UM ESTUDO EXPLORATÓRIO DE TRIBOS DA PRAIA DE

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CONSUMO E PADRÕES ESTÉTICOS: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO DE
TRIBOS DA PRAIA DE IPANEMA
Gustavo da Silva Americano
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Instituto COPPEAD de Administração
Orientador: Letícia Moreira Casotti
D.Sc. em Engenharia de Produção (Coppe / UFRJ)
Rio de Janeiro
Junho 2007
Consumo e Padrões Estéticos: um estudo exploratório de tribos da Praia de Ipanema
Gustavo da Silva Americano
Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto COPPEAD de Administração, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à
obtenção do grau de Mestre.
Aprovada por:
____________________________________ Presidente da Banca
Profa. Letícia Moreira Casotti, D.Sc.. – Orientadora
(COPPEAD/UFRJ)
____________________________________
Profa. Ângela Maria da Rocha Cavalcanti, Ph.D.
(COPPEAD/UFRJ)
____________________________________
Profa. Daniela Abrantes Ferreira Serpa, D.Sc.
(FACC/UFRJ)
Rio de Janeiro, RJ
2007
Americano, Gustavo da Silva
Consumo e Padrões Estéticos: um estudo exploratório
de tribos da Praia de Ipanema / Gustavo da Silva
Americano. Rio de Janeiro, 2007.
vii, 142 f.
Orientador: Letícia Moreira Casotti
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio
de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração, 2007.
Referências Bibliográficas: f. 143-147
1. Consumo 2. Estética 3. Tribos 4. Marketing – Teses
I. Cassoti, Letícia Moreira. II. Universidade Federal do Rio
de Janeiro, Instituto COPEAD de Administração. III.
Consumo e Padrões Estéticos: um estudo exploratório de
tribos da Praia de Ipanema
À Maria Isabel
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Maria Isabel por ter acreditado, incentivado e persistido no objetivo de me fazer
acreditar que essa conquista era importante e possível.
A meu tio, Jarbas Americano, por ter me incentivado e mostrado o valor dessa empreitada.
Aos meus pais, Luciane e Artur, por terem me apoiado em mais esse importante momento da
minha vida.
À professora Letícia Casotti por ter acreditado nesse trabalho desde o início e pelas
orientações que me permitiram concluí-lo.
À Merck, nas figuras de Celso Braga, Gerd Bauer, Kai Wolf e Renato Senna, por terem,
imediatamente, apoiado esse projeto permitindo uma profícua aproximação entre a academia
e a prática da administração.
E a todos os meus maravilhosos colegas de turma, por terem mostrado que, a certa altura da
vida, quando menos se imagina que novas e profundas amizades surgirão, isso pode sim
acontecer. Além da ajuda e companheirismo durante o curso.
RESUMO
AMERICANO, Gustavo da Silva. Consumo e Padrões Estéticos: um estudo exploratório
de tribos da Praia de Ipanema. Orientadora: Letícia Moreira Cosotti. Rio de Janeiro:
UFRJ/COPPEAD, Junho de 2007. Dissertação.
A questão do comportamento de consumo é ponto de extrema importância dentro da
disciplina de marketing. A entrada na pós-modernidade pode ter gerado uma defasagem entre
a teoria e a prática do marketing. Basicamente o que pode estar acontecendo é que, enquanto
os consumidores apresentam cada vez mais características pós-modernas, o marketing ainda
trabalha com premissas modernas. Nesse contexto, novos universos sociais chamados de
tribos pós-modernas ganham importância nos estudos de comportamento de consumo. Esse
seria o caso dos grupos que freqüentam a praia de Ipanema em frente aos Postos 9 e 10.
A pesquisa apontou que existem indícios de que tais grupos podem ser considerados
tribos pós-modernas devido as suas mais variadas características. Como tal, os sentimentos
compartilhados pelos membros dos grupos são muitos, inclusive não havendo, no nível
macro, grandes diferenças entre os Postos 9 e 10. Embora, especificamente, diferenças
importantes possam ser notadas. Os principais valores de ligação dos grupos são própria praia
e a estética. Sendo que essa última desempenha papel de suma importância para o consumo
das tribos.
ABSTRACT
AMERICANO, Gustavo da Silva. Consumo e Padrões Estéticos: um estudo exploratório
de tribos da Praia de Ipanema. Orientadora: Letícia Moreira Cosotti. Rio de Janeiro:
UFRJ/COPPEAD, Junho de 2007. Dissertação.
The topic of consumer behavior is extremely important among the studies of
marketing. The new age of post-modernity could have generated a lack between the theory
and the practice of marketing. Basically, what can be happening is, at the same time that
consumers have been showing more post-modern characteristics, marketing still works with
modern premises. In this context, new social universes called post-modern tribes have been
increasing in importance among the studies of consumer behavior. It would be the case of the
groups that frequently go to the Ipanema beach in front of rescue points number 9 and 10.
The research has pointed out that there are some clues which suggest that such groups
can be considered post-modern tribes due to their various characteristics. Indeed, there are
many shared feelings among the members of the groups, and there are no big differences, at a
macro level, between rescues points 9 and 10. However, specifically speaking, important
differences can be noticed. The main liking values are the beach itself and the esthetics. The
latest plays a very important role for the tribes’ consuming behavior.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Tabela contendo os perfis dos entrevistados dos Postos 9 e 10.
37
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................1
1.1 OBJETIVO E IMPORTÂNCIA...........................................................................................................................1
1.2 IPANEMA E A PRAIA DE IPANEMA ..............................................................................................................3
1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO ..........................................................................................................................7
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA....................................................................................8
2.1 MODERNIDADE ...................................................................................................................................................8
2.2 O MARKETING NA MODERNIDADE ..........................................................................................................11
2.3 PÓS-MODERNIDADE ........................................................................................................................................16
2.4 O MARKETING NA PÓS-MODERNIDADE .................................................................................................18
2.5 O MARKETING E AS COMUNIDADES ........................................................................................................24
3 METODOLOGIA ....................................................................................................31
3.1 A PESQUISA QUALITATIVA ..........................................................................................................................32
3.2 A COLETA DE INFORMAÇÕES.....................................................................................................................32
3.3 SELEÇÃO DOS ENTREVISTADOS................................................................................................................33
3.4 COLETA E TRATAMENTO DOS DADOS ....................................................................................................35
3.4.1 OBSERVAÇÕES............................................................................................................................................35
3.4.2 ENTREVISTAS..............................................................................................................................................37
3.4.3 TRATAMENTO DOS DADOS ....................................................................................................................38
3.5 LIMITAÇÕES .......................................................................................................................................................40
4 OBSERVAÇÕES E ENTREVISTAS ......................................................................41
4.1 AS OBSERVAÇÕES PARTICIPANTES .........................................................................................................41
4.1.1 O GRUPO QUE FREQUENTA A FARME DE AMOEDO.......................................................................41
4.1.2 O GRUPO QUE FREQUENTA O POSTO 9...............................................................................................43
4.1.3 O GRUPO QUE FREQUENTA O POSTO 10.............................................................................................44
4.2 AS ENTREVISTAS ..............................................................................................................................................46
4.2.1 Entrevistado 1: Ana (Posto 9) ........................................................................................................................47
4.2.2 Entrevistado 2: Sílvia (Posto 9) .....................................................................................................................52
4.2.3 Entrevistado 3: Fabio (Posto 9)......................................................................................................................59
4.2.4 Entrevistado 4: Clara (Posto 10) ....................................................................................................................63
4.2.5 Entrevistado 5: Alexandre (Posto 9) ..............................................................................................................69
4.2.6 Entrevistado 6: Bruna (Posto 10) ...................................................................................................................75
4.2.7 Entrevistado 7: Leonardo (Posto 9) ...............................................................................................................80
4.2.8 Entrevistado 8: Marcos (Posto 9)...................................................................................................................89
4.2.9 Entrevistado 9: Gustavo (Posto 9) .................................................................................................................94
4.2.10 Entrevistado 10: Leandro (Posto 10) ...........................................................................................................99
1
4.2.11 Entrevistado 11: André (Posto 10)............................................................................................................ 106
4.2.12 Entrevistado 12: Luis (Posto 10)............................................................................................................... 111
5 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS ........................................118
5.1 OS GRUPOS ....................................................................................................................................................... 118
5.1.1 Aqui e Agora: amenidades e descontração................................................................................................. 118
5.1.2 Sentimentos .................................................................................................................................................. 120
5.1.3 Interesses em Comum.................................................................................................................................. 121
5.1.4 A Praia como Valor de Ligação .................................................................................................................. 122
5.1.5 Rotinas dos Grupos...................................................................................................................................... 124
5.2 POR QUE PERTENCER A IPANEMA? ...................................................................................................... 126
5.3 SELETIVIDADE ............................................................................................................................................... 128
5.4 ACEITAÇÃO E INFLUÊNCIA ...................................................................................................................... 130
5.5 ESTÉTICA E PREOCUPAÇÃO COM O CORPO ..................................................................................... 131
5.6 CONSUMO ......................................................................................................................................................... 133
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................136
ANEXOS .................................................................................................................140
REFERÊNCIAS.......................................................................................................143
1
1 INTRODUÇÃO
1.1 OBJETIVO E IMPORTÂNCIA
O presente estudo tem por objetivo investigar a questão do consumo dentro de novos
universos sociais chamados de tribos pós-modernas (COVA, 1997; COVA; COVA, 2001a,
2001b). Foram analisados dois grupos, ou “tribos”, que freqüentam locais específicos da Praia
de Ipanema, no Rio de Janeiro: aqueles que freqüentam a praia em frente ao posto de
salvamento de número 9 e os que freqüentam em frente ao Posto 10. Foram feitas entrevistas
em profundidade com freqüentadores desses espaços da praia com o objetivo de compreender
seus comportamentos e práticas de consumo.
A motivação para a escolha do tema em questão tem origem na menção feita pelo
sociólogo francês Michael Maffesoli em sua obra “O Tempo das Tribos – O Declínio do
Individualismo nas Sociedades de Massa”, de 2000, quando cita: “Num país como o Brasil,
onde a praia é uma verdadeira instituição pública, monografias ressaltam que no Rio a
numeração dos ‘postos’ permite a cada qual reconhecer o seu território.” (MAFESOLI, 2000,
p. 140).
Não são raros os estudos já realizados nesses moldes como Kates (2002) e Kozinets
(2001), por exemplo. Porém um artifício complementar do presente será a comparação das
dinâmicas internas de cada grupo entre si, objetivando testar, principalmente, a premissa de
coexistência de tribos diferentes dentro do mesmo espaço urbano.
A observação do sociólogo francês em relação às praias cariocas parece estar
contagiando também os brasileiros. Em Maio de 2007, foi lançado o documentário “Faixa de
Areia” das cineastas Flávia Lins e Silva e Daniela Kallmann. O filme, com mais de 60 horas
de filmagens, foi rodado em várias praias do Rio de Janeiro, inclusive Ipanema, e abordou,
2
através da narrativa dos freqüentadores, a diversidade de pessoas nas mais variadas tribos. (As
Tribos das Praias. Jornal O Globo, Rio de Janeiro, 29 Janeiro 2007, Segundo Caderno, p. 3).
Os jornais impressos também passaram a dar destaque ao assunto. Em 6 de Fevereiro
de 2007, Larry Rohter publicou em sua coluna no The New York Times um artigo sobre a
divisão das tribos na praia. Nessa oportunidade o autor explorou mais a questão da divisão
entre as tribos, dando destaque a como elas podem ser segregacionistas. Nesse artigo o
antropólogo brasileiro Roberto da Matta foi citado: “...o que me surpreende é que em uma
sociedade que representa a si mesma como sendo altamente desorganizada, a praia é
impressionantemente organizada.”
Rocha e Barros (2004) destacam que o consumo se resume a um fato econômico até a
fronteira do preço de entrada. A partir daí, as escolhas tornam-se dependentes da ordem
cultural, de sistemas simbólicos e de necessidades classificatórias. O que faz com que o ato de
consumir se transforme num fato social capaz de gerar representações coletivas ou que se
transforme em um instrumento de adaptação às novas culturas.
No mundo pós-moderno, onde a presença de tribos com sub-culturas específicas
(COVA, 1997) é uma realidade, a colocação anterior em relação ao consumo se torna ainda
mais importante para o entendimento dessas novas dinâmicas sociais. Dentre as quais,
movimentos de aglutinação que, segundo Cova; Cova (2001a) giram em torno de emoções e
que Cova (1997) chamou de valor de ligação. Dinâmicas essas com impactos em várias áreas
de estudo, especialmente no marketing, haja vista sua estreita ligação com o ato do consumo.
Não é por menos que Firat et al. (1995) chegam a atestar que mudanças no marketing podem
ser um grande reflexo de mudanças sociais mais profundas.
Considerando que a evolução da disciplina de marketing nos últimos 50 anos se deu,
basicamente, em função de características do período moderno, pode estar acontecendo uma
fase de transição no pensamento em marketing (FIRAT; SHULTZ II, 1997). Além disso,
3
Casotti (1998) e Firat et al. (1995), levantam a possibilidade de estarmos no meio de uma
dicotomia entre teoria e prática de marketing, justamente devido a primeira estar defasada em
relação à segunda.
Todas essas inquietações refletem a importância de novos estudos voltados para o
marketing dentro dessa nova perspectiva. Tanto que Rocha e Barros (2004, p. 13) comentam:
“A afirmação de que o consumo é, antes de tudo, um ato simbólico e coletivo, promoveu um
grande deslocamento nos modos dominantes de pensar esse fenômeno no universo de
pesquisas em marketing...”.
1.2 IPANEMA E A PRAIA DE IPANEMA
Como seria de se esperar, a praia de Ipanema e suas peculiaridades guardam estreita
relação com o bairro em si. Bairro esse que poderia ser demarcado conforme descrição feita
pelo Jornalista Millôr Fernandes na Revista de Domingo, do Jornal do Brasil de 23 de
dezembro de 1990 (apud CASTRO, 1999):
Ao sul, o Oceano Atlântico, incluindo as ilhas Cagarras e tudo que o olho
alcançar dentro das duzentas milhas. Ao norte, a Lagoa Rodrigo de Freitas –
do Clube Caiçaras até a margem esquerda do Corte do Cantagalo. A leste, de
um lado, o Arpoador, a praia do Diabo, o mar e o horizonte correspondentes;
de outro, a rua Conselheiro Lafayette ao cruzar as ruas Rainha Elizabeth,
Joaquim Nabuco e Francisco Otaviano; a fronteira leste segue pela rua
Antonio Parreiras, subindo até o número 125 da rua Saint-Roman (onde
ficava o Pasquim), galgando parte do morro do Pavãozinho e descendo pelo
Corte. E, a oeste, a margem direita do Jardim de Alah. (CASTRO, 1999, p.
11).
4
De qualquer forma, existe um Decreto da prefeitura, de número 5.280, de 23 de agosto de
1985, que define os limites oficiais do bairro, não muito diferentes desses listados por Millôr
Fernandes.
O bairro de Ipanema é relativamente recente no contexto da cidade do Rio de Janeiro.
Foi a partir de 1894, com a assinatura do termo de fundação do projeto de construção da Villa
Ipanema, que ele passa a existir oficialmente. A primeira “tribo” da praia foi a dos índios
tamoios que foram também os primeiros habitantes de Ipanema. Contudo, essas tribos não
resistiram ao primeiro século da colonização. Uma das razões da pouca idade de Ipanema é
que o crescimento do Rio de Janeiro não procurou o caminho do mar até o início do século
XX. Foi apenas nessa época que Copacabana, Ipanema e Leblon começaram a entrar, de fato,
no mapa da cidade. Até aquele momento, essas regiões permaneceram praticamente
desabitadas.
De 1910 até mais ou menos princípios dos anos 70, quando, segundo o consenso,
encerrou-se o ciclo da Ipanema “clássica”, nenhum outro bairro no Brasil parece ter tido uma
tradição cultural tão rica ou de vanguarda (CASTRO, 1999). Talvez seja por isso que esse
bairro é referência nacional e internacional, tanto que Jaguar (2001) atesta: “Mas era também
um bairro que se intrometia na cidade e no estado, ditava moda, hábitos e costumes para o
Brasil e para o mundo, ...”.
Essa tradição cultural está intimamente ligada às origens de Ipanema e seus habitantes.
Os primeiros moradores da Villa Ipanema foram, além dos brasileiros, os portugueses. Depois
vieram os ingleses e americanos. A estes se juntaram italianos, sírios, libaneses e,
posteriormente, japoneses, alemães e imigrantes judeus. O bairro era extremamente propício
para receber estrangeiros, pois era pequeno, sossegado, a praia limpa e um comércio ainda por
expandir. Toda essa gente acrescentava características de diversidade cultural ao bairro, pois
eram pessoas habituadas a museus, monumentos, que falavam diversas línguas e que estavam
5
acostumadas a conviver com a história. Conforme Castro (1999), os que vinham fugindo do
nazismo traziam ainda o amor pela liberdade e outros eram ainda muito ligados a artistas de
vanguarda em seus países de origem. Balsa (2005) ressalta:
Ipanema é um bom exemplo de como a diversidade cultural gera novos
modos de vida. Longe de estabelecer uma homogeneização de valores, os
imigrantes trouxeram uma nova visão de mundo e introduziram costumes e
tradições próprias de seus países. Em Ipanema, estabeleceram novas
maneiras de vestir, novos esportes, hábitos alimentares, assim como tipos de
comércio ligados às suas culturas e atividades econômicas de origem.
(BALSA, 2005, p. 101).
A história da praia de Ipanema se confunde com a história do próprio bairro. No
século XIX, os banhos de mar eram indicados como coadjuvantes em tratamentos de saúde.
Somente um século depois, quando outros hábitos europeus começaram a chegar ao Rio de
Janeiro, a paria se transformou em algo corriqueiro. Mais uma vez, Ipanema, aqui
representada pela praia, sempre esteve na vanguarda do movimento de liberação das rígidas
normas de conduta na paria impostas pelos governos. Além disso, a praia de Ipanema foi
berço de vários esportes que hoje se encontram difundidos pelo país, entre eles o futebol de
areia, a pesca submarina e o surfe (BALSA, 2005).
Outra faceta que dá uma dimensão da importância da praia de Ipanema ao
desenvolvimento do bairro foi o impulso dado ao grande caldo cultural ipanemense que teria
nascido no Arpoador (CASTRO, 1999), que foi sua primeira praia a ser desbravada e palco de
uma convivência democrática entre gente de todos os níveis: pescadores, intelectuais, artistas,
boêmios e etc. Segundo Balsa (2005):
Denomina-se Arpoador a extremidade esquerda da praia de Ipanema, que
termina junto à rua Francisco Otaviano – marco inicial da praia de Ipanema.
Da praia do Diabo, passando pelo Pontão, até a praia do Arpoador, são 800
metros de extensão, com ondas que variam de um a dois metros e águas
muitas vezes transparentes, o que faz dali um dos melhores lugares para a
6
prática do surfe, da pesca submarina e da pesca esportiva de superfície.
(BALSA, 2005, p. 59).
Dessa mistura cultural nascida no Arpoador, nasceu nos anos 50 e 60 o que se chamou de
República de Ipanema – uma província habitada por cosmopolitas e uma moderna Shangri-lá
à beira-mar, com uma qualidade de vida elevadíssima (CASTRO, 1999).
Talvez um dos produtos mais famosos dessa Ipanema cultural seja a música de Tom
Jobim e Vinícus de Moraes: “Garota de Ipanema”. Os dois músicos costumavam freqüentar o
Bar Veloso (hoje chamado Garota de Ipanema), na esquina das Ruas Prudente de Moraes e
Montenegro (atualmente Rua Vinícius de Moraes). Vinícus de Moraes fez uma primeira
versão, que então se chamava “Menina que Passa”. Mas ambos não gostaram. Então,
inspirados pela graça de Heloísa Eneida Menezes Paes Pinto, mais conhecida como Helô
Pinheiro, que frequentemente passava em frente ao bar, conceberam uma das canções mais
famosas do país e que pode ser considerada um hino de Ipanema: “Garota de Ipanema”.
(Disponível em: http://www.jobim.com.br, http://pt.wikipedia.org/wiki/Garota_de_Ipanema)
A orla carioca possui postos de salvamento distribuídos a cada mil metros. A
numeração segue aquela iniciada na praia do Leme. O primeiro posto de Ipanema é o de
número 7, no Arpoador, e o último, próximo ao Jardim de Alah, quase na divisa com o
Leblon, é o de número 10. Conforme Balsa (2005): “Os postos em Ipanema, assim como os
nomes das ruas transversais à praia, sempre funcionaram como referência de ‘territórios’ nas
areias.”
Ou, conforme Larry Rohter, em sua coluna do The New York Times, de 6 de Fevereiro
de 2007:
No rio, 59 praias se espalham por 110 milhas de areia. Mesmo as praias mais
elitizadas da cidade, Ipanema e Copacabana, e suas extensões, Leblon e
Leme, são informalmente subdivididas em setores demarcados por uma
dúzia de estações de salva-vidas chamadas de postos, cada um a
aproximadamente meia milha do próximo. Cada posto, numerado de 1 a 12,
7
possui sua própria cultura, atrai a diferentes ´tribos´ e pode ser inóspito a
intrusos. (ROTHER, 2007, p. 1).
.
1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
Este trabalho está organizado em seis capítulos. Sendo o primeiro capítulo
introdutório. No segundo, será feita uma revisão de literatura que está estruturada da seguinte
maneira: primeiramente é feita uma abordagem à modernidade e, logo em seguida, como o
marketing foi influenciado pelas características dessa época. Feito isso, o foco passa a ser na
pós-modernidade e, fechando a revisão, o impacto dessa época sobre o marketing, a
emergência do marketing tribal.
O terceiro capítulo trata da metodologia escolhida para o estudo e descreve os
métodos e procedimentos adotados: a entrevista em profundidade e a observação participante.
Nesse capítulo consta ainda a forma utilizada para análise dos dados e as limitações do
método.
No quarto capítulo é apresentado em perfil de cada entrevistado com uma breve
descrição das principais informações obtidas durante a entrevista, constituindo-se em uma
forma de pré-análise dos dados.
No capítulo cinco, a interpretação e análise dos dados colhidos nas observações e nas
entrevistas em profundidade. Aqui, além de uma análise intra-grupo, será realizada também
uma comparação inter-grupos procurando diferentes valores que suportem o consumo e o
próprio relacionamento dessas tribos.
O sexto e último capítulo traz as conclusões e os possíveis impactos que estas podem
trazer para a teoria e prática do marketing, bem como sugestões de futuros estudos acerca do
tema aqui abordado.
8
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Nesse capítulo será feita uma revisão da literatura relacionada ao tema de pesquisa
proposto objetivando fornecer o embasamento teórico necessário não só à compreensão dos
resultados da pesquisa, bem como para mapear pontos de interesse que devem fazer parte da
mesma. Para tanto a revisão está organizada de forma a abordar desde o conceito de
Modernidade e Pós-modernidade, e a relação desses conceitos com o a evolução do
marketing, com destaque para o conceito de marketing tribal proposto por Cova e Cova
(2001a).
2.1 MODERNIDADE
Em 1500 d.C. uma única igreja unia a Europa e, praticamente, a definia. Todavia,
cinqüenta anos mais tarde a Revolta Protestante mudaria esse quadro profundamente. Esse
fato marcaria então o início do desenvolvimento de algumas das principais premissas dos
tempos modernos. O movimento de Reforma foi iniciado pelo monge alemão Martinho
Lutero que decidiu se opor às indulgências e várias outras práticas papais. Em última
instância, Lutero pregava que era possível ter esperança na salvação, mesmo sem a igreja,
simplesmente confiando no relacionamento particular de cada um com Deus. Aqui vale
destacar como a individualidade, característica marcante da modernidade, já se faz presente
desde a sua gênese (ROBERTS, 2001).
No séc. XVIII o Iluminismo ajudou a sedimentar a idéia de que o mundo fosse cada
vez mais controlável pela vontade humana e pela razão. Aqui outra característica importante
da modernidade começa a aparecer: a racionalidade. Sobre a razão, Maffesoli (2005, p. 56)
destaca: “A Deusa Razão, Espírito Santo da modernidade, é a única inspiradora dos virtuosos
9
e dita-lhes não somente o que é bom para eles, o mínimo, mas também o que é bom para
todos, aqui e em qualquer lugar.”
Na segunda metade do séc. XVIII a Revolução Francesa marca de forma significativa
o início da modernidade. Nessa oportunidade a constituição histórica da França foi
modificada e a monarquia foi transformada em república. Além disso, conforme Hobsbawn
(1996), em 1789 foi realizada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que
envolvia os seguintes aspectos: os homens são livres e iguais, porém existem distinções
sociais, propriedade privada e direito de representação na elaboração de leis. Estava, portanto,
lançado o arcabouço sobre o qual se desenvolveria a modernidade.
Conforme Habermas (1983), o projeto da modernidade pretendia o desenvolvimento
de formas racionais de organização social e de modos racionais de pensamento que
prometiam a liberação das irracionalidades do mito, da religião, da superstição, a liberação do
uso arbitrário do poder. Ou seja, trata-se de um período de extrema valorização do indivíduo
e de sua racionalidade. Tanto que Harvey (2000), quando se referindo a modernidade, salienta
o que chamou de “Destruição Criativa”, ou seja, a destruição do que veio antes em prol da
construção de um mundo totalmente novo. Além disso, esse autor também destaca que a vida
moderna é permeada pelo sentido do fugido, do efêmero, do fragmentário e do contingente, o
que levaria a uma ruptura com a história precedente.
Outra característica do período moderno foi o projeto de uma sociedade com foco no
futuro, a ponto de Hobsbawn (1996) enfatizar que, após a Revolução Francesa, não havia
interesse no mundo acima do da nação. Ou seja, segundo Maffesoli (2000), na modernidade a
sociedade é uma organização econômico-política. Nesse contexto, os indivíduos passam a
desempenhar funções específicas dentro do corpo social, fato que contribui para reforçar
ainda mais a já marcante individualização do sujeito.
10
Todo esse projeto de futuro é caracterizado por Maffesoli (2005) como sendo o
político que, segundo o autor, é permeado pelo linearismo cristão. Isso teria acontecido, pois,
a partir do séc. XVIII o “dever ser” evangélico condicionou o “tu deves” político. Ainda
conforme Maffesoli (2005), esse traço cristão é essencialmente evolutivo e sua lei é o
progresso. Nesse contexto, a perfeição, terrestre ou celeste, é possível racionalmente e
alcançável ao fim de uma árdua caminhada. Tanto que Maffesoli (2000, p. 84) caracteriza a
política como sendo a forma profana da religião e, sobre essa última, comenta: “Mais do que a
pureza da doutrina, é o viver e o sobreviver juntos que preocupa as comunidades de base.”
Dessa forma, poder-se-ia dizer que, de acordo com Maffesoli (2005), o político, ou
coisa pública, serviu-se da racionalização teórica e organizacional da religião. Esse processo
gerou alguns postulados que marcaram bastante a modernidade. São eles:
- O homem seria desprovido de natureza social e manipulável, inclusive devendo sê-lo
para o seu próprio bem; e
- Somente a razão, em seu poder soberano, poderia aperfeiçoar-lhe a evolução.
Tais postulados permearam de maneira tão marcante a época moderna a ponto de Maffesoli
(2000) caracterizar esse período como sendo de uma “estrutura social totalmente mecânica”, o
que pode estar relacionado à afirmação de Bauman (2003, p. 40) de que “Desde o começo dos
tempos modernos, a gerência não é uma questão de escolha, mas uma necessidade.”. O autor
reforça, ainda, que o poder moderno diz respeito à capacidade de gerenciar e comandar e não
da propriedade como era até então.
A descrição do político de Maffesoli (2005) fala que, além dos traços já mencionados,
seria um modo de vida intelectual e moral, pautando o comportamento de toda uma
sociedade.
Vale mencionar ainda uma dicotomia levantada por Maffesoli (2005) que também
estaria presente na modernidade. Tal desvio seria entre a cultura, que seria refletida através do
11
sujeito, e a natureza. Ou seja, durante a época moderna não havia muito espaço para a
contemplação do mundo ao redor, todas as atenções estariam voltadas para o futuro, que era o
que interessava para os indivíduos.
Para efeito de síntese, poderiam ser citados como características da modernidade
alguns aspectos levantados por Goulding (2003): economia, ciência, construções analíticas,
objetos concretos, progressão, ordem e harmonia.
2.2 O MARKETING NA MODERNIDADE
Como o projeto da modernidade foi seguido pelo marketing, segundo Casotti (2004),
quando a história recente dessa disciplina é analisada, podem-se encontrar diversas etapas que
começam pelo marketing de massa passando pelo marketing segmentado e marketing de
nicho chegando ao marketing um a um ou customizado, possível devido à evolução da
tecnologia da informação, o que sugere que a atividade de marketing caminha em paralelo
com a crescente individualização promovida pela modernidade (HARVEY, 2000).
Valentine e Gordon (2000) pontuam que existiu uma época em que as empresas
assumiam que os consumidores eram passivos receptores das suas decisões, julgamentos e
produtos, essa era a fase do marketing de massa que remonta ao início dos estudos da
disciplina de marketing, pouco antes dos anos 50. Kotler (1998) chama de Conceito de
Produção que:
... assume que os consumidores darão preferência aos produtos que
estiverem amplamente disponíveis e forem de preço baixo. Os gerentes de
organizações orientadas para a produção concentram-se em atingir a
eficiência de produção elevada e distribuição ampla. (KOTLER, 1998, p.
35).
12
Em outras palavras, nessa fase não são diferenciados os consumidores em relação às suas
preferências.
Com a segmentação de mercado, o marketing começa a trilhar o caminho que poderia
levar à individualização dos consumidores. O artigo de Smith (1956) representa a gênese dos
estudos acadêmicos sobre o tema. Logo de início esse autor atesta que:
Não são apenas as estratégias de diferenciação e segmentação que clamam
por diferentes sistemas de ação em qualquer ponto no tempo, mas as
dinâmicas do mercado e do marketing pontuam a importância de variados
níveis de diversidade através do tempo e sugerem que uma seleção racional
das estratégias de marketing é um requerimento para o atingimento da
efetividade funcional máxima na economia como um todo. (SMITH, 1956,
p. 4).
O trecho acima é bastante rico no que tange ao marketing e seu desenvolvimento.
Primeiramente, pode-se perceber a distinção feita pelo autor entre diferenciação e
segmentação. E, em seguida, pode-se notar a preocupação em enfatizar que estratégias de
marketing não são universais e que variam de acordo com o tempo.
Conforme o próprio Smith (1956) aquele era o tempo de se pensar em estratégias de
segmentação. O autor faz, ainda, um contraponto entre os conceitos de diferenciação de
produto e segmentação. Diferenciação diz respeito à mudança na curva de demanda através da
manipulação do suprimento. Já o novo conceito de segmentação referia-se à mudança na
curva de demanda através da manipulação da própia demanda. Ou seja, até então acreditavase que o mercado responderia à ações tomadas estritamente dentro da empresa sem considerar
o lado dos consumidores. É nesse contexto que Smith (1956) lança o conceito de segmentação
dizendo que as empresas deveriam olhar mais para fora de suas sedes e entender os clientes,
inclusive suas peculiaridades.
Barnett (1969, p.152) segue rumo à individualização dos clientes quando atesta:
“Segmentação se refere à noção de que um grupo de consumidores que formam o mercado de
13
um produto é composto de subgrupos, cada qual tendo necessidades e desejos específicos e
diferentes.”. O que indica o sentido seguido pelo marketing rumo à separação dos
consumidores.
Ainda seguindo essa lógica, Barnett (1969) sugere que produtos similares não
precisam ser homogêneos. Em outras palavras, as pessoas possuem preferências diferentes
mesmo em se tratando de um mesmo produto. O que abre espaço para o desenvolvimento de
produtos diferenciados com foco em um segmento de mercado específico. Pode-se citar como
exemplo o chocolate, que é sempre chocolate, mas encontra-se com várias graduações de
amargura a fim de satisfazer diferentes consumidores.
Fazendo um breve retrospecto, de início o conceito predominante era o do mercado de
massa, com o advento da segmentação, esse mercado foi “quebrado” em várias partes
menores em prol de melhor satisfazer a diferentes desejos e necessidades. Portanto, nada mais
natural que o marketing seguisse essa tendência moderna e buscasse, através do marketing de
nicho, um grupo ainda mais diferenciado de consumidores.
Segundo Shani e Chalasani (1992) a principal diferença entre a segmentação e o
marketing de nicho é que a primeira refere-se ao processo de quebrar um grande mercado em
mercados menores, homogêneos e gerenciáveis; enquanto o segundo visa encontrar uma
pequena parte do mercado a qual as necessidades não estão sendo supridas. Ou seja, mesmo
após o processo de segmentação, ainda restam pessoas com características que não estão
sendo atendidas, pois não pertencem a nenhum dos grupos definidos pela segmentação.
Portanto, o marketing de nicho parte de uma premissa ainda mais individualista das pessoas,
em linha com a evolução do período moderno.
Nesse sentido Shani e Chalasani (1992) listam alguns pontos antagônicos entre
segmentação e o marketing de nicho. Segundo os autores, a segmentação: utiliza uma
abordagem de cima para baixo, divide baseada nas diferenças, todos os membros do grupo
14
são considerados idênticos e forma grandes grupos. Já o marketing de nicho: utiliza uma
abordagem de baixo para cima, agrega baseado nas similaridades, dá ênfase aos indivíduos e
forma pequenos grupos. Os autores afirmam:
Profissionais de marketing de produtos de consumo têm que se mover da
abordagem de cima para baixo de quebrar o mercado de massa, para a
abordagem de baixo para cima de agregar necessidades individuais em
lucrativos micro-mercados. (SHANI; CHALASANI, 1992, p. 46).
Ainda com relação ao marketing de nicho, Dalgic e Leeuw (1994, p. 44) destacam
que: “Novas demandas, mudanças na motivação dos consumidores e a individualização
(ambas negócios-negócios bem como negócios-consumidores), criaram uma multiplicidade de
mercados diversificados e fraturados em contraste com o que foi outrora um simples mercado
de massa.” Tanto que esses autores defendem que uma idéia chave no marketing de nicho é a
especialização por parte da empresa com vistas ao atendimento de necessidades específicas
dos consumidores.
Independente das diferenças analisadas, tanto a segmentação quanto o marketing de
nicho, percorrem o caminho rumo à individualização, têm seus focos na formação de grupos
de consumidores e formam mercados específicos. Nos anos 90 surge um conceito ainda mais
radical de individualização: a customização. Tal processo foi, em grande parte, facilitado
pelos avanços tecnológicos que começaram a permitir que as empresas oferecessem produtos
únicos para cada cliente. Como afirmam Gilmore e Pine II (1997, p. 91): “No seu desejo de se
tornarem orientadas aos consumidores, muitas empresas se voltaram a inventar novos
programas e procedimentos para suprir qualquer demanda dos clientes.”.
Conforme Gilmore e Pine II (1997), consumidores não podem mais ser vistos como
pertencentes a grupos de mercados homogêneos, sejam eles grandes ou pequenos, pois cada
consumidor é o seu próprio mercado. Mesmo assim, segundo os autores, o desafio não
termina por aí: “... de fato, a jornada não termina com cada consumidor sendo o seu próprio
15
mercado. O próximo passo, um largo reconhecimento de que múltiplos mercados residem
num único indivíduo, irá mudar por completo a noção de mercados e consumidores.”
(GILMORE; PINE II, 1997, p. 92). Essa última afirmação, apesar de já conter elementos do
marketing na pós-modernidade, como será visto mais adiante, abre espaço para um conceito
mais recente dentro do marketing moderno: o marketing de relacionamento.
Segundo Shani e Chalasani (1992), o marketing de relacionamento diz respeito ao
desenvolvimento de um relacionamento contínuo com os clientes através de uma família de
produtos ou produtos relacionados. Esse conceito vai ao encontro do colocado por Gilmore e
Pine II (1997) quando mencionam a existência de vários mercados dentro do mesmo
indivíduo. Shani e Chalasani (1992) enfatizam que a maneira mais efetiva de se explorar
nichos cada vez menores é através do marketing de relacionamento com cada indivíduo sendo
o único membro do nicho e destacam ainda uma série de características do marketing de
relacionamento, entre elas: orientado para o relacionamento, comunicação um a um, interesse
de longo prazo (para a vida toda), requerimento de larga base de informações, requerimento
de canais de comunicação interativos e ênfase em fazer do consumidor um parceiro.
Conforme Shani e Chalasani (1992), o marketing de relacionamento só é possível com
o apoio da tecnologia da informação representada pelo database marketing. Esse conceito, ou
ferramenta, foi descrito pelos autores como a coleta de informações acerca do passado,
presente e consumidores em potencial para construir uma base de dados que melhore os
esforços de marketing. O contexto do marketing de relacionamento via database marketing,
chega às organizações, que parecem se aproximar da vida de seus consumidores.
16
2.3 PÓS-MODERNIDADE
Conforme Harvey (2000), ao final da II Guerra Mundial, com os Estados Unidos da
América (EUA) hegemônicos no mundo, o modernismo perdeu seu atrativo de antídoto
revolucionário para alguma ideologia reacionária e tradicionalista. Teria sido nesse contexto
que os vários movimentos contra-culturais e anti-modernistas dos anos 60 apareceram,
culminando em 1968. Dessa data até 1972, em algum ponto, teria emergido o pósmodernismo.
Segundo Firat (1995, p. 40): “Possivelmente a maior diferença entre modernismo e
pós-modernismo é a rejeição pós-modernista da idéia moderna de que a experiência social
humana tem, fundamentalmente, bases reais.”. Para esse autor, o pós-modernismo entende
que muito dos ideais modernos referentes à individualidade, liberdade e estrutura são
arbitrários e efêmeros ao invés de essenciais e críticos.
Harvey (2000) coloca como características da pós-modernidade a total aceitação do
efêmero, da fragmentação, do descontínuo e do caótico além da aceitação da fragmentação,
do pluralismo e da autenticidade de outras vozes e outros mundos. E acrescenta que as
construções pós-modernas passam a privilegiar as pessoas e não o “homem”. O que, em
princípio, parece ser uma contradição, se levada em consideração a característica moderna da
individualidade. Todavia, para esse autor, a modernidade via o homem como uma instituição
linear e não como as pessoas em suas características mais íntimas.
Para Brown (1993) o pós-modernista rejeita o apelo de impor ordem e coerência à
realidade, pois o conhecimento é visto como algo limitado, assim como a capacidade humana
de generalizar significados. Dessa forma, o pós-modernista ao invés de procurar verdades
universais se satisfaz com o efêmero, com a contingência e a diversidade do mundo físico e
humano.
17
Alem das características já mencionadas, o período pós-moderno traria ainda uma
forte relação com o passado, o que seria mais um fator de distanciamento do modernismo e o
seu projeto de futuro. Para Brown (1997) não existe nenhuma dúvida de que a pósmodernidade parece mais ligada ao passado do que ao futuro, com o que “está sendo” mais do
que com o que “se tornará”, com “retrospectiva” mais do que com “perspectiva”. Harvey
(2000) também enfatiza o resgate do passado.
Todas essas características pós-modernistas mencionadas parecem ter gerado
mudanças nas sociedades e em como as pessoas se relacionam. Daí surgiram várias linhas de
pensamento que procuram situar o homem nessa nova etapa de sua existência. Maffesoli
(2005, p. 15) procurou estudar a falência do político, ou do projeto moderno de futuro. E, logo
no início de sua obra, adverte: “Essas duas entidades (Deus e Política) perderam a força de
atração... Somente o presente vivido, aqui e agora, com outros, importa.”.
Para Maffesoli (2005 p. 23), “... o político é uma instância que, na sua acepção mais
forte, determina a vida social, ou seja, limita-a, constrange-a e permite-lhe existir.”. O autor
faz essa afirmação tentando ilustrar que o projeto político da modernidade prevê uma
aceitação geral de um status quo e de que a sociedade estaria ligada à desordem enquanto o
Estado à razão. Dessa forma, como o projeto era de futuro, nada mais viável do que a política.
Segundo o autor, o desejo de perfeição do Estado, fez com que este fosse entregue a uns
poucos “puros” que, para permanecerem no poder, transformaram-se no decorrer do tempo
em nome de sua própria perenidade. Dessa forma as pessoas começaram a se afastar da vida
pública, voltando-se para o privado e o Estado tendeu a tornar-se cada vez mais abstrato.
Além disso, Maffesoli (2005, p. 56) reconhece no projeto político o defensor da razão:
“A deusa razão, Espírito Santo da modernidade, é a única inspiradora dos virtuosos e dita-lhes
não somente o que é bom para eles, o mínimo, mas também o que é bom para todos, aqui e
em qualquer lugar.”.
18
Ainda sobre a política, Maffesoli (2005) conclui que, frente à situação mencionada
anteriormente, a sociedade que validou o político muda e passa não mais aceitá-lo através de
uma forte indiferença à coisa pública e à racionalidade. Nesse contexto a não ação torna-se o
emblema da pós-modernidade e o mundo passa a ser aceito pelo que ele é e não pelo que se
gostaria que fosse. E acrescenta: “... em lugar de dominar o mundo, de querer transformá-lo
ou mudá-lo, opta-se por unir-se a ele pela contemplação.” (MAFFESOLI, 2005, p. 108).
Contemplação essa que é representada, em grande parte, pela estética que é definida pelo
próprio Maffesoli (2000) como sendo a faculdade comum de sentir e de experimentar.
Maffesoli (2005, p. 114), então, atesta que: “... a consistência de um conjunto social vem
essencialmente de uma força invisível que toma corpo nos totens, emblemas ou imagens
diversas e assim constitui o corpo social.”.
Por fim, Maffesoli (2005) destaca a nova dinâmica entre as pessoas quando atesta que
o sujeito não é mais o único ângulo de ataque para a compreensão da vida do indivíduo social
e de suas relações com o meio social e natural. Nessa nova realidade de interação com o
mundo natural o “eu” torna-se “nós”, e o indivíduo torna-se relativo, pois só faz sentido
quando participa de um grupo. Enquanto a modernidade se dedicou a separar as pessoas, a
pós-modernidade os une em tribos. E fecha refletindo: “De fato, projetando-se, participando,
magicamente, de um conjunto mais amplo, e rompendo, assim, a carapaça individual, alcançase uma espécie de realização de si oriunda da recepção do outro, da perda no outro.”
(MAFFESOLI, 2005, p. 199).
2.4 O MARKETING NA PÓS-MODERNIDADE
Segundo Bauman (2003), em tempos pós-modernos, as comunidades voltam à tona
com muita força, pois durante a modernidade houve todo um movimento de individualização
19
no qual as pessoas trocavam sua segurança por liberdade. Na pós-modernidade o movimento
tenderia a se inverter com as pessoas procurando mais segurança do que liberdade. Para o
autor a comunidade é um lugar confortável e aconchegante, onde podemos contar com a boa
vontade dos outros, e frisa: “As palavras têm significado: algumas delas, porém, guardam
sensações. A palavra ‘comunidade’ é uma dessas. Ela sugere uma coisa boa...” (BAUMAN,
2003, p. 7).
Cova e Cova (2001a) seguem essa linha de pensamento e aprofundam a
pesquisa sobre as características quasi-arcaicas das tribos pós-modernas: não podem contar
com um poder central para manter a ordem social, constituem um ator coletivo que representa
um contra-poder ao poder institucional, não agrupam pessoas em função de algo racional e
moderno (projeto, profissão,...), mas sim de algo não racional e arcaico (localidade, emoção,
paixão,...) e participam do re-erguimento do mundo. Mesmo assim os autores frisam que
existem sim algumas diferenças entre as tribos arcaicas e as modernas, pois as primeiras eram
permanentes e totalizantes, o membro só podia pertencer a uma única tribo, era limitada
fisicamente e unida por laços de parentesco e dialeto.
Já essas tribos pós-modernas, segundo Cova e Cova (2001a), apresentam as seguintes
características distintas às tribos arcaicas: são efêmeras e não totalizantes, o membro pode
pertencer a mais de uma tribo (inclusive representando diferentes papéis dependendo da
tribo), os limites são virtuais e são unidas por sentimentos compartilhados e símbolos
específicos.
Com relação à formação das tribos, Maffesoli (2000) destaca que estas até podem ter
um objetivo, mas não é isso o essencial. A energia despendida para a formação do grupo é o
mais importante na opinião do autor, pois, dessa forma, elaborar novos modos de viver é uma
criação pura.
20
No período pós-moderno em que vivemos, segundo Maffesoli (2000), o dinamismo
social não mais trilha os caminhos da modernidade de forma que o papel da sociedade vai
além das instituições através de uma “centralidade subterrânea informal”. Nesse contexto a
cultura vem prevalecendo sobre o processo econômico-político e o social migrando para o que
o autor chama de “socialidade”. Essa última teria suas características básicas bem antagônicas
ao período moderno, são elas: uma estrutura complexa ou orgânica, as pessoas e seus papéis
e, por fim, a formação das tribos.
Para Bauman (2003), trata-se de uma busca por segurança que acontece em função da
quebra com a rigidez moderna de até então que gerou uma incerteza nos governados sobre o
próximo movimento do governante que, por sua vez, liberou o indivíduo para procurar
segurança nas comunidades. O mundo teria se tornado flexível e amorfe, as certezas não mais
existiriam levando a momentos de incerteza e obscuridão com relação ao futuro.
Num mundo muito pouco linear, Maffesoli (2000) ressalta que as tribos desenvolvem
mecanismos de proteção. Um deles diz respeito à lei do segredo: “Ao contrário de uma moral
imposta e exterior, a ética do segredo é, ao mesmo tempo, federativa e equalizadora.”
(MAFFESOLI, 2000, p. 131). O silêncio teria a vantagem de favorecer a cumplicidade entre
aqueles que o praticam. A outra forma de manter o grupo unido é a “máscara”. Quanto mais
se avança mascarado, mas se fortalece o laço comunitário.
Complementando, Maffesoli (2000), aborda a questão do espaço onde as tribos fincam
suas raízes: a cidade. Sobre a cidade o autor argumenta que contêm em si outras entidades do
mesmo gênero: bairros, grupos étnicos, corporações, tribos que vão se organizar em torno de
territórios específicos (reais ou simbólicos) e de mitos comuns. Toda essa heterogeneidade
não pode mais ser resolvida pela política, mas sim pelo negociar, entrar em acordo. Para tanto
são comuns alguns fatores de agregação, tais como: culturais, sexuais, vestimentares,
21
religiosos, políticos, intelectuais, etc. Uma vez estabelecidas, as tribos passam a dividir o
mesmo espaço através de uma rede de comunicação.
Mesmo assim, Bauman (2003) destaca que existe, no mundo atual, uma classe de
abastados que mantém-se isolados da comunidade. Entendendo-se por abastados aqueles que
adotam uma visão distanciada do mundo, voltada apenas para o consumo fútil, o autor atesta
que estes também se aglutinam entre si, mas o tipo de relação estabelecida não os caracteriza
como uma comunidade.
Conforme Maffesoli (2000), as tribos, ou tribalismo, dizem respeito à coesão, lugares
e ideais. Os principais pilares do tribalismo seriam a ética, estética e costume. Sobre a ética o
autor enfatiza que se trata do cimento que fará com que diversos elementos de um dado
conjunto formem um todo. Já a estética se refere à faculdade comum de sentir e experimentar.
Por fim, o costume seria o conjunto dos usos comuns que permitem a um grupo social
reconhecer-se como aquilo que é.
Maffesoli (2000) segue sua análise sobre o tribalismo pós-moderno voltando à questão
da estética. Segundo o autor é a estética pura que interessa: como se vive e como se exprime a
sensação coletiva. E não apenas uma questão de gosto ou de conteúdo. Dessa forma, cada
grupo é para si mesmo, seu próprio absoluto não possuindo uma visão daquilo que deve ser
uma sociedade. Tudo isso supõe que exista uma multiplicidade de estilos de vida, um
multiculturalismo que, de maneira conflitual e harmoniosa, se põem e opõem uns aos outros.
E coloca isso em perspectiva com o dia-a-dia: “... a densidade da vida cotidiana é, antes de
tudo, a conseqüência de forças impessoais... essa vida cotidiana, em sua frivolidade e
superficialidade, é certamente o que torna possível qualquer forma de agregação, seja ela qual
for.” (MAFFESOLI, 2000, p. 127).
Abordando um pouco mais profundamente as características de uma comunidade,
Bauman (2003) destaca que o tipo de entendimento em que a comunidade se baseia precede
22
todos os acordos e desacordos. Tal entendimento, na visão desse autor, é compartilhado e
tácito. E assim deveria ser, pois só se pode continuar feliz enquanto mantém-se a inocência.
Ou seja, desfrutar da alegria ignorando a natureza das coisas que o fazem feliz sem tentar
mexer com elas. Essas características fazem da comunidade uma instituição frágil, distinta,
pequena, homogênea e auto-suficiente que, para se manter viva, precisa de vigilância, reforço
e defesa.
Para Bauman (2005) a identidade vem das comunidades pós-modernas que surgiram
através de idéias em comum. Além disso, segundo o autor, a identidade fala a linguagem dos
que foram marginalizados pela globalização. Nesse contexto, a identidade é uma convenção
socialmente necessária. E conclui: “As pessoas em busca de identidade se vêem
invariavelmente diante da tarefa intimidadora de ‘alcançar o impossível’...” (BAUMAN,
2005, p. 16).
Conforme Bauman (2005), ainda no período moderno, surgiu a idéia de identidade
nacional, mas que nada tinha ver com o conceito de identidade, pois exigia adesão inequívoca
e fidelidade exclusiva. Não havia sido gestada e incubada na experiência humana, mas sim
forçada pelo Estado. Além disso, a identidade nacional não reconhecia competidores, muito
menos opositores. Nos dias de hoje, as pessoas passam por diversas comunidades diferentes.
É uma espécie de existência “fatiada”, o que traz à tona a fragilidade e a condição
eternamente provisória da identidade.
Interessante destacar que Maffesoli (2000) faz uma constatação com relação à
identidade, especialmente a nacional, que parece complementar a opinião de Bauman (2005)
sobre esse mesmo tema: “Fica entendido que a ‘identidade’ diz respeito tanto ao indivíduo
quanto ao grupamento no qual este se situa: é na medida em que existe uma identidade
individual que vamos encontrar uma identidade nacional.” (MAFFESOLI, 2000, p. 92).
23
Ainda segundo Bauman (2005), “Globalização significa que o Estado não tem mais o
poder ou o desejo de manter uma união sólida e inabalável com a nação.”, nesse contexto a
identidade perde as âncoras sociais que a faziam parecer natural, e a identificação se torna
cada vez mais importante para os indivíduos que buscam um “nós”. E atesta: “... ‘identificarse com...’ significa dar abrigo a um destino desconhecido que não se pode influenciar, muito
menos controlar.”.
Bauman (2005) se concentra ainda em abordar a questão de que a tratativa da
identidade não é linear. Em relação às pessoas, para o autor, o mundo está estratificado em
duas dimensões: aqueles que podem escolher e moldar suas identidades (abonados) e aqueles
que têm suas identidades impostas (pobres e renegados). Além dessas diferenças sociais que
impactam na definição da identidade, Bauman (2005) lembra também do caráter efêmero da
própria identidade: “A construção da identidade assumiu a forma de uma experimentação
infindável. Os experimentos jamais terminam.”. E conclui dizendo que as pessoas sentem-se
sobrecarregadas de responsabilidades em relação a ter uma identidade e, por isso, ansiosas por
mais liberdade de expressão, o que só pode aumentar suas responsabilidades. Portanto, a
comunidade é um fenômeno ambíguo, amado ou odiado, amado e odiado.
Maffesoli (2000) segue essa linha penetrando ainda mais profundamente no
movimento tribalista. Acerca do atual momento, o autor destaca: “Insistiram tanto na
desumanização, no desencantamento do mundo moderno, na solidão que este engendra que
não conseguem mais ver as redes de solidariedade que nele se constituem.” (MAFFESOLI,
2000, p. 101). E segue dizendo que tais agrupamentos sociais compartilham momentos de
êxtase dentro do grupo de forma que podem ser consideradas comunidades emocionais.
Nesse ponto, Maffesoli (2000) parece julgar importante fazer uma diferenciação entre
o conceito clássico de tribalismo e o neo tribalismo. Enquanto o primeiro traz uma carga
muito grande de estabilidade, o segundo se refere à fluidez, ajustamentos pontuais e
24
dispersão. E é esse último o contexto pós-moderno. Um mundo onde aparência é vetor de
agregação. Cada um é, ao mesmo tempo, ator e espectador. Onde a comunicação verbal e não
verbal constitui uma ampla rede que liga os indivíduos entre si, contrariando a perspectiva
racionalista de considerar apenas a verbalização como estatuto de laço social.
A título de síntese das características pós-modernas, pode-se recorrer a Brown (1993)
que fez um amplo levantamento nesse sentido. São elas: desordem / caos, ambigüidade /
indeterminação, pós-fordismo / escritório, estilo / superficial, estático / hoje, heterogeneidade
/ pluralidade, igualdade / jovem, performance / imitação, brincalhão / centrado em si,
participação / paródia e incongruência / chance.
2.5 O MARKETING E AS COMUNIDADES
Vários autores (BROWN, 1997; COVA, 1997; COVA; COVA, 2001a; FIRAT et al.,
1995; FIRAT; SHULTZ, 1997) buscaram relacionar as características da pós-modernidade ao
marketing. Dentro do contexto pós-moderno é natural que a disciplina de marketing passe por
mudanças ou, pelo menos, que passe a ser repensada. Foi nesse intuito que Casotti (1998)
parece ter intitulado seu artigo de “Marketing Moderno e Consumidor Pós-Moderno?”. Nesse
ensaio a autora questiona justamente a adaptação do marketing moderno à nova realidade
trazida pela pós-modernidade. E conclui:
O Marketing assim como a Filosofia, procurou o caminho seguro das
ciências. Na busca de se firmar como tal parece ter se desenvolvido através,
principalmente, de um cientificismo exagerado com predominância do
positivismo lógico. Não temos a menor pretensão de negar a enorme
contribuição que os trabalhos empíricos sofisticados e de natureza
quantitativa tem fornecido ao desenvolvimento desta área de conhecimento,
no entanto o marketing deve estar associado a características como a
abertura, a tolerância, a flexibilidade, a crítica, o relativismo, a diversidade
que, de acordo com nossa análise, são características mais associadas à
condição pós-moderna do que as idéias de progresso, de verdades, de
generalizações, de planejamentos e de segurança, mais associadas ao
pensamento moderno. (CASOTTI, 1998, p. 11).
25
Tanto que para Cova (1997) a fragmentação da sociedade e do consumo são as facetas mais
visíveis da pós-modernidade.
Pensamento similar parece ser o de Firat et al. (1995), pois os autores começam o seu
artigo atestando que existe uma dicotomia entre a teoria e a prática de marketing. Segundo os
autores, a primeira ainda seria moderna enquanto a segunda pós-moderna. Um dos
argumentos que usam para ratificar essa posição é que a realidade prática do comportamento
do consumidor não é tão exata quanto prega a teoria. O outro argumento utilizado é o de que,
em teoria, se produtos refletem valores, ao controlar o composto de marketing, controlar-se-ia
os valores atribuídos pelas pessoas ao produto. Já na prática, a imagem é o que se vende e o
produto apenas a tangibiliza. Em suma, na visão moderna as características físicas do produto
supririam as necessidades dos consumidores; na visão pós-moderna o foco passa a ser na
imagem. Talvez seja por isso que Firat et al. (1995) seguem dizendo que mudanças no
marketing podem ser reflexo de uma mudança social generalizada.
Nesse mesmo sentido, Cova (1996, p. 16) inicia seu artigo dizendo: “Pós-modernismo
propõem um completo repensar dos princípios da ciência em geral e da teoria de marketing
em particular... Pós-modernidade diz respeito a desafios completamente novos para a gerência
de marketing.”.
Firat et al. (1995) destacam uma série de mudanças, com implicação para o marketing,
envolvendo o sujeito pós-moderno. Em termos das necessidades, os autores destacam que no
modernismo é o consumidor que as guia e, na medida em que novas demandas vão surgindo
aleatoriamente, os pós-modernistas passam a reconhecer esse fato e focam na parte simbólica
dessa construção de necessidades. Quando o assunto é o ato do consumo o artigo frisa que na
modernidade as pessoas tinham um padrão, pois todos buscavam projetos e objetivos em
comum. Já na pós-modernidade as pessoas buscam experiências diferentes, mesmo que
através do mesmo produto / serviço. Por fim, em relação ao consumidor em si, os autores
26
concluem que, com todas essas mudanças, ele passa a interagir na “produção” do produto ou
serviço, pois passa a ser importante ter o poder de moldar a sua auto-imagem através desses
produtos ou serviços.
Para a Firat e Shultz II (1997), na modernidade o consumidor foi colocado no centro
do projeto, sendo um indivíduo com uma mente livre de sensações e emoções. Essa
uniformização das pessoas teria possibilitado sua segmentação em grupos relativamente
homogêneos em termos de comportamento, necessidades e orientação. Já Cova (1997, p. 299,
300) salienta que, na pós-modernidade, o sujeito está numa movimentação social eterna e que,
na ausência de referências modernas, o indivíduo volta-se para objetos, serviços e locais no
intuito de formar uma identidade. E complementa: “Nós entramos agora na era do indivíduo
ordinário, isso significa uma era quando qualquer indivíduo pode (e deve) tomar ação pessoal
no intuito de produzir e mostrar sua própria existência, sua própria diferença.”.
Já Bauman (2005) atesta que os indivíduos transitam por diversos grupos diferentes,
“fatiando” sua existência. Isso acontece porque as pessoas não querem mais se “aprisionar” a
uma identidade específica. E diz: “... a ‘identidade’ só nos é revelada como algo a ser
inventado e não descoberto...” (BAUMAN, 2005, p. 22).
Cova e Cova (2001b) também analisam os impactos da pós-modernidade em relação
ao marketing quando colocam que as tribos diferem dos segmentos psicográficos pela sua
curta vida e grande diversidade. E dizem:
É justo dizer que o tribalismo pós-moderno traduz uma necessidade de
pertencer não apenas a um grupo, mas a vários grupos diferentes
simultaneamente, e que a associação tribal não envolve ter os mesmos traços
de personalidade ou valores, mas expressa uma experiência compartilhada
de talvez apenas alguns aspectos da história pessoal de cada um. (COVA;
COVA, 2001b, p. 69).
Com a passagem para a pós-modernidade, Firat e Shultz (1997) destacam que o
marketing passa a ter uma perspectiva de não conceitualizar o consumidor como um fim em si
27
mesmo, mas como um momento num ciclo contínuo de (re) produção. Segundo os autores, o
marketing pós-moderno deve oferecer: produtos que ajudem a projetar (auto) imagem e (con)
textos que permitam aos consumidores terem experiências e experimentar. E terminam
dizendo que, na pós-modernidade, as atenções se voltam para os sentimentos dos
consumidores e não para a demografia. Além disso, conforme Cova (1997), o sistema de
consumo passa a ser central para a existência do indivíduo e os produtos passam a representar
o outro no processo de criação da identidade. Portanto o sistema de consumo passa a servir à
ligação social, e não o contrário.
Nesse sentido Cova (1997) inicia seu artigo colocando a pergunta: “... é possível
estender as fronteiras do marketing para além do nível individual de análise no intuito de
aumentar nosso entendimento do comportamento do consumidor?”. Para o autor, o indivíduo
liberado das ligações modernas passa a tentar recompor seu universo social com base na
emoção. No contexto da sociedade pós-moderna, diferentemente da moderna, que fora
concebida como uma montagem de grupos sociais, são formadas redes sociais de microgrupos nos quais os indivíduos compartilham emoções, sub-cultura e visão de vida. Na visão
do autor, o resultado de tudo isso é a formação do que chamou de tribos pós-modernas, um
agrupamento social onde a ligação é mais importante do que a coisa em si. Além disso,
acrescenta: “A palavra tribo refere-se à re-emergência de valores quasi-arcaicos: um senso
local de identificação, religiosidade, sincretismo, narcisismo grupal,...”. E enfatiza: “Na pósmodernidade, o produto ou serviço não isola, mas é como o totem para as tribos primitivas,
serve como pólo de atração para as tribos pós-modernas.”.
Cova (1996) argumenta que o marketing passa a ser um vetor de agregação dessas
tribos. Afirmação que guarda relação estreita com o conceito de valor de ligação (COVA,
1997), na medida em que nesse artigo (COVA,1996, p. 21) o autor já menciona que:
“...pessoas pós-modernas valorizam bens e serviços que, através de seu valor de ligação,
28
permitem e suportam interações sociais do tipo comunal.”. Isso aconteceria, pois essas tribos
efêmeras precisam estar constantemente afirmando e consolidando sua união. Nesse contexto
o papel do marketing passa a ser o de lançar produtos e serviços que facilitem esse
agrupamento, ou seja, se transforma em “marketing tribal” (COVA, 1996).
Nesse mesmo sentido, Cova; Cova (2001b) ressaltam que o importante para o
marketing passa ser colocar menos ênfase no produto ou serviço em si, mas sim suportar
produtos ou serviços que mantenham as pessoas juntas como uma comunidade de entusiastas
ou devotos. Novamente, tratam-se dos conceitos de valor de ligação (COVA, 1997) e
marketing tribal (COVA, 1996). Com relação ao primeiro, segundo Cova e Cova (2001b):
... refere-se à contribuição do produto ou serviço para estabelecer e/ou
reforçar a união entre indivíduos. Tal valor de ligação raramente é inerente
ao conceito de valor de uso do produto/serviço... Quanto maior a
contribuição de um produto ou serviço para o desenvolvimento e reforço da
união tribal, maior será o seu valor de ligação. (COVA; COVA, 2001b, p.
70).
Tanto que nesse mesmo artigo os autores definem tribo como sendo: “... uma rede de pessoas
heterogêneas – em termos de idade, sexo renda, etc. – que estão interligadas por uma paixão
ou emoção em comum.” (COVA; COVA, 2001b, p. 69). Daí a importância atribuída ao valor
de ligação de produtos e/ou serviços.
De qualquer forma, Cova (1997) destaca que, nos dias de hoje, existe sim a
coexistência de quatro tipos de ligações sociais: tribos pós-modernas, comunidades
tradicionais, agregações modernas e individualidade da modernidade tardia. Fato esse que traz
ainda mais complexidade para a disciplina de marketing uma vez que tratam-se de diferentes
motivações para o consumo. E acrescenta que, mesmo uma pessoa pode consumir de maneira
diferente no curso do seu dia-a-dia. Tudo isso causaria então uma confusão no consumo e
uma extrema dificuldade na identificação dos hábitos dos consumidores. Por isso, o autor
termina dizendo que o marketing pós-moderno não tenta encaixar o consumidor em
29
segmentos ou nichos, mas sim tenta entender: as situações de consumo e seu entorno físico, os
rituais de consumo e as tendências de consumo, todos influenciando o humor e o
comportamento do consumidor.
Com toda essa complexidade envolvendo consumo e consumidor, Cova e Cova
(2001a) defendem uma abordagem etnosociológica do consumo, ao invés da tradicional
abordagem sociológica. Para esses autores em tempo de tribos pós-modernas o marketing
deve também passar a assumir características tribais, focando mais o valor de ligação do que
os produtos e serviços em si. Ou seja, a empresa deveria orientar suas ações na relação
consumidor-consumidor do que na relação desses com ela própria, passa a fazer um suporte
ao relacionamento dos membros da tribo, interage com os rituais e locais de culto da tribo e
constrói uma lealdade afetiva ao invés de cognitiva.
Firat e Shultz (1997) também se encarregaram de descrever algumas características
inerentes ao marketing tribal. Deve ser aberto e tolerante às demandas não tradicionais
comunicadas pelos consumidores. Deve comportar a criação de uma realidade simulada, pois
houve uma erosão do comprometimento com o projeto de futuro. Deve ser tolerante aos mais
diversos estilos de vida devido a perda de comprometimento das pessoas com um estilo fixo e
específico. Deve ser capaz de desconectar qualquer contexto específico fazendo o que os
autores chamaram de justaposições paradoxais. Deve permitir uma reversão do consumo /
produção, com o consumidor participando da produção do produto ou serviço. Deve enfatizar
a forma e estilo. E, finalmente, deve aceitar a desordem e o caos como regra.
Por fim, faz-se importante mencionar que, conforme destacam Rocha e Rocha (2007),
uma série de estudos com ênfase no comportamento de consumo grupal vem sendo
desenvolvida no Brasil. Segundo esses autores, tal esforço iniciou-se a partir de 1990 no
Instituto Coppead de Administração da UFRJ e hoje já foi adotado por outros centros de
30
pesquisa, como a UFRGS, por exemplo. Essas pesquisas, de maneira geral, focam-se em
grupos bem delimitados, buscando investigar aspectos específicos do consumo desses grupos.
Sobre alguns dos trabalhos levantados por Rocha e Rocha (2007) e os seus respectivos
objetivos, os autores escrevem:
... e como o consumo serve, entre outras coisas, para definir ou reconstituir
identidades após transições, como no caso de mulheres separadas
(FERREIRA, 2002) e homossexuais (PEREIRA; AYROSA; OJIMA, 2005);
para marcar o pertencimento a um grupo, como entre as ‘patricinhas’
(WALTHER, 2002) e ‘yuppies’ (SILVEIRA, 2002); para reafirmar a
identidade étnica, como entre judeus do Rio de Janeiro (BLAJBERG, 2001)
e entre os membros de uma comunidade black do Rio de Janeiro (LINO,
2005); para mostrar status e hierarquia, como entre profissionais liberais
negros (SOARES, 2002) e pobres da favela da Rocinha (MATTOSO, 2005a,
2005b; MATTOSO; ROCHA, 2005); para falar de relações de poder, como
consumidores insatisfeitos nos estudos de Chauvel (1999, 2000a, 2000b) e
Giglio e Chauvel (2002). (ROCHA; ROCHA, 2007, p. 75).
31
3 METODOLOGIA
Este capítulo descreve as perguntas de pesquisa, a metodologia utilizada, a forma de
coleta dos dados, a seleção dos entrevistados e os procedimentos de análise. Por fim, discute
desvantagens e limitações da abordagem utilizada. Este estudo exploratório utilizou
metodologia qualitativa e como métodos de coleta de informações a observação participante e
a entrevista em profundidade para responder a seguinte pergunta principal de pesquisa:
•
Quais são os principais fatores que influenciam os hábitos de consumo dos dois
diferentes grupos ou tribos que freqüentam locais distintos (posto 9 e posto 10) na
praia de Ipanema?
Para que se responda a pergunta acima, algumas outras também se fazem necessárias:
•
Como é a dinâmica interna de cada grupo?
•
É possível identificar características de tribos pós-modernas (COVA, 1997;
COVA; COVA, 2001a, 2001b)?
•
Que características estéticas são descritas como diferenciadoras de um grupo em
relação ao outro?
•
Quais são os principais itens de consumo identificados em cada um do grupo?
Creswell (2003) observa que:
Pesquisa qualitativa é emergente ao invés de ser estritamente préconfigurada. Vários aspectos emergem durante um estudo qualitativo. As
perguntas de pesquisa podem mudar ou serem redefinidas à medida que o
pesquisador aprende o quê perguntar e para quem deveria ser perguntado.
(CRESWELL, 2003, p. 181).
32
3.1 A PESQUISA QUALITATIVA
Em se tratando de um projeto de pesquisa, a escolha do tipo de pesquisa a ser realizada
é um dos pontos mais importantes, pois é a partir desse ponto que se vai delinear como as
informações serão obtidas (AAKER; KUMAR; DAY, 2004). Ainda segundo esses autores, a
premissa básica que sustenta os métodos qualitativos é a de que a reação de uma pessoa frente
a um estímulo não estruturado indicaria suas percepções básicas em relação ao fenômeno. Em
outras palavras, poder-se-ia dizer que nesse tipo de pesquisa, observações e entrevistas não
estruturadas podem fazer com que o observado / entrevistado revele seu comportamento
naturalmente, o que sugere ser o tipo de pesquisa mais apropriado para o presente estudo
exploratório, que é definido por Aaker, Kumar e Day (2004) como:
A pesquisa exploratória é usada quando se busca um entendimento sobre a
natureza geral de um problema, as possíveis hipóteses alternativas e as
variáveis relevantes que precisam ser consideradas. Normalmente existe
pouco conhecimento prévio daquilo que se pretende conseguir. (AAKER;
KUMAR; DAY, 2004, p. 94).
Vergara (1997) complementa: “Por sua natureza de sondagem (a pesquisa exploratória), não
comporta hipóteses que, todavia, poderão surgir durante ou ao final da pesquisa.” (p. 45).
3.2 A COLETA DE INFORMAÇÕES
Conforme Vergara (1997), “o método é um caminho, uma forma, uma lógica de
pensamento.” (p.12). Levando em consideração a pergunta de pesquisa, o método mais
adequado para se conseguir chegar às respostas seria o fenomenológico, cuja principal
característica seria: “Afirmar que algo só pode ser entendido a partir do ponto de vista das
33
pessoas que estão vivendo e experimentando; tem, portanto, caráter transcendental,
subjetivo...”. (VERGARA, 1997, p. 13).
Nesse tipo de abordagem o pesquisador consegue os dados necessários através de
observação, entrevistas e questionários não estruturados, nas histórias de vida, em conteúdos
de textos, etc., enfim, qualquer fonte que lhe permita refletir sobre as dinâmicas do objeto em
estudo. Segundo Aaker, Kumar e Day (2004), nesse tipo de pesquisa:
Os métodos são muito flexíveis, não estruturados e qualitativos, para que o
pesquisador comece seu estudo sem preconcepções sobre aquilo que será
encontrado. A falta de estrutura rígida permite que se investigue diferentes
idéias e indícios sobre a situação. (AAKER; KUMAR; DAY, 2004, p. 94)
Vergara
(1997)
corrobora essa
posição
quando
coloca
que,
no
método
fenomenológico, o pesquisador obtém os dados de que necessita na observação, em
entrevistas e questionários não estruturados, nas histórias de vida, enfim, em tudo aquilo que
lhe permita refletir sobre processos e interações.
3.3 SELEÇÃO DOS ENTREVISTADOS
A seleção foi feita por acessibilidade que, conforme Vergara (1997) está “longe de
qualquer procedimento estatístico, seleciona elementos pela facilidade de acesso a eles.” (p.
49). Além disso, foi utilizado o procedimento de Snow-balling (AAKER; KUMAR; DAY,
2004), de forma que um entrevistado fosse recomendando um outro de iguais características e
assim por diante, até que o número alvo de pesquisados fosse alcançado. Assim, optou-se por
encerrar os contatos de forma que o grupo do Posto 9 contou com um total de sete entrevistas
em profundidade e o Posto 10 com cinco, num total de doze para todo o estudo.
34
O filtro usado na seleção se resumia a perguntar se costumava ir a praia de Ipanema
nos postos 9 ou 10 e com que freqüência. Por freqüência entenda-se ao menos uma vez por
semana, em semanas com sol. Procurou-se entrevistar pessoas de uma faixa etária em torno de
20 ou 35 anos.
Primeiramente, a presente pesquisa também abrangeria os freqüentadores da Rua
Farme de Amoedo, mas, à medida que o projeto avançou, após a observação realizada junto a
esse grupo, essa idéia foi abandonada. O principal motivo para tal procedimento foi que esse
grupo parecia não mais caracterizar uma tribo pós-moderna (BAUMAN, 2003; COVA, 1997;
COVA; COVA, 2001a, 2001b; MAFFESOLI, 2000), haja vista que a maioria dos
freqüentadores seriam turistas que freqüentariam o local apenas de maneira esporádica.
A faixa de areia em frente à Rua Farme de Amoedo é reconhecidamente um reduto
gay do Rio de Janeiro. Durante muitos anos, foi freqüentada por cariocas gays e simpatizantes
à causa. Todavia, durante as primeiras observações e as entrevistas, ficou claro que os atuais
freqüentadores desse local não são mais aqueles de outrora.
Conforme reportagem da Revista O Globo (De Braços Abertos para Todos. Jornal O
Globo, Rio de Janeiro, 28 Janeiro 2007, Revista O Globo, p. 21 – 25), atualmente as pessoas
que vão à Farme são, na sua grande maioria, turistas GLS (gays, lésbicas e simpatizantes). Ou
seja, pessoas ali estão por se tratar de mais um ponto do turismo gay ao redor do mundo, e não
pelo fato de ser o ponto da tribo gay carioca na paria.
Além disso, a estética do grupo parece modificada e homogênea. Os corpos são bem
semelhantes e trabalhados em academias, usam o mesmo tipo de moda praia, o que faz com
que o grupo apresente uma grande homogeneidade. Um dos entrevistados na pesquisa chegou
a defini-los como “playmobil”, pelo fato de parecerem todos iguais.
Esses fatos foram percebidos também durante as observações, porém não foi nessa
fase que se abandonou a proposta de pesquisar a Farme. Mas sim à medida que, nas
35
entrevistas, aquilo que se suspeitou nas observações foi sendo ratificado: que os
freqüentadores da praia em frente à Farme não mais representavam uma tribo pós-moderna
nos moldes propostos por autores como Bauman (2003), Cova (1997), Cova e Cova (2001) e
Maffesoli (2000). Além disso, não foram poucas as menções a gays que atualmente
freqüentam outros pontos da praia, inclusive postos 9 e 10. Fornecendo indícios de que não
mais se identificariam (BAUMAN, 2005) com o grupo que hoje freqüenta aquele espaço.
Sendo assim, apenas freqüentadores dos Postos 9 e 10 foram entrevistados. Seus perfis
constam da tabela 1:
3.4 COLETA E TRATAMENTO DOS DADOS
3.4.1 OBSERVAÇÕES
Conforme Vergara (1997), a observação pode ser simples ou participante. No primeiro
caso, o pesquisador se mantém distante do grupo ou situação que pretende estudar. Já no
segundo caso, que foi o utilizado nessa pesquisa, o pesquisador se engaja na vida do grupo ou
situação. Tanto que Creswell (2003) coloca que esse tipo de procedimento permite ao
36
pesquisador “... desenvolver um nível de detalhe acerca do indivíduo ou lugar e ficar
altamente envolvido nas experiências atuais dos participantes.” (p. 181).
Conforme recomenda Creswell (2003), para realizar a observação participante foi
elaborado um “protocolo de observação” (p. 188). Com base na revisão de literatura, foi
estruturado um roteiro (Anexo 1) de maneira que os principais pontos pudessem ser
registrados amplamente. Além disso, essas informações também desempenhariam papel
importante na elaboração do roteiro final de entrevistas.
As observações foram feitas diretamente nos locais onde se concentram as tribos
pesquisadas e, de forma geral, duraram entre 45 minutos e 1 hora. Nesses procedimentos o
pesquisador se portou como qualquer outra pessoa que apenas desfrutava da praia, ou seja,
não necessariamente interagiu com algum dos freqüentadores do local. Apenas postando-se ao
sol com a utilização de uma cadeira de praia, de onde realizou, então, as observações.
Cada grupo pesquisado foi observado individualmente por três vezes, durante os dias
12 de Janeiro e 25 de Março do ano 2006. Importante destacar que tratam-se de meses de
verão no Rio de Janeiro, época em que as praias costumam estar cheias. Fato esse que pode
ser visto como prejudicial para as observações realizadas, pois o objetivo era focar em grupos
que estão o ano todo juntos na praia. Além disso, o verão e o carnaval atraem maior
quantidade de turistas, outro fato que podia distorcer a observação da composição dos grupos.
De qualquer forma, apenas uma observação de cada tribo foi feita sob essas condições, as
duas demais foram feitas em condições normais, pois aconteceram após o período
carnavalesco, de forma a atenuar possíveis distorções.
Além disso, ao final do período de observações os relatórios finais passaram por uma
“validação” feita por um membro de cada tribo que avaliou se, de maneira geral, as
impressões do pesquisador eram condizentes com a realidade do grupo. Creswell (2003)
propõem esse tipo de aferição, que chama de “member-checking” como forma de testar a
37
acuracidade das informações coletadas. Sendo assim, alguns desvios considerados mais
importantes pelos avaliadores puderam ser alterados de forma a não impactar a construção do
roteiro e dos achados da pesquisa.
3.4.2 ENTREVISTAS
Após as observações, o “member-checking” (CRESWELL, 2003) e, novamente, com
base na literatura, foi elaborado um roteiro de entrevistas (Anexo 2). O roteiro aberto e não
estruturado permitiu respostas livres dos respondentes (VERGARA, 1997).
Primeiramente, esse roteiro foi dividido em subgrupos onde procurou-se identificar os
temas de importância para a pesquisa, de acordo com as teorias já desenvolvidas por outros
autores. Por isso, os principais autores pesquisados na literatura aparecem destacados, o que
não quer dizer que eles tenham sido os únicos a falar sobre os temas em questão. Por fim, para
cada bloco, foram elaboradas perguntas abertas pertinentes para abordar os temas de
importância. Vale também mencionar que, conforme propõem Vergara (1997), o roteiro
também foi submetido a uma avaliação prévia por uma pessoa de conhecimento do
entrevistador e que freqüenta um dos grupos alvo da pesquisa no intuito de detectar pontos de
melhoria.
Devido à característica do roteiro, que foi divido em sub-temas, as entrevistas podem
ser classificadas como por pautas (VERGARA, 1997). Segundo a autora: “Na entrevista por
pauta, o entrevistador agenda vários pontos para serem explorados com o entrevistado. Tem
maior profundidade (do que a informal e a focalizada). Você pode gravar a entrevista, se o
entrevistado permitir, ou fazer anotações.” (p. 53). E assim foi feito. As entrevistas duraram
em média 50 minutos, nunca com menos de 30 minutos, e foram gravadas para posterior
transcrição.
38
Tendo pesquisador contato com alguns freqüentadores dos grupos alvo, o primeiro
passo foi pedir indicação de possíveis entrevistados. Feito isso, um primeiro contato por
telefone ou correio eletrônico checava se a pessoa realmente se enquadrava no perfil de
sujeito da pesquisa. Em caso positivo, um segundo contato, averiguava se estaria disponível
para uma entrevista. Nesse mesmo momento já era, então, proposto um encontro, com data,
hora e local. Após cada entrevista, o entrevistado era solicitado a indicar mais uma pessoa de
seu conhecimento que pudesse participar da pesquisa, conforme prevê a técnica Snow-balling
(AAKER; KUMAR; DAY, 2004).
3.4.3 TRATAMENTO DOS DADOS
Creswell (2003) coloca que a pesquisa qualitativa é fundamentalmente interpretativa.
As observações foram registradas em forma de anotações em uma planilha previamente
concebida para isso (Anexo 1). Conforme já mencionado, esses dados receberam apenas um
tratamento: a verificação junto a um freqüentador de cada um dos grupos alvo da pesquisa.
Feito isso, essas informações foram confrontadas com a literatura levantada e forneceram o
arcabouço para o roteiro final de entrevistas (Anexo 2), que também foi verificado por um
outro freqüentador da praia depois de pronto, mas antes de ser aplicado.
Em termos mais práticos, Creswell (2003) diz que a análise envolve: preparação dos
dados, condução de diferentes análises, profundo entendimento dos dados, representação
desses dados e interpretação dos mesmos. Como esse modelo de abordagem foi o adotado
para a análise das entrevistas, cabe listar o procedimento detalhado preconizado pelo autor (p.
191 – 195):
39
1. Organização e preparação dos dados para análise;
2. Leitura geral dos dados buscando formar um senso geral;
3. Início da análise detalhada: codificação dos dados;
4. Utilização da codificação para gerar descrições de pessoas e categorias de
análise;
5. Definir como as descrições serão representadas na análise final;
6. Análise final: fazer uma interpretação das informações geradas anteriormente.
As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas. Essas transcrições foram,
então, descritas uma a uma de forma que os principais pontos levantados pelos entrevistados
pudessem ficar registrados no corpo do trabalho. Além disso, essa tarefa de descrever as
entrevistas, acabou se constituindo em uma pré-análise dos dados na medida em que os pontos
mais interessantes e coincidentes foram já sendo destacados.
Para proceder as descrições, foram elaborados grupos de tema chave de forma que
toda transcrição foi divida e classificada de acordo com esses temas. Posteriormente, as
informações referentes a cada um desses grandes temas foram reagrupadas dando origem à
descrição da entrevista. Os temas foram:
•
O Grupo
•
Estética
•
Rituais, práticas e conversas
•
Sentimento em relação ao grupo
•
Percepção em relação aos vizinhos
•
Consumo
A parte final da análise dos dados das entrevistas foi feita com base nas descrições
acima mencionadas. Uma vez que todas as entrevistas já estavam categorizadas por temas,
abandonou-se as transcrições e as informações foram rearranjadas de forma que, por exemplo,
40
tudo que foi dito sobre estética fosse analisado em um bloco único, independente do
entrevistado. Isso proporcionou uma melhor visão geral dos pontos de interesse. Essa análise
final contou também com alguns retornos às gravações e aos dados das observações quando
houve necessidade de compreender melhor algum ponto.
3.5 LIMITAÇÕES
Segundo Aaker, Kumar e Day (2004), uma das principais limitações das pesquisas
qualitativas seria originada mais pela possibilidade de os dados serem utilizados de forma
inadequada, do que por suas desvantagens inerentes. Pois existiria uma forte tendência das
pessoas a aceitarem os resultados como verdades absolutas que podem ser projetadas para
representar o todo. Além disso, pela própria natureza desse tipo de pesquisa e o método
utilizado para a coleta e interpretação dos dados, poderia existir grande dose de ambigüidade
nas informações.
Já Creswell (2003) coloca mais um fator limitador à pesquisa qualitativa quando diz
que “... o pesquisador filtra os dados através de uma lente pessoal que está situada em um
momento sociopolítico e histórico específico. Não se pode escapar de interpretações pessoais
trazidas para a análise qualitativa.” (p. 182).
Mais especificamente com relação ao método fenomenológico, Vergara (1997)
pontua: “... vale alertar que o homem não é uma ‘tábula rasa’; logo suas crenças, suas
suposições, seus paradigmas, seus valores estão presentes no olhar que lança ao fenômeno
estudado.” (p. 13). Ou seja, ao lançar mão do método fenomenológico, a pesquisa está
automaticamente sujeita a vieses causados pela história de vida do pesquisador e seu
envolvimento com o fenômeno estudado, que podem impactar na interpretação dos dados.
41
4 OBSERVAÇÕES E ENTREVISTAS
4.1 AS OBSERVAÇÕES PARTICIPANTES
Esta seção tem por objetivo apresentar as observações participantes realizadas junto
aos grupos objetos do estudo. Tal procedimento, por sua vez, pretendia inserir o autor na
realidade desses grupos permitindo assim o levantamento de informações para o entendimento
do comportamento dos integrantes, inclusive colaborando com a posterior construção do
questionário para as entrevistas em profundidade.
Na seqüência serão apresentadas as observações participantes feitas antes da
realização das entrevistas.
4.1.1 O GRUPO QUE FREQUENTA A FARME DE AMOEDO
Esse grupo tem como principais características a concentração em frente à Rua Farme
de Amoedo e é composto, predominantemente, por gays, principalmente homens. Ao chegar
ao local é possível visualizar várias bandeiras do movimento gay hasteadas nas barracas dos
vendedores de praia. A estética, o comportamento e as diferentes línguas e sotaques que é
possível ouvir sugerem uma maioria de turistas estrangeiros. A maior freqüência de pessoas
se dá após o meio dia e o grupo fica reunido até o final da tarde, início da noite.
Não parece haver uma faixa etária mais característica do grupo, podendo ser avistados
jovens em torno dos 20 anos, mas também muitos na faixa dos 40 – 50 anos. Há
predominância de uma estética física específica, ou seja, grande parte do grupo exibe corpos
muito trabalhados em academias. Fica a impressão de que o “culto ao corpo” é seguido de
forma religiosa. Impressiona não só a semelhança dos corpos “trabalhados”, mas a dos
cabelos com cortes cuidadosos e das tatuagens diversas espalhadas pelo corpo.
42
Em termos de vestimenta o que se pode notar é que chegam à praia utilizando
bermudas, dos mais variados estilos e camisetas sem manga, na grande maioria das vezes.
Uma vez na areia, o principal traje é a sunga sem que haja um modelo ou tamanho específico.
Fato que se repete em relação às cores, pois não parece haver uma cor de preferência: o
colorido predomina, inclusive com a presença de sungas bastante estampadas.
Muitos produtos juntam-se à estética do corpo. Podem ser estritamente relacionados à
praia, como bronzeador e protetor solar, até uma gama mais ampla de apetrechos, como
pulseiras e cordões finos, óculos escuros grandes, tênis, iPod e tocadores de MP3 e mochilas.
Em relação ao comportamento dos indivíduos do grupo, pode-se notar que parecem
estar sempre atentos ao redor, prestando atenção aos que passam. Sentam-se sozinhos, em
duplas ou em pequenos grupos. Um produto, no entanto, parece ter destaque na estética do
corpo: chama atenção o ato de passar bronzeador ou protetor solar pelo corpo. Parece tratar-se
de um ritual importante que, muitas vezes, tem a ajuda do parceiro ou amigo. Conforme já foi
mencionado anteriormente, parece haver um forte culto ao corpo entre os integrantes do
grupo, e esse seria um ritual que confirmaria essa hipótese. Além disso, destacam-se também
o fato de trazerem toalhas para a praia e o hábito de beberem cerveja.
A pouca conversa e os muitos olhares ao redor pode ser conseqüência do grande
número de turistas estrangeiros. Tocam-se ao falar ou rir, utilizando muito a linguagem
corporal.
A sintonia que buscam parece ser com o sol. Estão deitados de frente, ou de costas, em
direção ao sol para a busca do melhor bronzeado. Enquanto fazem isso, costuma ler livros ou
revistas ou ouvir música nos mais variados aparatos eletrônicos.
O “grupo da Farme de Amoedo” parece ser vanguardista. Nesse sentido são comuns
roupas e acessórios diferentes. Em uma das observações pode-se inclusive presenciar a venda
de sungas e camisas “artesanais” com estilos bastante diferentes do censo comum.
43
O fato de turistas serem caracteristicamente grupos que se modificam com muita
freqüência e de já existirem vários outros locais na praia de Ipanema freqüentados por gays,
como os Postos 9 e 10, levou esse trabalho a optar por não entrevistar especificamente os
freqüentadores da “Farme de Amoedo”.
4.1.2 O GRUPO QUE FREQUENTA O POSTO 9
Tendo o mar como referência frontal, o posto de salvamento número 9 se situa um
pouco à esquerda da Rua Joana Angélica e se estende até próximo ao posto 10. Pode-se dizer
que seu fim é pouco antes do hotel Caesar Park.
Originalmente esse grupo da praia de Ipanema se situava bem em frente ao Posto 9,
mas pequenos deslocamentos foram acontecendo para a direita de forma que atualmente ela se
estabelece em frente ao chamado Coqueirão, que nada mais é do que uma árvore no calçadão
da praia que transformou-se em ponto de referência. Segundo informação de um freqüentador
convidado a opinar sobre as observações feitas, isso aconteceu quando o “grupo tradicional do
Posto 9” percebeu a presença de “outros” estranhos no local e resolveu deslocar-se
provisoriamente. Em termos de horário, o grupo se reúne principalmente após o meio dia e
assim permanece até o final da tarde, início da noite.
Chama à atenção a presença de muitas pessoas que poderiam ser classificadas como
“interessantes” “alternativas” e “diferentes”, enfim “o grupo do Posto 9” parece ser um
celeiro da diversidade.
Com relação às vestimentas, pode-se perceber que os homens utilizam bermudas de
praia sem camisa ao chegarem e, uma vez na areia, sungas lisas, geralmente de modelagem
grande e de cores mais contidas, como o azul marinho e o preto, por exemplo. Já as mulheres,
chegam vestidas com bermudas e saias, com predominância dessa última, e camisetas. Na
44
areia, vestem-se com biquínis de diferentes tipos. No pé? Havaianas das mais variadas cores e
estampas que se juntam a outros elementos estéticos como tatuagens e os piercings.
Os produtos que trazem nas suas bolsas ou mochilas parecem ser aqueles
exclusivamente voltados para uso na praia. Destacam-se o protetor solar, bronzeador, cangas e
óculos de sol.
O principal comportamento observado parece ser a sociabilidade do grupo. Em geral
sentam-se junto em grandes grupos e conversam bastante.
Onde está o sol? O grupo parece menos interessado no bronzeado e na posição em
relação ao sol. A prioridade parece ser a busca de uma boa posição para acompanhar as
conversas.
Que práticas unem o grupo? Entre as práticas do grupo a mais disseminada e
controvertida seja o hábito de fumar maconha na praia. Mas não é só. Os jovens costumam
ler, ouvir música e tomar cerveja. No campo dos esportes, são práticas comuns o vôlei de
praia e uma modalidade originada do futebol e adaptada a um especo pequeno: a “altinha”,
quando os jogadores mantêm a bola no alto com apenas um chute por vez, por pessoa.
O “grupo do Posto 9” deslocou-se e não está mais em frente ao Posto 9. Mas continua
sendo o “grupo do Posto 9”.
4.1.3 O GRUPO QUE FREQUENTA O POSTO 10
Esse grupo freqüenta a praia de Ipanema entre o Country Clube e o Posto 10. O grupo
costuma chegar ao local após o meio dia e ali permanecem até o final da tarde, início da noite.
Durante as observações participantes, o grupo parecia formado por uma maioria do
sexo feminino. Um fato que chamou a atenção foi a pouca presença de famílias com crianças.
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As idades são variadas e obeserva-se a predominância de corpos trabalhados em
academias e coloridos por tatuagens. Um fato que chama a atenção com relação às mulheres
são os cabelos muito bem cuidados. Muitas parecem se preocupar com eles durante a
permanência na praia. É possível observá-las usando variados produtos no cabelo enquanto
tomam sol ou banho de mar.
Com relação à vestimenta, pode-se observar que as mulheres chegam ao local de bata
ou utilizando short ou saia e camiseta. Nos pés usam Melissa ou Havaianas. Roupas e
acessórios parecem combinar de maneira arquitetada. Quando na areia, usam biquíni, na sua
grande maioria estampados, e boné. Já os homens vestem-se de maneira um pouco menos
complexa: bermuda de praia e Havaianas simples na chegada; e sungas grandes estampadas e
boné quando na areia.
Produtos? Canga, protetor solar, bronzeador, óculos de sol, produtos para cabelo e
grandes, novas e coloridas bolsas de praia, que parecem acompanhar a moda.
Os grupos podem ser pequenos, de três ou quatro pessoas, mas podem também chegar
a ter dez ou doze pessoas. Se marcam encontro? Muitos chegam com jeito de que nada
marcaram, mas que vão achar o que procuram. Sentam-se muito lado a lado e menos em rodas
de bate papo. Mais sol, menos conversa e mais água. Esporte? Predomina o vôlei de praia e o
frescobol.
Historicamente o edifício Cape Ferrat parece ter sido o responsável pela agregação
espacial desse grupo: “em frente ao Cape Ferrat”. Atualmente, parece se concentrar em frente
ao “prédio verde”.
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4.2 AS ENTREVISTAS
Esta seção tem por objetivo fazer uma descrição individualizada dos principais pontos
abordados em cada entrevista. Para tanto, uma série de temas chave, que serão listados a
seguir, servem de balizadores:
1. O Grupo
O objetivo dessa categoria é o de caracterizar o grupo conforme descrito por cada
entrevistado.
2. Estética
Descreve questões relativas à estética do grupo de praia na visão do entrevistado.
3. Rituais, Práticas e Conversas
Localiza rituais, práticas, hábitos e temas de conversas partilhados pelo grupo.
4. Sentimento em Relação ao Grupo
Identifica os principais sentimentos do entrevistado em relação ao grupo e os
principais sentimentos partilhados pelo grupo na visão do entrevistado.
5. Percepção em Relação aos Vizinhos
Opiniões emitidas por cada entrevistado acerca dos seus “vizinhos” de praia, ou
seja, “os outros” grupos investigados.
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6. Consumo
Identifica comportamento de consumo de cada entrevistado influenciado pelo
grupo.
4.2.1 Entrevistado 1: Ana (Posto 9)
Perfil: 24 anos, solteira, moradora de Botafogo, fisioterapeuta e atualmente trabalha como
vendedora de uma loja de roupas femininas.
Questão 1: Nem sempre a freqüentou o posto 9, já freqüentou a praia do Leblon. Mas destaca
que o grupo era outro. Composto por amigos do colégio e dos vizinhos, quando ainda morava
no bairro da Gávea. Como algumas dessas pessoas também freqüentavam a praia de Ipanema,
a entrevistada passou a ir com certa freqüência a essa praia. Com o passar do tempo, as idas à
Ipanema aumentaram, até que essa última se tornou o destino fixo.
Com relação ao grupo, destaca que tratam-se de pessoas que “gostam de estar ali umas
com as outras”, “de curtir a praia pela praia”, ou ainda pela social também, pois “você
encontra muita gente, aí senta, troca uma idéia, aí daqui a pouco você vê outra e senta,
conversa.”.
O grupo mora em diferentes bairros e conhece pouca gente que mora do bairro de
Ipanema. Esse grupo da praia é também é o grupo para outras ocasiões. Relata que o grupo se
formou em situações distintas à praia. Na maioria das vezes através de vínculos anteriores de
amizade ou trabalho: “São minhas amigas no trabalho, são minhas amigas na praia, são
minhas amigas fora, são minhas vizinhas.”. Apesar de a citação anterior mencionar apenas
amigas do sexo feminino, a entrevistada ressalta que existem também homens pertencentes ao
grupo.
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Apesar de achar que o grupo “vive em harmonia”, descreve heterogeneidade de
temperamentos: “... Acho que cada um tem um temperamento muito diferente... Umas bem
parecidas, mas tem umas que às vezes a gente bate de frente, mas é amiga,... Tem algumas
que você discute um pouco mais. Tem outras que não.”.
Questão 2: Em termos estéticos, relata que seu grupo é bastante homogêneo, ressaltando que,
fisicamente, “não são pessoas nem com corpos muito trabalhados nem fora de forma”. Em sua
opinião essa homogeneidade física é determinada, em grande parte, pelo interesses das
pessoas: “... É, porque a meu ver isso também são grupos entendeu? Porque você vê. Os
sarados, os bombados, andam com as bombadas, entendeu?”.
Descreve a aparência do seu grupo como sendo “todos pessoas magrinhas, homens
e mulheres” e “que se vestem bem”. Ressalta que existe um integrante que ela julga ser meio
“cafona”:
Ela, sei lá... Ela bota uma roupa, que sei lá... Caraca, por que usa essa roupa?
Que sandália é essa? Por quê você fez isso? Porque... Mas ela é assim. Ela é
assim. Não adianta você falar. Ela pode até ter as mesmas roupas do que eu,
mas ela faz as combinações que não são maneiras, mas é dela.
Ainda sobre a aparência física do grupo, a entrevistada relata que existem “pessoas
louras e morenas” e que “todos são bronzeados”. Diz que, em função do trabalho, as mulheres
andam sempre com unhas e cabelos bem feitos.
Questão 3: O grupo freqüenta a praia entre o meio dia e quatro e cinco da tarde. Fazem isso
em todos os finais de semana de sol.
O grupo sai da praia unido, rumo a algum restaurante onde possam almoçar juntos.
Já quando o assunto é a chegada, não há uma marcação prévia as pessoas apenas vão pela
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própria conta e lá se encontram. Mesmo assim, a entrevistada diz que, ao contrário dos
demais, ela faz ligações telefônicas para alguns integrantes antes de ir à praia.
Na praia conversam, jogam cartas e alguns mantêm o hábito de fumar maconha.
Quando perguntada se essa última prática é corriqueira, diz: “É clássico. Parece que a maioria
que vai comigo... Não, tem umas amigas minhas que também não, mas na hora que vai junto,
fuma e aí... Entra, dá uma fumada lá.”. Além dessas práticas, ela percebe também que existem
mais algumas, com o Futevôlei e a “Altinha”, um jogo de roda com bola cujo objetivo é
manter a bola no alto, sem deixá-la cair no chão.
Em termos de diferenças de hábitos entre homens e mulheres, destaca que as últimas
estão mais preocupadas em pegar sol sentadas em suas cadeiras, enquanto os homens parecem
não estar muito preocupados com isso. Nesse caso, os homens gastam até mais o seu tempo
conversando do que as mulheres.
Não há a obrigatoriedade de ir sempre à praia, pois o grupo também se encontra fora
dela. Enfatiza que, se alguém resolve abandonar o grupo, não há maiores “seqüelas”. Já a
entrada de alguém novo se dá, na maioria das vezes, através da apresentação por um já
membro.
Os procedimentos do grupo quando na praia variam muito, mas, em linhas gerais, se
resumem a alugar uma cadeira para se sentar, passar o protetor ou bronzeador solar,
mergulhar na água quando o calor aumenta e tomar líquidos para se hidratar.
O tema principal das conversas entre os membros do grupo são os acontecimentos do
dia-a-dia das pessoas: “Geralmente o que aconteceu no dia anterior assim, porque como a
gente está sempre junto, aí sempre rola aquela fofoca do dia anterior. Ou da saída ou do
acontecimento. Ou de uma coisa que vai acontecer no dia.”.
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Questão 4: O principal sentimento? A amizade. A entrevistada ressalta que todos são muito
amigos e que, inclusive, algumas integrantes são suas melhores amigas: “São minhas amigas
no trabalho, são minhas amigas na praia, são minhas amigas fora, são minhas vizinhas. E
ainda tem as outras que não trabalham...”. A principal conseqüência disso, ou talvez a causa, é
que as pessoas costumam ir aos mesmos lugares, fazer as mesmas coisas e conhecer as
mesmas pessoas.
“São pessoas que eu me sinto muito bem quando estou com elas.”. Isso tudo se
traduz em felicidade. Até porque menciona que não se sente obrigada a nada e é livre para
fazer o que bem entende, assim como todos os outros membros. Cita, inclusive, a questão de
temperamentos distintos como um exemplo dessa liberdade. Também relata independência no
sentido de abandonar o grupo quando quiser porque continuariam sendo seus amigos.
Ana se vê como a mais falante do grupo. E diz que seus companheiros a julgam a mais
esnobe dentre eles. O que, mais uma vez, não interfere em nada no bom relacionamento do
grupo, pois todos se conhecem muito bem. Ela vê seu grupo como pessoas falantes e alegres
que interagem muito umas com as outras.
Questão 5: Os vizinhos: “Tem uma galera bem parecida com a gente, mas tem uma galera
também... Tipo... Uma galera mais malhada, galera mais bombada, sarada.”.
Em relação ao Posto 10: “Do Posto 10 é uma galera assim... Uma galera mais
‘patricinha’, mais ‘mauricinho’.”. Quer dizer com isso que tratam-se de pessoas com corpos
mais trabalhados e que se preocupam em demasia com a aparência de uma forma geral: “...
uma galera do tipo assim: arrumadinha. Na praia entendeu? Tipo: um cordãozinho com
pulseira. Coisas que eu não vou botar.”.
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Em relação aos freqüentadores da Farme de Amoedo, a entrevistada comenta que, na
sua percepção, tratam-se, majoritariamente, de gays. Ressalta que, em sua opinião, são
pessoas felizes, alegres e engraçadas.
Questão 6: Em termos de hábitos de consumo, afirma não ter mudado em nada por causa do
grupo. Mas diz que, por causa da localização na praia algumas coisas mudaram sim. Cita
como exemplo o produto “sucolé do cãozinho”, que só estaria disponível no Posto 9. Além
disso, cita o Mate Leão que é feito pelo próprio vendedor, sendo que esse, notoriamente, não é
uma exclusividade do Posto 9, dessa forma constituindo-se uma pequena contradição por
parte da entrevistada.
De maneira análoga, acha que não influenciou de maneira alguma os hábitos de
consumo de seus colegas de grupo. Mas julga que os produtos que são, por acaso, consumidos
em comum conectam ainda mais as pessoas. Dentro desse contexto, declara o seguinte: “Tá
todo mundo comendo? Vou comer também! Aí você vai, com certeza.”.
Além disso, a questão do que as pessoas vestem parece ser um fator de distinção em
relação aos forasteiros: “... aparecer de maiô pra dar uma de doida assim... quando vejo umas
pessoas com aqueles biquínis grandes, sabe, porque geralmente a galera não usa muito.”. Em
relação aos homens, idem: “Pô, aquelas sungas são muito pequenas. Fininhas do lado ou coisa
assim. Seria bem falho.”.
Em relação aos produtos indispensáveis ao grupo, a entrevistada cita a canga como
exemplo feminino. Já para os homens, fica em dúvida do que não poderia faltar e não
consegue se lembrar de nada específico. No que tange as preferências em relação às
atividades que ocorrem na praia, cita festas noturnas como de preferência do seu grupo,
mesmo que não seja hábito recorrente freqüentá-las. Já o evento ideal seria aquele de graça e
com bom som.
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4.2.2 Entrevistado 2: Sílvia (Posto 9)
Perfil: 29 anos, farmacêutica de formação, com especialização em farmácia industrial.
Atualmente trabalha exercendo essa função para uma empresa multinacional. É solteira e
moradora de Laranjeiras.
Questão 1: Frequenta o Posto 9, mais exatamente em frente ao Coqueirão, uma árvore que se
situa poucos metros à direita do posto de salvamento propriamente dito. Essa localização nem
sempre foi a mesma, pois seu grupo costumava ficar exatamente em frente ao Posto 9.
Todavia, com a chegada de mais e mais “forasteiros” o grupo foi se movendo em direção ao
Coqueirão no intuito de evitar a “confusão” gerada por esse grande número de novos
freqüentadores. Contudo, no momento em que essas pessoas desistirem de ir a praia ali, o seu
grupo volta imediatamente para frente do Posto 9.
Relata que movimento similar ao descrito acima já acorreu em outra é época:
Isso já aconteceu quando eu tinha... Eu comecei a ir pro Nove o que?
Quando eu tinha uns 15 ou 16 anos. Em frente ao Nove. Ia andando,
andando, até que fui parar na Garcia. Cheguei, cheguei até ao Country, de
tanto que eu andei... Então fui andando até chegar lá no Posto 10. Só que
isso foi durante alguns anos. Tanto que quando eu falei que há uns cinco
anos atrás eu voltei pro Nove, foi quando, de tanto andar, cheguei no
Country, eu voltei pro Nove. O Nove tava habitável de novo.
As pessoas que compõem o grupo são parecidas com a entrevistada em quesitos
como escolaridade, nível social e local onde moram. Além disso, relata conhecerem muita
gente em comum, terem os mesmos interesses e gostarem, basicamente, das mesmas coisas.
Mais especificamente, cita alguns hábitos compartilhados pelo grupo como: tomar cerveja na
casa dos amigos e em bares, ir a shows na Fundição Progresso e Circo Voador e ir ao cinema
de rua. Em relação a esse último item diz: “Eu gosto de cinema de rua. Apesar de ser um
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horror pra parar o carro, mas eu prefiro. Aquele ambiente... Adoro o shopping pra fazer
compras. Agora não vejo o shopping como um centro de entretenimento.”.
Moram todos espalhados pela zona sul, em Laranjeiras, Botafogo, Jardim Botânico,
Gávea, Leblon e Lagoa.
O grupo se formou através de laços de amizade, inicialmente através de uma amiga de
faculdade: “... uma amiga minha da faculdade, então eu conheci os amigos dela, ela conheceu
meus amigos, aí de tanto sair junto acaba formando.”. Além disso, relata que nas ocasiões em
que esse grupo da praia se dispersa, procura outros grupos para fazer alguns programas
diferenciados.
A entrevistada julga que a ligação do grupo é feita, basicamente, por interesses em
comum, tais como: política, cinema, música, moda e outras atividades. Mesmo assim, diz
haverem diferenças de personalidade e comportamento entre os membros do grupo:
Ali a diferença vem muito... É... Como as pessoas tiveram formações muito
diferentes, você tem designer, arquiteto, engenheiro, farmacêutica. Você
tem... Então acaba... Eu não sei se isso influencia em algumas opiniões ou a
forma até de como você se porta, de como você fala. Eu vejo assim: o
pessoal que é designer são pessoas mais assim... Não sei o quê... E
normalmente são os mais descolados. São os mais alternativos. Os mais
‘uhoo!’. Aí a galera arquiteta já é mais centrada.
Sobre o início das idas à praia de Ipanema: “Quando eu comecei a ir à praia com um
ano de idade, eu sempre fui à Ipanema. Então com meus pais. A primeira vez que eu fui à
praia. O meu primeiro mergulho no mar foi em Ipanema. Então eu sempre fui e acaba que fui
indo, fui ficando, fui ficando. E também estou satisfeita.”. E afirma que a praia é hoje o ponto
de encontro de grupo. Sem a praia não haveria grupo, pois a dispersão seria certa.
No que tange a descrição do seu grupo: “Cada um está ali pelo seu valor. Pela sua
contribuição. Não é. Não tem interesse material. Financeiro. Nada disso. Gosta do outro do
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jeito que ele é. Como ser humano. Noto que ninguém é perfeito, todo mundo com os seus
defeitos, mas a galera se gosta assim.”.
Questão 2: A estética é um fator que une o grupo e ressalta que acredita ser assim para
qualquer grupo. Além disso, seria também um fator de distinção em relação aos demais: “Que
no nove tem aqueles ‘ripongas’ que são... Então esses aí são nossos co-habitantes. Na verdade
eles chegaram primeiro né. A gente limitou os nossos co-habitantes. No meu grupo não tem
ninguém desse ‘riponga pesado.”.
Especificamente sobre a questão física, as mulheres são, na sua maioria, do tipo
“magrinha”, o que quer dizer que não possuem corpos trabalhados em academias. A faixa
etária gira em torno dos 28 aos 31 anos. Já os homens são um pouco mais velhos, na casa dos
29 a 32 anos de idade.
No quesito vestimentas: “Todo mundo ali, acaba que no fundo, no fundo todo mundo
é um pouco vitrine de loja.”. E explica: “Pode dizer estilo alternativo. É estilo alternativo, mas
alternativo, mas vai comprar nas lojinhas que todo mundo compra.”. A única ressalva feita em
relação a esse testemunho fica por conta de que o grupo busca sempre os modelos mais
informais de roupa.
Sobre a relação entre estética e inserção no grupo: “Acho que a aparência, esse modo e
se vestir, acaba sendo um pouco limitada, por mais que você conheça uma mulher de cabelo
roxo, pode ser super legal, mas ela não vai entrar lá. Os interesses são outros.”.
Questão 3: O grupo freqüenta a praia após o meio-dia permanecendo até o sol se por, a não
ser que exista algum compromisso marcado ou , nas palavras da entrevistada, “até encher o
saco”. Ela explica: “Às vezes você chega na praia meio-dia, dá três da tarde, ou bate fome, ou
você não agüenta mais o sol, ou tá afim de fazer outra coisa... Ou tá com sono... Enfim...”. A
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freqüência se situa nos finais de semana de sol e nas férias, também condicionado ao
aparecimento do sol.
A grande maioria dos integrantes costuma chegar ao redor do mesmo horário, ou
seja, ao meio-dia. Não há uma combinação prévia para o encontro na praia. Apenas algumas
ligações podem ser feitas apenas no intuito de confirmar o que todo o grupo já sabe de
maneira tácita que irão se encontrar na praia. Também é mencionado como hábito o fato de
todos saírem da praia juntos para o almoço em grupo.
No que tange às práticas do grupo na praia: “Bate-papo, conversa. Começo falar, falar,
falar, falar,... De vez em quando uma cervejinha. Isso nós mulheres né. Os meninos
conseguem fazer outras atividades de pegar onda, jogar frescobol...”. As mulheres tendem a
falar muito mais que os homens. Enquanto esses últimos nutrem o hábito da leitura,
principalmente, jornal.
Em relação à entrada de novas pessoas no grupo, afirma que sempre existe alguma
rotatividade. Normalmente os novatos são apresentados por pessoas que já fazem parte do
grupo. Se gostarem do ambiente, e forem aceitos pelo grupo, podem voltar quando quiserem.
No caso dos abandonos, relata que acontece com certa freqüência sair e voltar. Apenas um
caso de uma pessoa que saiu e nunca mais voltou a ver grupo foi mencionado.
Quando da chegada na praia, a maioria das pessoas aluga cadeiras de praia para se
sentarem ao sol. Na medida em que o calor aumenta, é comum beberem bebidas não
alcoólicas. Sendo que, a partir de um determinado momento, começam a optar pela cerveja. É
também hábito do grupo fumar cigarro. Alguns membros optam também pelo fumo da
maconha. Além disso, costumam lançar mão de biscoito para saciar temporariamente a fome.
O tema das conversar gira sempre em torno de temas simples e amenos, poucos são os
momentos de assuntos muito importantes ou complexos: “Fofoca é uma palavra muito forte,
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mas não deixa de ser. Amenidades. É um momento de descontração. Tem que falar de
amenidades.”. E acrescenta:
Volta e meia cria-se um tema polêmico. Por exemplo, se tivesse dado sol no
final de semana que teve ataque em São Paulo, ia falar um pouco sobre
aquilo, mas normalmente a gente fala um pouco sobre coisa séria, mas
depois desvia para festinha, que saiu, o que vamos fazer hoje a noite, fulano
fez isso...
Questão 4: Sobre os sentimentos em relação ao grupo: “Material não tem nada. Mas
convivência agradável. Não sei. Eu gosto das pessoas. Então quando você gosta você tem...
Você convive, você sai junto, você se diverte, você marca programas.”. Além disso, afirma se
sentir livre para falar ou agir da maneira que bem entender. E conclui dizendo que isso tudo se
traduz em uma convivência bastante harmoniosa.
A entrevistada diz ser muito apegada ao grupo, mas não se sente amarrada. Ou
seja, pensa que pode abandoná-los sem problemas, se assim o desejar. Mas acrescenta:
“Então, eu não quero deixar não. Quero não. Eu gosto. E como eu tenho assim outra galera,
eu fico super dividida quando tem duas coisas pra fazer. Só que uma é de um grupo e outra
coisa com outro grupo, fico: Ai meu Deus! Agora o quê que eu faço?”.
Relata que sua grande diferença em relação aos demais integrantes do grupo fica por
conta do seu gosto musical. Mais especificamente por gostar de música baiana, estilo musical
odiado pelos demais membros. Além disso, uma outra diferença mencionada seria em relação
a sua rigidez de horário de trabalho, enquanto os demais gozam de horários mais flexíveis
devido às suas profissões.
Percepção em relação ao seu grupo:
O grupo, a verdade nua e crua. Eu também me incluo um pouco nessa
verdade, que às vezes, não é querer passar uma coisa que não é, Não é isso.
É muito... Querer passar uma coisa que não é, também tem aqueles
‘cabloquinhos’ da trancinha. Acho ‘too much’. Mas às vezes eu tenho, eu
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sinto umas pessoas que se forçam um pouco a ser descoladas demais assim.
Você fala assim: calma. Eu sei que você não é assim. Não precisa mostrar
pra mim e pro universo que você é assim, porque eu sei que você não é. Às
vezes parece... Às vezes mostra que é mais descolado do que realmente é.
Todavia, reafirma que a passagem acima é uma percepção sua e, quem olhar de fora,
não verá nada disso. Mas sim um grupo de pessoas felizes, descoladas e que parecem não
estar preocupadas com a vida. Apesar de reforçar que todos são trabalhadores.
Questão 5: Considera que seus vizinhos de praia mais próximos são os grupos que freqüentam
a praia em frente as ruas Maria Quitéria e Vinícius de Moraes. Com relação aos primeiros, são
compostos majoritariamente por estrangeiros e famílias. Já os segundos, ela não saberia
definir, por se tratar de uma gente muito peculiar, na sua opinião.
Percepção dos freqüentadores da Farme de Amoedo, relata: “Pra mim lá só tem
viado. É bicha louca mesmo. De beijar na boca na frente de todo mundo. Eu... Cada um faz o
que quer. Mas tem gente que não gosta de ver isso, entendeu? Então a impressão que eu
tenho, se eu passar na Farme, eu vou ver dois caras se pegando.”.
Já no que tange aos grupos do Posto 10: “No Posto 10 é aquele cara que só quer
saber de malhar. Desfile de moda: ‘comprei um biquíni de R$ 250’. O cara: ‘malhei pra
caramba ontem’, ‘peguei várias na night’. E que também é tudo filhinho de papai. Também
que não tira um Real do bolso pra pagar uma conta.”.
Ao aprofundar um pouco a questão acima, a entrevistada revela o conceito de
Playboy: “Playboy é aquele termo assim, aquela definição de playboy que eu tenho de anos
atrás que é usar bermudinha da Osklen, blusa não sei o quê. Entendeu?”. Mas acredita que
esse estereotipo pode guardar diferenças entre os playboys no Posto 9 e no Posto 10, e
explica:
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Que as gírias do carioca mais ou menos são as mesmas. Mas é o jeito de se
vestir, é o jeito de falar. Então assim, de repente quando você olha, fala:
hummmm... Mas quando você conversa começa a ver o que o cara faz, aí eu
vejo esses meninos estão muito... Aí gostam de pegar onda, gosta de se
enfiar no mato, faz escalada, faz não sei o quê, dá um ‘doiszinho’, entendeu?
Então é a diferença do... O Dez não. O Dez é beber uísque, pegar mulher,
Prelude, não sei o quê. É diferente. Mas se você olhar os dois assim, de boca
fechada, você não diz.
Questão 6: Em relação ao consumo do grupo que freqüenta o Posto 9, especificamente no que
diz respeito às vestimentas, apesar de existirem dois estilos básicos, os mais alternativos e os
playboys, todos compram nas mesmas lojas. A diferença desse grupo em relação aos demais,
com o Posto 10, por exemplo, seria que optam sempre pelas roupas mais alternativas, não se
preocupando em seguir nenhum preceito da moda. Apesar das lojas serem lojas da moda.
Além disso, dentro do grupo, afirma haver uma homogeneidade de estilos: “Mas todo mundo
se veste mais ou menos igual. Têm umas diferenças bem sutis, mas não vejo muita diferença.
Todo mundo tem o mesmo estilo.”.
Quando o assunto é tendência, é bastante freqüente a introdução de algo novo por
algum membro do grupo. A aceitação é quase imediata por parte dos demais: “Pode até achar,
de repente, um estilista novo que não sei o quê, que vende na feira não sei onde. Mas aí basta
ir uma e gostar que vai o resto todo. Todo mundo acaba gostando. Se não for uma coisa
esdrúxula, todo mundo compra.”.
Mais uma vez em salienta que a diferença de estilo do seu grupo em relação aos
demais não está no local de compra mas sim no que se compra: “É a mesma loja, mas se vir
aquele estilo é mais alternativo. É o que compra. A mercadoria que você leva pra casa. É a
roupa, aquele determinado tipo de roupa e não aonde.”.
Por causa do grupo a entrevistada relata ter começado a ir almoçar nos restaurantes
de Santa Teresa, principalmente no Sobrenatural. Além disso, passou a comprar sandálias,
item até então não presente no seu guarda roupas. Relata ainda que, no caso de alguns outros
produtos (que não especificou), até já os comprava, porém sob a influência do grupo, passou a
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fazê-lo em outros estabelecimentos. Por fim, confessa ter criado gosto por coisas mais
coloridas, evitando as lisas, também devida à influência do grupo. Mesmo com tantas
mudanças de sua parte, pensa que não influenciou seu grupo a mudar em nada seus hábitos de
consumo.
No rol de produtos que não podem faltar ao grupo figuram o cigarro e filtro solar.
Outra coisa indispensável, que não se trata de produto ou serviço, é espaço: “Não pode faltar
espaço. Quando a praia tá muito cheia... Ou então olha: ‘aqui não fico de jeito nenhum, vou
pra lá’ Não pode faltar espaço.”.
O grupo não costuma freqüentar ativamente eventos na praia, mas, dependendo da
atividade, comparecem sim. Em sua opinião, o evento perfeito seria algo pequeno, mais
intimista e durante a noite: um lual.
4.2.3 Entrevistado 3: Fabio (Posto 9)
Perfil: 33 anos, formado em Administração e possui uma pós-graduação em Marketing.
Atualmente é sócio de uma empresa de Marketing Esportivo. É casado e mora no Jardim
Botânico. Seu pai mora da Rua Prudente de Moraes, em Ipanema.
Questão 1: Freqüenta a Praia de Ipanema sempre na altura do Posto 9. Mais especificamente,
atualmente, fica um pouco à direita do posto de salvamento em si, próximo ao Coqueirão.
Trata-se de uma tentativa de evitar o tumulto que vem se formando em frente ao Posto 9. Não
considera o Posto 9 um ícone pois, para evitar o tumulto, até trocaria de lugar. Porém ainda
não ocorreu de a situação ficar insuportável a esse ponto.
O grupo é formado, na média, por pessoas da mesma faixa etária, mas existem
algumas pessoas mais jovens que o entrevistado. Todos se conheceram devido a laços de
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amizade com algum membro que, posteriormente, foram se estendendo aos demais. Algumas
dessas pessoas moram próximo à praia de Ipanema, mas não são todos. Esse é também o
grupo para outras ocasiões, que não a praia, como festas, churrascos, almoços e reuniões em
casa. Quando questionado sobre o que faz a ligação do grupo, responde: “Acho que é o astral.
Eu acho que é mais o astral. É a coisa meio festiva. São pessoas animadas. Pessoas bonitas. É
por aí.”.
Os componentes do grupo possuem características distintas um dos outros, mas cita
um deles como um exemplo de diferença em relação aos demais. Esse integrante é músico e
morou muito tempo fora do país, o que lhe confere uma visão de mundo bastante diferente
dos demais. Fora essa pessoa, as diferenças são assim sintetizadas:
É mais a forma de pensar. As questões pessoais de cada um. É... Acho que
hoje em dia tá cada um com seus problemas, com suas questões e tal. Uns
com questões mais sérias, outros com uma vida mais tranqüila. Uns mais
preocupados outros menos preocupados. Acho que essas são basicamente as
diferenças.
Cita existirem pessoas no grupo com as quais ele não mantém uma boa relação:
Pertence ao grupo. Mas essas pessoas que eu já procuro manter uma certa
distância, porque assim eu fui educado né. Então acho que têm pessoas que
não têm semancol, então essas pessoas eu prefiro..., né. Mas são
pouquíssimos os casos, ou raríssimos os casos assim. De forma geral são
pessoas né... Mas essa coisa de falta de semancol, em certas circunstâncias
um pouco mas ou em outras um pouco menos. Mas aí também eu acho que
cabe a mim...
No contexto do grupo, uma pessoa bem aceita é aquela que tem personalidade, que é
boa de conversa, que é simpática, que é carinhosa e natural. Já pessoas que não seriam aceitas
seriam aquelas com “nariz empinado”. Com a ressalva de que o grupo pode rejeitar pessoas
de forma indevida: “Mas o grupo rejeita pessoas que são legais, mas que tem uma
personalidade diferente. Às vezes uma coisa um pouco mais introspectiva e tal...”.
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Questão 2: No quesito estética, mais especificamente em relação a questão da beleza física:
“A beleza não é um pré-requisito para estar no grupo, nem nada disso, mas de uma forma
geral são pessoas bonitas.”.
Questão 3: Freqüentam a praia entre uma e cinco horas da tarde, aos finais de semana. No
caso específico do entrevistado, relata que costuma ir à praia de duas a três vezes por mês,
mesmo no verão. O motivo para tal seria uma grande quantidade de pendências a serem
resolvidas durante o final de semana e, às vezes, a própria preguiça em relação ao
deslocamento até Ipanema.
As pessoas do grupo chegam em horários distintos. Com relação a combinarem a
ida à praia , às vezes, se falam para marcar, mas nem sempre. Quando isso não acontece,
apenas vão é lá se encontram. Normalmente todo o grupo sai junto da praia, algumas vezes
com o intuito de almoçarem juntos. Durante a permanência na praia, o principal hábito grupal
é conversar. Alia a isso o ritual dos membros de circularem entre si em busca de tais
interações.
Não se recorda de ninguém que tenha abandonado o grupo para nunca mais voltar.
Também atesta serem poucos os casos daqueles que saíram e depois voltaram. O que
aconteceria é que nem todos estão presentes a todos os eventos do grupo, aí inclusas as idas à
praia: “É mais que em determinadas ocasiões tem alguns que não vão por um motivo ou por
outro. Em outras já têm pessoas que numa versão anterior de uma determinada festa, de um
churrasco e não foram nesse. Então varia de acordo com a disponibilidade da pessoa.”.
Em relação aos temas abordados nas conversas cita: programações, festas e falar da
vida alheia. Apenas eventualmente conversam sobre algo mais sério. Na maioria das vezes o
tema sempre gira em torno de amenidades.
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Questão 4: Sobre como percebe o grupo: “É, eu acho que conversar sobre amenidades é uma
válvula de escape. É uma coisa de aproveitar o final de semana pra dar uma desligada
realmente da semana e do trabalho, das responsabilidades, das contas né, e de como ganhar
mais dinheiro, etc..”.
Mesmo assim, ressalta o fato de, por ser casado, não é um grande problema não
estar junto do grupo:
A partir do momento que você né, quer dizer, é casado; a coisa já não é mais
quando você é solteiro. Que você né, quer encontrar gente pra sair, pra fazer
e acontecer. Quer dizer, mal ou bem, durante a semana você tem uma vida
muito mais regrada em função do trabalho e tal. Então assim, não é algo: Ah,
meu Deus, não vou encontrar as pessoas, ou isso é um problema e tal. Então
não é um grande problema. É importante você ter alguns momentos que
sejam com o grupo, com pessoas do grupo que você mais se identifica.
A existência desse grupo confere um bom balanceamento à sua vida.
Se considera a pessoa mais ranzinza do grupo, mesmo acreditando que só age dessa
forma quando provocado: “Eu sou uma pessoa muito mais reativa a atitudes impertinentes.”.
Questão 5: Sobre seus sentimentos em relação aos seus mais próximos “vizinhos” de praia,
diz não prestar muita atenção neles. Mesmo já tendo freqüentado outros pontos da praia de
Ipanema, julga não estar apto a emitir opiniões devido ao longo tempo com que não vivencia
o dia-a-dia desses outros grupos.
Questão 6: Em relação a eventuais mudanças em seus hábitos de consumo devido à
influências do grupos: “É. Até suspeito que sim, mas também eu não sou um dos mais
observadores. Então não poderia afirmar isso.”. Porém, mais a frente no depoimento, afirma
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categoricamente que não mudou em nada seus hábitos em função do grupo. Além disso, isso
teria acontecido justamente pelo fato de sentir bem conectado aos demais do jeito que é.
Itens obrigatórios para o grupo são a cadeira de praia, a cerveja e o refrigerante.
No caso do entrevistado, menciona o cigarro como produto de primeira necessidade. Em
relação a eventos na praia, diz não saber as preferências do grupo, pois, particularmente, não
gosta de aderir a esse tipo de programa.
4.2.4 Entrevistado 4: Clara (Posto 10)
Perfil: 29 anos, formada em Economia, atualmente trabalha em uma firma de consultoria
tributária. Solteira e moradora de Ipanema, sua casa fica a poucas quadras da praia.
Questão 1: Local de predileção na praia é o Posto 10, mas especificamente em frente ao
Country Clube. Desde pequena freqüenta a praia nesse local devido à influência de seus pais.
Atribui esse hábito a toda uma estrutura de conforto que acabou desenvolvendo por lá como
um barraqueiro conhecido, por exemplo. Nunca pensou em mudar de lugar, pois com o passar
do tempo o local ficou conhecido e várias pessoas amigas passaram a freqüentar também. Fica
nos flancos ao invés de ficar bem em frente ao clube no intuito de evitar uma areia muito
congestionada.
Sobre os componentes do grupo: “Ah, são meus amigos atuais. Meus amigos com
quem eu saio, enfim. Então é o mesmo grupo que eu faço os outros programas é esse grupo da
praia.”. Quanto à origem dessas amizades, relata que são pessoas conhecidas no trabalho,
amigos de infância e até familiares, como as primas, por exemplo.
A maioria dessas pessoas não mora em Ipanema. Estão espalhadas pelo Humaitá,
Fonte da Saudade e Corte do Cantagalo.
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A formação do grupo se deu devido aos laços de amizade. A ligação entre essas
pessoas é construída, principalmente, através de interesses em comum: “Gostam dos mesmos
programas, enfim. Tem uma vida muito parecida, né. Ou seja, no trabalho. Tipo coisa que
gosta de fazer.”. A grande maioria trabalha no meio corporativo, e muito poucas pessoas
desempenham um trabalho mais alternativo.
O grupo se integra muito bem aos demais freqüentadores do Posto 10, não destoando
dos demais por nenhum motivo. De forma geral, naquele pedaço da praia as pessoas são
muito parecidas. Em relação às diferenças entre os membros do seu grupo:
Ah tem umas pessoas mais quietas, têm outras mais loucas. Tem, enfim,
pessoas mais agitadas. A Camila é muito agitada. Então ela vai na praia, ela
uma das que não consegue ficar sentada o tempo inteiro conversando. Ela
tem que fazer alguma coisa. Tem que jogar um frescobol, andar, tem que
fazer. Aí então tem uns mais agitados, outros mais calmos, outros que
conversam mais. Outros conversam menos.
O grupo varia em termos de idade, girando entre os 27 e 35 anos. Não existem
pessoas muito obesas, mas são pessoas bem “comuns”. As mulheres costumam cuidar bem
dos cabelos, enquanto os homens usam cabelos curtos.
Sobre o perfil de uma pessoa que se integraria bem ao seu grupo:
No meu grupo uma pessoa ‘in’, quer dizer, que ia se dar bem lá no grupo é
uma pessoa que realmente gosta de sair, gosta de sair pra tomar chope, gosta
se sair pra comer. Assim, que sabe conversar sobre qualquer assunto. Gosta
de falar besteira. E que, ao mesmo tempo, enfim, tem uma vida séria.
Questão 2: Na questão estética, mais especificamente vestuário, os homens se vestem de
maneira muito mais simples que as mulheres. Eles usam bermuda e, quando muito, um par de
chinelos. Já elas sempre andam com acessórios, como bolsas, roupas, chapéus, e outras coisas
mais.
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Na questão física: “Os homens do meu grupo não são muito sarados não. Eu acho
que é ao contrário. Você vai chegando com mais idade, o homem vai relaxando mais do que a
mulher. A mulher é mais preocupada assim, tipo: ‘Ah eu vou à praia. ’ Enfim... ‘Tô gorda.
Que saco. ’.”.
Questão 3: O grupo costuma chegar na praia ao redor do meio dia e ficar até ao redor das
quatro horas da tarde. Essa é a hora que a “fome aperta”. Inclusive, saem juntos para almoçar
em algum restaurante próximo. No verão a freqüência de idas à praia é semanal durante os
fins-de-semana. Já no inverno, afirma ser mais difícil vê-los na praia.
O grupo se encontra naturalmente, sem que haja ligações para combinar um
encontro na praia. Apesar de a entrevistada relatar que, no seu caso específico, faz pelo menos
uma ligação, apenas para informar que ela está a caminho da praia. O encontro na praia serve
para que outros programas sejam combinados entre o grupo. Quando na praia, a maioria do
grupo fica conversando. Apenas a entrevistada e mais uma amiga jogam frescobol com certa
freqüência. Eventualmente, no fim de tarde, pode acontecer um jogo de baralho ou gamão.
Quando da chegada na praia, os homens chegam e entregam suas carteiras, dinheiros e
chaves a alguém que tenha bolsa para guardá-los. E costumam ficar de pé mesmo. Já as
mulheres têm por hábito chegar e estender suas cangas e sentarem. Acredita que essa
dinâmica de homens em pé e mulheres sentadas se dá devido às últimas estarem mais
preocupadas em se bronzear.
O grupo não costuma mudar com freqüência. O que acontece é que algumas pessoas
vão menos à praia do que outras, mas ainda assim aparecendo e pertencendo ao grupo. A
entrada de alguém novo se dá por introdução de algum já membro.
Com relação aos rituais e hábitos do grupo:
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Quando tá muito quente tem uns três chuveirinhos atrás que o pessoal vai
muito assim. Agora o pessoal fica muito na água. Principalmente quando tá
muito quente fica realmente. A água fica lotada. O que mais que tem de
ritual...? As pessoas normalmente chegam, já sentam logo. Muitos pegam
cadeira e barraca. É um lugar que fica muito cheio de barraca e cadeira. Vai
chegar a disputa pela parte próxima à água e aí sempre, inevitavelmente,
chega a água. Que a maré enche, chega a água aí as pessoas...Sempre tem
gente se levantando e enfim, chegando pra trás e aí começa a entulhar atrás.
Acho que as pessoas basicamente... Elas chegam, se instalam e aí uns vão
fazer esporte ou vão, enfim, ficam debaixo da barraca, outros vão tomar
cerveja.
No que tange aos assuntos tratados nas conversas do grupo: “Ah! Tudo quanto é tipo
de besteira. Qualquer coisa que não tenha nada sério, eu acho. É um momento de
descontração.”. Justamente pela maioria trabalhar no meio empresarial, o último assunto de
que gostam de falar é sobre o mundo corporativo. Todos respeitam, e preferem só falar sobre
amenidades.
Questão 4: Sobre seus sentimentos em relação ao grupo: “Ah! São minhas melhores amigas
também. Quer dizer, pessoas desse grupo são meus melhores amigos. Então o grupo é tudo!”.
Diz se sentir segura, pois sabe que as pessoas estão ali com ela, à disposição para o que for
preciso. E acrescenta: “Cada um com o seu estilo, cada um é mais apropriado para
determinada hora, mas são pessoas em que você confia. Você pode contar. São amigas
mesmo.”. Não se sente amarrada ao grupo e que poderia abandoná-los a qualquer momento.
Mesmo assim não gostaria de fazê-lo e acredita que as pessoas cobrariam dela um motivo
para tal abandono.
A entrevistada tem a percepção de ser a pessoa que mais trabalha dentre os
membros do grupo. E diz ser, inclusive, criticada por isso. Com relação ao conjunto do grupo,
as pessoas são muito parecidas em termos de comportamento. São pessoas animadas, que
falam alto e riem o tempo todo.
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Questão 5: Com relação aos outros grupos que freqüentam as cercanias do Posto 10, à
esquerda ou direita pode-se notar uma maior presença de famílias. E em frente ao Country
Clube é maior a presença de pessoas mais jovens, inclusive praticantes de surfe.
Em comparação ao Posto 9, as pessoas freqüentadoras do Posto 10 não costumam
fumar tanta maconha quanto no primeiro, apesar de também manterem esse hábito. Imputa
esse maior volume do Posto 9 ao fato de se serem pessoas mais “alternativas”.
Sua percepção específica em relação ao Posto 9 é de que está sempre cheio, não
importando o tempo ou o dia da semana. Todavia, não os julga vagabundos por isso. Apenas
acredita que é um grupo formado por pessoas mais jovens que, por ainda serem colegiais ou
universitários, têm mais tempo disponível.
Em relação aos freqüentadores da praia na altura da Rua Farme de Amoedo, sua
primeira impressão é de que são todos homossexuais. Para, em seguida, acrescentar que os
acha o povo mais alegre de Ipanema. E complementa:
Eu penso duas coisas da Farme. Primeiro eu penso assim: um público
homossexual e tal e penso que deve ser muito homem. Muito mais homem
do que mulher. Ah, com aquelas sunguinhas coloridas. Acho que pouco
esporte assim, porque eu tenho essa impressão. Eu penso também nos
gringos. E eu penso sempre naqueles caras né, tentando dar uma de esperto
com os gringos. Mostrando cardápio inglês com o preço mais caro.
A entrevistada relata ainda uma diferença importante entre as pessoas que freqüentam
a área do Posto 10. Bem em frente ao posto de salvamento concentram-se pessoas de fora da
Zona Sul, vistas pelos locais com certo desprezo até. Já em frente ao Country Clube
encontram-se as pessoas moradoras da Zona Sul.
Especificamente falando sobre Posto 9 e Posto 10:
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O Nove eu vejo, por exemplo, menos pranchas na areia, mais uma galera
sentada conversando, fumando um. Aquela história do apito que tinha. No
Country eu vejo mais gente fazendo esporte. É muito frescobol. É muita
altinha. Pegando onda. Tem uns campos em cima de vôlei. Que eles jogam
futevôlei, jogam vôlei. Então é uma atividade. Às vezes eles jogam futebol
mesmo. Montam dois times.
A acrescenta mais uma característica específica ao Posto 10:
Perto das barracas de trás, que são, sei lá, umas cinco ou seis. Às vezes tem
show no final da tarde, na praia, de um dos barraqueiros. O Magrão, que é
assim super famoso. E aí os homens ficam muito assim, um grupo enorme de
homem na parte detrás da praia, perto desses barraqueiros assim tomando
cerveja. Eu não vejo tanta barraca no Nove, quanto eu vejo no Country.
Ainda caracterizando os freqüentadores do Posto 10, no Country:
Eu diria que são pessoas que freqüentam a academia, são pessoas que muitos
gostam de esporte. Estão preocupados com a aparência. Acho que isso
dentro do grupo todo mundo tem essa preocupação com a aparência. Pode
ser que faça mais ou menos coisa por isso, mas tem essa preocupação. Mas o
Dez é muito aquela é... Pessoas com corpos malhados, bonitas, jovens,
enfim, que desfilam.
Questão 6: Em termos de hábito de consumo, a entrevistada afirma que passou a consumir o
produto Mate Leão influenciada pelo grupo. Além disso, acrescenta também a água de côco.
Fora isso, afirma que as outras mudanças em seu hábito de consumo se deram no espectro dos
serviços, tendo passado a freqüentar diferentes bares e restaurantes, mesmo em bairros mais
distantes. Um produto específico que passou a lançar mão no âmbito da praia foi a cadeira:
“Assim, tinha hábito de sentar em canga, só que peguei essa mania (de cadeira) depois por
causa do grupo.”.
Os produtos não parecem conectar tanto o grupo, mas os hábitos sim. Cita como
exemplo essa maior freqüência a bares e restaurantes nos bairros onde outros membros do
grupo vivem: “Mas eu acho que o que eu mais me conectei foi no sentido que eles sempre
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falam: a galera do Humaitá, a galera do Humaitá. Aí é como se eu fizesse parte disso também,
embora eu não more no Humaitá.”.
Acha que, por sua influência, alguns passaram a ler o jornal O Globo em busca de uma
coluna específica. Além disso, cita o gosto pelo vinho como um hábito por ela introduzido.
Produtos que não podem faltar na praia são as cadeiras e barracas. Mas destaca um
serviço sem o qual o Posto 10 ficaria descaracterizado:
Eu acho que o caracteriza muito o Country são as pessoas que ficam nas
barracas. Os donos da barraca. Todo mundo sabe os nomes de todos eles.
Fica: é o Magrão, é o Brás, é o... Enfim, tem uns ou outros aí, mas todo
mundo tem o seu barraqueiro preferido e senta próximo dele.
Até por essa relação da tribo com os barraqueiros, principalmente homens, costumam aderir a
eventos na praia. Como os do barraqueiro Magrão que coloca som no final das tardes de verão
e fica lotado, por exemplo. É comum também eles organizarem churrascos com grande adesão
por parte do grupo.
4.2.5 Entrevistado 5: Alexandre (Posto 9)
Perfil: 31 anos, formado em Contabilidade, atualmente trabalhando para uma instituição
financeira. Solteiro, morador de Copacabana e praticante de esportes.
Questão 1: Local de predileção na praia é o Coqueirão, em frente à Barraca do Marcão.
Costumava freqüentar o posto 10 em frente ao Country, mas não suportou mais aquela “galera
plástica”, aquela “turma bombada”. Com relação à migração para o posto 9:
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Nego começou a migrar. A galera do Dez e do que era o Dez antigamente e
que era do Country e depois começou a ir um pouco mais pro Coqueirão,
que tem umas ‘mulherzinha’mais alternativa, bonitinha assim, sabe qual é?
Mais ‘singelinha’. Não é só aquelas ‘bombadinha’. Ficou aquela coisa
plástica mesmo. Sai um pouco daquilo e outro estereótipo e ir pra um
lugarzinho mais que neguinho tá ali mais relaxado, tranqüilo.
Nesse local se concentram as pessoas “ex-playboys”, enquanto que em frente ao posto 9
propriamente dito, ficariam aqueles mais afeitos ao uso de entorpecentes (maconha).
O grupo é composto de pessoas bastante homogêneas, pertencentes às classes alta e
média alta, situam-se na casa dos 20 a 30 anos de idade. São pessoas ativas em termos de
estudo, ou seja, cursando uma faculdade ou já formadas. Mas com interesses intelectuais
variados. Tratam-se de pessoas que freqüentam à praia pelo prazer de ali estar e não por outro
motivo qualquer, como para flertar, por exemplo. Em termos de aparência, todos se vestem de
maneira muito parecida.
Destaque para um integrante do grupo que se diferencia dos demais:
Eu tenho tatuagem e coisa e tal, mas o cara tem oito tatuagens. É um cara de
família rica. Assim AB para A. E hoje em dia, pô, ele trabalha como
representante. Então, quer dizer, tem uma vida mais tranqüila. O cara é um
pouco diferente, né. Tem uma família muito boa. Teve boa formação. Bons
colégios. Só que ele degringolou um pouco na faculdade e coisa e tal. Se
freou, galera toda se formou, vamos dizer assim, hoje em dia ele trabalha,
exerce a função que ele ganha o dinheiro dele, tem o esforço dele, mas ta
pegando onda, ta fazendo coisa e tal. Então é uma figura.
Os membros do grupo moram em bairros como Gávea, Ipanema e Botafogo. Esse
grupo é também o grupo para outras ocasiões que não a praia, como shows, aniversários e
etc.. A base original do grupo foi formada na época de colégio, época em que eram
aproximadamente umas quatro pessoas. Com o passar do tempo, novos amigos foram sendo
introduzidos. Sobre o que mantém essas pessoas unidas:
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Eu acho que você tem aí, pelo menos o pessoal que eu convivo ali, eu acho
que a característica de todo mundo ali, todo mundo é trabalhador. Todo
mundo já tem uma posição. Todo mundo, ninguém não vem de família
abastada, mas também não vem de sofrimento e tal. Todo mundo tem aquela
posição de, a maioria né, vamos dizer assim, pô, de trabalhar, vencer. E acho
que a maioria. Tanto a mulher quanto os homens. Entendeu? Todo mundo tá
trabalhando. Todo mundo ta batalhando. Todo mundo é lutador. Entendeu?
Não tem tempo bom.
Acrescente-se a isso ao fato da diversão também manter a união do grupo.
Sobre o que diferencia o seu grupo dos demais:
A gente freqüenta várias tribos, vamos dizer assim. Botar esse termo mais
assim. Eu posso ir pra uma Rave.Pô, posso ir pra um teatro. Acho que tem
uma galera ali que ta mais pra teatro, que vai mais no Circo Voador,
entendeu? Outra galera ali só vai em Rave. Que só freqüenta academia. E,
porra, é aquilo, macarrão e frango. E, porra, infelizmente, eu também sou
adepto, mas pô, eu também como pizzas, essas porras aí. Acho que é um
pouco disso. A diferenciação da galera é mais ou menos isso aí.
Em termos de diferenças entre homens e mulheres, os primeiros são mais extravagantes
enquanto elas costumam ser mais contidas nas conversas.
O entrevistado faz parte de vários outros grupos: da academia, da faculdade e do
trabalho.
A principal diferença do entrevistado em relação aos demais componentes do grupo se
deve a sua hiperatividade. Sempre incitando os companheiros a realizarem alguma atividade.
Gosta de estar sempre presente, participando.
Questão 2: No que tange à questão estética, especificamente aparência física, o grupo é
composto por pessoas “malhadas” e também pelas “normais”. Em termos de vestimentas:
“Acho que o homem é bem casual mesmo. A maioria é bem casual. E as mulheres eu acho
que não são casuais. São arrumadinhas. Eu olho assim. Os homens são casuais.Pô. Sair de
tênis, camisa, sabe qual é?”.
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Questão 3: Freqüentam a praia de meio dia até ao redor das quatro horas da tarde, nos finais
de semana de sol. Com relação aos horários de chegada e saída das pessoas:
Veja bem, ali no Coqueiro tem um problema que é o Caeser Park. Hoje em
dia por volta das três e meia o sol passa atrás do Caeser Park, então faz uma
sombra no Coqueiro. Então o público ta chegando ali hoje em dia, eu acho
que meio dia e meia... Geralmente quando essa sombra tá chegando, hoje em
dia, o inverno, a praia ta durando até quatro horas da tarde.
Mas não há nenhum tipo de combinação prévia para se encontrarem. Apesar de o entrevistado
ligar para umas duas ou três pessoas antes de se dirigir para a praia em busca de carona. Já
com relação à saída, geralmente, o grupo sai unido em direção a algum restaurante para
almoçarem.
Com relação as atividades do grupo na praia: “Bate-papo pra cacete. Frescobol. E,
basicamente... E tem uns moleques que pegam onda. Geralmente nego leva revista. Aí fica
debatendo sobre o: ‘olha só que matéria maneira.’. Aí todo mundo fica conversando sobre a
revista. É maneiro.”.
Especificamente sobre as conversas:
Assunto preferido? Acho que o dia-a-dia mesmo. Cara. Não tem um... É o
dia-a-dia. Pô. A coisa é papa-agenda né. O que tu fez ontem né. Saber um
pouco do outro. O que construiu naquele dia ali. A experiência que a menina
teve. De repente quer passar. Mulher trocar pneu. A mulher noutro dia: ‘Ah
não, que eu troquei um pneu.’. Pô. Acreditar que mulher troca pneu. Então é
o dia-a-dia. Acho que é papo do dia-a-dia... Mais amenidades.
Não é comum membros saírem e depois voltarem ao grupo. Todavia, vários casos de
abandono já acontecerem. Principalmente em função de uma mudança no estilo de vida da
pessoa, com se casar ou se mudar para um bairro distante, por exemplo.
Sobre os rituais do grupo:
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Acho que o ritual. Nego ficar bem organizado. Então as mulherezinhas mete
canga. Entendeu? Fica tipo um clubinho, vamos dizer assim. Pô, homem
pega quatro cadeiras. A mulher mete três cangas. Aí ficam os satélites por
ali. Acho que o ritual é que é armar um ‘fortezinho’. No dia-a-dia ali, metade
toma cerveja, metade não toma. Também é um pouquinho diferenciado né.
Mas pô, mas tem o ritualzinho da cerveja também. Volta e meia um ou outro
dá uma relaxadinha (fumar maconha) ali. Entendeu? Uma galera dá uma
relaxadinha ali. Eu não sou usuário não, mas não tenho preconceito de nada.
Questão 4: No que tange aos sentimentos em relação ao grupo:
Acho que a questão de segurança de especo né. É legal. É legal você estar
com um grupo na praia. É legal. É legal. Você se sente bem pô. Pode deixar
tuas coisas. Pode jogar teu frescobol. Pô tu chega lá, a menina te trata, o
pessoal pô. Questão de liberdade, acho que nem tanto. Que acho que a
questão de segurança já abre esse caminho. Se tá seguro, o sujeito fica
mais... Pô, daí fala mais alto, sei lá, alguma coisa assim. Acho que tem a
questão da segurança legal. E da união mesmo, cara. Um pega cerveja pro
outro. Entendeu ? O companheirismo ali.
O entrevistado se sente preso ao grupo e não gostaria de ter que abandoná-los. Sobre
isso:
Mais do lado da amizade mesmo. Não lado de diversão assim. Não só se
divertir não. Acho que é mais o laço de amizade. Prenderia esse lado da
amizade. Entendeu? Pô galera maneira. Tá sempre fazendo coisas legais
assim. Porque senão eu apagava dali. É tanto que eu apaguei do Country
porque, porra, já andava com uma galera lá que perdi o contato. Comecei a
não achar a galera tão maneira. Aí sim. Até volto aí no que você falou.
Aquela galera lá tava me levando pra um lado assim que eu não tava
achando muito legal. Neguinho muito competitivo. Era muita zoação,
entendeu? Tem pouca amizade. Cara gostava de sacanear todo dia. Sacanear
o cara. Ficava aquele clima. Tu não vê aquele...
Questão 5: Sobre os freqüentadores das redondezas 10:
E pro lado do Dez, você tem aí uma diferenciação, cara, porque a galera,
vamos dizer assim, hoje em dia a "playboyzada" mesmo é tudo no Country.
"Playboyzada" é tudo no Country. E entre o Coqueiro e o Country é o Posto
10. Aí você vê o quê? Pessoas que pô, que moram por ali. Que vão sempre
ali. Pessoas que não são do bairro assim, moram no Flamengo. Moram em
outras áreas que vão ali. Casais. Geralmente que é uma área mais tranqüila.
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Geralmente mais casais ali nessa área do Dez. Entre o Coqueirão e o
Country você vê mais essa galera de casais, o pessoal que mora por ali ou até
pessoal que não mora ali. Entendeu?
Especificamente sobre o grupo do posto 10:
Eu não tenho nada assim muito podre. Não é nem, né. É pra deixar aqui que
eu não condeno nenhum dos dois grupos, mas pô, eu acho a galera no Dez é
um pouco over, no sentido de praticidade né, estereótipo. E a galera do
Nove, é a galera mais, pô, a maioria ali curte muito, não que eu não respeite,
ali, inclusive tem nego na minha galera ali que fuma maconha todo dia e...
Acho uma galera muito, entendeu? ‘Eu sou doidinho’, ‘Qual é’. Entendeu?
Aquele cara que... Porque porra, eu conviveria com pessoa assim sem
problema nenhum, mas não é muito a minha praia. Vamos dizer assim.
Entendeu?
E sobre o posto 9:
Acho que, volto a falar, não tenho nada assim contra assim, mas eu acho que
não é muito o meu local porque tem quantidade maior de homossexuais. Eu
acho que quantidade maior de pessoas, vamos dizer assim, muito largadonas,
entendeu? Que não é muito o meu estilo de ser e de meu comportamento.
Mais Nove entendeu? Então não me sinto tão bem quanto me sentiria ali no
local que eu tô. Eu não tenho nada contra. Eu iria à praia ali e ficaria o dia
inteiro ali, mas sentiria essa falta aí.
Questão 6: Tatuagem é um hábito corrente entre os membros do grupo, sendo considerado um
item de suma importância entre eles. Dessa forma, o entrevistado relata que passou a
consumir esse tipo de artefato estético por influência do grupo. Por outro lado, não parou de
consumir nada em função do grupo. Com relação ao consumo conectar os membros do grupo:
Acho que sim cara. Acho que sim. Acho que é por aí mesmo. Cara. O grupo,
os arredores. Aquele negócio do comportamento ali. Pra tu vê, nesse grupo
aí. Tem maior galera que vai no Baixo Gávea. Baixo Gávea tu vê várias
galeras assim. Neguinho fica comentando. Pô. Fazer uma tattoo nova, não
sei o quê. Achei maneiro, cara. Essas tatuagens da galera, a maioria são
homenagens, são totens, são... Você vê muito coloridão assim. Entendeu?
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O grupo costuma viajar com certa freqüência seja para a casa de algum membro ou
mesmo para hotéis ou albergues. O que não pode faltar ao grupo são as cangas e cadeiras.
Pois, quando em formato de cerco, dão justamente o ar de grupo e segurança. Caso contrário,
haveria dispersão.
Sobre um programa na praia ao qual o grupo atenderia:
Um DJ. Tipo um lualzinho com um DJ tocando Hip Hop ou uma parada
assim. Ou DJ esplanando mesmo. Tem um som desse, desse tipo, tipo um
HIP HOP... com um somzinho assim HIP HOP. Eu até gosto de HIP HOP
pesado, mas HIP HOP(zinho) estilo Tio Pepe, mesmo, estilo mais
reggaezinho né. Eu acho que é por aí cara. Estilo hip hop. E se é pra chamar
três mil pessoas. Duas mil, nego vai.
4.2.6 Entrevistado 6: Bruna (Posto 10)
Perfil: 28 anos, formada em Economia e cursando graduação em Ciências Contábeis.
Trabalha como auditora fiscal e é solteira.
Questão 1: Se reúne com os amigos em frente ao Country Club há muitos anos, porém já
freqüentara a praia do Leblon na infância. Sobre o início no posto 10: “Na verdade eu morava
em Petrópolis. Aí vim pro Rio, aí conheci umas amigas, essas minhas amigas e da Cissa, elas
já freqüentavam lá, eu comecei a freqüentar lá mesmo. Aí começou a ver que era o mesmo
grupo assim. Se encontra todo mundo lá.”.
O grupo é composto na sua maioria por “patricinhas e mauricinhos”, que são pessoas
fúteis, preocupadas mais com a aparência. Entre as quais o hábito de fumar maconha e tomar
cerveja não é tão intenso, apesar de ocorrer. Esse grupo é homogêneo não havendo nenhuma
pessoa que se destaque por ser diferente.
Na sua maioria os integrantes moram próximos à praia de Ipanema, em bairros como a
própria Ipanema, Gávea e Humaitá. Não se trata apenas de se reunir na praia, mas também nas
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mais variadas ocasiões. Inclusive esse grande grupo da praia é uma composição de vários
outros grupos que fizeram da praia seu território de integração. Com relação à evolução do
grupo: “Os amigos de infância. A maioria. Amigo de infância ou amigo... Aí que virou amigo
de infância que um foi conhecendo o outro, aí virou um grupo grande.”. No que tange aquilo
que faz a ligação entre as pessoas: “Porque a gente gosta. A gente tem empatia mesmo. De
gostar das mesmas coisas. A gente se gosta. O costume também de tá sempre junto desde
pequeno.”.
Quando questionada sobre o que faz a distinção do seu grupo em relação aos demais:
Não sei. Porque na verdade a gente tá lá. Eu, pelo menos e o meu grupo. Eu,
pelo menos. Eu não sei, vai, falar pelo grupo. Eu tô lá pelo simples fato que
vou encontrar todo mundo. Mas assim, não é preconceito de não estar em
outro posto. De jeito nenhum. Tanto que... E lá acho que no Posto 10 tem
muita gente que é preconceito mesmo de não se misturar com outro. Em
outras gangues ou em outros espaços. Mas pra mim, por isso que não
consegui responder direito, que eu não vejo muito, que a gente tá... Eu não
vejo interesse de eu estar ali por ver... É óbvio que você vê gente mais
bonita. Mas pra mim assim, se eu tiver com uma galera legal e no outro
posto, é porque eu só vou lá porque eu conheço todo mundo lá. Do outro eu
não conheço ninguém.
Sobre as pequenas diferenças individuas dos integrantes:
Acho que uns são mais desencalhados assim em relação à vida. Ao modo de
viver. Outros são mais deprimidos. Mais complicados e numa forma de ver a
vida. Na forma de se relacionar com as pessoas. E isso que eu acho que é a
grande diferença. Eu vejo assim três ou quatro pessoas lá que pode cair o
mundo que tá feliz. Rindo. Que tudo tá bom. E outras complicadas. Você vê
que a pessoa é travada assim pra conseguir ser feliz sabe. E acho que isso aí
pode gerar até, na maioria dos papos, um debate sobre isso. Indiretamente,
entendeu? Cada um defendendo o seu lado do ponto de vista de viver
melhor.
Questão 2: No que tange à estética, especificamente física:
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Em relação ao meu grupo. É negócio de malhação. Mulheres que, pelo
contrário, tá todo mundo um pouco se ferrando, ninguém faz nada da vida.
Só eu que tenho mais essa preocupação neurótica, com negócio de corpo.
Mas o que eu vejo ali que acho que, sei lá, as mulheres se preocupam. No
meu grupo que é meio atípico nisso. Mas as mulheres se preocupam mais em
negócio de malhar do que os homens.
Isso acontece devido à pressão ser grande em função de todos ao redor agirem dessa forma
com relação ao corpo.
A média de idade do grupo é de 28, 27 anos para as mulheres e 30 para os homens. As
mulheres não costumam ser extremamente arrumadas, porém ainda o são mais do que os
homens, que são básicos. Em termos de moda praia, as mulheres freqüentam com mais
adereços, com bolsa e saias, por exemplo. E existe a preocupação fazer uma combinação
agradável entre esses itens.
Questão 3: O grupo freqüenta a praia após o meio dia, permanecendo até o sol se por.
Normalmente a presença se dá quinzenalmente. Nem todos chegam no mesmo horário. Todos
costumam sair juntos da praia em direção a algum lugar para almoçar. Não há uma
combinação prévia de reunião na praia, pois o encontro é inevitável de qualquer forma. Lá
chegando as pessoas se procuram, ou até ligam umas para as outras.
Costumam jogar frescobol, quando há espaço suficiente na areia. No mais,
permanecem sentados conversando. Sobre o tema dessas conversas: “Ah fim de semana,
óbvio que de Sábado, se tiver, aí tiver saído na Sexta, tivesse acontecido alguma coisa, óbvio
que o papo vai ser a noitada da Sexta. E combinamos os preparativos, o que vai fazer no
Sábado a noite. Sei lá o quê.”. Raramente assuntos mais sérios entram em pauta:
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Papo furado. Papo furado. E, sei lá, como tá o trabalho. A vida pessoal de
cada um. Óbvio se tiver acontecendo uma revolução, alguma coisa. Como no
mundo, na política, óbvio que vai ser o papo da hora. Mas assim rotineiro...
Na Copa do Mundo agora. Sobre Copa do Mundo. Entendeu?.
Normalmente os entrantes são amigos ou familiares de pessoas que já pertencem ao
grupo. Já existiram casos de pessoas que saíram e retornaram, principalmente por motivos de
viagem ou casamento. Sobre se isso influencia na relação com o grupo:
Nada. Não influencia em nada. É porque ali é mais amizade. Não é o estar
com aquela pessoa, com aquele grupo, pelo modo de se vestir ou por estar ali
vai ser, sei lá, pro social assim. Não. É pela amizade mesmo. É por isso que
não acaba.
Em relação aos procedimentos do grupo quando na praia:
Ah chega na praia, fica lá um pouco. Pega um sol. E aí tá calor, dá um
mergulho. Aí depois no meio da tarde já começa a comer alguma coisa. Um
mate, um biscoito pra segurar. Aí no final do dia cada um paga... Sai junto
né. Paga as suas coisas que tem que pagar na barraca que a gente conhece,
sei lá, ao cara. E vai pra um barzinho, um boteco, almoçar todo mundo junto.
Questão 4: No que tange aos sentimentos em relação ao grupo: “Me sinto totalmente cúmplice
em relação a qualquer momento da minha vida, de ter um apoio e feliz. Porque eu acho que,
como é um grupo muito grande, eles que sempre, quando tem um cabisbaixo e tem um que tá
mais feliz, e aí ele se segura ali.”.
Sobre se abandonasse o grupo:
O problema seria que eles iam ficar me ligando. Eles não iam entender nada
acho. Se eu quisesse largar, seria por algum motivo de briga ou de, sei lá,
algum momento diferente que eu estaria vivendo, mas fora isso, acho que
tenho total liberdade de querer estar lá ou não. Não vão me discriminar
porque eu tô em outro posto ou eu tô em outro lugar.
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A entrevistada se julga diferente dos demais por sua preocupação com o corpo. Não
suporta engordar um pouco. Enquanto seu grupo é mais “desencanado” com essas questões. A
ponto de, sentindo-se gorda, não ir à praia. Enquanto os demais “não estão nem aí”.
Sobre como vê o seu grupo: “Animadas. Chamaria a atenção pela animação. Não é
aquele grupo que chamaria a atenção pela beleza ou pelo corpo, pelos cuidados. Chamaria a
atenção pelo papo. Pela animação. Acho que o que chamaria.”.
Questão 5: Os freqüentadores do posto 9 tendem a ser mais “alternativos” e também mais
engajados intelectualmente: “Sei lá. Mais é... Como é que posso falar? Mais debatendo fatos
de política, vida. Mais preocupado o mundo, em termos em geral. Entendeu? Acho que mais
largado. Em relação a tudo sabe? Maconheiro. Esteticamente mais largado.”.
Em relação aos freqüentadores da Farme de Amoedo, são na sua maioria gays. E
vivem em harmonia por serem na sua maioria homossexuais mesmo. Em relação ao
preconceito: “Ah, que acho que homem lá... Porque mulher não tem esse preconceito. Mas
homem, que não é, não se sente bem de ir lá. E mulher solteira, assim, se não tem amigos, no
meio de homens, também não vai lá por que... Não vai se sentir...”.
Sobre o que seria uma pessoa bem inserida no posto10: “Mas o que eu vejo ali são os
marombeiros mesmo. A galera forte. Malhada. Tá dentro. Bonitinha sabe. Preocupada. Acho
até que freqüenta os mesmos lugares da zona sul. De boate, de bar. Combina ali.”. E as que
seriam rechaçadas: “Acho que quando entra, vamos supor, um magrinho, um branquinho, um
cabeludo, um maconheiro, você já vê que tem alguma coisa de errado ali. Entendeu?”.
Questão 6: Em termos de consumo chama a atenção a maioria das mulheres usarem moda
praia da marca Salinas. Passou a consumir mate em copo, industrializado, e Biscoito Globo
influenciada pelo grupo. Deixou de consumir o mate que é feito pelo próprio vendedor
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ambulante também por influência do grupo. Os hábitos de consumo têm poderes ambíguos de
conexão do indivíduo em relação ao grupo:
Mas em termos do meu grupo ali, não por causa desse negócio da amizade.
Então não vai ficar mais desconectado. Entendeu? Mas acho que em termos
do grupo inteiro. Do Posto ali, acho que pode ser sim. Olhar de forma
diferente. Influenciam totalmente. Você já sabe é. Você já sabe distinguir.
Ah não. O posto lá do, sei lá, o Nove. Já sabe distinguir que a galera de lá,
que é mais bicho grilo ou não. Sei lá o do que é.
Sua influência sobre os hábitos de consumo do grupo situa-se na arena dos esportes.
Por estar sempre forçando as pessoas a praticarem algum exercício.
Produto fundamental para o grupo é o protetor solar, sem o qual se torna uma árdua
tarefa suportar o sol. O grupo é aberto a experiências na praia através de eventos
diferenciados, como algum show, por exemplo.
4.2.7 Entrevistado 7: Leonardo (Posto 9)
Perfil: 26 anos, formado em Engenharia Eletrônica e atualmente cursando mestrado em
administração. Solteiro, morador de Laranjeiras e surfista.
Questão 1: Seu grupo se reúne um pouco à esquerda do posto 9. O ponto de referência, além
do posto de salvamento em si, é a Barraca do Uruguai local onde o entrevistado foi
acostumado a freqüentar desde pequeno. Inclusive tendo criado vínculo de amizade com o
dono da barraca.
Mesmo assim a fidelidade a essa localização não é extrema: “Não tem ninguém ali
na barraca esse dia, no momento ou então eu quero curtir outro pessoal. Então vou pra outro
lugar.”. Porém o Posto 9 continua sendo a referência de onde não se vai além.
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O grupo é composto, basicamente, de pessoas que cresceram juntas e, somam-se a
essas, os amigos desses que foram compondo o grupo com o passar dos anos. Todos
pertencem, em média, a mesma faixa etária. Porém existem sim pessoas um pouco mais
velhas, como alguns pais, por exemplo. Fora isso, o grupo é homogêneo no seu modo de ser e
agir:
É homogêneo. É pessoal que gosta de pegar onda. Gosta de sair na noite.
Aqueles lugares mais badalos e tal. Aquele meio tipo de moda. De modinha
né. E eu gosto de, pô, tomar cuidado com o corpo. Eu gosto de futevôlei. É
bem aquele estilo do Nove ali de, entendeu? É o que tá na moda. Mesmo da
altinha. Começa a altinha. Neguinho tá jogando a altinha. É aquela coisa.
Não sei. Nasce ali no Nove. O negócio nasce ali no Nove. Então...
Com relação a alguma pessoa que se diferencie dos demais, o entrevistado vê em
si próprio essa pessoa:
Eu sou um cara diferente pela minha perspectiva de vida assim, pela minha
visão da vida, entendeu? Lá é bem pelo o que você falou. Lá é a visão do
hoje que eles querem curtir o hoje e não pensam muito no futuro, entendeu?
Eu sou um cara também meio atípico ali no meio que pó... E às vezes até
estranho, entendeu? O cara, pô. Pô, tu largou o trabalho pra fazer mestrado?
Pô. Por quê? E é grana? Como é que é isso? Entendeu? Pô, mestrado. Que é
isso? Caramba! Pô. Tu é gênio! Entendeu? Tu é sinistro! Não meu irmão.
Tem que... Tu curte. Tem que curtir, mas também tem a parte do futuro aí. A
vida né?
Os componentes do grupo dividem-se entre moradores de vários bairros da cidade,
entre eles: Laranjeiras, Santa Teresa, Ipanema e Copacabana. Apesar de os demais integrantes
do grupo saírem juntos à noite, esse grupo, na perspectiva do entrevistado, é apenas o grupo
da praia. Ou seja, ele se reúne com eles em função da praia. Inclusive relata que não gosta
muito dessas pessoas como companhia para outros programas. Possuindo, para isso, um outro
círculo de amizades.
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Uma das características que diferencia o grupo é o respeito mútuo. Além disso, as
pessoas são muito amigas e gostam de fazer as mesmas coisas e juntas, principalmente em se
tratando de atividades desempenhadas na praia.
Novamente abordando a homogeneidade do grupo, quando questionado sobre
possíveis diferenças individuais:
Muito heterogêneo não. É o contrário. É muito parecido. Poxa, os caras é... É
tudo. Mesmo o curso na faculdade. Mas parece que tem que prestar contas
ao pai né. Que tá fazendo alguma coisa na vida e pô, pega um emprego na
loja. Pra pô, pra tirar um dinheirinho. Pra poder curtir de noite. Tem a
namorada, que geralmente é a mesma coisa também. Quando pinta
namorada diferente ela fica já meio de saco cheio.
Esse não é o único grupo do entrevistado. Que se lembrasse na hora, possui
também os grupos da faculdade, do condomínio e do mestrado. Com relação ao primeiro
destaca: “São pessoas mais sérias. Entendeu? Visão de futuro. Consegue trocar uma idéia
mais legal.”.
Com relação aos momentos em que não está na Barraca do Uruguai, diz não
conceber as outras pessoas e locais como sendo o seu grupo de praia:
Aí não classificaria como grupo de praia”. Eu classificaria assim: são outros
grupos. Por exemplo, ou eu levo do condomínio ou grupos de pessoas que eu
conheço de Laranjeiras, que eu tenho amizade de infância. Que
freqüentavam até. Tem um grupo que freqüentava esse lugar, quando era
mais novo. Aí agora vai pra outro. Vai pra Garcia D’Ávila né, que era outro
lugar que quando era pequeno já freqüentei também.
No que tange ao estereótipo de homem que se integra bem ao grupo:
O cara bem aceito no grupo é aquele cara que curte ali as diversões da praia
né, que é como eu falei né. De futevôlei, o altinha. É pegar onda. E pra tá
“in” mesmo. Quem é o cara “in” do Posto 9? Pega a figura do Posto 9. É o
cara que joga altinha. Curte o vôlei. É o cara que pega onda. E o cara sai na
‘night’. Conhece todo mundo na ‘night’. Pô, o cara fuma um baseado com
uma maconha aqui. Entendeu? Aí vai, conversa e tal. Fuma um outro...
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E mulheres:
A mulher é mais complexa. Aquela mulher que hoje em dia que gosta de
fazer as coisas que o cara talvez, o homem, né, entre aspas, faz, e aí você já
vê a mulherada jogando altinhas, participando do dia-a-dia ali da praia. E
tem a mulherada que vai lá só pra pegar o sol e fofocar. E conversar da
‘night’ anterior. Conversar da garotada. Olhar os homens.
Sobre a relação entre o grupo e a praia:
Porque eu acho que ali o grupo se reúne mesmo pra curtir a praia, entendeu?
O papel principal ali não são as pessoas. A praia é que dita ali o que vai ter
ou o que não vai ter. Eu quero até falar, porque se não tiver sol, até o tempo
também né, mas eu acho que o tempo também faz parte da praia. Eu digo a
praia com sol né. Então se não tiver o sol, não tem a reunião. Se tiver
chovendo, por exemplo, não tem reunião. Se não tiver onda, não tem. O
pessoal não vai pegar onda, entendeu? Mas aí vai jogar o futevôlei. Então,
entendeu, acho que a praia de forma geral é essa.
Questão 2: Esteticamente não há grandes diferenças entre os membros do grupo. Tratam-se
pessoas adeptas do culto ao corpo. Uma única observação fica por conta das mulheres que se
produzem mais para ir à praia, enquanto os homens não parecem se importar tanto com isso.
Destaca: “Corpo malhado. Roupa da moda. As lojas da moda né, de... E aí quando eu falo da
moda é da garotada da faixa etária assim. Você está entrevistando de 20 a 30. É isso mesmo.
É Osklen. Aquela Limits, que apareceu agora.”.
Quando questionado sobre a questão do culto ao corpo versus vida saudável:
Corpo. Não é saúde. É corpo. É tá com aquele corpo bem ali. Pra você
chegar... Você até brinca. Brinca, quer dizer, eu brinco. Que os caras, pô,
dois meses. Tem gente ali que dois meses antes do Verão, entra na academia.
Começa a malhar, aí toma bomba né e tal. Aí cresce. Fica com o corpo
sarado. E aí tá pronto pra vir pra praia. Vai pra praia e tal. Passou. E aí é o
Carnaval. Aí o cara, meu irmão, o cara veio ‘murcha’, e aí dois meses antes
do Verão seguinte, o cara já tá lá na academia e tal.
Questão 3: O entrevistado costuma freqüentar a praia a partir das 13 horas até o sol se pôr,
todos os finais de semana, aos sábados e domingos. O sol é um fator importante para ida à
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praia, todavia não é limitante haja vista que há não muito tempo atrás, quando a moda era o
futevôlei, os jogos aconteciam mesmo com o tempo fechado.
Os demais membros do grupo também costumam chegar ao redor das 13 horas,
mas não há de forma alguma um padrão, as pessoas vão simplesmente “chegando”. Inclusive
esse horário de chegada depende muito da ocupação da pessoa, que pode estar liberada mais
cedo ou mais tarde que os demais.
A saída da praia não é muito diferente com as pessoas se retirando à medida que
lhes convém. Além disso, não há nenhum tipo de combinação para programas posteriores à
praia, como almoçar, por exemplo. Apesar de isso já ter sido comum em outras épocas.
Antes de se dirigirem à praia, é comum as pessoas trocarem telefonemas. Não com
o objetivo de agendar um horário, mas para saber a intenção de um ou mais integrantes do
grupo de irem, ou não, à praia. Além disso, aproveitam essas ligações para se informarem
sobre as condições das ondas visando a prática do surfe.
Dentre as práticas mais comuns do grupo na praia destacam-se: o futevôlei, a
altinha, o frescobol, o surfe e as conversas. Com relação ao tema das conversas, tratam-se de
amenidades ou, nas palavras do entrevistado, “futilidades”. Apenas eventualmente algum
tema mais sério é discutido.
Com relação a essas atividades, o entrevistado percebe alguma dicotomia entre o
gostar e se sentir obrigado a fazer:
Só te interromper e complementando, passaria aí o próprio hobby da praia. O
cara às vezes, por exemplo, futevôlei. O cara não sabe jogar um futebol, não
sabe jogar uma altinha, mas como a galera joga futevôlei e tá na onda o
futevôlei, então o cara começa a entrar na altinha mesmo, sem saber. Fica
querendo jogar. Aí pega a bola. Fica querendo jogar pra aprender, pra poder
tá participando, entendeu, daquele negócio. Jogar altinha ali na beira da
praia. Que o pessoal acha... Eu jogo altinha porque eu gosto, mas dizer que...
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É comum a entrada de novos membros através introdução via um já integrante do
grupo. Da mesma forma, a saída de algum membro também é um fato comum, principalmente
relacionado a novas situações sociais, como o namoro ou o casamento, por exemplo. Nesses
casos, quando ocorre o retorno dessa pessoa, a recepção por parte dos demais é tranqüila.
Com relação aos rituais do grupo:
Cara, padrão é: chegou na praia. Aí chega na praia, vê se tem onda. Se tem
onda, bota as coisas na areia. Vai pra dentro do mar logo pegar onda. Aí sai
da onda. Sai do mar. Aí toma um negócio e tal. Dá uma descansada. Aí vai
jogar uma altinha. Se tiver muito sol, joga altinha ali na beira da praia. Se
não, às vezes joga lá pra cima. Se a praia tiver muito cheia, às vezes, também
joga lá pra cima. E aí o futevôlei é mais pro final do dia. E aí tem futevôlei
no final do dia. E aí fechou. E aí começa a escurecer. Fica ruim. Que não
tem holofote ali pra iluminar. E aí morre. E aí é, no Verão principalmente,
fica trocando idéia, fica brincando...
Questão 4: O entrevistado percebe que os integrantes do grupo apenas valorizam o hoje,
esquecendo por completo qualquer projeto de futuro. E essa preocupação com o imediato
seria refletida no hábito de consumo:
É assim: pô, o cara trabalha. Pô, o cara tá trabalhando na loja, tá tirando mil
reais. Pô, o cara tá felizão. Com os mil reais dele ele consegue ir pra noite.
Entendeu? Ele consegue comprar uma roupinha bonita. Aí pô, fala: ‘comprei
a calça na Osken por duzentos e trinta’; a namorada fala que ganhou um
presente do namorado de tanto. Pô. Entendeu? Tá beleza. O cara mora com
os pais. Os mil reais dele é no bolso dele pra ele gastar. Então ele compra a
roupa da moda da Osken. Paga trezentos reais numa bermuda. Chega na
praia com a bermuda e tirando onda.
O valor de ligação do grupo é a praia. Apesar de haver um sentimento de amizade
entre os membros, o entrevistado não se considera amigo das pessoas. Mas sim que possui
uma afinidade em termos de “usufruir a praia”:
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Acho que é a diversão na praia mesmo. É um grupo que gosta de pegar
ondas juntos, entendeu? E gosta de jogar o futevôlei. Pegar uma altinha. São
os hábitos na praia. Acho que aí forma esse grupo e principalmente pra mim
é isso: são os hábitos. É o pessoal que tem um hábito na praia que eu gosto.
Entendeu? Chega de noite eu não saio. Entendeu? Tanto que eu não tenho
esse hábito de sair de noite.
Os valores pessoais da maioria do grupo divergem fortemente dos do entrevistado,
principalmente no que tange ao projeto de futuro. Mas esse último admite ser uma exceção e
declara que a valorização do hoje é sim um valor compartilhado pelo grupo:
Não sei, porque não sou psicólogo né, mas eu acho que no subconsciente
talvez esteja aquele negócio: pô, todo mundo tá igual a mim. Todo mundo tá
fazendo a mesma coisa que eu faço. Então tá tranqüilo. Então eu não tô
errado. Entendeu? Vamos curtir o dia e vamos embora. Eu acho que no
subconsciente deve ter alguma coisa assim.
Mesmo assim, admite que a praia é também para ele um lugar para se “desligar” um pouco
das dificuldades e agitação do dia-a-dia: “Então ali eu meio que vou pra praia, me desligo.
Entendeu? Pra mim e pra meio que me desligar da vida mesmo. E aí curtir a praia mesmo.”.
O entrevistado não se sente preso ao grupo, a não ser pela afinidade em “usufruir a
praia”. Ademais, alega que não teria maiores dificuldades em se desvencilhar. Inclusive, se
encontrasse um outro grupo com as mesmas afinidades em relação à praia, mas com valores
mais parecidos com os seus, trocaria prontamente. Nesse caso, a mudança de ambiente, ou
local, não teria interferência nenhuma.
O grupo poderia ser identificado pela sua “vontade de estar na moda”:
Identifica. Tá jogando altinha. Tá com a rede, futevôlei. Falar, conversar. Pô,
eu tenho a rede ali no Posto 9, entendeu? Isso aí é, pro cara, é um status. ‘Eu
tenho uma rede que jogo futevôlei ali’. ‘Pô, chega aí.’ ‘Você quer chegar ali
na minha rede.’.
E completa: “O cara falar: ‘vem aqui na minha rede jogar.’ Pô, pro cara é o máximo isso aí.”.
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Um resumo de como o entrevistado vê e se sente em relação ao seu grupo:
Pô cara, é um grupo que busca curtir a praia. Eu acho que busca afirmação
um no outro, entendeu? Eu acho que no fundo, cara, deve bater alguma
preocupação quanto a futuro nas pessoas né. Eu não consigo imaginar a
pessoa que não tem essa preocupação. Não tem uma preocupação. Nenhuma.
Entendeu? A galera quer curtir o dia. Curtir e querem se auto-afirmar. Você
vê e os caras querem e pô, querem contar o que os caras fazem. Eles querem
contar, não querem, por exemplo, ele quer muito contar a vitória, entendeu?
Tem aquele negócio: ah, não conta derrota, só conta vitória. Os caras querem
contar o que ele fez, o que ele se deu bem. Entendeu. Na vida. Se ele arruma,
não sei. Se chega em Dezembro, o cara tá trabalhando na loja. O cara é o
primeiro vendedor da loja, o cara chega na praia, é a vitória pra ele aquilo.
Contar: ‘pô fui o cara que mais vende’, ‘Ganhei tal.’.
Questão 5: Em relação aos vizinhos de praia, mais especificamente os freqüentadores do
posto 10:
Cara, o Posto 10 acho que tem o pessoal que curte a praia, mas curte assim...
Ele já tem uns objetivos. É um pessoal... Talvez até um pessoal já mais velho
já pra... Mais velho não né. Que eu tenho 26 já. Eu parei no tempo né. Não tá
crescendo né. Mas tem o pessoal... É o pessoal que talvez... É até engraçado.
Talvez seja o pessoal que até me... Talvez eu me desse melhor assim. Teria
de complementar. Seria aquele negócio de curtir a praia e você tem algo a
mais ali pra conversar. Uma conversa legal. Entendeu? Um papo mais...
E sobre outros grupos em geral:
Ah eu não sei dizer assim. Você tem grupos no Nove mesmo você tem
grupos diversos né? Tem aquele grupo que é mais... Se bem que o grupo é
algo engraçado porque ali eu vejo adversidade em que você tem em pontos
em comum. Né. Tem grupo, por exemplo, meu grupo não tem essa coisa de
drogas entendeu? Tu vê outros grupos que não. Que tem aquele negócio da
maconha. Que pra eles é normal. Você fuma maconha, pra eles é normal.
Fumar maconha é como se tomasse uma cervejinha. Entendeu? Já tem
aquele outro grupo que não. Que aí já curte uma droga mais pesada.
Entendeu? Isso aí já é um pessoal mais porra-louca né. Acho que é bem
diverso. Aí na Farme eu não conheço muito, mas o que eu conheço é o que
todo mundo fala. Que ali é um pessoal alternativo. Pessoal homossexual. É
um grupo diferente.
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Questão 6: Em função da valorização do hoje, os hábitos de consumo do grupo giram em
torno da moda. Grande parte dos salários são gastos com roupas de marcas conhecidas, entre
as quais podem ser citadas Osklen e Limits.
O sanduíche de churrasco da Barraca do Uruguai, que serve de demarcação
territorial para o grupo, com o passar do tempo também se tornou um habito de consumo.
Primeiro pela própria convivência em comum e, segundo, porque tornou-se famoso e “volta e
meia sai nessas revistas, como Veja Rio”. Além das imensas filas que se formam para adquirir
o produto.
Fora isso, o entrevistado não passou a consumir nada em função do grupo. Mas, no
caso das roupas, ele e o grupo possuem o mesmo gosto:
Eu sempre comprei esse tipo de roupa. Eu gosto de usar esse tipo de roupa.
Mas não direi que foi por causa do grupo. Assim, até porque, na época desse
grupo entendeu? Eu não sei se de repente o grupo que eu ando em geral,
entendeu? Todos os grupos que eu ando, minhas amizades, de repente, usam
esse estilo de roupa, entendeu?
Sobre o influência do grupo nos hábitos de consumo individuais:
Tem uma forte influência. Eu acho que esse estilo de que eu me visto, por
exemplo, é um estilo... Acho que ali no Posto 9 em geral, só sabe só do meu
grupo. Vou sair um pouco do meu grupo e falar do que eu vejo do Posto 9
em geral. É a galera. Essa moda Osklen, que nem a Limits. Essa roupa meio
de, entendeu, que você se sente bem né. Não é aquela roupinha mais
arrumadinha.
O grupo costuma freqüentar eventos que acontecem na praia, sendo os de música
preferidos. Mas o Ano Novo também figura como preferência. Em tempos passados os luais
também faziam sucesso, contudo não mais. Para que esses tipos de evento voltem (ou
continuem) a ser freqüentados é necessária a presença de bastante gente do mesmo estilo, para
que, então, as demais se sintam interessadas em comparecer.
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4.2.8 Entrevistado 8: Marcos (Posto 9)
Perfil: 30 anos, terceiro grau completo, advogado, atualmente estudando para concurso
público. Morador do Flamengo.
Questão 1: O grupo se concentra nas cercanias do posto 9:
É Posto 9, mas é tipo: é ao arredores né. Atualmente eu vou te confessar que
existe uma tendência das pessoas que elas iam antigamente no Posto 9. Aí
foi passando pra direita, que foram acabar no Coqueirão. E aí agora hoje em
dia, essas mesmas pessoas que há cinco meses estavam no Coqueirão, agora
elas estão quase no Ceaser.
Isso acontece devido a busca do conforto perdido na medida em que, tanto Posto 9, quanto
Coqueirão, já estariam muito cheios.
A principal característica dos membros do grupo é a “vanguarda de cabeça”,
sendo eles “libertos quanto a várias questões”. Além disso são pessoas muito ligadas à moda e
comportamento, mas não são necessariamente obstinados com isso. Tratam-se de pessoas com
idéias abertas e culturalmente conectadas. Inclusive muitos membros trabalham no teatro.
Com relação à aparência das pessoas: “Cara, eu acho que são pessoas bonitas, mas
na realidade são as pessoas bonitas, digo como, bonitas normais. Não são as bonitas da
academia. Sacou? São pessoas acho que bonitas até pelo relaxamento facial que elas
emitem.”.
A tribo é composta por pessoas de idade e estilos de vida variados, mas a
homogeneidade é uma de suas características básicas, pois não existem diferenças aparentes
entre os membros. Tanto de ordem físico-estética, quanto comportamental. Embora haja
diferenças quanto às profissões de cada um. Moram todos pela zona sul do Rio de Janeiro,
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mas não necessariamente em Ipanema. Algumas pessoas do grupo também costumam estar
juntas em outras ocasiões que não a praia.
Com relação ao começo no Posto 9:
Mas eu acho que eu também vou no Nove, desde que eu era... Não desde que
eu era pequeno não. Eu, quando era pequeno, ia na Garcia. O que que
acontece? Eu não moro em Ipanema. Mas a minha mãe tem uma loja em
Ipanema. Então a loja fica perto da Garcia. Então a gente ia sempre pra
Garcia. Quando eu era pequeno né, a gente ia sempre pra Garcia. Depois que
eu comecei de freqüentar a praia, invés de ser com amigos de infância, pra
ser meus amigos que eu optei, de vida, eu passei a freqüentar mais o Nove.
Isso aconteceu, sei lá, com 17 anos de idade. Foi há bastante tempo.
Questão 2: Com relação ao vestuário: “Eu vou falar de mim né. Como me visto. Eu
normalmente boto um bermudão de praia e de chinelo. E pra mim, se for praia, é o lugar de
maior conforto que possa existir.”. E à estética de maneira geral:
Elas não são. As minhas amigas não são... Não fazem uma pré-produção
praia. Não vão se vestir assim, se maquiar. Não vão fazer nada tipo desse
esquema pra ir pra praia não. Elas são bem, tipo... Ah, vão botar um
shortinho pra ir pra praia. Vão botar um biquíni pra ir pra praia. É claro que
tem... Não vou dizer cara, meus amigos têm muito estilo sabe? Tipo, tudo
isso que a gente tá falando, não tem... É pô. Tudo isso que estou falando eu
sei, tipo, não adianta comparar meu amigos à galera do Dez, do Onze, sei lá
de onde, tipo, eu acho que meus amigos tiram muita onda em relação. Eu
vou me vestir simples pra caralho, mas vou tá muito mais bem vestido do
que aquele cara que comprou a roupa lá na Osklen, que é igual aquele do
ladinho, que é igual aquele tarará, é igual. Eles pô, são...
Tudo isso poderia ser resumido em uma palavra: autenticidade.
Questão 3: O grupo freqüenta a praia entre três horas da tarde e o final do dia, só saindo um
pouco antes do sol se por. Todo final de semana de sol a tribo se reúne, sendo que, em tempos
sem sol, na média, pelo menos uma vez por mês estão na praia. Apesar de, se o tempo estiver
nublado, não comparecerem, o sol também não é tido como fator preponderante.
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Nem todos os membros chegam no mesmo horário, existindo, inclusive, aqueles
que chegam ainda na parte da manhã. Dependendo dos afazeres de cada um, o grupo até
costuma sair junto da praia. Mas há liberdade para sair junto, ou não.
Não existe uma marcação formal de ida à praia. Todavia as ligações para avisar
que estão indo para a praia são comuns. Muito embora não sejam regra.
Sobre as coisas que fazem juntos na praia: “A gente nada. A gente pega sol. A
gente passa protetor solar. A gente passa nas outras pessoas, a gente fuma. A gente bebe. A
gente... Deixa eu ver... Mais alguma coisa. A gente fica escutando conversa alheia.”. Sobre as
conversar entre os membros do grupo, o tema preferido da atualidade é programa de reality
show Big Brother. De maneira geral os temas são sempre nessa linha de amenidades e / ou
futilidades.
Existe movimento de entrada de novos integrantes que acontece, basicamente,
através da introdução por um já membro. Mas esse ingreço não é indolor, pois existe um
“filtro bem pesado” pos parte dos integrantes. Sobre esse filtro:
Bem pesado. Tipo assim: demorou. O nosso grupo, ele demorou bastante pra
ele ter um pouco mais de abertura. Mas normalmente ele é bem fechado.
Esse grupo que eu falo, é o que eu, pô, viajo no Reveillon há dez anos.
Sacou?
E mais: “Barrado que eu digo, não é ser barrado. Simplesmente não tem a mesma afinidade.
Sacou? Não tem o mesmo grau de afinidade. É isso.”.
Pessoa que abandonaram o grupo o fizeram, principalmente, por motivo de
mudança para o exterior. Mas, na hipótese de visitarem o país, ou voltarem para casa,
estariam a vontade para re-ingressar à tribo.
Sobre os rituais do grupo quando na praia: “Não cara. A gente nem tem muito
ritual não. No meu grupo não tem. Tipo, a gente, ah, vamos achar a barraca. Pegar a cadeira.
Vamos achar um lugar pra gente sentar. Não tem ritual não. Não tem essas coisas não.”.
92
Questão 4: Sobre a história do grupo:
São pessoas que eu conheço de outras épocas. São pessoas até que eu, tipo,
sou amigo, mas eu não tenho muita convivência fora da praia. São pessoas
que eu sei que gostam de ir à praia. Às vezes o meu grupo não tá a fim de...
Pessoas que eu me ligo mais, não tão na pilha de ir pra praia, eu vou, de
repente, com amigos mais antigos sabe? Que são pessoas que eu tenho
certeza que vão freqüentar a praia, mas tipo assim: eu freqüento com eles a
praia, mas eles são meus amigos de outras épocas.
E sobre o que faz a ligação dessa relação grupal: “São pessoas que eu já me dou há muito
tempo. Pessoas que eu tenho total liberdade de falar qualquer coisa e são pessoas muito
parecidas comigo. Na forma de pensar, enfim.”.
Para o entrevistado, esse grupo oferece segurança, liberdade, amizade e conforto.
Sobre esse último:
Esse conforto porque eu fico, entendeu, sou eu mesmo. Não tem qualquer
interferência de: pô, tô querendo, sabe? Quando você quer demonstrar
alguma coisa pra outras pessoas que você não conhece, você normalmente
impõe alguma conduta. Sacou? Não que seja diferente do que você é. Mas
você normalmente começa a... Não sei se você faz um, não é marketing
pessoal. Não é nada. É uma coisa que você... Eu acho que os meus amigos
eu não preciso ter qualquer meias palavras. Entendeu? Eu não preciso ter
qualquer relação de retenção com qualquer pessoa. Posso falar tudo o que eu
quiser. Tudo o que eu pensar.
Questão 5: Os vizinhos de praia do grupo são, de um lado, os turistas hospedados no Hotel
Ceaser e, do outro, os freqüentadores do Coqueirão. Não há por parte do grupo afinidade com
nenhum desses dois grupos. Especificamente com relação ao Coqueirão, o grupo entende que
seus freqüentadores não sejam mais aqueles que “freqüentavam o nove”.
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Sobre o que diferencia o grupo em relação aos vizinhos: “Eu acho que as pessoas
são realmente mais, mais libertas. No Nove, do que nos outros lugares geral. Mais abertos
mesmo pra ouvir, pra entender, pra escutar, pra falar.”.
Quando a questão é sobre os vizinhos do Posto 10 e da Farme de Amoedo, a
resposta: “playmobil”. Ou seja, todos iguais. E a explicação, primeiro, com foco no Posto 10:
É tipo, eu chego no Posto 10 assim: gente, as pessoas são todas iguais. É
tipo, todo mundo bonito. Sabe? Todo mundo bem cuidado. Pra mim eu vejo
praticamente o trabalho da cara deles. Tipo, eu não gosto de freqüentar.
Acho chato. Ah, que coisa mais igual. Idêntica.
Em seguida, sobre a Farme:
A Farme é bem parecida. Da Farme também as pessoas são bem iguais. A
Farme é outro lugar também que todo mundo é igual. Todo mundo é
bombado, sarado. E faz questão de, sabe? Na verdade, a Farme é o que eu
menos fui. Tipo assim, sabe? Eu não posso nem te dizer.
Questão 6: Sobre o consumo próprio sendo influenciado pelo grupo: “...por causa do grupo eu
não posso dar essa importância pro grupo. Eu acho que eu dou essa importância pra mim. Por
causa de mim.” Embora acrescente: “São decisões finais minhas. As decisões finais são
sempre minhas, mas é logicamente que tipo, o seu meio te interfere nas suas escolhas.
Interfere, mas tipo, se é o meu meio, cara.”.
O grupo procura primar pelo respeito à individualidade de seus membros, porém
certos tipos de influência, como na música e na leitura, por exemplo, são comuns. Esse tipo de
influência conecta mais o grupo atuando como fator de agregação.
O protetor solar é artigo indispensável para o grupo. Não pode faltar.
Há tempos atrás a tribo costuma freqüentar eventos na praia. Hoje, não mais.
Outrora, para atrair o grupo, bastava que fossem eventos com muita gente envolvida, como
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nos blocos carnavalescos, por exemplo. O detalhe é que tais eventos aconteciam não na areia,
mas sim no calçadão ou avenida à beira mar. Hoje em dia, pela idade mais madura do grupo,
acontecimentos com muitas pessoas são tidos como fonte de perturbação.
4.2.9 Entrevistado 9: Gustavo (Posto 9)
Perfil: 28 anos, formado em Direito, solteiro e morador de Copacabana. Atualmente estuda
para tentar um concurso público.
Questão 1: O local de predileção do entrevistado na praia é ao redor do Posto 9. Isso porque
onde houver menos concentração de pessoas, é onde ele se sente mais à vontade. Podendo
variar entre a Rua Vinícius de Moraes e o Coqueirão. A idéia central desse tipo de
movimentação é evitar a confusão. Mas o Posto 9 segue sendo a referência.
Nessas movimentações há troca de grupos. Ou seja, o entrevistado percorre vários
sub-grupos que se situam nas cercanias do Posto 9: “Às vezes mudo de grupo. Às vezes eu
vou só pra praia e aí encontro uma pessoas, e depois encontro outras. E vou pra lá, e vou pra
cá. Não tem mesmo um grupo certo nessa praia.”.
Os membros desses vários sub-grupos não são em nada parecidos. Todavia a
homogeneidade intra-grupo é certa. Uma maneira de descrever as pessoas desses vários
agrupamentos é por exclusão: “Eu não vou encontrar Barbies. Eu não vou encontrar Pitboys.
Eu não vou encontrar Patricinhas. Assim, acho que tá bom.”.
A diferença entre os sub-grupos:
É porque enfim: tem gente que é o grupo da faculdade... É mais gente... Mais
advogados e tudo mais. Isso é um grupo. Tem gente mais da noite, que já é
aí, enfim, um outro grupo. Tem amigos, sei lá, de infância. Gente, sei lá, que
eu conheci por outros amigos e é um outro grupo. Enfim.
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De qualquer forma, existem alguns membros que, como o próprio entrevistado, perambulam
por mais de um sub-grupo.
As pessoas que compõem o grupo são moradoras da zona sul, em diferentes
bairros. Esse grupo, ou sub-grupos, não se reúnem apenas na praia, mas também em outras
ocasiões. A praia é apenas mais um local para ir: “é um programa, como é um cinema, como
ir jantar...”. Porém é na praia, mais especificamente no Posto 9, que todas essas pessoas se
juntam.
Existem diferenças tanto intra-grupos como inter-grupos. No primeiro caso, se
tratam mais das características pessoais de cada um, com gostar de entrar no mar, ou não, por
exemplo. No segundo caso, as diferenças poderiam ser atribuídas mais ao fator
comportamental do grupo como um todo: “Tem uns grupos mais caretas”, por exemplo.
Mesmo assim, existe um limite de tolerância segundo o qual um determinado membro
“careta” poderia sim fazer parte de um grupo “alternativo”, por exemplo.
Sobre o história de idas ao Posto 9:
Eu morei muitos anos na Barra. Então eu não freqüentava a praia de
Ipanema e a praia era uma outra praia, né. As pessoas iam numa praia, eu ia
numa outra praia. Nunca tive muita identidade com o público da Barra, na
verdade. E aqui, em Ipanema, eu não sei... Eu até vinha da Barra pra
Ipanema pra ir à praia. Aquela coisa do social. Encontrar os amigos. Ir à
praia que as pessoas vão. Eu ia encontrar as pessoas.
Com o passar do tempo o grupo foi tomando corpo com a entrada de novos membros.
As principais características desse grupo são o divertimento, inteligência e
animação.
Questão 2: Em termos estéticos, o grupo não é ligado no culto ao corpo e as pessoas
costumam ir à praia “largadas”. Aqui também existem peculiaridades de acordo com cada
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sub-grupo: “Se tem o povo das Ciências Sociais assim, eu diria. O povo do mundo acadêmico.
É mais pra uma linha mais riponga. O povo dos advogados é mais pra uma linha mais
arrumadinha. Patricinha.”.
Questão 3: O grupo vai à praia em torno das quatro horas da tarde, permanecendo até o final
do dia e, às vezes, até estendendo um pouco noite à dentro. Em média, vão à praia
quinzenalmente, sendo que em época de sol, semanalmente. O sol não é fator preponderante,
pois o grupo se reúne inclusive em dias nublados. Nem todos os membros adotam a mesma
postura. Ou seja, uns vão com mais freqüência que outros, chegam mais cedo, ou saem mais
tarde, por exemplo. Eventualmente, no momento da saída, combinam de ir direto para um
restaurante almoçar.
Algumas vezes os membros se falam antes de irem à praia. No caso dos que
moram perto, isso acaba resultando em uma caminhada conjunta até o Posto 9. Em outros
casos, a ligação serve mais para confirmar a ida. Mas, existem ainda aqueles dias em que
ninguém se fala e acabam se encontrando naturalmente.
Os hábitos do grupo: conversar, tomar cerveja, mergulhar e tomar sol. Se estão só:
leitura e música. Esses últimos acabam sendo impossíveis na presença de outros membros.
Um hábito recente é o de levar máquinas fotográficas digitais para a praia e tirar fotos, tanto
da praia quanto dos amigos.
As conversas são, em grande parte, sobre amenidades, mas: “Depende. Enfim.
Depende de quem tá. Da intimidade que você tem com determinada pessoa. Com quem você
vai tá falando o assunto. Mas pode ser um assunto sério. Pode não ser.”.
Sobre atividades esportivas de praia, especificamente a altinha, que, no caso, o
grupo não desenvolve: “A questão é que essas atividades, especificamente, acho que é aquela
questão de espaço. É um espaço público. Né? Não é muito legal você levar uma bolada na
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cara ou não conseguir chegar no mar porque tem uma roda jogando uma bola na tua frente.”.
Um único hábito que poderia ser classificado como esportivo e que alguns do grupo gostam é
o surfe de peito, ou “jacaré”.
O grupo está sempre em mutação, com entrada de pessoas novas. Esse ingresso se
dá, principalmente, através da introdução pelos já membros. O oposto também é verdade
através da saída de pessoas do grupo. Isso acontece principalmente por: “É mais por mudança
(de cidade). E fase também. Tem gente que tem, enfim, fases que tá mais praia, sei lá, de
curtir o dia. Tem gente que tá numa fase de curtir a noite. Enfim. Têm fases. Tem gente que
aparece e vai e volta.”.
Questão 4: O elo de ligação do grupo é a afinidade e semelhança entre seus membros, mesmo
que existam várias grupos menores com suas peculiaridades. Fora isso, a praia, por si só,
agrega as pessoas. De qualquer forma, a praia é um programa que se faz com os amigos e não
um fim em si mesmo.
O entrevistado se sente seguro junto ao grupo, principalmente devido ao clima de
amizade que paira. Mesmo assim declara que poderia abandoná-los sem “remorso” e a
qualquer momento. Até porque costuma, eventualmente, ir à praia sozinho e sente bem
também dessa forma.
O entrevistado se acha diferente em relação aos demais membros: “Porque eu
acho, sei lá, que eu meio que perambulo por muitos nichos, por muitas tribos e de alguma
forma acabo sendo diferente dos grupos.”. Nesse contexto, existe uma adaptação do
comportamento conforme o sub-grupo: “...mas aí a gente dança conforme a música também
né.”. Essa característica de adaptação a um grupo específico não é de domínio geral:
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Já aconteceram assim, uns casos. Por exemplo, eu com os meus amigos do
meio acadêmico, aí de repente aparece um advogado e vem. Começa a
conversar. Senta e daqui a pouco tá falando, sei lá, dos milhões que ele
pretende ganhar aos trinta anos. E nada a ver porra nenhuma. Mas, enfim,
acontece. A gente na verdade fica numa de pô, queria que ele fosse embora,
mas eu não vou expulsar o cara daqui. Acontece isso.
Questão 5: Sobre os vizinhos de praia: “Na verdade assim: os vizinhos da Vinícius são, enfim,
os vizinhos também variam de lugar pra lugar. Na Vinícius tem mais família. Tem, enfim, no
Coqueirão é mais gente jovem. Não sei quê. Depende do lugar.”.
Sobre o Posto 10 e a Farme: “Eu não vejo. Eu não tenho identidade nenhuma.” e
“Barbies (Farme) e Patricinhas e Mauricinhos (Posto 10) do outro.”.
Questão 6: É comum os membros do grupo se influenciarem em termos de consumo. Um
exemplo seria o consumo do “Brownie do Príncipe Adam” que todos acabaram consumindo
influenciados uns pelos outros. Através desse tipo de consumo, ou dos produtos em si, o
grupo se sente mais conectado. Até porque em alguns casos, como do Brownie, por exemplo,
aquele consumo tem uma história representativa do grupo por trás.
O cigarro de maconha é um item indispensável para o grupo. Além disso, a cerveja
também é um item importante. Para o entrevistado especificamente, a canga é um produto
sempre presente. O filtro solar é desejável.
Não é comum o grupo freqüentar eventos na praia, porém já participaram de
alguns. O que os motivou e motiva é a atração em si: tem que ser um show que as pessoas
gostem. O fato de ser de graça não pesa em nada se não for assim. Além disso, é desejável
que não fique tão cheio a ponto de faltar “civilidade”. Nesses casos, o grupo tende a
abandonar o evento.
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4.2.10 Entrevistado 10: Leandro (Posto 10)
Perfil: 28 anos, pós-graduado em gestão de negócios, atualmente trabalhando como
representante comercial de uma firma de cartões de crédito. Solteiro e morador de Ipanema.
Questão 1: O grupo se reúne no Posto 10, em frente ao Country Clube. Um dos motivos
alegados para essa escolha seria a presença de pessoas bonitas nessa área, principalmente
mulheres. O grupo do posto 10, na verdade, poderia ser dividido em vários subgrupos
menores com interesses específicos, mas que compartilhariam o mesmo sentimento em
relação à praia: “Acho que a gente tem... Não sei, cara, para essa cultura de praia assim, que
todo mundo gosta de praia, eu acho que existe dentro do Dez, existe, vamos dizer, existem
várias tribos assim.”.
Mais especificamente sobre esses subgrupos:
Eu acho que tem um pouco daquele pessoal que curte praia mesmo. Que
chega cedo. Que sai cedo. Que só gosta da praia de manhã. Aquele pessoal
que não necessariamente é mais velho ou é casado, ou tem família. Mas é
uma pessoa que tem já... Muitas mulheres assim, que gosta de ir à praia só
cedo e tal. Depois tem aquele pessoal que a gente chama que é aquele
pessoal que vem da noite né. Que só chega na praia depois de meio-dia. Que
fez a noitada antes. E enfim, acho que de repente tem aquele pessoal que fica
na praia, especialmente, todo Rio também: Dez, Nove. Que na praia pra
jogar uma bola. Pra jogar um futebol. Outro que vai ali pra tomar uma
cerveja. E eu acho que isso se mistura um pouco né. Tem sempre aquelas
pessoas que andam por todos esses grupos, e aquelas que estão bem ali
fechadas. Só vão à praia pra jogar bola.
A principal característica do grupo é amar a praia, assim como todo carioca. Nesse
sentido, são comuns aqueles membros que, em qualquer momento de folga, dão “um pulo na
praia” apenas para um mergulho ou meia hora de surfe. Tratam-se de jovens entre 20 e 30
anos, de bom nível sócio-econômico e que moram próximo à praia.
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Dentre os membros do grupo, uma pessoa se destaca devido a um fator estético.
Essa pessoa é muito branca, quase albina e está sempre na praia: “Mas acho que só por uma
questão estética assim. Quer dizer, a gente não tá muito acostumado ver, né? Ah, muito
branco, o cara tá sempre correndo do sol e ela não. Ela curte praia, vai à praia.”.
O grupo é composto por pessoas que moram, em sua maioria, na zona sul em
bairros como Humaitá, Botafogo, Copacabana e Ipanema. Além desses, alguns integrantes são
moradores da Barra da Tijuca e freqüentam a praia de Ipanema em função do surfe.
O grupo não é apenas um grupo de praia, mas também se reúne em outras
ocasiões. São amigos do dia-a-dia que estão sempre juntos inclusive freqüentando as casas
uns dos outros. Todavia existem no grupo da praia aqueles “conhecidos” que só fazem parte
mesmo desse grupo.
Sobre a história do grupo:
Na realidade é assim. Eu assim, por ter estudado em muitos colégios e
morado em bairros diferentes. Eu morei em São Conrado, morei em
Ipanema, Leblon. Quer dizer, sempre São Conrado, indo e voltando. Então
assim: eu tenho muitos amigos na Barra. Muitos amigos em São Conrado.
Muitos amigos em Ipanema, Leblon, Gávea. Quer dizer, zona sul. Então é
um grupo muito mesclado. Vamos dizer assim. Então tem muitos amigos
que vieram da faculdade, tem alguns que vieram do colégio. Quer dizer, por
isso que eu digo: não é um grupo fechado. Seriam vários grupos né, e que
têm mais ou menos o mesmo gosto, o mesmo perfil assim. As mesmas
características e tudo mais, mas que não é um grupo fechado na realidade né.
Sobre o que faz a ligação do grupo:
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Eu acho que é assim: são as particularidades né, as identificações que as
pessoas têm umas com as outras. Quer dizer, você faz coisas iguais, acho
que isso aproxima né. Você ter, vamos dizer, hobbies em comum. Ou então
características ou qualidades em comum. Enfim, eu acho que seria mais por
aí. Assim, por exemplo, tem grupo que veio da faculdade. Grupos de amigos
que eu conheci na faculdade. Que encontrou em comum o gosto pela praia, o
gosto pelo surf e a gente tá junto até hoje. Depois têm outros amigos que já
são amigos de noite, né. Que vieram de escola, vieram de colégios. Que são
amigos que você, na realidade você encontra muito a noite. Mas que na praia
tá todo mundo ali. Pela praia ser um ambiente assim muito igual pra todo
mundo né, igual que a gente falou, então eu acho que tem muito disso. A
gente acaba tendo vários grupos dentro ali daquele mesmo grupo que tá
freqüentando a praia.
Uma das características desse grupo que o diferencia dos demais seria o fato de
vários serem adeptos do surfe. Além disso, também o nível cultural e econômico são um
diferencial em relação aos demais freqüentadores da praia. Mesmo assim, existem diferenças
entre os membros do grupo. A principal delas seria o fato de cada um ter seu objetivo de vida
próprio, resultando nas mais variadas ocupações. Fora isso, os gostos individuais também
variam muito, como música e comida, por exemplo.
Questão 2: Sobre a estética do grupo: “Acho que no geral são pessoas de bem com a vida. São
pessoas que de certa forma se preocupam com o corpo. Gostam de malhar. Tanto homem,
quanto mulher. Acho que, claro, mulher sempre é mais vaidosa.”.
Questão 3: Como grande parte do grupo é adepta do surfe, não há um horário fixo em que
freqüentam à praia “...vamos dizer, entre cinco da manhã e oito da noite.”. Normalmente estão
na praia de duas a três vezes na semana, quando está sol. A parte do grupo que não se
interessa pelo surfe chega em horários mais variados.
No que tange à saída da praia, também não há um movimento de todos saírem
juntos. Embora aconteça com freqüência o fato de se organizarem para irem a algum bar ou
restaurante, principalmente nos finais de semana.
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É comum as pessoas se falarem antes de irem para a praia, não para marcar, mas
sim para avisar que estão indo. De qualquer forma, é comum ir a praia sem não falar com
nenhum outro membro, pois existe a certeza de sempre encontrar alguém do grupo.
Sobre o que o grupo faz na praia: “Eu assim, eu já fiz muita coisa na praia. Já fui
pra correr na praia. Já fui pra malhar. Já fui jogar bola. Mas hoje em dia realmente minha
praia é surfe ou então vou ali pegar um sol. Trocar uma idéia. Beber uma cervejinha. Fazer
um social mesmo né.”. E sobre os assuntos das conversas:
Cara, mulher na praia é um assunto que é quase que, vamos dizer assim, lei
né. É inevitável, acho que homem ir pra praia e não fale de mulher, né cara.
Por mais que ele esteja casado. Que não esteja. E então assim... E o resto
assim: conversar, realmente descontrair. Ver o que ele vai fazer naquele dia.
Naquele tempo livre. Trocar alguma idéia. Quer dizer, não tem nada
realmente muito... Acabam surgindo assuntos e isso vão se desenrolando, né.
De repente idéias de novos negócios. Alguma coisa assim. Mas...
Sobre os hábitos de homens e mulheres do grupo:
Sem dúvida acho que existe uma grande diferença entre homem e mulher na
praia que é o seguinte: o homem fica em pé e a mulher fica sentada. No
grosso. Claro que a gente senta. A gente aluga a nossa cadeira. A gente senta
na canga da gata. A gente senta na areia também. Mas se você reparar assim
no grosso da praia, não só do meu grupo, homem geralmente tá em pé. Tá ali
olhando. Tá olhando. Tudo ligado. Daqui e ali. E a mulher também tá ligada.
Também tá antenada, só que de uma maneira mais discreta. Sentada,
conversando. Observando as coisas mais na maneira dela.
O grupo está em constante mutação, com a saída e entrada de novos membros. Os
novos sempre chagam através da alguém que já pertence ao grupo. Mas nem sempre são bem
recebidos, principalmente pelas mulheres do grupo, que fazem “um filtro mais forte”. Quando
estas julgam uma nova pessoa “antipática”, a aceitação fica comprometida. Já os homens,
mesmo que não gostem muito de um novo membro, preferem não “fazer muito barulho” e
apenas não interagirem com a pessoa. Com relação à saída de algum membro, pode acontecer
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por duas vias: viagem ou mudança, ou desentendimentos. Sendo que a primeira, é mais
freqüente que a segunda. Embora essa última não seja rara.
Sobre os rituais:
Cara, acho que tem um padrão assim: primeiro o pessoal que surfa fica
olhando o mar, no dia anterior, no dia seguinte. De manhã, a tarde e a noite.
Entrar na internet pra ver a previsão. Previsão de onda. Previsão de vento. E
eu acho que tem um ritual cara, do meu grupo, que é muito forte, que às
vezes até eu fico assim: pô tô cansado de fazer isso e tal. Mas é uma coisa
que você hoje tá cansado, amanhã já quer fazer de novo.
Questão 4: Sobre o sentimento em relação ao grupo:
Cara, eu na realidade assim, sinto segurança sim, sem dúvida né, quando
você tá acompanhado, mesmo inconscientemente você passa a ter uma
segurança ali um com outro e tal. Agora eu acho que seria mais uma coisa de
relação cada amigo, do que em relação ao grupo como um todo. Dentro do
grupo teria alguns amigos que sim. Me passam confiança eterna e tal. Nunca
me deixaram na mão. Nunca deixaram furo. Agora mesmo grupo de pessoas
que eu não confio nada. Não que me passaram pra trás ou fizeram alguma
coisa. Mas simplesmente pela atitude que o cara tem que você: ‘Pô, esse aí...
’. Você pensa, você acredita que não pode confiar. Não pode contar com ele.
Por exemplo: esse cara no momento de dificuldade não é quem eu vou
procurar. Alguns amigos são um pouco mais...
Nem todos do grupo são considerados “amigos” suficiente para os momentos de maior
necessidade.
Sobre a identificação com o grupo:
Eu acho que é mais uma identificação né. Acho que o ser humano tem essa
necessidade de tá incluído né, no grupo. Que o ser humano acho que ele se
junta em comunidade né, desde que a gente... Altos tempos aí indígenas e
tudo mais. Então eu acho que é mais uma questão de você se sentir querido.
Você ir a um lugar, você sabe: ‘bom, aqui eu tô a vontade’, ‘aqui eu me sinto
bem’, ‘aqui eu posso falar o que eu quiser’. É claro que o pessoal vai
implicar. Tem aquela implicância, mas é uma coisa mais de irmão. Acaba
sendo uma família. E você acaba... Acho que a primeira coisa que passa
realmente é segurança e a identificação com o grupo, né? Se sentir incluído.
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Mesmo com todos os sentimentos envolvidos, o entrevistado não se sente preso ao
grupo, e julga que poderia abandoná-lo a qualquer momento. Se isso acontecesse, mesmo com
o grupo desfeito, a amizade continuaria.
O entrevistado se julga diferente dos demais integrantes do grupo no que tange à
sua capacidade de empatia com os demais. Essa capacidade foi adquirida no decorrer dos
anos, pois, na adolescência, a prepotência era sua característica principal. E diz:
Eu acho assim: com certeza não são todos os meus amigos que dão esse
valor à amizade. Talvez 20 por cento dos meus amigos dão valor à amizade
que eu dou. Eu acho assim: vamos dizer, ser sincero, ter o caráter legal, ser,
porra, amigo do cara na hora boa, na hora ruim. Então eu acho que essa é
uma diferença minha assim. Eu acho que sou... Eu gosto de ajudar cara. Eu
gosto quando... Não é que eu goste, mas assim: eu me sinto bem quando um
amigo me liga que ele tá com um problema e eu posso ajudar ele. Então eu
acho isso legal.
Sobre a percepção que teria do grupo se não fizesse parte do mesmo:
Cara, veria um grupo de jovens assim, que gosta de praia. Que... Acho que
seria num... Poderiam até dizer que são playboys, né. Vamos dizer assim.
Porque são pessoas que têm condições de vida boa. Tá na praia com prancha
de surf. Então a gente tem aquela ideologia de que: ‘pô, surfista é playboy ‘
Quando não é verdade, porque tem muito surfista que veio da favela. Ali no
morro. E de classes baixas e tal. Mas eu acho de quem olha de fora tenderia
a olhar assim: ‘ah esses aí são os playboyzinhos aí da zona sul.’ Entendeu?
Questão 5: Sobre o Posto 9:
Cara, quando eu olho pro Nove, eu vejo a diversidade muito grande de
culturas. Acho que o Posto 9 reflete bem o que é o Rio de Janeiro. O que é
Ipanema. Que existe muita diferença ali. Acho que o Rio de Janeiro em
geral. Né. Você vê, como é próxima à favela, as mansões né, no Rio de
Janeiro. Então eu acho que a praia no geral ela resume muito bem isso. A
praia é um ambiente onde tá todo mundo. Praticamente todo mundo é igual
né. Você não vai ver um Rolex na praia. Nem uma camisa pólo. Nem uma
coisa assim. Quer dizer: vai tá todo mundo de sunga. Todo mundo de
biquíni. Então eu acho que é onde as pessoas ficam mais iguais é naquele
momento ali na praia.
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Sobre os vizinhos da Farme:
A Farme é engraçado porque eu tava comentando isso hoje. No trabalho, um
amigo meu que mora aqui, em Ipanema, e a gente tava lembrando de como
era a Farme antigamente. Que a Farme era ponto da galera casca grossa, que
era o pessoal do jiu-jitsu. Que era o pessoal que, porra, meio, vamos dizer
assim, os playboys meio bandido de Ipanema. Galera meio que gostava de
arranjar confusão. Uma galera que tava sempre né. Um pessoal de briga.
Aquela coisa assim. De uma hora pra outra, de repente começou a se tornar
um lugar mais alternativo. Com presença de pessoal, grupo do GLS,
bandeira colorida. E parece que o pessoal, os machões ali da Farme, quer
dizer, o pessoal da briga, o pessoal da confusão, pessoal acabou tudo. Pô não
adianta a gente querer brigar com esses caras porque, entendeu, aí tentaram.
Até hoje tem muita briga aí.
Mesmo assim, a percepção sobre os freqüentadores da Farme é de que são “apelativos” e que
existe um excesso de liberalidade que, inclusive, incomodaria os demais moradores da região.
Mesmo não sendo contra a expressão da homossexualidade, algumas demonstrações de
carinho com “ardor” ainda são um pouco “agressivas”.
Questão 6: O entrevistado não se lembra de qualquer produto ou serviço que tenha começado
ou parado de consumir por influência do grupo. Mesmo assim as pessoas fazem em coisas em
comum que as tornam mais conectadas umas com as outras. Como, por exemplo, freqüentar
um determinado bar ou restaurante. De qualquer forma os gostos individuais permanecem, a
opção por músicas ou comidas, são um exemplo.
Sobre a propagação de modas ou estilos no grupo:
Eu acho que... Não sei... Eu, por exemplo, eu não segui essa moda de óculos
grandes, mas eu vejo muita gente seguindo. A minha mulher mesmo. Volta e
meia ela pega um óculos pra experimentar um óculos maior e tal. E: ‘ah,
esse ficou legal’. É maior. Então eu acho que tem. Tem uma influência sim,
sem dúvida. Mas acho que o grosso assim é mais incomum. E pequenas
coisas que exercem influência.
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Item fundamental para o grupo é a prancha de surfe. Além disso, produtos
importantes são a cadeira e a barraca de praia.
O grupo não chega a ser freqüentador assíduo de eventos na praia, embora já tenha
ido a alguns. O estilo de evento que mais atrai a tribo é aquele que não tem muito apelo na
mídia de forma a não atrair uma quantidade de pessoas muito grande. Eventos que significam
muita confusão de pessoas afastam o grupo.
4.2.11 Entrevistado 11: André (Posto 10)
Perfil: 28 anos, administrador de empresas, solteiro, morador de laranjeiras e praticante de
esportes em geral.
Questão 1: O grupo se concentra no posto 10, mais especificamente em frente a Barraca do
Mineiro. Um dos destaques desse local é a concentração de pessoas bonitas, principalmente
mulheres. Quando acontece de o local estar muito cheio o grupo se desloca para um dos lados
procurando maior conforto. O mínimo de espaço necessário é o da cadeira de praia e guardasol.
Os membros do grupo são adeptos de atividades físicas. Muitos freqüentam a
mesma academia. Muitos também moram próximo uns dos outros em Laranjeiras. A faixa
etária gira em torno de vinte a trinta anos.
Sobre os membros que destoam dentre os demais:
Ah, tem uma figura ou outra assim. Tipo, uns caras assim meio favelado. Tá
ligado? Que freqüenta, que gosta de andar com playboy e tudo mais. Tem
sempre uma figura ou outra dessas. O cara fica meio que deslocado né. Não
deslocado, mas ele ressalta. Mas ele tá integrado no grupo. Mas ele, se você
observar, você vê, pô, esse maluco ali. O que que é ali? O que que é?
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O grupo também se reúne em outras ocasiões que não a praia como, por exemplo,
em saídas noturnas e viagens. Mesmo assim alguns membros se encontram apenas na praia.
Os integrantes mais antigos já se conhecem a bastante tempo, em torno de sete ou oito anos.
Sobre o que faz a ligação desse núcleo mais antigo com o restante da tribo:
Eu acho que, na medida que você começa a freqüentar o lugar com repetidas
vezes, você acaba criando afinidades e conhecendo as pessoas, né. É
impossível você chegar num... Pô, até num mercado. Você acaba
conhecendo os caixas. Você, sei lá, no botequim, você conhece o cara que
serve a tua cerveja. E os freqüentadores também né. Se você não for uma
pessoa totalmente introvertida, né, você consegue se relacionar.
Além disso, existem sentimentos de descontração e de que o momento na praia é bom que
fazem a ligação do grupo ainda mais forte.
Em termos de diferenças entre os membros, as profissões são as que mais se
destacam. Existem desde professores de educação física até pedagogos, passando por
administradores. Mas reafirma: “Ou seja, a galera tem outras vidas que não aquela ali né, mas
pô, por algum motivo converge naquela praia.”. No mais, o grupo é bastante homogêneo em
suas práticas e hábitos, “até o jeito de falar é meio parecido.”.
Diferenças no comportamento de homens e mulheres do grupo: “Pô,
comportamental... Cara, é que eu também não fico prestando muita atenção. Mas acho muito
que o homem quase o tempo todo tá falando de mulher e acho que a mulher tá o tempo todo
falando de homem.”.
O entrevistado possui outros grupos fora da praia, como da academia ou do
trabalho, por exemplo. Com esses grupos os encontros acontecem em ambientes diferentes à
praia, mesmo que haja alguma sobreposição do grupo da academia, pois alguns freqüentam
também a praia. Além desses, o entrevistado já foi também há muitos anos freqüentador do
posto 9, mas seus interesses foram mudando com a idade de forma que passou a optar pelo
posto 10.
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Questão 2: Sobre a questão estética das mulheres:
Eu acho que as mulheres são, pô, se cuidam legal. Acho que mulher tem
mais preocupação. Com o que bebe. Pô. E proteção com a pele. Cabelo.
Esses negócios assim. As mulheres são mais cuidadas. Você vê mulher
chegar na praia com o cabelo assim cuidadão e tal, não sei quê. Maior
preocupação em não molhar direito. Em não molhar o cabelo todo.
Já os homens são bem mais “largados”. Apesar de também se preocuparem com corpo e
freqüentarem academia, não são tão detalhistas quanto às mulheres.
Uma descrição física do grupo:
Pô, a grande maioria, nego tá bronzeada né. Visual de homem, aquele nego
malhado assim. Forte. Mulher, saradinha. Algumas mulheres tipo cavalonas,
mas a maioria assim, com o corpo arrumado né. E cuidadas também né.
Galera meio que moda praia assim. Tipo, surfware, de Osklen da vida.
Questão 3: O grupo chega na praia entre dez e onze horas da manhã, essa chegada pode variar
em função do programa da noite anterior. Quando estão muito cansados, chegam um pouco
mais tarde. De maneira geral, em torno de meio dia já estão todos. A saída ocorre por volta
das seis horas da tarde. É comum saírem juntos para almoçar. Todavia, quando o sol começa a
abaixar, as pessoas começam a se retirar, principalmente aqueles que têm outros programas. O
grupo vai à praia semanalmente aos sábados e domingo e de sol. Mesmo que o sol não esteja
forte, mas, no mínimo, “um mormaço que você sinta que vai dar uma queimada”. Caso
contrário, preferem não ir.
As pessoas costumam se falar antes de irem para a praia embora essa comunicação
não tenha um caráter de agendamento. Ou seja, apenas se ligam para avisar que estão indo,
“geralmente é tudo de supetão mesmo”. Mesmo que se vá direto, sem falar com ninguém, ao
chegar à praia é certo que se encontrará com alguém do grupo.
Sobre o que fazem juntos na praia:
109
É bate-papo. Pô, ficar de bobeira mesmo. Tomando sol. Eu não jogo
futevôlei, mas tem uma galera que joga o futevôlei. Tem uma galera que
pega... Pô, Ipanema eu caio de pranchão, então não dá pra surfar de pranchão
em Ipanema. Aí dá pra pegar um jacaré né. Quando o mar tá bom né. Dar um
mergulhinho. Dar uma nadadinha.
Nas conversas os temas preferidos são amenidades. O que não quer dizer que,
eventualmente, não se discutam temas relacionados a trabalho, por exemplo. Mas como ali é
um momento de lazer, a preferência realmente recai sobre os assuntos de menor seriedade:
“Até porque, imagina, se você tá a semana toda trabalhando. Você não vai chegar no final de
semana pra ficar batendo papo de trabalho na praia, né?”.
A atitude de conversar sobre temas muitos sérios e fora de contexto pode,
inclusive, estigmatizar uma pessoa:
O cara tava falando... Pô, falando. Acho que ele fazia consultoria ou alguma
coisa de investimento. E falando pro cara e tudo o mais. Aí parecia um
amigo meu, que é neurótico com esse negócio de corretor. O cara não parava
de falar disso. Pô, se ele chegar ali ninguém agüenta aquele papo dele. Só a
galera dele que gosta também.
O grupo está em sempre em mutação com a entrada e saída de novos membros.
Esses movimentos são quase imperceptíveis no dia-a-dia do grupo. Os novos chegam através
de alguém que já faz parte do grupo.
Sobre os procedimentos das mulheres:
A mulher arma a canga. E mulher normalmente assim: fica aquele grupinho
de mulheres juntas no ti-ti-ti. Todas pegando sol juntas. Aí, tipo, uma vira, aí
todas viram. E por aí assim, sabe? Pega sol de frente. Pega sol detrás. Aí
uma vai dar um mergulho, aí vai aquele grupo dar um mergulho.
E dos homens:
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Homem não tem tanto. Tipo assim, pô, vamos dar um mergulho? Não. Vou
daqui a pouco. Aí você não vai ficar se prendendo. Nem eu vou me prender a
você pra, tipo, dar um mergulho. A não ser que eu vá falar assim, pô, eu vou
embora. Tu vai ficar? Aí depende né. Se você tiver de carona. Se eu tiver de
carona com você.
Questão 4: Sobre as percepções em relação ao grupo:
Eu percebo que, de repente, as mulheres do Dez. O pessoal é um pouco mais
marrento assim sabe. Do que o pessoal que freqüenta os outros cantos da
praia. Acho que, de repente, uma galera mais vaidosa. E tudo o mais. Você
percebe que tem muito cara ali playboyzão mesmo. Que não faz nada pra
ninguém. Que o pai e a mãe bancam geral.
Os sentimentos do entrevistado em relação ao grupo: “Ah, identificação né. Porque
é gente que de uma certa forma funciona como você funciona. Assim, quer dizer, que tem
bastante coisa em comum e isso te dá, vamos dizer, uma sensação de segurança. Tá ligado?
Que você tá andando com gente que pensa como você.”. Mesmo assim, o entrevistado não
acha que o grupo o prende e julga que poderia abandoná-lo sem maiores problemas. Embora
faça uma ressalva de que não gostaria de fazê-lo, pois “... acho que ninguém pode dizer que
pode abrir mão de amizades. De pessoas assim de uma hora pra outra né.”.
Uma pessoa que vê o grupo de fora, provavelmente enxergaria pessoas com o
mesmo gosto, de alguma forma parecidos em termos de atitude e físico. E, dependendo da
idade do observador, que são alienados.
Questão 5: Os vizinhos do grupo são os freqüentadores do Ceaser Park Hotel e do posto 9. No
primeiro, concentram-se os turistas e muitas prostitutas. No segundo “... a galera mais nova
que, pô, muito maconheiro também...”.
Com relação à Farme de Amoedo: “A Farme é reduto de homossexual né. Assim,
assumido. Sabido. É um ponto da praia que se você chegar lá porque você, no mínimo, é
simpatizante da causa né.”.
111
Questão 6: No que tange aos hábitos de consumo, em certa época o grupo passou a freqüentar
uma determinada festa por influência de um dos membros que era um dos DJs do evento. O
entrevistado, especificamente, passou a freqüentar um restaurante japonês “muito maneiro”
também por influência dos amigos do grupo.
Essa influência nos hábitos de consumo de uns sobre os outros é normal:
Tipo, estilo de sunga. Geral gosta da sunga da Blue Man. Pra mim é a
melhor sunga que tem. Não é só nome, porque a sunga que dura legal. Veste
bem. Então meio que via de regra, todo mundo usa sunga da Blue Man.
Acho que aí tem uma certa influência aí. . De bermuda também. As
bermudas da Osklen são muito maneiras, mas você vai numa Star Point da
vida, você também tem várias bermudas, essas marcas surfware. Que de uma
certa forma influencia. De repente se eu chegar com uma bermuda muito
maneira, tu vai olhar aquela bermuda e falar: ‘pô, essa bermuda é irada.
Comprou ela onde?’.
Sobre a identificação que o consumo gera: “Cria uma certa identificação. Tanto
pra quem meio que lançou a moda e que vai se sentir meio bam-bam-bam do negócio, né,
quanto pros outros que tão também acompanhando uma tendência.”.
Em termos gerais, os produtos mais consumidos durante a permanência na praia
são: o mate de tonel e biscoito de polvilho. Item fundamental é a barraca de praia e o protetor
solar pois o sol está “nocivo”.
4.2.12 Entrevistado 12: Luis (Posto 10)
Perfil: 23 anos, analista técnico de um banco, solteiro e morador do Jardim Botânico.
Questão 1: O grupo se concentra em frente a Rua Garcia D’Ávila, que fica em frente ao posto
10 ou, um pouco mais para a direita, no Country Clube. O principal motivo para essa
112
preferência se dá por conta do “clima” do posto 10 que, ao contrário de outros lugares, é mais
“bacana”.
Uma descrição sobre o ambiente do posto 10:
A Garcia é um clima muito mais família do que o Posto 9. Ali, quem vai no
Posto 10, ali é muito mais quem mora por perto ou que mora em Ipanema.
Porque o Posto 10, até diametralmente é um ponto mais longe da favela mais
próxima. No Posto 9 tem as favelas do canto de Ipanema e o Leblon tem o
Vidigal. Então é a que menos é freqüentada. Menos é freqüentada porque,
sei lá... E acho que na Garcia sempre foi... Lá na Garcia os pais, os pais de
quem vai no Posto 10, ainda vão no Posto 10. Então é um outro clima muito
diferente do pessoal do Posto 9. E na Garcia também tem uma outra coisa
especial que a praia, numa quarta-feira, ela tá vazia. Tá mais ou menos vazia
num dia de sol. As pessoas sentam afastadas umas das outras. No Posto 9
parece que todo mundo gosto de se apinhar. Fica um em cima do outro. Isso
me incomoda.
Já em frente ao Country, o público muda um pouco dando lugar a “galera”. Mesmo assim o
ambiente seria muito similar ao da Garcia.
Os integrantes do grupo moram todos pela Zona Sul. Nem todos em Ipanema ou
Leblon, mas todos relativamente perto da praia. As idades variam entre dezoito e trinta anos.
Todos trabalham e freqüentam assiduamente a praia para jogar vôlei ou apenas estar com o
grupo.
Um dos integrantes do grupo se destaca dos demais porque ele é o “porteiro da
praia”. Ou seja, está sempre lá. Apesar de trabalhar bastante, a freqüência dessa pessoa na
praia ultrapassa muito a dos outros, e chega a chamar atenção por isso. Além disso, é comum
ele ficar enviando mensagens por telefone celular chamando os demais para irem a praia com
ele. Somado a isso o seu carisma, o resultado é que tosos gostam dele e ele, por sua vez,
“conhece todo mundo”.
Esse grupo não se restringe apenas à praia. Durante a semana os membros também
se encontram para outras atividades, principalmente para desempenhar algum esporte. Sobre a
história do grupo:
113
Esse grupo surgiu principalmente por causa do vôlei de praia, que todo
mundo surgia... Uma galera que nem joga, mas que ficava todo mundo ali
em volta da rede e ficou amigo de amigo. E eu tenho uns que eu conheço
assim há uns dez anos. E tão sempre ali. Tem outros que eu sempre via, que
tavam ali, não conhecia, aí depois comecei a conhecer. Começaram a ficar
amigos. E hoje, na verdade, eles são, como, acho que a praia sempre foi a
constância na minha vida, porque, sei lá, você entra no colégio, você entra na
faculdade, você entra no mestrado. Passei por vários núcleos, mas a praia foi
sempre um lugar que eu sempre freqüentei. Mudei de trabalho. Então esses
são amigos que vieram acompanhando. Eles gradualmente têm sido cada vez
mais presentes.
Em linhas gerais ainda é o vôlei que faz a ligação do grupo.
Uma característica que diferencia essa tribo das demais é a sua heterogeneidade.
Pois, apesar de todos serem moradores da zona sul, seus trabalhos, formação e religião
diferem bastante.
Sobre as mulheres em relação aos homens:
É... porque todos os homens, todas as mulheres jogam vôlei. As mulheres
são... Ah, elas são mais cuidadosas. Elas são mais, sei lá, elas ficam mais...
Elas são muito mais associativas do que os homens. Normalmente são elas
que unem todo mundo. Elas vão costurando... Elas foram costurando todos
os grupos. Todas as pessoas que freqüentavam a praia desde cedo, ficaram
amigos dela ou da outra. E ela, sei lá, a Camila, a Tati, elas juntaram os
grupos, entendeu? Elas fizeram a costura.
No contexto do grupo, uma pessoa “in” é aquela adepta de práticas esportivas.
Caso contrário, não se adaptaria bem ao estilo do grupo.
Questão 2: Sobre a questão estética:
114
Todo mundo é feio lá. Todo mundo é feio. Homem, mulher. Todo mundo é
feio. Não tem ninguém assim que chame a atenção de ninguém. Todo mundo
é esportista, mas ninguém tem o corpo sarado porque o vôlei não precisa que
você tenha o corpo sarado. É, sei lá, é esporte. É mais natural. Porque eu
acho que a galera... Acho que ninguém malha lá. Poucos malham, mas
malham mais por lazer assim. Também não tem nenhum obeso porque todo
mundo joga vôlei. Então tem o corpo mais ou menos, sabe? Só que acho que
quem malha mais, sem dúvida, sou eu.
Já no Country, que o grupo também freqüenta normalmente: “Country é diferente
nesse sentido. Porque o Country é a galera que malha mais. É uma galera que tá mais
preocupada com o corpo. Não tá mais preocupada com o esporte.”.
Questão 3: O grupo freqüenta a praia entre as dez horas da manhã e as quatro da tarde. Isso
acontece “absolutamente todo final de semana de sol”, principalmente aos sábados. Quando
está nublado o grupo também costuma marcar presença, pois o vôlei não depende de sol. Mas,
nesse caso, nem todos comparecem.
Todos costumam chegar no mesmo horário. Até porque é prática trocarem
mensagens avisando que já estão se dirigindo para a praia. A saída também acontece dessa
forma, todos juntos, embora não sigam para o mesmo destino. Em relação às mensagens
confirmando presença, além de servirem para avisar aos demais, também funcionam como
incentivo nos dias em que se está “mais ou menos”. Mesmo nos casos onde nenhuma
comunicação é feita existe a certeza de sempre se encontrar com alguém do grupo.
Além do vôlei, que é a atividade mais importante para o grupo, também costumam
jogar frescobol e altinha. Por se tratarem de pessoas mais ligadas em atividades físicas, as
conversas são de certa forma, limitadas: “Tem um ‘trololó’ de vez em quando, mas nada
assim... Fica ali todo mundo caído, mas já esperando pra jogar a próxima partida.”. Quando
essa conversa acontece, geralmente é sobre algum assunto com mais “substância”, tipo
trabalho, por exemplo.
Sobre a entrada de novos membros:
115
Entra. É engraçado. Entra. Tem entrado bastante gente nova porque são os
novos freqüentadores da praia. Ou a galera que vai ficando mais velha, vai
entrando no grupo assim. Ou, sei lá, é um grupo que incha. Fica sempre
amigo de um por causa do vôlei. Aí, fica amigo de um. Joga um vôlei na
partida, continua ali jogando.
Sair do grupo também é comum, principalmente por motivos de viagem. Por isso, não é raro
pessoas que voltam a fazer parte da tribo depois de um tempo fora. Nos casos onde o membro
não for um freqüentador muito assíduo, “Você não vai fazer muita diferença.”.
Sobre os rituais do grupo:
A galera chega. Monta a rede. Arma. Toda a galera fica sentada e frente à
barraca do Pelé. Porque o Pelé sempre é uma galera... O Pelé, acho que não
falei, mas o Pelé é quem uniu uma galera. Todo mundo conhece o Pelé
também porque ele tá sempre ali. É todo mundo amigo do Pelé de qualquer
jeito. Inclusive o Pelé, ele cobra pelos serviços dele pra todo mundo que
freqüenta a praia em volta dele. Mas pra gente não. Ele sempre montou a
rede de graça. Ele sempre quis que a gente freqüentasse a praia. Então ele
sempre tava ali incentivando. E aí a gente chega sempre. Chega. Monta as
cangas, as barracas. Mas tudo isso mais em cima. Mais perto da quadra.
Questão 4: Sobre os sentimentos em relação ao grupo:
Segurança. Eles estão sempre ali. Tá ligado? Sempre. Quando tá na praia. É
engraçado porque eles são fora do resto da minha vida. Então, sei lá, isso é
engraçado. Você parou pra pensar, mas eu sei que eu vou sair... Meu
trabalho tá uma bosta. Sei lá, tô com problema na família, mas eu vou chegar
na praia e não tem nada a ver com o resto da minha vida, mas eles vão tá
sempre, sabe?
De qualquer forma, sente que poderia abandonar a tribo se assim o quisesse. Embora isso não
esteja nos planos, devido ao forte laço que os une.
Uma percepção sobre o grupo é a de que não há discussão. “É uma galera que tá
sempre ali de gargalhada. De palhaçada. Nunca tem discussão.”.
116
Questão 5: Sobre os freqüentadores da Farme de Amoedo:
Quem vai à praia na Farme, hoje em dia, são os gringos, que leram em
algum lugar. Porque você vai em todo lugar do mundo sempre tem uma
praia, que a praia é gay. Então eles leram lá no guia deles e viram que a
praia... E quem tá atrás de gringos. Que são, sei lá, que são os garotos de
programa. Que são o tipo que é mais assumido. E é, acho que hoje o Rio de
Janeiro, acho que os gays do Rio de Janeiro, eles tentam se desviar disso,
sabe? De serem assumidos. Porque todo mundo passa ali na Vieira Souto.
Então ninguém quer... Então eu acho que é mais por aí.
E sobre os vizinhos do posto 9:
...eu já fui à praia às vezes no Posto 9. Realmente, ali é um lugar diferente.
Porque, quando você perguntou da conversa fiada, né? Normalmente você
vê no Posto 9, eles: ah, não tão fazendo nada, eles acendem um ‘back’,
começam a fumar e é o tipo. Porque os meus amigos do colégio... Que isso,
quase nunca acontece ali no Posto 10. Ali na Garcia e tudo mais. Quase
nunca. Por isso que eu achei que a conversa é com mais substância, porque
isso é uma parada, é uma coisa que me marca, sabe?
São pessoas mais alternativas que vão desde os “sarados” até os atores, passando pelos gays.
Esses teriam optado por abandonar a Farme que virou lugar de “gringos”.
Questão 6: O entrevistado não lembra de ter sido influenciado pelo grupo no que tange ao
consumo de bens e / ou serviços. Inclusive acredita serem os seus hábitos de consumo um
fator de diferença em relação aos demais membros do grupo. Como exemplo cita, viagens e
restaurantes que tem por hábito, e os demais não.
Todavia julga que já influenciou algumas pessoas e que elas fazem isso
mutuamente: “Eu influenciei e outras pessoas receberam certas influências. Por exemplo: de
boate. De lugares de sair a noite. De lojas de roupas pra comprar. Isso eu tenho certeza. É
isso.”.
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Esse tipo de influência conecta mais o grupo, pois trata-se da “opinião de alguém
que o outro leva em consideração”.Assim, “esse cruzamento deixa mais sólido o
relacionamento”.
Itens indispensáveis para o grupo são a bola a rede de vôlei.
Sobre os eventos que o grupo costuma ir na praia: “A gente vai a jogos de vôlei. A
eventos esportivos que tenha na praia. É isso que vai e um showzinho mais MPB. Nada de
música eletrônica. Mas é uma coisa mais MPB.”. Porém a quantidade de pessoas no evento é
um fator de restrição, “não é duzentas mil pessoas na praia”.
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5 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
O presente capítulo tem por objetivo apresentar a análise e interpretação das
informações colhidas, das observações participantes e entrevistas em profundidade, durante o
trabalho de campo.
5.1 OS GRUPOS
Essa primeira seção tem por objetivo analisar as principais características,
comportamentos, procedimentos e sentimentos dos grupos analisados. O que se objetiva é
chegar a uma fotografia de como esses grupos vivem e se integram. Os principais aspectos
observados foram agrupados nos seguintes itens: Aqui e Agora, Sentimentos, Interesses em
Comum, A Praia como Valor de Ligação e Rotinas.
5.1.1 Aqui e Agora: amenidades e descontração
Quando questionados especificamente sobre o “momento praia”, os entrevistados
pareciam atribuir de maneira espontânea um papel importante ao grupo da praia e a deram
respostas do tipo “gostam de estar ali umas com as outras”. Foram sempre colocações simples
e que ressaltavam em geral a importância do grupo “estar junto”.
Em alguns depoimentos é possível notar um horizonte de tempo bastante limitado que
não ultrapassa o dia anterior e fica focado no “hoje”, no “aqui e agora”, e sequer faz menção
ao “amanhã”. Eles parecem ter noção de que suas conversas são uma “válvula de escape” e se
restringem a “amenidades” e acham que assim deve ser e continuar no seu momento praia:
119
É um momento de descontração. Tem que falar de amenidades. Ah! Tudo
quanto é tipo de besteira. Qualquer coisa que não seja nada sério, eu acho. É
um momento de descontração. (SÍLVIA, POSTO 9)
É, eu acho que conversar sobre amenidades é uma válvula de escape. É uma
coisa de aproveitar o final de semana pra dar uma desligada realmente da
semana e do trabalho, das responsabilidades, das contas, e de como ganhar
mais dinheiro, etc. (FABIO, POSTO 9)
Quando há algum desvio dos temas descontraídos eles parecem se policiar para
retornar às “amenidades”, como expresso nesse depoimento:
Volta e meia cria-se um tema polêmico... mas normalmente a gente fala
pouco sobre coisa séria, mas depois desvia para festinha, que saiu, o que
vamos fazer hoje a noite, fulano fez isso... (SÍLVIA, POSTO 9)
Às vezes esse policiamento pode chegar a beirar a hostilidade:
O cara tava falando... Acho que ele fazia consultoria ou alguma coisa de
investimento. E falando pro cara e tudo o mais. Aí parecia um amigo meu,
que é neurótico com esse negócio de corretor. O cara não parava de falar
disso. Se ele chegar ali ninguém agüenta aquele papo dele. Só a galera dele
que gosta também. (ANDRÉ, POSTO 10)
Apenas um entrevistado fez uma ligação entre o momento “aqui e agora” da praia e o
futuro. Qual o significado de futuro? Preocupação. Qual o significado do momento “aqui e
agora”? Curtir o dia de praia com o grupo.
Cara, é um grupo que busca curtir a praia. Eu acho que busca afirmação um
no outro, entendeu? Eu acho que no fundo, cara, deve bater alguma
preocupação quanto a futuro nas pessoas né. Eu não consigo imaginar a
pessoa que não tem essa preocupação. Não tem uma preocupação. Nenhuma.
Entendeu? A galera quer curtir o dia. Curtir e querem se auto-afirmar. Você
vê e os caras querem contar o que os caras fazem. (LEONARDO, POSTO
9)
120
5.1.2 Sentimentos
Que sentimentos despertam os grupos de praia? O primeiro parece ser a “amizade” que
está na origem dos grupos com diferentes variações: amigos “da faculdade”, “de infância”,
“do trabalho”, “vizinhos”, “amigo do amigo” e “amigos da praia”.
Se a amizade é a origem, outros sentimentos parecem se seguir a partir dela: a
segurança emocional de saber que o grupo “tá sempre ali” ou a segurança física na difícil
cidade do Rio de Janeiro, cheia de roubos e assaltos, de “poder deixar tuas coisas e jogar um
frescobol”.
Além disso, a amizade também faria com que o grupo se reunisse em outras situações
que não a praia. Como bem sintetiza essa entrevistada:
São minhas amigas no trabalho, são minhas amigas na praia, são minhas
amigas fora, são minhas vizinhas. (ANA, POSTO 9)
Outros sentimentos parecem associar-se à dimensão da segurança: o “conforto” de “ser
eu mesmo” de não precisar ter “qualquer meias palavras”, de “falar tudo o que eu quiser” ou
“pensar”, a “cumplicidade” de viver o momento junto com o grupo e o sentimento de “apoio”,
pois “quando tem um cabisbaixo e tem um que tá mais feliz, e aí ele se segura ali”.
Separar sentimentos parece difícil. Portanto, o sentimento de ter “identificações”,
“hobbies” ou muitos interesses “em comum” também sugerem segurança aos grupos como
ilustram os depoimentos abaixo:
Eu acho que é assim: são as particularidades né, as identificações que as
pessoas têm umas com as outras. Quer dizer, você faz coisas iguais, acho
que isso aproxima. Você ter vamos dizer, hobbies em comum. Ou então
características ou qualidades em comum. (LEANDRO, POSTO 10)
121
Ah, identificação né. Porque é gente que de uma certa forma funciona como
você funciona. Assim, quer dizer, que tem bastante coisa em comum e isso
te dá, vamos dizer, uma sensação de segurança. Que você tá andando com
gente que pensa como você. (ANDRÉ, POSTO 10)
5.1.3 Interesses em Comum
Quais seriam os principais interesses em comum dos grupos de praia? Os
freqüentadores dos Postos 9 e 10 de Ipanema lembram em seus depoimentos de muitos
interesses semelhantes.
Uma certa homogeneidade sócio-demográfica observada nos grupos como nível
social, grau de escolaridade e idade parecem influenciar os comportamentos, gostos e
programas semelhantes. Como lembra Clara, Posto 10, eles têm “uma vida muito parecida”
até fora da praia.
O relato que segue fala, no entanto, de “modismos” e de certa efemeridade (BROWN,
1993; FIRAT, 1995; HARVEY, 2000) que parecem ser motivadores da construção de
interesses e comportamentos:
É homogêneo. É pessoal que gosta de pegar onda. Gosta de sair na noite.
Aqueles lugares mais badalos e tal. Aquele meio tipo de moda. De modinha
né. E eu gosto de tomar cuidado com o corpo. Eu gosto de futevôlei. É bem
aquele estilo do Nove ali de, entendeu? É o que tá na moda. Mesmo da
altinha. Começa a altinha. Neguinho tá jogando a altinha. É aquela coisa.
Não sei. Nasce ali no Nove. O negócio nasce ali no Nove. Então...
(LEONARDO, POSTO 9)
A “cerveja”, as “conversas”, a “leitura”, “pegar sol” e as atividades esportivas,
como surfe, frescobol, futevôlei e altinha também constroem nos grupos interesses comuns de
muitos membros, o que é lembrado pelo relato abaixo:
122
Esse grupo surgiu principalmente por causa do vôlei de praia, que todo
mundo surgia... Uma galera que nem joga, mas que ficava todo mundo ali
em volta da rede e ficou amigo de amigo... Passei por vários núcleos, mas a
praia foi sempre um lugar que eu sempre freqüentei. Mudei de trabalho.
Então esses são amigos que vieram acompanhando. Eles gradualmente têm
sido cada vez mais presentes. (LUIS, POSTO 10)
Alguns entrevistados relacionam a aparência física das pessoas com os interesses em
comum das mesmas, como se fosse possível identificar determinado padrão de interesse
apenas olhando para a aparência dos membros do grupo. Como lembra Ana, Posto 9, “os
sarados, os bombados, andam com as bombadas”.
A própria maneira de se vestir na praia, “riponga” ou “arrumadinha”, distinguiria
grupos com diferentes interesses. Como exemplifica essa declaração:
Se tem o povo das Ciências Sociais assim, eu diria. O povo do mundo
acadêmico. É mais pra uma linha riponga. O povo dos advogados é mais pra
uma linha mais arrumadinha. Patricinha. (GUSTAVO, POSTO 9)
Mas é a praia o local que reúne todos esses “interesses comuns”. Os entrevistados
falam da “cultura de praia”, do “amor à praia” e de vários sentimentos que nutrem pela praia.
Apenas um dos entrevistados declarou que não se considera amigo das pessoas do seu grupo,
mas sim que possui com elas uma afinidade em termos do “usufruir a praia”, no momento
“aqui e agora”.
5.1.4 A Praia como Valor de Ligação
Quando perguntados sobre diferenças dentro do grupo e fora do grupo de praia ou
sobre diferenças percebidas em relação aos grupos vizinhos de praia (Postos 9 ou 10), são
relatados apenas detalhes que parecem não ter muita importância, pois estão no lugar onde
predominam “amenidades”. Os relatos indicam que as possíveis diversidades de formações e
123
profissões parecem não ter muita importância. Da mesma forma, eles não parecem se
preocupar com a vida fora da praia quando estão na praia. Se “um está mais preocupado e
outro menos”, “se um é mais complicado e o outro pode cair o mundo que está rindo” e “se
um é mais desencalhado e outro mais travado”, essas não parecem ser grandes diferenças
quando se está na praia.
Diferenças podem estar em fumar ou não maconha, gostar ou não de bronzeado, ter o
corpo mais ou menos “sarado”, ser gay ou heterossexual. Reconhecendo, por exemplo, que as
mulheres são mais responsáveis pela presença, união e pelos cuidados com o grupo.
Mesmo reconhecendo o papel feminino de reunir o grupo, a possível superficialidade
desses encontros pode ser indicativa de uma certa “independência” ou de falta de lealdade em
relação aos grupos de praia que aparece nos discursos dos entrevistados. A efemeridade
(BROWN, 1993; FIRAT, 1995; HARVEY, 2000) desses grupos parece não ser diferente da
efemeridade dos grupos que estão fora da praia (academias de ginástica, vizinhos, trabalho e
faculdade). O grupo da praia é mais um dentre os vários grupos a que pertencem os
entrevistados (BAUMAN, 2005).
Alguns relatos sugerem, inclusive, que eles podem pertencer e transitar por mais de
um grupo no mesmo local de praia. Aqui cabe destacar que não se tratam de freqüentadores
do Posto 9 que vão ao Posto 10, ou vive-versa. Mas sim a possibilidade de trafegar por vários
subgrupos que freqüentam o mesmo posto. Como relata um entrevistado:
Às vezes mudo de grupo. Às vezes eu vou só a praia e aí encontro umas
pessoas, e depois encontro outras. E vou pra lá, vou pra cá. Não tem mesmo
um grupo certo nessa praia... É porque enfim: tem gente que é do grupo da
faculdade... Tem gente mais da noite, que já é aí, enfim, um outro grupo.
Tem amigos, sei lá, de infância. Gente que eu conheci por outros amigos e é
um outro grupo. (GUSTAVO, POSTO 9)
Cabe ressaltar que transitar por subgrupos diferentes pode ocasionar problemas de
adaptação: “... mas aí a gente dança conforme a música também”. Isso seria um “preço” a ser
124
pago, pois, conforme esse mesmo entrevistado, algumas pessoas não possuem tal habilidade e
poderiam acabar ocasionando situações constrangedoras ao tentar “conversar” ou “transitar”
por outros grupos.
A praia apareceu indiretamente nas colocações dos entrevistados como o local de
encontro e valor de ligação (COVA; COVA, 2001b). Espontaneamente, apenas um
entrevistado mencionou a praia como principal fator de ligação de grupo. Ao afirmar que “se
não fosse pela praia, não existiria o grupo”, que a união do grupo estaria relacionada
principalmente com “usufruir a praia”, e que talvez não fizesse sentido o grupo existir em
“outras situações” fora da praia.
Independência em relação ao grupo? Sair do grupo não parece ser comum. Foram
relatadas algumas situações onde alguém sai, mas volta ao grupo. Nesses casos, fatores
conjunturais teriam sido responsáveis por essa ausência temporária como, por exemplo, um
novo namoro. Apenas mudanças “mais bruscas” na vida da pessoa como, por exemplo,
casamentos e mudanças de cidade, ou mesmo de país, podem levar ao abandono do grupo na
visão dos entrevistados.
A declaração abaixo sugere que sair do grupo pode não ser algo tão simples:
Então, eu não quero deixar não. Quero não. Eu gosto. E como eu tenho
assim outra galera, eu fico super dividida quando tem duas coisas pra fazer.
Só que uma é de um grupo e outra coisa com outro grupo, fico: ‘Ai meu
Deus! Agora o quê que eu faço? (SÍLVIA, POSTO 9)
5.1.5 Rotinas dos Grupos
Os grupos pesquisados parecem reforçar em seus depoimentos a existência de rotinas
bem definidas. Naturalmente que cada grupo, especificamente, possui a sua dinâmica interna
própria.
125
Como é a chegada deles na praia? O horário relatado tanto no Posto 9 quanto no Posto
10 está sempre ao redor do meio dia. Eles não costumam chegar juntos e nem costumam
combinar antes a ida à praia. Alguns relatam que fazem telefonemas antes para informar sobre
o deslocamento para a praia, mas esclarecem que respostas como “não vou à praia hoje” não
interferem na decisão de ir já que sabem que outros estarão no ponto de encontro.
Uma vez na praia alguns relatam a pressa em alugar cadeiras de praia e barracas de sol
que ajudam a demarcar o território do grupo que chega a ser chamado de “fortezinho”
aludindo a um forte de combate onde não entra o inimigo ou estranho. Segue-se a rotina de
conversas, esportes, cerveja e outros, como ilustra o depoimento abaixo:
Ficar bem organizado. Então as mulherezinhas colocam canga. Entendeu?
Fica tipo um clubinho, vamos dizer assim. Homem pega quatro cadeiras. A
mulher mete três cangas. Aí ficam os satélites por ali. Acho que o ritual é
que é armar um ‘fortezinho’. No dia-a-dia ali, metade toma cerveja, metade
não toma. Também é um pouquinho diferenciado né. Mas tem o ritualzinho
da cerveja também. Volta e meia um ou outro dá uma relaxadinha (fumar
maconha) ali. Entendeu? Uma galera dá uma relaxadinha ali. Eu não sou
usuário não, mas não tenho preconceito de nada. (ALEXANDRE, POSTO 9)
Como é a rotina do calor na praia? Entrevistados relatam os procedimentos para lidar
com o forte calor do Rio de Janeiro, principalmente durante os meses de verão: molhar o
corpo nos chuveiros ou no mar e procurar a sombra de uma barraca.
Como é a rotina da sede e da fome na praia? A sede e a fome podem ser enganadas
com mate, cerveja, biscoitos e sanduíches ou podem determinar a saída do grupo da praia. Se
os entrevistados disseram que chegam separados, declararam que costumam sair juntos, por
volta das 18 horas, ou “quando o sol se foi”. Saem juntos para bares e restaurantes.
126
Ah chega na praia, fica lá um pouco. Pega um sol. E aí tá calor, dá um
mergulho. Aí depois no meio da tarde já começa a comer alguma coisa. Um
mate, um biscoito pra segurar. Aí no final do dia cada um paga... Sai junto
né. Paga as suas coisas que tem que pagar na barraca que a gente conhece,
sei lá, ao cara. E vai pra um barzinho, um boteco, almoçar todo mundo junto.
(BRUNA, POSTO 10)
5.2 POR QUE PERTENCER A IPANEMA?
Uma das primeiras questões que surgem quando se começa analisar especificamente
sobre o ponto de vista da praia de Ipanema é o porquê da predileção por essa praia. A origem
da escolha da praia de Ipanema, que aparece nos discursos dos entrevistados, está na história
de vida quando, desde cedo, são levados à praia pela família ou, principalmente, nas relações
de amizade: “influência de amigos”, “para encontrar as pessoas” ou “os amigos”, para “aquela
coisa do social”, pois “se encontra com todo mundo lá”. E “afinal sem a praia não teria o
grupo”.
A história e os amigos parecem trazer o sentimento de pertencer àquele lugar. Um dos
entrevistados, por exemplo, declarou freqüentar o mesmo local há tantos anos que acabou se
tornando amigo do barraqueiro local, que passou a delimitar o espaço do seu grupo na praia
antes mesmo que eles cheguem.
O primeiro espaço a ser delimitado, no entanto, parece não ser a praia em si mas sim a
Zona Sul do Rio de Janeiro. É bem verdade que apenas alguns entrevistados moram no bairro
de Ipanema, porém os demais não estão muito longe, haja vista que se espalham pelos outros
bairros das redondezas como Laranjeiras, Botafogo, Gávea, Lagoa, Jardim Botânico e
Humaitá.
Existe um estilo zona sul de ser? Se existe, os entrevistados do Posto 9 e do Posto 10
estariam dentro desse estilo zona sul. Este estudo pretendeu analisar inicialmente as
semelhanças e diferenças entre esses dois grupos de freqüentadores da praia de Ipanema. No
127
entanto os grupos dos Postos 9 e 10 não parecem ser “tribos” tão fechadas. Em outras
palavras, os grupos que freqüentam esses postos parecem se subdividir em grupos ainda
menores e com valores de ligação mais fortes.
Por que tantas semelhança e tão poucas diferenças entre os grupos do Posto 9 e do
Posto 10? Em princípio, um dos pontos de diferenciação estaria relacionado à “abertura”
proclamada por integrantes do Posto 9:
Eu acho que as pessoas são realmente mais, mais libertas. No nove, do que
nos outros lugares em geral. Mais abertos mesmo para ouvir, pra entender,
pra escutar, pra falar. (MARCOS, POSTO 9)
No entanto, tal “abertura” não parece acontecer assim. Uma análise mais geral dos
relatos dos entrevistados sugere que “os outros”, “os estranhos”, “os forasteiros” podem
incomodar a ambos os grupos. Nesse contexto, o falado espaço democrático das praias do Rio
de Janeiro parece não existir. O grupo do Posto 10 parece assumir mais esse estranhamento,
ou rejeição, enquanto o grupo do Posto 9 insiste em um discurso “mais aberto” e “menos
preconceituoso”:
Ah, tem uma figura ou outra assim. Tipo, uns caras meio favelado. Ta
ligado? Que freqüenta, que gosta de andar com playboy e tudo mais. Tem
sempre uma ou outra figura dessas. O cara fica meio que deslocado né.
(LEANDRO, POSTO 10)
Acho que no posto 10 tem muita gente que é preconceituosa mesmo de não
se misturar com outro. (BRUNA, POSTO 10)
Porque o posto 10, até diametralmente é um ponto mais longe da favela mais
próxima. No posto 9 tem as favelas do canto de Ipanema e o Leblon tem o
Vidigal. (LUIS, POSTO 10)
Como evitar “os outros”? Alguns entrevistados buscam justificativas talvez menos
preconceituosas e mais racionais para se deslocaram na areia em busca de um espaço mais
128
“privado” e de “mais conforto” para o grupo. Dizem que precisam “ficar mais à vontade” e
que querem “evitar confusão”, pois a areia “fica muito cheia de gente”.
Mas também vão assumindo que características de personalidade também vão
delimitar o grupo: pessoas com “boa conversa”, “simpáticas” e “com estilo”. Que estilo?
Estilo carioca, zona sul, Posto 9 ou Posto 10. Mas será que existe mesmo um estilo Posto 9 ou
Posto 10? Os relatos abaixo sugerem que a diferença de estilos desses dois grupos aparece
quando os entrevistados falam sobre a estética e o consumo.
Eu não vou encontrar ‘Barbies’. Eu não vou encontrar ‘Pitboys’. Eu não vou
encontrar ‘Patricinhas’. Assim, acho que ta bom. (GUSTAVO, POSTO 9)
Não vou dizer cara, meus amigos têm muito estilo sabe? Tipo, tudo isso que
a gente tá falando, não tem... Tudo isso que estou falando eu sei, não adianta
comparar meu amigos à galera do Dez, do Onze, sei lá da onde, tipo, eu acho
que meus amigos tiram muita onda em relação. Eu vou me vestir simples
mas vou tá muito mais bem vestido do que aquele cara que comprou a roupa
lá na Osklen, que é igual aquele do ladinho, que é igual aquele tarará, é
igual. Eles pô, são... (MARCOS, POSTO 9)
Que no nove tem as ‘ripongas’ que são... Então esses aí são nossos cohabitantes. Na verdade eles chegaram primeiro né. A gente limitou os nossos
co-habitantes. No meu grupo não tem ninguém desse ‘riponga pesado’.
(SÍLVIA, POSTO 9)
Acho que a aparência, esse modo de se vestir, acaba sendo um pouco
limitada, por mais que você conheça uma mulher de cabelo roxo, pode
ser super legal, mas ela não vai entrar lá. Os interesses são outros.
(SÍLVIA, POSTO 9)
5.3 SELETIVIDADE
No que tange ao sentimento de rejeição a pessoas de fora do grupo, os “forasteiros”,
pode-se dizer que o mesmo parece ser forte quando os relatos são analisados. Quem são os
“estranhos”? Quem são as pessoas que de alguma forma não deveriam estar ali?
129
Os entrevistados acabam expressando esse sentimento de rejeição através de
explicações sobre os deslocamentos na areia. Ou seja, ir mudando de lugar na areia para
preservar o grupo ou evitar proximidade de estranhos. A motivação para a rejeição seria a de
se “evitar a confusão” causada pelo grande número de “novos freqüentadores”. Outra
expressão muito utilizada para justificar essa estratégia de deslocamento é o “conforto”, pois
os grupos evitam os “forasteiros” em nome de se “sentirem mais a vontade”, haja vista que os
últimos vêm sempre em grande número, conforme declarações. Será? A questão da
quantidade de estranhos parecer ser um subterfúgio para justificar a não aceitação dos de fora.
Existem indícios de que mesmo se fossem à praia em pequeno número, os “forasteiros”
seriam rejeitados da mesma forma.
“Forasteiros” e “vizinhos” de praia podem estar sujeitos ao mesmo crivo. Os
requisitos exigidos pelos grupos para estar dentro deles variam. Vão desde “simpatia” e “boa
conversa” à “estilo” e “gostar de esporte”, por exemplo. De maneira geral giram em torno de
questões comportamentais e estéticas, embora Sílvia, Posto 9, explique de “de boca fechada”
são bem parecidos e Marcos, Posto 9, tenha assumido que seu grupo “é bem fechado”.
As gírias do carioca mais ou menos são as mesmas. Mas é o jeito de se
vestir, é o jeito de falar. Então assim, de repente quando você olha, fala:
hummmm... Mas quando você conversa começa a ver o que o cara faz, aí eu
vejo esses meninos estão muito... Aí gostam de pegar onda, gosta de se
enfiar no mato, faz escalada, faz não sei o quê, dá um ‘doiszinho’, entendeu?
Então é a diferença do... O Dez não. O Dez é beber uísque, pegar mulher,
Prelude (boate), não sei o quê. É diferente. Mas se você olhar os dois assim,
de boca fechada, você não diz. (SÍLVIA, POSTO 9)
Bem pesado. Tipo assim: demorou. O nosso grupo, ele demorou bastante pra
ele ter um pouco mais de abertura. Mas normalmente ele é bem fechado.
Esse grupo que eu falo, é o que eu, pô, viajo no Reveillon há dez anos.
Sacou? Barrado que eu digo, não é ser barrado. Simplesmente não tem a
mesma afinidade. Sacou? Não tem o mesmo grau de afinidade. É isso.
(MARCOS, POSTO 9)
130
Os relatos sugerem que o “filtro” entre grupos está na questão estética. Isso pode ser
notado, pois, mesmo se não perguntados especificamente sobre isso, muitos entrevistados
mencionam esse aspecto. Como uma das entrevistadas que diz acreditar que a estética é sim
um fator importante e que une o grupo, em sua opinião, qualquer grupo.
5.4 ACEITAÇÃO E INFLUÊNCIA
Como ter a aceitação do grupo? As diferentes atividades na praia e os aspectos
relativos à estética aparecem como importantes para a inclusão ou exclusão do grupo. Os
relatos abaixo exemplificam os movimentos para pertencer ao grupo: “saber jogar uma
altinha”, “ter uma rede de vôlei”, “parecer descolado no seu jeito de ser ou vestir” ou ainda
fazer um esforço para parecer o que não é, mas que a pessoa julgue que o grupo valoriza:
O cara não sabe jogar um futebol, não sabe jogar uma altinha, mas como a
galera joga futevôlei e tá na onda o futevôlei, então o cara começa a entrar
na altinha mesmo, sem saber. Fica querendo jogar. Aí pega a bola. Fica
querendo jogar pra aprender, pra poder tá participando, entendeu, daquele
negócio. Jogar altinha ali na beira da praia. Eu jogo altinha porque eu gosto,
mas dizer que... (LEONARDO, POSTO 9)
Eu tenho uma rede ali no posto 9, entendeu?’ Isso aí é, pro cara, é um
status... Pro cara é o máximo isso aí. (LEONARDO, POSTO 9)
A verdade nua e crua, eu também me incluo um pouco nessa verdade, que às
vezes, não é querer passar uma coisa que não é, Não é isso. É muito... Querer
passar uma coisa que não é. Também tem aqueles ‘cabloquinhos’ da
trancinha. Acho ‘too much’. Mas às vezes eu sinto umas pessoas que se
forçam um pouco a ser descoladas demais assim. Você fala assim: calma. Eu
sei que você não é assim. Não precisa mostrar pra mim e pro universo que
você é assim, porque eu sei que você não é. Às vezes parece... Às vezes
mostra que é mais descolado do que realmente é. (SÍLVIA, POTO 9)
Situações como essas sugerem que o grupo pode passar a ser então uma imagem
criada por uma busca coletiva, ou seja, uma imagem que os membros fazem de si mesmos. O
131
que está de acordo com alguns autores no que diz respeito à identificação estética de tribos
pós-modernas (COVA, 1997; COVA; COVA, 2001a; MAFFESOLI, 2005).
Quando perguntados sobre as influências do grupo, os entrevistados, em geral, não
descreviam atitudes, comportamentos ou consumos que tivessem influência do grupo.
Todavia, a observação participante sugere que existem comportamentos e produtos que unem
os grupos, tais como a preferência por óculos de sol grandes, as tatuagens, sentar-se em grupo,
fumar maconha, entre outros. Os depoimentos abaixo reforçam esses aspectos levantados
durante a observação participante:
Tá todo mundo comendo? Vou comer também! Aí você vai, com certeza.
(ANA, POSTO 9)
Mas todo mundo se veste mais ou menos igual. Têm umas diferenças bem
sutis, mas não vejo muita diferença. Todo mundo tem o mesmo estilo.
(SÍLVIA, POSTO 9)
5.5 ESTÉTICA E PREOCUPAÇÃO COM O CORPO
Maffesoli (2000) define, em linhas gerais, que a estética é a capacidade comum de
sentir e experimentar. Sendo assim, a questão da aparência física é apenas uma das variáveis
que podem compor a estética de um grupo. Mesmo assim, poucas foram as menções que não
fizeram referência à estética do corpo e de seus adornos.
Um primeiro ponto que aparece nas declarações é a questão do estereótipo, dos
grupos. Enquanto no Posto 9 as descrições do grupo giram mais em torno do
“comportamento”, no Posto 10 a preocupação com a aparência surge com mais força nos
testemunhos, como exemplificado abaixo:
132
Quem é o cara ‘in’ do posto 9? Pega a figura do posto 9. É o cara que joga
altinha. Curte vôlei. É o cara que pega onda. É o cara que sai na ‘night’.
Conhece todo mundo na ‘night’. Pô, o cara que fuma um baseado.
(LEONARDO, POSTO 9)
Eu diria que são pessoas que freqüentam a academia, são pessoas que muitos
gostam de esporte. Estão preocupados com a aparência. Acho que isso
dentro do grupo todo mundo tem essa preocupação com a aparência. Pode
ser que faça mais ou menos coisa por isso, mas tem essa preocupação. Mas o
Dez é muito aquela é... Pessoas com corpos malhados, bonitas, jovens,
enfim, que desfilam. (CLARA, POSTO 10)
Será que os freqüentadores do Posto 9 fogem do estereótipo do “culto ao corpo”? A
preocupação com a aparência e o corpo também parecem estar presentes no momento praia do
Posto 9:
Corpo. Não é saúde. É corpo. É tá com aquele corpo bem ali. Pra você
chegar... Você até brinca. Tem gente ali que dois meses antes do Verão,
entra na academia. Começa a malhar, aí toma bomba né e tal. Aí cresce. Fica
com o corpo sarado. E aí tá pronto pra vir pra praia. Vai pra praia e tal.
Passou. E aí... lá é o Carnaval. Aí o cara, meu irmão, o cara veio “murcha”, e
aí dois meses antes do Verão seguinte, o cara já tá lá na academia e tal.
(LEONARDO, POSTO 9)
Alguns relatos tentam também separar a beleza “normal” da beleza construída nas academias
de forma crítica:
Cara, eu acho que são pessoas bonitas, mas na realidade são as pessoas
bonitas, digo como, bonitas normais. Não são as bonitas de academia.
Sacou? (MARCOS, POSTO 9)
Mas como o Posto 9 vê o Posto 10? São “fúteis”, de “vida fácil” e “só se preocupam
com a aparência”. Além disso, se julgam mais “evoluídos” em relação aos freqüentadores do
Dez, pois trata-se de uma “galera plástica e bombada”, “patricinhas” e “mauricinhos”. E
como o Posto 10 vê o Posto 9? São pessoas mais “alternativas”, “ripongas” e “maconheiros”.
Um lugar com grande diversidade de “estilos” e onde as pessoas são mais “largadas”.
133
Cabe destacar a percepção comum de que quando o assunto é a aparência, as mulheres
merecem lugar de destaque como ilustra o depoimento abaixo:
Eu acho que as mulheres se cuidam legal. Acho que mulher tem mais
preocupação. Com o que bebe. E com a proteção com a pele. Cabelo. Esses
negócios assim. As mulheres são mais cuidadas. Você vê mulher chegar na
praia com o cabelo assim cuidadão. Maior preocupação em não molhar
direito. Em não molhar o cabelo todo. (ANDRÉ, POSTO 10)
Ainda sobre a questão da preocupação com a aparência, um aspecto relaciona-se à
questão do “estar ou não na moda”. Muitas foram as menções, de ambos os postos, sobre a
preocupação das pessoas estarem sempre usando roupas e acessórios da moda. Todavia,
Leonardo, Posto 9, parece ter que “sair” do grupo para descrevê-lo e admitir a importância de
marcas e lojas.
Eu acho que me visto na praia com um estilo... Acho que ali no Posto 9 em
geral, só sabe só do meu grupo. Vou sair um pouco do meu grupo e falar do
que eu vejo do Posto 9 em geral. É a galera. Essa moda Osklen, que nem a
Limits. Essa roupa meio de, entendeu, que você se sente bem né. Não é
aquela roupinha mais arrumadinha. (LEONARDO, POSTO 9)
5.6 CONSUMO
Foram identificados dois grupos de produtos consumidos pelos entrevistados: aqueles
relacionados à praia, cujo consumo e utilização se dão exclusivamente nesse âmbito, e os não
diretamente relacionados à praia. Entrevistados dos Postos 9 e 10 demonstraram uma postura
similar frente a ambos os grupos de produtos.
No caso dos produtos associados à estética, no entanto, parece emergir uma diferença
sobre a “rejeição” dos freqüentadores do Nove não só quanto à preocupação com a aparência,
mas também quanto a determinados bens relativos à ela. Talvez o sentimento de rejeição ao
134
“culto ao corpo” do Posto 10 tenha sido uma reação mecânica, ou uma reação associada à
tentativa de ir contra padrões estéticos dominantes nos freqüentadores do Posto 10.
Começando a análise de produtos associados à estética, pode-se perceber que os
mesmos parecem servir de parâmetro para “selecionar” pessoas que tenham ou não o perfil do
grupo, como nesse depoimento:
... aparecer de maiô pra dar uma de doida assim... quando vejo umas pessoas
com aqueles biquínis grandes, sabe, porque geralmente a galera não usa
muito... Pô, aquelas sungas são muito pequenas. Fininhas do lado ou coisa
assim. Seria bem falho. (ANA, POSTO 9)
Os principais produtos que foram mencionados pelos entrevistados são: roupas em
geral, principalmente saia e bermuda, bolsa, chinelo, chapéu, biquíni, cordão, pulseira e
óculos escuros. Surgiu também a questão do “estilo” associado a itens de consumo. O que é o
“estilo” do grupo? Os depoimentos que seguem sugerem a dificuldade de associar o estilo a
uma loja ou as roupas às lojas. Uma loja pode atender a vários estilos ou a loja tem que ter o
seu estilo “alternativo”? O estilo “alternativo” está fora da vitrine ou ele está na loja que todo
mundo compra? Segundo os relatos abaixo, lojas podem oferecer opções diferenciadas para
estilos diferentes:
É a mesma loja, mas se vir aquele estilo é mais alternativo. É o que compra.
A mercadoria que você leva pra casa. É a roupa, aquele determinado tipo de
roupa e não aonde. (SÍLVIA, POSTO 9)
Todo mundo ali, acaba que no fundo, no fundo, todo mundo é um pouco
vitrine de loja. Pode até dizer estilo alternativo. É estilo alternativo, mas vai
comprar nas lojinhas que todo mundo compra. (SÍLVIA, POSTO 9)
Estilo alternativo a quê? Alguns depoimentos fazem referência inclusive ao nome de
lojas e marcas da moda e até aos preços altos associados a elas, o que sugere que o “estilo
alternativo” pode estar associado à moda e não seria uma atitude que a ela se opõem.
135
Caracterizando assim um tipo de consumo mais preocupado com o “presente”, com o “agora”
com o “momento” (COVA, 1997; COVA; COVA, 2001a). O relato abaixo ilustra a
associação entre o consumo, a moda e o momento:
O cara tá trabalhando na loja, tá tirando mil reais. O cara tá felizão. Com os
mil reais dele ele consegue ir pra noite. Entendeu? Ele consegue comprar
uma roupinha bonita. Aí, fala: “comprei a calça na Osklen por duzentos e
trinta”; a namorada fala que ganhou um presente do namorado de tanto. O
cara mora com os pais. Os mil reais dele é no bolso dele pra ele gastar. Então
ele compra a roupa da moda da Osklen. Paga trezentos reais numa bermuda.
Chega na praia com a bermuda e tirando onda. (LEONARDO, POSTO 9)
136
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Seriam os grupos dos Postos 9 e 10 compostos por subgrupos menores? No início da
pesquisa esperava-se encontrar mais homogeneidade dentro dos grupos e ao mesmo tempo
mais heterogeneidade entre eles. As entrevistas, no entanto, tanto do grupo do Posto 9 quanto
do grupo do Posto 10, mostraram grupos de jovens com pensamentos, opiniões,
comportamentos e consumo muito semelhantes. Encontrou-se muita homogeneidade e poucas
diferenciações.
Seriam os discursos analisados reveladores de características pós-modernas tais como
a efemeridade, o foco no momento presente, a identidade e o reforço ao grupo (BROWN,
1993; HARVEY, 2000; BAUMAN, 2003, 2005; MAFFESOLI, 2005)? Poderiam esses dois
grupos ser considerados tribos pós-modernas (COVA; COVA, 2001a)?
Alguns achados podem ser ligados aos conceitos da pós-modernidade (BROWN,
1993; HARVEY, 2000; BAUMAN, 2003, 2005; MAFFESOLI, 2005) e descrição sobre o
tribalismo pós-moderno (COVA, 1997; COVA; COVA, 2001a, 2001b). O primeiro deles se
refere ao conceito de identidade (BAUMAN, 2005). Os entrevistados parecem mudar de
identidade dependendo do momento e do grupo com quem estão, e possuem outras tribos. De
forma mais geral, isso pode ser notado em informações relativas às profissões como
advogados e farmacêuticos, por exemplo, que parecem se transformar no grupo da praia
quando adaptam suas identidades ao momento para pertencer ao grupo.
Em termos de sentimentos, o que mais se destacou foi o fato de haver a busca por
segurança (BAUMAN, 2003), com o possível custo de perda de liberdade. Apesar de os
discursos indicarem um esforço para demonstrar uma liberdade em relação aos grupos, eles
sugerem que a busca por segurança, conforto e pertencimento parecem mais fortes do que a
liberdade. Observa-se um “ajuste” da estética e do comportamento para uma convivência
contínua e harmônica com o grupo, e não a “liberdade” de sair do grupo como indicaram
137
alguns relatos. Principalmente do grupo do Posto 9, de tradição libertária e eclética, que
sugerem não só que eles não parecem tão “libertos” e nem abertos à diversidade, e também
que não são tão inclusivos quanto a entrada de novos membros.
A característica pós-moderna do abandono do político, ou do projeto de futuro
(MAFFESOLI, 2005), está presente em diferentes relatos. Não parece haver naquele
“momento praia”, de lazer e descontração, interesse e espaço para questões mais sérias ou
acerca do futuro. As conversas são sobre o “aqui e agora”.
Em termos de valores de ligação (COVA; COVA, 2001b), a praia aparece com
destaque não só como um valor de ligação, mas também como um amor compartilhado pelos
freqüentadores. O que mais liga os grupos de praia? A estética da aparência do corpo e seus
adornos. Mesmo que os entrevistados do Posto 9 tenham tentado minimizar a importância da
estética e que os entrevistados do Posto 10 tenham assumido com mais naturalidade sua
importância para o seu vaidoso grupo, os relatos sugerem a estética como um forte valor de
ligação (COVA; COVA, 2001b) e, consequentemente, os itens de consumo associados a ela
como importantes para o pertencimento (BAUMAN, 2003, 2005).
Marketing tribal (COVA; COVA, 2001a)? Estilos criados pelos grupos que seguem
marcas ou lojas? Existem algumas indicações na análise dos relatos que permitem inferências
sobre a importância de práticas e produtos na formação da identidade dos grupos (COVA,
1997), ou de marcas que despertam sentimentos e promovem a ligação (COVA; COVA,
2001b) no momento praia.
Deveria o marketing de tribos (COVA; COVA, 2201a), prestar mais atenção aos
sentimentos do que à demografia? De acordo com Cova (1997) as tribos pós-modernas
compartilham emoções, sub-cultura e visão de vida, dessa forma a ligação pode ser mais
importante do que produto em si. Essa parece ser também a impressão extraída a partir dos
relatos.
138
Nesse ponto, deve-se remeter ao conceito de marketing tribal (COVA; COVA, 2001a),
pois aqui a questão da moda não parece se referir ao que o resto da sociedade como um todo
adota, mas sim a um estilo criado por terceiros, que não as tribos, para representar o jeito do
carioca na praia. Assim, muitas marcas e lojas foram recorrentemente mencionadas como de
preferência de ambas as tribos, fornecendo indícios dessa nova aplicação do marketing.
Tais produtos são comprados muito mais pelo que representam no contexto das tribos
do que pelas suas funcionalidades em si, ajudando os membros a formarem suas “identidades
de praia”, conforme prevê a teoria (COVA, 1997). Nesse caso, conforme Firat e Shultz (1997)
propuseram, o marketing dessas marcas se foca muito mais nos sentimentos compartilhados
pelos grupos do que na demografia, buscando reforçar o valor de ligação (COVA; COVA,
2001b) estético tão presente nas tribos pesquisadas, que encontram nesses produtos o caminho
para serem reconhecidos dentro e fora de seus agrupamentos. Dessa forma, o marketing passa
a atuar como um vetor de agregação dessas pessoas (COVA, 1996) na medida em que através
da comunicação das suas marcas define esse “estilo de praia”.
Outro ponto que se pode notar é que, no âmbito do consumo na praia, onde não
haveria indícios de motivações outras que não a necessidade aliada à disponibilidade do
produto, dois produtos conseguem se destacar entre os demais com preferido pelas tribos: o
mate Leão de galão e o biscoito O Globo. Sugerindo que é possível, mesmo em condições de
commoditização, diferenciar os produtos. Além desses, produtos isolados, mas representativos
da história do grupo também se destacam.
O que retoma a conclusão anterior de que o marketing, no contexto das tribos (COVA;
COVA, 2201a), deve direcionar sua atenção para os sentimentos em detrimento da
demografia (FIRAT; SHULTZ, 1997). Conforme Cova (1997) colocou, as tribos pósmodernas compartilham emoções, sub-cultura e visão de vida, dessa forma a ligação é mais
139
importante do que o produto em si. E esse parece ser o caso dos produtos consumidos pelas
tribos dos postos 9 e 10.
No entanto, a pouca diferenciação dos grupos de praia dos Postos 9 e 10 sugere que os
espaços urbanos citados por Maffesoli (2000) como exemplo de tribos urbanas pós-modernas
precisam ser revistos. Ou seja, dentro desses diferentes espaços da praia de Ipanema parecem
conviver não uma “tribo” do Posto 9 e do Posto 10, mas sim várias tribos no Posto 9 e várias
no Posto 10.
Futuras pesquisas acerca do tema poderiam se focar em entender melhor o
relacionamento e a dinâmica interna das tribos dos postos 9 e 10 no que diz respeito a
interação entre os vários subgrupos que as compõem. Dessa forma uma importante
contribuição para a ampliação da teoria de marketing poderia emergir. Além disso, também
poderia ser interessante mais pesquisas exploratórias que buscassem levantar pontos
relacionados a questão da moda praia frente ao estilo requerido pelas tribos, o que abriria
caminho para futuras pesquisas quantitativas com foco no consumo específico de
determinados produtos.
140
ANEXOS
Anexo 1: Roteiro de Observação
OBSERVAÇÃO:
DIA
DIA DA SEMANA
HORA
CLIMA
TEMPO DE OBSERVAÇÃO
PESSOAS:
APARÊNCIA FÍSICA
ROUPAS
PRODUTOS
COMPORTAMENTO
TRIBO:
PROCEDIMENTOS
INTERAÇÕES
PRÁTICAS
LOCALIZAÇÃO
TEMPO / OCASIÃO
TENDÊNCIAS
INSTITUIÇÕES
141
Anexo 2: Roteiro de Entrevista
1. PERFIL:
a. Nome?
b. Idade?
c. Escolaridade?
d. Ocupação?
e. Estado civil?
f. Hobbies?
2. TRIBO (Cova & Cova– 2001):
a. Mora próximo à praia de Ipanema?
b. Quais os seus locais de predileção na praia? Tem algum fixo? Por que?
c. Onde esse local predileto “começa”? Onde ele “termina”? Como você descreve
seus vizinhos de praia? Me explica o porquê.
d. Qual o horário que costuma freqüentar a praia? Com que freqüência vai à
praia?
e. Como você descreve o grupo que freqüenta a praia com você?
f. Todos chegam mais ou menos no mesmo horário?
g. Como é a saída da praia? Vocês saem juntos?
h. Tem alguém diferente no grupo? Alguém que você destacaria? Por que?
i. Costuma marcar com os amigos algum encontro antes de ir à praia? E depois
da praia?
j. O grupo que freqüenta a praia com você mora perto da praia?
k. O grupo pode ser caracterizado apenas como “grupo da praia”?
l. Como você explica a ligação desse grupo? Tem uma história?
m. O que faz a ligação desse grupo?
n. O que vocês fazem juntos na praia?
o. Quais são os assuntos preferidos nas conversas?
p. O que diferencia o seu grupo de outros grupos de praia que você conhece?
q. Falando do seu grupo, que diferenças você vê nos membros?
r.
Diferencie homens e mulheres do grupo.
s. Você tem outros grupos (fora da praia)? Já tentou? Você freqüenta outros
grupos de praia?
142
3. VALORES SUBCULTURAIS COMPARTILHADOS (Kates – 2002):
a. Voltando ao início, porque mesmo essa praia? E esse grupo?
b. O que o seu grupo te dá? Segurança, liberdade? O grupo te prende ou te
amarra?
c. Teria como descrever itens relacionados à aparência das pessoas do seu grupo?
O que identifica o grupo? Diferenciar homens e mulheres.
d. O grupo muda? Sempre? Como é a entrada de alguém novo?
e. Já aconteceu de alguém sair? Por quê? E sair e voltar?
4. COMPORTAMENTO DE CONSUMO EM RELAÇÃO À TRIBO (Cova – 1997):
a. Tem alguma coisa que você passou a consumir / comprar por causa do grupo?
b. Tem alguma coisa que você parou de consumir / comprar por causa do grupo?
c. Em caso afirmativo, você se sente mais conectado ao grupo da praia dessa
forma?
d. Você acha que pode ter modificado alguma coisa que o grupo compra /
consome?
e. Em que você se acha diferente do grupo?
f. Imagine que você está olhando para o seu grupo da praia. O que você está
vendo?
g. Agora imagine que você está olhando para os vizinhos (posto 9, 10 ou Farme).
O que você está vendo?
5. FRONTEIRAS DO CONSUMO (Kates – 2002):
a. No contexto da praia, o que seria para você uma pessoa “in”? O que seria uma
pessoa “out”?
b. Você sabe que grupos, em geral, têm rituais. Quais são os rituais desse seu
grupo de praia? (“A chegada”, “A fome”, “O calor”, “A chuva”, “A saída”, ...).
c. O que não pode faltar para o seu grupo de praia? Homens e mulheres.
d. Seu grupo vai a eventos que acontecem na praia? Quais?
e. Como seria um evento na praia que motivaria o seu grupo a participar?
143
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