a concordância variável do infinitivo na escrita padrão

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A CONCORDÂNCIA VARIÁVEL DO INFINITIVO NA ESCRITA
PADRÃO
por
GRASIELA DE SOUSA CABRAL
(Departamento de Letras Vernáculas)
Dissertação
apresentada
como
exigência parcial para obtenção do
grau
de
Mestre
em
Letras
Vernáculas,
subárea
Língua
Portuguesa, sob a orientação da
Profª Drª Maria Eugênia Lamoglia
Duarte (UFRJ)
Faculdade de Letras da UFRJ
Fevereiro / 2006
EXAME DE DISSERTAÇÃO
CABRAL, Grasiela de Sousa. A concordância variável do infinitivo na escrita
padrão. Orientadora: Maria Eugênia Lamoglia Duarte. Rio de Janeiro: UFRJ /
Faculdade de Letras, 2006. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________
Profª. Drª. Maria Eugênia Lamoglia Duarte (UNICAMP)
(Orientadora)
___________________________________________________
Profª. Drª. Christina Abreu Gomes (UFRJ – Lingüística)
___________________________________________________
Prof. Dr. Afrânio Gonçalves Barbosa (UFRJ – Vernáculas)
___________________________________________________
Profª. Drª. Vera Lúcia P. Paredes da Silva (UFRJ – Lingüística)
(Suplente)
___________________________________________________
Profª. Drª. Célia Regina dos Santos Lopes (UFRJ – Vernáculas)
(Suplente)
Examinada a Dissertação, em 29/03/2006
Conceito:
À Maria Eugênia, meus mais sinceros
agradecimentos
pela
serenidade,
incentivo, apoio e compreensão em um
dos momentos mais difíceis do meu
percurso,
A minha mãe Georgina, por sua
constante dedicação e por sua palavra
amorosa que me fez prosseguir.
A minha madrinha e mãe Vandeliza,
pelo seu carinho e por sua ajuda
durante os meus anos de estudo,
A meu pai, em nome de sua memória,
A meus irmãos Vagner e Michel, pelo
auxílio e cuidado fraternos,
A meu namorado Rafael, pelo estímulo
e confiança,
A minha amiga Yanna Karla, pelo apoio
e incentivo,
E, por fim, meus agradecimentos aos
meus amigos, colegas e professores
que me ajudaram a tornar esse sonho
possível.
SUMÁRIO
ÍNDICE DE TABELAS E GRÁFICOS ..................................................................... i
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 9
2. PONTOS DE PARTIDA.................................................................................... 11
2.1. A perspectiva tradicional quanto ao uso do infinitivo pessoal /
impessoal................................................................................................ 11
2.2. A perspectiva dos manuais de redação quanto ao uso do infinitivo pessoal
/ impessoal ............................................................................................ 16
2.3. A perspectiva de Mateus et alii quanto ao uso do infinitivo pessoal /
impessoal................................................................................................ 18
2.4. A perpectiva de Ladeira sobre o uso variável do infinitivo....................... 23
3. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS .................................. 33
3.1. O quadro teórico ................................................................................ 33
3.1.1. A teoria variacionista............................................................... 33
3.1.2. A teoria de Princípios e Parâmetros........................................ 34
3.1.3. O parâmetro do sujeito nulo.................................................... 37
3.1.4. O estatuto da categoria vazia nas sentenças finitas e não finitas
.......................................................................................................... 41
3.2. Hipóteses .......................................................................................... 44
3.3. A metodologia da pesquisa................................................................ 44
3.3.1. O corpus analisado ................................................................ 44
3.3.2. Metodologia ............................................................................ 45
3.3.3. As variantes submetidas à análise – variável dependente
.......................................................................................................... 46
3.3.4
Os
grupos
de
fatores
utilizados
na
análise
.......................................................................................................... 47
4. ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................... 70
5. CONCLUSÃO .................................................................................................. 89
REFERÊNCIAS.................................................................................................... 91
RESUMO ............................................................................................................. 94
ABSTRACT ......................................................................................................... 95
ÍNDICE DE TABELAS E GRÁFICO
Tabela 1. Posição da oração infinitiva em relação à principal ............................ 24
Tabela 2. Posição da oração infinitiva em relação à principal e a distância entre os
respectivos verbos (dados do JB) ....................................................... 27
Tabela 3. Posição da oração infinitiva em relação à principal e a distância entre os
respectivos verbos (dados da Bíblia) ................................................... 28
Tabela 4. Enunciado realizado X enunciado não realizado (dados do JB) ......... 29
Tabela 5. Termo substantivo anteposto ao verbo no infinitivo ............................ 30
Tabela 6. Ocorrência de sujeitos pronominais plenos (vs. nulos) em PE e PB .. 40
Tabela 7. Ocorrência de sujeitos pronominais nulos e plenos de terceira pessoa em
PE e PB. (Barbosa, Duarte e Kato 2001) ...................................... 41
Gráfico 1. Distribuição geral das variantes analisadas ....................................... 70
Tabela 8. Distribuição das ocorrências segundo a voz verbal ............................ 71
Tabela 9. Distribuição das ocorrências segundo a função da oração infinitiva ...72
Tabela 10. Distribuição das relativas segundo a voz verbal ............................... 73
Tabela 11. Distribuição das relativas segundo a posição do controlador ........... 74
Tabela 12. Distribuição das ocorrências segundo o controlador da
................................................................................. 75
concordância
Tabela 13. Ocorrência de clíticos dativos de terceira pessoa em PE e PB. (Freire
2005) ................................................................................................ 77
Tabela 14. Distribuição das ocorrências segundo o traço semântico do controlador
....................................................................................... 77
Tabela 15. Distribuição das ocorrências segundo a posição do controlador ...... 79
Tabela 16. Distribuição das ocorrências segundo a presença / ausência de
preposição ..................................................................................... 81
Tabela 17. Distribuição das ocorrências segundo a posição da oração adverbial .................................................................................................... 82
Tabela 18. Distribuição das ocorrências segundo o tipo de verbo ...................... 84
Tabela 19. Distribuição das ocorrências segundo posição do sujeito da oração
completiva de verbo causativo / perceptivo ..................................... 85
Tabela 20. Distribuição das ocorrências segundo a distância do controlador do
verbo causativo / perceptivo ............................................................ 86
Tabela 21. Distribuição das ocorrências segundo a estrutura do sujeito da oração
completiva de verbo causativo / perceptivo ..................................... 87
Tabela 22. Distribuição das ocorrências segundo o gênero textual .................... 88
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho busca, com base em dados extraídos do jornal O Globo e do
Jornal do Brasil, no período que compreende 2002 e 2005, analisar a variação no
uso do infinitivo flexionado e não flexionado, nos contextos em que são controlados
por um SN plural da oração principal ou em orações completivas dos verbos
chamados causativos e perceptivos. Optou-se por analisar esses jornais por
acreditar que apresentam a língua considerada padrão.
Despertou-nos a atenção o fato de a concordância do infinitivo apresentar-se
nas gramáticas como um fenômeno variável em estruturas cujo sujeito é
correferente com um termo da oração principal. Para muitos gramáticos, a escolha
entre o infinitivo flexionado ou do não flexionado pertenceria mais ao campo da
estilística do que da gramática.
O objetivo do trabalho é, pois, observar, através de uma análise quantitativa,
se há fatores sintáticos, semânticos e/ou extralingüísticos que condicionam o
emprego das formas infinitivas, ou se tal variação seria guiada por questões
estilísticas.
As hipóteses que orientam o trabalho são: (a) a variação não é aleatória,
mas condicionada por fatores que favorecem ou inibem a flexão; (b) o infinitivo
pessoal / flexionado, graças ao uso freqüente de concordância verbal (cf. Naro e
Scherre 2003) e a preferência pelo sujeito pronominal expresso no português do
Brasil (cf. Duarte 1993, 1995, 2003) devem ser expressos na escrita padrão; (c) a
maior distância entre o infinitivo e o SN que comanda a concordância deve
favorecer o uso de marcas flexionais (cf. Mollica 2003).
Para a confirmação dessas hipóteses e a análise dos grupos de fatores que
poderiam ajudar a sistematizar a variação no uso do infinitivo, utilizam-se os
pressupostos teóricos e metodológicos da Teoria de Princípios e Parâmetros e da
Sociologia Variacionista.
Este trabalho está organizado da seguinte forma: no capítulo 1, apresentase uma revisão bibliográfica, tomando como base a perspectiva das gramáticas
tradicionais, dos Manuais de Redações dos Jornal do Brasil e d a Folha de São
Paulo, a de Mira Mateus et alii (2003) e da pesquisa realizada por Ladeira (1986)
sobre a concordância variável do infinitivo. No capítulo 3, estabelecem-se os
pressupostos teóricos e metodológicos: em 3.1, é apresentado o quadro teórico,
enfocando a Teoria de Princípios e Parâmetros e o Parâmetro do sujeito nulo; em
3.2, são expostas as hipóteses iniciais; em 3.3, define-se a metodologia adotada na
pesquisa, como o corpus utilizado, a variante submetida à análise e os grupos de
fatores utilizados. No capítulo 4, faz-se a análise dos resultados. Finalmente, no
capítulo 5, apresentam-se as conclusões.
Espera-se, com este trabalho, contribuir para uma descrição da escrita
padrão atual, uma exigência para que se produza material didático que reflita a
norma culta em sua modalidade escrita.
2. PONTOS DE PARTIDA
2.1. A perspectiva tradicional quanto ao uso do infinitivo pessoal /
impessoal
O infinitivo impessoal é a forma verbal que não apresenta sujeito,
porque não se refere a uma pessoa gramatical, como se vê em (1).
(1) [_Fumar] é prejudicial.
Sua estrutura apresenta uma base (o morfema lexical), a vogal temática que
identifica a conjugação do verbo: fal-a-r, vend-e-r, part-i-r, respectivamente para a
1ª, 2ª e 3ª conjugação, e a desinência –r.
O infinitivo pessoal é a forma verbal que tem sujeito próprio – determinado
ou não – e recebe as desinências zero na 1ª e na 3ª pessoa do singular, –es na 2ª
pessoa do singular e –mos, -des e –em nas três pessoas do plural e é sempre
controlada por um referente, expresso ou não na oração infinitiva, anteposto ou
posposto. Essa forma verbal pode aparecer na forma flexionada, como se observa
em (2) e (3), ou, na não flexionada, como se vê em (4) e (5).
(2) Eu convenci os meninos [a trabalharem comigo].
(3) Ouvi [_dizerem] que isso é bom.
(4) Eu convenci os meninos [a trabalhar comigo].
(5) Eu mandei [os meninos trabalhar bem cedo].
O emprego das formas flexionada e não flexionada do infinitivo tem-se
apresentado nos compêndios gramaticais de um modo não uniforme. De modo
geral, os gramáticos consideram que o emprego do infinitivo flexionado é seletivo,
pertencente mais ao campo da estilística do que propriamente da gramática.
Para Said Ali (1965:175), Cunha (1985:477) e Bechara (2002:260), o
infinitivo pessoal é empregado quando apresenta sujeito expresso, como em (6):
(6) É bom [tu chegares cedo].
Said Ali (1965:176) e Bechara (2002:258) destacam a possibilidade de
ocorrência da forma flexionada do infinitivo quando este aparece nas locuções
verbais com os verbos poder, querer, dever, costumar, começar, deixar de, ou
respectivos sinônimos, afastado do seu auxiliar. A flexão contribui para desfazer a
possibilidade de obscurecer o sentido da frase, como é observado em (7):
(7) Possas tu, descendente maldito de uma tribo de nobres guerreiros,
implorando cruéis forasteiros, seres presa de vis aimorés. (G. Dias)
Em relação aos infinitivos regidos de preposição, Said Ali (1965:178)
acrescenta o uso da forma pessoal nos seguintes casos:
(a)
Na combinação ao + infinitivo, como equivalente de oração temporal
explícita iniciada pela conjunção quando, como em (8).
(8) Ficaram todos pasmados [ao verem-no caminhar].
(b)
Em verbos precedidos pela preposição de e dependente de verbo ou
adjetivo que designe sentimento, desde que possa haver qualquer equívoco ou se
queira mostrar que a pessoa a quem o verbo no infinitivo se refere é ou deve ser
afetada pelo sentimento, como em (9) e (10).
(9) Ficando contentes e alegres [de verem entre aqueles dous fidalgos
tamanhas discórdias]. (D. do Couto)
(10) Têm logo esperança certa [de serem livres]. (F.M. Pinto)
(c)
Nas estruturas obrigar a, constranger a, forçar a caso se dirija a
atenção para a vítima do constrangimento, como se vê em (11), e nas estruturas
construídas com ensinar a acompanhadas de termos explicativos extensos, como
em (12).
(11) Serão forçados [a se acomodarem com a paz]. (Vieira)
(12) Pois ela nos ensina [a amarmos nossos amigos]. (F.R.L. de Sousa)
Em relação aos infinitivos dependentes dos verbos causativos e perceptivos
mandar, deixar, fazer, ver, ouvir, sentir, Said Ali (1965:177), Cunha (1985:476) e
Bechara (2002:259) mostram que estes não tendem a ser flexionados
particularmente com o sujeito posposto ao verbo, como se vê em (13). Aparecem
casos com o infinitivo flexionado, como em (14). Segundo os autores, há a
possibilidade de flexão quando o infinitivo se acha afastado do verbo causativo ou
perceptivo pela interposição de dizeres extensos, como se observa em (15).
(13) O fumo faz [fugir as abelhas].
(14) Vi [aparecerem os meninos estudiosos].
(15) Viu de antigos, longínquos e altos montes [nascerem duas claras e
altas fontes]. (Camões)
Cunha (1985:476) acrescenta a possibilidade de flexão do infinitivo
quando o sujeito se insere entre o auxiliar e o infinitivo e vem representado por
substantivo ou equivalente, como pode ser visto em (16), ou mais raramente
quando o sujeito aparece sob a forma de um pronome oblíquo, ou seja, o sujeito
recebe o caso acusativo do verbo da oração principal, como se observa em (17).
(16) Maria mandou [os homens saírem].
(17) Maria viu[-as saírem]. (Coelho Neto)
Said Ali (1965:178) cita exemplos da linguagem quinhentista do emprego do
verbo parecer construído com infinitivo flexionado, quando os verbos estão juntos,
como se observa em (18):
(18) Pareciam virem na ordem das procissões da invocação. (Barros)
Como se vê, as observações da tradição gramatical se pautam no uso de
autores consagrados em sincronias passadas. Não se sabe se o uso atual, na
escrita padrão, reflete as mesmas tendências apontadas: a concordância variável
nos contextos regidos de preposição e a preferência pela não flexão nas orações
completivas de verbos causativos e perceptivos. Os autores apresentam como
variável o uso do infinitivo (flexionado / não flexionado) em algumas estruturas e
não tecem comentários sobre qual seria a preferência no português culto, uma vez
que a tradição gramatical não apresenta esse objetivo. Cunha (1985:478) e Lima
(1994:416) consideram que o emprego do infinitivo flexionado é seletivo,
pertencente mais ao campo da estilística do que propriamente da gramática.
2.2. A perspectiva dos Manuais de Redação quanto ao uso do infinitivo
pessoal / impessoal
Tanto o Manual de Redação da Folha de São Paulo quanto o do Jornal do
Brasil afirmam não existirem regras inequívocas para o emprego do infinitivo
flexionado / não flexionado. Esses manuais ressaltam a importância “da harmonia,
da clareza e da eufonia” na escolha de uma ou outra forma.
Os dois manuais listam alguns critérios em que, de acordo com a “tendência
moderna da língua”, é preferível o uso da forma flexionada. O Manual da Folha de
São Paulo lista uma série de critérios para o uso da forma flexionada, de acordo
com a tendência mais moderna da língua:
a) Sujeito próprio:
Quando o sujeito da oração infinitiva apresentar sujeito próprio e diferente do
da oração principal, pode-se usar a forma flexionada, como em (19).
(19) Ele deu ordens [para os rapazes abrirem o portão].
b) Estruturas preposicionadas:
Em estruturas com infinitivo regido por preposição, pode-se utilizar a forma
“conjugada”, principalmente quando a oração infinitiva aparece anteposta à oração
principal, como pode ser observado em (20) e (21), respectivamente.
(20) Precisamos apenas pensar [para acertar(mos)].
(21) [Ao descobrir(em) a fraude], vão ficar pasmos.
c) Orações infinitivas completivas dos verbos causativos e perceptivos:
Em relação aos verbos causativos e sensitivos, os dois manuais são
consensuais ao afirmarem ser proibida a flexão do infinitivo caso o sujeito seja
representado por um pronome no caso acusativo, como se observa em (22), mas
dizem ser conveniente evitar a flexão caso o sujeito seja representado por um
sintagma nominal, como se vê em (23).
(22) Mande[-as esperar].
(23) Ação do BC faz [os preços cair].
d) Verbo passivo, reflexivo ou pronominal:
É possível utilizar o infinitivo flexionado quando a oração infinitiva apresenta
forma passiva ou possuir verbo reflexivo ou pronominal, como se vê em (24) e (25).
(24) Saiu sem o comparsa dizendo que não convinha [serem vistos juntos].
(25) Estão dispostos [a se reconciliarem].
2.3. A perspectiva de Mira Mateus et alii quanto ao uso do infinitivo pessoal /
impessoal
De acordo com Mateus et alii (2003:621), existe um grupo de orações com
verbos no infinitivo, chamadas de completivas não finitas, que são selecionadas
por verbos, nomes e adjetivos e podem apresentar o verbo no infinito flexionado ou
no não flexionado, como se pode observar em (26), (27) e (28):
(26) Os pais disseram aos miúdos [para vir(em) para casa cedo].
(27) Elas têm sempre medo [de perder(em) o avião].
(28) Os contribuintes estão ansiosos [por receber(em) a informação a
tempo].
As autoras comentam a exigência de flexão caso ocorra a presença de
sujeitos lexicais, como se vê em (29):
(29) [Os miúdos terem chegado cedo a casa] surpreendeu-nos.
São apresentadas algumas construções, denominadas “estruturas de
controle”, em que a oração completiva apresenta um sujeito sem realização lexical
e com referência fixada por um termo controlador presente na oração principal.
As construções de controle são divididas em controle do sujeito, em que o
sujeito da oração principal controla a referência do sujeito nulo da oração
completiva de infinitivo, como pode ser visto (30); controle do objeto, em que o
objeto direto ou o objeto indireto da oração principal controla a referência do sujeito
não preenchido da oração infinitiva, como é observado em (31) e (32).
(30) Declaramos desde já [assumir(mos) a responsabilidade pelo acidente].
(31) Os professores autorizaram os alunos [ a realizar(em) o teste durante
as férias de semestre].
(32) O pai disse a Pedro e Maria [para chegar(em) cedo a casa].
As estruturas com verbos causativos e perceptivos são denominadas pelas
autoras como construções de marcação excepcional de caso, pelo fato de o sujeito
do infinitivo receber caso acusativo do verbo da oração principal. Essas estruturas
se caracterizam por terem o verbo no infinitivo flexionado ou no não flexionado
quando o sujeito é representado por um sintagma nominal, como pode se visto em
(33) e por terem o verbo no infinitivo não flexionado quando o sujeito da completiva
ocorre em acusativo, como o ilustrado em (34).
(33) A testemunha viu [os ladrões ameaçar(em) o gerente do banco].
(34) A testemunha viu [-os ameaçar o gerente do banco].
Entretanto não há comentário sobre a possibilidade de o sujeito ser
representado por um pronome no caso nominativo, como se encontra em exemplos
no português escrito culto brasileiro, nem sobre o tipo concordância mais freqüente
no português europeu quando o SN exerce a função de sujeito do infinitivo.
Para as autoras, quando ocorre a inversão do sujeito de modo que exista
uma combinação do verbo causativo ou perceptivo com o verbo no infinitivo não
flexionado da oração completiva, cria-se uma construção denominada “união de
orações” e o infinitivo usado é sempre o não-flexionado, como o ilustrado em (35) e
(36):
(35) O professor mandou [entrar os alunos].
(36) O jornalista viu [fugir os habitantes da aldeia].
Mateus et alii (2003: 643) apontam um outro grupo de orações completivas
com
infinitivo
preposicionado,
denominadas
infinitivas
gerundivas
que
complementam os verbos perceptivos e se caracterizam basicamente por
apresentarem um verbo no infinitivo substituível pelo gerúndio e por terem o
infinitivo flexionado e o não flexionado em variação livre, o que pode ser visto em
(37) e (38):
(37) Eu vi [os meninos a decora(em) o gelado].
(38) Eu vi [os meninos decorando o gelado].
Em relação às orações adverbiais introduzidas por uma preposição ou por
uma locução prepositiva, elas apresentam o verbo na forma infinita. Quanto à
variação, de acordo com as autoras, apenas as adverbiais finais, concessivas e
temporais podem apresentar o verbo flexionado ou não, como se vê em (39) e (40):
(39) Os rapazes teriam feito tudo [para ganhar(em) a bolsa].
(40) [Ao aproximar(em)-se], os rapazes cumprimentaram os amigos.
Em relação às adverbiais condicionais, causais e consecutivas, são dados
exemplos com orações reduzidas, mas não há comentário sobre a variação no
emprego do infinitivo.
Em vista do exposto, pode-se concluir que as gramáticas e os manuais de
redação aqui citados não apresentam evidências quantitativas a respeito do
emprego infinitivo flexionado e do não flexionado, além de não se comentar a
possibilidade de o sujeito das orações completivas de verbos causativos e
perceptivos ser representado por um pronome nominativo, possivelmente uma
estrutura ainda não observada freqüentemente na escrita, embora apareça na fala
atual. Os comentários e exemplos são fortemente inspirados no uso lusitano, mas
carecem de indicações pautadas no uso padrão atual brasileiro. Basta observar as
fontes de onde são extraídos os exemplos que orientam as descrições das
tendências e as prescrições. Permanece nos manuais consultados a justificativa de
que a clareza, a eufonia e a harmonia devem ser levadas em conta. Não há
comentários sobre a freqüência de uso de uma ou outra forma. Não há, sobretudo,
qualquer referência ao fato de o pronome nominativo já aparecer em lugar do
clítico acusativo nas construções com verbos causativos e perceptivos,
principalmente em gêneros mais informais, como a crônica.
2.4. A perspectiva de Ladeira sobre o uso variável do infinitivo
Um trabalho de cunho variacionista enfocando a flexão / não-flexão do
infinitivo em orações infinitivas controladas e não-controladas foi desenvolvido por
Ladeira (1986). Nesse estudo, o pesquisador analisou dados de orações infinitivas
encontrados em editoriais do Jornal do Brasil, de maio de 1978 a julho de 1984, e
na Bíblia de Jerusalém. O autor optou por utilizar editoriais do Jornal do Brasil,
sobretudo por servir como exemplo de língua culta contemporânea de caráter
dissertativo e incluiu dados da Bíblia de Jerusalém por igualmente servir de modelo
da língua culta contemporânea, conter o discurso narrativo e o descritivo e
apresentar formas verbais de segundas pessoas.
Ladeira (1986), tomando como ponto de partida a intuição dos nossos
gramáticos, filólogos e lingüistas, testou alguns fatores, buscando quais seriam
inibidores ou favorecedores da flexão do infinitivo. O autor percebeu que alguns
fatores favorecem a flexão do infinitivo:
1) O emprego da primeira pessoa do plural:
Esse fator foi considerado como ligeiramente favorecedor da concordância. Foi
encontrado em 52,88% dos dados do Jornal do Brasil e em 31,28% dos dados da
Bíblia o infinitivo flexionado. Observemos os exemplos abaixo:
(41) ... nós descemos uma primeira vez [para _ comprar víveres...] (Gn
43,20)
(42) ... ponhamo-nos a caminho, [para _ conservarmos a vida...] (Gn 43,8)
2) A oração infinitiva anteposta à principal:
O pesquisador observou, apesar de só analisar parte dos dados do Jornal do
Brasil, que as orações antepostas à principal tendem a apresentar o verbo no
infinitivo flexionado, enquanto as orações pospostas tendem a apresentar o verbo
não-flexionado, conforme ilustra a tabela abaixo:
Fatores
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
115 (69,70%) 60 (30,30%)
Anteposta
165
Posposta
1087 (43,20%) 1431 (56,80%) 2518
Tabela 1: Posição da oração infinitiva em relação à principal
Os exemplos abaixo mostram, respectivamente, orações antepostas e
pospostas à principal.
(43) (a) [Ao receber o livro], os quatros Seres Vivos e os vinte e quatro
Anciãos prostraram-se diante do Cordeiro... (Ap 5,8)
(b) [Ao ouvirem essas palavras], sua exaltação contra ele se acalmou.
(Jz 8,3)
(44) (a) Depois sentaram-se [para comer]. (Gn 37,25)
(b) Eis o que fareis [para terdes salva a vida...] (Gn 44,18)
3) A maior distância entre o verbo da oração principal e o da infinitiva:
Neste grupo de fatores, o pesquisador levou em consideração a posição da
oração infinitiva em relação à oração principal e classificou as orações infinitivas da
seguinte forma:
a)
Oração infinitiva anteposta com verbo a sete ou mais vocábulos do
verbo da principal (rotulada “muitantes”)
(45) [Ao fazê-lo], as esquerdas, em todo o mundo, partem do princípio de
que a União Soviética, bem ou mal, sempre está defendendo o Socialismo.
(JB, 03.06.82)
b)
Oração infinitiva anteposta com verbo a quatro, cinco ou seis
vocábulos do verbo da principal (rotulada “maisantes”)
(46) [Ao chegar a esse ponto], ambos Poderes (sic) estarão concretamente
informados... (JB, 03.08.80)
c)
Oração infinitiva anteposta com verbo a um, dois ou três vocábulos
do verbo da principal (rotulada “poucantes”)
(47) ... [ao entrar], não encontraram o corpo do senhor Jesus... (Lc 24,3)
d)
Oração infinitiva anteposta com verbo imediatamente antes do
verbo da oração (rotulada “imendantes”)
(48) [A fim de os purificar], procederás de seguinte maneira... (Nm 8,7)
e)
Oração infinitiva posposta, com verbo imediatamente depois do
verbo da oração principal (rotulada “imedapós”)
(49) Deixai [vir a mim os pequeninos...] (Mc 10,14)
f)
Oração infinitiva posposta com verbo a um, dois ou três vocábulos
do verbo da principal (rotulada “poucapós”)
(50) ... e se tornaram incapazes [de lhe falar]. (Gn 37,4)
g)
Oração infinitiva posposta com verbo a quatro, cinco ou seis
vocábulos do verbo da principal (rotulada “maisapós”)
(51) Cabe aos habitantes de todo o continente [exercerem toda a força de
seu pensamento positivo...] (JB, 06.04.82)
h)
Oração infinitiva posposta com verbo a sete ou mais vocábulos do
verbo da principal (rotulada “muitapós”)
(52) Então, partiram da montanha de Hor pelo caminho do mar de Suf, [para
contornarem a terra de Edom]. (Nm 21,4)
O autor observou que há uma tendência para maior flexão da infinitiva à
medida que se aumenta a distância entre o verbo da oração infinitiva e o da
principal, como pode ser visualizado nas tabelas abaixo:
Estrutura
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
27 (67,50%) 13 (32,50%)
“muitantes”
40
15 (55,56%) 12 (44,44%)
“maisantes”
27
17 (52,52%)
“poucantes”
16 (48,48%)
33
6 (75%)
“imendantes”
2 (25%)
8
153 (70,83%) 216
“imedapós”
63 (29,17%)
“poucapós”
374 (24,43%) 1157 (75,57%) 1531
“maispós”
279 (39,46%) 428 (60,54%) 707
“muitapós”
253 (43,62%) 327 (56,38%) 580
Tabela 2. Posição da oração infinitiva em relação à principal e a distância
entre os respectivos verbos (dados do JB)
Através da análise da tabela anterior, pode-se perceber que as orações
rotuladas “imendantes”, “imedapós” e “poucapós” são as que menos favorecem a
concordância.
Estrutura
“muitantes”
“maisantes”
“poucantes”
“imendantes”
“imedapós”
Inf. Flex.
20 (66,67%)
22 (84,62%)
31 (73,81%)
12 (54,55%)
19 (4,38%)
Inf. Não flex.
10 (33,33%)
4 (15,38%)
11 (26,19%)
10 (45,45%)
415 (95,62%)
Total
30
26
42
22
434
469 (61,96%) 757
“poucapós”
288 (38,04%)
174 (51,94%) 335
“maispós”
161 (48,06%)
111 (50,68%)
“muitapós”
108 (49,32%) 219
Tabela 3. Posição da oração infinitiva em relação à principal e a distância
entre os respectivos verbos (dados da Bíblia)
Os resultados apresentados na tabela acima mostram que as orações
“imedapós” são as que menos favorecem a concordância.
Pode-se observar que o grupo de fatores que leva em consideração a posição
da oração infinitiva – anteposta ou posposta – e a distância entre o verbo da
infinitiva e o da principal é bastante relevante em relação à variação do infinitivo.
4) O enunciado expresso na oração infinitiva já ter se realizado:
Em um dos grupos de fatores analisados, foi levado em conta se o enunciado
expresso na oração infinitiva foi ou não realizado. Observemos os exemplos
seguintes:
(53) Lutamos [por termos um ideal].
(54) Lutamos [por ter uma casinha].
Em (53), a oração “por termos um ideal” é a causa que antecede o ato de lutar.
Primeiro, temos um ideal, depois lutamos. Dessa forma, a oração infinitiva
apresenta um enunciado realizado.
Em (54), a oração “por ter uma casinha” expressa a finalidade que precede o
ato de lutar. Primeiro, lutamos, depois podemos ter uma casinha. Assim, a oração
infinitiva traz um enunciado não-realizado.
Os resultados apresentados pelo pesquisador, apesar
de
levar
em
consideração apenas as orações retiradas do JB, demonstraram a relevância deste
grupo como favorecedor da concordância, como pode ser visualizado na tabela
abaixo:
Estrutura
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
452 (72,90%)
Realizado
168 (27,10%)
620
1313 (63,86%)
Não-realizado
743 (36,14%)
2056
Tabela 4. Enunciado realizado X enunciado não realizado (dados do JB)
5) Presença de termo substantivo na oração infinitiva, principalmente quando
anteposto:
Foi observado que a presença de um termo substantivo colocado antes do
infinitivo favorece a flexão do infinitivo, como se vê na tabela abaixo:
Corpora
JB
Bíblia
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
638 (74,18%)
222 (25,82%)
860
48 (70,59%)
20 (29,71%)
68
Tabela 5. Termo substantivo anteposto ao verbo no infinitivo
6) Presença de predicativo ou particípio plurais:
Nas orações em que ocorre predicativo ou particípio no plural, foram encontrados
96,18% de flexão nos dados do JB. No exemplo abaixo, pode ser
visualizado esse tipo de estrutura.
(55) ... corremos o risco [de ficarmos presos a fórmulas antiquadas...] (JB,
17.11.83)
7) Oração subordinada adverbial temporal e oração subordinada adverbial
causal:
Ao analisar as orações, levando em conta a nomenclatura tradicional, foi
observado que as orações temporais e as causais foram as que mais favoreceram
a concordância. As temporais apresentaram 79,67% de flexão e as causais
98,90%. Os exemplos abaixo mostram, respectivamente, orações temporais e
causais.
(56) O Ministro Ruben Ludwig determina que as Secretarias, [ao selecionar
os livros didáticos], adotam critérios... (JB, 07.01.82)
(57) ...tinham sido presos [por promoverem, horas antes, agitações
populares na Plaza de Mayo.] (JB, 03.04.82)
8) Pronome apassivador:
Foram testadas as orações em que aparece o pronome apassivador das
gramáticas tradicionais e concluiu-se que a presença desse pronome atuou como
favorecedor da flexão, como é visto no exemplo (58).
(58) ...para se descongestionarem as relações comerciais. (JB, 10.07.78)
9) Pronomes reflexivos e recíprocos:
Das 569 orações com pronome reflexivo ou recíproco encontradas no JB, 456
(80,14%) apresentaram o verbo flexionado e, das 150 encontradas na Bíblia, 112
(74,67%) trouxeram o verbo no infinitivo pessoal.
Um fator apresentado pelo estudioso que atua como inibidor da flexão foi a
presença de sujeito representado por um pronome oblíquo, encontrado nas
orações completivas de verbos causativos e perceptivos. Das 304 ocorrências
analisadas, apenas 22 apresentaram flexão. Observemos os exemplos abaixo:
(59) ... em ótimo lugar faze[-os habitar...] (Gn 47,6)
Em (59), o sujeito do verbo “habitar”, representado pelo acusativo “os”, não leva
o verbo a se flexionar. De acordo com o autor, o acusativo não apresenta força
regencial para flexionar o verbo.
Esse estudo desenvolvido por Ladeira (1986) foi significativo para a nossa
pesquisa por apresentar fatores importantes para a análise da variação do infinitivo
no português.
3. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS
Este capítulo apresenta o quadro teórico que orienta a pesquisa, a
metodologia utilizada bem como os grupos de fatores à luz dos quais os dados
foram analisados.
3.1. O quadro teórico
Este trabalho se desenvolve com base nos pressupostos teóricometodológicos da Sociolingüística variacionista, de inspiração laboviana. Procura
ainda relacionar o uso do infinitivo flexionado à mudança em curso na
representação do sujeito pronominal no português brasileiro e, para tanto, utiliza
algumas hipóteses da Teoria de Princípios e Parâmetros.
3.1.1. A teoria variacionista
Para o estudo sociolingüístico da flexão dos infinitivos no português escrito
culto, tomou-se como base a teoria da variação lingüística de Lavov (1972). Essa
teoria trabalha com a heterogeneidade lingüística e a influência de fatores sociais
sobre a língua e defende que os fatos lingüísticos estão sujeitos à variação, que
não é aleatória.
Mesmo tendo sido pensado inicialmente para a análise no nível fonológico,
uma vez que, nesse tipo de variação, as formas alternantes expressam o mesmo
valor, esse modelo teórico pode ser aplicado à nossa análise, apesar de ser um
estudo sintático, já que a variação flexão / não flexão do infinitivo não gera
“conteúdos informativos” diferentes.
Na análise variacionista, busca-se controlar as variáveis e os fatores
influenciadores do fenômeno em estudo. Para isso, utiliza-se parte do Pacote de
Programas VARBRUL, visando a selecionar, através da análise dos dados, os
fatores mais relevantes para a ocorrência da flexão do infinitivo no português
escrito culto.
3.1.2. A teoria de Princípios e Parâmetros
No âmbito da Teoria Gerativa que se caracteriza pelo estudo da
competência lingüística de um falante/ouvinte ideal, desenvolveu-se o modelo de
Princípios e Parâmetros, proposto inicialmente por Chomsky (1981), segundo o
qual a Gramática Universal é constituída por dois tipos de princípios: os rígidos e
invariáveis e os abertos e variáveis.
Os princípios rígidos e invariáveis são chamados de Princípios da Gramática
Universal, os quais toda gramática terá que agregar. Por exemplo, encontra-se o
Princípio da Projeção, segundo o qual, em todas as línguas humanas, as orações
apresentam necessariamente um sujeito e um predicado.
Além desses princípios, existem os abertos e variáveis cujo valor varia
segundo os dados a que o falante é exposto durante a aquisição e são chamados
de Parâmetros. Esses parâmetros apresentam um valor positivo ou um valor
negativo, e cada língua os marca a partir dos dados da aquisição.
De acordo com Kato (2005), o conhecimento de sintaxe de um falante é
visto como um conjunto Princípios invariáveis e propriedades paramétricas, estas
com seus valores definidos a partir da língua que lhe serviu de "input" no período
da aquisição.
Segundo a autora, a língua-I é entendida como o estágio adulto do
conhecimento lingüístico e a Gramática Universal (GU) é postulada como o estado
So inicial, comum a todas as crianças, homogêneo dentro da espécie humana.
Essa GU é composta por um conjunto dos Princípios invariáveis e pelos
Parâmetros, concebidos como opções marcadas positivamente ou negativamente.
Desse modo, os Princípios não são aprendidos, já estão em So. Já os Parâmetros,
por serem propriedades sub-especificadas, precisam ser definidos em relação à
marcação positiva ou negativa, dependendo do que a criança ouve em sua
comunidade, sendo um processo seletivo e não instrucional. Por exemplo, uma
criança que vive em uma comunidade em que se utiliza o sujeito nulo não tem
dificuldade em fixar o valor positivo em relação ao preenchimento do SN.
Ao relacionar os Princípios aos Parâmetros, pode-se observar que, se a
representação obrigatória do sujeito é um Princípio da GU, a sua forma de
realização faz parte de um Parâmetro que distingue as línguas em dois tipos: as
que possibilitam o sujeito nulo e as que não possibilitam o sujeito nulo.
O Português, assim como o Espanhol e o Italiano, são caracterizados,
dentro do quadro de Princípios e Parâmetros (Chomsky, 1981), desenvolvido no
âmbito da Teoria Gerativa, como línguas de sujeito nulo. Nessas línguas, pode-se
propor o sujeito nulo numa frase, como se vê em (1):
(1) __ Comprei o livro.
Em (1), o verbo comprar seleciona dois argumentos, um dos quais é o
argumento externo, o sujeito, que não está expresso foneticamente, mas é
recuperado pela flexão verbal.
Em oposição às línguas positivamente marcadas em relação a esse
parâmetro, encontram-se o Francês e o Inglês, por exemplo, que são línguas
negativamente marcadas, uma vez que a posição de sujeito tem de ser preenchida
foneticamente, como se verifica em (2):
(2) (a) *__ sont déjà arrivés de l´école.
(b) *__ already arrived from school.
Se a existência de sujeito nas orações é um Princípio da GU, a forma de
(sua) representação é um Parâmetro que distingue as línguas que admitem sujeito
nulo daquelas que não admitem. O Parâmetro, então, diferencia as línguas. Desse
modo, se línguas, mesmo com gramáticas muito semelhantes, apresentam a
fixação de apenas um de seus parâmetros de modo distinto (uma sendo
positivamente marcada e a outra negativamente marcada em relação a um
parâmetro), encontram-se duas gramáticas diferentes.
3.1.3. O parâmetro do sujeito nulo
As línguas do mundo, quanto à realização do sujeito nulo, dividem-se em
dois grupos: as que permitem a não-realização do sujeito (o chamado "sujeito
nulo"), e as que exigem o sujeito realizado. Entre as primeiras, estão o Inglês e o
Francês, enquanto entre as segundas, o Português e o Italiano, como pode ser
visto em (3) e (4):
(3) (a) I am a student.
(b) * Am a student.
(4) (a) Eu sou estudante.
(b) Sou estudante.
O Parâmetro do Sujeito Nulo começou a ser discutido por Chomsky (1981)
com base na relação entre um paradigma verbal rico e a possibilidade do não
preenchimento do sujeito pronominal. Este parâmetro está dentro dos estudos da
Gramática Gerativa, que tenta descrever a GU e definir quais são as leis que a
governam e quais as variações possíveis dentro das mesmas. A propriedade de
não realização do sujeito foi proposta a partir da comparação feita entre o inglês e
as línguas românicas (línguas que permitem a queda do sujeito pronominal – prodrop)
A explicação em geral aceita para o fato de algumas línguas não admitirem o
sujeito nulo é a impossibilidade de se recuperar o sujeito através da flexão verbal,
no caso das línguas não-pro-drop. Ao compararmos o paradigma verbal do inglês
com o do italiano, percebemos que o italiano possui uma forma para cada pessoa
verbal, enquanto o inglês distingue apenas a terceira pessoa do singular (no
presente do indicativo; no perfeito, não há nem mesmo esta distinção):
·
Presente do indicativo (Inglês vs. Italiano)
I
sing
(Io) canto
=
eu canto
You
sing
(Tu) canti
=
você canta
He
sings
(Lui) canta
=
ele canta
We
sing
(Noi) cantiamo
=
nós cantamos
You
sing
(Voi) cantate
=
vocês cantam
They
sing
(Loro) cantano
=
eles cantam
Entretanto, essa explicação é contestada por algumas línguas que apresentam
morfologia verbal rica e não permitem o sujeito nulo, como o alemão, e por outras
línguas que não apresentam morfologia verbal, porém permitem o apagamento do
sujeito, como o chinês. Tais fatos têm merecido diversas análises no quadro teórico
da Gramática Gerativa.
No português do Brasil, observa-se uma significativa simplificação do
paradigma flexional do verbo, a partir da perda das flexões de segunda pessoa
direta (as desinências <-s> e <-is>) e do emprego mais raro da desinência <mos>,
uma vez que o pronome nós tem sido substituído pela expressão a gente. Os
pronomes você(s) e a gente utilizam a forma verbal de terceira pessoa, o que levou
a uma grande redução no paradigma verbal do português:
Presente do indicativo
Imperfeito do indicativo
Eu canto
Eu cantava
Você canta
Você cantava
Ele canta
Ele cantava
A gente canta
A gente cantava
Vocês cantam
Vocês cantavam
Eles cantam
Eles cantavam
Como podemos perceber, o paradigma verbal do PB fica reduzido a três ou
duas formas (dependendo do tempo verbal), diferentes no morfema de número e
pessoa. A forma da terceira pessoa do plural por vezes também se reduz a -a, na
fala popular e coloquial, contribuindo também para reduzir ainda mais o número de
desinências.
Trabalhos recentes vêm apontando correlações entre esta mudança do
paradigma e o uso cada vez menor de sujeitos nulos no PB. Destacamos o
trabalho diacrônico de Duarte (1993), que analisa peças de teatro populares dos
séculos XIX e XX, mostrando que está ocorrendo uma mudança no PB, no sentido
de não mais permitir o sujeito nulo. Nesse trabalho, foi observado que o PB vem
acusando um uso crescente dos pronomes-sujeito referenciais em contextos em
que, nas línguas do tipo “pro-drop”, se utiliza o sujeito nulo. Duarte (1993),
observou que, na primeira década do século XIX, o preenchimento do sujeito era
de 20%, enquanto, no final do século XX, essa marca passou para 74%.
Os resultados sincrônicos de Duarte (1995) para a fala culta confirmam a
hipótese de que o PB tende a preencher a posição do sujeito, como se verifica nos
resultados da tabela 6 que comparam o português europeu (PE), com o PB culto
na modalidade oral.
Variedade
1ª. pessoa
2ª. pessoa
3ª. Pessoa
PE
88/254 (35%)
11/45 (24%)
44/209 (21%)
PB
538/728 (74%) 114/127 (90%) 287/495 (58%)
Tabela 6. Ocorrência de sujeitos pronominais plenos (vs. nulos) em PE e PB
Observa-se que, em todas as pessoas, existe uma distância significativa
entre o PE e o PB no que se refere ao preenchimento do sujeito, sendo maior a
distância (66%) na segunda pessoa. Esse fato se dá em função da mudança do
quadro pronominal que tende a substituir o pronome “tu” pela segunda pessoa
indireta “você”, não marcada. Esses resultados são confirmados em Duarte (2003)
para a fala popular, que alcança em média 80% de preenchimento nas três
pessoas do discurso.
A diferença entre o PB e PE fica patente em Barbosa, Duarte e Kato (2001)
em que se obtém dados que confirmam o maior preenchimento do sujeito de
terceira pessoa no PB (56%) do que no PE (22%), em entrevistas das duas
variedades transcritas em jornais e revistas, com resultados muito próximos aos
obtidos para a fala espontânea:
Variedade
Sujeito nulo
Sujeito Pleno
Total
PE
126 (78%)
36 (22%)
162 (100%)
PB
63 (44%)
79 (56%)
142 (100%)
Tabela 7. Ocorrência de sujeitos pronominais nulos e plenos de terceira pessoa em
PE e PB. (Barbosa, Duarte e Kato 2001)
3.1.4. O estatuto da categoria vazia sujeito nas sentenças
finitas e não finitas
Nas frases flexionadas com sujeito nulo, a teoria gerativa propõe a
existência de uma categoria vazia legitimada pela flexão verbal, que lhe atribui
traços de número e pessoa.
Nas sentenças finitas, a posição vazia do sujeito será representada pelo
pronome nulo pro se o infinitivo for flexionado; se não flexionado ou não controlado,
por PRO, como se observa nos exemplos (5) e (6):
(5) Elesi pediram [para proi fazerem o trabalho].
(6) Elesi pediram [para PROi fazer o trabalho].
De acordo com Brito (1995: 18), o emprego do sujeito nulo está relacionado
à natureza forte da concordância (CONC), ou seja, dos morfemas de pessoa e
número na flexão verbal. As línguas que apresentam poucas marcas de
concordância na flexão verbal – sejam morfológicas ou fonéticas – são línguas de
concordância fraca.
Nas orações com infinitivo não flexionado, tem-se uma flexão sem tempo e
sem concordância, como se vê em (7):
(7) (a) Eu quero [fazer o exercício].
(b) [- TEMPO / + CONC]
O infinitivo flexionado consiste na possibilidade de existir uma flexão verbal
sem tempo, mas com concordância, ou seja, com marcas de pessoa e número,
como se esquematiza em (8):
(8) (a) [...] nós fazermos [...]
(b) [- TEMPO / + CONC]
As orações com infinitivo flexionado são orações plenas, com sujeito próprio,
no caso nominativo, que lhe é atribuído pela flexão [+ CONC]. Por isso essas
orações são distintas das orações infinitivas com sujeito nulo de interpretação
genérica (PRO), como se nota em (9a). Pode-se observar, através dos exemplos
(9b) e (9c), que as orações com infinitivo flexionado não podem ser independentes
e não podem ser introduzidas por um complementizador.
(9) (a) Seria bom [PRO comprar o livro].
(b) [Os rapazes comprarem o livro].
(c) Seria bom [que os rapazes comprarem o livro].
Ao observar os exemplos, percebe-se que o emprego do infinitivo flexionado
está condicionado a estruturas com orações dependentes. Com base nesses
dados, Raposo (1987) cria a hipótese de que a concordância numa estrutura com
infinitivo flexionado apresenta propriedades nominais e marcação por um caso
abstrato que lhe é conferido pela flexão, pelo verbo ou pela preposição.
3.2. Hipóteses
A partir dos fatos expostos na seção anterior, este trabalho focalizará a
concordância variável do infinitivo sob as hipóteses de que, (1) com a mudança na
representação dos sujeitos referenciais, isto é, com a projeção do especificador de
TP, também as sentenças infinitivas controladas por um sujeito no plural exibirão
marca flexional de terceira pessoa e de que (2) o uso variável do infinitivo
flexionado e do não flexionado não é condicionado por uma regra estilística, como
preferem alguns gramáticos, mas por motivo gramatical, por estar relacionado a
fatores estruturais.
3.3. A metodologia da pesquisa
3.3.1. O corpus analisado
Para o presente estudo, foram utilizados textos de opinião e notícias do
Jornal do Brasil e do jornal O Globo publicados entre 2002 e 2005.. Parte desses
dados provém de material coletado pelo projeto PEUL. Esses jornais foram
selecionados por acreditar que reflitam a escrita padrão do português brasileiro.
Recolheram-se 968 dados de estruturas infinitivas controladas por um SN na
oração precedente ou subseqüente e 41 dados de orações infinitivas completivas
dos verbos causativos e perceptivos, em que o sujeito do infinitivo se encontra
dentro da própria subordinada. Essa diferença no número de dados entre as
orações infinitivas se deu em função da reduzida utilização das orações
completivas dos verbos causativos e perceptivos nos jornais analisados.
3.3.2. Metodologia
A pesquisa foi desenvolvida com base nos pressupostos teóricometodológicos da Sociolingüística Variacionista, de inspiração laboviana. Para
determinar os fatores que implicam a concordância foram levadas em consideração
variáveis de natureza sintática e extralingüística e utilizou-se parte do Pacote de
Programas VARBRUL para computadores.
Esse modelo lingüístico é importante por propor uma pesquisa sistemática
dos fenômenos lingüísticos em interação com o contexto social, sendo a variação
considerada inerente ao sistema, e, desse modo, um princípio geral da língua, que
pode ser descrita e analisada. De acordo com esse modelo, há regras variáveis
que estão sujeitas a fatores lingüísticos, estruturais, extralingüísticos ou sociais que
determinam a prevalência de um ou outro uso lingüístico. A partir da noção de
variação, pode ser observado determinado fenômeno lingüístico à luz de
condicionamentos lingüísticos e extralingüísticos.
O Pacote de programas VARBRUL foi utilizado para quantificar os
percentuais em relação à variável dependente – flexão / não flexão –, o que
possibilitou observar os contextos que mais tendem à concordância. Não foi,
entretanto, feita a análise com base em pesos relativos. Nossa análise levará em
conta os valores percentuais.
3.3.3. As variantes submetidas à análise – variável dependente
Considera-se variável dependente o fenômeno lingüístico que é objeto de
estudo e que se observa através de um determinado número de variantes. Neste
trabalho, duas variantes ocorrem na realização da variável dependente em foco: a
flexão ou a não flexão do infinitivo. Essas duas variáveis dependentes foram
observadas em dois grupos de dados: o primeiro que engloba as orações
completivas de verbos causativos e perceptivos e o segundo que engloba as
demais estruturas de orações infinitivas. A seguir exemplificamos as variantes
mencionadas.
(a) Uso da flexão do infinitivo
·
Com verbos causativos e perceptivos
(10) Faz [as pessoas acreditarem nele]. (O Globo, 12.09.04)
·
Com outros verbos
(11) Os governos que se sucederam no estado não são responsáveis pela
herança perversa que receberam, mas são culpados [por se terem omitido
em tomar medidas simples]. (O Globo, 13.09.04)
(b) Uso da não flexão do infinitivo
·
Com verbos causativos e perceptivos
(12) I s s o osi faz [_i buscar a tranqüilidade e o prazer em locais mais
afastados. (O Globo, 14.09.04)
·
Com outros verbos
(13) Os promotores do evento alegaram que estava muito em cima da hora
[para suspender o festival]. (O Globo, 14.09.04)
3.3.4. Os grupos de fatores utilizados na análise – variáveis
independentes
Consideram-se variáveis independentes as condições lingüísticas e
extralingüísticas que possibilitam o controle da variável dependente. Essas
variáveis equivalem aos fatores definidos como condicionantes para a emergência
do fenômeno lingüístico a ser estudado. No presente trabalho, foram utilizados
onze (11) grupos de fatores, onze de natureza lingüística e um de natureza
extralingüística, que apresentaremos a seguir.
Apresentamos, em seguida, as chamadas variáveis independentes,
representadas por grupos de fatores lingüísticos (morfológicos, sintáticos e
semânticos) e extralingüístico (gênero textual) que levantam as possíveis
correlações com as formas de realização do infinitivo flexionado / não flexionado.
Temos, então, os seguintes grupos de fatores:
Grupo (1): Tipo de oração
Este grupo de fatores, de caráter sintático, foi levantado sob a hipótese de
que as orações completivas verbais tenderiam a exibir menos concordância do que
as demais, principalmente em função da comum adjacência entre os verbos das
orações infinitiva e principal, já as orações relativas não canônicas tenderiam a se
flexionar por apresentarem normalmente um controlador próximo, enquanto as
orações completivas de verbos causativos e perceptivos teriam infinitivo flexionado,
caso seu sujeito aparecesse anteposto e em forma de SN. Se este aparecesse em
forma de clítico acusativo ou posposto ao infinitivo a preferência recairia sobre a
forma não flexionada, obedecendo à recomendação das gramáticas e dos manuais
de redação.
Vejamos os tipos de oração:
(a) Completiva de adjetivo
(14) [ Acusados d e agredirem um rapaz e quebrarem várias lixeiras ao
longo da Rua Haddock Lobo, na tijuca,] oito lutadores de jiu-jítsu, (sete
homens e uma mulher) foram detidos por PMs ontem de madrugada. (O
Globo, 13.09.04)
(15) Acordo permitido que Leão investigue empresas acusadas [ d e
prejudicar concorrência por irregularidades fiscais]. (O Globo, 13.09.04)
Em (14), observamos um exemplo de oração com infinitivo flexionado que
completa o adjetivo acusados. Em (15), temos um exemplo de oração com verbo
não flexionado que completa o adjetivo acusada”.
(b) Completiva de nome
(16) Já para aqueles que gastam 5% de sua fortuna, a probabilidade [de
manterem o mesmo poder de compra é maior]. (JB, 17.04.05)
No exemplo anterior, a oração infinitiva flexionada completa o nome
probabilidade.
(17) Os diretores assumem com à missão [ d e recompor o órgão, que
possui informações valiosas sobre processos, inovações e avanços
tecnológicos]. (O Globo, 13.09.04)
Em (17), a oração infinitiva não flexionada completa o nome missão.
(c) Completiva de verbo
(18) Criador dos bicicletários, o secretário municipal de Urbanismo, Alfredo
Sirkis, aconselha os ciclistas [a comprarem trancas inteiriças de metal, no
lugar de cabos de aço]. (O Globo, 13.09.04)
(19) Em visita ontem à Zona Oeste, o prefeito César Maia (PFL), candidato à
reeleição, acusou seus dois maiores adversários Marcelo Crivela (PL) e Luiz
Paulo Conde (PMDB), [de usar a religião para cabalar votos]. (O Globo,
14.09.04)
Em (18), a oração infinitiva flexionada funciona como complemento do verbo
aconselhar, apresentando como controlador o termo os ciclistas; já em (19), a
oração infinitiva com o verbo não flexionado complementa o verbo acusar da
oração principal.
(e) Oração adverbial
(20) Os acusados – seus nomes não foram divulgados – foram autuados e
liberados [depois de pagarem fiança de R$ 1.300 cada]. (O Globo,
13.09.04)
(21) pro Pretendemos fazer o leilão de energia existente (de usinas já
construídas) [antes de licitar a energia nova]. (O Globo, 13.09.04)
Em (20) e (21), as orações infinitivas, pospostas à principal, são introduzidas
por locuções prepositivas – depois de e antes de – e apresentam valor temporal. O
primeiro exemplo traz o verbo no infinitivo flexionado, sendo controlado pelo termo
os acusados. No segundo exemplo, o infinitivo aparece não flexionado e tem como
controlador o pronome nulo nós.
(f) Oração relativa não canônica:
É considerada oração relativa não canônica a oração infinitiva com valor
adjetivo não introduzida por pronome relativo e iniciada por uma preposição.
(22) O u t r o s dois artistas [ a serem destacados] são Davi Cury e José
Patrício.] (O Globo, 13.09.04)
(23) De Koonings e Pollock, os primeiros [a fazer] os europeus acharem que
algo de novo acontecia na arte no Novo Mundo. (O Globo, 17.09.04)
Tanto em (22) como em (23) as orações relativas não canônicas delimitam o
sentido de um termo de valor substantivo – respectivamente dois artistas e os
primeiros – têm, desse modo, um valor adjetivo, são iniciadas pela preposição a e
não apresentam pronome relativo. No capítulo seguinte, veremos que esse tipo de
estrutura é bastante relevante para se efetue a flexão do infinitivo.
(g) Completiva de verbos causativos e sensitivos
(24) Faz [as pessoas acreditarem nele]. (O Globo, 14.09.04)
(25) Isso [os f a z buscar a tranqüilidade e o prazer em locais mais
afastados]. (O Globo, 14.09.04)
Em (24) e (25), há exemplos em que um verbo causativo / perceptivo projeta
um objeto direto oracional: “as pessoas acreditarem nele“ e “eles buscar a
tranqüilidade e o prazer em locais mais afastados”, respectivamente. Nos dois
casos, o controlador da concordância aparece como termo da própria oração
infinitiva, diferentemente das outras estruturas em que é sempre um termo da
oração principal.
O exemplo (24) ilustra um caso em que o sintagma nominal as pessoas,
anteposto ao verbo, funciona como sujeito do infinitivo e faz com que o verbo seja
flexionado, enquanto, no exemplo (25), o clítico acusativo, anteposto ao verbo da
oração principal, exerce a função de sujeito do verbo “buscar”, que não aparece
flexionado, seguindo o modelo proposto pelas gramáticas e pelos manuais de
redação.
Grupo 2 : Forma do controlador da concordância
Esse grupo de fatores leva em consideração a forma apresentada pelo
controlador da concordância: sintagma nominal, pronome expresso, pronome nulo,
clítico acusativo, clítico dativo. Supõe-se que, quando o controlador é um clítico,
tenderia a haver menos concordância, principalmente nas estruturas com verbos
causativos e perceptivos.
(a) Sintagma nominal
(26) [Após roubarem os pertences e jóias de sete carros,] os bandidos
seguiram no Pólo pela Conde de Bonfim. (O Globo, 14.09.04)
(27) [Para driblar a insegurança,] os moradores procuram, cada um à sua
maneira, Vigilância privada, rádios e cancelas para evitar roubos... (JB,
17.04.05)
Os dois exemplos acima ilustram orações adverbiais cujos verbos no
infinitivo são controlados por um sintagma nominal: os bandidos , e m (26), e os
moradores, em (27).
(b) Pronome expresso
(28) Eles passam por loucuras [até conseguirem se abraçar]. (O Globo,
13.09.04)
(29) Nós temos que fazer uma aliança que vai da esquerda ao centro, [para
governar]. (JB 24.04.05)
Em (28), a oração adverbial “até conseguirem se abraçar”, posposta à
oração principal, apresenta o verbo flexionado controlado pelo pronome expresso
eles. Em (29), o verbo governar é controlado pelo pronome expresso nós.
(c) pronome nulo
(30) O que pro têm em comum – além da idade e do fato [de estarem em
seus segundos mandatos de deputado federal]. (O Globo, 14.09.04)
(31) pro Decidiram formar um bloco parlamentar [para discutir]. (JB
24.04.05)
Nos dois exemplos anteriores, temos orações adverbiais com verbos no
infinitivo cujos controladores aparecem representados por um sujeito nulo na
oração principal. Em (30), o verbo apresenta-se na forma flexionada, enquanto, em
(31), na não flexionada. Esse tipo de controlador foi pouco encontrado no corpus
analisado, como veremos no capítulo seguinte.
(d) Clítico acusativo
(32) Acusando-os [ d e usufruírem do “american way of life”]. ( Globo,
10.02.05)
(33) Se a arraigada boa-fé dos eleitores americanos os impediu [de atinar
com a lógica perversa por trás do esquema]. (O Globo, 17.09.04)
Os exemplos acima ilustram o controlador na forma de clítico acusativo;
esse tipo de controlador foi de pouca recorrência nos dados estudados. Em (32),
podemos visualizar uma oração infinitiva completiva verbal que exerce a função de
objeto indireto em relação ao verbo “acusando” da oração anterior. Nesse exemplo,
o pronome acusativo “os” controla a concordância e leva o verbo infinitivo a se
flexionar.Em (33), observamos que o verbo “atinar”, complemento indireto do verbo
“impedir”, é controlado pelo pronome acusativo “os” que se refere ao sintagma
nominal “eleitores americanos” expresso anteriormente. Nesse caso, não ocorreu a
flexão.
(e) Clítico dativo
(34) Isso lhes daria força [para incluir suas propostas na agenda e maior
influência no governo Lula]. (O Globo, 13.09.04)
Em relação a esse tipo de controlador, como poderemos observar no
capítulo seguinte, só foram encontrados dois dados no nosso corpus com o
infinitivo não flexionado, por isso houve Knockout (ocorrência dos extremos
percentuais: 0% ou 100% na realização do fator estudado) com esse controlador.
Em (34), ocorre uma oração com verbo no infinitivo não flexionado
controlado pelo clítico dativo “lhes”.
Grupo 3: Voz verbal
Esse grupo de fatores avalia a forma verbal quanto à voz. Esses fatores
foram bastante relevantes quando os dados foram submetidos à análise, como
veremos no capítulo seguinte.
(a) Voz ativa
(35) Incitar os Estados [a não servirem de porto seguro a terroristas]. (JB
24.04.05)
(36) Candidatos apostam na inclusão social [ao apresentar seus programas
para teatro, cinema e arte na cidade]. (O Globo, 13.09.04)
O e x e m p l o (35) apresenta uma oração completiva verbal flexionada
controlada pelo SN “os estados” e (36) ilustra uma oração adverbial, com infinitivo
não flexionado, posposta à oração principal. Os dois exemplos trazem o infinitivo
na voz ativa. Um fator que, de acordo com os dados, favorece significativamente a
não flexão da oração.
(b) Passiva
(37) Os próximos países africanos [ a serem visitados por Lula são
Tanzânia, Serra Leoa, Zâmbia, Mali, Gâmbia]. (O Globo, 13.09.04)
(38) Grupos como a Democracia Socialista (...) montaram verdadeiros
manifestos de inconformismo com os rumos do PT no poder [ a ser
divulgados na reunião do fim de semana]. (JB, 10.12.03, p. 03)
Os exemplo (37) e (38) retratam orações relativas não canônicas na forma
passiva. Em (37), o verbo aparece na forma flexionada, fato bastante recorrente
nos dados analisados; em (38), o verbo no infinitivo apresenta-se não flexionado.
Esse dado é bastante interessante por apresentar o verbo auxiliar no infinitivo não
flexionado e o verbo principal no particípio flexionado.
Grupo 4: Traço do referente do controlador da concordância
Essa variável tem como objetivo verificar o valor semântico do controlador,
visando a checar se esse traço se mostra importante na realização da flexão.
(a) + animado
(39) Os integrantes do R.E.M. parecem ter um sentido de vocação [ao
incorporarem a idéia de lutarem]. (O Globo, 12.09.04)
(40) Pelo menos 75 policiais civis e militares cercaram a cadeia [para evitar
uma possível fuga em massa]. (O Globo, 25.12.03)
Em (39), observamos dois verbos no infinitivo flexionado sendo controlados
pelo sintagma nominal “os integrantes do R.E.M.”. Em (40), vemos uma oração
adverbial infinitiva não flexionada controlado pelo SN “75 policiais civis e militares”.
Nos dois exemplos o controlador possui o traço [+animado].
(b) - animado
(41) As empresas em débito não ficavam impedidas de participar de
licitações [por não serem incluídas na dívida ativa dos estado]. (O Globo,
12.09.04)
(42) Os empregos não foram capazes [de absorver as novas demandas].
(O Globo, 25.12.03)
Nos exemplos anteriores, visualizamos orações infinitivas controladas por
um SN [-animado], respectivamente, “as empresas” e “os empregos”.
(c) - animado referente a grupos humanos
(43) Sete deles (táxis) foram notificados [por funcionarem sem licença]. (JB,
19.04.05)
(44) M a s empresas brasileiras sempre vêm tendo dificuldades [para
licenciar tecnologia enquanto as patentes estão em fase de análise no
INPI]. (O Globo, 13.09.04)
O exemplo (43) ilustra uma oração infinitiva adverbial flexionada que é
controlada pelo SN “sete deles”, referente ao antecedente “táxis” [-animado] que
contextualmente relaciona-se semanticamente aos taxistas.
Em (44), temos uma oração com infinitivo não flexionado que completa o
nome transitivo “dificuldades” e é controlada pelo termo “empresas brasileiras” de
traço [-animado] referente a um grupo humano.
Grupo 5: Posição do controlador da concordância em relação ao infinitivo
Nesse grupo de fatores, levamos em conta a distância entre o verbo da
oração infinitiva e o controlador da concordância. Esse grupo tem a finalidade de
verificar se a posição do controlador da concordância interfere na flexão. A
hipótese, baseada em resultados obtidos por Ladeira (1986), é a de que, quanto
mais distante estivesse o controlador, maiores seriam os índices de concordância.
(a) Anafórico com antecedente próximo
(45) Mas há mais coisas [para serem conquistadas]. (O Globo, 14.09.04)
(46) Convencendo os líderes nacionais [ a deixar as alianças com os
tucanos e pilotar os vôos próprios]. (JB, 17.04.05)
T a n t o e m (45)
quanto
em (46), visualizamos orações infinitivas que
apresentam controlador imediatamente anterior, respectivamente, “coisas” e “os
líderes nacionais”. No capítulo seguinte, veremos que, contrariando as conclusões
apresentadas por Ladeira (1986), essa posição do controlador foi a que mais
favoreceu a concordância.
(b) Anafórico com antecedente na oração anterior
(47) Os dois últimos não almejam, por enquanto, [se tornarem candidatos].
(JB, 17.04.05)
(48) As taxas de juros são usadas como instrumentos [para inibir o
consumo e a conseqüente alta dos preços]. (O Globo, 14.09.04)
Em (47) e (48), o infinitivo é controlado por um SN presente na oração
anterior.
(c) Anafórico com antecedente a duas ou mais orações
(49) Acusando-os de usufruírem do “american way of life” [sem se
integrarem à cultura americana]. (O Globo, 10.02.05)
(50) Os jogadores que estão concentrados desde sábado estão gostando da
idéia [de motivar o torcedor]. (O Globo, 14.09.04)
O exemplo (49) ilustra uma oração infinitiva adverbial com verbo flexionado
controlado pelo clítico acusativo “os”, situado a duas orações do verbo no infinitivo.
O exemplo (50) mostra uma oração completiva nominal que apresenta como
referente do infinitivo “motivar” o SN “os jogadores”.
(d) Catafórico: Quando o referente aparece posposto ao verbo no infinitivo.
(51) [Apesar de abrigarem um grande número de sem-votos,] as favelas
têm tido lugar de destaque nos programas eleitorais dos candidatos. (O
Globo, 14.09.04)
(52) [Depois de roubar um Vectra na Avenida Marechal Rondon, no Rocha,
por volta das 6h,] Felipe Nascimento de Magalhães, de 20 anos, e
Alexsandro Pinheiro Araújo, de 18, foram perseguidos por policiais militares
e presos dentro do recinto destinado a veados e antas no Zôo. (O Globo,
13.09.04)
Em (51) e (52), exemplificam-se orações adverbiais antepostas à principal,
logo o controlador aparece posposto ao verbo no infinitivo.
Grupo 6: Estrutura da oração infinitiva: preposicionada / não preposicionada
Esse grupo de fatores se deteve a observar se o fato de a oração ser
iniciada ou não por preposição atua como relevante para a flexão do infinitivo
Grupo 7: Grupo de fatores relativo apenas às orações adverbiais
7.1. Posição da oração adverbial
Esse grupo de fatores foi levantado por se considerar a posição da oração
um item relevante para a concordância, conforme já apontou Ladeira (1986).
Ressalta-se, ainda, o fato de os manuais de redação, assim como Ladeira (1986),
enfocarem a preferência pela flexão, principalmente quando as orações aparecem
antepostas.
(a) anteposta
(53) [Apesar de abrigarem um grande número de sem-votos], as favelas
têm tido lugar de destaque nos programas eleitorais dos candidatos. (O
Globo, 12.09.04)
(54) [Para reforçar o caixa], alguns candidatos têm passado o pires em
encontros a porta fechada. (O Globo, 14.09.04)
Os exemplos acima ilustram orações adverbiais antepostas à principal,
sendo controladas por um SN posposto às respectivas orações. Como veremos no
capítulo seguinte, a oração anteposta, no nosso corpus, tende a apresentar mais
concordância do que as orações pospostas, confirmando a conclusão de Ladeira
(1986).
(b) posposta
(55) Os rapazes teriam sido expulsos do local [após terem arrumado
confusão na pista de dança]. (O Globo, 12.09.04)
(56) Mas podem armar seus soldados [para promover grandes carnificinas
em nome de um nacionalismo]. (O Globo, 14.09.04)
Em (55) e (56), encontramos orações adverbiais pospostas à principal.
Grupo 8: Grupo de fatores relativos apenas às construções com os verbos
causativos e perceptivos:
8.1. Tipo de verbo
Esse grupo, de natureza semântica, busca verificar se o valor do verbo da
oração principal condiciona ou não a flexão.
(a) Causativo: mandar, deixar, fazer
(57) Estava diante da possibilidade de um encontro que poderia mudar sua
vida para sempre. Retirava então o livro da estante, com reverência, e o
abria aleatoriamente, deixando [ as páginas deslizarem...] ( O Globo,
12.06.04)
(58) I s s o os faz [ _i buscar a tranqüilidade e o prazer em locais mais
afastados]. (O Globo, 14.09.04)
Em (57), a oração completiva “as páginas deslizarem” completa o verbo
deixar, que possui o valor semântico de um causativ o . E m (58), a oração
“os...buscar a tranqüilidade e o prazer em locais mais afastados”, com infinitivo não
flexionado, funciona como complemento do verbo causativo “faz”.
(b) perceptivo: ver, ouvir, sentir.
(59) Estes inconformados, mas passivos, vêem [ os morubixabas d o s
governos brasileiros mostrarem-se bastante inventivos]. (JB, 24.04.05)
(60) Que já ouvira [os sinos tocar finados à sua passagem por Barbacena].
(JB 24.04.05)
Os exemplos acima ilustram orações infinitivas que complementam os
verbos perceptivos “ver” e “ouvir”, respectivamente. Veremos, no capítulo seguinte,
que praticamente não há diferença no comportamento dos verbos causativos e
perceptivos no que se refere à flexão.
8.2. Estrutura do sujeito da oração infinitiva complemento de causativo
/ perceptivo
Esse grupo tem a finalidade de controlar a representação do sujeito da
oração completiva. Espera-se que a flexão tenda a ocorrer quando o sujeito é
representado por um pronome nominativo ou por um sintagma nominal.
(a) Pronome nominativo
(61) Todas têm do outro lado do telefone algum rapaz de camiseta
apertadinha falando coisas que fazem [elas morrerem de rir]. (O Globo
22.02.04)
Em relação a esse fator, só foi encontrado um dado em que ocorreu a
flexão.
(b) Pronome acusativo
(62) Para faze-[los vibrar neste fim de semana]. (JB 24.04.05)
Em (62), o controlador da concordância do verbo “vibrar” aparece
representado por um pronome acusativo. Veremos na seção seguinte que todas as
estruturas encontradas em nosso corpus com controlador representado por um
clítico acusativo apresentaram o infinitivo na forma não flexionada, seguindo a
preferência prescrita pelas gramáticas e pelos manuais de redação. Desse modo,
esse fator funcionou como inibidor da flexão do infinitivo.
(c) Sintagma nominal
(63) Faz [as pessoas acreditarem nele]. (O Globo, 14.09.04)
(64) Eles se superaram em discursos e declarações que fazem [corar até os
escudeiros das respectivas comissões técnicas]. (JB, 02.04.05)
Em (63) e (64), as orações completivas são controladas por SNs. Esse tipo
de controlador parece favorecer a flexão verbal.
8.3. Ordem do sujeito da oração infinitiva complemento de causativo / perceptivo
Busca-se, através desse grupo de fatores, verificar se a posição do sujeito
condiciona a flexão do verbo no infinitivo. Visualizaremos, no capítulo seguinte, que
a posição do controlador, nesse tipo de estrutura, mostrou-se relevante para a
nossa análise.
(a) Sujeito + verbo infinitivo
(65) Faz [as pessoas acreditarem nele]. (O Globo, 14.09.04)
(66) Para faze-[los vibrar neste fim de semana]. (JB 24.04.05)
Nos exemplos acima, os sujeitos das orações infinitivas aparecem
antepostos ao verbo.
(b) Verbo + sujeito
(67) Tenta fazer [chegar aos menos afortunados as palavras tão bem
repassadas]. (JB, 17.04.05)
(68) O hábito de fazer [valerem seus direitos]. (O Globo, 16.01.05)
Em (67) e (68), os sujeitos dos verbos das orações completivas aparecem
pospostos, representados, respectivamente, pelos SNs “as palavras” e “seus
direitos”. O exemplo (68) foi o único encontrado no corpus com esse tipo de
estrutura e verbo flexionado.
Grupo 9: Fator extralingüístico – gênero textual
Visa-se a analisar se a variação flexão / não flexão tem relação com o tipo
de texto produzido. Procurou-se equilibrar a amostra para investigar a atuação
desse grupo de fatores, por isso foram selecionados 499 dados de textos de
opinião e 510 de notícias.
(a) Textos de opinião:
Há textos jornalísticos que se preocupam em questionar, debater, duvidar. A
esses tipos de textos pertencem os editoriais e as seções opinativas. Foram
considerados textos de opinião os que apresentaram “estratégias argumentativas”
(Leite, 2003) – desde o uso dos operadores discursivo-argumentativos, como os
modalizadores do discurso, até as interações com o leitor, presentes nas perguntas
direcionadas ao receptor – e refletem o “perfil ideológico” dos meios ou dos
produtores que representam.
Os editoriais, por serem textos opinativos, mesmo refletindo opinião de
instituições, e por terem sido encontrados poucos dados relativos a esse tipo
textual, foram computados junto com os textos de opinião.
(b) Reportagens / notícias
Foram considerados reportagens / notícias os textos que visavam a
informar, noticiar ou divulgar algum assunto à população, utilizando uma linguagem
basicamente referencial. As notícias, por revelar em universo “narrativo” em
relação aos acontecimentos, tendem a apresentar uma linguagem objetiva e direta.
No capítulo seguinte, apresentaremos a análise dos dados obtidos.
4. ANÁLISE DOS DADOS
4.1. Distribuição geral das variantes
Este capítulo apresenta a análise dos resultados obtidos sobre a
concordância variável do infinitivo em orações infinitivas no português escrito culto.
Foram computados 1009 dados, sendo 510 de reportagens e 499 de textos de
opinião. O gráfico abaixo mostra a distribuição geral das variantes analisadas.
80%
70%
60%
50%
40%
30%
Flexão
Não flexão
20%
10%
0%
Gráfico 1: Distribuição geral das variantes analisadas
Como se pode visualizar, contrariando a nossa hipótese inicial de que a
concordância seria predominante em contextos em que é considerada opcional, há
uma forte tendência geral a não se efetuar a flexão verbal (80%), contrapondo-se a
20% em que ocorre o infinitivo flexionado.
Do total de dados analisados, 41 são orações infinitivas completivas dos
verbos causativos e perceptivos (4,06%) e 968 apresentam os demais tipos de
estruturas (95,93%).
4.2. Os grupos de fatores
A análise se iniciará pela ocorrência de flexão / não flexão segundo a voz
verbal, como mostra a tabela 8:
Tabela 8. Distribuição das ocorrências segundo a voz verbal
Voz verbal
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
799 (83%)
Ativa
165 (17%)
40 (89%)
Passiva
5 (11%)
804 (80%)
Total
205 (20%)
Total
964
45
1009
Os resultados apresentados na tabela acima são bastante significativos, já
que retratam o fator mais significativo como favorecedor da concordância: a voz
passiva. Como se pode observar, a voz passiva foi um fator que apresentou um
alto índice de flexão (89%), já a voz ativa só apresentou 17% dos dados sendo
flexionados. Dos dados analisados, apenas 5 exemplos foram encontrados na voz
passiva com infinitivo não flexionado. Observemos os exemplos abaixo:
(1) Grupos como a Democracia Socialista (...) montaram verdadeiros
manifestos de inconformismo com os rumos do PT no poder [a ser
divulgados na reunião do fim de semana]. (JB, 10.12.03, p. 03)
(2) Um dos locais [a serem visitados pelos agentes será o Aterro do
Flamengo, que terá a campanha dos Agentes Mirins]. (O Globo, 13.09.04)
Em (1), o verbo aparece no infinitivo não flexionado e, em (2), no não
flexionado.
Um outro aspecto investigado foi a flexão do infinitivo de acordo com a
função da oração. Para essa análise, não foram consideradas as orações
completivas de verbos causativos e perceptivos. Observemos a tabela abaixo:
Tabela 9. Distribuição das ocorrências segundo a função da oração infinitiva
Estrutura
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
22
(69%)
Orações relativas
10 (31%)
32
137 (80%)
Completivas de verbos
35 (20%)
172
344 (79%)
Orações adverbiais
94 (21%)
438
108 (89%)
Completivas de adjetivos
14 (11%)
122
181 (89%)
Completivas de nomes
23 (11%)
204
780
(80%)
Total
188 (20%)
938
Observa-se, com base na tabela 9, que, contrariando a hipótese de que
haveria uma preferência pela concordância, quase todas as estruturas favorecem o
uso do infinitivo não flexionado. Apenas as orações relativas apresentam um índice
elevado de flexão (69%). As orações adverbiais apresentam 21% de flexão; as
completivas de verbos 20% e as completivas de adjetivos e as completivas de
nomes 11%.
Um fato bastante relevante quanto à estrutura das orações relativas não
canônicas é a variação na preferência do infinitivo flexionado em função da voz
verbal. Vejamos a tabela a seguir, que distribui as orações relativas quanto a esse
aspecto.
Tabela 10. Distribuição das relativas segundo a voz verbal
Voz verbal
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
Ativa
Passiva
Total
0 (0%)
22 (95,65%)
22 (69%)
9 (100%)
1 (4,35%)
10 (31%)
9
23
32
Observa-se, através da análise da tabela 10, que o emprego do infinitivo
flexionado em orações relativas é expressivo quando se têm construções na voz
passiva (95, 65%). Foi encontrado apenas um caso de voz passiva com o infinitivo
não flexionado; o dado, entretanto, apresenta o particípio flexionado, como se vê
em (3).
(3) Grupos como a Democracia Socialista (...) montaram verdadeiros
manifestos de inconformismo com os rumos do PT no poder [ a ser
divulgados na reunião do fim de semana]. (JB, 10.12.03, p. 03)
Já as orações na voz ativa só aparecem com o infinitivo não flexionado
(100%). Percebe-se que, nas orações relativas, o fator primordial para a flexão é a
voz passiva. Nos exemplos abaixo, têm-se casos de orações relativas na voz ativa
com verbo não flexionado (4) e na voz passiva com verbo flexionado (5):
(4) Não começa a empurrar as instituições financeiras [a reduzir também o
spread]. (O Globo, 27.04.05)
(5) Amiudaram-se os sinais do despertador de reações minoritárias no
Congresso ao desmoralizante desgaste moral da instituição e da urgência
de corretivos, [ a serem desdobrados em etapas para os ajustes às
imposições dos prazos]. (JB, 24.08.05)
Um outro fator importante para explicar o alto índice de flexão nas orações
relativas é a posição do controlador da concordância em relação ao infinitivo.
Observemos a tabela abaixo:
Tabela 11. Distribuição das relativas segundo a posição do controlador
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
19
(68%)
Anafórico com antecedente
9 (32%)
28 (88%)
próximo
Anafórico com antecedente 3 (75%)
1 (25%)
4 (22%)
distante
22 (69%)
Total
10 (31%)
32
Como se observa, as orações relativas apresentam predominantemente o
controlador da concordância próximo – 28 dados – dentre os quais 19 apresentam
o infinitivo flexionado.
A forma do controlador da concordância não se apresentou como um fator
relevante para a flexão. Vejamos a tabela a seguir.
Tabela 12. Distribuição das ocorrências segundo o controlador da concordância
Controlador
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
608 (77%)
Sintagma nominal 184 (23%)
792
2 (100%)
Clítico dativo
0 (0%)
2
119 (92%)
Pronome nulo
11 (8%)
130
41
(87%)
Pronome expresso 6 (13%)
47
34 (89%)
Clítico acusativo
4 (11%)
38
804
(80%)
Total
205 (20%)
1009
Como se pode visualizar, através da tabela acima, a hierarquia das variantes
é a seguinte: o maior índice de flexão (23%), ainda baixo, ocorre quando o
controlador é representado por um SN, como mostra o exemplo (6). Em segundo
lugar, temos o controlador representado por um pronome expresso (13%), como
visualizamos em (7). Em terceiro lugar, encontram-se o pronome nulo e o clítico
acusativo (11%), como se pode ver em (8) e (9).
(6) Desde que os responsáveis identifiquem sua origem e destino, [além de
não vincularem a distribuição a interesses políticos]. (O Globo, 14.09.04)
(7) Nós, profissionais da área, não podemos ignorá-la, [sob pena de
perdermos o compasso do nosso tempo]. (O Globo, 19.05.05)
(8) Há naturalmente dificuldades que não pro ignoramos, mas [ao termos
essa troca de idéias sobre os vários pontos nos quais nossos interesses não
estão totalmente encaixados,] pro chegamos à conclusão de que ainda vale
a pena o esforço e nós faremos esse esforço. (O Globo, 13.09.04)
(9) Não pude deixar de sensibilizar ao vê-las largando baby dolls de renda,
calcinhas de renda, sutiãs de renda e meias de renda, num cantinho da
alcova, [antes de pularem para o tálamo conjugal]. (JB, 04.09.05)
Como se pode perceber, só foram encontrados dois dados de infinitivo
controlado por um clítico dativo, ambos com infinitivo não flexionado. Esse baixo
índice de clíticos dativos confere com um estudo desenvolvido por Freire (2005)
que investigou a freqüência e as estratégias de substituição do clítico dativo de
terceira pessoa no português escrito culto, com base em amostras das variedades
brasileira e lusitana da língua. Nesse estudo, constatou-s e q u e , enquanto a
lusitana faz largo uso do clítico lhe na realização do dativo anafórico (83%), a
escrita culta brasileira não registra um percentual baixo no uso dessa variante com
referência à terceira pessoa (26%), como se pode visualizar na tabela 12. Segundo
o autor, as estratégias de substituição a esse clítico dativo por um sintagma
preposicional anafórico ou por um objeto nulo são mais produtivas no PB do que no
PE.
Função Dativa
Clítico
SP anafórico
Objeto nulo
42%
32%
PB
26%
83%
PE
3%
14%
Tabela 13. Ocorrência de clíticos dativos de terceira pessoa em PE e PB. (Freire
2005)
Um fato que nos chamou a atenção em relação à forma do controlador foi o
menor número de dados com pronome expresso do que com o pronome nulo nas
orações principais, já que no português falado no Brasil há uma tendência de
preenchimento do sujeito (DUARTE, 1995, 2003). Provavelmente, essa
discrepância se deve à ação normativa da escola, já que tratamos de língua escrita
e as gramáticas sempre consideraram desnecessárias e redundantes as
repetições.
A tabela, a seguir, apresenta o grupo de fatores relativo ao traço semântico
do controlador.
Tabela 14. Distribuição das ocorrências segundo o traço semântico do
controlador
Controlador
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
592
(81%)
+ animado
143 (19%)
735
147 (74%)
- animado
52 (26%)
199
65
(87%)
- animado (referente a 10 (13%)
75
grupos humanos)
804 (80%)
Total
205 (20%)
1009
A tabela acima mostra que o traço do referente não contribui como um
favorecedor da concordância. Observamos que o maior percentual (26%) ocorre
quando o controlador é [-animado] e o menor percentual (13%) aparece quando o
controlador é [-animado] referente a grupos humanos.
A seguir, podemos visualizar exemplos em que ocorrem antecedentes
[+animados], [-animados]
e
[-animados]
relativos
a
grupos
humanos,
respectivamente:
(10) Vários senadores foram convencidos pelo chefe da Casa Civil, José
Dirceu, [a não mudarem de partido]. (O Globo, 13.09.04)
(11) Participou, pessoalmente, de debates no Senado e na Câmara dos
Deputados, recolhendo opiniões e subsídios que contribuíram [para
adequar o empreendimento às condições hidrológicas do rio]. (O Globo,
13.09.04)
(12) [ P a r a reforçar o combate à sonegação,] a Receita Federal e a
Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, firmaram
um acordo. (O Globo, 13.09.04)
Observamos no exemplo (10) que o antecedente [+animado] “vários
senadores” controla a concordância do verbo “mudar”, fazendo-o se flexionar. Em
(11), o termo [-animado] “opiniões e subsídios”, objeto direto do verbo “recolher”,
funciona como controlador do verbo “adequar”, que aparece no infinitivo não
flexionado. Já em (12), o termo “a Receita Federal e a Secretaria de Direito
Econômico (SDE), do Ministério da Justiça”, sujeito do verbo firmaram, aparece
como um controlador catafórico do verbo reforçar, empregado no infinitivo não
flexionado.
A tabela a seguir ilustra a distribuição das ocorrências segundo a posição do
controlador:
Tabela 15. Distribuição das ocorrências segundo a posição do controlador
Controlador
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
108 (59%)
Próximo anafórico
76 (41%)
184
483 (88%)
Distante anafórico
68 (12%)
551
164 (78%)
Muito distante
45 (22%)
209
49 (75%)
Catafórico
16 (25%)
65
804 (80%)
Total
205 (20%)
1009
Através da análise da tabela 15, podemos perceber que o controlador
anafórico próximo é o fator em que mais se evidenciou a flexão do infinitivo (41%) e
o controlador anafórico distante foi o que menos favoreceu a flexão (12%).
Esse resultado é interessante por apresentar resultados diferentes dos
encontrados por Ladeira (1986), que, ao analisar a flexão do infinitivo em editoriais
do Jornal do Brasil, de maio de 1978 a 31 de julho de 1984, a Bíblia de Jerusalém
e um conjunto de 21 tomos da Bíblia datados entre 1781 e 1789, completados por
três tomos do mesmo tradutor, datados de 1807, conclui que havia uma tendência
para maior flexão infinitiva à medida que se amplia a distância entre os respectivos
verbos. Naro e Scherre (2003), por outro lado, mostram que quanto mais distante o
sujeito, maior a possibilidade de não haver flexão.
Notamos que, no nosso corpus, o resultado foi discrepante, uma vez que a
flexão foi mais incidente quando o antecedente era imediatamente anterior à
oração infinitiva, como podemos visualizar em (13):
(13) Criador dos bicicletários, o secretário municipal de Urbanismo, Alfredo
Sirkis, aconselha os ciclistas [ a comprarem trancas inteiriças de metal, no
lugar de cabos de aço]. (O Globo, 13.09.04)
Em (13), o controlador próximo “os ciclistas” favorece a flexão do verbo no infinitivo
“comprar”.
Observemos os exemplos abaixo que ilustram, respectivamente, o
controlador “distante anafórico”, o “muito distante anafórico” e o “catafórico”:
(14) Nesta semana, por exemplo o órgão pretende colocar agentes de
trânsito nas ruas [para distribuir panfletos explicativos e fazer corpo-a-
corpo em pontos de movimentação intensa de pessoas]. (O Globo,
13.09.04)
(15) Tanto o baiano Wagner Moura quanto a paulista vêm se sentindo cada
vez mais cariocas. O passo que faltava [para assinar em baixo a nova
naturalidade] – os dois já se mudaram definitivamente para o Rio há uns
quatro anos – será dado no palco. (O Globo, 13.09.04)
(16) [Para reforçar o caixa,] alguns candidatos têm passado o pires em
encontros a porta fechada. (O Globo, 12.09.04)
A tabela abaixo ilustra a distribuição das ocorrências segundo a presença /
ausência de preposição:
Tabela 16. Distribuição das ocorrências segundo a presença / ausência de
preposição
Estrutura
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
750 (80%)
Preposicionada
182 (20%)
932
54 (70%)
Não preposicionada
23 (30%)
77
804 (80%)
Total
205 (20%)
1009
Observamos, através da análise da tabela 16, que os dados prioritariamente
apresentaram a estrutura preposicionada – 932 dados – e que o uso da estrutura
preposicionada, exemplo (17), ou da não preposicionada, exemplo (18), não atuou
como fator que contribui para a flexão.
(17) Os colonos do Sul vieram de regiões da Grã-Bretanha diferentes das de
onde vieram os colonos do Norte – e eram tão diferentes entre si do outro
lado do Atlântico como do lado de cá – ou seja, [muito antes de terem visto
um escravo negro]. (O Globo, 15.05.05)
(18) Para permitir às crianças de menor poder aquisitivo [competir por seu
lugar ao sol]. (O Globo, 15.05.05)
Um grupo de fator estudado relativo apenas às orações adverbiais diz
respeito à distribuição das ocorrências segundo a posição da oração infinitiva,
como se vê na tabela 17.
Tabela 17. Distribuição das ocorrências segundo a posição da oração adverbial
Posição
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
42
(67%)
Anteposta
21 (33%)
63
302 (81%)
Posposta
73 (19%)
375
344 (79%)
Total
94 (21%)
438
O estudo de Ladeira (1986) já nos mostrava uma relativa importância desse grupo
para a flexão / não flexão do infinitivo. O autor concluiu que havia maior flexão
infinitiva quando a oração estava anteposta à principal (69,70%). De acordo com a
tabela acima, percebe-se que, apesar de ser um índice baixo de concordância
(30%), as orações antepostas continuam apresentando um índice maior de flexão
do que as pospostas.
4.3. Os resultados dos verbos causativos e perceptivos
Os resultados apresentados abaixo são referentes apenas às orações
completivas dos verbos causativos e perceptivos. Do total de 1009 dados, apenas
41 apresentaram esse tipo de estrutura. O primeiro grupo analisado observa a
distribuição das ocorrências segundo o tipo de verbo; o segundo, a distribuição das
ocorrências segundo posição do sujeito da oração completiva de verbo causativo /
perceptivo; o terceiro analisa a distribuição das ocorrências segundo a estrutura do
sujeito da oração completiva de verbo causativo / perceptivo.
As orações completivas de verbos causativos e perceptivos apresentam uma
estrutura diferente das demais analisadas por apresentar o controlador da
concordância como termo presente na própria oração, como se vê no exemplo
(19).
(19) Viu [presidentes americanos entrarem e saírem do governo]. (JB,
22.08.05)
Em (19), temos a oração “presidentes americanos entrarem e saírem do
governo” funcionando como complemento verbal do verbo perceptivo “ver”. O
termo “presidentes americanos” funciona como sujeito e controlador dos infinitivos
“entrar” e “sair”, que se apresentam na forma flexionada.
A tabela abaixo ilustra a distribuição das ocorrências segundo o tipo de
verbo.
Tabela 18. Distribuição das ocorrências segundo o tipo de verbo
Posição
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
20 (59%)
Causativo
14 (41%)
34
4 (57%)
Sensitivo
3 (43%)
7
24 (59%)
Total
17 (41%)
41
Como se pode visualizar na tabela 18, o tipo de verbo da oração principal –
causativo ou perceptivo –, no nosso corpus, não atua como fator importante para a
flexão / não flexão do infinitivo. A nossa hipótese inicial era que os fatores
sintáticos seriam os mais importantes para a flexão. Desse modo, esse fator, de
natureza semântica, realmente não seria relevante para a flexão, uma vez que se
tem o mesmo tipo de estrutura sintática. A seguir, são apresentados exemplos com
verbo causativo (20) e perceptivo (21).
(20) Deixar [culpados passarem como inocentes]. (JB, 22.08.05)
(21) Que já ouvira [os sinos tocar finados à sua passagem por Barbacena].
(JB 24.04.05)
Em (20), a oração “culpados passarem como inocentes” complementa o
verbo causativo “deixar” e em (21) a oração “os sinos tocar finados à sua
passagem por Barbacena” completa o verbo perceptivo “ouvir”
A seguir, a tabela 19 retrata a distribuição das ocorrências segundo posição do
sujeito da oração completiva de verbo causativo / perceptivo.
Tabela 19. Distribuição das ocorrências segundo posição do sujeito da oração
completiva de verbo causativo / perceptivo
Posição
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
15
(48%)
SV
16 (52%)
31
9 (88%)
VS
1 (12%)
10
24 (59%)
Total
17 (41%)
41
Como se pode observar, esse grupo relativo aos causativos e perceptivos foi
de grande relevância. Estruturas que apresentam a ordem direta apresentaram
52% de flexão, como se vê em (22), enquanto as estruturas que apresentaram o
sujeito posposto ao verbo apresentaram apenas 12% de flexão, como se observa
em (23).
(22) (a) Fazer [as coisas funcionarem]. (JB 24.04.05)
(b) ... já ouvira [os sinos tocar afinados à sua passagem por
Barbacena]. (JB 24.04.05)
(23) (a) O hábito de fazer [valerem seus direitos]. (O Globo, 16.01.05)
(b) Querem fazer [trafegar 90 linhas intermunicipais]. (JB, 17.04.05)
Em (22a), o sujeito controlador “as coisas”, anteposto ao infinitivo, leva o
verbo “funcionar” a se flexionar e, em (22b), o sujeito “os sinos” não leva o verbo a
se flexionar. Em (23a), o sujeito posposto “seus direitos” leva o verbo se flexionar e
(23b), o sujeito posposto “seus direitos” também faz o verbo se flexionar.
Apesar da discrepância, ainda foi maior o percentual de não flexão nos dois
tipos de estruturas. Acredita-se que essa tendência ocorra em função das
preferências apontadas pela norma gramatical, além de o falante perceber menos
o sujeito.
A distribuição das ocorrências segundo a distância do referente anafórico de
verbo causativo/perceptivo se mostrou como um fator significativo em relação à
flexão, como podemos observar na tabela a seguir.
Tabela 20. Distribuição das ocorrências segundo a distância do controlador do
verbo causativo / perceptivo
Posição
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
16 (80%)
Próxima
4 (20%)
20
11 (100%)
Distante
0 (0%)
11
16 (52%)
Total
15 (48%)
31
Em termos percentuais, nota-se que, assim como nas outras orações
analisadas, a proximidade entre o infinitivo da oração completiva de um verbo
causativo e perceptivo e a posição do controlador foi bastante significante. Com o
sujeito próximo, em 80% dos dados, houve a flexão; enquanto, com antecedente
distante, não houve flexão.
O último grupo estudado em relação às completivas de verbos causativos e
perceptivos diz respeito à distribuição das ocorrências segundo a estrutura do
sujeito da oração completiva de verbo causativo/perceptivo.
Tabela 21. Distribuição das ocorrências segundo a estrutura do sujeito da oração
completiva de verbo causativo / perceptivo
Estrutura
Clítico acusativo
Sintagma nominal
Pronome reto
Total
Inf. Flex.
0 (0%)
16 (57%)
1 (100%)
17 (41%)
Inf. Não flex.
12 (100%)
12 (43%)
0 (0%)
24 (52%)
Total
12
28
1
41
A tabela 21 nos mostra que, no único dado encontrado, a flexão é favorecida
quando o sujeito é representado por um pronome reto. Na estrutura com sujeito
representado por um sintagma nominal, o percentual cai para 57%. Já nas
ocorrências de sujeito representado por clítico acusativo, só foram encontrados
exemplos em nosso corpus de infinitivo não flexionado. A seguir, vemos exemplos
que ilustram as informações acima:
(21) Todas têm do outro lado do telefone algum rapaz de camiseta
apertadinha falando coisas que fazem [ elas morrerem de rir]. (O Globo,
22.02.04)
(22) Faz [as pessoas acreditarem nele]. (O Globo, 12.09.04)
(23) I s s o os faz [ _i buscar a tranqüilidade e o prazer em locais mais
afastados]. (O Globo, 14.09.04)
No exemplo (21), o sujeito representado pelo pronome reto “elas” faz com
que o verbo “morrer” seja flexionado, em (22), o sujeito representado pelo SN “as
pessoas” também levou o verbo a se flexionar enquanto, em (23), o sujeito
controlador do verbo “buscar”, representado pelo clítico acusativo “os” não levou o
infinitivo a se flexionar.
4.4. Fator extralingüístico: gênero textual
O próximo grupo que será retratado na tabela 22 enfoca um fator
extralingüístico: a distribuição das ocorrências segundo o tipo de texto. Esse grupo
considera o tipo de texto: notícias e textos de opinião. Trabalhamos com o objetivo
de verificar se o tipo de texto seria um elemento favorecedor da concordância.
Tabela 22. Distribuição das ocorrências segundo o gênero textual
Tipo de texto
Inf. Flex.
Inf. Não flex.
Total
423 (83%)
Notícias
87 (17%)
510
381 (76%)
Opinião
118 (24%)
499
Em termos percentuais, vemos que esse grupo não é relevante como
favorecedor da concordância.
CONCLUSÃO
Este trabalho procurou investigar realização da concordância considerada
facultativa dos infinitivos. Para isso, foram levantados 1009 dados, sendo 41 de
orações infinitas completivas dos verbos causativos e sensitivos e 968 dos demais
tipos de estruturas.
Com base nas hipóteses levantadas, são aqui registradas as conclusões
gerais do estudo realizado, ressaltando-se o fato de a maioria dos fatores
analisados não terem sido considerados relevantes para que ocorresse a flexão do
infinitivo nos contextos considerados opcionais. A pesquisa dividiu-se em três
etapas. Na primeira, utilizaram-se todos os dados. Na segunda, foi observado um
fator referente apenas às orações adverbiais. Na terceira, analisaram-se apenas os
verbos causativos e perceptivos.
Observou-se que, contrariando as nossas expectativas de que a tendência
seria um maior emprego de flexão, encontrou-se um maior uso da não flexão.
Constatou-se que as estruturas das orações relativas e a voz passiva são os
contextos que mais favorecem a concordância.
Em relação às orações completivas de verbos causativos e perceptivos,
observou-se que o sujeito representado pelo Sintagma nominal e anteposto ao
infinitivo foram fatores decisivos para que houvesse a flexão.
Diante de tais resultados, confirma-se a opcionalidade na flexão do infinitivo,
e é possível dizer que existem contextos que favorecem a flexão.
Houve, portanto, a confirmação de que existem fatores sintáticos que
favorecem ou não a flexão do infinitivo. Espera-se, com essa pesquisa, ter
contribuído para uma descrição da norma escrita culta relativo ao emprego do
infinitivo controlado, uma vez que reconhecemos ser de extrema importância
termos descrições e normas gramaticais inspiradas na norma escrita culta
contemporânea.
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RESUMO
CABRAL, Grasiela de Sousa. A concordância variável do infinitivo na escrita
padrão. Orientadora: Maria Eugênia Lamoglia Duarte. Rio de Janeiro: UFRJ /
Faculdade de Letras, 2006. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa.
Este trabalho apresenta uma análise quantitativa da concordância variável
do infinitivo na escrita padrão, com base em 1009 dados extraídos do jornal O
Globo e do Jornal do Brasil, no período que compreende 2002 e 2005, nos
contextos em que são controlados por um SN plural da oração principal ou têm seu
sujeito na própria oração infinitiva, isto é, em orações completivas dos verbos
chamados causativos e perceptivos. A análise busca (a) contestar a hipótese de
que variação seja guiada por questões estilísticas, como pregam os estudos
tradicionais, (b) levantar, com base na sociolingüística variacionista, os fatores
sintáticos, semânticos e/ou extralingüísticos que condicionam a variação e (c)
contribuir para uma descrição da escrita padrão atual. A hipótese inicial era que,
com o aumento de concordância em sentenças finitas e o aumento da expressão
do sujeito pronominal haveria preferência pelo uso de marcas de concordância. Os
resultados gerais contrariam as expectativas iniciais, mostrando uma tendência
maior para o emprego do infinitivo não flexionado, apesar da existência de alguns
contextos que favorecem a concordância: as orações relativas não canônicas, a
voz passiva e o sujeito representado pelo sintagma nominal e anteposto ao
infinitivo nas orações completivas de verbos causativos e sensitivos.
ABSTRACT
CABRAL, Grasiela de Sousa. A concordância variável do infinitivo na escrita
padrão. Orientadora: Maria Eugênia Lamoglia Duarte. Rio de Janeiro: UFRJ /
Faculdade de Letras, 2006. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa.
This work presents a quantitative analysis of the variable agreement of infinitives in
standard writing, based on 1009 sentences collected in two newspapers from Rio
de Janeiro, between 2002 and 2005, considering the contexts in which infinitives
are controlled by a plural NP in the matrix clause or have their subject in the very
infinitival clause, that is, in complement clauses of causative and perceptive verbs.
The main purposes of the analysis are (a) to discuss the hypothesis that variation is
guided by stylistic choices, a position defended by traditional grammarians, (b) to
find the syntactic, semantic and non-linguistic factors that control variation and (c) to
bring a contribution to the standard writing of the present. The initial hypothesis was
that, due to an increase in the rates of agreement in finite sentences and in the
rates of pronominal subjects, there would be a preference for the use of agreement
marks in the infinitive. The results show a general tendency to non-agreement, in
spite of some contexts which favor agreement: non canonical relatives, infinitives in
the passive voice and the NP preposed to the infinitive in completives of causative
and perceptive verbs.
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