O coelho-bravo e a paisagem Mediterrânica: dois requisitos fundamentais GESTÃO DA PAISAGEM MEDITERRÂNICA UMA FERRAMENTA FUNDAMENTAL PARA A CONSERVAÇÃO DO LINCE-IBÉRICO A Liga para a Protecção da Natureza (LPN) é uma Organização Não Governamental de Ambiente, sem fins lucrativos O lince-ibérico é um mamífero carnívoro exclusivo da Península Ibérica. É, por isso, um carnívoro muito especializado, ou seja, muito selectivo, não só em termos de alimentação mas também do tipo de paisagem (habitat) onde vive, ambos típicos desta área geográfica. e com estatuto de Utilidade Pública. É uma associação de âmbito nacional, fundada em 1948. A missão da LPN é contribuir para que a sociedade projectos.lpn.pt/lifelince conserve o ambiente, conciliando as especificidades sociais e culturais com a O Coelho-bravo… Cerca de 90% da alimentação do lince-ibérico é constituída por coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus). O coelho é uma das presas mais importantes na Península Ibérica, sendo consumido por muitas outras espécies. Nas últimas décadas, as populações de coelho-bravo sofreram um grande decréscimo devido ao abandono das tradicionais actividades agrícolas e à introdução, por parte do homem, de duas doenças infecciosas graves (mixomatose e doença hemorrágica viral). A existência de refúgio, tocas ou vegetação densa, é fundamental para aumentar a sua sobrevivência. ZCN Contenda www.lpn.pt Lince-ibérico, o super-predador… Na paisagem Mediterrânica, o lince-ibérico (Lynx pardinus) cumpre uma importante função ecológica de super-predador. Para além de manter as populações de coelho saudáveis (pois caça preferencialmente animais doentes, velhos ou debilitados), o lince afasta ou elimina outros carnívoros seus competidores (como a raposa ou o sacarrabos). Um lince ocupa um território grande, com algumas centenas de hectares, e, em geral, basta-lhe um coelho por dia para ficar saciado. Na ausência do lince, essa mesma área é ocupada por outros carnívoros que, no seu conjunto, acabam por consumir mais presas do que o lince. preservação da biodiversidade e com o Ao promover a conservação do lince-ibérico estamos a contribuir para que as populações de outros carnívoros sejam controladas de modo natural e ajudamos a manter a qualidade cinegética desta paisagem. Deste modo, protegemos uma paisagem única da Península Ibérica e uma autêntica riqueza natural exclusiva de Portugal e Espanha. uso sustentável dos recursos naturais. Contactos Coordenação e Equipa técnica E-mail [email protected] Website projectos.lpn.pt/lifelince Liga para a Protecção da Natureza (Sede Nacional) Estrada do Calhariz de Benfica, n.º 187 1500-124 Lisboa www.lpn.pt A Paisagem Mediterrânica… A abundância de coelho -bravo não é o único factor essencial para a existência de lince-ibérico. Para além de uma densidade adequada desta presa, este felino necessita de um tipo de paisagem muito específico – o mosaico mediterrânico. Neste mosaico as áreas de matagal e floresta alternam com zonas de clareira e de pastagens. Os matos e bosques fornecem abrigo para refúgio e reprodução do lince -ibérico, enquanto os pastos são locais propícios à caça. O Programa Lince iniciou-se em 2004, através de uma parceria entre a LPN e a FFI e tem como principal objectivo assegurar a conservação e a gestão a longo prazo de um corredor de áreas prioritá- Telefone (+351) 217 780 097 Telemóvel (+351) 964 119 504 Fax (+351) 217 783 208 rias para a conservação do Texto Filipa Loureiro e Eduardo Santos Fotos Programa de Conservación Ex-Situ del Lince Ibérico (lince) e Programa Lince/LPN expansão transfronteiriça e a lince-ibérico em Portugal. Este corredor permitirá assegurar a ligação de populações isoladas desta espécie no Sul de Portugal e Espanha. Para além da região de Moura e Barrancos, a área de actuação do Programa Lince inclui também a Serra do Caldeirão e o Vale do Guadiana. projecto LIFE Lince Moura/Barrancos O projecto LIFE Lince Moura/Barrancos… Parceiros Co-financiadores A existência de rios, ribeiras ou charcas, para saciar a sede, de preferência com vegetação ribeirinha que sirva também de refúgio, assim como a tranquilidade, são também condições importantes para a presença do lince-ibérico. Projecto co-financiado a 75% pelo Programa LIFE-Natureza da Comissão Europeia O projecto LIFE Lince Moura/Barrancos tem como principal objectivo recuperar e conservar o habitat do lince -ibérico no Sitio Moura/Barrancos, através da implementação de medidas de gestão da paisagem, a médio/longo prazo, bem como de acções de informação, sensibilização e participação pública. Este projecto resulta de uma parceria da Liga para a Protecção da Natureza (LPN) com a Fauna & Flora International (FFI) e o Centro de Investigação e de Intervenção Social (CIS) do ISCTE-IUL. É co-financiado a 75% pelo Programa LIFE-Natureza da Comissão Europeia e é uma componente do Programa Lince da LPN/FFI. MEDIDAS DE GESTÃO DA PAISAGEM MEDITERRÂNICA MEDIDAS DE GESTÃO PARA A CAÇA MENOR Implementação de comedouros e bebedouros selectivos Promoção de abrigo para coelho-bravo A paisagem Mediterrânica é fundamental para a existência do lince-ibérico, mas é também habitat de muitas outras espécies de animais e plantas, algumas das quais ameaçadas e importantes de preservar (ex. águia-imperial, abutre-preto). O contínuo despovoamento das zonas rurais nas últimas décadas levou a um abandono de muitas das principais actividades agrícolas que aí se realizavam e que proporcionavam alimento e abrigo a muitas espécies cinegéticas (ex. coelho, perdiz). Actualmente, é importante melhorar as condições de habitat existentes de modo a que haja alimento e abrigo para a fauna silvestre ao longo de todo o ano. Durante a época estival e/ou em zonas de maior carência alimentar, é essencial fornecer alimento e água suplementar, de preferência em estruturas selectivas instaladas para o efeito – bebedouros e comedouros. Desta forma, para além de não se desperdiçar alimento e de se perder menos água por evaporação, assegura-se que apenas espécies de pequenas dimensões utilizam estas estruturas, tais como o coelho-bravo e a perdiz. Para o coelho-bravo, a existência de abrigo é fundamental para evitar a predação e permitir a reprodução. No entanto, em muitos locais, o solo delgado ou a escassez de vegetação arbustiva, não permitem que haja abrigo suficiente. Para melhorar as condições do habitat para esta espécie, assim como para outras variedades de caça menor (ex. perdiz), deverão sempre manter-se manchas de mato espalhadas pelo território, sem as quais a existência de coelho-bravo fica comprometida. Aumento do alimento disponível Paralelamente, é possível criar uma grande variedade de abrigos numa mesma área. Estes abrigos podem ser muito simples e servir apenas de refúgio ou ser mais complexos e funcionar como locais de reprodução onde se instalam grupos familiares de coelhos. Para aumentar a disponibilidade de refúgio, em especial junto de clareiras, pode aproveitar-se qualquer material disponível no campo, desde pedras, troncos ou ramos, que se amontoam e assim proporcionam um esconderijo adequado para evitar predadores. Pastagens permanentes Para o coelho-bravo, assim como para outras espécies de caça menor, a existência de pequenas clareiras com pastagens (naturais ou não) é fundamental, pois é aí que pode obter alimento de maior qualidade. Para ajudar a conservar a paisagem Mediterrânica é importante: • manter o mosaico de matos e floresta/pastagens e o sistema multifuncional, ou seja, a diversidade de usos e actividades típicos do Sul de Portugal – caça, silvicultura, pastorícia, pecuária extensiva e agricultura tradicional; • promover a regeneração natural dos bosques e montados, através da sua correcta exploração e da protecção individual de plantas em áreas onde a densidade de árvores é reduzida (ou com a maioria dos exemplares envelhecidos) ou onde ocorreram fogos; • evitar a permanência e circulação de gado no leito e margens de ribeiras, através da colocação de vedações e/ou pontos de passagem específicos, de forma a permitir a preservação e crescimento de vegetação ribeirinha; • evitar o derrube ou degradação de exemplares de árvores antigas ou de grandes dimensões, que poderão servir de refúgio para as espécies animais; • garantir a existência de aceiros (corta-fogos) e clareiras para prevenção de incêndios; • evitar a sobre-exploração dos montados e pastagens e o encabeçamento excessivo de gado, optando sempre por práticas agrícolas não intensivas; • proporcionar pontos de água acessíveis à fauna silvestre e dispersos de modo regular pelo território. ZCN Contenda ZCN Contenda Dependendo do local e de se tratarem de culturas de Outono ou de Primavera, para melhorar as pas tagens permanentes, poderá ser utilizada uma mistura de trevos, luzernas, ervilhacas, entre outras leguminosas, que poderão ser por vezes complementadas com gramíneas (ex. triticale, aveia). Para a implementação destas pastagens é preciso ter em conta que: • deverão estar distribuídas de modo a que haja alimento por toda a área; • podem ser instaladas ao longo de caminhos e aceiros, sendo especialmente úteis junto a zonas onde ocorrem manchas de mato extensas, local de refúgio natural destas espécies; • apenas quando necessário, deverá ser realizada uma mobilização mínima do solo (evitando fazê-lo em locais com grande inclinação), antecedida, caso se justifique, de uma desmatação; • deverão ter uma forma irregular e estar junto a zonas com vegetação densa que proporcionem abrigo, tendo no máximo cerca de 50 metros de largura e favorecendo áreas de pequeno tamanho (criam-se assim parcelas com alimento intercaladas com zonas de refúgio); • é aconselhável a aplicação de fertilizante no solo, em particular com fósforo, de preferência de libertação lenta (se possível que contenha enxofre); • poderão ser vedadas com cercas eléctricas para impedir o acesso ao gado ou ungulados silvestres. Existem muitas variedades de bebedouros e comedouros. De acordo com o local, o tipo de alimento fornecido e a espécie alvo, qualquer um deles poderá ser utilizado. Aconselha-se a implementação de uma rede de comedouros e bebedouros distanciados entre si cerca de 300m. A instalação de abrigos de reprodução é um processo um pouco mais moroso e que envolve habitualmente a abertura de covas e a mobilização do solo, de modo a facilitar a criação e escavação de galerias. Estes abrigos poderão ser constituídos por terra, pedras, troncos, raízes de árvores, paletes, etc. Poderão ainda ser reforçados com rede de malhaço metálico (de 10x10 cm) para evitar a predação e destruição da estrutura por parte de outros animais. Devem permitir sempre a existência de galerias e túneis no seu interior e proporcionar uma entrada fácil e óbvia para a sua utilização pelos coelhos existentes no local. Os abrigos para reprodução devem ser instalados em: Em geral, como alimento suplementar para coe lho -bravo e outras espécies de caça menor, pode u t i l i z a r- s e c e r e a l em grão (ex. trigo ou aveia) e luzerna em fardo. • locais com declives suaves sem risco de alaga- mento, • zonas no limite entre matos e pastagens; • grupos de 4 a 8 unidades distanciadas cerca de 25 a 50 metros entre si (nunca mais do que 100m). Posteriormente à construção de um destes abrigos deve colocar-se alguma vegetação em cima e em redor das entradas, de modo a oferecer maior protecção aos seus ocupantes.