Gledson Bezerra Magalhães, Edson Vicente da Silva

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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física
II Seminário Ibero-Americano de Geografia Física
Universidade de Coimbra, Maio de 2010
Da teoria à prática: as unidades geoambientais e sua contribuição
para o planejamento territorial cearense
Gledson Bezerra Magalhães – Universidade Federal do Ceará
Edson Vicente da Silva – Universidade Federal do Ceará
[email protected]
Introdução
O Estado do Ceará é uma das 27 unidades federativas do Brasil. Está situado na
Região Nordeste e tem por limites o Oceano Atlântico a norte e nordeste, Rio Grande
do Norte e Paraíba a leste, Pernambuco a sul e Piauí a oeste. De acordo com o IBGE
(2000) possui uma área de 146.348,30 km², correspondendo a 9,37% da área do
Nordeste.
Seu território apresenta diferentes paisagens, fruto da dinâmica entre os
componentes da natureza e também desses com o homem.
Entender como se relaciona esses componentes naturais e como o homem atua
sobre eles modificando-os, é perceber como se da o processo de (re)formação espacial
e paisagística que constituem o território cearense. Dessa, forma o presente trabalho
visa compreender através de que métodos e como a delimitação das unidades
geoambientais do Ceará podem fornecer subsídio para um melhor planejamento e
gestão dos recursos naturais do Estado, visto que, os sistemas ambientais servem de
suporte às atividades sócio-econômicas.
Para tanto se faz necessário entender sob que metodologia e critérios realizaram-se
a compartimentação das Unidades Geoambientais do Ceará. Esse tema será tratado na
primeira parte desse estudo.
Também é basilar entender as características físico-naturais (geologia, relevo, solo,
clima, hidrografia e vegetação) do território cearense, visto que a necessidade de
compreender as inter-relações entre os elementos supracitados perpassa também por
estudos setorizados do meio. As abordagens setorial e integral devem interpenetrar-se
e manter interfaces. Isso será abordado na segunda parte do artigo.
O terceiro e quarto momento do estudo apresentam respectivamente as Unidades
Geoambientais do Ceará a partir das propostas de Sousa (2005) e a elaborada pela
FUNCEME1 em 2009, enfatizando sua importância para a gestão do território.
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Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos.
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Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
O referencial teórico das Unidades Geoambientais
A compartimentarão das unidades geoambientais do Ceará, é resultado de uma
concisa análise integrada dos aspectos naturais desta mesma região. O estudo de
Souza (2005) e da FUNCEME (2009) são os mais abrangentes, e apresentam oito
unidades geoambientais, tendo como base de delimitação a geomorfologia, por
sintetizar o conjunto dos componentes geoambientais.
Segundo Souza (2005: 127), “a análise geoambiental é uma concepção integrativa
que deriva do estudo unificado das condições naturais que conduz a uma percepção
do meio em que vive o homem e onde se adaptam os demais seres vivos”. Observa-se
que a análise geoambiental, pauta-se através de uma análise integrada da paisagem,
tendo como método o modelo geossistêmico, sendo o termo unidade de paisagem ou
sistema ambiental sinônimos de geossistema.
O conjunto de componentes geoecológicos (geologia, morfologia, hidrologia,
climatologia, pedologia e fito-ecologia) constitui o arcabouço estrutural do potencial
ecológico, que com suas características próprias geram paisagens singulares dando-nos
subsídio para a análise integradora do meio. Souza e Carvalho (2009) apontam que o
conjunto dos componentes, processos e sistemas de meio físico-geográfico, são
expressos através da concepção de unidade geoambiental ou geossistemas.
O Geossistema deriva da Teoria Geral dos Sistemas – TGS de Bertalanffy. Na TGS o
estudo de sistemas tem como principio básico a conectividade. Nesse sentido o
sistema é um conjunto de elementos interdependentes, cada qual com uma ou mais
funções específicas, funcionando de forma interconectada. Eles podem ser abertos –
quando a troca de energia e matéria com o meio – e fechados, quando não há a
referida troca. Nos sistemas naturais predominam sistemas abertos.
O estudo de geossistemas adentrou a Geografia Física no início da década de 1960
com os estudos do russo Sotchava e posteriormente foi aprofundado pelo francês
Bertrand (1968). Os geossistemas surgiram como forma de analisar as paisagens
geográficas complexas.
Bertrand (1968) expõe o termo geossistema servindo para designar um sistema
geográfico natural e homogêneo associado a um território. Afirma que o geossistema
corresponde a dados ecológicos relativamente estáveis, resultando da combinação de
fatores geomorfológicos, climáticos e hidrológicos. Estando em equilíbrio (estado de
clímax) quando o potencial ecológico e a exploração biológica também estão. Sendo
que para cada geossistema pode-se distinguir um potencial ecológico e uma
exploração biológica específica.
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Ele se caracteriza por uma morfologia, isto é, pelas estruturas verticais (os
geohorizontes) e horizontais (geofácies); um funcionamento, que engloba o conjunto
de transformações dependentes da energia solar ou gravitacional, dos ciclos da água,
dos biogeociclos, assim como dos movimentos das massas de ar e dos processos de
morfogênese; um comportamento específico, isto é, para as mudanças de estado que
intervêm no geossistema em uma dada seqüência temporal. (Bertrand, 1968, p. 51)
Sotchava (1977) aponta que o geossistema é o potencial ecológico de determinado
espaço no qual há uma exploração biológica, podendo influir fatores sociais e
econômicos na estrutura e expressão espacial.
As bases teóricas dos dois autores confluem para considerar o geossistema como
um conceito territorial, espacialmente delimitado e analisado sob determinada escala.
Christofoletti (1999, p.42) nos mostra que o geossistema “resulta da combinação de
um potencial ecológico (geomorfologia, clima, hidrografia), uma exploração biológica
(vegetação, solo e fauna) e uma ação antrópica, não apresentando, necessariamente,
homogeneidade fisionômica, e sim um complexo essencialmente dinâmico”.
Nascimento e Sampaio (2005, p. 167) nos mostram que a organização espacial dos
geossistemas se expressa pela estrutura conferida pela distribuição e arranjo espacial
dos elementos que compõem o universo do sistema, os quais são resultantes da
dinâmica dos processos atuantes e das relações entre os elementos.
Pelas citações supracitadas nota-se que o geossistema constitui-se um sistema
aberto, natural, dotado de um dinamismo, variando temporo-espacialmente e
considerando o homem como um fator modificador do mesmo. A variação temporoespacial o qualifica como uma sucessão de estados que evoluem no tempo e no
espaço.
A introdução da concepção sistêmica na Geografia Física permitiu a mesma uma
maior clareza em seu objeto de estudo, assim como uma visão holística do meio
natural, aproximando as pesquisas nas interações homem-meio. Deixando de lado os
estudos exclusivamente fragmentados dos componentes da natureza, e trabalhando
com as relações existentes entre os componentes e as atividades humanas, como
colocam em voga Sotchava (1977), Troppmair (1989), Bertrand (1991). Portanto, a
Geografia Física encontra na concepção sistêmica o método mais adequado para
estudar e explicar a estrutura dinâmica dos fatos socio-naturais.
Nascimento e Sampaio (2005) afirmam que a Teoria Geossistêmica deu um caráter
mais metodológico a Geografia Física, facilitando e incentivando os estudos integrados
das paisagens. Para eles o geossistema possibilita um estudo prático do espaço
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Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
geográfico incorporando a ação social na interação natural, assim como o potencial
ecológico e a exploração biológica.
Ao analisarmos um dado espaço, se nós avaliamos apenas os seus elementos, sua
natureza, sua estrutura ou possíveis classes desses elementos, não ultrapassamos os
limites da descrição. É somente a relação que existe entre as coisas que nos permite
realmente conhece-las e defini-las, isto é, “os fatos isolados são abstrações e o que
lhes dá concretude é a relação que as mantêm entre si” (Santos, 2004, p. 133). É
necessário ir além da paisagem propriamente dita, devem-se buscar as interrelações
existentes no seu interior.
A Compartimentação Geoambiental do Estado do Ceará, elaborada pela FUNCEME2,
em parceria com pesquisadores da UFC3 e UECE4, assim como a compartimentação
elaborada por Sousa (2005) traz o que foi explanado ate aqui. Esta pesquisa tem em
seu bojo informações sistematizadas pertinentes ao contexto geoambiental do
território cearense. Acompanhando a linha geossistêmica o estudo hierarquiza os
sistemas ambientais tendo como base as múltiplas relações entre os fatores do
potencial ecológico, os fatores de exploração biológica e as condições de uso e
ocupação da terra. Ele identifica as principais variáveis ambientais, delimita os
sistemas ambientais e indica a ecodinâmica dos sistemas ambientais definindo
capacidades de suporte com base nos critérios de Tricart (1977), que classifica o meio
em 3 categorias5, associando-as ao comportamento e à vulnerabilidade das condições
geoambientais em função dos processos degradacionais, possibilitando “detectar o
grau de vulnerabilidade do ambiente e sua sustentabilidade futura tendencial e
desejada.” (Souza e Carvalho, 2009, p. 15)
Aspectos físicos naturais do Ceará
O Ceará abriga uma variedade de domínios naturais e paisagísticos, fruto da
interação dos diferentes componentes naturais. Segue-se uma caracterização dos
componentes naturais do Estado de modo individualizado objetivando assim uma
melhor compreensão do arcabouço estrutural do território cearense.
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Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos.
Universidade Federal do Ceará.
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Universidade Estadual do Ceará.
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O modelo ecodinâmico de Tricart (1977) categoriza o meio em: ambientes estáveis, ambientes de
transição ou intergrades e ambientes fortemente instáveis.
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Geologia
Apresenta uma significativa parte do seu território sob o domínio do embasamento
cristalino, abrangendo toda a depressão sertaneja. Nos limites com os outros estados
verificam-se estruturas geológicas sedimentares, e no litoral a acumulação recente de
sedimentos (tercio-quaternário). De acordo com Souza (2005, pp. 128-129) A
diversidade estrutural e litológica tem implicações diretas no desenvolvimento de
relevos próprios dos núcleos cratônicos, de bacias sedimentares com diferentes
modelos de estratificação e das coberturas detríticas que revestem a área litorânea. Os
reflexos geológicos incidem igualmente sobre a grande diversidade de solos e
disponibilidade de recursos hídricos de superfície e subsuperfície. Como tal, interferem
no quadro fito-ecológico local e nas potencialidades dos recursos naturais disponíveis.
A estrutura geológica do Ceará é basicamente constituída de três tipos de terrenos,
o embasamento cristalino, proveniente do pré-cambriano, é a estrutura geológica mais
antiga, os compartimentos sedimentares datados do paleo-mesozóico, e constituindo
as grandes bacias sedimentares do nordeste, por ultimo os depósitos sedimentares
tercio-quaternários. Estes de formação mais recente.
Solo
Apesar de haver uma estruturação geológica não muito diversificada, os
condicionantes climáticos, a morfologia dos terrenos, a geologia e o tipo vegetacional
vão produzir uma vasta tipologia pedológica no Estado. Pereira e Silva (2005) apontam
a existência de 13 classes de solo para o estado. São elas: Latossolos VermelhoAmarelos, Argissolos Vermelho-Amarelos, Nitossolos Vermelhos, Chernessolo
Argilúvico, Luvissolos, Planossolos, Neossolos Flúvicos, Vertissolos, Neossolos Litólicos,
Cambissolos, Neossolos Regolíticos, Neossolos Quartzarênicos e os Gleissolos.
Vegetação
Fruto da interação entre os componentes naturais (clima, solo, recurso hídrico,
rochas e relevo) a vegetação do Ceará caracteriza-se pelo predomínio de plantas
decíduas, sendo a maioria xerófila, com exceção da vegetação dos relevos de altitude
mais significativa. Fernandes (1990) identificou dez unidades vegetacionais no estado:
Vegetação Pioneira Psamófila, Subperenifólia de Dunas, Subcaducifólia de Tabuleiro,
Caducifólia de Caatinga, Mata Úmida/Sub-úmida, Mata Seca, Vegetação de Várzea,
Vegetação Paludosa Marítima de Mangue, Carrasco e Cerradão.
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Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
Relevo
O relevo cearense é caracterizado por altitudes modestas, com a predominância de
terras abaixo de 200 m. Sendo exceções os maciços residuais e os planaltos
sedimentares, com pequenas extensões acima de 700 m. Se podem distinguir
nitidamente as planícies litorâneas, as depressões sertanejas de altitudes inferiores a
200m, os pés-de-serra que ficam entre 200 e 400m, e as serras, serrotes e planaltos,
que chegam a alcançar uma altitude de 400 a 1.000m acima do nível do mar.
A evolução do revelo cearense esta pautada nos regimes tectônicos e climáticos
diversos. A constante atuação dos agentes externos (condicionados pelas diferenças
climáticas do Estado) e os agentes internos ativos (tectônicas) e passivos (litologia e
estrutura) deram origem a diferentes formas de relevo.
Segundo Meireles (2005: 147) “a ação do clima, como fator dinâmico modelador do
relevo, foi fundamental para a origem de camadas intemperizadas, as quais foram
mobilizadas, em grande parte, pelos agentes fluviais, para os fundos dos vales,
alcançando as bacias sedimentares, a planície costeira e o mar”.
A respeito dessa variação morfoestrutural Sousa (1988 e 2003) apud Meireles
(2005) elaborou a mais completa classificação do revelo do Ceará, compartimentandoo em três domínios:
Domínio dos depósitos sedimentares cenozóicos – planícies fluviais,
formas litorâneas e tabuleiros;
Domínio dos escudos e maciços antigos – planaltos residuais e
depressão sertaneja;
Domínio das bacias sedimentares paleo-mezozóicas – chapada do
Araripe, chapada do Apodí, e Planalto da Ibiapaba.
Recursos Hídricos
O Estado do Ceará está dividido por elevações que se constituem divisores de água
e tem seus rios e riachos originados no próprio território que, só excepcionalmente,
escoam para fora do Estado.
Os cursos d'água estaduais são alimentados diretamente pelas águas pluviais e não
dispõem de qualquer ação de fontes perenes. As concentrações de chuvas em um
curto período de tempo impõem a característica de intermitência a grande parte dos
rios que correm no território estadual. Alguns já se encontram perenizados devido a
construção de barragens, como é o caso do rio Jaguaribe.
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No período de elevados índices pluviométricos, o regime das correntes d'água é de
acentuada torrencialidade. Logo depois de terminadas as chuvas, o escoamento
superficial cessa e, apenas nos rios de leito arenoso e poroso, formam-se lençol
freático situado próximo à superfície.
Além das características de intermitência imposta pelas chuvas, o regime fluvial
recebe influência da temperatura através da evaporação, da constituição geológica e
pedológica das áreas, do relevo e da vegetação. Nas serras e pés-de-serras, os cursos
d'água têm vazão assegurada durante a maior parte do ano pela favorabilidade desses
fatores.
No sertão, além das chuvas escassas e concentradas, o regime fluvial é de máxima
torrencialidade devido a litologia da área e descontinuidade da vegetação. Ademais, a
maior evaporação, dada à elevada temperatura reinante no Sertão, associa-se aos
fatores citados para tornar mais rápido e pouco duradouro o escoamento fluvial.
Clima
As características climáticas representadas pela sazonalidade das precipitações
mantêm uma relação direta com o comportamento fluvial (ZANELLA, 2005: 167). A
maior parte do Estado do Ceará apresenta clima semi-árido, excetuando-se as regiões
de elevadas altitudes e o litoral. As precipitações pluviométricas no Ceará
caracterizam-se por um período chuvoso curto e irregular e um período seco
prolongado. A sua localização territorial favorece uma intensa insolação o ano todo,
proporcionando elevadas temperaturas, características de climas tropicais quentes.
De acordo com Zanella (2005: 170) a atuação dos diferentes sistemas atmosféricos
estabelece a sazonalidade da precipitação. A altitude, a disposição do relevo e a
proximidade – ou distância – da superfície oceânica proporcionam as diferenciações
locais dos climas do estado.
De forma geral o estado apresenta temperaturas médias anuais elevadas e baixa
amplitude térmica, fruto de sua proximidade com o equador. Todavia, a influencia de
condicionantes locais - como relevo e a distancia com o oceano – determina
diferenciações térmicas e pluviométricas dentro de seu território.
As áreas que apresentam as mais baixas temperaturas e os mais elevados índices de
precipitação são condicionadas pela altitude, ocorrendo em pequenas porções das
regiões serranas, como é o caso da porção a barlavento do Maciço de Baturité, da
cuesta da Ibiapaba, das serras da Meruoca, Urubuetama e Pereiro. Há também
significativos índices de precipitação e temperaturas mais amenas em toda a área
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Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
litorânea, fruto a influencia da maritimidade e dos sistemas atmosféricos incidentes no
litoral. O restante do estado apresenta temperaturas elevadas, e baixos índices de
precipitação.
Referente à sazonalidade da precipitação Zanella (2005: 172) expõe que as chuvas
se concentram, principalmente nos meses de fevereiro/março/abril, quando o estado
fica sob a influência da Zona de Convergência Intertropical, principal sistema
atmosférico causador de precipitação.
Unidades Geoambientais do Ceará
Com base nos critérios geoambientais, Souza (2005) fez um importante estudo
sobre o estado do Ceará. A base de delimitação das unidades foi o aspecto
geomorfológico, já que, segundo o autor, “os limites do relevo e as feições do
modelado são passíveis de uma delimitação mais precisa” (p. 128), visando assim o
mapeamento das áreas cujos aspectos naturais apresentavam certa homogeneidade.
Cada área analisada possui características próprias de drenagem superficial,
ordenamento dos solos e padrões fisionômicos de vegetação. A compartimentação
considerou as diferentes paisagens e os componentes geoecológicos que compõem o
potencial natural e a exploração biológica derivada. No estudo de Sousa (2005) foram
destacados os potenciais e limitações de uso em cada unidade, assim como os
impactos ambientais.
Em cada unidade de paisagem é possível identificar as características naturais
dominantes, suas capacidades de suporte (potencialidades e limitações), assim como o
risco de ocupação. A delimitação das unidades ambientais foi realizada em
consonância com as similaridades dos aspectos naturais (relevo, vegetação, clima,
solo, hidrologia) do estado.
Abaixo apresentaremos, de forma sintetizada, as nove unidades geoambientais
elaboradas pelo autor supramencionado e detalhadas pela equipe da FUNCEME (2009)
na Compartimentação Geoambiental do Estado do Ceará.
Planície litorânea - Esta unidade é composta por terrenos de neoformação que
sofrem influência marinha, eólica, pluvial e fluvial. É constituída por faixas de praia,
campo de dunas, mangues, falésias, planície lacustre e áreas de acumulação inundável.
As condições climáticas variam entre semi-áridas e sub-úmidas com chuvas anuais de
700 a 1200 mm. Possui ocorrência freqüente de estuários e um bom potencial de
recursos hídricos subterrâneos. Apresentando-se como ambiente fortemente instável.
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Tabuleiros Pré-litorâneos - Possui uma superfície com suave inclinação
topográfica para a linha de costa. É constituído por sedimentos plio-quaternário da
formação barreira e dissecado por interflúvios tabulares. O topo é revertido por
vegetação de tabuleiro, caatingas litorâneas e encraves de serrado. Esta unidade tem
sido utilizada no fornecimento de materiais para construção civil, lavouras, pecuária,
agroextrativismo além de está passando por um intenso processo de expansão urbana.
A utilização inadequada pode provocar a impermeabilização do solo comprometendo a
carga hídrica. Outros problemas que afetam esta unidade são os processos erosivos
em áreas degradadas e mineração descontrolada.
Planícies fluviais - São constituídas por áreas amplas resultantes da acumulação
fluvial e sujeitas a inundações periódicas, estando situadas nas bordas dos rios. Nelas
identificam-se solos aluviais profundos e com drenadem deficiente e eventuais
problemas de salinização. Tem como uso predominante o agro-extrativismo. Além
disto, esta unidade tem sido utilizada em atividades e mineração, agricultura irrigada,
pesca artesanal e turismo. O mau uso pode causar a degradação da mata ciliar,
poluição dos recursos hídricos, assoreamento dos rios e salinização do solo.
Baixos planaltos sedimentares: chapada do Apodi - Possui uma superfície
baixa (níveis altimétricos inferiores a 100m), formados por rochas da bacia mesozóica
potiguar, capeada por calcários sobrepostos ao aos arenitos da formação Açu. Possui
clima semi-árido quente. Os solos possuem alta fertilidade natural e topografias
favoráveis, além de um bom potencial de águas subterrâneas. Apesar disto, possui
baixo potencial de águas superficiais e inexistência de locais propícios aos barramentos
dos rios. A exploração do calcário de maneira descontrolada pode causar danos no
ambiente.
Altos planaltos sedimentares - Constituem-se áreas com superfície plana e
suavemente inclinada, condicionada por estruturas geológicas de bacias sedimentares
paleozóicas ou mesozóicas. Possui níveis altimétricos entre 750-900m e uma
drenagem superficial quase ausente, com um razoável potencial de águas
subterrâneas. Pode possuir vegetação de caatinga arbustiva densa, carrasco ou até
matas pluvio-nebulares ou serrado. Nessa compartimentação se incluem o Planalto da
Ibiapaba e a Chapada do Araripe
Maciços residuais - Esta unidade é constituída por áreas serranas dispersas
pela depressão sertaneja e localizadas próximas ao litoral, possuindo níveis
altimétricos entre 600-900m. Os relevos são fortemente dissecados e possui uma rede
fluvial densa com padrão dendrítico. Possuem argissolo vermelho-amarelo nos relevos
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Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
colinosos e nas lombadas com fertilidade natural variando de média a alta. Nas
vertentes mais íngremes e nas cristas ocorrem solos rasos e afloramentos rochosos.
Possuem revestimento vegetal formado por matas pluvio-nebulares remanescentes e
um uso agrícola com lavouras variadas (cafeicultura, bananicultura, horticultura).
Maciços residuais: serras e secas – São formaddos por áreas serranas dispersas
pela depressão sertaneja, localizada nos sertões distantes da faixa litorâneas com
níveis altimétricos entre 500 e 700m. Possui uma rede fluvial densa com padrão
dendrítico. Nas colinas há predominância de argissolos vermelho-amarelo com
pequena espessura e fertilidade natural variando entre média e alta. Nas vertentes
mais íngremes e nas cristas ocorrem neossolos litólicos e afloramentos rochosos. O
revestimento vegetal primário é de mata seca ou de caatinga arbórea, fortemente
descaracterizada pelo uso agrícola. Estas unidades vêm passando por um elevado
processo de erosão motivado pelo desmatamento indiscriminado, o que provoca
perda de solo e empobrecimento da biodiversidade.
Sertões do Sul - Esta unidade possui superfície pediplanada nas depressões
sertanejas semi-áridas ou subúmidas secas, truncando rochas cristalinas do complexo
cristalino em níveis altimétricos entre 250-400m. O escoamento superficial tem rede
de drenagem com padrão subdendrítico e com eventuais controles estruturais, além
da predominância de regimes fluviais intermitentes sazonais. Possui argissolos
vermelho-amarelo e luvissolos no topo. As altas vertentes das colinas sertanejas são
revertidas primariamente por caatinga arbustiva, nos fundos dos vales as planícies
fluviais são revestidas por mata ciliar. Esta área possui um uso agro extrativo com
predominância das atividades de pecuária extensiva. Entre os principais problemas
gerados pela ocupação nestas áreas está a susceptibilidade à degradação do solo a à
desertificação.
Sertões do Centro-Norte – Constituem as áreas de superfície pediplanada nas
depressões sertanejas semi-áridas ou subúmidas secas, possuindo níveis altimétricos
entre 100-250m. A superfície aplainada tem inclinação suave em direção ao litoral com
baixa amplitude térmica entre os interfluvios sertanejos e fundos dos vales. Possui um
escoamento superficial com rios intermitentes sazonais com padrão subdendrítico. Os
solos podem ser planossolos e neossolos litólicos em afloramentos rochosos nas áreas
erodidas e aluviais nas planícies fluviais. No que se refere à vegetação há o
recobrimento de caatinga arbóreo-arbustiva densa e eventualmente aberta. Esta
vegetação está fortemente degradada pelo uso agroextrativo e pecuária extensiva.
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Considerações finais
O Ceará apresenta uma acentuada heterogeneidade paisagística, fruto das
dinâmicas ambientais diversificadas ao longo do território. Dessa forma, apresenta
sistemas ambientais diversificados, cada qual com potenciais ecológicos, e exploração
antrópica singulares. Entender e reconhecer tais sistemas fornece subsídios para um
melhor planejamento territorial, visto que, traz informações basilares para direcionar
as atividades de uso e ocupação da terra, assim como os tipos de exploração dos
recursos naturais de determinada área. Além de expor o grau de degradação dos
sistemas ambientais, identificando suas causas. Há exemplo do Ceará, Souza e
Carvalho (2009:12) afirmam que “os sistemas ambientais se apresentam fortemente
degradados em face da expansão histórica das fronteiras agrícolas e do extrativismo
vegetal desordenado”.
Através deste trabalho podemos evidenciar as substantivas contribuições da
aplicação do geossistema como aporte metodológico para a Geografia Física. A
utilização desta metodologia por pesquisadores locais tem possibilitado a realização de
estudos ambientais de maneira integrada, fornecendo uma percepção mais ampla do
meio natural cearense, além de ser um estudo base para pesquisas posteriores a
respeito dos condicionantes e recursos naturais. Utilizando a abordagem geossistemica
na delimitação e reconhecimento dos recursos naturais foi possível detectar as
unidades geoambientias do Estado. Estas análises fornecem subsídios para a
compreensão das potencialidades e limitações dos nossos recursos naturais.
A delimitação das unidades geoambientais assim como as informações que levaram
a tal, tornam-se ferramentas chave nos estudos de impacto ambiental vindouros,
permitindo diagnósticos mais condizentes com a realidade, e possibilitando ao mesmo
tempo a predição, avaliação e delineamento de procedimentos de caráter preventivo
na mitigação de efeitos julgados negativos ao meio ambiente.
No amplo cenário científico, a compartimentação geoambiental, através da
abordagem geossistêmica, pode ser considerada como possuidora de um grande
potencial para estudos futuros em Geociências, Geografia Física e na análise
ambiental, abrindo caminhos metodológicos para desenvolver a compreensão da
teoria e da realidade ambiental posta.
O processo de investigação para uma compartimentação geoambiental do território
cearense aprofundou e difundiu o conhecimento da geografia física do Estado.
Servindo de subsídio ao planejamento, implementação e desenvolvimento de políticas
publicas ou de ações de iniciativa privada que necessitem de suporte nas informações
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Tema 3 – Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
sobre os recursos naturais, fornecendo informações de caráter interdisciplinar,
sintetizadas, e com abordagens multiescalares, possibilitando a prognose a respeito da
dinâmica dos sistemas ambientais delimitados e estudados, assim como a
discriminação de unidades operacionais de planejamento.
As informações levantadas, desde que utilizadas de maneira adequada podem ser
vaporosas para mitigação dos problemas ambientais no estado do Ceará, auxiliando na
formulação do planejamento governamental, na definição de políticas e diretrizes de
distribuição e gestão dos recursos naturais, visto que, o processo de uso e ocupação se
dá em consonância com a disponibilidade de recursos naturais. A Compartimental
Geoambiental do Estado do Ceará é basilar para o diagnóstico e acompanhamento dos
recursos naturais renováveis e das condições ambientais.
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