Seu carrinho de supermercados vai continuar a desmatar e queimar a Amazônia? Em 1986 quando lançamos a memorável campanha “Estão tirando o verde da nossa terra” da Fundação SOS Mata Atlântica não percebi o grande erro que este chamado para a ação continha. Por quê “estão tirando o verde”? Não será melhor assumir, de uma vez por todas: “nós estamos tirando o verde”? Por quê os fazendeiros, os grileiros, os pistoleiros, os garimpeiros, os bandoleiros de sempre estão tirando o verde da Amazônia e produzindo bife, madeira e carvão? Certamente porque há um número crescente de pessoas que consume avidamente estes produtos e aceita pagar o preço de sua ilegalidade e a falta de compromisso socioambiental. Você é diariamente bombardeado pela mídia: a Amazônia está queimando, o índice de desmatamento subiu, o índice desceu... Pura verdade. Vinte por cento da maior floresta tropical do planeta virou pó (ou melhor, gases para aumentar o efeito estufa). Na região onde moro, nordeste do Pará, 95% se foi (pior que a Mata Atlântica!). E qual é a sua reação? O que você faz em seu dia-a-dia? Segundo pesquisa da Ipsos para o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (abril de 2007), 58% dos entrevistados respondem “não faço nada” à pergunta “como você contribui para evitar os efeitos do aquecimento?” Você nada faz por que não sabe o que fazer? Ou nada faz por que não quer fazer algo contra o aquecimento global? Você acredita que o aquecimento global irá lhe atingir ou isto é um problema para os “outros”? O mundo fala que cerca de ¼ do aquecimento global é causado pelo desmatamento e queima das florestas tropicais. O Brasil é o campeão de desmatamentos e queimadas. Você já se perguntou a razão desta piromania nacional? O desmatamento é para o plantio de pastagens para a boiada e as queimadas anuais são para limpar os pastos de maneira barata e rápida. Em bom português: é para que você tenha seu bifinho de cada dia e o mais barato possível. E você se pergunta: quando é que vamos dar nomes aos bois? Você continuaria a freqüentar o Carrefour se soubesse que um dos maiores grupos econômicos do Brasil e da França possuía até há poucos dias uma fazenda com mais de 18 mil cabeças de gado na Amazônia e que no Mato Grosso inteiro o Carrefour engorda mais de 100 mil cabeças? Vendeu a fazenda mas continua a comprar da mesma forma que fazia antes. O que você faria se a soubesse que uma boa parte da carne que você encontra no Wall Mart, o maior empregador privado do mundo, ou o Pão de Açúcar, um dos maiores do país, vem da Amazônia? Você mudaria de atitude? Você passaria a perguntar ao açogueiro “e aí, Manoel, de que bioma vem este filé?” Ou a questão é mais grave – o boi destruiu a Mata Atlântica, a Caatinga e agora come o bioma do Cerrado e da Amazônia? E o que você faria se soubesse que o IFC – International Finance Corporation, o braço do Banco Mundial voltado para a iniciativa privada, acaba de aprovar um empréstimo de R$ 180 milhões para a Bertin instalar um matadouro em Marabá, no coração da Amazônia. Marabá, a terra das castanheiras, que desde a instalação do pólo de Carajás viu metade de suas florestas derrubadas (a lei permite o máximo de 20%). Você comprará carnes da Bertin no açougue mais próximo de sua casa? Em 50 anos o rebanho da Amazônia aumentou de 1 milhão para 71 milhões de cabeças (porque você prefere comer carne sempre barata). Afinal, o aquecimento global faz alguma diferença para você? O que você considera uma empresa responsável? Sustentável? Compromissada? Voltando à pergunta do início do artigo, “estão” tirando o verde de nossa terra” ou “estamos tirando o verde de nossa terra”? Quem é o destino final – quem toma a última decisão? Seu carrinho de supermercados vai continuar a desmatar e queimar a Amazônia? João Meirelles Filho, Belém, agosto de 2007