UNIBAN – EDUCAÇÃO e SOCIEDADE – CURSO DE PEDAGOGIA

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UNIBAN – EDUCAÇÃO e SOCIEDADE – PEDAGOGIA
Unidades: A corrente funcionalista pressupostos, método sociológico e conceitos
básicos. Durkheim e a questão da anomia (8.1)
DURKHEIM (1858-1917)
Também para Durkheim a questão da ordem social seria uma preocupação
constante. De forma sistemática, ocupou-se com estabelecer o objeto de estudo da
Sociologia, assim como indicar o seu método de investigação. É através dele que a
Sociologia penetrou a Universidade, conferindo a esta disciplina o reconhecimento
acadêmico.
Sua obra foi elaborada num período de constantes crises econômicas, que
causavam desemprego e miséria entre os trabalhadores, ocasionando o aguçamento das
lutas de classes, com os operários passando a utilizar a greve como instrumento de luta e
fundando os seus sindicatos. Não obstante esta situação de conflito, o início do século XX
também é marcado por grandes progressos no campo tecnológico, como a utilização do
petróleo e da eletricidade como fontes de energia, o que criava um certo clima de euforia e
de esperança em torno do novo progresso econômico.
Vivendo em uma época em que as teorias socialistas ganhavam terreno, Durkheim
não podia desconhecê-las, tanto que as suas idéias, em certo sentido, constituíam a
tentativa de fornecer uma resposta às formulações socialistas. Discordava das teorias
socialistas, principalmente quanto à ênfase que elas atribuíam aos fatos econômicos para
diagnosticar a crise das sociedades européias. Durkheim acreditava que a raiz dos
problemas de seu tempo não era de natureza econômica, mas sim uma certa fragilidade
moral da época em orientar adequadamente o comportamento dos indivíduos. Com isto,
procurava destacar que os programas de mudança esboçados pelos socialistas, que
implicavam modificações na propriedade e na redistribuição da riqueza, ou seja, medidas
acentuadamente econômicas, não contribuíam para solucionar os problemas da época.
Para ele, seria de fundamental importância encontrar novas idéias morais capazes
de guiar a conduta dos indivíduos. Compartilhava com Saint-Simon a crença de que os
valores morais constituíam um dos elementos eficazes para neutralizar as crises
econômicas e as políticas de sua época histórica. Acreditava também que era a partir deles
que se poderia criar relações estáveis e duradouras entre os homens.
Possuía uma visão otimista da nascente sociedade industrial. Considerava que a
crescente divisão do trabalho que estava ocorrendo a todo vapor na sociedade européia
acarretava, ao invés de conflitos sociais, um sensível aumento da solidariedade entre os
homens. De acordo com ele, cada membro da sociedade, tendo uma atividade mais
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especializada, passava a depender cada vez mais do outro. Julgava, assim, que o efeito
mais importante da divisão de trabalho não era o seu aspecto econômico, ou seja, o
aumento da produtividade, mas sim o fato de que ela tornava possível a união e a
solidariedade entre os homens.
Segundo Durkheim, a divisão do trabalho deveria em geral provocar uma relação de
cooperação e se solidariedade entre os homens. No entanto como as transformações sócioeconômicas ocorriam velozmente nas sociedades européias, inexistia ainda, de acordo com
ele, um novo e eficiente conjunto de idéias morais que pudesse guiar o comportamento dos
indivíduos. Tal fato dificultava o “bom funcionamento” da sociedade. Esta situação fazia com
que a sociedade industrial mergulhasse em um estado de anomia, ou seja, experimentasse
uma ausência de regras claramente estabelecidas.
Para Durkheim, a anomia era uma demonstração contundente de que a sociedade
encontrava-se socialmente doente. As freqüentes ondas de suicídio da nascente sociedade
industrial foram analisadas por ele como um bom indício de que a sociedade encontrava-se
incapaz de exercer controle sobre o comportamento de seus membros.
Preocupado em estabelecer um objeto de estudo e um método para a Sociologia,
Durkheim dedicou-se a esta questão, salientando que nenhuma ciência poderia se constituir
sem uma área própria de investigação. A Sociologia deveria tornar-se uma disciplina
independente, pois existia um conjunto de fenômenos na realidade que distinguia-se
daqueles estudados por outras ciências, não se confundindo seu objeto, por exemplo, com a
Biologia ou a Psicologia. A Sociologia deveria se ocupar, de acordo com ele, com os fatos
sociais que se apresentavam aos indivíduos como exteriores e coercitivos. O que ele
desejava salientar é que um indivíduo, ao nascer, já encontra pronta e constituída a
sociedade. Assim, o direito, os costumes, as crenças religiosas, o sistema financeiro forma
criados não por ele, mas pelas gerações passadas, sendo transmitidos às novas através do
processo de educação.
Referência
MARTINS, C. B. O que é Sociologia. 61.reimpr. da 1. ed. São Paulo: Brasiliense, 2004.
Nota: grifos nossos.
* * * (8.2)
“Deve-se a Durkheim o reconhecimento da Sociologia enquanto ciência, com objeto
e método de estudo próprios. Durkheim deu fundamento a uma forma determinada de
análise da sociedade – a análise funcionalista. Tal análise baseia-se na visão da sociedade
como um organismo à semelhança de um organismo vivo, um todo integrado, onde cada
parte desempenha uma função necessária ao equilíbrio do todo.
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Muitos estudos foram e são feitos em Sociologia com base nessa visão,
principalmente no que diz respeito à utilização do método, do procedimento indicado pela
análise funcionalista.
Para nosso propósito é importante identificar, mesmo que de maneira resumida,
apenas a parte da obra de Durkheim referente à educação, ainda que sua concepção de
educação se integre ao conjunto de conceitos que formam seu método de análise da
sociedade.
Para Durkheim, a educação tem a função fundamental de conservação da
sociedade: ela ‘tem por objeto superpor ao ser que somos ao nascer, individual e associal,
um ser inteiramente novo’. ‘É uma ilusão acreditar que podemos educar nossos filhos como
queremos’, afirma ele, pois a ‘educação se impõe ao indivíduo de modo irresistível’. Dentro
desta visão, a sociedade determina totalmente o que será o indivíduo. Durkheim afirma,
portanto, o determinismo social sobre os indivíduos.
Considera a divisão social do trabalho um processo natural: ‘nem todos somos feitos
para refletir; e será preciso que haja sempre homens de sensibilidade e homens de ação. A
diferença de aptidão, de caracteres hereditários e a própria diversidade das profissões
acabam naturalmente produzindo educações diferentes’. Durkheim considera a divisão do
trabalho como necessária ao equilíbrio da sociedade mantido pela solidariedade orgânica,
isto é, a solidariedade que, à semelhança dos órgãos dos organismos vivos, também
acontece com a sociedade.
Segundo Pizzorno, Durkheim, embora preocupado com as crises sociais que
desequilibram a sociedade (consideradas por ele como um estado de anomia, doença
social), está convencido de que elas se devem à rapidez com que se produzem as
mudanças na vida econômica. Acredita que, com o tempo, os contatos e as comunicações
necessárias irão se estabelecer de maneira normal e, conseqüentemente, será
restabelecido o bom funcionamento da economia (da boa cooperação), como também a
superação das situações de anomia (desequilíbrio social). Esse otimismo é, aliás,
sustentado pela convicção de que o movimento da história nos aproxima das condições que
tornarão possível a solidariedade generalizada nas sociedades em que reina a divisão do
trabalho (1977:66).
O pensamento de Durkheim foi usado muitas vezes para justificar atitudes e
ideologias conservadoras, interessadas em manter a ordem social vigente. Como já vimos, o
pensamento liberal conservador justifica a desigualdade social como fenômeno natural,
afirmando que os homens são dotados de capacidades diferentes. A desigualdade é tomada
como questão individual e não social. Muitas vezes ouvimos atribuir-se o fracasso escolar
ou insucesso na vida meramente à incapacidade pessoal; ou atribuir-se o exercício de
determinadas profissões ‘naturalmente’ a certos grupos sociais. Por exemplo, se tomamos a
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educação na Constituição de 1937, vemos que ela afirmava: à infância e à juventude a que
faltarem recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação,
dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino
em todos os graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades,
aptidões e tendências vocacionais. O ensino pré-vocacional profissional, destinado às
classes menos favorecidas, é, em matéria de educação, o primeiro dever do Estado’ (o grifo
é nosso). Portanto, a Constituição de 1937 separava a formação intelectual para as elites e
o ensino vocacional, profissionalizante, para os desfavorecidos.
A divisão do trabalho, justificada em função da especialização, vem contribuindo,
mais e mais, para separar os que pensam daqueles que fazem. O saber técnico ganha
destaque e importância. Dessa forma, um grande número de problemas de nossas vidas foi
transformado em questões técnicas, distantes do debate e da ação política. Fomos
transformados, em nome da especialização e da divisão do trabalho, em executores de
decisões tomadas por outros.
O princípio da integração, de todo orgânico, situa os grupos sociais em uma certa
estratificação social, processo pelo qual os indivíduos, as famílias ou os grupos sociais são
hierarquizados em uma escala: uns nos escalões superiores e outros nos inferiores,
segundo origem, nível de renda, grau de instrução, prestígio da ocupação etc. Essa
hierarquia resulta da simples classificação dos indivíduos, segundo algum critério, sem que
tal classificação obrigue ao estabelecimento das relações de interação, contraditória e/ou
complementar, entre tais segmentos. As camadas ou estratos sociais resultantes dessa
classificação não têm, na análise funcionalista, a mesma dimensão que o conceito de
classes sociais tem na análise marxista.
Essa estratificação, considerada como decorrência natural da divisão do trabalho,
acena com a possibilidade de ascensão social de um estrato inferior para outro superior.
Afirma a existência de efetiva mobilidade social, condicionada apenas ao esforço pessoal.
Ganha destaque a meritocracia: os indivíduos podem vencer na vida, por seus méritos
pessoais. As diferenças sociais são novamente tomadas com diferenças individuais. Uma
das vias de ascensão social proposta é a educação. Nessa visão, a educação e o sucesso
escolar dependem apenas do esforço e da capacidade de cada um [ ].
Dessa forma, apenas aparentemente contraditório com a tradição meritocrática, o
pensamento conservador valoriza o determinismo social, que afirma, a priori, o destino de
cada um, segundo sua posição social. As pessoas ‘sentem-se imobilizadas’ frente a ele. Por
essa via, pode-se entender determinadas frases explicativas da desigualdade social: ‘É
destino, Deus quis assim...’. Com essa forma de manifestar-se, a população de baixa renda
incorpora e expressa, no seu universo de valores e de significados, a visão dos
determinismo social, colocando em ‘Deus’ ou no ‘destino’ as razões de sua condição social,
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ao mesmo tempo em que é levada a acreditar que o fracasso escolar de seus filhos é
conseqüência da falta de empenho ou de esforço pessoal.
Portanto, a visão conservadora da sociedade simultaneamente afirma, de um lado, a
possibilidade de ascensão social pelo mérito de cada um, e, de outro, justifica que as
pessoas tenham ‘destinos’ socialmente diferentes. Em ambos os casos, prende-se a fatores
sobretudo individuais, desconhecendo que o social faz a sua parte.”
As nossas maneiras de comportar, de sentir as coisas de curtir a vida, além de
serem criadas e estabelecidas “pelos outros”, ou seja, através das gerações passadas,
possuem a qualidade de serem coercitivas. Com isso, Durkheim desejava assinalar p
caráter impositivo dos fatos sociais, pois segundo ele comportamo-nos segundo o figurino
das regras socialmente aprovadas.
Ao enfatizar ao longo de sua obra o caráter exterior e coercitivo dos fatos sociais,
Durkheim menosprezou a criatividade dos homens no processo histórico. Estes surgem
sempre, em sua sociologia, como seres passivos, jamais como sujeitos capazes de negar e
transformar a realidade histórica. O positivismo durkheimiano acreditava que a sociedade
poderia ser analisada da mesma forma que os fenômenos da natureza. A partir dessa
suposição, recomendava que o sociólogo utilizasse os mesmos procedimentos das ciências
naturais. Costumava afirmar que, durante as suas investigações, o sociólogo precisava
encontrar um estado de espírito semelhante ao dos físicos químicos.
Disposto a restabelecer a “saúde” da sociedade, insistia que seria necessário criar
novos hábitos e comportamento no homem moderno, visando ao “bom funcionamento” da
sociedade. Era de fundamental importância, nesse sentido, incentivar a moderação dos
interesses econômicos, enfatizar a noção de disciplina e de dever, assim como difundir o
culto à sociedade, às suas leis e à hierarquia existente.
A função da sociologia, nessa perspectiva, seria a de detectar e buscar soluções
para os “problemas sociais”, restaurando a “normalidade social” e se convertendo dessa
forma numa técnica de controle social e de manutenção do poder vigente.
O
seu
pensamento
marcou
decisivamente
a
sociologia
contemporânea,
principalmente, as tendências que têm-se preocupado com a questão da manutenção da
ordem social [...].
Extraído de:
KRUPPA, S. A visão de educação em Durkheim. In: ___ Sociologia da Educação. São Paulo: Cortez,
2002, p. 55-58.
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