1 O NEOLIBERALISMO NO MÉXICO E A EMERGÊNCIA DO

Propaganda
1
O NEOLIBERALISMO NO MÉXICO E A EMERGÊNCIA DO
MOVIMENTO ZAPATISTA.
Priscila da Silva Nascimento1
O movimento zapatista tem origem na constituição do Exército Zapatista de
Libertação Nacional (EZLN), que se inicia com a geração que participava dos movimentos
que marcaram o final da década de 1960. O México estava sob uma forte crise social que
unia setores estudantis e a base da sociedade; as repressões políticas aos envolvidos por
parte do governo provocam uma rearticulação da esquerda do país, que passa a se organizar
em novos partidos, guerrilhas urbanas e movimentos sociais.
Em 1983, início do processo de construção do movimento zapatista, um grupo
composto de cinco homens e uma mulher chega a Chiapas com o intuito de aprender a
viver no ambiente hostil da montanha e realizar treinamento contra o exército mexicano.
Este grupo começa a treinar os jovens indígenas para a defesa de suas comunidades, contra
as ações dos jagunços e dos latifundiários da região.
Com o tempo as comunidades começam a integrar o EZLN. Esta organização
fundamentalmente política e militar se revelou uma propulsora de práticas, formas de
atuação e mecanismos de participação que tem a democracia, como objetivo principal.
O novo movimento zapatista, nome inspirado na tradição de luta zapatista iniciada
por Emiliano Zapata no contexto da Revolução Mexicana em 1910, ganha visibilidade
mundial em 1994, quando realizam um levante político propondo transformações sociais
radicais norteadas pelo contexto mundial atual.
Desde o seu início, o movimento zapatista, demonstrou em suas reflexões e
propostas, pleno domínio e conhecimento dos elementos que exercem influência sob seu
cotidiano e que de alguma maneira limitam ou favorecem a sua busca por avanços na
melhoria das condições de vida dos indígenas mexicanos e reconhecimento das etnias
indígenas nas esferas de direitos políticos, culturais e sociais.
1
Estudante na Universidade Estadual Paulista - Marília-SP. Endereço para contato: Rua Dr Rodrigo Argolo
Ferrão nº 250, Bairro: Morumbi, CEP: 17500-000, Marília – SP. Telefone: 14 34138112.
E-mail: [email protected]
2
Sua capacidade de visualizar o impacto de medidas de caráter macropolítico no
cotidiano das comunidades indígenas, conferiu ao movimento uma amplitude e papel
político importante dentro dos movimentos sociais na atualidade. Segundo Jules Falquet
(2006, p. 212), o movimento zapatista desempenhou um grande papel no desencadeamento
da atual resistência a globalização neoliberal.
Podemos notar que o discurso zapatista trava diálogos com o que considera
emergente em seu tempo, observando que os desdobramentos da globalização no contexto
social estão intimamente ligados a projetos econômicos que são aplicados em escala global,
no caso o neoliberalismo.
A emergência pública do movimento zapatista em 1º de janeiro de 1994, data de
implantação do NAFTA (Tratado do Atlântico Norte), bloco de caráter econômico formado
pelos Estados Unidos, Canadá e México, marcou sua postura de oposição às medidas
neoliberais, que desde a década de 1970 só fizeram agravar a situação de pobreza da já
desumana condição de vida da maioria da população da América Latina.
As idéias neoliberais chegam à América Latina na década de 1970. Exemplifica
Mariani (2007), que o Chile, com o então presidente Pinochet foi o primeiro país, antes
mesmo da pioneira Inglaterra, a implantar o modelo neoliberal,
Cumprindo à risca o modelo neoliberal, caracterizou-se pela:
liberalização da economia, alta taxa de desemprego, repressão sindical,
concentração de renda em favor dos ricos e privatização de bens
públicos. Pinochet foi o responsável por uma das mais cruéis ditaduras
militares da América Latina, mandando perseguir, torturar, prender e
matar os seus opositores, especialmente aqueles ligados ao governo de
Salvador Allende.
A inserção da América Latina na economia mundial sempre se desenvolveu de
forma subordinada, ligada aos padrões de dependência dos centros hegemônicos. Hoje, o
neoliberalismo cumpre um papel enormemente eficaz na manutenção da desigualdade
social, preservação e ampliação do latifúndio e da pobreza, especialmente nos países de
maior expressão econômica e populacional (como o Brasil, a Venezuela, a Argentina e o
México).
3
Historicamente, o liberalismo é proposto em meados do século XVIII com a
doutrina do laissez-faire2 e torna-se dominante nos Estados Unidos e nos países europeus
durante o início do século XIX até o início do século XX quando ocorre a quebra da bolsa
de Nova York em 1929.
Esta doutrina no século XX, a partir de 1929, ganha novos contornos expressos no
chamado neoliberalismo, onde o Estado cumpre funções mínimas administrativas e
intervém na economia. O plano político e econômico se sobrepõem ao social e as
privatizações em massa ganham repercussão, o que na prática tem significado uma gradual
entrega de todos os serviços públicos, inclusive a saúde e a livre concorrência do mercado
capitalista.
Verifica-se uma tendência crescente, Fleury (2002) a um “processo de
mercantilização dos serviços sociais” com a transferência cada vez maior de parcelas dos
serviços públicos, como saúde, educação e previdência social, antes reservados ao setor
público para o setor privado. Entendemos o neoliberalismo como um projeto que, conforme
Fernandez (apud Vizentini; Carrion 1999, p.20), “[...] com sua estratégia de abertura e
conquista de mercados pelo grande capital dos países centrais, utiliza-se da supremacia
política deste para forçar o resto do mundo a desmantelar instrumentos fundamentais de
soberania e proteção nacional”.
O discurso e a visão neoliberal são apresentados como uma forma de organização
social única para a estabilidade e o crescimento econômico dos países latino-americanos,
no entanto, quando posta sob análise revelam ações incapazes de proporcionar, na maioria
dos casos, estabilidade nas taxas de crescimento e redução da pobreza, ao contrário,
colaborou para uma maior concentração de renda na América Latina condicionando, de
forma significativa, as políticas econômicas e sociais dos países latinos.
Segundo Wallerstein (1994, p.121), este sistema econômico foi capaz de fornecer a
linguagem dos debates políticos subseqüentes no interior da economia mundial capitalista
e, na atualidade, como neoliberalismo.
2
Laissez-faire, do francês “deixar fazer”, refere-se a uma ideologia econômica no século XVIII, no período
do Iluminismo, através de Montesquieu, que defendia a existência de mercado livre nas trocas comerciais
internacionais, ao contrário do forte proteccionismo baseado em elevadas tarifas alfandegárias, típicas do
período do mercantilismo. (NUNES, 2007)
4
A presença do discurso neoliberal ganha força em 1970 com uma crise capitalista
mundial, contudo, é ao longo das décadas de 1980 e principalmente nos anos de 1990,
ambas pertencentes a um período de ajuste estrutural, onde o social é o setor em que esses
ajustes se aplicam com mais rigor, que grande parte dos países latino-americanos
experimentam as práticas de políticas liberalizantes em seu cotidiano.
Com regras claras que são impostas por instituições financeiras como o Fundo
Monetário Internacional ou a Organização Mundial do Comércio, cujos discursos se
expressam na postura das elites dos países latinos, assenta-se à premissa de que o mercado
possui a capacidade de se auto-regular e que é dispensável a intervenção do Estado no
quadro econômico.
A baixa ou ausente atuação do Estado para a garantia de direitos sociais, papel que
inclusive consta das constituições nacionais dos países, deslocou as ações de setores de
resistências e lutas, que tomam outras características. A ausência do Estado como um
interlocutor de demandas sociais provocou uma transferência de sua função social histórica
básica, a de administrar serviços públicos de primeira necessidade como hospitais,
habitação e outros para outros setores – o da sociedade civil e o setor empresarial.
Cavalcanti (2001, p.25) explica que,
Trata-se agora, de repartir a responsabilidade no tocante às
“questões sociais” com a sociedade civil e com o setor empresarial.
Admite-se, portanto, que “o Estado, é assim, incapaz de resolver
impasses que se agravam ao longo dos anos e décadas, devendo,
portanto, seu ônus ser dividido com a sociedade como um todo.
Assim, os debates acerca de temas como igualdade de gênero e raça, da eliminação
da pobreza e da geração de emprego têm adquirido grande destaque nas agendas de
organizações não governamentais e nas bandeiras de companhias privadas e organismos
internacionais.
Uma novidade importante do governo neoliberal foi o papel cada vez maior das
ONG’s na prestação de vários tipos de serviço social, distribuição de alimentos, roupas,
demandas de reconhecimento cultural de grupos excluídos, como negros e homossexuais
entre outras que encontram nesta forma de organização uma alternativa ao Estado. No
5
começo dos anos de 1990, havia mais de 4 mil ONGs em atividade na América Latina, uma
questão problematizada pela diretora do Movimento de Solidariedade Ibero-americana
Marivilia Carrasco.
Em 2007, a revista mexicana Siempre publicou uma entrevista sob o título: ONGs
são instrumentos do neoliberalismo, com a diretora, onde a mesma coloca sua visão a partir
da realidade mexicana,
Não é possível desvincular o auge das ONG’s, nos últimos
20anos, das políticas impostas pelos organismos financeiros
internacionais financeiros multilaterais, como o Fundo Monetário
Internacional, a Organização Mundial do Comércio e o Banco Mundial
que consistem na financeirização e na desregulamentação geral da
economia. [...] a deteriorização das condições sociais devido às
políticas econômicas neoliberais, ocorre em paralelo com a
proliferação de ONG’s, que, em realidade, não contribuem para criar
melhores condições de vida para as populações, entre outras razoes,
porque não podem suplantar eficientemente as funções dos Estados
nacionais.
De outro lado, a chamada responsabilidade social das empresas espelha um
momento em que esta economia globalizada toma várias dimensões, não obstante, todas
pautadas na desigualdade. As políticas neoliberais atuam em todo o mundo, porém de
forma contraditória, para os países mais desenvolvidos, a retórica e a prática neoliberal
caminham fundamentalmente, no sentido da privatização de empresas estatais. Nos países
periféricos, além das privatizações, é possível perceber a influência do FMI, por exemplo,
nos pacotes econômicos que dirigem os gastos dos governos e controlam as aplicações
financeiras dos Estados.
As políticas neoliberais de abertura econômica trouxeram e continuam trazendo
implicações sociais graves, tais como: o aumento de desemprego, a falta de incentivo à
pequena e média empresa, miséria e violência. Melluci (1998, p.37) argumenta que, “Neste
momento histórico acumulam-se, assim, as formas tradicionais de exclusão social
(econômica, política e cultural) com novas formas, aquelas relacionadas à distribuição não
eqüitativa de recursos que uma sociedade de informação possui”.
6
As teses que sustentam e defendem a aplicação do neoliberalismo como política
econômica mostraram-se falsas na década de 1990; os países que adotaram as medidas não
tiveram crescimento econômico, ao contrário estão em recessão ou baixo crescimento, o
incentivo à livre concorrência vem desvendando uma série de denuncias de cartéis e lobbies
e o imaginário de que a gerencia privada é superior à pública, vem desmoronando frente
aos resultados negativos das empresas privadas de serviços públicos, são altas tarifas para
serviços extremamente deficitários, conforme se lê em Mariani (2007).
Nota-se, assim, que as soluções econômicas sempre dependem do “macro”,
enquanto que as soluções para o social se restringem ao “micro”. Acrescenta Soares (2002,
p. 2), “Mais do que nunca o ‘local’ tornou-se o espaço para os problemas sociais que
afligem as pessoas, as famílias e as comunidades”.
Ao lado das ofensivas neoliberais há, hoje, sinais de resistência, como os
movimentos indígenas com forte organização e grande capacidade de ação que emergem
em um contexto em que, como salienta Mariani (2007): “O que chama a atenção aqui é que
são, sobretudo, estes setores, - considerados “atrasados” segundo a tradição marxista – que
estão hoje sendo capazes de fazer frente aos governos neoliberais, de resistir a suas
políticas e de tomar a iniciativa”.
Analisaremos a experiência mexicana dentro da lógica neoliberal, uma vez que o
seu desenvolvimento cria as bases para o levante indígena zapatista de 1994.
A situação do México
Com 107 milhões de habitantes, o México é um país importante na América Latina
e que chama atenção pela variedade de atividades econômicas que desenvolve e que com as
medidas neoliberais no país, sofreram em conjunto, recessos econômicos. O México possui
uma das principais reservas de petróleo do mundo, contudo, estas reservas estão
hipotecadas, foram oferecidas como garantia do pagamento da dívida externa do país com
o FMI.
A opção pelo pagamento rigoroso da dívida externa com o FMI e a aplicação de
severas políticas econômicas de ajuste recessivo resultou em um milhão de trabalhadores
7
demitidos em 1995, milhões de famílias empobrecidas e milhares de empresas imersas em
crises.
Políticas de caráter neoliberal são encontradas no México desde a década de 1980,
por exemplo, com o governo de Miguel de la Madri (1982-1988); neste período, as
despesas com o pagamento de juros em 1982 era de 14% e ao final de seu governo subiu
para 55,2% demonstrando um regresso tanto econômico quanto social para o país.
A primeira medida de Madri nesse sentido foi o chamado processo de
“desincorporação” de empresas públicas, com a extinção, fusão, liquidação e venda das
empresas estatais aos empresários nacionais e estrangeiros; no final de seu governo cerca
de 30% delas foram vendidas.
Em 1992, os Estados Unidos propõem ao Canadá e ao México um acordo de livrecomércio, o NAFTA (Tratado de Livre Comércio da América do Norte), o presidente em
gestão, Carlos de Salinas de Gotari do PRI (Partido Revolucionário Institucional), partido
historicamente acusado de corrupção, aceita o convite e começa a empreender mudanças
que precarizaram ainda mais as condições de vida da população mais pobre.
Conforme relata Petras (1995, p.187) no decorrer das negociações do acordo de
livre comércio com o México, os Estados Unidos foram inflexíveis na sua tentativa de
modificar a atual lei mexicana que proíbe investimentos estrangeiros em bancos, ferrovias,
companhias de eletricidade, petróleo etc. Durante o ano de 1990, Salinas começou a tomar
iniciativas destinadas a aumentar o âmbito de investimento estrangeiro no México.
Apresentou um projeto de lei permitindo que 30% da propriedade dos bancos poderiam
estar em mãos estrangeiras. Os estrangeiros receberam permissão de possuir 100% das
empresas de mineração.
O México somou, em 2002, um comércio global de 320 milhões de dólares, uma
cifra 200% superior à registrada em 1992, porém a pobreza é crescente tanto para o setor do
campesinato quanto para o dos centros urbanos.
8
Este tratado permitiu a ampliação de industrias maquiladoras3; após a implantação
do Nafta este modelo de indústria cresceu significativamente, uma vez que, os países foram
desobrigados de cumprir leis de direitos humanos, trabalhistas ou ambientais.
As maquiladoras surgiram em 1965 de um acordo comercial entre a Bacia do Caribe
e Estados Unidos com o intuito de desenvolver economicamente a região. Um dos pontos
do acordo previa que os países membros deveriam importar 75% da matéria prima
necessária nas fábricas dos Estados Unidos; no México estas industrias foram instaladas na
área de fronteira com os Estados Unidos, o que gerou uma forte migração dentro do país
para estas regiões em busca da oferta de empregos e um considerável aumento do número
de favelas nas regiões próximas as maquiladoras. Houve um aumento da miséria de várias
famílias que, ao abandonarem a terra e verem o quadro de trabalhadores das maquiladoras
já suprido, devido à ampla oferta de mão de obra, tornam-se desempregados e sem comida,
esta que antes provinha da terra em que viviam.
As conseqüências das políticas neoliberais têm recaído de forma insistente sobre as
mulheres, são elas as maiores vítimas da desigualdade social. Nas maquiladoras as
precariedades nas condições de trabalho podem ser expressas na opressão de gênero que as
mulheres estão submetidas.
A maioria dos trabalhadores nas maquiladoras são mulheres, cerca de 60%, muitas
estão sujeitas cotidianamente à discriminação moral e sexual por parte dos gestores da
empresas, tal ato é acompanhado de impunidade, pois conforme relata Amaral (2002), o
assédio sexual não é proibido pela constituição mexicana.
Na contratação, as mulheres são submetidas a testes de gravidez, condicionante para
a seu ingresso e, em algumas industrias, as mulheres têm que passar por verificações
mensais em vasos sanitários para provarem que estão menstruadas e, portanto não terão que
parar de produzir futuramente. De acordo com dados de Amaral (2002), 62% das
trabalhadoras das maquiladoras desenvolveram alergias e doenças após terem tido contato
com produtos químicos sem a devida proteção e 76% delas sofrem de dores pulmonares.
3
Maquiladoras são industrias onde processo industrial ou de serviço é destinado à transformação, elaboração
ou reparação de mercadorias vindas de fora do país, importadas temporariamente para sua exportação
posterior.
9
Além das conseqüências para a mulher das políticas neoliberais, o Nafta
reorganizou a economia mexicana alterando diversos pontos da constituição do país. Os
capítulos XI, XIV, XIX e XX do estatuto que rege o Nafta há considerações acerca da
mobilidade do capital e do comércio, o conteúdo de um deles é explicitado por Santos
(2007), no capítulo 11 há a concessão de determinados privilégios aos investidores
estrangeiros que sobrepõem e anulam as legislações nacionais, prevendo inclusive punições
a qualquer tipo de intervenção jurídica ou política nacional que lese a livre ação desses
investidores.
O tratado, ao não levar em consideração os graus diferentes de desenvolvimento
econômico de cada país integrante, fez do México o membro mais lesado do acordo, uma
vez que teve que fazer várias modificações nas suas leis para adequar-se ao Nafta, medidas
que, conforme observamos no capítulo 11, tirou a autonomia do país para planejar pacotes
econômicos que respondessem a sua necessidade.
Outras mudanças, de impacto diretamente no social, também foram adotadas com o
NAFTA. Previa-se mudanças no artigo 3, sobre a educação gratuita, no 123, sobre tutela
social do trabalho, no 4, acerca da saúde, e o principal para compreendermos a emergência
do movimento zapatista, no artigo 27, que regulamenta a propriedade da terra, ligada ao
ejidos.
Os ejidos são uma forma de posse coletiva da terra, criada no processo de reforma
agrária que a elite mexicana viabilizou para conter as pressões dos camponeses após a
tentativa revolucionária de Villa e Zapata. Garantida legalmente pelo artigo 27 da
Constituição mexicana, estas terras protegidas não poderiam ser vendidas, arrendadas ou
hipotecadas; as famílias que saem delas cedem a posse para outros eventuais moradores de
forma que o espaço é sempre utilizado pelas comunidades indígenas de diversas etnias.
As pressões para alterar o artigo 27 se tornam cada vez mais fortes no âmbito das
negociações do NAFTA e, em 1990, uma mudança na constituição torna os ejidos
mercadoria, ou seja, passíveis de compra e venda à iniciativa privada ou aos grandes
latifundiários.
A crise do campo já vinha desde 1980 quando a liberalização da política comercial
colocou uma série de medidas que precarizaram ainda mais a situação dos pequenos
10
agricultores, como a redução dos subsídios agrícolas; a invasão de produtos agrícolas
estrangeiros, fruto de acordos bilaterais entre países, barateou a compra da produção das
pequenas propriedades levando muitas famílias indígenas à beira da miséria.
O tratado devastou a economia do país, especialmente a sua agricultura. Outrora,
um grande produtor de milho, feijão e leite, o México hoje tem que importar esses produtos
do Canadá e Estados Unidos. Com o presidente Vicente Fox houve uma campanha para
retirar todos os subsídios governamentais para os camponeses. Hoje, o subsidio ao campo é
dez vezes menor do que os dados aos fazendeiros nos EUA, conforme se lê em Choma
(2006).
Na região de Chiapas, sudoeste mexicano, conforme relata Tschirqi (2000),
ironicamente, o balanço global dos setores rurais de Chiapas mostrou-se florescente ao
longo da década de 1980, graças aos altos lucros acumulados pelos latifundiários, que se
aproveitaram da disposição do governo de privilegiar a industria agro-alimentícia. Assim,
as medidas de corte de ajuda à produção de café nesta região não afetaram os grandes
empresários, mas os pequenos agricultores que dependiam de políticas estatais para a
seguridade de sua produção.
A derrocada econômica do México nos anos de 1980 e os constantes cortes nos
investimentos federais contribuíram para o enfraquecimento ou a extinção das organizações
governamentais de ajuda aos agricultores indígenas, agravando significativamente a
situação dos indígenas no país.
Em 1994, segundo o Banco Mundial, 79% dos mexicanos do meio-rural
viviam na pobreza e, em 1998, após quatro anos de gestão do Nafta, este numero subiu para
82%. No Final de 1994, o México, devido à sua integração econômica com os EUA e
Canadá, sofria profundamente com a desigualdade do nível de desenvolvimento das
economias, tornado-se protagonista de uma grave crise especulativa que afetou as bolsas da
América Latina.
Diante de um quadro econômico enormemente desfavorável a amplas camadas
populares do território mexicano e com o fechamento de portas para a garantia de
manutenção e acesso legal à terra, as comunidades indígenas começam a se organizar em
resistências contra as medidas do governo.
11
Opondo-se à idéia de que o neoliberalismo não passaria de uma luta quixotesca ou
talvez romântica, de lutar contra leis inexoráveis da economia – seria equivalente, no
mundo atual, a lutar-se contra a vigência da lei da gravidade, que o movimento zapatista
começa a ser construído. (MALDONADO, 1999, p.23).
Assim, como podemos observar a emergência do movimento zapatista é a soma de
múltiplos fatores, que permeiam questões étnicas, de exclusão social e outras que são
pensadas em esferas culturais e econômicas, que não perdem de vista o neoliberalismo
como um elemento presente e perseverador das desigualdades sociais.
Referência Bibliográfica
AMARAL, R. F. Partindo das maquiladoras, o exemplo para a Alca, 2002. Disponível em
< http://www.midiaindependente.org/es/red/2002/10/39732.shtm>. Acesso em 10 de
janeiro de 2008.
CARRASCO, Marilivia. ONGs são instrumentos do neoliberalismo, 2007. Disponível em
http://www.msia.org.br/M-fia-Verde/419.html. Acesso em 5 de março de 2008.
CAVALCANTI, Soraya Araújo Uchoa. Reforma do Estado e políticas sociais no Brasil.
In: Texto para Discussão, Recife, n. 1, 2001
CHOMA, J. México: Muitas polêmicas, poucas diferenças, 2006. Disponível em
http://www.pstu.org.br/internacional_materia.asp?id=5267&ida=2. Acesso em 15 de
janeiro de 2008.
FALQUET, Jules. Três questões aos movimentos sociais “progressistas”: contribuições da
teoria feminista à análise dos movimentos sociais. In Revista lutas & resistências, nº1.
Londrina: Ed Modiografi, 2006.
12
FLEURY, Sonia. Políticas sociais e democratização do poder local. Mimeo, 2002.
Disponível
em
http://www.ebape.fgv.br/academico/asp/dsp_opb_resumos.asp?cd_artigo=1309&origem=
professor> . Acesso em 19 de abril de 2008.
MARIANI, E. J. A trajetória de implantação do Neoliberalismo, 2007. Disponível em
<http://www.urutagua.uem.br/013/13mariani.htm. Acesso em 4 de janeiro de 2008.
NUNES,
P.
Conceito
de
Laissez-Faire,
2007.
Disponivel
no
site:
http://www.knoow.net/cienceconempr/economia/laissezfaire.htm. Acesso em 8 de março de
2008.
PETRAS, James. Ensaios contra a ordem. São Paulo: Scritta, 1995.
SANTOS, Macelo. Revista Brasileira de Política Internacional – O México como aliado dos
EUA no projeto de integração das Américas. V.50 n.2 Brasília jul/dez.2007. Disponível em
< http://ibri-rbpi.org>. Acesso em 25 de fevereiro de 2008
SOARES, L.T. Desigualdades sociais na América Latina, 2002. Disponível em
<http://www.desempregozero.org.br/artigos/desigualdades_sociais_na_america_latina.pdf.
Acesso em 8 de fevereiro de 2008.
TSCHIRQI, D. Egito e México - Um novo tipo de conflito de Dan Tschirqi, 2000.
Disponível em < http://diplo.uol.com.br/2000-02,a1671> . Acesso em 4 de abril de 2008.
VIZENTINI, P; CARRION, R. Globalização, neoliberalismo, privatizações: quem decide
este jogo?In As Armadilhas da Globalização de Luis Fernando. Porto Alegre: Editora
Universidade, 2ª edição, 1998, (p.15-18).
13
WALLERSTEIN, I. As agonies do liberalismo. In Revista Lua Nova São Paulo: Fronteira,
1994, n34.
MELLUCI, Acción colectiva y transformación personal en la era de la información.
Ciudades, 37: 3-11, México, jan./mar, 1998.
Download