ENSINO DE HISTÓRIA E FILOSOFIA DA BIOLOGIA: UMA PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES DE ENSINO MÉDIO. Thais Gimenez da Silva Augusto, Leticia Vieira Basilio, Bruno Mangili de Paula Rodrigues Universidade Estadual Paulista, campus de Jaboticabal, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Departamento de Economia, Administração e Educação. Eixo Temático 2: Formação continuada e desenvolvimento profissional de professores da educação básica. Programa Núcleos de Ensino – Prograd/Unesp. [email protected] 1. Introdução Os documentos curriculares produzidos nas últimas décadas enfatizam a importância da utilização da História e Filosofia da Ciência (HFC) para a construção do conhecimento científico na escola. Esses documentos explicitam a necessidade de que o ensino de Ciências proporcione uma aprendizagem acerca da própria Ciência, seus métodos e sua relação com a sociedade (BRASIL, 1998; BRASIL, 1999; BRASIL, 2002). Segundo esses documentos, a abordagem da História da Ciência no ensino de Ciências visa fornecer ao aluno os meios para que ele possa compreender de que maneira ocorre o desenvolvimento científico; como esse desenvolvimento científico influencia as transformações observadas no âmbito social e como as questões sociais influenciam o desenvolvimento da Ciência. Tem como objetivo mostrar ao aluno que a realidade está em contínua transformação e revelar qual o contexto social (cultura, ideias, economia) do momento em que uma teoria foi construída. Além do exposto, o elo entre Filosofia e História da Ciência pode promover um ensino interdisciplinar, que seja desafiador, articulador e integrador na construção de conhecimento científico pelo educando, já que o desenvolvimento do pensamento científico está intimamente ligado ao contexto no qual foi gerado, como Goulart (2005) discorre, evidenciando que o processo histórico da construção de conceitos revela a lógica da ciência: A ciência não é apenas uma coleção de leis, um catálogo de fatos não relacionados entre si. É uma criação da mente humana, com seus conceitos e ideias livremente inventados. As teorias... tentam fomentar um quadro da realidade e estabelecer sua conexão com o amplo mundo das impressões sensoriais. Assim a única justificativa para as nossas estruturas mentais é de que maneira as nossas teorias formam tais elos (EINSTEIN e INFELD, 1976, p. 235 apud GOULART, 2005, pg. 3-4). Isto permite posicionar o ensino de História e Filosofia da Ciência como um possível caminho para a melhoria do ensino de Ciências auxiliando os extudantes a fazer 2981 conexões entre os conceitos e compreender melhor a trajetória do conhecimento científico até os dias de hoje. Ademais, a utilização da História e Filosofia da Ciência no ensino de Ciências é uma estratégia didática que contribui na construção de competências e habilidades por parte dos educandos. Os livros didáticos costumam mencionar a História da Ciência ou breves biografias de cientistas de forma desarticulada ao ambiente, apenas citando datas e nomes de cientistas de destaque. Essa abordagem pode ser perigosa pois possibilita a redução do fato histórico a uma simples descoberta, em que apenas uma pessoa é a que “postula a verdade”. O cientista é tido como “gênio” e pouco se problematiza sobre a participação de outros pesquisadores e o contexto histórico-social e cultural presente na época. Algumas vezes se faz menção a outros cientistas, mas que geralmente são tratados como oponentes “menos capazes” ou “perdedores” de uma disputa científica, por não serem as teorias desses as que são aceitas atualmente. Ou seja, o que se observa, quando se fala sobre História da Ciência, é a exaltação de um cientista em detrimento do outro (WYKROTA, 1998): A versão histórica corriqueira nos livros didáticos de Biologia, quando existe passa frequentemente pela citação de um breve elenco de eminentes descobridores e pela narrativa da seleção de contribuições que se sucedem cronologicamente até a aceitação da ideia que vigora. Desse modo, ao exaltar a sua eficiência, o faz em detrimento das outras, vencidas, derrotadas, ou socialmente desprestigiada, que permanecem no passado da ciência, mas não são usadas no ensino de ciências (WYKROTA, 1998, p. 17). O uso da História da Ciência no ensino deveria evidenciar que “o saber histórico é produzido coletivamente por um numeroso grupo de especialistas (e não individualmente, pela atuação de alguns poucos cientistas geniais)” (BASTOS, 1998, p. 33). Em síntese, Carneiro e Gastal (2005, p. 38) afirmam que: Apesar do reconhecimento quase consensual sobre a necessidade de abordagem histórica dos conteúdos da Biologia, falta ainda um maior número de estudos que possibilitem uma avaliação sobre se e como essa perspectiva histórica têm sido efetivamente trabalhada em sala de aula, e em que contextos. [...] Não basta afirmar a necessidade de adotar uma perspectiva histórica no ensino de Biologia sem que os instrumentos para que esta proposta seja levada a cabo de maneira satisfatória sejam desenvolvidos. [...] Tal necessidade também implica um esforço concentrado na produção de materiais curriculares que possam fornecer aos professores indicadores a respeito de como trabalhar esta abordagem em suas aulas. Essa breve explanação, demonstra a importância de inserir a História e a Filosofia da Ciência no ensino de Biologia e a necessidade de formar professores para essa tarefa complexa e produzir materiais didáticos que possam auxiliá-los. 2982 2. Objetivo O objetivo do presente trabalhado é descrever e analisar uma proposta de formação continuada em desenvolvimento para professores de Biologia, vinculados à Diretoria de Ensino de Jaboticabal, sobre o Ensino de História e Filosofia da Biologia. 3. Metodologia O presente trabalho é parte do projeto de pesquisa “Ensino de História e Filosofia da Biologia na educação básica”. O referido projeto teve início com uma pesquisa do tipo estado da arte que mapeou 71 trabalhos dentro do escopo do ensino de Ciências sobre a História e a Filosofia da Biologia. Através dessa pesquisa foi possível obter as teses e dissertações sobre essa temática na íntegra e elas foram utilizadas como referencial teórico para a elaboração de sequências didáticas para o ensino fundamental e médio e para uma proposta de formação continuada para professores de Biologia. As sequências didáticas produzidas a partir das dissertações e teses tiveram como tema “O que é vida?”, “A história da pesquisa médica sobre doenças infecciosas” e “História das ideias sobre evolução biológica”. Essas sequências foram ministradas a alunos da educação básica e aprimoradas pelo grupo de pesquisa, que compreende uma docente universitária e três graduandos do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas. Após estabelecimento de parceria com a Diretoria Regional de Ensino em Jaboticabal para o desenvolvimento de uma série de encontros de formação continuada para professores de Biologia, ficou definido que o tema do primeiro encontro seria “A história da pesquisa médica sobre doenças infecciosas”. Assim, o primeiro passo para a preparação desse encontro de formação foi analisar o Material de Apoio do Currículo do Estado de São Paulo, que é amplamente utilizado pelos professores, para avaliar o que ele traz sobre História e Filosofia da Biologia. O segundo passo consistiu na elaboração de um questionário para coletar as concepções dos professores participantes do encontro sobre a HFB e sua importância no ensino. Elaborou-se um questionário inspirado na tese de Scoaris (2007), que desenvolveu um instrumento para a avaliação de concepções docentes sobre o ensino de HFC. O questionário foi adaptado às necessidades da presente pesquisa e respondido por 24 docentes de Biologia da rede pública estadual, vinculados à Diretoria de Ensino de Jaboticabal. 2983 O instrumento tem como base a escala Likert em que são feitas afirmações sobre as quais o respondente deve assinalar se concorda plenamente, concorda, não concorda nem discorda, discorda, discorda plenamente ou não sabe. O questionário compreende 35 assertivas sobre três temáticas: natureza da Ciência, importância da HFC no ensino e a formação dos professores em HFC. As respostas dos professores foram tabuladas e analisadas. No início do primeiro encontro de formação, os professores responderam a esse questionário e, ao final, foi distribuído um novo questionário, elaborado pela Professora Coordenadora da Oficina Pedagógica da Diretoria Regional de Ensino, para que os docentes avaliassem o encontro. O encontro foi filmado para posterior transcrição e análise das interações realizadas. Assim, esta pesquisa caracteriza-se como qualitativa, pois diferentemente da quantitativa, não busca representatividade numérica em seus resultados, tem o seu foco mais nos processos que no seu produto. Além disso, na pesquisa qualitativa prevalece o método descritivo, tendo em sua maioria dados como entrevistas, fotografias, depoimentos, estudos de caso, entre outros. Ao analisar, o pesquisador qualitativo deve respeitar integralmente a forma com que os dados encontram-se e a perspectiva dos participantes (Bogdan & Biklen, 1994, p.47). 4. Desenvolvimento Análise da presença da História e Filosofia da Biologia no Material de Apoio do Currículo do Estado de São Paulo O primeiro passo dos integrantes do projeto foi analisar a presença de conteúdos de História e Filosofia da Biologia no Material de Apoio do Currículo do Estado de São Paulo e a forma de abordagem dessa temática. A escolha desse material para a análise justifica-se uma vez que os cadernos do professor e do aluno vinculados ao Currículo do Estado de São Paulo são o material didático oficial da rede pública estadual de ensino. Esses cadernos são amplamente distribuídos em todas as escolas estaduais de ensino fundamental e médio. Assim, foi feita uma análise documental do “Caderno do Professor” do primeiro, segundo e terceiro ano do ensino médio, da disciplina de Biologia. O Caderno do Aluno traz o mesmo conteúdo do Caderno do Professor, mas é menos completo, ou seja, traz 2984 apenas textos e atividdes, enquanto o Caderno do Professor traz também as orientações didáticas para o docente. Os seis volumes foram lidos na íntegra pelos autores do presente trabalho, os quais buscaram identificar a forma de abordagem dos conteúdos relacionados à História e Filosofia da Biologia. Os resultados da análise mostraram que há vinte e nove menções à História e Filosofia da Biologia no material e um capítulo inteiro dedicado ao tema. Esse capítulo trata da História do desenvolvimento das vacinas e traz questões reflexivas e analíticas, voltadas a diferenciação entre fato e hipótese e exercícios de elaboração de hipóteses e de experimentos (Situação de Aprendizagem 6- História da Vacinação, p. 55-70, 1º. ano do ensino médio, volume 2). Figura 1. A camponesa destemida Nos outros volumes, a abordagem geralmente é feita através de quadros de texto que ilustram trechos pontuais da História da Biologia. Mesmo quando os textos são mais longos e detalhados, eles contam a história do desenvolvimento científico de uma teoria de forma linear, sem problematização ou questionamentos posteriores que levem a reflexão sobre a natureza da Ciência e o fazer científico. Geralmente, há questionários sobre o conteúdo abordado nos quadros, mas as questões estão relacionados ao conteúdo biológico em si e não a História ou Filosofia da Biologia. As exceções a esse padrão são uma atividade que solicita aos alunos a elaboração de um texto sobre o trabalho de Mendel (p.40, 2º. ano do ensino médio, volume 2) e um pequeno texto sobre uma fraude científica em Paleontologia que traz uma questão sobre a natureza da Ciência (p.66, 3º.ano do ensino médio, volume 2). Os conteúdos mais frequentemente 2985 abordados historicamente são Genética, Evolução, Origem da Vida e Paleontologia. A Filosofia da Biologia está menos presente. Figura 3. O homem de Piltdown Concepções de professores de Biologia sobre a natureza da Ciência e a importância do ensino de História e Filosofia da Biologia A primeira atividade do primeiro encontro de formação de professores, foi a aplicação do questionário para coletar as concepções do grupo sobre o ensino de História e Filosofia da Biologia e a formação que tiveram sobre a temática. A primeira categoria possibilitou observar que os professores têm uma visão positivista em relação há alguns aspectos da natureza da Ciência (70%). Entendem ainda que a sociedade e a religião podem influenciar o trabalho dos cientistas e possuem uma visão linear e cumulativa da produção dos conhecimentos científicos, acreditando que os resultados produzidos são patrimônio de toda a humanidade, o que pode ser considerada uma visão ingênua. A segunda categoria demonstra que a maioria dos professores reconhece a importância da HFC no ensino, acreditando que a abordagem da mesma seja insuficiente nos livros didáticos. Em relação a inserção da HFC nos currículos, a maior parte dos professores foi favorável, alguns neutros. As respostas ao terceiro grupo de assertivas mostra que os professores reconhecem a importância da HFC para a sua formação, contudo boa parte deles afirma que conhece apenas aspectos pontuais da HFC. Assim, foi possível perceber que os professores vinculados à Diretoria Regional de Ensino de Jaboticabal não possuem uma percepção totalmente acrítica da Ciência, 2986 estando em processo de construção de uma visão mais realista da natureza da Ciência que poderá ser melhor elaborada a partir do curso de formação continuada proposto. O primeiro encontro de formação continuada O projeto está sendo desenvolvido desde março de 2015 e já é possível descrever alguns resultados. Foram convocados para o primeiro encontro de formação, pela Diretoria Regional de Ensino de Jaboticabal, 25 professores de Biologia, vinculados as escolas estaduais da região. O encontro teve duração de oito horas. Foram desenvolvidas as atividades descritas a seguir. Iniciou-se com a apresentação do projeto, seus objetivos e dos participantes aos professores através de uma conversa informal. Em seguida, os professores responderam ao questionário inicial e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, assentindo com o uso de suas respostas para fins de pesquisa. Passou-se então para uma apresentação em power point destacando a importância da História e Filosofia da Ciência no ensino a partir dos documentos oficiais que abordam as diretrizes para o ensino de Ciências e Biologia e alguns autores renomados que abordaram esse assunto. A terceira atividade da manhã foi a discussão com os professores sobre a Sequência de Aprendizagem do Caderno da rede pública estadual sobre a origem da vacina. Foi perguntado aos professores se eles trabalham essa situação de aprendizagem, de que forma e se os alunos se interessam. Eles responderam que raramente conseguem chegar a esse tema, já que está no final do caderno do primeiro ano. Os que afirmaram que já desenvolveram algumas vezes, relataram que os alunos costumam se entediar com o excesso de textos e questões, consideram a metodologia repetitiva e cansativa para os alunos. Aproveitamos essa atividade para estabelecer a diferença entre fatos e hipóteses, conceito desenvolvido através dessa Situação de Aprendizagem. No período da tarde, passamos a abordar uma sequência didática por nós desenvolvida com base no estudo de teses, que tinha como tema A História da pesquisa médica sobre as doenças infecciosas, focando principalmente nas pesquisas sobre a febre amarela e sobre a febre do parto, em ambas abordando os aspectos históricos e sociais envolvidos. Para o desenvolvimento do tema, utilizamos uma apresentação em 2987 power point, trechos do filme “A Vida de Louis Pasteur”, que trata da febre do parto e um questionário sobre o Diário de Semmelweis, que ilustra as pesquisas do médico sobre a febre do parto. Por último, foi desenvolvida uma atividade lúdica e interativa como forma de avaliação dos conteúdos abordados. A mesma consistiu em um jogo de perguntas e respostas em que os professores foram divididos em dois grupos. Um integrante de cada grupo ficava sobre um tabuleiro confeccionado em EVA e avançava uma casa a cada resposta correta. Ambos os grupos receberam um pequena lousa e giz para anotar a letra correspondente à alternativa que consideravam correta. Após cerca de um minuto, os dois grupos deveriam levantar a lousa mostrando sua resposta. Os professores participantes acertaram todas as perguntas e demonstraram empenho, interesse e motivação em relação a atividade. No final do primeiro encontro de formação, foi aplicado um segundo questionário. Este, por sua vez, fora elaborado pela Diretoria de Ensino, sendo constituído por questões abertas. Esse questionário tinha como objetivo que os professores avaliassem o encontro e dessem sugestões para as próximas formações. Uma análise preliminar dos questionários mostrou que, no geral, os professores gostaram e elogiaram bastante a metodologia utilizada e os recursos didáticos apresentados, principalmente o jogo de tabuleiro. Entre os principais temas sugeridos para os próximos encontros estão: Evolução, Genética e Biologia Celular. Assim, elegemos para o próximo encontro o tema Evolução, pois o grupo já vinha produzindo um material relacionado ao assunto. 5. Discussão dos resultados Os resultados encontrados em relação às concepções de professores sobre a utilização da História e Filosofia da Biologia no ensino vão ao encontro da pesquisa de Duarte (2004) que analisou cinco estudos portugueses a respeito de concepções docentes sobre a inserção da História da Ciência no ensino. Os estudos analisados pela autora foram feitos com professores de Química e Física, contudo chegam a resultados semelhantes aos nossos: [...] dos resultados obtidos parece ser legítimo inferir que, apesar de alguns desses professores valorizarem a História da Ciência no ensino das Ciências, isto não parece ser necessariamente congruente com a utilização da História da Ciência nas suas práticas de ensino. E embora os estudos referidos digam respeito a professores de Ciências FísicoQuímicas, é de se admitir que uma situação semelhante ocorra com professores de outras disciplinas de Ciências (DUARTE, 2004, p. 323). 2988 A autora relata que dada à importância da História da Ciência no ensino, países europeus, especialmente Portugal, fizeram mudanças curriculares a fim de inserir essa temática no ensino de Ciências. Mas ela ressalta que a inserção da História da Ciência nos currículos é insuficiente se não se investir na formação dos docentes para desempenharem tal tarefa. Grande parte das Universidades portuguesas já contempla disciplinas de História e/ou Filosofia da Ciência e em seus currículos, contudo: Enfrentar esses desafios exige considerar estratégias de formação de professores de sentido inovador, seja no âmbito da formação inicial, seja no da formação continuada. Não basta, como poderia parecer numa abordagem simplista, integrar nos currículos/cursos de formação disciplinas de História e/ou Filosofia das Ciências. Tal medida já parece ter sido tomada em muitas universidades portuguesas que formam professores... (DUARTE, 2004, p.324). A autora adverte que embora essas disciplinas sejam importantes, pois para se ensinar História da Ciência é necessário conhecer seus conteúdos, os cursos de formação de professores devem ir além, possibilitando ao docente planejar estratégias de ensino que contemplem a História e Filosofia da Ciência em diferentes contextos, para que ele possa se sentir encorajado a desenvolver essa temática em sua prática pedagógica. Ou seja, mais que apenas ensinar conteúdos de História e Filosofia da Ciência aos docentes é necessários atrelá-los a conhecimentos da Didática e da Prática de Ensino. Assim, embora o curso ministrado invista na participação efetiva dos professores e no diálogo constante com os mesmos e procure convencê-los da importância da utilização da História e Filosofia da Biologia no ensino, apresentar conteúdos de História da Ciência e estratégias de ensino para se trabalhar em sala de aula parece insuficiente. É preciso criar situações para que os próprios docentes desenvolvam tais estratégias e aprofundem seus conhecimentos sobre a temática. Caldeira (2009) ao discutir a necessidade de um tratamento epistemológico dos conceitos das Ciências Biológicas nos cursos de formação de professores ressalta a importância de se “inserir a História da Biologia, bem como a reflexão sobre esse conhecimento”, possibilitar aos docentes “conhecer as inter-relações entre as áreas do conhecimento biológico” e “analisar a produção do conhecimento biológico, por meio de conceitos oriundos da Filosofia da Biologia, permitindo a compreensão dos contextos de produção, justificação e natureza desse conhecimento” (p.77). A autora propõe ainda “aliar os estudos disciplinares a outras formas interdisciplinares de estudo e reflexão” (CALDEIRA, 2009, P.77) no escopo das Ciências Biológicas, já que na maioria das vezes, os cursos de formação inicial costumam ser fragmentados no vários campos da Biologia (Botânica, Zoologia, Biologia Celular, etc) sem que ocorram momentos de aproximações e interações entre esses conhecimentos. 2989 Esse é um desafio que precisamos enfrentar junto aos professores de Biologia em formação, ou seja, construir formas mais integradas de pensar o conhecimento biológico que ainda não estão prontas. O ensino de História e Filosofia da Biologia propicia essas aproximações interdisciplinares não apenas entre os campos da Biologia, mas também com outras disciplinas. Durante o primeiro encontro de formação, percebemos que teria sido ainda mais rico se tivessem sido convidados não apenas professores de Biologia para o encontro, mas também professores de História. A temática desenvolvida (“história da pesquisa sobre doenças infecciosas”) envolve muitos conhecimentos do contexto histórico como o imperialismo, o mercantilismo, as condições de vida da população brasileira no século XIX e início do século XX que favoreciam as epidemias, etc. Ou seja, os professores de história poderiam contribuir substancialmente com o tema e docentes de Biologia e História teriam a oportunidade de construir projetos interdisciplinares sobre a temática em suas escolas. 6. Conclusões Com base na análise feita no Material de Apoio do Currículo do Estado de São Paulo, concluiu-se que embora nem sempre seja tratada da forma desejável, a História e Filosofia da Biologia está bastante presente nesse material, com destaque para a situação de aprendizagem sobre a História das Vacinas. Essa situação de aprendizagem desenvolve uma estratégia de ensino interessante com questões que instigam o aluno a refletir sobre o fazer científico. A avaliação das respostas ao questionário inicial mostrou que os professores de Biologia vinculados à Diretoria Regional de Ensino de Jaboticabal não possuem uma percepção totalmente acrítica da Ciência, estando em processo de construção de uma visão mais realista da natureza da Ciência. Essas concepções docentes poderão ser melhores elaboradas a partir do curso de formação em desenvolvimento. Informam ainda que sua formação inicial contemplou alguns fatos e discussões sobre a História e Filosofia da Ciência. Contudo, diversas pesquisas portuguesas demonstraram que ter algum conhecimento sobre essa temática não garante que os docentes desenvolvam esses conteúdos em sua prática pedagógica. O primeiro encontro de formação continuada abordou a importância do ensino de História e Filosofia da Biologia e a História da pesquisa médica sobre as doenças infecciosas. Na avaliação que os docentes participantes fizeram do encontro, percebe-se que eles julgaram os conteúdos importantes e a metodologia adotada, instigante. Fazendo referências principalmente aos trechos de filme debatidos e ao jogo de tabuleiro. 2990 Para o próximo encontro será desenvolvido um dos temas mais sugeridos pelos professores: a história das ideias sobre evolução biológica. A partir da reflexão sobre esse primeiro encontro de formação à luz da literatura, percebemos que não basta trazer aos docentes conhecimentos sobre História e Filosofia da Biologia e apresentar formas de ensiná-la aos alunos. É necessário criar espaços e tempos para que os próprios professores possam aprofundar seus conhecimentos sobre a História da Ciência e desenvolver estratégias de ensino para ensiná-las aos seus alunos. Oportunizar encontros interdisciplinares, principalmente com docentes de História, pode favorecer a implementação dessa temática de forma inovadora nas escolas. Referências BASTOS, F. 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