua validade e se a mesma passou
pelos testes de qualidade, como retirá-la e qual
a melhor forma de jogá-la fora após o uso e,
o lubrificante mais apropriado. Com a inserção
dessas informações na prática sexual dos participantes, estimula-se o uso do preservativo
nas relações sexuais, reduzindo também as
chances da camisinha se romper durante o ato
sexual e tornando o sexo mais seguro. É interessante fazer desse momento um espaço
de descontração, preservando no entanto
a seriedade do assunto abordado. Pode-se
utilizar técnicas mais eróticas (como por
exemplo, ensinar a colocar a camisinha com
a boca) para se obter maior descontração
do grupo. Na demonstração prática do uso do
preservativo, duplas podem ser compostas e,
com a ajuda de uma prótese peniana de borracha (“vibrador de borracha”), a utilização
correta da camisinha deve ser exercitada,
sendo todo processo acompanhado de perto
pelo instrutor. Deve-se sempre demonstrar
o uso da camisinha masculina e da feminina
(com o auxílio de uma prótese feminina);
69
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
70
Capitulo 4
4) A entrega de material informativo-educativo
sobre sexo mais seguro e suas possibilidades
é sempre indicada;
5) Ao final da oficina, é necessário realizar
uma breve avaliação, onde cada participante
fala como se sentiu, o que aprendeu e como vai
aplicar o aprendizado na sua prática sexual.
Além dessas etapas, a inclusão de uma parte
inicial na oficina, logo após a apresentação
dos participantes, para a divulgação de informações sobre as outras doenças sexualmente
transmis-síveis - especialmente as mais comuns
-prevenção e tratamento e, sua relação com
a infecção pelo HIV/aids, é uma boa alternativa, que enriquece a atividade. Em média,
a oficina de sexo mais seguro dura cerca de
duas horas, sendo aconselhável ter no máximo
de 25 pessoas. Essa medida garante maior articipação e melhor acompanhamento das questões
e dúvidas individuais. Quanto ao material para
as oficinas, é importante garantir a disponibilização de papel, lápis, caneta, preservativos,
lubrificantes (vaselina e gel à base de água),
quadro ou flipchart, próteses do pênis
e a da vagina (de borracha e/ou acrílico).
A intervenção comportamental entre pessoas
com orientação homossexual tende a ser realizada
de maneira mais êxitosa, possibilitando maior
envolvimento e resposta da comunidade, se estiver
centrada na metodologia da “educação entre
pares”: pessoas homossexuais (com um universo
socioeconômico-cultural similar ao da comunidade a ser trabalhada) agindo e educando outras
pessoas homossexuais.
Outra questão importante para o sucesso da
intervenção comportamental, é garantir que
as mensagens de prevenção das DST/HIV/aids
sejam associadas à promoção da saúde da
população-alvo. Mensagens fatalistas que tentam
criar ou incentivar o pânico e o medo frente
a aids, relacionando-a com morte e doença,
têm mostrado seu fracasso enquanto informação
para a educação e sensibilização a sociedade.
Além disso, vincular a aids à morte pode promover
posturas desvinculadas da realidade, como por
exemplo, achar que as pessoas soropositivas
e/ou doentes de aids não estão vivas, mas apenas
aguardando a hora de sua morte. “Cuidar da
saúde” é sempre uma mensagem mais real,
sincera e educadora.
Metodologias de intervenção
Oficinas de Sexo mais Seguro
Por fim, vale ressaltar que a intervenção comportamental deve ter uma missão educadora
cotidiana, centrada na informação, na troca
de experiências e na boa comunicação com
o público-alvo. Ações que se limitam a entregar
preservativos e materiais informativos tendem
a não cumprir esse papel de educação em saúde
sexual e prevenção das DST/HIV/aids. Portanto,
as ações nesse campo devem sempre estar
direcionadas em estratégias que contemplem
a informação, a educação e a comunicação.
71
Direitos humanos
Direitos humanos
75
Direitos humanos
“Não adianta comemorar o cinqüentenário da Declaração
dos Direitos Humanos, se práticas injustas que excluem
os homossexuais dos direitos básicos continuam ocorrendo.
É preciso que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário
tomem consciência e tenham percepção de que
é necessário enfrentar essa situação de grave
adversidade por que passam os integrantes
deste grupo extremamente vulnerável“
(Ministro Celso de Mello, Presidente do STF 1998)
A expressão “direitos humanos” é uma forma
abreviada de mencionar os direitos fundamentais
da pessoa humana. Segundo estudiosos deste
tema, tais direitos são considerados fundamentais
porque sem eles a pessoa humana não consegue
existir ou não é capaz de se desenvolver e de participar plenamente da vida. Todos os seres humanos, portanto, devem ter asseguradas, desde
o nascimento, condições mínimas neces-sárias
para se tornarem úteis à humanidade, bem como
para receber os benefícios que a vida em sociedade pode proporcionar. Esse conjunto de condições e de possibilidades associa as características
básicas dos seres humanos à capacidade de cada
pessoa em valer-se como resultado da organização social. É a esse conjunto que se dá o nome
de direitos humanos1.
1
2
Enciclopédia Digital de Direitos Humanos. Dhnet, Natal, 1999. www.dhnet.org.br
Dallari, Dalmo. “O que são direitos humanos: noção e significado”,
Enciclopédia Digital de Direitos Humanos. Dhnet, Natal, 1999
Para entendermos com maior facilidade
o significado dos direitos humanos, basta dizer
que tais direitos correspondem às necessidades
essenciais da pessoa humana. Tratam-se daquelas
necessidades comuns a todos os seres humanos
e que devem ser atendidas para que a pessoa
possa viver com dignidade. O direito à vida
– por exemplo– é um direito humano fundamental,
porque sem ela a pessoa não existe e, assim,
a preservação da vida torna-se uma necessidade
de todas as pessoas humanas. Mas, observando
como são e como vivem os seres humanos,
percebemos a existência de outras necessidades
que além dessa, também são fundamentais, como
a alimentação, a saúde, a moradia, a educação,
o direito ao afeto e à livre sexualidade, entre outras.
É preciso reforçar que a afirmação da igualdade
de todos os seres humanos não quer dizer igualdade física, cultural, intelectual ou psicológica.
Cada pessoa humana tem sua individualidade,
personalidade e, modo próprio de ver e de sentir
as coisas. O mesmo acontece para os grupos
sociais: cada um tem sua cultura própria,
resultado de condições naturais e sociais2.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
76
Capitulo 5
Entre essas condições, se reconhece também que
os direitos sexuais também são direitos humanos.
Dessa forma, a discriminação e o preconceito
contra os homossexuais constitui uma das áreas
de maior índice de violação dos direitos humanos
em nosso País.
Na nossa tradição ocidental -herdeira da moral
judaico-cristã- o amor entre pessoas do mesmo
sexo foi considerado crime dos mais graves,
equiparado ao regicídio (assassinato de reis ou
rainhas) e à traição nacional. O sexo entre dois
homens era considerado tão horroroso, que os réus
desse crime hediondo deviam ser punidos com
a pena de morte. Só em 1821 quando é abolida
a Inquisição Portuguesa e em 1823 quando surge
nosso primeiro Código Penal, a sodomia (perversão
sexual, prática do coito anal) deixa de ser crime no
Brasil. Porém, além de crime, a homossexualidade
foi considerada como “o mais sujo, torpe e desonesto pecado”, sendo mais grave do que matar
a própria mãe, escravizar outro ser humano,
cometer violência sexual contra crianças.
3
A maioria das igrejas continua sendo absolutamente intolerante, pregando que “a homossexualidade é intrinsecamente má”3 e que a aids “peste
gay” e um castigo divino contra os homossexuais4.
Assim, embora as igrejas venham abrindo cada
vez mais espaço para o trabalho social e defesa
de negros, índios, mulheres prostituídas e portadores do HIV/aids, suas portas permanecem
fechadas para os homossexuais. Hoje, a moderna
teologia (estudo da religião cristã) e exegese
(comentário para esclarecimento de um texto
ou palavra, que aplica-se as leis e a Bíblia) comprovam que essa homofobia bíblica foi baseada
em premissas e/ou traduções equivocadas,
já existindo algumas poucas igrejas e/ou líderes
religiosos que defendem a criação de pastorais
específicas para homossexuais.
Segundo estimativa do Relatório Kinsey5,
os homossexuais masculinos e femininos
representam por volta de 10% da população
–o que vale dizer que segundo esta estimativa,
o Brasil possui cerca de 17 milhões
de homossexuais.
Mott, Luiz. “A Igreja e a questão homossexual no Brasil”, Mandragora, São Paulo, ano 5, n.5, 1999
4
Mott, Luiz. “Aids: Reflexões sobre a sodomia”, Comunicações do ISER, nº17, dez.1985
5
Kinsey, A. C. et alii. Sexual Behavior in Human Male. Philadelphia, Saunders, 1948.
Direitos humanos
77
No entanto, de acordo com a avaliação do Plano
Nacional de Direitos Humanos, os homossexuais
estão entre as minorias sociais mais vulneráveis
na sociedade brasileira, atingindo um índice
de 80% de rejeição entre os formadores de opinião.
Uma pesquisa realizada no Brasil em 19936
mostrou que: 79% dos brasileiros ficariam tristes
se tivessem um filho ou filha homossexual;
56% mudariam sua conduta com o colega se
soubessem que é gay; 56% não concordam
que um candidato homossexual seja eleito
Presidente da República; 47% mudariam seu
voto caso fosse revelado que seu candidato
a eleição é homossexual; 45% trocariam de médico
e dentista se descobrissem que ele é gay; 36%
deixariam de contratar um homossexual para
sua empresa mesmo que fosse o candidato mais
qualificado. Assim, no início do século XXI, ainda
constatamos a triste realidade dos homossexuais
continuarem sendo as principais vítimas do
preconceito e da violência dentro da sociedade
brasileira.
6
7
Apesar dos atos homoeróticos entre gays,
lésbicas e travestis terem sido descriminalizados
há quase dois séculos, os homossexuais continuam
sendo tratados como criminosos nas delegacias,
sendo vistos em batidas policiais como
delin-qüentes e, mesmo quando vítimas,
tratados como réus7.
No Brasil 76 municípios, 2 estados e o Distrito
Federal, possuem leis proibindo a discriminação
baseada na orientação sexual, sendo essa uma
grande conquista do movimento homossexual
brasileiro. Mesmo assim, essa proteção legal
é ainda letra morta em muitos casos, já que são
registradas poucas condenações por discriminação
de homossexuais, principalmente se compararmos
o número de homossexuais assassinados no País
-1.960 no período de 1980/2000, segundo
pesquisas realizadas– com o número de efetivas
punições por crimes e/ou atos discriminatórios
aos homossexuais.
“Brasileiros não aceitam médicos nem político gay”, Pesquisa IBOPE. Veja, 10-5-1993.
Mott, Luiz. Homofobia: A Violação dos Direitos Humanos de Gays, Lésbicas e Travestis no Brasil. S.Francisco (USA),
International Gay and Lesbian Human Rights Comission, l997
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
78
Capitulo 5
A psicologia e psicanálise propõem que todos
os seres humanos são “perversos polimorfos”,
com uma forte presença da bissexualidade
na libido. Kinsey, pesquisador norte-americano,
descobriu em 1948 que 37% dos homens ocidentais tinham experimentado na idade adulta,
ao menos dois orgasmos com o mesmo sexo.
Assim, numa sociedade tão fortemente marcada
pela homofobia, percebemos paralelamente
que quase a totalidade das pessoas sentem
desejos unissexuais e que um número significativo
de indivíduos já teve secretamente alguma prática
homoerótica. Essa contradição provoca, em muitas
pessoas, um ódio doentio contra o próprio desejo
homoerótico e, sobretudo, contra aqueles que
ousam transgredir a ditadura da heterossexualidade.
A psicologia chama esse ódio mórbido contra
a homossexualidade de homofobia internalizada,
provocando sintomas diversos que incluem a
neurose por frustração sexual, suicídio e atos
de violência (como agressões e assassinato sádico
de homossexuais).
8
Hilton, B. A Homofobia tem cura? São Paulo, Edições Ouro, 1992; Weinberg,
G. La Homosexualidad sin prejuicios. Barcelona, Granica Editor, 1971.
Nosso país é extremamente contraditório no que
se refere aos homossexuais: por um lado temos
a aceitação e consagração de transexuais (como
por exemplo, a eleição de Roberta Close como
“modelo de beleza da mulher brasileira”) e por
outro, a cada dois dias um homossexual é barbaramente assassinado, vítima da homo- fobia(ódio
à homossexualidade)8. A homofobia tem raízes
profundas na nossa sociedade, comprovando
assim que as travestis, gays, lésbicas e transexuais
constituem a minoria social mais vulnerável.
Como já vimos, essa fragilidade e/ou vulnerabilidade tem também sua origem na falta de apoio
familiar: enquanto crianças e adolescentes negros,
judeus ou deficientes físicos, aprendem com seus
familiares, a enfrentar o preconceito e a hostilidade
da sociedade, desenvolvendo o orgulho étnico/
racial e a auto-estima, os jovens homossexuais
vivenciam em seus próprios lares a brutalidade
da discriminação. Aqueles que não são insultados,
agredidos ou expulsos de casa, vêm-se forçados
a manter na clandestinidade sua verdadeira
essência existencial, impedidos de compartilhar
sua vida íntima com seus entes mais próximos.
Direitos humanos
79
Permanece, portanto, um complô do silêncio
contra “o amor que ainda não ousa dizer o nome”,
perpetuando a ditadura da intolerância da heterossexualidade, que rotula os amantes do mesmo
sexo como “anormais”, “doentes” ou “marginais”.
Mais grave do que o preconceito encontrado entre
os líderes religiosos e acadêmicos, é a homofobia
observada entre as lideranças das instituições
voltadas para a defesa dos direitos humanos.
Vários políticos, líderes religiosos e intelectuais
brasileiros ligados a essa área, têm divulgado
na mídia opiniões discriminatórias contra os
homossexuais, alguns opondo-se radicalmente
ao reconhecimento legal da união civil entre
pessoas do mesmo sexo9. Assim, torna-se evidente
que os principais culpados pela divulgação
do mais violento discurso homofóbico e pela
conseqüente legitimação da intolerância e
violência anti-homossexual, continuam sendo
pessoas ligadas às diferentes seitas/crenças
religiosas e cada vez mais, aos jovens com
discurso néo-nazista pertencentes ao meio
universitário ou à periferia das grandes cidades.
9
Podemos também citar alguns exemplos de como
a intolerância anti-homossexual é agressiva em
diferentes setores da nossa sociedade: por duas
vezes o maior jornal do Nordeste publicou impunemente, a pena de morte aos homossexuais
divulgando o slogan “mantenha Salvador limpa,
mate uma bicha todo dia”; em São Paulo um
político de peso10 declarou publicamente que “os
homossexuais não podem ter os mesmos direitos
que têm as pessoas normais”; no Rio de Janeiro um
conhecido jornalista11 escreveu que “gostaria
de ver todos os homossexuais condenados à
morte em forno crematório e mesmo assim
lamentava que sobrassem as cinzas”; em Fortaleza
um arcebispo declarou que “o homossexualismo
é um defeito da natureza humana, como o orgulho,
a tendência ao roubo, a cleptomania, o homicídio,
ou qualquer coisa assim” e, um arcebispo de
Florianópolis proclamou que “os gays são gente
pela metade, se é que são gente”12. Por fim, não
podemos esquecer do assassinato na Praça da
República, em São Paulo, de Edson Néris da
Silva homossexual e adestrador de cães13,
por um grupo de skinheads (auto-denominados
“Carecas do ABC”).
Mott, Luiz. Violação dos Direitos Humanos e Assassinato de Homossexuais no Brasil. Salvador, Editora Grupo Gay da Bahia, 2000
10
Deputado Raimundo da Cunha Leite - PMDB
11
Ivan Leal – Jornal do Brasil
12
A Tarde (Salvador)12-7-1982;15-11-1989;Diário do Grande ABC (SP),7-10-l986;Jornal do Brasil,14-12-86.
13
Em 06 de fevereiro de 2000
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
80
Capitulo 5
Esse crime bárbaro despertou as autoridades
paulistas para o ressurgimento de uma forte
organização neonazista que emprega a violência
contra homossexuais, negros, nordestinos
e judeus.
Para quem ainda tem dúvidas do quanto a violência homofóbica ameaça gravemente a integridade física e psicológica dos gays, travestis, lésbicas e transexuais, cabe a rápida apresentação
de alguns dados sobre o assunto: no Rio de Janeiro
(julho/1999 a dezembro/2000) foram registradas
500 denúncias sobre diferentes abusos contra
os homossexuais14 e num levantamento realizado
na Bahia15 registrou-se 130 assassinatos de
homossexuais e 261 casos de violação dos direitos
humanos (50 casos de agressões e torturas, 16
ameaças e golpes, 15 casos de discriminação em
instituições e por autoridades governamentais,
29 casos de discriminação econômica, contra
a livre movimentação, privacidade e trabalho,
33 casos de discriminação familiar, escolar,
científica e religiosa, 22 difamações e discriminações na mídia), 235 insultos e preconceitos
anti- homossexual, 8 casos de violência contra
lésbicas e 63 episódios de violência contra
travestis.
Como já vimos, segundo a estimativa feita por
Kinsey, os gays, lésbicas e transgêneros devem
representar pelo menos 10% da população
brasileira, sendo portanto, 17 milhões de seres
humanos presentes em todas as raças, grupos
étnicos, classes sociais, profissões e idades. Em
nível mundial, os homossexuais constituem
a única minoria que se faz presente em todas
as demais minorias sociais. Por isso o principal
slogan usado pelo movimento homossexual internacional é “somos milhões e estamos em toda
parte”. Não obstante tal fato, é provável que 99%
dos homossexuais continuem escondidos “dentro
do armário”, vivendo clandestinamente o que
para todo ser humano é motivo de grande satisfação, reconhecimento público e orgulho: o amor.
O preconceito, a opressão e discriminação contra
este grupo populacional são tão fortes que a quase
totalidade dos gays e lésbicas introjetaram
a homofobia dominante em nossa ideologia
heterossexista, tornando-os homossexuais
egodistônicos, ou seja, não assumidos. Devido
a essa invisibilidade, deixam de fornecer modelos
positivos para os jovens com orientação homoerótica, podendo causar, entre outras coisas,
frustração e alta taxa de suicídio entre
os adolescentes16.
14
“DDH-500 Casos”, Instituto de Estudos da Religião (ISER); Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, dezembro 2000.
15
Mott, Luiz & Cerqueira, Marcelo. Causa Mortis: Homofobia. Salvador, Editora Grupo Gay da Bahia, 2001
16
Mott, Luiz. A Cena Gay em Salvador em Tempo de Aids. Salvador, Editora Grupo Gay da Bahia, 2000
Direitos humanos
81
Para que gays, lésbicas e transgêneros brasileiros
ocupem efetivamente sua posição na sociedade
e exerçam sua cidadania plena, o movimento
homossexual considera urgente a adoção
de algumas medidas:
1) descriminalizar de vez a homossexualidade
no que se refere ao trato que a polícia e a justiça dão às minorias sexuais, aprovando-se
leis que condenem a discriminação sexual
com o mesmo rigor que o crime de racismo;
2) quebrar os tabus religiosos que colocam
o amor entre pessoas do mesmo sexo como um
grande pecado, propondo às diferentes igrejas
a promoção de pastorais específicas voltadas
para as minorias sexuais;
3) tratar a homofobia internalizada - que
impede a sociedade heterossexista de reconhecer os direitos humanos e a diversidade
das minorias sexuais - criando sentimentos
de tolerância dentro das famílias para que
respeitem a livre orientação de seus filhos
e parentes homossexuais;
4) quebrar o complô do silêncio e divulgar
informações corretas e positivas a respeito
da homossexualidade, desmascarando as
falsas teorias que a define como uma patologia
e ampliando na academia, as pesquisas que
resgatem a história e dignidade das minorias
sexuais;
5) substituir a homofobia reinante nos partidos e grupos políticos que tratam a
cidadania homossexual como luta menor,
erradicando, dos grupos que defendem os
direitos humanos, qualquer tipo de manifestação de preconceito que viole a dignidade
e cidadania dos homossexuais;
6) propôr aos órgãos governamentais, políticas
públicas visando o desenvolvimento da autoestima, consciência e saúde integral de gays,
travestis, transexuais e lésbicas, com campanhas
específicas de prevenção de DST/aids
e de garantia da segurança e da cidadania
das minorias sexuais;
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
82
Capitulo 5
7) estimular os gays, lésbicas, travestis
e transexuais a assumirem publicamente sua
identidade homossexual, lutando pela construção de uma sociedade onde todos possam
ter reconhecidos seus direitos humanos e sua
cidadania plena.
A sexualidade é parte integral da personalidade
de todo ser humano e o seu desenvolvimento
total depende da satisfação de necessidades
humanas básicas, tais como, o desejo de contato,
a intimidade, a expressão emocional, o prazer,
o carinho e o amor. Como já vimos anteriormente,
a sexualidade é construída a partir da interação
existente entre o indivíduo e as estruturas sociais,
sendo um elemento essencial para o bem estar
individual, interpessoal e social. Assim, a saúde
sexual é considerada também um resultado
de um ambiente que reconhece, respeita e exercita estes direitos sexuais. Os direitos sexuais
são direitos humanos universais baseados
na liberdade inerente, dignidade e igualdade
para todos os seres humanos, logo, a saúde
sexual deve ser um direito humano básico.
Para assegurarmos que os seres humanos e a
sociedade desenvolvam uma sexualidade saudável, os direitos sexuais devem ser reconhecidos,
promovidos, respeitados e defendidos por todas
as sociedades.
A prática homossexual entre maiores de dezoito
anos não é crime no Brasil porém, observamos
a freqüência de notícias sobre abuso de poder
ou graves discriminações por parte de autoridades civis, de policiais ou de empresas. Ninguém
pode ser discriminado, nem privado de qualquer
direito constitucional simplesmente por ser
homossexual. No caso de uma pessoa ser presa
ou sofrer agressão física/moral por ser homossexual, a lei garante proteção. A seguir indicamos
algumas recomendações de como proceder
e quais artigos de leis devem ser utilizados/
citados, no caso de abusos, discriminação
ou prisão injusta:
1) Não existe no Brasil nenhuma lei que criminalize a homossexualidade. É legal ser
homossexual. Nem o Código Penal nem a
Constituição Federal proíbem o amor entre
pessoas do mesmo sexo, maiores de 18 anos.
Direitos humanos
83
Portanto, no caso de ameaças, discriminação
ou prisão pelo fato de ser gay, lésbica, travesti, transexual ou bissexual, considera-se
como abuso de poder e crime contra o direito
de cidadania. Eis os artigos da Constituição
Federal que protegem quem for vítima de
abuso do poder:
Art.5°: Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se
a todos a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança
e à propriedade.
Parágrafo 2: Ninguém será obrigado a fazer
ou deixar de fazer alguma coisa, senão em
virtude da lei. Parágrafo 3: Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano
ou degradante. Parágrafo 10: São invioláveis
a intimidade, a vida privada e a honra dos
cidadãos.
2) Ninguém pode ser detido se não praticou
crime ou delito. Ser homossexual não é crime.
Só pode ser preso quem for surpreendido
cometendo um crime em flagrante ou por
ordem de um juiz. Desmunhecar, travestir-se,
namorar com pessoa do mesmo sexo em local
público, ir para hotel com outro homossexual
- nada disto é crime e ninguém pode ser ameaçado ou preso por praticar tais atos.
Porém, se despir ou exibir os órgãos genitais na
rua e fazer sexo em vias públicas, são considerados atos de “atentado público ao pudor”,
e o rigor na repressão desses delitos deve ser
igual para heterossexuais e para homossexuais.
A prostituição, seja de mulheres ou de homens,
não é considerada crime no Brasil. Eis os parágrafos da Constituição Federal que protegem
a cidadania:
Art. 5º - Parágrafo 51: Ninguém será preso
senão em flagrante delito ou por ordem escrita
e fundamentada de autoridade judiciária
competente .
Parágrafo 52: A prisão de qualquer pessoa
e o local onde se encontra serão comunicados
imediatamente ao juiz competente e à família
do preso ou à pessoa por ele indicada”.
3) Se houver prisão por qualquer motivo relacionado à homossexualidade, é necessário
argumentar sem, no entanto, resistir à prisão,
exigindo ser tratado sem violência física ou
verbal, como manda a Constituição e o Código
Policial. Nunca se deve desafiar ou insultar
o policial, pois isto é considerado desacato
à autoridade e pode provocar atitudes de
violência.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
84
Capitulo 5
É recomendado que a pessoa diga ser homossexual, reforçando que a Constituição proíbe
a discriminação contra gays e lésbicas.
Na maioria das cidades a polícia tem conhecimento dos grupos homossexuais locais
existentes e assim, o relato do vínculo com
um desses grupos pode favorecer a solução
do problema enfrentado;
4) Nos casos de prisão por orientação sexual
recomenda-se memorizar ou anotar o nome
do policial, a chapa da viatura, o local e horário
onde a prisão ocorreu e se/onde aconteceu
qualquer tipo de violência policial. Se houver
agressão física, logo que possível é fundamental
ir ao Instituto Médico Legal para fazer o exame
de corpo delito, contando com a presença
de testemunhas que presenciaram o abuso
de poder policial e registrando fotograficamente o ferimento ou lesão corporal. Nesses
casos a Constituição Federal também garante
proteção:
Art. 5º” – Parágrafo 54: O preso tem direito
à identificação dos responsáveis por sua prisão
ou por seu interrogatório policial.
5) Toda pessoa presa tem direito legal de entrar
em contato com sua família e assistência
de advogado. Ninguém é obrigado a fazer
declarações, nem assinar documentos se assim
não desejar. Eis a garantia da Constituição:
Art. 5º - Parágrafo 53: O preso será informado
de seus direitos, entre os quais de permanecer
calado, sendo-lhe assegurada a assistência da
família e de advogado.
6) Logo que a pessoa for solta –caso tenha
sido vítima de prisão injusta (abuso de
poder) ou presa por justa causa mas,
humilhada ou sofrido violência por ser homossexual– o contato com grupos homossexuais
e ONG da cidade é recomendado, afim de
receber orientação e denunciar o fato ocorrido
às autoridades competentes e aos meios de
comunicação. Calar-se ou esconder–se, em se
tratando de ser vítima de homofobia, eqüivale
a dar força e impunidade aos opressores.
Quanto maior for a publicidade dos casos
de discriminação, mais as vítimas ficam protegidas, já que os agressores geralmente temem
represálias de seus superiores.
7) A seguir relacionamos uma lista dos órgãos
públicos que podem ser acessados no caso
de prisão abusiva, discriminação ou tortura
por ser homossexual.
Direitos humanos
85
• Prefeitura e Câmara Municipal - Comissão
de Direitos Humanos: essa instância existe
justamente para defender os abusos ao direito
de cidadania. Os vereadores podem informar
se a cidade em questão está inserida na lista
dos estados e municípios onde a Lei Orgânica
ou a Constituição Estadual proíbem discriminação contra a orientação sexual dos indivíduos;
• Assembléia Legislativa: onde também existe
uma Comissão de Direitos Humanos para
onde podem ser encaminhadas denúncias e
solicitadas providências. Uma opção no caso de
pouca receptividade, é procurar parlamentar
do Partido dos Trabalhadores, já que esse é o
único partido político brasileiro que define em
seu regimento interno que “os homossexuais
não devem ser tratados como caso de polícia”;
• Secretaria de Justiça e Direitos Humanos e
Secretaria de Segurança Pública: pode
ser solicitada audiência, para a entrega de uma
“representação” (folha de papel onde a vítima
denuncia detalhadamente o fato/ agressão
ocorrida);
• Defensoria Pública: esse órgão da Justiça está
geralmente situado no próprio Fórum da cidade
e é onde os promotores e procuradores devem
fazer a Lei ser respeitada e cumprida. Caso
a pessoa não tenha recursos financeiros,
tais autoridades são obrigadas a indicar
advogado gratuito para defender a causa;
• Ordem dos Advogados (OAB): órgão
ue também dispõe de uma comissão de
direitos humanos, com serviço de advogados
para atender vítimas de abuso do poder.
8) Os meios de comunicação podem igualmente
ser um grande aliado na luta contra a homofobia. Muitos jornais dispõem de plantão
policial e em caso de abuso policial ou outro
tipo de violência, o contato com a redação ou
com o plantão policial dos principais jornais da
cidade é uma opção recomendada;
(9) No caso da pessoa ser menor de 18 anos
e homossexual, é preciso saber que ninguém
pode obrigá-la a mudar de tendência erótica.
A livre orientação sexual é um direito humano
fundamental de todo/a cidadão, garantido
tanto pela Declaração Universal dos Direitos
Humanos, quanto pela Constituição Federal
e pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
86
Capitulo 5
No caso de sofrer algum tipo de pressão ou violência psicológica/física por ser homossexual,
é necessário procurar o Conselho Tutelar da
cidade - órgão encarregado de zelar pelo
cumprimento do ECA. Caso haja internação
na FUNABEM ou no Juizado de Menores,
é fundamental exigir que a integridade física/
psicológica enquanto homossexual seja respeitada. Se houver violência sexual, deve-se exigir
fazer o exame de corpo delito e a assistência
de um advogado da defensoria pública.
Eis os artigos do Estatuto da Criança
e do Adolescente que protegem os homossexuais menores de 18 anos:
Art. 15: A criança e o adolescente têm direito
a liberdade, ao respeito e à dignidade como
pessoas humanas e como sujeitos de direitos
civis, humanos e sociais garantidos na Constituição Federal e nas leis;
Art. 17: O direito ao respeito consiste na
inviolabilidade da integridade física, psíquica e
moral da criança e do adolescente, abrangendo
a preservação da imagem, da identidade,
da autonomia, dos valores, etc;
Art. 18: É dever de todos velar pela dignidade
da criança e do adolescente, pondo-os a salvo
de qualquer tratamento desumano, violento,
aterrorizante, vexatório ou constrangedor;
10) No caso dos homossexuais que estão
cumprindo pena de prisão por algum delito
comum, deve ser exigido o respeito por sua
condição de homossexual. Sofrendo alguma
violência sexual, é necessário solicitar
transferência para local seguro, denunciando
o fato à OAB, à Comissão Carcerária e aos
grupos homossexuais locais.
Como já vimos, nos últimos 20 anos, mais de
1.960 gays, lésbicas e travestis foram barbaramente assassinados no Brasil vítimas da homofobia, sendo que a cada dois dias um homossexual
é morto no País. Muitos desses assassinos são
garotos de programa ou desconhecidos que
o homossexual encontra na rua e leva para
casa. Portanto, é importante reforçar algumas
recomendações de auto-proteção, na tentativa
de evitar situações que promovam a violência
física ou o assassinato:
• Nunca se sentir inferior a ninguém. Ser homossexual não é crime. Se alguém humilhar, discriminar ou agredir um homossexual somente
pela orientação sexual é necessário reagir,
discutir e denunciar. É preciso também evitar
se mostrar indefeso, demostrando passividade,
medo ou submissão;
Direitos humanos
87
• “Deve se evitar levar desconhecidos para
dentro de casa, principalmente quando for
para relações sexuais: a maioria dos homossexuais assassinados foram executados no
seu próprio quarto. Assim, hotéis, motéis ou
saunas devem ser utilizados preferencialmente.
Mesmo se tratando de hotéis e motéis, é importante se identificar na portaria, deixando documentos na recepção e avisando que o casal
deve sair junto;”• No caso do homossexual
levar alguém para casa, recomenda-se trancar
a porta e esconder a chave, nunca deixando
armas, facas e objetos perigosos à vista;
• Em nenhuma situação - e principalmente
nesse caso - deve-se humilhar o parceiro dando
demonstração de maior poder econômico,
com a exposição de jóias, dinheiro, cartões
de crédito e etc. Muitas vezes, essa atitude
leva o/a convidado/a ao latrocínio
(assassinato por roubo);
• É preciso ter cuidado com as bebidas oferecidas por um desconhecido: elas podem
conter soníferos. Nunca deve-se ter como
acompanhante/parceiro um desconhecido,
no caso de ter bebido demais e de não ter mais
autocontrole. É muito perigoso dormir depois
da relação sexual ao lado de quem não
se conhece;
• Deve-se acertar todos os detalhes antes da
relação sexual: preferências eróticas, duração
e preço. É importante também esclarecer, por
exemplo, se o parceiro faz tudo, se transa com
camisinha, se quer ser pago ou não;
• É preciso manter boas relações com a vizinhança, pois, além de outros benefícios, em
momentos de perigo, os vizinhos podem ajudar
e socorrer a vítima ou mesmo salvar sua vida;
• Se houver caso de humilhação, agressão
e roubo, deve-se procurar imediatamente
a polícia e fazer o Boletim de Ocorrência
e/ou o exame de corpo delito.
O movimento
homossexual
e a aids
O movimento homossexual e a aids
91
O movimento homossexual e a aids
“Somos milhões e estamos em toda parte”
(palavra de ordem do movimento homossexual)
Quando o fenômeno da aids surgiu em todo
o mundo, no início dos anos 80, o maior impacto
da epidemia foi sobre a comunidade homossexual.
Nessa época, nas manchetes de jornais ou
em conversas de rua, o termo mais usado para
referendar a epidemia que se iniciava era “a
peste” ou “o câncer” gay. Para além de todo
o preconceito social, os casos de aids que tinham
maior notoriedade pública invariavelmente
estavam relacionados aos homossexuais, o que
resultava na associação direta de toda e qualquer
morte por aids com o tipo de orientação sexual.
Quem vivenciou essa fase inicial da epidemia,
acompanhou a divulgação constante de relatos
assustadores e de imagens chocantes de pessoas
doentes de aids em leitos hospitalares. Esses
tipos de relatos e imagens eram considerados
como uma espécie de “terapia de choque” para
promover maior conscientização sobre a gravidade da situação que se impunha.
Situação essa que também trouxe dois tipos
de reações bastante peculiares em relação
à homossexualidade: por um lado, nova onda
moralista pregava que a epidemia da aids era
prova inconteste de que esse tipo de orientação
sexual era uma prática “contra a natureza humana”
e, por outro, várias vertentes religiosas
declaravam publicamente que a aids era
“o castigo” infligido aos que ousavam praticar
o sexo sem fins de procriação.
Porém, para compreendermos melhor a história
do movimento homossexual no Brasil e sua
relação com a epidemia pelo HIV/aids, é preciso
recuarmos um pouco no tempo e entendermos
também o contexto político e social que vivíamos
nas décadas de 70 e 80. Na segunda metade
da década de 1960, instalou-se no Brasil uma
ditadura militar: sob o pretexto de combater
a ameaça do comunismo, as forças armadas
tomam o poder e suspendem a liberdade democrática básica dos cidadãos. Na década de 70,
após o decreto do (AI-5) Ato Institucional 5 ,
o governo passa a ter poderes para cassar direitos
políticos e individuais e assim, mergulhamos
numa época de terror contra os aqueles que
discordavam da política governamental de então.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
92
Capitulo 6
Muitas pessoas foram arbitrariamente presas,
torturadas e assassinadas durante essa época,
sendo a imprensa colocada sob rígida censura.
No início dos anos 80, quando a epidemia
do HIV/aids começa a ser fortemente associada
aos homossexuais, a relativa liberdade que se
estabelecia no Brasil, a partir do afrouxamento
do autoritarismo dos anos da ditadura militar,
é progressivamente eliminada e o discurso
de censura recrudesce.
Paralelamente a esse cenário político brasileiro,
nos Estados Unidos, a situação era bem diversa.
Na verdade, a população americana ainda vivia
sob a influência de várias tendências, conquistas
e fatos ocorridos na década de 60, como por
exemplo, a Revolução Cubana que mostrava
ser possível resistir aos ditadores, a invenção
da pílula que permitia o sexo sem risco
da gravidez, a chegada do homem à Lua,
o surgimento do rock e do movimento hippie.
A partir desse clima, nada mais natural que
o início do movimento homossexual moderno
aconteça em 28 de junho de 1969, a partir
de batida policial realizada no bar Stonewall Inn,
em Nova Iorque, que provocou revolta dos
homossexuais, reunidos em protesto público
por três dias.
Essa reação dos homossexuais aos constantes
atos de violência policial, marcou o final
de uma série de humilhações e discriminações
que já haviam se tornado rotina na comunidade
homossexual americana.
Com esse fato histórico, institui-se o dia
28 de junho como o Dia do Orgulho Gay
(Gay Pride). Esse foi o primeiro passo para
que a sociedade americana e o mundo passassem
a ter –mesmo que de forma lenta e inicial– outra
concepção do “universo” homossexual. Respirando os novos tempos trazidos pelo movimento
feminista - que lutava pela igualdade entre os
gêneros, exigindo também o fim da discriminação da mulher - os homossexuais americanos
passam a se organizar de forma mais consistente,
resultado de um esforço conjunto de conscientização que vinha ocorrendo há anos nos Estados
Unidos.
Após a invasão do bar Stonewall, os homossexuais se reúnem em praça pública nos anos
subsequentes, para celebrar a vitória obtida
no ano anterior.
O movimento homossexual e a aids
93
Eles haviam chegado às manchetes dos jornais
e não estavam mais dispostos a viver no anonimato, numa suposta condição de “cidadãos de
segunda categoria”, sem acesso à livre expressão
de sua afetividade e orientação sexual. Essa comemoração passa a ser feita a cada ano e, paulatinamente, começa a atrair um número maior
de pessoas, transformando-se numa parada:
um desfile em via pública onde gays, lésbicas,
bissexuais, travestis e transgêneros se mostram
à comunidade local, reafirmando seus direitos
de livre expressão sexual e de cidadania. Dessa
forma, na década de 70 o movimento homossexual
americano –não tendo vivenciado os rigores
da ditadura militar existente no Brasil na épocacomeça a ocupar cada vez mais espaço na vida
pública e social, se fortalecendo, abrindo canais
de comunicação e de interlocução social e política,
moldando lideranças e criando associações
e grupos para defesa de seus direitos. Cabe lembrar
que uma das primeiras grandes conquistas desse
processo refere-se ao fato da Associação Psiquiátrica
Americana oficializar, em 1973 , que a homossexualidade não se trata de doença psíquica,
nem tão pouco de distúrbio de conduta sexual.
No Brasil, no final da década de 70, inicia-se
um processo de abertura política, com várias
manifestações das classes operárias e estudantil,
exigindo a democracia e condições sociais mais
justas para os trabalhadores e para a sociedade
brasileira em geral. Essa atmosfera mais liberal
no País e a influência das conquistas nos Estados
Unidos, fazem com que velhos tabus nacionais
comecem a ser derrubados. Eram tempos
de valorização da androginia (a não definição
entre o masculino e o feminino) e quando
a bissexualidade começa a ser a prática sexual
mais discutida.
Em meio a esse clima de mudança, surge em 1978
o jornal “O Lampião da Esquina”, abordando
temas associados à sexualidade, cultura, gênero
e discriminação racial. Inspirados nessa publicação,
homossexuais de São Paulo começam a se reunir
informalmente, discutindo também o processo
de criação da primeira organização em defesa
de seus direitos: o Somos –o Grupo de Afirmação
Homossexual, em 1979.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
94
Capitulo 6
Embora historicamente tenhamos o registro
de outras iniciativas de organização de grupos
homossexuais, é a partir do jornal “O Lampião
da Esquina” e do Grupo Somos que se imprime
um novo caráter político e social a esse tipo
de organização no Brasil. Em 1980 é criado
em Salvador, o Grupo Gay da Bahia cujas primeiras
ações foram vinculadas à luta pelo reconhecimento
jurídico do grupo e pela abolição da classificação
no Conselho Nacional de Saúde da homossexualidade como transtorno sexual curável
(o que ocorre em 1985).
Desde esse início de organização, gradualmente,
a solidariedade com os homossexuais portadores
de HIV/aids é incorporada na agenda política
do movimento homossexual brasileiro, compondo
parte importante da resposta comunitária que
então se inicia à epidemia pelo HIV/aids.
Nesse aspecto é fundamental ressaltar o diálogo
existente entre o movimento homossexual
e o movimento social de pessoas que vivem
com HIV/aids que marca, dentre outras questões,
a luta comum para que a soropositividade saia da
esfera de mais um preconceito (a ser combatido)
que tenta limitar e demarcar o desejo
em torno de sorologias.
No início da década de 80, as diferentes formas
de preconceito vividas e enfrentadas por homens
e mulheres com prática homossexuais, eram
as questões mais discutidas e combatidas pelo
movimento homossexual que então se iniciava.
Por conseqüência, também se discutia a necessidade de definição de uma identidade gay,
na tentativa de se construir um conjunto de
elementos mínimos que pudessem configurar
uma espécie de “essência” do ser homossexual.
A partir de divergências (vivência da prática
homossexual, questões de gênero e identidade
homossexual) as lésbicas -que até então estavam
inseridas no movimento homossexual- definem
a necessidade de se desvincularem desse grupo,
buscando formas mais pertinentes e específicas
para sua organização social.
O início da década de 80 também foi palco
do surgimento, no Brasil, do que chamamos
do “mercado homossexual” ou “mercado
cor-de-rosa”. Começam a surgir nas grandes
cidades, bares e boates cuja freqüência é quase
exclusivamente de gays e lésbicas. Embora
na maioria das vezes obrigado a manter
sua identidade sexual sob forte sigilo, o homossexual começa então a ter espaços específicos
de encontro e socialização.
O movimento homossexual e a aids
95
A criação desses locais de socialização traz
aos homossexuais a oportunidade de interação,
indo muito além da vivência anterior, restrita
aos encontros fortuitos e anônimos em banheiros
públicos e saunas. Nesse novo espaço social,
começa também a se formar “cultura” própria
do homossexual que, gradativamente,
se fortalece e amplia.
Essa nova perspectiva social e cultural é muito
importante, pois, a tranqüilidade estabelecida
nesses espaços e entre seus freqüentadores
é subitamente suprimida, quando a epidemia
da aids torna-se pública, sendo vinculada aos gays.
A criação do “mercado cor-de-rosa”, que também
era considerado fator positivo para a visibilidade
e a afirmação social dos homossexuais, passa
então a ser condenado por um lado (a onda
moralista e religiosa que novamente se instala
contra a homossexualidade) e temido e/ou
evitado por outro (seus próprios freqüentadores
começam a evitar tais espaços de socialização,
por medo ou por precaução).
Perplexa diante do súbito adoecimento e hospitalização de pessoas públicas, amigos e parentes,
entristecida com as perdas pessoais que a aids
traz, a comunidade homossexual reage de duas
formas: parte de seus integrantes abandona
o “gueto” (ou espaços de socialização) camuflando
ainda mais sua orientação sexual e, outra parte,
se une e mobiliza para combater a nova ameaça
e desafios trazidos pela epidemia.
Nessa época, por não contarmos com medicamentos específicos e por termos recursos médicos
limitados para o enfrentamento da epidemia,
o apoio social e psicológico aos doentes de aids
e familiares, bem como a prevenção da infecção
pelo HIV eram as duas formas de combate
possíveis. Assim, começam a surgir no País,
grupos ou organizações não-governamentais
voltadas para essas duas frentes de ação,
associando também aos seus objetivos a defesa
dos direitos das pessoas que vivem com HIV/aids
e a luta contra o preconceito e discriminação.
A partir do trabalho feito por esses grupos
e da atuação das esferas governamentais consegue-se, com relativa rapidez, desenvolver ações
no campo da assistência e prevenção
ao HIV/aids, acessíveis à boa parte
da população brasileira.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
96
Capitulo 6
Apesar do temor e restrições dos homossexuais
face a possibilidade da infecção pelo HIV, é nesse
panorama que eles também começam a ter uma
visibilidade diferenciada daquela até então
existente. A partir da ampla divulgação de
materiais informativos sobre prevenção da aids,
foi possível expor abertamente questões sobre a
sexualidade, explicitando também as diferentes
orientações e práticas sexuais existentes. Essa
característica das ações de prevenção do HIV/
aids é considerada como um elemento positivo
para a divulgação de informações adequadas
sobre a homossexualidade, bem como um canal
efetivo para o combate a discriminação
e preconceito e pela defesa dos direitos humanos
dos homossexuais.
Na década de 90, a partir da ampliação da atuação
do movimento homossexual brasileiro (que durante
boa parte dos anos 80 fica fortemente associada
ao combate à epidemia da aids) começam a ser
organizados os Encontros Brasieiros de Gays,
Lésbicas e Travestis (EBGLT)1. Esses encontros
reúnem grupos organizados e lideranças de todo
o País para discutir questões políticas e sociais
do movimento homossexual, dando também
maior visibilidade e legitimidade as suas
diferentes reivindicações.
1
Os EBGLT são realizados a partir de 1982,
sendo o primeiro deles (Cajamar/SP) marcado
pelo pioneirismo dos grupos então reunidos e,
o último deles (Maceió/2001) pela atuação
política do movimento já consolidado no País.
Mesmo sem participar de um contexto mais
amplo do movimento homossexual brasileiro,
as lésbicas e as travestis - a partir de trabalho
específico de conscientização e mobilização
– marcam a trajetória de seus respectivos
movimentos com a organização de encontros
nacionais, reforçando a visibilidade de questões
vinculadas aos direitos humanos, às diferenças
de gênero, à promoção da saúde e à prevenção
das DST/HIV/aids. Em 1996, no Rio de Janeiro,
organiza-se o primeiro “Seminário Nacional
de Lésbicas (SENALE), espaço anual de encontro
e discussão desse movimento, elegendo o dia
29 de agosto como o Dia Nacional da Visibilidade
Lésbica. Por outro lado, em 1993, também no
Rio de Janeiro, promove-se o primeiro “Encontro
Nacional Travestis e Liberados”, que com a
progressiva adesão dos grupos organizados
e de lideranças ao longo dos anos, possibilita
maior divulgação e discussão de temas associados à cidadania, saúde e prevenção das DST/
HIV/aids para esse segmento populacional.
Originalmente tais eventos foram chamados de “Encontros Brasileiros de Homossexuais”. Somente a partir de 1993 a participação em tais encontros
é ampliada, incluindo as lésbicas e travestis. Nesse capítulo consideramos o VII Encontro de Lésbicas e Homossexuais como o primeiro da série.
Ver cronologia completa dos Encontros no anexo História da Homossexualidade no Brasil
O movimento homossexual e a aids
97
Com a realização dos Encontros Brasileiros
de Gays, Lésbicas e Travestis, começa uma
mobilização semelhante àquela despertada
pelos incidentes corridos no bar Stonewal,
nos Estados Unidos: cresce a disposição em
comemorar de forma expressiva, o dia da visibilidade homossexual no Brasil. Em fevereiro
de 1997, como atividade de encerramento do
IX EBGLT, em São Paulo, realiza-se uma passeata
com 2 mil pessoas, iniciando assim a organização
de Paradas do Orgulho de Gays, Lésbicas,
Bissexuais e Transgêneros, a exemplo do que
já ocorria nas grandes capitais do mundo. No ano
seguinte, no dia 28 de junho, a primeira Parada
do Orgulho de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros de São Paulo, é realizada. Esse evento,
mesmo com poucos recursos, consegue reunir
num desfile cerca de 2.000 militantes e simpatizantes na Avenida Paulista, coração financeiro
do Brasil. Nos anos seguintes a história se repete,
tornando a Parada GLBT de São Paulo uma referência nacional para a visibilidade do movimento
homossexual brasileiro. A principal diferença
entre as sucessivas paradas realizadas desde
então, é o crescente número de participantes,
simpatizantes, grupos organizados, patrocinadores, lideranças e militantes incorporados
ao evento, a cada ano.
Os princípios básicos que norteiam a realização
das Paradas GLBT estão centrados no seu caráter
democrático e não excludente, possibilitando
a visibilidade das diferentes expressões da homossexualidade, de acordo com suas peculiaridades.
O efeito social das Paradas -que acontecem
também em várias cidades brasileiras– é significativo enquanto momento privilegiado
da visibilidade homossexual perante a sociedade.
Elas tornam pública a discussão sobre os direitos
dos homossexuais, sobre a discriminação e
preconceito e sobre a dignidade e cidadania
dos homossexuais, enquanto indivíduos. Essas
características das Paradas são também
elementos reforçados nas ações de luta contra
a epidemia pelo HIV/aids, onde identifica-se
que qualquer esforço no campo da prevenção,
não pode excluir o fortalecimento da auto-estima
e da cidadania dos homossexuais. O respeito
social e individual pela diversidade na orientação
sexual é também uma forma para garantir
o cuidado com a saúde, propiciando assim
a adoção de práticas sexuais mais seguras
em relacionamentos sexuais e afetivos.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
98
Capitulo 6
Ainda nos anos 90, impulsionado por uma maior
facilidade de contato e pelas conquistas do movimento homossexual internacional –como a realização Conferência da Associação Internacional
de Gays e Lésbicas (ILGA- Internacional Lesbian
and Gays Association) no Rio de Janeiro (1995)o movimento homossexual brasileiro registra
também grandes avanços sociais e políticos,
principalmente em relação à aprovação de leis
municipais e estaduais contra a discriminação
com base na orientação sexual.
Nessa perspectiva da defesa dos direitos humanos,
não se pode deixar de ressaltar proposição do
projeto de lei para legalização da união civil entre
pessoas do mesmo sexo -Parceria Civil Registrada
(PCR). Essa proposição, ainda não aprovada pelo
Congresso Nacional, prevê a assinatura de contrato
entre parceiros, regularizando e legalizando
a partilha de bens em caso de dissolução ou
morte, bem como garantindo benefícios como
previdência social, imposto de renda conjunto,
aquisição ou aluguel de imóveis, entre outros.
Nesse sentido, é também importante registrar
o significativo aumento de demandas judiciais
individuais para reconhecimento de direitos
básicos, como herança no caso de falecimento
do parceiro e retratação por abuso, violência
e/ou discriminação com base na orientação
sexual. Assim, nesse cenário, algumas das
muitas conquistas e discussões devem
ser destacadas, como:
1) o ganho de causa de ação movida pelo
NUANCES (grupo homossexual de Porto
Alegre) e Ministério Público no Rio Grande
do Sul contra o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) resultando em liminar
(aplicável em todo território nacional) que
obriga a concessão aos parceiros homossexuais o direito à pensão, reforçando a jurisprudência em relação a parceria estável entre
duas pessoas do mesmo sexo, como constituição de unidade familiar e assim, sujeita
a proteção por parte do Estado;
O movimento homossexual e a aids
99
2) o inquérito minucioso conduzido pela polícia
de São Paulo por ocasião do assassinato de
Edson Néris da Silva, com posterior julgamento
e conde-nação dos primeiros acusados (vinte
e um anos de prisão) por júri popular, sendo
que durante esse processo, pela primeira vez
na história, o principal argumento foi
a intolerância homofóbica;
3) a decisão inédita da Justiça de Minas
Gerais que concedeu a casal homossexual
de Belo Horizonte a guarda da filha biológica
de um dos parceiros; e,
4) a promulgação de Leis Municipais em
Fortaleza que estabelece punições aos estabelecimentos comerciais que discriminarem em
decorrência da orientação sexual e que institui
o dia 28 de junho como o Dia Municipal
do Orgulho Homossexual.
Em nível de organização e fortalecimento
do movimento social, além dos Encontros
Nacionais e das Paradas de Orgulho GLBT,
o início dos anos 90 também marcou a história
do movimento homossexual brasileiro
por outras duas iniciativas pioneiras no País.
A primeira delas foi a criação, em Curitiba (1995)
de uma associação visando representar os grupos
organizados das minorias sexuais: a Associação
Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis (ABGLT),
que conta atualmente com a adesão de uma
grande parte dos grupos homossexuais existentes
no País. A segunda (em 1999), foi a fundação
do Fórum de Organizações com Trabalhos
de Prevenção das DST/Aids para Homens que
Fazem Sexo com Homens do Estado de São Paulo
(Fórum HSH/SP), composto por grupos homossexuais, ONG e instâncias governamentais locais,
tornando-se o mais importante espaço de discussão e deliberação para questões relacionadas à
homossexualidade e à prevenção das DST/HIV/
aids. Essa experiência vem sendo replicada em
outros estados brasileiros.
Além das suas ações de combate à epidemia
pelo HIV/aids, atualmente o movimento homossexual brasileiro vem atuando de forma expressivapara garantir os direitos humanos, o exercício
da cidadania e a participação e mobilização
social desse segmento populacional.
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
100
Capitulo 6
Abrir espaços de luta contra o preconceito
e a discriminação no sistema educacional formal,
também passou a ser um elemento estratégico
para o movimento, uma vez que essa é uma
forma concreta para se chegar a uma sociedade
mais aberta à aceitação da diversidade sexual
no futuro. Nesse sentido, dentre as linhas
de atuação do movimento homossexual,
cabe destacar algumas das principiais
reivindicações aprovadas para apresentação
na Conferência de Durban2:
Principiais reivindicações
aprovadas para apresentação
na Conferência de Durban.
• Proteger os GLTTB contra agressões
e divulgação de idéias discriminatórias
seja pela imprensa, igrejas ou quaisquer
outros meios de divulgação e informação,
por meio da criação de um conselho ético
que responda por publicações e exibições
de quadros que incentivem a homofobia
e ao racismo;
• Proceder emenda na Constituição Federal
alterando os artigos 3º e 7º para incluir
a proibição da discriminação por orientação
sexual dos GLTTB;
• Incluir nas Constituições Estaduais
e Leis Orgânicas Municipais a proibição
de discriminar por orientação sexual
e regulamentação urgente das leis
municipais e estaduais já existentes;
2
Texto parcial. “Reivindicações do Movimento Homossexual Brasileiro,
aprovadas na Conferência Preparatória da Conferência de Durban “.
Rio de Janeiro (7/7/2001).
• Implementar um programa nacional
de prevenção à violência contra GLTTB,
obrigando-se que nas estatísticas policiais
haja sempre referência específica aos crimes
perpetrados em razão da orientação sexual
das vítimas;
• Incluir em todos os Documentos Oficiais
e Programas de Direitos Humanos a defesa
de livre orientação sexual e da cidadania
dos GLTTB, ao lado dos demais grupos
discriminados, bem como incluir
um conjunto de medidas de afirmação
dos Direitos Humanos dos GLTTB;
• Incentivar programas de orientação
familiar e escolar, com o objetivo
de capacitar as famílias, profissionais
da educação e comunidade escolar,
no sentido de conferir às crianças e jovens
GLTTB, o respeito à livre orientação sexual,
prevenindo atitudes hostis e violentas,
inclusive o uso abusivo de terapias corretivas;
• Apoiar a publicação de documentos
científicos que contribuam para a divulgação
de informações corretas e antidiscriminatórias
contra os GLTTB, inclusive nos materiais
pedagógicos e escolares;
• Incluir em todos os censos demográficos
e pesquisas oficiais do Governo, quesitos
relativos à orientação sexual do(a)s
brasileiro(a)s, bem como incluir formas
diversas de violência e discriminação;
• Capacitar profissionais de educação para
promoverem em todos os níveis escolares
e nos meios de comunicação, a consciência
ética da tolerância das diferenças individuais,
através da destruição do estereótipo
depreciativo dos gays, lésbicas, travestis,
transexuais e bissexuais;
• Promover campanhas contra discriminação
(homofobia) e incentivo do reconhecimento
das diferenças individuais nos meios
de comunicação de alcance nacional;
• Inserir a matéria de livre orientação sexual
e seus desdobramentos nas escolas da
Magistratura e do Ministério Público em
todos os estados brasileiros;
• Promover campanha junto aos profissionais
da Saúde, da Segurança Pública
e do Direito para o esclarecimento relativo
aos conceitos científicos e éticos ligados
à homossexualidade, transexualidade
e bissexualidade, educando para uma
cultura de Direitos Humanos;
• Criação de programas na área de Saúde
que atendam as especificidades da
comunidade GLTTB nos âmbitos municipal,
estadual e federal, da seguinte forma: que
nos programas de saúde da mulher, sejam
garantidas as especificidades das lésbicas,
tendo como pano de fundo campanhas,
informativos e materiais específicos;
que os programas de saúde garantam
tratamento adequando para as (os)
transexuais, no pré, durante e pós-operatório;
campanha de prevenção à aids específica
para GLTTB; e, que os programas de saúde
garantam a orientação, acompanhamento
e tratamento das travestis e transexuais
na utilização de hormônios, silicone e outros
similares;
• Criação de programas que atendam
e promovam a cidadania GLTTB
encarcerados e garantir direito de visita
íntima a parceiros/as de GLTTB presos;
• Criação e funcionamento efetivo
de Comissão de Direitos Humanos
em todas as Câmaras Municipais
e Estaduais Brasileiras;
• O Ministério do Trabalho deve garantir
a integralidade da aplicação da Convenção
111 da Organização Internacional do
Trabalho – OIT assegurando que os núcleos
de combate a discriminação no trabalho
recebam e apurem as denúncias de
discriminação por orientação sexual;
• Garantir e definir no orçamento federal
recursos para ações afirmativas contra
práticas discriminatórias
à comunidade GLTTB.
• Nesse inicio do Século XXI, não podemos
deixar de reforçar a importância da
globalização e da internet para o movimento
homossexual brasileiro: embora este último
veículo ainda seja um meio de comunicação
restrito, sua ampla e crescente utilização
fortalece os laços do movimento em todo
o País, viabilizando também a ampliação
do conheci-mento sobre as diferentes frentes
de luta, a identificação de outros segmentos
sociais discriminados
e promovendo a ampliação da luta
por mudanças que tornem nossa sociedade
mais justa, solidária e fraterna.
História da aids:
breve resumo
História da aids: breve resumo
A aids no mundo
História da aids: breve resumo
A aids no mundo
No início da década de 80, o surgimento de uma
nova doença – posteriormente identificada como
uma síndrome, conhecida mundialmente pela
sigla AIDS (Acquired Imunodeficiency Syndrome)
ou SIDA (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) - foi responsável por mudanças significativas
em campos que extrapolaram a área da saúde,
principalmente pela doença se relacionar ao
comportamento sexual. O desafio de combater
a doença instalou-se em diferentes áreas do
conhecimento, além das ciências biomédicas,
como a economia, a antropologia, a sociologia,
a política, os direitos humanos, entre outras.
Os primeiros casos conhecidos de aids (entre 77
e 78) ocorreram nos Haiti, Estados Unidos
e África Central. Nessa ocasião, os segmentos
da população atingidos, denominados “grupos
de risco” e concentrados nos grandes centros
urbanos, eram constituídos de homossexuais,
receptores de sangue e hemoderivados e
usuários de drogas injetáveis (UDI).
A primeira definição da doença feita pelo
Centro de Controle e Prevenção de Doenças
(Centers for Diseases Control and Prevention
- CDC) dos Estados Unidos, enfatizou a sua letalidade, incluindo doenças indicativas de aids com
diagnóstico definitivo, pois ainda não se conhecia
a etiologia da doença. Eis a definição preliminar
de um caso de aids: “...doença, pelo menos
moderadamente preditiva de defeito da imunidade celular, ocorrendo em pessoa sem causa
conhecida para uma resistência diminuída ao
sarcoma de Kaposi (SK) e ao PCP (Pneumocistose). Na mesma definição já aparece o termo
“grupo de risco”, incluindo os 4H: homossexuais
masculinos, hemofílicos, heroinômanos (como
representantes dos UDI) e haitianos. Com a visão
de uma doença restrita ao então chamado Grupo
dos 4H, a adoção de medidas preventivas por
parte dos organismos governamentais só ocorreu
quando a aids foi caracterizada como uma epidemia. Paralelamente, a população atingida foi
sendo ampliada: crianças, mulheres, usuários
de drogas e indivíduos expostos a sangue
e hemoderivados.
107
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
108
Capitulo 7
A identificação do agente etiológico, a disponibilidade de testes diagnósticos e outros avanços
tecnológicos levaram a sucessivas modificações
na definição de caso de aids. As pesquisas clínicas
e os dados epidemiológicos tiveram um papel
fundamental na formação do consenso em torno
do HIV, como foi chamado o agente causal
da aids.
A aids no Brasil
A aids foi identificada pela primeira vez no Brasil
em 1983, em caso post mortem de indivíduo
que manifestou a doença em 1980, vindo a falecer
em 1981. Inicialmente restrita as nossas grandes
metrópoles, como Rio de Janeiro e São Paulo,
iniciou sua expansão para outras capitais e
interior do País, a partir da segunda metade
da década de 80. Em 1986, o Governo Federal
publicou portaria ministerial criando o Programa
Nacional de Combate às DST e Aids e incluiu,
nesse mesmo ano, a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) na lista nacional de doenças de modificações compulsória (Port.n.º 1.100,
de 24 de maio de 1986). Na década seguinte,
o crescimento da epidemia foi indiscutível.
A taxa de incidência da aids sofreu uma variação
de mais de 50%, passando de 8,2 (1991) para
11, 2 (1999) casos por 100 mil habitantes. Em
2000, cerca de 60% dos municípios brasileiros
registravam pelo menos um caso da doença.
Homossexuais
Até o ano de 1990, 45,9% dos casos de aids
no Brasil incidiam em indivíduos homossexuais
ou bissexuais masculinos. Esses dados, associados
ao preconceito e à discriminação pela orientação
sexual, certamente concorreram para um atraso
da consciência social sobre a necessidade de se
tomar medidas de saúde pública urgentes,
evitando a disseminação da epidemia para outros
segmentos da população. A consciência, a disposição e o ativismo individual ou de grupos homossexuais, antes mesmo do surgimento da aids
no País, serviu de alerta e importante fator de
mudança na atitude dos órgãos governamentais
no que se refere à implantação de programas
de prevenção das DST/aids. Com o passar dos
anos, observou-se uma progressiva redução
da participação percentual dos homossexuais/
bissexuais no quadro epidemiológico (21,6%
em 1999, segundo o Ministério da Saúde).
História da aids- breve resumo
Sangue
Essa tendência, entretanto, observada em todas
as regiões do Brasil, não deve ser compreendida
como a reversão de um quadro epidemiológico,
inicialmente negativo entre os homo/bissexuais:
é efetivamente, o resultado geral de uma discreta
estabilização dos números absolutos de casos
nesta subcategoria, comparativamente à progressiva disseminação da doença para outros segmentos
da população. Utilizando-se dados de 1998 para
homens de 18 a 59 anos estimou-se, por meio
de estudos estatísticos e epidemiológicos, que
a probabilidade de um homossexual estar infectado pelo HIV é cerca de 11 vezes maior do que
a de um homem heterossexual. Esta estimativa
corrobora e coloca este segmento populacional
como um dos mais prioritários para a implantação de ações de prevenção das DST/HIV/
aids no País.
Sangue
No início da epidemia, a transmissão do HIV
pelo sangue e hemoderivados fez dos seus
receptores - especialmente os hemofílicos um segmento populacional duramente atingido.
Em 1984, nada menos que 62% dos pacientes
haviam sido expostos a sangue contaminado.
Pressões políticas do movimento social organizado e o temor causado pela emergência avassaladora de casos atribuídos à transfusão sanguínea, exigiram uma resposta governamental
imediata. À frente desse movimento da sociedade
civil, Herbert de Souza (o sociólogo Betinho) teve
uma atuação destacada, possibilitando o engajamento da Sociedade Brasileira dos Hemofílicos
no processo de definição de políticas de saúde,
voltadas para a luta contra a aids. A lei normalizadora dos padrões técnicos a serem adotados
pelos bancos de sangue foi editada no País
pela Port. nº 721/GM (09 de agosto de 1989)
e alterada pela Portaria nº 1376 (19 novembro
de 1993), publicada no Diário Oficial da União
de 02 de Dezembro de 1993, refere-se às normas
técnicas para coleta, processamento e transfusão
de sangue, componentes e derivados e dá outras
providências, entre as quais a exigência
da obrigatoriedade de testagem do sangue
para a detecção de anticorpos anti-HIV.
109
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
110
Capitulo 7
Feminização da epidemia
A partir de estudos de prevalência do HIV
em gestantes estimou-se, em 1998 que 530 mil
indivíduos entre 15 e 49 anos estavam infectados
pelo HIV no Brasil. O contingente masculino de
infectados foi estimado considerando-se a razão
entre casos masculinos e femininos - a partir das
taxas de incidência acumuladas.até então, de 2
homens para cada mulher. O conceito hegemônico sobre os grupos mais atingidos pela doença,
foi um fator importante para a população feminina não se perceber vulnerável à infecção pelo
HIV, conseqüentemente não adotando medidas
preventivas. A noção de “grupo de risco” afastou
as mulheres da possibilidade de infecção e a
implantação de ações de prevenção direcionadas
a elas foi tardia. A própria cultura brasileira, com
sua visão machista vertical e desigual, no cotidiano das relações de gênero, reforçou também
esse atraso. Atualmente, o progressivo aumento
no número de casos de aids entre as mulheres,
em todas as regiões brasileiras, na sua grande
maioria causados pela transmissão do HIV pelas
relações heterossexuais, vem recebendo maior
atenção para ações de prevenção.
Outro dado importante é o fato de que 38,2% das
mulheres com aids contraíram o vírus compartilhando seringas ou em relações sexuais desprotegidas com parceiro usuário de drogas injetáveis.
Transmissão materno-infantil
Uma consequência direta da ampliação da
participação feminina na epidemia da aids foi
o progressivo aumento da transmissão vertical
do vírus, da mãe para a sua criança durante a
gestação, no momento do parto e/ou no aleitamento. No Brasil, a primeira ocorrência dessa
forma de transmissão data de 1985, e até 30/12/
2000 foram notificados 5.731 casos da transmissão vertical do HIV (Ministério da Saúde, 2000),
período em que também se registra uma modificação do perfil etário das crianças infectadas.
De 84 a 90, 21% das crianças notificadas tinham
entre 0 a 4 anos, enquanto que em 1999-2000,
já eram 84% os casos de aids pediátrica
neste grupo etário.
História da aids- breve resumo
Pauperização da aids
Com base nos estudos-sentinela da infecção
pelo HIV em parturientes realizados no Brasil,
estimou-se que em 2000, 12.898 gestantes (0,4%
do total das gestantes brasileiras) estavam infectadas pelo HIV. Contudo, apenas 2.512 delas (ou
19,5% do número estimado de gestantes infectadas) receberam zidovudina (AZT) injetável no
momento do parto.
Interiorização da epidemia
A análise da expansão da epidemia, segundo
extratos referentes às populações dos diferentes municípios, mostra o seu início nos grandes
centros urbanos, mas que esses mesmos centros
detêm, a partir do final da década de 80, o menor
aumento relativo do crescimento. Observamos
que os maiores ritmos de crescimento da epidemia
vêm se dando, nos últimos anos, entre os municípios pequenos, com menos de 50.000 habitantes.
Evidentemente, nesses municípios a epidemia
ainda se encontra na fase inicial de expansão,
enquanto nos municípios com mais de 500.000
habitantes, com exceção da Região Sul, vem
ocorrendo o inverso, ou seja, uma desaceleração
da velocidade de crescimento.
Embora haja sinais de expansão recente
da epidemia entre os municípios predominantemente rurais, a epidemia no Brasil ainda é um
fenômeno urbano. Diferentemente do seu advento,
20 anos atrás, praticamente exclusivo aos grandes
centros urbanos da Região Sudeste, a epidemia
atual faz-se presente em quase 60% dos 5.548
municípios brasileiros, com disseminação maior
nos últimos anos entre municípios pequenos,
mais pobres e com menor renda per capita.
Pauperização da aids
A escolaridade é dado disponível na ficha
de notificação dos casos de aids. Este dado além
de permitir a avaliação do grau de instrução dos
portadores do HIV/aids, permite traçar, de forma
aproximada, o seu perfil socioeconômico. Até 1982,
a totalidade dos casos de aids com escolaridade
conhecida era de nível superior ou com até 11 anos
de estudo. Nos anos seguintes, observou-se um
nítido e progressivo aumento no registro
de casos com menor grau de instrução.
111
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
112
Capitulo 7
Em 1999/2000, observou-se que entre os pacientes com escolaridade reconhecida, 58,7% eram
analfabetos ou tinham até 8 anos de freqüência
às escolas, e apenas 23% apresentavam mais
de 11 anos de estudos ou curso superior. O número
de casos da doença aumenta entre homens e
mulheres com tempo de estudo escolar inferior
a dois anos. Entre os homens com mais de oito
anos de estudo a incidência diminui. O mesmo
não acontece com as mulheres.
Adolescentes e uso de drogas
Desde o início da epidemia, o grupo etário
mais atingido, em ambos os sexos, tem sido
o de 20 a 39 anos, perfazendo 70% do total de
casos de aids notificados (Ministério da Saúde,
2000). Cabe lembrar que o perfil epidemiológico
sempre retrata a infecção ocorrida há pelo menos
5 anos, em média, o que justifica plenamente
a inserção da população de adolescentes no rol
de preocupações dos que atuam na prevenção
do HIV/aids, especialmente no contexto da sua
associação ao uso de drogas.
As razões que facilitam a exposição do adolescente ao contágio do HIV por via sexual vêm
da própria característica deste grupo etário.
De maneira geral, os jovens entre 13 e 18 estão
à busca de uma identidade própria. Nesse
processo de crescimento, tendem a valorizar
novas experiências em detrimento da reflexão
e da percepção dos riscos que elas trazem.
Fatores e mecanismos psicológicos, estímulos
e condicionamentos sócio-culturais inerentes
ao adolescer, acabam por tornar esses jovens
mais vulneráveis à infecção. A rápida e extensa
difusão dos casos de usuários de drogas injetáveis, vem caracterizando uma interface preocupante entre aids e drogas, em determinadas
áreas geográficas, como as Regiões Sul e Sudeste
do País, refletindo diretamente no perfil mais
recente e na perspectiva de evolução da epidemia,
especialmente nestas regiões. Em 1984, 37% dos
casos de aids por transmissão sangüínea eram
atribuídos ao compartilhamento de agulhas
e seringas. Em 1999/2000, essa subcategoria
já representava 99% das ocorrências por transmissão sangüínea. Estudos realizados em vários
países demostraram que os jovens adolescentes
com menor nível socioeconômico e de instrução
escolar são mais suscetíveis às DST.
História da aids- breve resumo
Avanços terapêuticos e assistenciais
Justifica-se, portanto, a importância da implementação de programas voltados para a prevenção de comportamentos e práticas sexuais de
maior risco entre os adolescentes, principalmente
aqueles provenientes de extratos sociais mais
pobres, de níveis mais baixos de escolaridade
ou que sofrem qualquer tipo de exclusão social
e familiar.
Avanços terapêuticos e assistenciais
A partir de 1989, a estratégia de testagem
e aconselhamento passa a ocupar um lugar
de destaque nos programas de prevenção,
por meio dos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). A disponibilização do teste
para um maior número de pessoas tem sido uma
tendência constante, cada vez mais enfatizada.
O uso do teste para corroborar as estratégias
de prevenção, com enfoque na redução de risco
individual para prevenção da epidemia, atravessou a década de 90 com grande força. Até o ano
de 1996, o impacto da mortalidade por aids era
grande junto aos adultos em idade reprodutiva,
sendo a 4ª causa de óbito no grupo
de 20 a 49 anos.
Após 1997, com a terapia anti-retroviral disponibilizada para a população, esse quadro foi modificado, com retardo da evolução da doença até
a sua fase mais avançada. Como conseqüência
direta da política nacional de disponibilização
universal e gratuita de medicamentos para
portadores do HIV e pacientes de aids, caíram
sensivelmente as taxas de mortalidade pela
doença. Entretanto, a distribuição de medicamentos
não substituiu outras alternativas assistenciais
adotadas pelo Ministério da Saúde. O repasse
de recursos para os estados e municípios, por
meio do Programa de Alternativas Assistenciais,
possibilitou a implantação de projetos formados
por equipes multidisciplinares de profissionais
de saúde, como o Serviço de Assistência Especializada-SAE, nos ambulatórios, em que o paciente
encontra atendimento especializado, medicamentos e preservativos; o Hospital-Dia (HD),
em que o paciente recebe procedimentos
hospitalares durante algumas horas do dia;
e a Assistência Domiciliar Terapêutica (ADT),
onde o paciente é atendido no próprio domicílio.
113
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
114
Capitulo 7
A Portaria Ministerial de nº 166, de 31 de dezembro de 1997, institucionalizou a assistência
prestada por esses serviços, incluídos no Sistema
de Informações Ambulatoriais (SIA) entre os
procedimentos atendidos com recursos do (SUS)
Sistema Único de Saúde. A introdução da terapia
anti-retroviral e sua oferta gratuita nos serviços
de saúde pública, bem como a notificação dos
critérios de definição de caso têm permitido
que as pessoas com HIV/aids tenham uma maior
expectativa e melhor qualidade de vida.
Vulnerabilidade e prevenção
No ano de 1998, pesquisa sobre o “Comportamento Sexual da População Brasileira e Percepção do Risco para o HIV/aids” (Berquó et
al.,1999) foi conduzida em 183 microrregiões
urbanas do País, a partir de uma amostra de
3.600 indivíduos com idade entre 16 e 65 anos.
Essa pesquisa demonstrou que 80% dessas
pessoas são sexualmente ativas, sendo os homens
mais ativos sexualmente (87%) do que as mulheres (72%). Na faixa etária dos 26 aos 40 anos,
estão 89% da população sexualmente ativa.
Do total de pessoas sexualmente ativas,
81% haviam mantido relações estáveis nos
12 meses anteriores à coleta, 6% relações
eventuais, e 13% os dois tipos de relação.
Também foi registrado que, durante o mesmo
ano, 71% das mulheres haviam se relacionado
sexualmente com um único parceiro, contra
apenas 46% dos homens. No seu conjunto,
cerca de 35% das pessoas mantiveram relações
sexuais com dois ou mais parceiros e 6% tiveram
mais de cinco parceiros no mesmo período.
Também foi demonstrado que grande parte
da população já se “sentiu” de alguma forma
exposta à infecção pelo HIV; e que 20% já se
submeteram, espontaneamente, à testagem sorológica para o vírus da aids em serviços públicos
ou privados. A faixa etária que mais procurou os
testes foi a de 26 a 40 anos.
Adesão ao preservativo masculino
Em relação ao uso de preservativos masculinos,
a mesma pesquisa mostrou que 64% da população sexualmente ativa já usou ou tem usado
a camisinha, nos últimos 12 meses. Entre os
jovens e adultos (pessoas entre 16 e 65 anos
de idade que responderam o questionário),
esse percentual chega a 87%.
História da aids- breve resumo
Direitos humanos em HIV/aids
Um dado que merece especial atenção é o de que
48% dos que afirmaram ter usado ou estar usando
o preservativo, fizeram-no pela primeira vez nos
últimos 5 anos, o que demonstra uma adesão
crescente na utilização desse insumo de prevenção.
Efetivamente, dados da indústria de preservativos e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior revelam que, se em 1992
foram comercializados 50 milhões de preservativos no País, esse número chegou a 300 milhões
em 1998. A ampliação da aquisição e disponibilização gratuita de preservativos pelo Ministério
da Saúde foi de 18 milhões em 1993, aumentando
esse quantitativo gradativamente, até alcançar
300 milhões de unidades em 2002.
Direitos humanos em HIV/aids
Desde os anos 80, a luta pelos direitos das pessoas
com HIV/aids já era uma realidade do movimento
social organizado. Entretanto, um fato amplamente divulgado pelos meios de comunicação
fez com que os direitos dos portadores do HIV
assumissem proporções inéditas e fossem motivo
de polêmica entre a opinião pública: a atitude
preconceituosa de uma escola particular de São
Paulo, que impediu a matrícula de uma aluna
com aids (Sheila Cortopassi).
Em 1987, a aprovação do uso do AZT nos Estados
Unidos da América fez com que, no Brasil, grupos
sociais organizados provocassem a mobilização
da opinião pública, dos meios de comunicação
e das diferentes instâncias governamentais para
a efetivação de ações que garantissem o acesso
universal e gratuito a esse medicamento. Finalmente, esse direito foi conquistado em 1991,
possibilitando a todas as pessoas infectadas
um trata-mento adequado pela rede pública
de saúde. A partir de então, o argumento de que
o acesso aos medicamentos é uma questão dos
direitos humanos tem ganhado força e mobilizado governo e sociedade civil na consolidação
das políticas assistenciais, e levado o País a uma
liderança internacional inquestionável, na defesa
do direito à vida em detrimento de interesses
econômicos e políticos.
115
Guia de Prevenção das DST/Aids e Cidadania para Homossexuais
116
Capitulo 7
Pesquisas com vacinas
candidatas anti-HIV
A posição brasileira nos debates sobre a ética
dos ensaios de vacinas HIV/aids nos países em
desenvolvimento é bem clara. Existe um consenso
nacional, especialmente na Comissão Nacional
de Ética em Pesquisas (CONEP), subordinada
ao Conselho Nacional de Saúde do Ministério
da Saúde, de que somente serão admitidas
mudanças que tornem as declarações e resoluções internacionais cada vez mais capazes
de garantir a integridade dos seres humanos
participantes de pesquisas científicas em qualquer lugar do mundo. O objetivo geral do Plano
Nacional de Vacinas é estabelecer estratégias
para o desenvolvimento, avaliação, disseminação
de informações, disponibilização e produção de
vacinas seguras, eficazes e de custo acessível. Até
o presente momento, não existe conhecimento
de correlatos de imunidade a ponto de se definir
o que se espera de uma vacina anti-HIV. Entretanto, sabe-se que a vacina ideal deverá estimular
respostas imunológicas capazes de bloquear
a infecção por via sexual, intravenosa e maternofetal.
Ela ainda deverá produzir anticorpos que
neutralizem partículas virais livres, e também
provocar respostas imunológicas celulares
capazes de destruir células infectadas. Além
disso, é provável que sejam necessárias diversas
vacinas (ou verdadeiros “coquetéis”) para lidar
com os vários subtipos do HIV prevalentes nos
diversos países onde a epidemia
se faz presente.
Evolução da epidemia de Aids
1981
• Primeiros “olhares clínicos”(CDC)
• Primeiro nome:
“Síndrome do comprometimento Gay”
Total de casos: 1 em 1980, em São Paulo
1982
• Primeiro caso de transfusão sangüínea
• Doença dos 4 “Hs” – Homossexuais,
Hemofílicos, Haitianos, Heroinômanos
• Definição de grupos de risco e da aids,
ressaltando-se a sua elevada letalidade
• Concentração de casos na Califórnia:
agente contagioso ou fator relacionado
aos estilos de vida ?
• Fator de possível transmissão
por contato sexual, uso de drogas
ou exposição a sangue e derivados
• Primeiros 3 casos de aids registrados
(homens) no Rio de Janeiro
Total de Casos: 10
1983
• Relato de caso de possível transmissão
heterossexual
• Homossexuais usuários de drogas seriam
os difusores do “fator” para os heterossexuais
usuários de drogas
• Casos de aids em todo mundo
• Primeiras críticas ao termo
“grupos de risco”, das principais vítimas:
gays e Haitianos
• Primeiros 2 casos de aids no sexo
feminino no Brasil
Total de casos: 39
1984
• Disputa entre os grupos americano
(Robert Gallo – Science, 1983;
Human T-Leukemia Virus-HTLV-III)
e francês (Luc Montagner - Science, 1984;
Limphadenopathy Associated Virus-LAV)
– seriam o mesmo vírus?
• Caracterização da aids em termos
clínicos e epidemiológicos
• Primeiros 3 casos de aids registrados
em mulheres no Rio de Janeiro
Total de casos: 137
1985
• Diferentes estudos buscam meio
diagnóstico para a possível etiologia viral
• Caracterização dos
“comportamentos de risco”
• Nova definição de caso para a aids – CDC
• A aids é a fase final da doença
causada por um retrovírus
• LAV e o HTLV-III: mesmo vírus,
definido então como Human
Immunodeficiency Virus (HIV)
• Primeiro caso de transmissão perinatal
Total de casos: 573
1986
• Primeiros sistemas classificatórios
incorporando dados laboratoriais
(sorologia e CD4+) e clínicos com
objetivos relacionados à saúde pública
• Facilita-se a comunicação sobre a doença
(notificação e vigilância da doença,
estudos epidemiológicos, atividades
de prevenção e controle e políticas
de planejamento)
• Criação do Programa Nacional
de DST e Aids
• Criação da Comissão Nacional de Aids
Total de casos: 1.192
1987
• Uso e repercussões dos testes ELISA
e Western Blot no diagnóstico
• Questiona-se a definição
de comportamentos sexuais
tidos como “anormais”
• Nova definição de caso para a aids (CDC)
visando melhor acompanhar a doença,
simplificar a notificação e aumentar
sua especificidade
• Surgimento do AZT no cenário internacional
• Definição de casos em indivíduos de 13 anos
ou mais (publicada apenas em 1992)
Total de casos: 2.813
1988
• Promulgação da Constituição de 1988
• Criação do Sistema Único de Saúde
• Participação efetiva de ONG
no combate à epidemia
• MS inicia o fornecimento de medicamentos
para tratamento das infecções oportunistas
Total de casos: 4.53
1989
• Critério de Definição de Caso de Aids
OPAS/Caracas
Total de Casos: 6.295
1991
• Inicia-se o processo para a aquisição
e distribuição de anti-retrovirais
Total de casos: 11.805
1992
• Classificação da infecção pelo HIV
– Categorias Clínicas (CDC)
• MS inclui os procedimentos para
o tratamento da aids na tabela do SUS
• Início do credenciamento de hospitais
para o tratamento da aids
• Critério de definição de casos de aids
em adultos e adolescentes
Total de casos: 14.924
1993
• Revisão dos critérios para definição
de casos de aids para adolescentes
e adultos (CDC)
• Início da implantação de fato do SINAN
– Sistema Nacional de Informações
sobre Agravos e Notificações.
Total de casos: 16.760
1994
• Redefinição dos critérios de classificação
da infecção pelo HIV em crianças (CDC)
• åAcordo com o Banco Mundial –
impulso às ações previstas pelo MS
• Definição de casos de aids em crianças
Total de casos: 18.224
1995
• Opções consolidadas para o tratamento
anti-retroviral até este momento:
AZT, ddI e ddC
• Aparecimento dos primeiros
inibidores de protease
• Até este ano a assistência medicamentosa
era bastante precária
• Inclusão do critério óbito para definição
de casos de aids
Total de casos no Brasil: 19.980
1996
• Primeiro consenso em terapia
anti-retroviral
• Lei brasileira determina o direito
ao recebimento de medicação gratuita
• Disponibilização do AZT venoso
na rede pública de saúde
• Queda das taxas de mortalidade por aids
Total de casos no Brasil: 22.343
1997
• Implantação da Rede Nacional
de Laboratórios para a realização
de exames de da carga viral e contagem
de linfócitos (T CD4+)
• Início da implantação do Sistema
de Controle Logístico de Medicamentos
(SICLOM)
• Pojeto Sentinela: vigilância epidemiológica
ativa em frações representativas
de heterossexuais sob risco
• Estabilização da epidemia a partir deste ano:
coeficientes de incidência em torno
de 12 por 100.000 hab. ano
• Início da produção nacional de ddC e de D4T
e da distribuição gratuita de Indinavir e D4T
Total de casos no Brasil: 22.593
1998
• Medicamentos disponíveis: AZT, 3TC,
AZT+3TC, ddI, ddC, d4T, Nevirapina ,
Saquinavir, Indinavir, Ritonavir, Nelfinavir
• Lei define como obrigatória a cobertura
pelos seguros-saúde privados de despesas
hospitalares com aids (não assegura
tratamento anti-retroviral)
• Laboratórios públicos passam a produzir ddI.
Início da distribuição gratuita
de Nelfinavir, Nevirapina e Delavirdina
Total de casos (até agosto 1999): 22.102
1999
• Medicamentos disponíveis: AZT, 3TC,
AZT+3TC, Abacavir, ddI, ddC, d4T,
Nevirapina, Delavirdina,Efavirenz,
Saquinavir, Indinavir, Ritonavir,
Nelfinavir, Amprenavir
• Implantação da Rede Nacional de Estudos
da Resistência do HIV aos anti-retrovirais
Total de casos(até junho 2000 ): 17.806
2000
• Nova ficha de notificação de caso
de aids em crianças
• Implementação do Sistema de Vigilância
do HIV para Gestantes e Crianças Expostas
• O Brasil começa a produzir Indinavir
e a Nevirapina. Assim, já são 7, dos 12 ARVs
distribuídos nacionalmente, que são
produzidos no País.
• O Programa Brasileiro de Aids é destacado
internacionalmente pela sua política
de distribuição gratuita de medicamentos
a todos os pacientes
Total de casos 13.933 (até março 2001)
2001
• Em junho, em nota conjunta dos governos
norte-americano e brasileiro, é declarado
o acordo no qual os EUA retiram queixa
contra o Brasil na Organização Mundial
do Comércio – OMC, referente à Lei
de Patentes.
História da
Homossexualidade no Brasil
Declaração Universal
Direitos Humanos
Direitos Fundamentais
das Pessoas que Vivem
com HIV/Aids
Direitos Sexuais
Grupos Homossexuais no Brasil
Referências Bibliográficas
Anexos
História da homossexualidade no Brasil - principais destaques
1532
• Nas Cartas Régias de doação das capitanias
hereditárias o Rei determina a pena de morte
aos sodomitas sem ter de consultar
a Metrópole
1580
• Fernão Luiz, professor mulato, morador
na Bahia, mata seu jovem parceiro
e sua família para não ser denunciado
à Inquisição: é a primeira reação conhecida
de um sodomita do Brasil para escapar
da ameaça da Inquisição
1591
• Francisco Manicongo, escravo africano,
primeiro travesti do Brasil, Salvador
1592
• Felipa de Souza, a primeira lésbica
a ser açoitada publicamente pela Inquisição
no Brasil (Bahia)
1821
• Extinção da Inquisição e fim da pena
de morte contra os sodomitas
1830
• Código Penal do Império Brasileiro
exclui o crime de sodomia
1859
• Publicação do livro “O Bom Crioulo”,
do escritor cearense Adolfo Caminha,
o primeiro romance das Américas
a tratar de forma realista do homoerotismo
1894
• O termo “lésbica” é publicado no Brasil
pela primeira vez em Pires de Almeida,
“Homossexualismo, a libertinagem”
no Rio de Janeiro
1914
• Publicação do livro “O Menino Gouveia”,
primeiro conto homoerótico brasileiro
1932
• Prisão de 195 homossexuais pela Polícia Civil
do Rio de Janeiro para serem objeto de
estudo do Dr. Leonídio Ribeiro, do Instituto
de Identificação
1959
• Primeiro jornal gay do Brasil “Snobe” (RJ)
1971
• Primeira operação transexual no Brasil
realizada pelo Dr. Roberto Farina
1977
• João Antônio Mascarenhas, advogado
gaúcho, convida Winston Leiland, Editor
do “gay Sunshine” (São Francisco/EUA)
para conferências no Brasil: é o primeiro
ato político de fundação do Movimento
Homossexual Brasileiro
1978
• Fundação do jornal “Lampião da Esquina”,
que contou com 37 números, extinguindo-se
em 1981, sendo um importante e pioneiro
veículo de comunicação que possibilitou
a discussão da homossexualidade
nesse período político do País
• Fundação do Grupo Somos (São Paulo),
primeira aparição pública na Universidade
de São Paulo em fevereiro/1979
1979
• Fundação do Grupo de Atuação
e Afirmação Gay, Baixada Fluminense, RJ
• No Rio de Janeiro realiza-se o
“I Encontro de Homossexuais Militantes”
1980
• Fundação do Grupo Gay da Bahia (Salvador)
• Primeira passeata com a participação
de homossexuais em São Paulo e em março
realiza-se o “I Encontro Brasileiro
de Homossexuais”
• Morre Pascoal Carlos Magno, teatrólogo
e embaixador, fundador do Teatro do
Estudante do Brasil (RJ), homossexual
assumido e discriminado pelo Itamaraty,
no tempo da ditadura
1981
• Primeira celebração do
Dia do Orgulho Gay em Salvador
• Início da campanha contra o Código 302. 0
da OMS que rotulava o “homossexualismo”
como desvio e transtorno sexual
obtendo-se 16 mil assinaturas
1982
• Em São Paulo realiza-se o
“I Encontro Paulista de Grupos
Homossexuais”
1984
• Realiza-se em Salvador o
“II Encontro Brasileiro de Homossexuais”
1985
• O Conselho Federal de Medicina retira
“homossexualismo” da classificação
de doenças
1986
• O Grupo Triângulo Rosa (RJ), o GGB (BA)
e o Libertos (SP), iniciam campanha junto
à Constituinte pela inclusão da proibição
de discriminação por orientação sexual
na Constituição
1987
• João Antônio Mascarenhas é o primeiro
homossexual brasileiro a ser convidado
a falar no Congresso Nacional, debatendo
sobre a inclusão da orientação sexual
na Constituição
1989
• Realiza-se no Rio de Janeiro o
“III Encontro Brasileiro de Homossexuais”
1990
• Salvador é a primeira cidade da América
Latina a proibir discriminação por
orientação sexual na Lei Orgânica Municipal,
seguida de mais 72 municípios e nas
Constituições de Sergipe e Mato Grosso
• Realiza-se em Aracajú o
“IV Encontro Brasileiro de Homossexuais”
1991
• Realiza-se em Recife o
“V Encontro Brasileiro de Homossexuais”
1992
• Realiza-se no Rio de Janeiro o
“VI Encontro Brasileiro de Homossexuais”
1993
• O Grupo Dignidade (PR) é o primeiro grupo
a ser declarado de Utilidade Pública Estadual
• Em Cajamar (SP) realiza-se o
“VII Encontro de Lésbicas e Homossexuais”
• Renildo José dos Santos,
Vereador de Coqueiro Seco, Alagoas,
é assassinado após bárbara tortura,
seu nome foi conferido ao Prêmio
da Associação Bissexual da Austrália
• Primeiro Encontro Nacional de Travestis
e Liberados (ENTLAIDS) no Rio de Janeiro
1994
• Aprovada a Lei Municipal
contra a discriminação por orientação sexual
em Porto Alegre, iniciativa do Grupo
Nuances
1995
• Fundação da Associação Brasileira de Gays,
Lésbicas e Travestis (ABGLT) em Curitiba,
com a presença de 120 participantes
• Em Curitiba realiza-se o
“VIII Encontro Brasileiro de Gays e Lésbicas”
1996
• Pela primeira vez os homossexuais são
citados num documento oficial do Governo,
no Plano Nacional de Direitos Humanos
• Realiza-se no Rio de Janeiro o
“I Seminário Nacional de Lésbicas”
1997
• Conselho Federal de Medicina
autoriza operação de transexuais
• Realiza-se em São Paulo o
“IX Encontro Brasileiro de Gays,
Lésbicas e Travestis”
1998
• Morre João Antônio Mascarenhas,
Fundador do Movimento Homossexual
Brasileiro
• Eleição do primeiro mandato de Kátia
Tapety, primeira travesti a ser eleita
vereadora em Colônia do Piauí/PI .
1999
• Conselho Federal de Psicologia aprova
resolução proibindo que psicólogos
participem de clínicas ou terapias visando
“curar” homossexuais
• Fundação em São Paulo do Fórum de HSH,
envolvendo ONG e OG com trabalhos
de prevenção das DST/HIV/aids
Fundação em São Paulo do Fórum de HSH,
envolvendo ONG e OG com trabalhos
de prevenção das DST/HIV/aids
2000
• Edson Néris é barbaramente assassinado
na Praça da República em SP,
por um grupo de néo-nazistas:
é o crime homofóbico de maior
repercussão nacional
• O INSS concede o direito previdenciário
de pensão aos parceiros gays por
falecimento ou detenção, iniciativa
do Grupo Nuances (RS)
2001
• Assembléias Legislativas de São Paulo
e Minas Gerais aprovam leis contra
a homofobia
• Realiza-se em Maceió o
“X Encontro Brasileiro de Gays,
Lésbicas e Travestis”
• Câmara Municipal de Recife estende aos
parceiros de funcionários homossexuais
a equiparação de direitos previdenciários
• Fundação, em dezembro,
da Associação Nacional das Travestis
Declaração universal dos direitos humanos
“Todos nascemos livres e somos iguais
em dignidade e direitos”.
“Todos temos direito à informação verdadeira
e correta”.
“Todos temos direitos à vida, à liberdade
e à segurança pessoal e social”.
“Todos temos direito de ir e vir,
mudar de cidade, de Estado ou País”.
“Todos temos direito de resguardar a casa,
a família e a honra”.
“Todos temos direito de não sofrer nenhum
tipo de discriminação”.
“Todos temos direito ao trabalho digno
e bem remunerado”.
“Ninguém pode ser torturado ou linchado.
Todos somos iguais perante a lei”.
“Todos temos direito ao descanso,
ao lazer e às férias”.
“Ninguém pode ser arbitrariamente preso
ou privado do direito de defesa”.
“Todos temos à saúde e assistência
médica e hospitalar”.
“Toda pessoa é inocente até que a justiça,
baseada na lei, prove a contrário”.
“Todos temos direito à instrução, à escola,
à arte e à cultura”.
“Todos temos liberdade de pensar,
de nos manifestar, de nos reunir e de crer”.
“Todos temos direito ao amparo social
na infância e na velhice”.
“Todos temos direito ao amor
e aos frutos do amor”.
“Todos temos direito à organização popular,
sindical e política”.
“Todos temos o dever de respeitar
e proteger os direitos da comunidade”.
“Todos temos direito de eleger e ser
eleito às funções de governo”.
“Todos temos o dever de lutar pela
conquista e ampliação destes direitos”.
Direitos fundamentais das pessoas que vivem com HIV/aids1
“A lei protege todos os indivíduos igualmente;
em conseqüência, você não deve sofrer
nenhum tipo de discriminação”.
“Viver com HIV ou aids não é impedimento
para o exercício da sexualidade com segurança”.
“Você não é obrigado a fazer exame anti-HIV
nem a declarar que é soropositivo. Se por
vontade própria decidir realizar o exame você
tem o direito de fazê-lo de forma anônima e
que os resultados do mesmo sejam guardados
com absoluto sigilo”.
“Quando for procurar emprego, você não
poderá ser obrigado a fazer o exame antiHIV”.
“Em nenhum caso você pode ser detido
forçadamente, isolado, sofrer segregação
social ou familiar pelo fato de viver com HIV
ou ter desenvolvido aids”.
“O seu livre trânsito pelo território nacional
não poderá ser restrito”.
“Caso queira casar-se, você não poderá ser
obrigado a fazer o exame anti-HIV”.
1
Organização das Nações Unidas - 1978
“Você não pode ser cerceado do direito a
educação, lazer, religião, etc., em qualquer
instituição pública ou privada.”
“Você tem o direito de associar-se livremente
com outras pessoas ou filiar-se a instituições
que tenham como finalidade a proteção dos
interesses daqueles que vivem com HIV
ou que tenham desenvolvido aids”.
“Você tem o direito de buscar, receber e difundir informações precisas e documentadas
sobre
os meios de transmissão do HIV e a forma
de proteger-se”.
“Se você é soropositivo tem o direito de receber
informações sobre aids, suas conseqüências
e tratamentos aos quais poderá submeter-se”.
“Você tem direito aos serviços de assistência
médica e social que tenha como objetivo
melhorar sua qualidade e tempo de vida”.
“Você tem direito a uma atenção médica digna
e seu prontuário médico deverá ser manuseado de forma confidencial”.
“Como qualquer ser humano, você tem direito
a uma morte e serviço funerário dignos”.
Direitos sexuais2
“Direito à liberdade sexual: a liberdade sexual
diz respeito à possibilidade dos indivíduos em
expressar seu potencial sexual. No entanto,
aqui se excluem todas as formas de coerção,
exploração e abuso em qualquer época
ou situações de vida”.
“Direito à autonomia sexual. integridade
sexual e à segurança do corpo sexual: esse
direito envolve a habilidade de uma pessoa
em tomar decisões autônomas sobre a própria
vida sexual num contexto de ética pessoa
e social. Também inclui o controle e o prazer de
nossos corpos livres de tortura, mutilação
e violência de qualquer tipo”.
“Direito à privacidade sexual: o direito às
decisões individuais e aos comportamentos
sobre intimidade desde que não interfiram nos
direitos sexuais dos outros”.
2
“Direito à igualdade sexual: liberdade de todas
as formas de discriminação, independentemente do sexo, gênero, orientação sexual,
idade, raça, classe social, religião, deficiências
mentais ou físicas”.
“Direito ao prazer sexual: prazer sexual,
incluindo autoerotismo, é uma fonte de bem
estar físico, psicológico, intelectual e espiritual”.
“Direito à expressão sexual: a expressão sexual
é mais que um prazer erótico ou atos sexuais.
Cada indivíduo tem o direito de expressar
a sexualidade através da comunicação, toques,
expressão emocional e amor”.
“Direito à livre associação sexual: significa
a possibilidade de casamento ou não,
ao divórcio, e ao estabelecimento de outros
tipos de associações sexuais responsáveis”.
Petchesky,R. (1999) Direitos Sexuais: um novo conceito na prática política internacional. In: Barbosa, R. e Parker,
R. Sexualidades pelo avesso: direitos, identidades e poder, São Paulo. Editora 34
“Direito às escolhas reprodutivas livres
e responsáveis: é o direito em decidir ter ou
não ter filhos, o número e o tempo entre cada
um, e o direito total aos métodos de regulação
da fertilidade”.
“ Direito à informação baseada no
conhecimento científico: a informação
sexual deve ser gerada através de um processo
científico e ético e disseminado em formas
apropriadas e a todos os níveis sociais”.
“Direito à educação sexual compreensiva:
esse é um processo que dura a vida toda, desde
o nascimento, pela vida afora e deveria
envolver todas as instituições sociais”.
“Direito à saúde sexual: o cuidado com a saúde
sexual deve estar disponível para a prevenção
e tratamento de todos os problemas sexuais,
preocupações e desordens”.
Grupos homossexuais no Brasil
Região Norte
Associação Amazonense de Gays,
Lésbicas e Travestis
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (92) 234 2275
Movimento Homossexual de Belém
telefone: (91) 456 8119
Região Nordeste
Grupo Lésbico da Bahia
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (71) 395 6666
Grupo Dialogay de Sergipe
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (79 214 7217
Unidas
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (79) 3041 3071
Associação das Travestis do Ceará
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (85) 494 5471
Grupo Gay de Alagoas
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (82) 221 0667
Grupo de Resistência Asa Branca
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (85) 281 9081
Pró-Vida
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (82) 221 0667
Associação das Travestis de Salvador
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (71) 321 1848
Grupo Habeas Corpus Potiguar
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (84) 611 1220
Grupo Gay da Bahia
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (71) 321 6714
Movimento do Espírito Lilás
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (83) 241 3921
Região Centro-Oeste
Região Sudeste
Associação Goiana de Gays,
Lésbicas e Travestis
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (62) 213 6222
Associação da Parada de Orgulho GLBT
de São Paulo
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (11) 3362 2361
Associação Ipê Rosa
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (62) 224 2444
Grupo Corsa
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (11) 3773 5514
Associação de Travestis
do Mato Grosso do Sul
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (67) 272 8299
Atobá – Movimento de Emancipação
Homossexual
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (21) 2331 1527
Atitude
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (61) 327 3186
Rede de Informação Um Outro Olhar
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (11) 3735 1035
Grupo Estruturação
correio eletrônico:
[email protected]
telefone: (61) 327 3186
Coletivo de Feministas Lésbicas
de São Paulo
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (11) 3104 8379
Grupo Arco-Iris
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (21) 2552 5995
Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (21) 2517 3290
Grupo Felipe de Sousa
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (21) 225 24700
Associação Lésbica de Minas
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (31) 3439 9780
Movimento Gay de Minas
correio eletrônico:[email protected]
telefone: (32) 3215-1575
Região Sul
Associação Brasileira de Gays,
Lésbicas e Travestis
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (82) 235 4699
Associação Nacional das Travestis
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (41) 323 7825
Grupo Esperança
correio eletrônico:
[email protected]
telefone: (55) 421 1162
Instituto Arco-Iris
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (48) 224 9235
InPAR
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (41) 324 9501
Grupo Gay de Blumenau
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (47) 326 6970
Grupo Dignidade
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (41) 222 3999
Grupo Igualdade
correio eletrônico: [email protected]
telefone: (51) 3211 3849
Nuances
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Rede de Informação Um Outro Olhar
Referências bibliográficas
145
Sobre os autores
Francisco Pedrosa
Jornalista, mestrando em Políticas Públicas e Sociedade
na Universidade do Estado do Ceará. Diretor do Grupo
de Resistência Asa Branca (GRAB), de Fortaleza.
Glademir Lorenzi e Célio Golin
NUANCES – Pela Livre Orientação Sexual,
de Porto Alegre/RS.
Jacqueline Rocha
Transexual que já passou pela redesignação de sua genitália. Educadora, formada pela Universidade de Michigan/
USA. Militante no combate à aids desde 1995. Integrante
da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/aids de
São José do Rio Preto. Representante da Rede Latinoamericana de Pessoas Vivendo com HIV/aids na Rede
Global de Pessoas Vivendo com HIV/aids –
Global Network of PLWA.
Janaína Dutra
Advogada. Vice-presidente e Assessora Jurídica do Grupo
de Resistência Asa Branca (CE). Presidente da Associação
de Travestis do Ceará. Coordenadora da Região Nordeste
da Associação Nacional de Travestis.
Kátia Guimarães
Psicóloga. Pesquisadora Associada do Núcleo de Estudos
de Saúde Pública da Universidade de Brasília. Doutoranda
em Ciências de Saúde da UnB. Assessora Técnica da Secretaria Executiva da Articulação de Mulheres Brasileiras.
Lilia Rossi
Jornalista, mestre em Comunicação Social. Assessora
Técnica da Unidade de Prevenção, da Coordenação
Nacional de DST e aids do Ministério da Saúde.
Liza Minelly e Salange Stercz
Associação Nacional de Travestis, Curitiba, PR.
Luis Felipe Rios
Psicólogo, mestre em Antropologia e doutorando em Saúde
Coletiva, no Instituto de Saúde Coletiva da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Assessor de Projetos da
Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA).
Luiz Ramires (Lula)
Formado em Filosofia pela Universidade de São Paulo,
com pós-graduação em Antropologia pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Tradutor técnico e professor
de inglês. Presidente do CORSA – Cidadania, Orgulho,
Respeito, Solidariedade e Amor e membro da Associação
da Parada de Orgulho GLBT de São Paulo.
Luiz Mott
Doutor em Antropologia. Professor Titular do Departamento de Antropologia da Universidade Federal da Bahia.
Presidente do Grupo Gay da Bahia. Secretário Acadêmico
da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis.
Membro da Comissão Nacional de Aids do Ministério
da Saúde.
Miriam Martinho Rodrigues
Jornalista, tradutora e editora da Revista Um Outro
Olhar e do Boletim Ousar Viver (São Paulo, SP),
dirigidos à população de mulheres que se relacionam
com mulheres.
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