índios urbanos: estratégias de territorialização em

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
ÍNDIOS URBANOS: ESTRATÉGIAS DE TERRITORIALIZAÇÃO EM
CAMPO GRANDE/MS
MARINA CÂNDIDO MARCOS1
Resumo: A presença indígena na cidade foram descritas, inicialmente, nos estudos feito pelo
pioneiro Roberto Cardoso de Oliveira (1968), como os Terena nas cidades de Campo Grande e
Aquidauana em Mato Grosso. Por meio de seu estudo foi constatado que as primeiras Terena
chegar à cidade de Campo Grande foram duas irmãs, Juliana e Carolina, que vieram para trabalhar
como empregadas domésticas, em 1920. Entretanto, ambas constituíram famílias conjugais
interétnicas. A partir desse contexto histórico, compreender a presença indígena nas cidades traz
alguns questionamentos no que se refere a sua identidade e a sua relação/produção no/com o
espaço urbano, pois passa a ser pensado como um processo de desagregação cultural, aculturação,
tornar-se igual a outro e em consequência a perda de sua cultura. Imaginário nacional que foi
construída ao longo da história.
Palavra-chave: índio urbano; territorialização; Campo Grande.
INTRODUÇÃO
As diversas organizações e articulações indígenas existentes em
Campo Grande, Mato Grosso do Sul, acabam oferecendo a realização ou ainda
reforço da identidade étnica dos indígenas.
Dados estatísticos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE/2010) totalizam os chamados Índios Urbanos em aproximadamente 5.657.
Número que tem aumentado cada vez mais. E o trabalho de se fazer visível na
cidade, se forma através dessas articulações, trabalhos e projetos ligados ao
governo. E um desses fatores que somam junto com essa visibilidade é o fator das
identidades étnicas, o processo de afirmação da identidade social.
E o presente trabalho vai trabalhar com esse enfoque das identidades
étnicas e os meios que os indígenas urbanos buscam para “alcançar” a visibilidade e
a promoção de sua cultura.
1
Acadêmica do programa de Pós-Graduação em Geografia pela Universidade Federal da Grande
Dourados. E-mail de contato: [email protected]
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Dessa forma, tentar compreender como a dinamicidade de identidade étnica
com os Terena que migram para a cidade, que estabelecem vínculos afetivos e
aqueles que de outra geração nasceram na cidade e através de políticas publicas
reafirmam sua “identidade indígena”.
CATEGORIAS ATRIBUÍDAS AO OUTRO
No Brasil, são utilizados muitos termos para categorização de grupos
sociais. Alguns de maneira evidentes de identidade étnica, como: Índio, mulato,
mestiço ou negro. Outros ainda indicam a categorização através da região em que
vivem, como: Carioca, Sertanejo, Nordestino, Gaúcho, Paranaense, entre outros. E
ainda aqueles que se refere à classe social, como: rico, pobre, caipira, entre outros.
Essa classificação se torna um tanto problemática quando se faz uma
pesquisa de campo, um trabalho empírico, pois não são encontradas no seu uso
cotidiano com aquele que coincide e definido pelas “autoridades” linguísticas e não
tem relação nenhuma com alguns conteúdos já trabalhos no campo acadêmico.
Dessa forma, o termo “índio” se mostra ambíguas. Designa ao índio o
habitante de terras americanas quando chegam os europeus. E também, adquire-se
uma conotação depreciativa, que se torne ate o insulto. Assim como para designar
ao índio que vive na cidade, nesse caso, trago para a cidade de Campo Grande, em
que os índios urbanos, são constantemente chamado de “Bugre”, que chegou a
encarnar o significado pejorativo de individuo em que não se pode confiar, grosso,
agressivo.
Entretanto com democracia brasileira, através de espaço político para a
formação das organizações indígenas atuais nos anos de 1970 a 1980, o termo
“índio” acabou adquirindo um instrumento de representação social e de ação
política, tornando assim protagonista de sua própria política. Como muito bem
coloca Cruz, sobre agentes e forças sociais.
Esse conjunto de agentes e forças sociais,
historicamente
marginalizados
e
invisibilidade no espaço público, torna-se
protagonista na luta por direitos e justiça em
todo continente, como sugere a feliz
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expressão de Eder Sader (1988): “novos
personagens entram em cena”. Muitos
desses
“novos”
personagens,
agora
protagonistas, eram tidos como forças
sociais que pertenciam ao passado e que,
inevitavelmente, seriam incorporados ou,
simplesmente, desapareciam no processo
de modernização capitalista que a região
tem vivenciado nos últimos cinquenta anos.
Contrariando esse diagnóstico, camponeses,
indígenas, afrodescendentes, longe de
serem personagens anacrônicos, torna-se
protagonistas da invenção e da construção
de outros possíveis futuros. (CRUZ, pág. 38,
2014).
As populações da cidade Campo Grande utiliza esse termo Bugre para se
referir aos índios de maneira depreciativa, inferiorizando e discriminando sua
condição de cultura diferenciada. Essa mesma denominação é utilizada e se repete
em outras cidades como Aquidauana, Miranda, Sidrolandia ou ainda nas cidades do
cone sul do Estado, como por exemplo, Dourados e Naviraí.
A cidade de Campo Grande, atualmente possui aproximadamente 6 mil índios,
distribuídos em 5 aldeias urbanas (Marçal de Souza, Darcy Ribeiro, Água Bonita,
Tarsila do Amaral e Indubrasil), e há ainda, registrado um acampamento indígena
Água Bonita, onde 128 famílias indígenas reivindicam a construção do conjunto
habitacional. (ver foto).
Foto: Acampamento Indígena Água Bonita. Marina Cândido Marcos, 2014.
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Através dessa dinamização dos Terena na cidade de Campo Grande é que
vai construindo e refortalecendo os processos de afirmação de identidade indígena,
e implicam estratégias sociais especificas, como valorização e promoção da cultura
indígena no contexto urbano e assim desconstruindo essa imagem de Bugre dado
aos indígenas Terena. E há outras estratégias sociais que a seguir iremos nos ater,
que não foge a questão de valorização da cultura, mas também de afirmação de
identidade, enquanto ser Terena.
Gerações e processo de identidade
Importante distinguir os tipos de integração que foram realizadas pelas
diversas gerações de índios na cidade de Campo Grande, pois as maneiras de
encarar sua identidade são diversas, como a maneira diante do outro, da sociedade
envolvente. Como a utilização de diacríticas étnicas, como a língua, as cerimônias, a
vida familiar, sua relação com a sua aldeia e os parentes, a percepção de política,
entre outros.
Quando se fala em gerações, referimos a diferentes ondas de migrações
quanto a grupos que já são “filhos da cidade”, frutos dessa geração de migrações.
Essa primeira geração que migrou para cidade sofreu com os efeitos do
choque culturais diferentes, mas mesmo assim, defendeu-se reforçando sua
identidade através de um certo tipo de resistência étnica, utilizando referentes
próprias da sua tradição. E não conseguiu integrar no seu mundo cultural os
referentes de sua tradição a matriz urbana na qual vivia sua vida cotidiana.
O fato étnico, nessa primeira geração, passa antes de tudo pela afirmação
do “deve ser”, traduzido numa prática inserida nos valores tradicionais do grupo a
qual pertencia. Que são maneiras de agir e reivindicar enquanto étnicas, e nessa
maneira a utilização da língua que se manifesta como um elemento fundamental de
afirmação de identidade. Em que são cobradas para gerações posteriores, a
utilização da língua. Que passa por afirmação de identidade quanto para sua própria
comunicação entre os grupos.
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A segunda geração corresponde aquela que foi ou que ainda são integradas ao
processo de matriz cultural. Muitos integrou – se nos diferentes setores de trabalho
da sociedade. Como mercado de serviços, mercado informal de serviços como
faxineiras em casas, segurança ou ainda como funcionários de agencias
governamentais.
Quando suas atividades não possuem ligação direta com sua condição
étnica, como organizações indígenas, serviços públicos, etc. e aqueles que
mencionamos acima, as manifestações da sua identidade étnica tendem a
desaparecer nos espaços públicos. O que acontece o contrário, quando se trata de
trabalhos no que se refere a organizações indigenistas tanto privadas como
governamentais, como organizações indígenas, onde o fator étnico é um elemento
fundamental em favor do trabalho realizado. Onde o sociólogo Javier A. Lifschitz faz
uma discussão interessante sobre os agentes externos, em que ele traz o tema de
neocomunidades e comunidades tradicionais e que tem similaridade com essa
última questão. Vejamos:
As comunidades tradicionais vêm sendo um
âmbito privilegiado de políticas públicas e de
instituições e agências privadas (agências
culturais, ONGs, turismo cultural, dentre
outras), e que estas imprimiram mudanças
na dinâmica comunitária. Principalmente,
com a difusão de ações e programas
voltados “reconstrução” de identidades
étnicas, questão que além de ser inédita do
ponto de vista cultural tem desdobramentos
no plano político. (LIFSCHITZ, 2011, pág.
13)
E é a partir dessa última geração, que a modernidade dos processos de
identidade grupal se mostra visível. Aparecendo de forma de discursos que consiste
em palavras de reafirmação étnica e também por símbolos e ainda instituições
(nesse caso organizações) que se coloca através de instrumentos de afirmação de
estratégias para a representação na sociedade.
Exemplificamos aqui eventos
que nessa modernidade, valorizam o “ser indígena” em contexto urbano, como é o
caso do Concurso de beleza indígena, em que meninas Terena, desfilam sua
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“beleza indígena” usando roupas características de sua etnia. Entretanto,
considerando estarem no espaço urbano, às modelos devem seguir o padrão de
beleza exigida pela sociedade (alta, magra, etc) e usando, às vezes de forma
estereotipada, os adornos que deveriam ser de sua cultura, mas estas se misturam.
Vejamos a foto abaixo:
Foto: Mulheres Terena (retirada do site índio educa)
Faremos uma análise a partir dessas fotos. Ambas as fotos são de mulheres
Terena. Como podemos observar, há nitidamente, um “confronto” de gerações. Na
primeira foto, as senhoras Terena se preparam para a dança da Ema (dança
tradicional das mulheres Terena), com as roupas característica das próprias Terena,
pois é usado dessa forma desde sempre. Na segunda foto, a Terena, que esta
desfilando para um corpo de jurado (que em sua maioria, é “julgado” por outras
mulheres não indígenas, que são referencia em “beleza”) a sua “beleza indígena”,
em que é considerada, a roupa tradicional de sua etnia e suas características
enquanto “ser indígena”.
Muitas são as questões que podemos levantar, como em uma dança cultural
das mulheres Terena, não se pode usar o cocar, este cabe apenas aos homens. E
na segunda foto, ela usa o cocar, e outros adereços não pertencentes à cultura
“original”. Percebe-se que essa mudança, essa ressignificação de identidade Terena
passa por essa dinamicidade de culturas que se misturam. Pois muitos dos colares
que ela usa, os brincos e a saia são de outras etnias, sobretudo, dos indígenas da
região nordeste. A mulher Pataxó usa desses mesmos adereços.
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Há entre algumas mulheres indígenas, há um debate sobre essa nova
maneira de “promover” a cultura indígena. Há quem são favoráveis e outras as
discordem por outros fatores. Aqui traremos algumas das opiniões de mulheres
indígenas de algumas etnias. (Todas as entrevistas feitas por facebook).
“Penso que essa "história" pode colocar a real beleza indígena - na sua naturalidade,
numa beleza do capitalismo de magreza, de top models essas coisas já que miss
segue essa trilha, ou seja, numa vertente que não convém com as realidades das
belezas das mulheres indígenas. A Beleza da Mulher Indígena está nos aspectos do
seu cotidiano, no carinho em amamentar seus filhos, na pintura tradicional... bem
assim penso eu... agora vai saber mesmo para que serve a miss indígena?”
Samanta Tsitsina - do povo indígena Xavante
“Penso que esses concursos deveriam priorizar principalmente a beleza cultural, os
aspectos de cada cultura independente da beleza física, mas a própria expressão
cultural de cada candidata e sua etnia. E que cada candidata também valorizasse os
artesanatos, grafismos, colares, tiaras ou cocares de seu próprio povo. E realmente
concordo quando se diz que “essa "história" pode colocar a real beleza indígena - na
sua naturalidade, numa beleza do capitalismo”. Afinal o que esta sendo priorizado
nesses concursos ? a beleza indígena natural ou a representação da beleza
indígena numa perspectiva não indígena?” Renata Machado – do povo indígena
Tupinambá
“Marina você sabe que questiono algumas coisas. Batendo e assoprando, eu acho
realmente incrível, como indígenas se apropriam de muitas coisas para mostrar a
sua cultura. Esses concursos também fazem parte disso. 'apropriação'. O grande
problema é que vivemos num país onde a erotização é enorme, a mulher é colocada
na mídia como objeto sexual e por aí vai. Além do embranquecimento da beleza e
outras 'cositas más', é preciso tomar cuidado. Cautela, sempre...” Naine Jesus – do
povo indígena Terena
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“Na verdade antes de mais nada estou buscando compreender esse fenômeno que
se prolifera e vejo como a coisificação do corpo da mulher indígena, o meu
questionamento é na busca de entender para que serve isso? Caso, alguém possa
ter uma explicação razoável seria bom. Acho que nós mulheres indígenas um pouco
mais esclarecidas temos que ter o nosso senso crítico,assim podemos contribuir
com aquelas que ainda não tem esse olhar, aposto que esse tipo de coisa se faça
sem uma reflexão.Sei-la, eu tbm não estou aqui para dizer como deva ser ou não,
estou, somente tentando entender.” Isabel Taukane – do povo indígena KuraBakairi.
Muitas dessas questões dessa nova geração em reafirmar sua condição
étnica são colocadas em cheque, muitas vezes, dessa primeira geração, ou ainda
por aqueles que migraram, pois é sempre cobrado as suas matrizes culturais, como
a língua. Que é um dos elementos para se reconhecer como membro de uma etnia
de origem. E a partir disso, entra esse “confronto” de se manter o que é “original” e a
dinamicidade das culturas, a ressignificação, a hibridização.
E cada vez mais, isso se torna visível, pelas varias organizações indígenas
que promovem essas mudanças de representação indígena, essa nova forma de
produção cultural. Promovido pelos próprios indígenas com base nos agentes
externos que lançam essa nova forma de reconstrução de saberes e práticas. Como
bem coloca LIFSCHITZ,
São repertórios muito diversos, mas
possuem em comum a características de
utilizar “meios modernos” a serviço da
tradição. Exemplo deste tipo vem se
espalhando em comunidades de todo o país,
constituindo fenômenos contemporâneos de
reconstrução cultural que envolve, por um
lado, comunidades com tradições e saberes
e, por outro, “agentes modernos” que
objetivam em recriá-los. (LIFSCHITZ, 2011,
pág. 95)
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Todas essas manifestações de identidade até o momento, só pode ser
construída a partir dos movimentos indígenas que mencionamos anteriormente. Pois
através dessa mudança de visão sobre os povos indígenas, sobre a articulação que
se vinha fazendo desde os anos 80, houve muitas políticas especificas para atender
a demanda e que se estende até os dias atuais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho apresentado trata de questões de identidade que se
manifesta em diversas formas dentro do contexto urbano. Nesse casso Campo
Grande, que tem vários segmentos de grupos indígenas Terena que vieram de
diversas partes do Estado. Temos segmentos das mulheres indígenas e sua vinda
para a cidade, sobre tudo daquelas que vivem em aldeias urbanas e trabalham
como feirantes.
Campo Grande é o unido estado brasileiro que forma em regiões periféricas
as suas cinco aldeias urbanas. E dessa maneira o estudo presente se torna mais
amplo. Pois é levando em consideração como a questão da identidade, sua cultura e
suas gerações e que esta em processo de construção.
Embora estejam contemplados no texto, os índios urbanos podem ser
subdividas em vários outros grupos, levando em consideração o fator da língua e
cultura matriz. E é importante levar isso em consideração quando se trabalha com
índios urbanos.
REFERENCIAS BIBLIOGRAFIAS
CRUZ, V. do. C. Movimentos sociais, identidades coletivas e lutas pelo direito ao
território na Amazonia. IN: SILVA, o.; SANTOS, E; COELHO NETO, A. (ORGs),
Identidade, território e resistência. Rio de Janeiro: Consequencia, 2014
LIFSCHITZ, J. A. Comunidades tradicionais e neocomunidades. Rio de Janeiro:
Contra capa, 2011.
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