Centro Cultural e Auditório de S. Cipriano Memória Descritiva e Justificativa 1. Preâmbulo O concelho de Resende é dotado de um enorme e valioso património histórico, cultural e antropológico. As suas terras, fortemente ligadas à fundação da nacionalidade, doadas a D. Egas Moniz por D. Afonso Henriques em 1130, apresentam inúmeros testemunhos ancestrais, desde a presença de povos primitivos à passagem dos Romanos pela Península. Com uma vasta frente ribeirinha do Rio Douro, o território desce desde o planalto da Serra do Montemuro, recortado por vales de ribeiros de traçados caprichosos, originando belas variantes de paisagem natural e construída. Monumentos megalíticos, belíssimas igrejas românicas, imponentes solares, pontes e aldeias serranas, fazem de Resende um testemunho de grande valor arqueológico, histórico e social. A Câmara Municipal de Resende, no intuito de valorização deste património humano e construído, tem por objectivo, a implementação de equipamentos capazes de congregar todas essas potencialidades intrínsecas dos diversos locais, fazendo reflectir os seus valores naturais, paisagísticos, históricos e etnográficos, criando novas dinâmicas, e constituindo pólos de actividade culturais e turísticas, que contribuam determinantemente para a afirmação do concelho. Foi neste contexto que a autarquia decidiu promover os estudos necessários à construção de um Centro Cultural e Auditório, numa das freguesias mais dinâmicas, S. Cipriano, com um elevado legado patrimonial e forte potencial turístico, tradicionalmente ligada à música pelas suas bandas filarmónicas e indissociavelmente relacionada com a obra do escritor Eça de Queiroz através da Casa da Torre da Lagariça. O programa definido deve-se não só à resposta funcional de uma carência local, mas principalmente às potencialidades que um equipamento com estas características, ancorada, a toda uma série de factores culturais e turísticos, pode produzir a nível local, transformando-se simultaneamente num elemento de referência regional. 2. Enquadramento Geral A freguesia de S. Cipriano situa-se na vertente nascente do vale do rio cabrum, afluente do Douro e elemento divisor dos concelhos de Resende e Cinfães. De povoamento disperso e características rurais, esta povoação faz a transição entre a zona ribeirinha do concelho, com as termas de Caldas de Aregos a norte, e a sua parte serrana, marcada pelas pequenas aldeias implantadas nos contrafortes da serra do Montemuro e no seu planalto. Na envolvente próxima destacam-se a presença da Ponte da Lagariça sobre o ribeiro Cabrum, a Casa da Torre da Lagariça e a Estação arqueológica do Penedo de S. João. 3. Caracterização O terreno com cerca de 4600 m2, localiza-se à entrada de S. Cipriano num terreno fronteiro a um arruamento de acesso ao centro cívico da freguesia, onde se situam os edifícios da Junta de Freguesia, Escola Primária, Jardim-de-Infância e Igreja. O terreno apresenta uma pendente constante, delimitada a Norte e Poente por um caminho público de utilização pedonal, e a sul pela Estrada Municipal, que passa a uma cota superior da zona de implantação do futuro equipamento, orientado-se para o vale do rio Cabrum e usufruindo de uma franca exposição solar. 4. Sinopse A proposta apresentada teve por base a procura de uma elementaridade funcional e estrutural que contrariasse a complexidade programática de um edifício com estas características, ao mesmo tempo que procura introduzir na paisagem um carácter iconográfico de sentido público, sem recorrer a jogos de volumetria ou à diversidade de materiais, para a sua afirmação. O edifício proposto, uma caixa com cerca de 36 metros de comprimento, 12 metros de largura e altura, de imagem sóbria, quase abstracta, implanta-se segundo o eixo SE-NE, acompanhando o desnível existente no terreno, para a disposição da inclinação da sala do auditório. Uma rígida modulação de 6 x 6 metros (na qual se apoiou a estrutura do edifício), como os seus múltiplos e submúltiplos, determinou e desenhou os espaços, minimizando áreas de circulação excedentárias e privilegiando as áreas de utilização colectiva, que se distribuem por três pisos, um dos quais em semi-cave. 5. Piso 0 A abordagem ao edifício é feita através de uma pequena praça sobre um socalco, transversalmente localizada a uma cota inferior à rua principal existente, e que serve a entrada principal do equipamento. O foyer foi concebido como elemento central do edifício, a partir e em volta do qual todos os espaços se relacionam directamente entre si. A partir daqui, o futuro utente do edifício, percepcionará todos os seus núcleos funcionais. Este quadrado central, de pédireito duplo, é iluminado zenitalmente por um lanternim que reforça a componente fundamental deste espaço e estrutura e relaciona todas as actividades programáticas do equipamento. Neste piso, e de um dos lados do foyer, localizar-se-ão a escada de acesso aos pisos inferior e superior, axialmente localizada e apoiada por um elevador / monta-cargas, e laterizada por espaços de apoio, como o bengaleiro, cafetaria, copa e um pequeno gabinete. 6. Auditório Do lado oposto, o auditório. Com capacidade para 194 pessoas sentadas, foi idealizado para permitir a sua utilização nas mais variadas manifestações artísticas ou culturais, permitindo acolher apresentações de grupo recreativos locais, a cinema, espectáculos de música, dança ou itinerante de teatro. Antecedendo os corredores laterais de acesso às bancadas, situam-se as cabines de projecção e de tradução simultânea, prevendo uma forte utilização do auditório no âmbito de conferências, palestras e simpósios. A sala desenvolve-se em degraus, com cerca de 30% de inclinação até ao palco, onde se localizam duas saídas de emergência. A configuração do tecto da sala, em três níveis diferentes, deve-se aos requisitos acústicos colocados na sua concepção. A grande particularidade da sala reside na grande caixilharia em vidro proposta sobre o palco, através da qual se pode apreciar de uma forma cómoda e controlada a magnífica paisagem do vale do ribeiro Cabrum. A sala é ainda dotada, ao nível do piso inferior, através do palco, de uma zona de preparação de cena, com camarins para artistas e respectivo vestiário. 7. Piso Sobre o grande átrio e em volta deste, concebeu-se uma sala em galeria aberta para o piso inferior, usufruindo da luz filtrada do grande lanternim central, e que terá como principal função a utilização como espaço de exposições, embora, pela sua forma, possa ser utilizada noutras actividades, como sala de leitura ou “workshops”. Ainda neste piso, e em cada um dos vértices deste quadrilátero, localizar-se-ão gabinetes de apoio e uma sala de reuniões para a administração do edifício, iluminadas naturalmente através de um lanternim na cobertura à semelhança da escada central. 8. Piso –1 Neste nível, para além das baterias de sanitários públicos e balneário de pessoal, foi consagrado uma sala de utilização polivalente, que poderá ser utilizada por grupos em sessões de trabalho, e que tem como principal vocação, dado o cuidado no tratamento acústico, a sua utilização como sala de ensaio musical das duas bandas filarmónicas existentes na freguesia. Este espaço é devidamente apoiado por espaços para arrecadação de instrumentos e sanitários de apoio. Esta condicionante funcional, obrigou à criação de uma entrada independente ao edifício por este piso, feita através de um jogo de escadas e bancadas em pedra, que origina um pequeno anfiteatro ao ar livre e um pátio, que poderão ser utilizados para ensaios das bandas no exterior, para pequenas representações do teatro infantil, ou simplesmente para usufruto da população local. 9. Programa Piso 0 Vestíbulo – Foyer – Bengaleiro – Elevador – Cafetaria – Copa – Gabinete – Atendimento – Cabines de Tradução – Cabine de Projecção / Régie – Auditório (194 lugares sentados) Piso 1 Sala de Exposições / Salas de Estudos / Biblioteca – Elevador – Gabinetes – Sala de reuniões Piso –1 Sala de Ensaio / Pequenas Conferências / Workshops – Anfiteatro ao Ar livre – Salas de Apoio - Sanitários – Balneário – Arrecadação – Palco – Preparação de Cena – Camarins – Vestiário – Posto de Transformação – Sala de Quadros – Central Térmica 10. Arranjos Exteriores A intervenção nos espaços exteriores sustentou-se em duas preocupações fundamentais. Por um lado a intenção de não desvirtuar a morfologia preexistente do terreno, minimizando os movimentos de terra; Por outro, a necessidade de criar acessos francos ao edifício, sejam pedonais ou automóveis. Para isso, a solução recorre a muros de contenção com características semelhantes aos vulgarmente utilizados nos socalcos existentes dos campos de cultivo que dominam toda a envolvente. O acesso pedonal ao equipamento é feito através de uma rampa e escadas, que desembocam numa plataforma longitudinal sob a qual se localiza a central técnica. O acesso automóvel para parqueamento ou cargas e descargas, é igualmente feito por uma rampa. Em toda a restante superfície propõem-se uma sementeira de prado de reduzida manutenção, e a Sul, no alçado lateral do edifício, considera-se um pequeno maciço arbóreo que originará um pequeno parque. Propõe-se a reformulação de todo o arruamento existente à cota superior, redefinindo o seu perfil e introduzindo baias de estacionamento e alinhamentos de árvores de médio porte. 11. Equipamentos e Acabamentos A opção foi para a utilização no exterior de materiais recorrentes na região e que fazem parte do léxico das construções populares de maior qualidade arquitectónica existentes na envolvente, nomeadamente a madeira, em ripado a revestir toda a caixa pelo exterior, e o granito nos muros e embasamento do edifício. No interior também se procurou minimizar a variedade de acabamentos, pelo que será utilizado um único tipo de pavimento (autonivelante) em todos os espaços, (com excepção da sala do auditório e todo o piso superior que será em soalho de madeira) e a utilização de gesso cartonado no revestimento de paredes de alvenaria e tectos, ou mesmo formando tabiques. Os vãos, aros, rodapés e lambris, serão em madeira pintada. A cobertura será em zinco camarinha. Todas as caixilharias exteriores e lanternins serão em alumínio. A central técnica do edifício, localizada no piso inferior, será composta pelo Posto de Transformação, Sala de Quadros Eléctricos e UTA’s, devidamente dimensionadas para um equipamento desta natureza. O Chiller, localizar-se-á no exterior do edifício, tal como o depósito de gás. O projecto de execução foi elaborado respeitando e cumprindo os regulamentares em vigor, em especial o Decreto Regulamentar 34/95 de 16 de Dezembro – Regulamento das Condições Técnicas e de Segurança dos Recintos de Espectáculos – e, entre outros, o Decreto-Lei 123/97 de 22 de Maio – Normas Técnicas para a Eliminação de Barreiras Arquitectónicas. Junho de 2006 Paulo Moura (Arquitecto)