Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: o Museu

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UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA
Faculdade de Arquitectura e Artes
Mestrado Integrado em Arquitectura
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva:
o Museu Arqueológico do Foz Côa
Realizado por:
Humberto José Barros da Silva
Orientado por:
Prof. Doutor Arqt. Fernando Manuel Domingues Hipólito
Constituição do Júri:
Presidente:
Orientador:
Arguente:
Prof. Doutor Arqt. Joaquim José Ferrão de Oliveira Braizinha
Prof. Doutor Arqt. Fernando Manuel Domingues Hipólito
Prof.ª Doutora Arqt.ª Helena Cristina Caeiro Botelho
Dissertação aprovada em:
15 de Julho de 2015
Lisboa
2015
U
N I V E R S I D A D E
L
U S Í A D A
D E
L
I S B O A
Faculdade de Arquitectura e Artes
Mestrado Integrado em Arquitectura
Um paradigma do território enquanto matéria
construtiva: o Museu Arqueológico do Foz Côa
Humberto José Barros da Silva
Lisboa
Junho 2015
U
N I V E R S I D A D E
L
U S Í A D A
D E
L
I S B O A
Faculdade de Arquitectura e Artes
Mestrado Integrado em Arquitectura
Um paradigma do território enquanto matéria
construtiva: o Museu Arqueológico do Foz Côa
Humberto José Barros da Silva
Lisboa
Junho 2015
Humberto José Barros da Silva
Um paradigma do território enquanto matéria
construtiva: o Museu Arqueológico do Foz Côa
Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitectura e
Artes da Universidade Lusíada de Lisboa para a
obtenção do grau de Mestre em Arquitectura.
Orientador: Prof. Doutor
Domingues Hipólito
Lisboa
Junho 2015
Arqt.
Fernando
Manuel
Ficha Técnica
Autor
Orientador
Humberto José Barros da Silva
Prof. Doutor Arqt. Fernando Manuel Domingues Hipólito
Título
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: o Museu
Arqueológico do Foz Côa
Local
Lisboa
Ano
2015
Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa - Catalogação na Publicação
SILVA, Humberto José Barros da, 1981Um paradigma do território enquanto matéria construtiva : o Museu Arqueológico do Foz Côa /
Humberto José Barros da Silva ; orientado por Fernando Manuel Domingues Hipólito. - Lisboa : [s.n.],
2015. - Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura, Faculdade de Arquitectura e Artes da
Universidade Lusíada de Lisboa.
I - HIPÓLITO, Fernando Manuel Domingues, 1964LCSH
1. Arquitectura de museus
2. Arquitectura vernácula - Portugal
3. Museu do Côa (Guarda, Portugal)
4. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Teses
5. Teses – Portugal - Lisboa
1.
2.
3.
4.
5.
Museum architecture
Vernacular architecture - Portugal
Museu do Côa (Guarda, Portugal)
Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Dissertations
Dissertations, Academic – Portugal - Lisbon
LCC
1. NA6690.S55 2015
Ao meu pai, postumamente.
“A presença de certas obras provoca em
mim
algo
misterioso.
Parecem
simplesmente estar lá. Uma pessoa não
lhes dá nenhuma atenção especial. E, no
entanto, é quase impossível imaginar o
lugar onde estão sem elas. Estas obras
parecem estar firmemente ancoradas ao
chão. Funcionam como parte integrante do
seu espaço envolvente e parecem dizer: “Eu
sou tal como tu me vês e daqui faço parte”.
Paisagens completadas.
ZUMTHOR,
Peter
(2009)
–
Pensar
arquitetura. Barcelona: Editorial Gustavo
Gili, p. 17
APRESENTAÇÃO
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva:
O museu arqueológico do Foz Côa
Humberto José Barros da Silva
Definindo-se como suporte de todos os fenómenos pertencentes ao mundo inteligível,
o território é antes de tudo uma extensão de terra que aparta e define fronteiras
físicas, culturais, históricas e antropológicas. Esta estratificação territorial traduz-se
numa diversidade cultural que exige abordagens distintas de apropriação e ocupação
do solo.
No âmbito da arquitetura, a inevitável ligação de um edifício ao terreno confere ao
território um papel fulcral no ato de projeto. As suas contingências determinarão a
qualidade do edifício, estabelecendo-se uma relação afetiva entre a obra e a sua
envolvente. A presente investigação estuda a emotividade que certos edifícios
transmitem na relação tectónica que estabelecem com o contexto físico em que se
inserem. Estuda-se a contribuição que alguns projetos portugueses e figuras
proeminentes como Vittorio Gregotti, Fernando Távora, Álvaro Siza e Souto de Moura
tiveram para a compreensão dos mecanismos que determinam esta relação telúrica
entre a arquitetura e o lugar, para depois focar o estudo no museu arqueológico do
Foz Côa, que é um exemplo paradigmático da condição existencial do território na
arquitetura. Tenta-se perceber em que medida é que a matéria tectónica, histórica e
cultural do território influenciou a materialidade do edifício.
Palavras-chave: Território, Matéria, Construção, Materialidade, Metáfora, Tectónica,
Lugar, Contexto.
PRESENTATION
A paradigm of the territory as a constructive matter:
The archaeological museum of Foz Coa
Humberto José Barros da Silva
Defining itself as a support of all phenomena belonging to the intelligible world, the
territory is first of all an extension of land that separates and defines physical, cultural,
historical and anthropological boundaries. This territorial stratification translates into a
cultural diversity that require different approaches to appropriation and land use.
In architecture, the inevitable connection of the building to the ground gives the territory
a crucial role in the project act. Their contingencies shall determine the quality of the
building, establishing an affective relationship between the building and the site. This
research studies the emotions that certain buildings transmits in the tectonic
relationship they establish with the physical setting where they are located. It´s studied
the contribution that some portuguese projects and prominent characters like Vittorio
Gregotti, Fernando Tavora, Siza and Souto de Moura had to understand the
mechanisms that determine this telluric relationship between architecture and the site,
to then be focused on the study at the archaeological museum of Foz Coa, which is an
paradigmatic example of existential condition of the territory in architecture. It´s tried to
understand in what extent is that the tectonically, historical and cultural matter of the
territory influenced the materiality of the building.
Keywords: Territory, Matter, Construction, Materiality, Metaphors, Tectonics, Site,
Context.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1 – Museu do Côa - O betão enquanto metáfora do xisto. (Ilustração nossa,
2015) .......................................................................................................................... 31
Ilustração 2 – As Piscinas de Leça, Siza Vieira – A simbiose entre as plataformas de
betão aparente e as rochas. (Siza, 1999, p. 60).......................................................... 31
Ilustração 3 – Signal Box, Suíça – A relação entre a “pele” de cobre do edifício e os
carris da linha férrea. (Herzog & de Meuron, 1996, p.34) ............................................ 31
Ilustração 4 – Termas de Vals, Suíça, Peter Zumthor – A relação entre a pedra
(basalto) e a montanha. (Vagón 293, 2015) ................................................................ 31
Ilustração 5 - The Esthetic- “Internal courtyard, Kawall Kanjiro house, Kyoto, Japan
(Oliver, 1997, p.5) ....................................................................................................... 34
Ilustração 6 - The Anthropological - “Anthropomorphism in the idealized plan of a
Dogon settlement” (Oliver, 1997, p. 7) ........................................................................ 34
Ilustração 7 – The Espacial – “Plan of a Mongol yurt showing spatial differentiation
including altar, male and female quadrants. Variants have been recorded”. (Oliver,
1997, p. 61) ................................................................................................................ 35
Ilustração 8 – “Environment” – “Nine Climatic zones for Vernacular architecture.
(Oliver, 1997, p. 128) .................................................................................................. 36
Ilustração 9 - “Desert”- Papago summer village with round house (vahkl) and shade
roof (ramada), Southern Arizona, USA. (Oliver, 1997, p. 133) .................................... 37
Ilustração 10 - “Continental”- Winter hut of the Saml, orthern Scandinavia. (Oliver,
1997, p. 131) .............................................................................................................. 37
Ilustração 11 - “Mediterranean”- “Shaded whitewashed street Naxos, Cyclades Islands
(Oliver, 1997, p. 135) .................................................................................................. 37
Ilustração 12 - “Montane”- Plan, sections and elevations of a double enclosure,
aerodynamic shepherd’s hut on montane pasture, Velika Plana,SubAlps. (Oliver, 1997,
p. 137) ........................................................................................................................ 37
Ilustração 13 - “Subtropical”- “Painted wooden house with generous porch to provide
shade on the south side, Charleston, South Carolina,United States” (Oliver, 1997, p.
134) ............................................................................................................................ 37
Ilustração 14 - “Maritime”- North Hungarian House, type with stepped thatched roof
(Oliver, 1997, p. 138) .................................................................................................. 37
Ilustração 15 - “Earth construction”- Clay lump workshop at Garboldisham, Norfolk,
England. Walls are of clay lump on a plinth of flint rubble, repaired with brick at right
corner. Top left: a) Clay lump mould; b) clay lump with key for plaster and its mould; c)
Moulding press; d) Clay lump. (Oliver, 1997, p. 212) .................................................. 38
Ilustração 16 – Utilização de taipa na Grande Muralha da China. (Torgal, Eires e Jalali,
2009, p. 11) ................................................................................................................ 39
Ilustração 17 – Pirâmide do Sol de Teotihuacan, México. (Torgal, Eires e Jalali 2009, p.
13) .............................................................................................................................. 40
Ilustração 18 – Edificações em terra, Povoado de Taos, Novo México. (Torgal, Eires e
Jalali, 2009, p. 13) ...................................................................................................... 40
Ilustração 19 – Edifícios em Adobe, Shibam, Iémen. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 14)
................................................................................................................................... 41
Ilustração 20 - Cidade de Arg-é Bam, Irão. (Fundación Cultural Oriente, 2015) .......... 41
Ilustração 21 - A Grande Mesquita de Djenné, Mali. (Condé Nast Traveler, 2015) ..... 41
Ilustração 22 – Plano da cidade de Arg-E-Bam antes do sismo. (Auroville Earth
Institute, 2015) ............................................................................................................ 42
Ilustração 23 – Mapa-mundo – Zonas do globo com elevada densidade de construção
em terra (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 17) ............................................................... 42
Ilustração 24 – Distribuição geográfica das construções tradicionais portuguesas em
terra: a) Taipa; b) Adobe; c) Tabique (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 16) ................... 43
Ilustração 25 - Castelo de Paderne, Algarve (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 15) ........ 44
Ilustração 26 - Castelo de Silves, Algarve (Urry, 2015) ............................................... 44
Ilustração 27 – Sistema de taipal tradicional com aperto por cordas. (Torgal, Eires e
Jalali, 2009, p. 36) ...................................................................................................... 45
Ilustração 28 – Pilões ou maços utilizados na taipa tradicional. (Torgal, Eires e Jalali,
2009, p. 37) ................................................................................................................ 45
Ilustração 29 - Construção em taipa tradicional (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 35).... 45
Ilustração 30 - Construção em taipa mecanizada com cofragens metálicas. (Torgal,
Eires e Jalali, 2009, p. 38) .......................................................................................... 46
Ilustração 31 - Produção manual e secagem do adobe. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p.
42) .............................................................................................................................. 47
Ilustração 32 - Produção mecanizada do adobe (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p.45) ... 47
Ilustração 33 - Construção de parede em "Adobeton" (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p.
46) .............................................................................................................................. 48
Ilustração 34 – Casa em Luanda – Imagem virtual da proposta (Ilustração Nossa,
2010, Trienal de Lisboa) ............................................................................................. 49
Ilustração 35 – Casa em Luanda – Esquema da evolução concetual da proposta
(Ilustração Nossa, 2010, Trienal de Lisboa) ................................................................ 50
Ilustração 36 – Casa em Luanda – Maqueta e fotomontagem da proposta (Ilustração
Nossa, 2010, Trienal de Lisboa) ................................................................................. 50
Ilustração 37 – Habitação unifamiliar construída em taipa, pedra e madeira, Beja
(Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 23) ............................................................................. 51
Ilustração 38 – Adega (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 23) .......................................... 51
Ilustração 39 – Esboço Litológico do território português (Moutinho, 1979, p. 15)....... 54
Ilustração 40 – Esboço do Relevo do território português. (Moutinho, 1979, p. 17) ..... 55
Ilustração 41 – Tipos de povoamento rural. (Moutinho, 1979, p.25) ............................ 55
Ilustração 42 – As formas do Relevo: Escarpa de falha – A) No granito as escarpas e
superfícies conservam-se bem e existe forte concentração de drenagem. B) Nos
xistos, todas as formas são dissecadas por uma rede hidrográfica muito densa,
conservando-se só algumas escarpas de falha e transformando-se as superfícies altas
num mar de cabeços. (Ribeiro, Lautensach e Daveau, 1991, p. 175) ......................... 55
Ilustração 43 – As formas do Relevo: Reboco de erosão: C) No granito, as escarpas
são vivas, com ângulo bem marcado na base; as colinas isoladas na planície
testemunham o retrocesso do flanco montanhoso; os vales principais são largos e de
fundo plano entre vertentes abruptas; outros tipos de vales: a) de fratura, b) de
rejuvenescimento lento. D) Nos xistos, passa-se gradualmente da montanha para a
planície e não há montes-lhas; a rede hidrográfica é densa e o relevo muito dissecado.
(Ribeiro, Lautensach e Daveau, 1991, p. 175). ........................................................... 55
Ilustração 44 – Adaptação agrícola às vertentes do Douro através da construção de
socalcos. (Centro de Inovação de Trás-os-Montes e Alto Douro, 2015) ..................... 56
Ilustração 45 – O ambiente agreste da região do Norte - Montes, O “Lugar”.
(Amaral,1988, p. 131) ................................................................................................. 57
Ilustração 46 – Alpendre de uma casa no Alentejo. (Amaral, 1988, p. 179) ................ 57
Ilustração 47 – Situação da Zona 1 no País. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 11) ...... 61
Ilustração 48 – Povoamento em Ponte de Lima, panorâmica sobre a Sobrada. (Arq.
Pop. Portuguesa,1988, p. 32). .................................................................................... 61
Ilustração 49 - Relevo e hidrografia (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 14) .................... 62
Ilustração. 50 – Geologia (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 15) ................................... 63
Ilustração 51 – Casas em Castro Laboreiro, construção em granito (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 38) ............................................................................................ 64
Ilustração 52 - Casa do povoado, construção em granito, Manhouse, S. Pedro do Sul.
(Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 83)............................................................................ 64
Ilustração 53 – Situação da zona 2 no País. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 123) .... 65
Ilustração 54 – Serra do Marão. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 128) ....................... 65
Ilustração 55 – Mapa geológico com a separação da Terra fria e Terra quente (Arq.
Pop. Portuguesa, 1988, p. 124) .................................................................................. 66
Ilustração 56 – Pormenor de um telhado de lousa rematado nas juntas com
argamassa, Boavista, Marão (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 139) ............................ 67
Ilustração 57 – Revestimento de parede em lousa, Cotorinho, Marão. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 138) .......................................................................................... 67
Ilustração 58 – Construção em xisto numa curva de caminho, Montes (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 136) .......................................................................................... 67
Ilustração 59 – Situação da zona 3 no país. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 3) ......... 68
Ilustração 60 – Os vales de Cotarredor (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 7) ................ 68
Ilustração 61 – A semelhança dos arredores de Pinhel, Guarda, com as planícies
alentejanas (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 6)........................................................... 69
Ilustração 62 – Mapa geológico (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 13).......................... 69
Ilustração 63 - Mapa dos materiais correntes de construção (Arq. Pop. Portuguesa,
1988, p. 61) ................................................................................................................ 70
Ilustração 64 – Construção em xisto, uma casa em Outeiro da Vinha (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 64) ............................................................................................ 71
Ilustração 65 – Aglomerado de casas em granito com cobertura de colmo, Bigorne.
(Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 71)............................................................................ 72
Ilustração 66 - Pormenor de cobertura «colmada». (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 71)
................................................................................................................................... 72
Ilustração 67 – A simbiose entre um aglomerado de casas em granito e a sua
envolvente, Sortelha. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 15) ......................................... 72
Ilustração 68 – Situação da zona 4 no País. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 123) .... 73
Ilustração 69 – Praia em Palheiros da Tocha (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 125) ... 73
Ilustração 70 - Um aglomerado concentrado em Azenhas do Mar. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 143) .......................................................................................... 74
Ilustração 71 – Esboço de um aglomerado em Sesimbra. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988,
p. 143) ........................................................................................................................ 75
Ilustração 72 – Sesimbra. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 142) ................................. 75
Ilustração 73 – Mapa Geológico. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 172) ...................... 76
Ilustração 74 – Mapa dos materiais de construção. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.
172) ............................................................................................................................ 76
Ilustração 75 – Construção em pedra calcário, Arneiro, Santarém. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 175) .......................................................................................... 77
Ilustração 76 – Construção em pedra calcário, Arneiro, Santarém. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 175) .......................................................................................... 77
Ilustração 77 – Parede de taipa, Arneiro, Santarém. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.
180) ............................................................................................................................ 77
Ilustração 78 – Parede de adobe, Arneiro, Santarém. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.
180) ............................................................................................................................ 77
Ilustração 79 – Casa de madeira, praia de Mira. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 186)
................................................................................................................................... 77
Ilustração 80 – Interior de uma casa de madeira, praia de Pedrógão. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 184) .......................................................................................... 77
Ilustração 81 – Situação da zona 5 no país. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.3) .......... 78
Ilustração 82 – Planície alentejana. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 24) .................... 78
Ilustração 83 – Emprego da cal nas habitações, Alegrete - Caiações sucessivas ao
longo de gerações concedem aos edifícios texturas inesperadas. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 56) ............................................................................................ 79
Ilustração 84 - Mapa geológico. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 10) ......................... 80
Ilustração 85 - Construção em Taipa com cunhais de tijolo, Vidigueira. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 37) ............................................................................................ 81
Ilustração 86 – Casas geminadas, aplicação de cal e tijolo. (Arq. Pop. Portuguesa,
1988, p. 39) ................................................................................................................ 81
Ilustração 87 – Construção em xisto, Monsaraz (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 49) . 82
Ilustração 88 – Construção em granito, Terena. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 49) . 82
Ilustração 89 – Construção em pedra calcário. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 49) .. 82
Ilustração 90 – Construção em granito, Terena. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 49) . 82
Ilustração 91 – Situação da zona 6 no país. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 123) ..... 83
Ilustração 92 – Localidade de Ferragudo, Portimão. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.
126) ............................................................................................................................ 83
Ilustração 93 – Mapa geológico. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 174) ....................... 85
Ilustração 94 – Mapa dos materiais. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 174) ................. 85
Ilustração 95 - Corte esquemático de uma cobertura em abóbada de tijolo maciço (Arq.
Pop. Portuguesa, 1988, p. 184) .................................................................................. 86
Ilustração 96 - Cobertura em abóbada, Faro (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 184) .... 86
Ilustração 97 – Construção em taipa assente sobre fundação de alvenaria de pedra,
Odemira (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 176) ........................................................... 87
Ilustração 98 – Castelo de Silves. (Urry, 2015) ........................................................... 87
Ilustração 99 – Universidade da Calábria, Cozenza, Itália, 1972 – Vista aérea do
conjunto, a relação entre o alinhamento do Eixo proposto e o existente. (Universidade
da Calábria, 2015) ...................................................................................................... 92
Ilustração 100 – Planta de situação do complexo da Universidade da Calábria, Vittorio
Gregotti (Nesbitt, 2008, p. 373) ................................................................................... 93
Ilustração 101 – Vista do eixo estruturante da Universidade da Calábria
(Skyscrapercity, 2015) ................................................................................................ 94
Ilustração 102 - Esquema da noção de lugar em Hegel (Muntañola, 1996, p. 27) ...... 98
Ilustração 103 – Palácio dos Braguinhas – Edifício da antiga Escola Superior de Belas
Artes do Porto [ESBAP] e atual instalação da Faculdade de Belas da Universidade do
Porto [FBAUP]. (Universidade do Porto, 2015) ......................................................... 104
Ilustração 104 – Edifício “Bonjour Tristesse”, Berlim, Álvaro Siza Vieira. (Testa, 1996,
p. 75) ........................................................................................................................ 106
Ilustração 105 – Siza Sketch perspective for the expansion of the city of Macau in
collaboration with Fernando Távora. (Fleck, 1995, p.104) ......................................... 107
Ilustração 106 - A ruína da antiga Casa dos 24 (Gomes, 2008) ................................ 110
Ilustração 107 – Processo de demolições do arranjo urbanístico,1939. (Gomes, 2008)
................................................................................................................................. 111
Ilustração 108 – Vista do Terreiro da Sé, com o antigo torreão da “Casa do 24” à
esquerda. (Gomes, 2008) ......................................................................................... 111
Ilustração 109 – Configuração da praça após reestruturação. (Gomes, 2008) .......... 111
Ilustração 110 – Comemorações do Duplo Centenário, 1940. (Gomes, 2008) .......... 111
Ilustração 111 – Vista da fachada sul – a relação tectónica e cromática com a
envolvente. (Dias, 2015) ........................................................................................... 113
Ilustração 112 – Vista da fachada poente e a ruína da antiga torre. (Dias, 2015) ..... 113
Ilustração 113 – Plantas e cortes do projeto de execução (Gomes, 2008) ................ 114
Ilustração 114 – Esquisso do enquadramento urbano do edifício e alçados do
anteprojeto, 1996 (Gomes, 2008) ............................................................................. 114
Ilustração 115 – Vista da fachada norte, adossada à escadaria de acesso à Rua de S.
Sebastião. (Urry, 2015) ............................................................................................. 115
Ilustração 116 - Vista panorâmica da “Casa dos 24” integrada na malha urbana (Urry,
2015) ........................................................................................................................ 115
Ilustração 117 – Planta Piscina das Marés. (Siza, 1999, p. 58) ................................. 117
Ilustração 118 – Planimetria do complexo Taliesin West. (Wright, 2007, p. 129) ...... 117
Ilustração 119 – Perspetiva do plano a 45º. (Siza, 1999, p. 82) ................................ 117
Ilustração 120 – Pormenor da cobertura em estrutura de madeira assente nas paredes
de betão, (Siza, 1999, p. 59) ..................................................................................... 118
Ilustração 121 – Articulação das piscinas com as rochas. (Ganshrit, 2004, p. 75-94)119
Ilustração 122 - A simbiose entre o betão, as rochas e o areal. (Siza, 1999, p. 60) .. 119
Ilustração 123 – A patine do tempo sobre o betão e as rochas, resultando na fusão
entre o natural e o construído. (Olhares, 2015) ......................................................... 120
Ilustração 124 – Vista Poente da ruína adossada à casa. (Gili, 1997, p. 45) ............. 121
Ilustração 125 - Planta do piso – O rochedo torna-se parte integrante da estrutura
espacial da casa. (Gili, 1997, p. 46) .......................................................................... 122
Ilustração 126 – Vista da cobertura assente sobre o terreno, referenciando uma nova
topografia humanizada. (Toy, 1999, p. 86)................................................................ 123
Ilustração 127 – Vista Poente – A casa estabelece uma relação de continuidade com
os muros de contenção dos socalcos. (Gili, 1997, p. 45) .......................................... 123
Ilustração 128 - Vista nascente da relação que o rochedo estabelece com o interior e
exterior da casa. (Toy, 1999, p. 87) .......................................................................... 123
Ilustração 129 - Pormenor construtivo das fachadas Nascente/Poente. (Futagawa,
1999, p. 85) .............................................................................................................. 124
Ilustração 130- Centro das Artes- Planta de Localização (David, 2007, p. 34) .......... 125
Ilustração 131 – Cortes – O edifício atuando como topografia humanizada, gerando
espaços, por subtração, na massa rochosa da colina (David, 2007, 38) ................... 126
Ilustração132 – A mutação cromática do edifício ao longo dia (David, 2007, p. 35) .. 127
Ilustração 133 – Complexo das Salinas, Câmara dos Lobos, Ilha da madeira - A
relação tectónica entre o paredão e as plataformas com os rochedos, recriando e
humanizando uma nova topografia que ambiciona fundir-se com as rochas. ........... 129
Ilustração 134 – Pavilhão do vulcanismo, Ilha da Madeira – A relação que o corpo
pétreo do pavilhão estabelece com a falésia, como se brotasse dela. (Barbosa, 2015
................................................................................................................................. 129
Ilustração 135 - Mapa de localização da Paisagem Protegida do Corno de Bico
(Paredes de Coura, 2015) ........................................................................................ 131
Ilustração 136 - paisagem do Corno do Bico (Câmara municipal de Paredes de Coura,
2015) ........................................................................................................................ 132
Ilustração 137 – Plantas de implantação do piso 0 e piso 1 do conjunto – Note-se na
planta do piso 0 como os pilares do edifício do CEIA se confundem com os troncos
das árvores. (Guerreiro e Correia, 2007, p. 102)....................................................... 133
Ilustração 138 - Corte longitudinal do conjunto (Guerreiro e Correia, 2007, p. 101) .. 134
Ilustração 139 - Vista do alçado poente – A alavancagem do edifício sugere o
desabrochar dos troncos do solo, que elevam-no do terreno, mantendo a fruição do
mesmo e respeitando a sua condição de paisagem protegida, incrementada também
pela “camuflagem” do corpo entre o maciço arbóreo, com o intuito de amenizar o
impacto visual do edifício na envolvente. Integração e preservação são assim as
palavras de ordem desta intervenção sensível ao território e, por isso, consentânea
com a sua finalidade. (Guerreiro e Correia, 2009, p. 51)........................................... 134
Ilustração 140 – Vista do alçado sul – Note-se, numa transferência de matéria, a
relação conceptual entre os troncos naturais com os artificias e o revestimento do
edifício: como se tivessem transferido a camada epidérmica que reveste os troncos
para o corpo do edifício. (Nautilus, 2015).................................................................. 135
Ilustração 141 - Pormenor construtivo do edifício em estrutura de betão com
revestimento exterior de madeira. (Guerreiro e Correia, 2007, p. 103) ..................... 135
Ilustração 142 – Vista norte – rampa de acesso ao edifício (Guerreiro e Correia, 2009,
p. 52) ........................................................................................................................ 136
Ilustração 143 – Planta de implantação – reconversão dos edifícios existentes
(Guerreiro e Correia, 2007, p. 102) ........................................................................... 137
Ilustração 144 – Vista nascente da ampliação proposta – a relação de continuidade do
novo corpo da pousada com o preexistente (a antiga casa do professor, no fundo da
imagem). (Guerreiro e Correia, 2007, p. 101/102) .................................................... 137
Ilustração 145 – Barragem do Alqueva (Comissão Nacional Portuguesa de Grandes
Barragens, 2015) ...................................................................................................... 139
Ilustração 146 - Vista aérea da antiga Aldeia da Luz (Pinto, 2011) ........................... 139
Ilustração 147 - Localização da antiga Aldeia da Luz (Pinto, 2011) .......................... 140
Ilust. 148 - A nova Aldeia da Luz com o conjunto da Igreja, cemitério e Museu em
primeiro plano (Pinto, 2011) ...................................................................................... 141
Ilustração 149 - Localização da nova Aldeia da Luz (Pinto, 2011) ............................ 141
Ilustração 150 - Vista poente do conjunto: Museu, cemitério e Igreja (Pacheco e
Clément, 2004, p. 49) ............................................................................................... 142
Ilustração 151 - Corte e alçado Norte do Museu (Pacheco e Clément, 2004 p. 52) .. 143
Ilustração 152 – Vista norte – Os planos que denunciam a presença do edifício na
paisagem. (Museudaluz, 2015) ................................................................................. 143
Ilustração 153 – Vista para antiga localização da Aldeia. (Museudaluz, 2015) ......... 144
Ilustração 154 - Planta de implantação do conjunto – Igreja, cemitério e Museu.
(Pacheco e Clément, 2004, p. 49)............................................................................. 144
Ilustração 155 - Vista poente do conjunto – A integração do museu na paisagem – a
relação cromática e topográfica com o território. Desta perspetiva o edifício assume
uma espécie de embasamento da nova Aldeia da Luz. (Pacheco e Clément, 2004, p.
49) ............................................................................................................................ 145
Ilustração 156 – Estereotomia da pedra. (Pacheco e Clément, 2004, p. 50) ............. 146
Ilustração 157 – Pormenor do revestimento das tiras de pedra (xisto) sobre a estrutura
de betão (Basulto e Assael, 2015) ............................................................................ 146
Ilustração 158 - Museu de Arte Moderna de Varsóvia, Polónia – A relação com o
maciço arbóreo. (Rebelo, 2015) ................................................................................ 151
Ilustração 159 - Ktima House, Grécia – Fachada e planta de implantação. (Rebelo,
2015) ........................................................................................................................ 151
Ilustração 160 –Tree House, Pigadakia, Grécia (Rebelo, 2015) ................................ 152
Ilustração 161 – Enquadramento geográfico da região que integra o Plano Estratégico
de Promoção Turística do Vale do Côa e Alto Douro. (Arte-coa, 2015) .................... 154
Ilustração 162 – Vale do Côa. (Ilustração nossa, 2015) ............................................ 154
Ilustração 163 – Arte do séc. XVI-XX (Ilustração nossa, 2015) ................................. 155
Ilustração 164 – Arte da Idade do Ferro – 1º milénio AC (Ilustração nossa, 2015) .... 155
Ilustração 165 – Arte Magdalenense e Tradiglaciar 15.000-9.000 AC. (Ilustração
nossa, 2015) ............................................................................................................. 155
Ilustração 166 – Arte do Período Gravetto-Solutrense 30.000-15.000 AC (Ilustração
nossa, 2015) ............................................................................................................. 155
Ilustração 167 - Mapa do Parque Arqueológico do Vale do Côa (Ilustração nossa,
2015) ........................................................................................................................ 156
Ilustração 168 - Vista nascente da Canada do Inferno: gravuras rupestres junto ao leito
do rio Côa (Ilustração nossa, 2015) .......................................................................... 157
Ilustração 169 - Canada do Inferno: réplica da rocha 11 (Ilustração nossa, 2015) .... 158
Ilustração 170 - Réplica do quotidiano de um caçador paleolítico no seu acampamento
no Vale do Côa. (Ilustração nossa, 2015) ................................................................. 159
Ilustração 171- Fachada Norte do Museu e uma réplica de um painel de xisto do Vale
de José Esteves 16: A semelhança entre a cor, textura, fragmentações e assimetrias
da fachada com as da réplica. (Ilustração nossa, 2015) ........................................... 161
Ilustração 172 – Museu do Côa – A cobertura enquanto miradouro, imagem 3D do
concurso. (Seabra, 2004, p. 30) ................................................................................ 163
Ilustração 173 – Fachada sul – Imagem 3D do concurso, perspetivando-se uma forte
fisionomia visual do corpo projetado sobre a encosta, (Seabra, 2004, p. 33) ............ 164
Ilustração 174 – A massa híbrida de betão com textura e pigmento do xisto. (Ilustração
nossa, 2015) ............................................................................................................. 166
Ilustração 175 – A constante permutação das superfícies cambiantes de betão ao
longo do dia. (Ilustração nossa, 2015) ...................................................................... 167
Ilustração 176 – Enquadramento do edifício na paisagem – Vista da fachada sul. Notese a presença enigmática do corpo monolítico sobre a encosta. (Cortesia de Rebelo e
Pimentel, 2015)......................................................................................................... 167
Ilustração 177 – O capeamento da cobertura com as placas prefabricadas. (GOP,
2015) ........................................................................................................................ 168
Ilustração 178 – Aspeto final das placas montadas e a diferença entre as superfícies
texturadas dos contornos exteriores e as lisas do interior (rampa de acesso ao interior
do museu), demarcando claramente o limite entre um ambiente mais agreste e natural
e outro mais sensível e humanizado. (Ilustração nossa, 2015) ................................. 168
Ilustração 179 – Localização do Museu na confluência dos vales. (Cortesia dos
arquitetos Camilo Rebelo e Tiago Pimentel, 2015) ................................................... 169
Ilustração 180 - A presença (dis)simulada do museu denunciada apenas pelos muros
que delimitam o perímetro de implantação (Ilustração nossa, 2015) ......................... 171
Ilustração 181 – Vista da fachada sul e nascente – A mudança de escala do edifício,
que evolui de uma presença abstrata para um corpo concreto. (Cortesia de Rebelo e
Pimentel, 2015)......................................................................................................... 171
Ilustração 182 - Alçado Sul - A preservação da topografia permite libertar o edifício no
extremo da encosta, resolvendo simultaneamente os acessos de serviços e
proporcionando um confronto mais intenso com o vale. (Rebelo e Pimentel, 2015) . 172
Ilustração 183 – A penumbra da rampa de acesso ao interior do museu remete o
visitante para um tempo primitivo, onde subjazem as salas “grutas”. (Ilustração nossa,
2015) ........................................................................................................................ 173
Ilustração 184 – Espaço de exposição permanente – Sala expositiva "A" dedicada ao
Vale do Côa como património mundial da humanidade e o corredor de acesso às salas
de exposição permanente. (Ilustração nossa, 2015) ................................................. 174
Ilustração 185 - Sala de exposição temporária (Ilustração nossa, 2015)................... 174
Ilustração 186 - Planta Piso 0 - área expositiva: 01- Acesso público – átrio exterior, 02 Serviço educativo, 03- Acesso público – entrada norte, 04- Investigação – sala de
arquivos, 05- Entrada do auditório, 06- auditório, 07- Museu – átrio interior, 08- Loja,
09- Átrio público – acesso aos elevadores, 10- Sanitários, 11- Armazém, 12- Cacifos,
13- Armazém, 14- Salas de exposição temporária, 15- Corredor das salas de
exposição, 16- Salas de exposição permanente, 17- Depósito, 18- Sala de
museografia, 19- Oficinas, 20- Laboratório de fotografia. (Cortesia de Rebelo e
Pimentel, 2015)......................................................................................................... 175
Ilustração 187 - Planta piso -1: 01- Escada – Entrada, átrio do restaurante, 02- Acesso
público – restaurante, 03- Átrio público – restaurante, 04- Auditório, 05- Sanitários, 06Cafetaria, 07- Bar/Restaurante, 08- Restaurante, 09- Cozinha, 10- Dispensa –
armazém, 11- Sanitários, 12- Acesso de serviço, 13- Área de serviço, 14Estacionamento, 15-Área técnica. (Rebelo e Pimentel, 2015) .................................. 175
Ilustração 188 - Fachada norte – A relação entre a superfície da fachada e o bloco de
xisto que brota do solo. Esta imagem sugere o território construído na forma do edifício
a partir dos afloramentos de xisto. (Ilustração nossa, 2015) ..................................... 178
Ilustração 189 - Planta de implantação – A forma triangular do museu gerada pela
confluência dos vales do Forno e de José Esteves. (Rebelo e Pimentel, 2015) ........ 179
Ilustração 190 – O aspeto de afloramento de xisto e a relação cromática que o edifício
estabelece com o território, gerando uma perceção de corpo esculpido na encosta,
mediante lapidação da mesma – a encosta deixou de ser apenas terreno e passou a
ser construção. (Vimeo.com, 20-4-2015) .................................................................. 179
Ilustração 191 – Acesso ao Miradouro Sul (Ilustração nossa, 2015) ......................... 182
Ilustração 192 – Acesso ao Miradouro Norte (Ilustração nossa, 2015) ..................... 182
Ilustração 193 - Planta de cobertura (piso 2): 01- Estacionamento, 02- Acesso ao
miradouro sul, 03- Miradouro norte, 04- Entrada, rampa de acesso ao museu.
(Cortesia de Rebelo e Pimentel, 2015) ..................................................................... 183
Ilustração 194 – O Museu enquanto miradouro. (Ilustração nossa, 2015)................. 184
SUMÁRIO
1. Introdução .............................................................................................................. 25
2. O território enquanto matéria construtiva ................................................................ 29
2.1. As influências da arquitetura vernacular [portuguesa] ..................................... 29
2.1.1. A universalidade da arquitetura vernacular ............................................... 32
2.1.2. Construção em terra ................................................................................. 38
2.1.3. Arquitetura vernacular portuguesa ............................................................ 43
2.2. A “Escola de Veneza”: entre o território e a arquitetura Analógica ................... 88
2.3. O legado da escola do porto: arquitetura contemporânea portuguesa e a
relação com o Lugar. .............................................................................................. 96
3. O museu de arte e arqueologia do vale do Côa ................................................... 147
3.1. Os autores ..................................................................................................... 147
3.2. O território ..................................................................................................... 154
3.3. O museu........................................................................................................ 162
4. Considerações finais sobre o museu .................................................................... 177
4.1. O museu enquanto território construído......................................................... 177
4.2. O museu enquanto lugar ............................................................................... 181
5. Conclusão ............................................................................................................ 185
Referências .............................................................................................................. 189
Bibliografia ................................................................................................................ 199
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
1. INTRODUÇÃO
Da natureza provém toda a matéria, toda a origem dos materiais que constroem o
nosso mundo. Desde os primórdios da civilização que o Homem interage com o meio,
usufruindo dos seus recursos para construção de abrigos, refúgios, ferramentas e
utensílios, tudo com os materiais da natureza, do ambiente físico, do território.
Na sua fase nómada, começou, inicialmente, por se abrigar em grutas e cavernas,
tendas ou acampamentos instáveis que montava durante as suas deslocações
estacionais em busca de alimentos e de um clima mais ameno. E já numa fase
sedentária, de agricultura e pastoreio (período Mesolítico e Neolítico), começa a
formar comunidades tribais e os primeiros povoados fixos, abandonando abrigos
temporários e inaugurando outros de caráter mais permanente, que viriam a constituir
o modelo essencial de habitação dos primeiros grupos humanos. Estes abrigos fixos
apresentam diversas formas, dependendo do ambiente físico em que se encontram e
dos recursos materiais que o território fornece para a sua a construção.
No entanto, mesmo com a evolução da humanidade, o Homem continua a reconhecer
as suas origens na natureza, assim como a sua dependência em relação a ela. E a
arquitetura, como disciplina e processo de intervenção que simboliza a ligação do
Homem à natureza, reflete esse estado de espírito. Ela restabelece a presença do real
na consciência deste, mantendo-o ligado às suas próprias raízes. Essa consciência do
real, estruturada mediante a estreita relação da arquitetura com o lugar, é privilegiada
no panorama da arquitetura contemporânea [portuguesa].
Esta ligação não é reconhecível apenas na arquitetura, mas em quase toda a atividade
humana e artística. Veja-se, por exemplo, a presença da natureza nas artes plásticas,
nomeadamente os trabalhos de Joseph Beuys1 e da Arte Povera2, ou as bases
conceptuais que formalizaram as intervenções da Land Art, que constituem, de algum
modo, uma linha de pensamento importante para arquitetura, uma vez que operam
ambas sobre um suporte comum – o território.
1
Joseph Heinrich Beuys (1921-1986) foi um professor, ativista político e artista plástico alemão.
Notabilizando-se pelos seus vários meios e técnicas de produção artística – escultura, fluxus, happening,
performance, vídeo e instalação. O artista alemão entendia que “não pode haver atividade artística sem o
conhecimento da natureza”.
2
A arte Povera foi um movimento artístico Italiano, nas décadas de 1960/70. Carateriza-se pelo uso de
materiais naturais, simples ou de caráter banal ou “pobre”, daí a designação “Povera”.
Humberto José Barros da Silva
25
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Esta linha de pensamento pode ser restabelecida no caso de estudo (Museu do Foz
Côa), que, concebido como “instalação na paisagem”, é produto de uma analogia feita
pelos próprios autores do projeto, que consideram as gravuras rupestres como sendo
“a primeira forma de Land Art da história da Humanidade”. Este princípio de interação
com a paisagem traduziu-se na ideia motriz do projeto, pela forma como o edifício se
implanta no território, como se de um afloramento de xisto se tratasse, à semelhança
dos blocos de xisto que serviram de suporte [artístico] das gravuras rupestres.
O presente estudo pretende, portanto, constituir uma investigação sobre o território
enquanto matéria construtiva e compositiva em arquitetura, referenciando contextos
arquitetónicos que demonstram em que medida o território determinou a materialidade
do edifício.
A eleição do tema resulta de uma intriga pessoal – inerente ao processo criativo em
arquitetura –, sobre a emotividade que certos edifícios transmitem, pelo seu caráter
mutável e entrópico na relação que estabelecem com o território, ajustando-se às
cambiâncias cromáticas e tectónicas do contexto físico em que se localizam,
ensaiando semelhanças plásticas com os elementos que formalizam o território. As
superfícies, sujeitas às mudanças sazonais do tempo, encontram-se em constante
permutação de aparências com o lugar, resultando, do processo, experiências
surpreendentes e reveladoras. A semelhança tectónica entre o artificial e o natural, e a
ambiência que produzem, tornam o edifício indissociável ao seu contexto. Segundo
Loos3 “cada material tem a sua própria e específica linguagem expressiva”, mas
também um contexto específico para sua plena expressão.
A arquitetura e o lugar são objetos de estudo de amplos contornos, destacando-se
como uma das mais fortes características da arquitetura contemporânea portuguesa,
impulsionada pela “Escola do Porto”. O lugar enquanto entidade dotada de fenómenos
transversais à atuação do homem no espaço é observada pelo arquiteto, que o
reconhece, deixando-se inspirar por ele, através daquilo que Paul Valéry4 designa
como “um estado poético que lhe está subjacente” (Neves, 2001, p. 12). Assim,
3
Adolf Loos (1870-1933) foi um visionário arquiteto austríaco. O seu ensaio “Ornamento e delito” marcou
profundamente o panorama da arquitetura do séc. XX. Foi ainda percursor do “ Raumplan” – um esquema
de desenvolvimento da planta em diferentes cotas, conforme a relevância e distribuição programática dos
espaços, estabelecendo hierarquias espaciais mediante variações de escala e de materialidade,
definindo, assim, graus de intimidade distintos entre os espaços.
4
Paul Valéry (1871-1945) foi um filósofo, escritor e poeta francês cuja obra abrange áreas como
arquitetura, música, literatura e dança. Na sua vasta obra, destaca-se a “Introduction à la méthode de
Léonard de Vinci, que na altura era o seu ídolo, na segunda metade da década de 1890.
Humberto José Barros da Silva
26
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
através das crenças na caracterização dos lugares e dos sítios, o arquiteto estabelece
uma forte relação sentimental e poética com essas entidades. No caso de Siza Vieira
e Souto Moura, por exemplo, essa relação é uma constante nos seus projetos.
A relação entre natureza e construção é decisiva na arquitetura. Esta relação, fonte
permanente de qualquer projeto, representa para mim como que uma obsessão;
sempre foi determinante no curso da história e apesar disso tende hoje a uma extinção
progressiva. (Siza Vieira, 1998, p. 17)
Este forte vínculo da arquitetura portuguesa ao lugar será o mote para circunscrever a
presente investigação num contexto, essencialmente, nacional, tendo como objeto de
estudo o museu arqueológico do Foz Côa, pela força telúrica do território materializada
no edifício. Um museu pensado à semelhança do seu contexto. Uma intervenção
abrangente, que agrega a sua história à do lugar.
Procurando a continuidade cromática da paisagem, optámos por uma expressão
produzida por betão com adição de pigmento, semelhante à cor do xisto (matéria
abundante no local), resultando numa massa híbrida com textura (obtida por moldes
feitos sobre as rochas locais) ”. (Rebelo e Pimentel, 2010, p. 5)
A sua imagem enquanto “instalação na paisagem” é potenciada pelo sentido afirmativo
do seu corpo enquanto massa física que extravasa a encosta – um monólito habitável,
texturado e pigmentado, que evoca as pedreiras locais (suporte artístico das gravuras
rupestres). Um verdadeiro paradigma do território enquanto matéria construtiva e
operativa de projeto.
A dissertação inscreve-se em três capítulos. No primeiro capítulo será feito um
enquadramento do tema, em que se fará uma abordagem mais literal do território
enquanto matéria construtiva, referenciando a arquitetura vernacular, pelo facto de se
construir com os materiais e recursos locais – aspetos autóctones que viriam a
influenciar bastante a arquitetura contemporânea portuguesa, após o “Inquérito da
Arquitetura Popular em Portugal”.
Ainda no primeiro capítulo, estabelecer-se-á, também, um paralelo entre a “Escola do
Porto” e a “Escola de Veneza”, pelo facto de se afirmarem sob o mesmo princípio
ideológico e de partilharem dois aspetos fundamentais que as caracterizam na sua
essência,
e
que
são
elucidativos
para
a
temática
em
questão:
a
refundamentação/contextualização da arquitetura tradicional no panorama modernocontemporâneo e a aposta numa produção arquitetónica de contexto.
Humberto José Barros da Silva
27
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Numa segunda fase do enquadramento, estudar-se-ão algumas obras que evidenciam
a relação da arquitetura contemporânea portuguesa com o lugar, com enfoque na
Escola do Porto, para se perceber em que linha de pensamento é que se fundamenta
a abordagem conceptual do projeto do museu. Pois a formação dos seus autores
(Camilo Rebelo e Tiago Pimentel) é oriunda desta Escola, que proclama uma visão
romântica da arquitetura, pautando-se por um sistema pedagógico intimista de
“escola-atelier”, onde a relação mestre/discípulo é cultivada ininterruptamente entre o
universo académico e o profissional. E assim “a visão romântica do ser arquiteto,
continua a refletir-se na prática profissional dos jovens arquitetos formados na
Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto [FAUP] ” (Figueira, 2011)
A imagem arquitetónica […] apesar de poder ser encarado como um elemento
tecnicamente previsto – projetado pelo desenho, ou pelas maquetes, por exemplo –
reflete também os mitos, a história, os conceitos característicos do saber
contemporâneo, a biografia do arquiteto e dos utentes da arquitetura, das suas
memórias culturais, dos seus sonhos; ou seja, de um conjunto de circunstâncias que
lhe dão significado. (Neves, 1991, p. 13)
E assim a investigação vai limitando, progressivamente, o âmbito dos seus objetivos
até focar-se, concretamente, no caso de estudo, onde se tentará perceber como os
fatores inerentes ao território, de âmbito tectónico, histórico-geográfico, paisagístico e
artístico, serviram de matéria operativa de projeto, resultando numa obra
paradigmática, que incorpora em si as valências do território, atribuindo-lhe qualidade
de imagem – Vila Nova de Foz Côa tornou-se, assim, indissociável ao museu, que lhe
concedeu a emergente projeção.
No terceiro e último capítulo, e em tom conclusivo sobre o caso de estudo, faremos
uma analogia do museu sob duas perspetivas estudadas no enquadramento do tema:
O museu enquanto território construído, pela forma como evoca o terreno xistoso em
que se implanta; e o museu enquanto lugar, pela sua estratégia de implantação, que
deixa imperturbada a contemplação da vasta paisagem do Douro, transformando a
encosta num autêntico miradouro.
Humberto José Barros da Silva
28
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
2. O TERRITÓRIO ENQUANTO MATÉRIA CONSTRUTIVA
2.1. AS INFLUÊNCIAS DA ARQUITETURA VERNACULAR [PORTUGUESA]
Segundo Rudofsky5, “a filosofia e o conhecimento prático dos construtores anónimos
oferecem a maior fonte de absorção e potencial de inspiração arquitetónica para o
homem industrial.” (Rudofsky, 1964, p. 10)
Para os arquitetos contemporâneos, as raízes da arquitetura “vernacular, anonymous,
spontaneous, indigenous, rural […]” (Rudofsky, 1964, p. 3), como for conveniente
designar, representam uma fonte inesgotável de inspiração, amparada na força da sua
expressão criativa e da sua autenticidade, relativamente à relação que estabelece com
o sítio em que se localiza.
A expressividade e riqueza plástica patente na arquitetura vernacular são referências
transversais a vários universos culturais no âmbito da produção arquitetónica
contemporânea. Onde os arquitetos, imbuídos pelo valor do locus, ensaiam
experiências semelhantes, mas aliadas a uma componente tecnicista, que através de
um processo metafórico, idealizam edifícios à semelhança da envolvente. Os edifícios
tornam-se, assim, nexos [arqui]tectónicos do contexto em que se inserem,
incorporando as suas qualidades sensoriais e enaltecendo a sua atmosfera, que na
perspetiva de Trías6, segundo Hipólito “[…] é constituído pelo nexo entre o território e o
corpo. […] ” (Hipólito, 2011, p. 7).
[…] o ambiental, o ambiente, é constituído pelo nexo entre o território e o corpo.
Envolve-o como âmbito que o circunda e instala-o num território. A arquitetura e a
música são artes ambientais que dão forma a um ambiente e que determinam o caráter
e a qualidade da “atmosfera” ou do ar que se produz entre o corpo e o ambiente […] “,
o que põe a arquitetura como um sistema relacional entre o corpo, o espaço e o
território […] (Trías, Hipólito, 2011, p. 7)
5
Bernard Rudofsky (1905-1988) foi um arquiteto e teórico cultural. Para além de ensaios sobre a
arquitetura e design, escreveu também sobre vestuário, calçado e hábitos do quotidiano. Lamentando a
perda de consciência sensorial do homem tecnológico e industrializado, reiterou nos seus estudos a
necessidade de uma reflexão sobre às práticas rudimentares como forma de sensibilizar novamente o
homem sobre as qualidades sensoriais das coisas que o rodeiam.
6
Eugenio Trías Sagnier (1942/2013) foi um escritor e filósofo espanhol. Aplicou as suas ideias nos
campos da ética, da reflexão política, do pensamento histórico-filosófico, da teoria do conhecimento, da
filosofia da religião, da ontologia e da arte e estética, sendo os dois últimos os seus âmbitos preferidos.
Entre a sua vasta obra, encontram-se “La filosofia y su sombra (1969), “Teoría de las ideologías (1970),
“La dispersión (1971) e “Metodologia del pensamiento mágico (1971).
Humberto José Barros da Silva
29
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A capacidade do ser poder experimentar o mundo sensorialmente reverte-nos para o
conceito de imaginação corpórea […] O corpo articula o mundo. Simultaneamente o
corpo é articulado pelo mundo. Quando “Eu” apreendo o betão como sendo qualquer
coisa fria e dura, “Eu” reconheço o corpo como sendo quente e macio. Deste modo o
corpo na sua relação dinâmica com o mundo torna-se o Shintai. O Shintai é um ser
sensível que responde ao mundo. (Frampton, 1998, p. 30,32)
Será, portanto, neste princípio – da troca de metáforas corpóreas entre o nosso corpo,
o território e o corpo da arquitetura – que se fará referência à arquitetura vernacular no
presente estudo, sob uma perspetiva da sua remanescência na arquitetura
contemporânea portuguesa, pela relação que ambas estabelecem com o lugar.
O exercício de invenção é central, porque parte da perceção e da memória em direção
ao que ainda não é, mas este exercício não é casual ou gratuita violação do já
constituído, mas sim busca contínua de uma ordem nova e diversa. Instituição de uma
nova possibilidade, de uma nova experiência do mundo acionada materialmente. [...] A
problemática da fundação de uma «pedagogia da invenção» deve, sem dúvida, passar
através das técnicas da manualidade e da perceção, da existência física (enquanto
técnicas que nos adestram no encontro com a realidade e com a matéria por meio do
próprio corpo), e deve saber aproveitar as técnicas da psicologia da expressão como
técnicas de resposta e de autenticidade [...] (Gregotti, 2004,p. 29)
E como se poderá restabelecer, sensorialmente, a presença do nosso corpo na
relação corpórea entre a arquitetura e o lugar, entre o artificial e o natural? A resposta
seria, na medida em que “ […] o corpo reconstitui o mundo através da apropriação
táctil da realidade […] ” (Frampton, 1998, p. 30). Neste sentido a materialização de um
edifício é produto da sensibilidade do autor no reconhecimento dos fenómenos e
qualidades sensoriais que formalizam o território, determinando o tipo de abordagem
ou estratégia de projeto a ser preconizado em função dessa leitura. A metáfora
constitui, assim, um processo humano pelo qual o arquiteto, enquanto utente e
projetista, entende e estrutura os diversos domínios da experiência no processo de
projeto. E sobre esta relação metafórica do homem com o mundo percebido,
Frampton7 refere que:
Desta distância, ou melhor, através do viver desta distância, o espaço circundante
manifesta-se como uma coisa dotada com vários sentidos e valores. Porque o Homem
tem uma estrutura fisionómica assimétrica, com uma parte superior e inferior, esquerda
e direito, frente e costas, o mundo articulado torna-se por seu turno num espaço
heterogéneo. O mundo que se dá aos sentidos e ao estado do corpo tornam-se assim
7
Kenneth Frampton, arquiteto britânico, nascido em 1930, no seu ensaio “Introdução ao Estudo da
Cultura Tectónica”, fala sobre interdependência entre o mundo percebido e o homem que o apreende, o
que designa de “Metáfora Corpórea”, baseando-se no princípio da “Imaginação corpórea”, proposto por
Gianbattista Vigo na «Scienza Nuova» em 1730.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
interdependentes. O mundo articulado pelo corpo é um espaço vivido, habitado.
(Frampton, 1998, p. 31)
Rossi8 fala-nos do valor do locus, “entendendo-o como uma relação singular e no
entanto universal, que existe entre uma certa situação local e as construções aí
localizadas” (Rossi, 2001, p. 151). Neste sentido, o que sustenta-se aqui,
essencialmente, sobre a arquitetura vernacular é o poder da sua imagem autóctone
enquanto fonte de inspiração para arquitetura contemporânea, pela ligação ao local de
construção, através dos materiais do próprio local.
Ilustração 1 – Museu do Côa - O betão enquanto metáfora do
xisto. (Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 2 – As Piscinas de Leça, Siza Vieira – A simbiose
entre as plataformas de betão aparente e as rochas. (Siza,
1999, p. 60)
Ilustração 3 – Signal Box, Suíça – A relação entre a “pele” de
cobre do edifício e os carris da linha férrea. (Herzog & de
Meuron, 1996, p.34)
Ilustração 4 – Termas de Vals, Suíça, Peter Zumthor – A
relação entre a pedra (basalto) e a montanha. (Vagón 293,
2015)
8
Aldo Rossi (1931-1997) foi um arquiteto e teórico italiano. Figura proeminente da “Escola de Veneza” e
pioneiro na releitura da arquitetura do iluminismo e do modernismo, refundamentou o conhecimento, a
teoria e o processo da composição arquitetónica na história e na dinâmica dos processos urbanos. No
seu ensaio “A Arquitectura da Cidade” faz referência ao termo genius loci no mundo clássico, referindo-o
como uma divindade local, que presidia tudo o acontecia nesse mesmo lugar.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Esta
influência
que
a
arquitetura
vernacular
exerce
sobre
a
arquitetura
contemporânea, não ocorre de uma mera imitação, mas sim de um processo de
interpretação, ancorado num suporte conceptual que determinará a materialização do
edifício em função do seu contexto. Pois na perspetiva de Braizinha:
[…] não existiria evolução do conhecimento humano se simplesmente se imitasse no
sentido denotativo do termo imitação. Imitar pressupõe que existe um entendimento
das bases que estão no suporte da ideia, adaptando-as a novos conceitos, formas e
aplicações defende na perspetiva que tem a partir do conhecimento. […] (apud
González, 2006, p. 26)
O mesmo autor refere ainda “que o facto de a imitação ser imagético, no sentido e na
medida em que está ligada às imagens que criam arquétipos, o que é certo é que o
arquétipo é em si a imagem livre de imitação e carregado de interpretação.”
(González, 2006, p. 27). Portanto a relação da arquitetura vernacular estabelece com
seu contexto físico é evocada pela arquitetura contemporânea numa perspetiva
poética, através da materialidade como veículo de expressão e entendimento das
valências do território na materialização do objeto arquitetónico. Nos exemplos
apresentados o artificial assemelha-se ao natural, através de um processo metafórico
de criação, ditado pela matéria do território.
2.1.1. A UNIVERSALIDADE DA ARQUITETURA VERNACULAR
Etimologicamente, ‘vernáculo’ é qualidade do que é próprio do país ou da região a que
pertence, deriva do latim ‘vernaculu’, que significa «escravo nascido em casa».
A number of attempts have been made to find an overall definition of vernacular
architectutre. It is not surprising that these attempts have been unsuccessful for the
term is used to embrace an immense range of building types, forms, traditions, uses
and contexts. […] “ (Oliver, 1997, p. 21)
Antes de qualquer abordagem sobre exemplos arquitetónicos que evidenciam a
universalidade da arquitetura vernacular, importa ver antes de mais, a inúmeras
designações que a caracteriza. Sendo que o termo ‘vernacular’, pelo seu significado,
tornou-se o mais adequado para englobar a enorme diversidade das construções que
se enquadram nas expressões populares deste tipo de arquitetura, em detrimento de
outros termos implícitos, mas pouco mencionados. “Vernacular architecture is now the
term most widely used to denote indigenous, tribal, folk, peasant and traditional
architecture […] “. Contudo “The Encyclopedia of vernacular architecture of the world”
define a arquitetura vernacular do seguinte modo:
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Vernacular architecture comprises the dwellings and all other buildings of the people.
Related to their environmental contexts and available resources, they are customarily
owner- or comunity-built, utilizing traditional technologies. All forms of vernacular
architecture are built to meet specific needs, accomodating the values, economies and
ways of living of the culture that produce them. (Oliver, 1997, p. 23)
Uma vez que não existe uma abordagem específica para o estudo da Arquitetura
Vernacular, as diversas investigações levadas a cabo sobre este tipo de construções
desempenham um papel fundamental para o seu conhecimento, não deixando, no
entanto, de revelar-se uma disciplina complexa no seu escrutínio, pela diversidade de
perceções que várias direções de pesquisa trazem até a ela.
Existem, pois, abordagens arquitetónicas que evidenciam diversas motivações na sua
origem, e que, por sua vez, implicam diferentes métodos de estudo utilizados para
percebê-las. Além disso, um investigador de determinada área terá, certamente,
interesses profissionais que irão influenciar, de algum modo, a direção da sua
investigação e as provas e conclusões apresentadas para apoiar a sua teoria.
Como resposta à incomensurabilidade que abarca os domínios da arquitetura
vernacular, a “Encyclopedia of vernacular architecture of the world”, estabeleceu uma
estratégia interessante de abordagens e conceitos que sintetizam o estudo desta
arquitetura, através de um denominador comum a diversas culturas que a praticam.
Entre esses conceitos destacam-se:
a) O Estético – está relacionado com ideias de qualidade e valor das edificações.
b) O Antropológico – aborda os edifícios como artefactos culturais, que podem ser
reveladores da sua relação com a família, a estrutura social e os costumes.
c) O Arqueológico – faz referência aos antecedentes arquitetónicos revelados por
pesquisas [etno]arqueológicas, comparando o uso do edifício contemporâneo
com o registo de artefactos, para identificar os primeiros estilos de vida.
d) O Arquitetónico – pode desvendar princípios tecnológicos e organizacionais e
trazer técnicas de análise de edifícios vernaculares que podem influenciar,
positivamente, futuros edifícios, contribuindo para uma produção arquitetónica
de todos os tempos, portanto intemporal.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
e) O espacial – refere que habitar um determinado espaço é uma experiência
compartilhada universalmente. Mas cada espaço está profundamente imbuído
de valores culturais específicos, que caracterizam a identidade de um povo.
f) O Cognitivo – revela padrões comportamentais numa comunidade rural ou
urbana, refletindo perceções cognitivas da compreensão do indivíduo sobre o
modo como assimila mentalmente o edifício e a sua envolvente.
g) O Fenomenológico – busca identificar a natureza experimental do lugar, e a
forma como este afeta o edifício por dentro e por fora.
h) O Ecológico – refere-se ao habitat vernáculo como parte de sistemas naturais
do ambiente, pela sua construção com materiais que a própria natureza
fornece.
i)
O Desenvolvimento – avalia o potencial dos edifícios tradicionais para
responder aos problemas habitacionais da atualidade, sejam económicos,
ecológicos, culturais, técnicos, estéticos, entre outros.
j)
O Etnográfico – baseia-se na descrição das comunidades e das suas práticas
em relação às estruturas que constroem.
k) O Geográfico – considera os padrões de ocupação e edificação vernacular no
seu ambiente topográfico e locais espácio-económicos, em escalas que vão do
regional ao continental.
Ilustração 5 - The Esthetic- “Internal courtyard, Kawall Kanjiro house,
Kyoto, Japan (Oliver, 1997, p.5)
Humberto José Barros da Silva
Ilustração 6 - The Anthropological - “Anthropomorphism
in the idealized plan of a Dogon settlement” (Oliver,
1997, p. 7)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 7 – The Espacial – “Plan of a Mongol yurt showing spatial differentiation including altar, male and female quadrants. Variants
have been recorded”. (Oliver, 1997, p. 61)
A arquitetura vernacular, para além de expressar a identidade e a cultura de um povo,
caracteriza de forma particular o seu modo de habitar e de intervir no território. É “[…]
uma lição de qualidade e adaptação às condições do meio, de saber construir ligado à
paisagem […]” (Amorim, 2010, p. 67)
Na sua pluralidade tipológica manifestam-se diversos condicionalismos – geográficos,
económicos, sociais e culturais – locais e das comunidades que as constroem e
habitam. Estas implicações traduziram-se numa diferenciação regional pela utilização
de materiais e recursos do próprio local de intervenção, pela adaptação às
especificidades climáticas, aos costumes do quotidiano da comunidade e respetiva
atividade económica. Condicionalismos regionais que materializaram-se em modos de
construir distintos, mas comuns pelo facto de serem desenvolvidas segundo
estratégias empíricas de adaptação ao meio ambiente.
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A arquitetura vernacular é, assim, uma arquitetura de produção que não se revê em
dogmas arquitetónicos, mas sim na diversidade tipológica que caracteriza os modos
de habitar de um povo e da sua região, que tem como denominador comum em todos
os universos culturais os materiais e recursos locais. É, portanto, na diversidade de
recursos materiais do território que reside toda a riqueza e essência da arquitetura
vernacular. É do fator local que advém toda a sua autenticidade, porque os territórios
diferem e com eles difere o clima, a cultura, os hábitos e modos de habitar.
A intensa carga telúrica do território sobre este tipo de construções deriva do simples
facto de serem construídos com os materiais do terreno em que se erguem,
estabelecendo uma certa harmonia com o ambiente em que se localizam. “As fontes
da matéria-prima quase sempre estão próximas da obra – tira-se a terra do solo e
constrói-se ao lado […] ” (González, 2006, p. 32). Ou seja, em zonas graníticas,
constrói-se em granito; em zonas xistosas, constrói-se em xisto; em zonas de solos
calcários, utilizam-se alvenarias de argamassa; e em zonas de maior predominância
do barro, argila, areia e cal, constrói-se em taipa ou adobe, e assim sucessivamente.
O território torna-se, literalmente, matéria de construção, elemento ativo que formaliza
linguagens e modos diversificados de edificar consoante a sua localização geográfica.
Ilustração 8 – “Environment” – “Nine Climatic zones for Vernacular architecture. (Oliver, 1997, p. 128)
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Ilustração 9 - “Desert”- Papago summer village with round
house (vahkl) and shade roof (ramada), Southern Arizona, USA.
(Oliver, 1997, p. 133)
Ilustração 10 - “Continental”- Winter hut of the Saml, orthern
Scandinavia. (Oliver, 1997, p. 131)
Ilustração 11 - “Mediterranean”- “Shaded whitewashed street
Naxos, Cyclades Islands (Olivver, 1997, p. 135)
Ilustração 12 - “Montane”- Plan, sections and elevations of a
double enclosure, aerodynamic shepherd’s hut on montane
pasture, Velika Plana,SubAlps. (Olivver, 1997, p. 137)
Ilustração 13 - “Subtropical”- “Painted wooden house with
generous porch to provide shade on the south side, Charleston,
South Carolina,United States” (Oliver, 1997, p. 134)
Ilustração 14 - “Maritime”- North Hungarian House, type with
stepped thatched roof (Oliver, 1997, p. 138)
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Ilustração 15 - “Earth construction”- Clay lump workshop at Garboldisham, Norfolk, England. Walls are of clay lump on a plinth of flint
rubble, repaired with brick at right corner. Top left: a) Clay lump mould; b) clay lump with key for plaster and its mould; c) Moulding
press; d) Clay lump. (Oliver, 1997, p. 212)
2.1.2. CONSTRUÇÃO EM TERRA
“A construção em terra é um sistema construtivo que ultrapassa qualquer horizonte da
memória edificada. Trata-se de um sistema simples de construção que sucede
naturalmente à utilização da caverna como unidade básica residencial.” (González,
2006, p. 25)
Descobrir a origem da construção em terra, bem como as alterações a que foi sujeita
ao longo dos séculos, é descobrir a génese da expressão cultural de civilizações que
vão desde a antiguidade mesopotâmica, egípcia, europeia, africana; do Médio Oriente,
às civilizações romanas e muçulmanas, e às asiáticas hindu e chinesa.
O velho Egipto, por exemplo, afirma-se pelas suas belas construções em pedra, mas a
ausência deste material na grande zona entre o rio Tigre e o Eufrates fez desenvolver
a magnífica arquitetura em terra que abrangeu todo o norte de África, o Magreb e a
própria Europa. Embora atualmente já se tenha um conhecimento mais aprofundado
dos métodos e formas de construir em terra, mantém-se a dificuldade de sabermos
exatamente a origem deste modo de edificar.
Contudo não deixa de ser interessante e justificável, de certo modo, este enigma da
origem da terra como material de construção por excelência, pelo simples facto de ser
uma matéria ubíqua, que, fornecida pelo solo, encontra-se, praticamente, em qualquer
parte do mundo, e consequentemente a sua origem construtiva torna-se inconclusiva.
Pode-se dizer, no entanto, que o Mediterrâneo foi o elo de povos que trouxe até à
Europa os conhecimentos sobre este tipo de construção, desenvolvida pelas grandes
civilizações Hindu, Egípcia e Mesopotâmica.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Pela descoberta de habitações à base de blocos de terra (adobe) no atual
Turquemenistão, datadas de um período entre 8.000 a 6.000 a.C., com as construções
na Mesopotâmia entre 5.000 a 4.000 anos a.C. e com os exemplares de blocos de
adobe descobertos na bacia do rio Tigre há 7.500 anos a.C., estima-se que o Homem
tenha começado a construir com terra há cerca de 9.000 a 10.000 anos a.C. Embora
não seja consensual o período exato,“ […] não se estará muito longe da verdade se se
admitir que a construção em terra tenha tido o seu início juntamente com o início das
primeiras sociedades agrícolas num período cujos conhecimentos atuais remontam
entre 12.000 a 7.000 a.C. […] ” (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 10).
No entanto, são inúmeros os casos de construções em terra, que executadas há
milhares de anos, ainda se encontram erguidas atualmente. A grande Muralha da
China, construída ao longo de 2.000 anos, por ordem de 13 dinastias, apresenta
troços bastante extensos construídos em taipa, sendo que muitos troços foram
posteriormente revestidos com alvenaria de pedra.
Ilustração 16 – Utilização de taipa na Grande Muralha da China. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 11)
A pirâmide de Uxmal, no México, construída entre os séculos VI e X, é um exemplo de
uma mega estrutura construída com terra. O seu centro é de terra compactada e o
exterior é recoberto de pedras. A pirâmide do Sol, também no méxico, tem no seu
núcleo aproximadamente dois milhões de toneladas de terra compactada.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 17 – Pirâmide do Sol de Teotihuacan, México. (Torgal, Eires e Jalali 2009, p. 13)
As construções em terra são comuns na América central. As ruínas da cidade de
Chanchán no Perú constituem um dos mais antigos conjuntos arquitetónicos feitos
com terra. Entre as construções mais antigas à base de terra, inclui-se também o
povoado de Taos, no estado do Novo México, que foi erguido entre 1000 e 1500 D.C.,
com paredes de argila seca ao sol, reforçada com fibras vegetais. É também um dos
povoados indígenas mais bem conservados do estado, uma vez que as restantes
foram completamente descaracterizados pelos atuais moradores.
Ilustração 18 – Edificações em terra, Povoado de Taos, Novo México. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 13)
Um dos grandes exemplos de construção à base de terra à escala urbana é a cidade
de Shibam, no Iémen. Ainda hoje habitada, esta cidade teve origem no séc. III, embora
os edifícios que persistem atualmente sejam, na sua maioria, do séc. XVI. É composta
por edifícios que possuem entre 5 a 11 andares, construídos em adobe cuja espessura
se estreita gradualmente nos andares superiores para aligeirar o seu peso e melhorar
a estabilidade.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 19 – Edifícios em Adobe, Shibam, Iémen. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 14)
Mas a maior construção em adobe de todo o mundo é a cidade Arg-é Bam, no Irão,
construída há 2.000 anos sobre a antiga fortaleza de Bam. Um dos aspetos mais
interessantes nesta cidadela, para além da sua escala, são as torres captadoras de
vento – dispositivos naturais de ventilação, construídos para suportar as extremas
condições climáticas que assolam as cidades Iranianas. Atualmente, a cidadela
encontra-se desabitada devido ao sismo que a devastou em 2003. Entre as
construções monumentais à base de terra, destaca-se ainda a Grande Mesquita de
Djenné, no Mali, um dos maiores edifícios em adobe do mundo.
Ilustração 20 - Cidade de Arg-é Bam, Irão. (Fundación Cultural
Oriente, 2015)
Humberto José Barros da Silva
Ilustração 21 - A Grande Mesquita de Djenné, Mali. (Condé Nast
Traveler, 2015)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 22 – Plano da cidade de Arg-E-Bam antes do sismo. (Auroville Earth Institute, 2015)
Sobre o panorama mundial e atual deste tipo de construções, estima-se que “quase
50% da população mundial vive em habitações feitas com terra, qualquer coisa como
3.000 milhões de indivíduos […] e as projeções existentes apontam para que nas
próximas 3 décadas, esse valor possa chegar a 9.000 milhões” (Jalali, 2009, p. 17/18)
Ilustração 23 – Mapa-mundo – Zonas do globo com elevada densidade de construção em terra (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 17)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
2.1.3. ARQUITETURA VERNACULAR PORTUGUESA
O panorama nacional da construção em terra
Na Península Ibérica, a construção em terra terá surgido por influência de diversos
povos, entre os quais os Fenícios, Cartagineses, Romanos e Muçulmanos. Tendo sido
maior a influência por parte dos últimos, que foram os que mais divulgaram este tipo
de construção.
Em
Portugal,
de
uma
forma
genérica,
a
construção
em
terra
abrange
predominantemente a zona sul do país, nomeadamente, a região do Algarve, Alentejo,
a zona do Ribatejo e finalmente inflete para o litoral, abrangendo a zona de Aveiro. A
abundância deste tipo de construção nestas zonas verifica-se naturalmente por razões
de ordem geográfica e mais concretamente por razões geológicas, uma vez que são
zonas com solos de escassas reservas de pedra para a construção, e maior
predominância do barro, xisto, argila, areia e cal. São zonas onde as construções
eram feitas usando os materiais que existiam no local. “As fontes da matéria-prima
estão quase sempre próximas da obra – tira-se a terra do solo e constrói-se ao lado
[…] ” (González, 2006, p. 32).
Ilustração 24 – Distribuição geográfica das construções tradicionais portuguesas em terra: a) Taipa; b) Adobe; c) Tabique (Torgal, Eires
e Jalali, 2009, p. 16)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A resistência deste tipo de construção e os seus processos de execução permitiram a
preservação, até a atualidade, de elementos arquitetónicas importantes em Portugal.
Recordemos a zona antiga da Albufeira que se mantém em taipa, como a maior parte
das construções do último período em que muçulmanos dominaram a Península
Ibérica. Dela encontramos exemplos importantes em Mértola, no bairro muçulmano; ou
exemplos de arquitetura militar islâmica em taipa, como o Castelo de Paderne ou de
Silves, com taipa forrada a pedra vermelha grés. Estes exemplos, e ainda uma parte
da muralha fernandina de Lisboa, com longos séculos de existência, comprovam a
resistência destas construções à base de terra. Silves, por exemplo, antiga capital
muçulmana do Algarve «ALGHARB D’AL ANDALOUS», possui um vasto património
de Arquitetura de Terra, de origens romanas, obras que demonstram uma longevidade
admirável.
Ilustração 25 - Castelo de Paderne, Algarve (Torgal, Eires e
Jalali, 2009, p. 15)
Ilustração 26 - Castelo de Silves, Algarve (Urry, 2015)
Este tipo de construção compreende dois métodos de execução distintos: a taipa,
técnica que consiste na execução de paredes autoportantes “in situ”; e o adobe,
blocos de terra moldada. Na construção em taipa, enche-se um espaço de 0,50
metros, entre os taipais, de uma massa constituída por terra, argila, cal e pequenas
pedras, que será depois vigorosamente apiloada por um longo período, para que fique
bem comprimida, garantindo a coesão dos elementos que a constituem. A terra é
compactada em camadas de aproximadamente 10 cm, até preencher todo o taipal,
este é posteriormente removido e recolocado para a camada seguinte. A forma de
encaixe entre camadas é feita na horizontal ou ligeiramente inclinada para reforçar o
travamento entre as mesmas. As fundações destas paredes de terra são
tradicionalmente executadas em alvenaria de pedra, de modo evitar a humidade nas
paredes.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 27 – Sistema de taipal tradicional com aperto por
cordas. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 36)
Ilustração 28 – Pilões ou maços utilizados na taipa tradicional.
(Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 37)
Ilustração 29 - Construção em taipa tradicional (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 35)
Para além da taipa tradicional, desenvolveu-se, com o aparecimento de novas
tecnologias, a taipa mecanizada – um novo sistema de produção de taipa executado
com o mesmo princípio de produção da taipa tradicional, diferindo apenas na
qualidade das superfícies, dimensões e meio de compactação. A cofragem pode ser
amovível conforme as dimensões utilizadas, recorrendo-se a moldes de madeira ou de
metal. No entanto, o tipo de moldes dependerá sempre da textura que se pretende
obter. A compactação da terra é realizada através de um compactador pneumático,
otimizando desta forma a eficácia e o tempo de execução da obra.
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 30 - Construção em taipa mecanizada com cofragens metálicas. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 38)
Já a construção em adobe apresenta um processo de produção mais simples e talvez
por isso mais utilizado nas construções antigas. O termo adobe deriva do árabe “attob”
e significa tijolo seco ao sol, o que revela exatamente o processo de endurecimento do
material. Pensa-se que esta técnica tenha sido introduzida na Península Ibérica
durante a ocupação árabe. No sul do país, como já foi aqui referido, são frequentes os
edifícios em alvenaria de adobe, devido à predominância de solo arenoso. O seu
fabrico consiste na moldagem da terra em pequenos moldes paralelepipédicos de
madeira, que são enchidos com uma massa feita com mistura de terra, argila e cal.
Estes blocos de terra, designados, também, de “formigão” (se na sua constituição for
misturada palha ou fibras vegetais para reforço da massa), depois de retirados os
moldes, são secos ao sol durante semanas para adquirem boa resistência, que
permita depois o seu uso na construção.
Depois do processo de secagem, a forma de construir em adobe é semelhante a do
tijolo convencional, sendo que o assentamento dos blocos é realizado com argamassa
à base de terra, a fim de obter melhor junção entre a argamassa e os blocos, uma vez
que se mantém o mesmo nível de retração, evitando-se, assim, o aparecimento de
fissuras na superfície das paredes. Tal como a taipa, o abobe também pode ser
produzido através de processo mecanizado, utilizando máquinas semelhantes às
agrícolas, o que possibilita um processo de fabrico mais rápido.
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 31 - Produção manual e secagem do adobe. (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 42)
Ilustração 32 - Produção mecanizada do adobe (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p.45)
Tal como a pedra, que tem várias composições que lhe conferem caraterísticas
específicas de resistência, também quer o adobe quer a taipa, conforme as dosagens
e o tipo de argila e cal empregues, poderão adquirir características diversas, que lhe
conferem um estatuto de material de construção por excelência. “ […] Um material que
pelas suas características económicas, construtivas e ambientais poderá permitir o
renascer da arquitetura regional”. (Pinheiro, 1991, p. 9)
Mas o grande desenvolvimento da construção em terra veio, no entanto, a revelar-se
nos países do Norte de África. Onde a tecnologia evoluiu de forma exponencial ao
longo do tempo. Nas construções do Burundi e Marrocos, por exemplo, a modelação
da taipa eleva as formas arquitetónicas a níveis de organicismo incríveis. Em
Marrocos, por exemplo, desenvolveu-se uma técnica de construção em adobe,
designado de “Adobeton” – adobe com revestimento em betão –, que consiste numa
tecnologia de construção de paredes exteriores em adobe com camada protetora das
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
intempéries do exterior em elementos de betão prefabricados, aumentando deste
modo a resistência e durabilidade das superfícies, e conferindo-lhes um caráter mais
industrial.
Ilustração 33 - Construção de parede em "Adobeton" (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 46)
Como já referido, seja por razões de ordem económica, cultural, estética, de
sustentabilidade, ou mesmo no sentido de uma continuidade ou harmonia com o lugar
e a sua história, a exaltação do imaginário vernacular tornou-se no novo paradigma da
arquitetura contemporânea, seja por via da metáfora como veículo de exaltação, seja
por necessidade de salvaguarda e renovação destes ancestrais métodos de edificar.
A título de exemplo, veja-se o caso do projeto vencedor do concurso organizado pela
Trienal de Lisboa9 em parceria com a Trienal de Luanda. O concurso versava o tema
“Casa em Luanda: Pátio e pavilhão”, e procurava uma solução que se enquadrasse
nesses padrões, sendo desenvolvido para albergar famílias constituídas por 7 ou 9
pessoas.
9
A Trienal de Arquitetura de Lisboa é uma organização sem fins lucrativos cuja missão é investigar,
dinamizar e promover o pensamento e a prática em arquitetura, realizando a cada três anos um fórum de
debate, reflexão e divulgação que cruza fronteiras disciplinares e geográficas. A primeira trienal, intitulada
“Vazios Urbanos”, realizou-se em 2007.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
As propostas teriam que privilegiar a sustentabilidade do seu processo construtivo,
podendo considerar-se, no entanto, a sua execução de modo faseado ou até mesmo a
autoconstrução por parte dos seus futuros moradores. A equipe vencedora apresentou
uma proposta de habitação em taipa de pilão, composta por seis pátios ligados por um
corredor central que articulam-se com os diferentes ambientes e espaços da casa.
O projeto destaca-se pelo uso da taipa como resposta aos requisitos programáticos,
mas também como resposta à cultura e ao território árido a que se destina. Apesar
desta técnica de construção ancestral, a proposta assenta numa lógica perfeitamente
adaptada aos usos e padrões contemporâneos. O recurso ao método de construção
em taipa é claramente uma exaltação da arquitetura vernacular enquadrada num
contexto contemporâneo. Uma proposta inspirada a partir do contexto geográfico a
que se destina – um território que se enquadra num continente cuja construção em
terra apresenta um historial milenar. Neste sentido, o território apresenta-se como
matéria construtiva (no sentido literal) e compositiva (numa referência cultural do
território).
Ilustração 34 – Casa em Luanda – Imagem virtual da proposta (Ilustração Nossa, 2010, Trienal de Lisboa)
Segundo os arquitetos, o projeto define “uma casa onde o interior se comunica
permanentemente com o exterior. “Um interior íntimo e protegido, onde cada membro
da família pode ter a sua privacidade e autonomia”. A escolha da taipa como único
material para a construção da casa é suportada pela ideia de que a riqueza e
diversidade da proposta ficassem evidentes na riqueza da tipologia, do espaço e da
luz, e não na diversidade de materiais aplicados.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 35 – Casa em Luanda – Esquema da evolução concetual da proposta (Ilustração Nossa, 2010, Trienal de Lisboa)
Ilustração 36 – Casa em Luanda – Maqueta e fotomontagem da proposta (Ilustração Nossa, 2010, Trienal de Lisboa)
Esta proposta é mais um testemunho do papel fundamental que a arquitetura
vernacular desempenha no panorama da arquitetura contemporânea, que se quer
diversificada mas autêntica, estando intrinsecamente vinculada ao seu contexto
geográfico e cultural.
A arquitetura contemporânea pode avançar se tiver em conta as fontes vernáculas. A
reinterpretação perpetua a tradição local, ao mesmo tempo que incorpora novas ideias
com origem na mesma região ou em outras mais distantes. Desta maneira, as
tradições locais fortalecem-se e renovam-se graças às novas influências, todo este
processo evita a estagnação. (Bahamón e Álvarez, 2009, p. 99)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A dinâmica formativa à volta da construção em terra, bem como o entusiasmo com
que novas gerações de arquitetos encaram este tema, ainda não tem grande
expressão em Portugal. No entanto, é importante referir que apesar de constituírem,
atualmente, uma percentagem diminuta em termos de mercado imobiliário nacional,
vão tendo já lugar várias obras de construção em terra, sendo que a sua incidência se
faz sentir mais no sul do país.
O nosso futuro depende do nosso passado e do nosso presente. Assim, a modernidade
precisa desta continuidade que liga a obra passada, a ação presente, a construção do
futuro. E o nosso objetivo terá de ser a qualidade da vida futura – não da nossa técnica,
mas das populações. É preciso então recuperar, reavaliar e reabilitar as técnicas
ancestrais e humanas com o que somos hoje, com a nossa sensibilidade. (Braizinha,
1993, p. 6)
Ilustração 37 – Habitação unifamiliar construída em taipa, pedra
e madeira, Beja (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 23)
Ilustração 38 – Adega (Torgal, Eires e Jalali, 2009, p. 23)
A constituição do território português
A singularidade das culturas é feita de pequenos e singulares acontecimentos que nos
distinguem e nos individualizam. Factos históricos, representações culturais imateriais
e realizações materiais concretas, tais como edificações e artefactos, que têm uma
importância determinante na caracterização cultural de um povo. É assim que o
património português tem um papel fundamental para a compreensão do nosso
território, da nossa história, da nossa cultura, do modo de ser e estar na vida. Partindo
do lugar enquanto espaço físico e humano, com as suas características próprias,
ordenou-se um território e edificou-se um país. Este processo longo e gradual foi
acompanhado por desenvolvimentos e transformações na estrutura social e
económica da população.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Mas o “conhecimento de um lugar, de uma região ou de um país pressupõe conhecer
as artes e os ofícios que lhe conferem vida, que lhe deram a individualidade que os
caracteriza.” (Fernandes, 2006). Graças aos operários das mais diversas áreas,
podemos hoje entender o percurso de Portugal na História, através das obras
edificadas, das mais eruditas às mais populares. No entanto, como referiu Fernando
Távora, “particular atenção deverá ser dada à arquitetura tradicional, porque a casa
popular fornecer-nos-á grandes lições quando devidamente estudada, pois ela é a
mais funcional e a menos fantasiosa, numa palavra, aquela que está mais de acordo
com as novas intenções." (Távora, “O Problema da Casa Portuguesa”, 1947)
A arquitetura tradicional, profundamente ligada aos lugares e às suas comunidades,
formaliza-se, como é comum em todas as construções tradicionais, a partir dos
recursos e materiais locais, sendo que a componente artesanal do saber construir
desempenha um papel preponderante em todo o processo. Os artificies, anónimos
mestres na arte da construção tradicional, possuem técnicas ancestrais e de
conhecimentos únicos. São eles que, com experiência herdada de gerações, tão bem
constroem a imagem tradicional do povo português, partindo do caráter próprio de
cada região para a construção de uma identidade nacional tão coesa e singular quanto
diversa.
De contornos bastante irregulares, o território português apresenta uma linha de costa
bastante extensa, com 812 km e uma fronteira terrestre com a Espanha que se
prolonga por 1215 km de comprimento.
Da sua posição marginal relativamente à Península Ibérica, resulta uma certa
continuidade nas formas e na topografia, que se prolongam do outro lado da fronteira,
sem que esta, na sua maior extensão, tenha origem em acidentes naturais bem
vincados. A semelhança do relevo é notória quer no Norte do país, onde o planalto de
Trás-os-Montes parece prolongar os planaltos de Castela-a-Velha e de Leão, quer no
Sul, onde a província do Alentejo apresenta a mesma continuidade em relação às
formas topográficas de Castela-a-Nova e da Estremadura espanhola.
No centro, é a cordilheira central, representada pela Serra da Estrela, que surge como
último elemento de um conjunto de elevações que, seguindo uma direção NordesteSudoeste, atravessam o centro da península.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Marginalmente são os vales profundos do Douro, Tejo e Guadiana que, seguindo
diversas direções, transportam para o oceano as águas nascidas respetivamente nas
serras de Urbion, de Albarcin e na lagoa de Ruidera.
Do ponto de vista geológico e estrutural, o território é formado por três grandes
unidades, diversas entre sim na origem, na litologia e na própria evolução das formas
representadas, provenientes de ações tectónicas e processos erosivos diferenciados.
Estas unidades estão representadas pelo Maciço Antigo ibérico, pelas Orlas
Sedimentares-Ocidental e meridional e ainda pelas bacias do tejo e do Sado, de
formação mais recente.
O mais antigo e extenso das unidades é o Maciço Antigo ibérico, formado por rochas
metamórficas, eruptivas e sedimentares, que cobrem quase sete décimos do território.
Entre as formações mais antigas, destacam-se as rochas gneisses, micaxistos,
quartzitos, calcários metamórficos e outras camadas acentuadamente comprimidas e
enrugadas. Além destas, temos ainda os granitos e os diorites, que cobrem uma
grande parte do território, concorrendo em extensão, com as formações xistosas
circundantes. Estas encontram-se associadas a outras formações, nomeadamente os
grauvaques, dando origem ao complexo-xisto-grauváquico, bastante representado
entre o rio Tejo e a Serra da Estrela, e no vale do Douro.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 39 – Esboço Litológico do território português (Moutinho, 1979, p. 15)
As formações graníticas, com elevado teor de humidade, arenizam-se facilmente,
dando origem a formas topográficas bem definidas, de caráter retilíneo, contribuindo
deste modo para o desenvolvimento de vales amplos e férteis. Os xistos, pelo
contrário, além de menos permeáveis do que os granitos, não sofrem de processos de
arenização, pelo que o solos apresentam-se bastante secos e pobres.
Os diferentes tipos de rochas correspondem a formas de relevo diversos, bem como
tipos de ocupação humana, e consequentemente tipos de arquitetura distintos. Para
além da estrutura geológica do território, os fatores do relevo e do clima, também,
determinam diversos tipos de povoamento.
O relevo português é constituído por blocos mais ou menos extensos e fraturados de
planaltos cortados por vales e outras elevações resultantes da erosão diferencial que
tem atuado sobre as formações geológicas. Desta complexidade de planaltos e
enrugamentos resulta naturalmente uma diferente distribuição das altitudes. A sul do
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
rio Tejo, por exemplo, o predomínio das superfícies planas é notório, prevalecendo
altitudes inferiores a 200 metros. Já a norte do rio predominam altitudes superiores a
400 metros, como por exemplo na Serra da Estrela.
Ilustração 40 – Esboço do Relevo do território português.
(Moutinho, 1979, p. 17)
Ilustração 41 – Tipos de povoamento rural. (Moutinho, 1979,
p.25)
Ilustração 42 – As formas do Relevo: Escarpa de falha – A) No granito as escarpas e superfícies conservam-se bem e existe forte
concentração de drenagem. B) Nos xistos, todas as formas são dissecadas por uma rede hidrográfica muito densa, conservando-se só
algumas escarpas de falha e transformando-se as superfícies altas num mar de cabeços. (Ribeiro, Lautensach e Daveau, 1991, p. 175)
Ilustração 43 – As formas do Relevo: Reboco de erosão: C) No granito, as escarpas são vivas, com ângulo bem marcado na base; as
colinas isoladas na planície testemunham o retrocesso do flanco montanhoso; os vales principais são largos e de fundo plano entre
vertentes abruptas; outros tipos de vales: a) de fratura, b) de rejuvenescimento lento. D) Nos xistos, passa-se gradualmente da
montanha para a planície e não há montes-lhas; a rede hidrográfica é densa e o relevo muito dissecado. (Ribeiro, Lautensach e Daveau,
1991, p. 175).
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A repartição do relevo a norte e a sul obriga a uma distribuição distinta das populações
e à diferenciação de modos de vida, assentes fundamentalmente nas atividades do
setor primário. Assim, a adaptação da agricultura à irregularidade do relevo processouse através da construção de inúmeros socalcos, como demonstram as vertentes do
Douro e as montanhas minhotas. Já as zonas mais baixas, embora apresentem uma
grande extensão em área, os solos apresentam baixos índices de produtividade,
devido à sua formação litológica, composta essencialmente por areia, aptos apenas
para florestação.
Ilustração 44 – Adaptação agrícola às vertentes do Douro através da construção de socalcos. (Centro de Inovação de Trás-os-Montes
e Alto Douro, 2015)
Apesar da diversidade física do território, a existência de grandes unidades naturais
com idênticas formas de relevo, de clima, de revestimento vegetal e da própria
atividade humana sugere a divisão do território em províncias. Desta divisão, podemos
distinguir as províncias em três grandes domínios climáticos, que irão influenciar a
distribuição populacional pelas regiões a Norte, no Centro e a Sul.
A desequilibrada repartição da população no território português, com maiores
densidades ao longo da faixa litoral entre o Minho e o Tejo, ao longo dos vales dos
principais rios, no Sul do país e no Algarve, não deixa de se refletir nas condições
naturais já aqui referidas, como a litologia, o tipo de solos, o clima, o relevo e própria
vegetação.
Essas condições naturais, além de influenciar os fatores de distribuição, de
crescimento e de atividade da população (predominantemente agrícola e pecuário),
influenciam também o tipo de construção existente nas diversas regiões, um precário
modo de habitar.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A nenhuns condicionamentos a Arquitectura regional está mais vincadamente sujeita
que à penúria do povo e aos materiais de construção. Uma na limitação de soluções,
outros na sua efetivação. […] Para lá do que procuram conscientemente, há nas
soluções um jogo espontâneo e belo de volumes, de aberturas ou de superfícies
fechadas, de claros-escuros que o sol realça ao afagar uma parede caiada a que a
tortuosidade do terreno deu vida. Conseguem uma superação do que a natureza e a
dura vida lhes oferecem e, para tal, basta-lhes pegar na pedra, mesmo sem acarinhar,
moldar a taipa ou empilhar o adobe, jogar com os tijolos e com os vazios, com a doçura
da cal ou com a vivacidade da madeira, passar de quando em quando uma mancha de
cor e, sem saberem regras de composição nem quererem ser mais do que esmerados,
carinhosamente erguem o lar ou a oficina. (Amaral, 1988, p.387)
Ilustração 45 – O ambiente agreste da região do Norte - Montes,
O “Lugar”. (Amaral,1988, p. 131)
Ilustração 46 – Alpendre de uma casa no Alentejo. (Amaral,
1988, p. 179)
Na zona Sul do país, por exemplo, nas regiões alentejanas e algarvias, constituídas
essencialmente por solos planos, ricos em calcário, areias e grés, ou xistos pouco ou
nada cristalinos (como se poderá constatar no mapa litológico), abundam construções
com paredes caiadas e pintadas de branco – um método que reduz a incidência dos
raios solares sobre as casas, atenuando, assim, o calor tórrido que se faz sentir nestas
regiões. Outro método de combate ao clima quente e seco compreende espaços
exteriores de permanência, como alternativa ao interior quente das casas, como o
alpendre ou uma varanda coberta, que resguardam do sol, conservando-se frescos.
Os invernos temperados, alternados com dias soalheiros influenciam o caráter do
espaço exterior contíguo à habitação que, pela criação dum alpendre ou de uma
varanda alpendrada, constitui zona de transição climática entre o ambiente tórrido e o
interior fresco. (Amaral, 1988, p. 179)
Inquérito à Arquitetura Popular em Portugal
Este Inquérito foi um extenso trabalho realizado pelo Sindicato Nacional dos Arquitetos
entre 1955 e 1960, com iniciativa do então presidente Francisco Keil do Amaral, Nuno
Teotónio Pereira, Fernando Távora, entre outros arquitetos.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A pretexto da crise de identidade que assolava o país relativamente às diretrizes
modernistas que proliferavam na Europa, Távora, em 1947, preocupado com a
implementação de uma arquitetura nacional com valores próprios, lançou o alerta para
a necessidade de renovação das intenções e ideias para uma arquitetura portuguesa
que não se quer apenas moderna, mas identitária, consentânea com as suas
necessidades e valores, e não estritamente racionalista ou funcionalista, como
algumas produções arquitetónicas que proliferavam na Europa, imbuídos de um
espírito progressista por vezes irrefletido. Com o alerta deste “Problema da Casa
Portuguesa”, Távora deu, assim, o mote para o Inquérito à Arquitetura Popular, que
viria a servir de ponte entre o tradicional e moderno em Portugal.
Debate-se aqui um problema central do nosso pensamento. O da identidade. Casa
portuguesa, em sentido lato espaço português, forma portuguesa, ambiente português,
cultura portuguesa, etc., etc. O problema da identidade: num mundo de massificação e
de internacionalização valerá a pena lutar pela individualidade e pela identidade? Mas
como conjugar a individualidade e a identidade com a modernidade? Ou que
modernidade para garantir ao homem e ao seu espaço a sua individualidade e a sua
identidade? A identidade como condição de sobrevivência? (Távora,1993 p. 56)
Contra às drásticas ruturas do modernismo com o passado, Távora sendo um
defensor da continuidade, para quem a obra arquitetónica tem de ser entendida no
contexto em que se insere, defendeu fervorosamente a efetivação de uma identidade
nacional, alcançável apenas com o escrutínio dos valores da arquitetura tradicional e o
modo como podem servir de referência para a evolução contextualizada da arquitetura
portuguesa – um princípio que Kenneth Frampton defende no seu “Regionalismo
Crítico”, referindo o seguinte:
Para enveredar pelo caminho da modernização, será necessário jogar fora a cultura do
passado que foi a raison d’être de uma nação? […] Daí se origina o paradoxo: de um
lado, a nação tem de fincar raízes no seu passado, forjar para si mesma um espírito
nacional e desfraldar essa reivindicação cultural e espiritual perante a entidade
colonista. Mas, para poder tomar parte da civilização moderna, é necessário participar
simultaneamente da racionalidade científica, técnica e política, o que muitas vezes
exige o abandono puro e simples de todo um passado cultural. O facto é que nem toda
a cultura pode suportar e absorver o choque da civilização moderna. E o paradoxo é:
como modernizar-se e retornar às fontes? Como despertar uma velha civilização
adormecida e se integrar na civilização universal […] (Frampton, Nesbitt, 2008, p. 505).
A problemática da Casa Portuguesa exigia, portanto, uma perspetivação arquitetónica
nacional “ […] atenta à necessidade de uma nova adequação social e histórica,
interessada em desenvolver um processo próprio com diferentes coordenadas.”
(Vieira, 1997, p. 9). Com a preocupação de articular as diretrizes do modernismo com
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
as necessidades de uma sociedade que se quer esclarecida quanto à sua identidade,
surgiu a iniciativa de elaborar o Inquérito sobre o estudo do meio e da arquitetura
tradicional portuguesa produzida até então, facto que veio a ser determinante para a
obra de Fernando Távora, que destaca-se pelo reconhecido equilíbrio que estabelece
entre a modernidade e a tradição.
Como já foi referido, Távora foi, inicialmente, o impulsionador da ideia, ao propor um
trabalho sério sobre o tema. Mas dois anos depois, Keil do Amaral pronunciou-se,
também, sobre a necessidade de um trabalho do género, vindo posteriormente a
afirmar-se como figura fulcral no lançamento e coordenação do Inquérito.
Organizados em seis equipas repartidas por diversas regiões do país, estes arquitetos,
muitos recém-licenciados, procederam a um estudo exaustivo da arquitetura popular,
percorrendo cerca de 50.000 quilómetros de automóvel, tirando cerca de 10.000
fotografias, centenas de desenhos e levantamentos, e tomaram milhares de anotações
escritas. Deste abundante material, foi preparado e lançado o livro “Arquitetura
Popular em Portugal”.
Para este trabalho estabeleceram-se disposições concretas e pormenorizadas sobre
aspetos que convinha analisar, tais como: ocupação do território, estruturação urbana,
materiais e processos correntes de construção, influência do clima, da economia, da
organização social, dos fatores de evolução sobre os edifícios e os seus
agrupamentos, e ainda uma análise das sínteses plásticas dos edifícios e das suas
condicionantes.
Nesta investigação procurou-se respostas sobre a prática da arquitetura na sua
ligação essencial com os fatores geográficos, mas também no âmbito das relações,
dos desdobramentos e sobreposições entre as influências mediterrânicas e atlânticas,
descritas antes pelo geógrafo Orlando Ribeiro, no seu livro “Portugal, o Mediterrâneo e
o Atlântico” (1945).
Este inquérito viria a influenciar o panorama da arquitetura moderna e contemporânea
portuguesa, servindo de inspiração a uma vaga de arquitetos, que irão cultivar o seu
interesse na qualidade expressiva das construções tradicionais, que se notabilizaram
pela forte incidência regional. Aspetos que viriam a ser determinantes na relação da
arquitetura contemporânea portuguesa com o lugar.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
No entanto, a consequência mais ampla, a nível cultural, deste trabalho foi a
conclusão da inexistência de uma arquitetura de caráter nacionalista, uma vez que não
se constatou um padrão de linguagem arquitetónica, mas sim uma diversidade
construtiva resultante da vigorosa imposição do território e das condições naturais à
ocupação humana nas diversas regiões, em que cultiva-se e constrói-se o que a
natureza consente, de acordo com as condições geográficas.
A arquitetura popular regional não é urbana de origens nem de tendências. Pode
«urbanizar-se», melhorar de cuidados construtivos e apuros formais, mas, se lhe
cortam as raízes que a prendem fortemente à terra e aos seus problemas, desvirtua-se,
perde a força e a autenticidade. (Amaral, 1988, p. 19)
Portanto, o objetivo deste estudo não foi definir um estilo arquitetónico mas sim
demonstrar a diversidade regional destas construções, que viria a ter um impacto
considerável na produção arquitetónica portuguesa, permitindo novas formas de
diálogo entre arquitetura moderno-contemporânea e a tradicional, particularmente na
dita Escola do Porto, com destaque para obra de Fernando Távora, e posteriormente
de Siza Vieira e Souto Moura, entre outros arquitetos das gerações subsequentes.
Seria, portanto, a partir do Inquérito à arquitetura popular que se estabeleceria o
vínculo da arquitetura moderna e contemporânea portuguesa ao lugar, tendo como
seu maior difusor, a Escola do Porto. “Moderno e Regional são portanto dois
parâmetros que andam lado a lado ao longo do percurso arquitetónico português e
estão simultaneamente aliados a uma forte relação com o lugar.” (Rodrigues, 2009, p.
6)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Região do Minho, Douro Litoral e Beiral Litoral
Zona tão tentadora como difícil, densamente povoada e abrangendo terras que vão do
litoral ao acidentado interior, e do Minho ao Mondego; Zona rica em história, onde a
dimensão tempo significa e explica muita coisa, agitada ao longo dos séculos por
choques de homens e culturas, povoada aqui por uma pequena aldeia de montanha, ali
pela grande cidade, variada na sua economia, que oscila entre a agricultura de
exploração quase primitiva à mais moderna indústria. Porque muito densamente
povoada e porque povoada desde sempre – Zona rica em construções, que vão desde
o espigueiro simples de Lindoso ao solar senhorial da Ribeira Lima, como da nora de
Válega à casa urbana do Porto.” (Távora, Pimentel e Menéres, 1988, p. 11)
Ilustração 47 – Situação da Zona 1 no País. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 11)
Ilustração 48 – Povoamento em Ponte de Lima, panorâmica sobre a
Sobrada. (Arq. Pop. Portuguesa,1988, p. 32).
Esta região, classificada no Inquérito como “Zona 1”, destaca-se pela quantidade de
rios que fragmentam o solo, diferenciando-se, a sul, pelo afastamento do Vouga e
Mondego; no centro, o Douro, pelo seu traçado, perfil e importância; e nos limites
orientais, o rio Tâmega, com o seu grande afluente. Para além dos rios, esta zona é
repleta de nascentes naturais, devido à permeabilidade do solo granítico (material
predominante na região), ao denso revestimento vegetal e às grandes precipitações
atmosféricas, que produzem uma enorme retenção de água no subsolo.
O relevo apresenta-se numa sequência de três faixas longas e paralelas ao Oceano. A
primeira faixa, junto à costa e com uma altitude compreendida entre os 0 e 400
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
metros, é recortada pela foz dos rios; a segunda faixa, com uma altitude de 400 a 800
metros, é formada por uma intrincada sucessão de vales, colinas e montes, que fazem
a transição para a terceira faixa, que compreende alturas superiores a 800 metros,
constituída por formações rochosas das montanhas situadas no interior. Esta
diferenciação de altitudes gerou tipos de ocupação e povoamentos distintos.
Ilustração 49 - Relevo e hidrografia (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 14)
Esta formação ascendente do relevo gera um autêntico anfiteatro natural sobre o
oceano, ladeado pelos sistemas graníticos das serras de Peneda, Soajo, Gerês,
Cabreira e Marão. Já os terrenos mais planos, de formação sedimentar, começam a
surgir mais junto à costa, a partir de Espinho.
Quanto ao clima, a ação do oceano atlântico nesta zona é determinante no que diz
respeito às vicissitudes dos seus ocupantes, definindo, ao longo do tempo, ações e
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
formas de expressão do quotidiano das populações. Funciona como elemento
moderador das variações climáticas, gerando um clima húmido e regular, com índices
de pluviosidade que variam consoante a altitude. Este tipo de clima, pela humidade
elevada e variação amena da temperatura, proporciona condições favoráveis para as
atividades agrícolas e de pastoreio.
A constituição geológica desta zona é predominantemente granítica e xistosa, o que
leva a que as edificações sejam maioritariamente construídas com estes materiais.
Apenas uma pequena porção do solo é constituído por argilas e rochas sedimentares.
Ilustração. 50 – Geologia (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 15)
[…] o cunho primitivo de hábitos de vida ensimesmada ressalta da construção espessa
onde só surgem à luz do dia os materiais líticos, únicos capazes de durar e envelhecer
lentamente. E assim permanecem séculos na sua forma quase inalterável, assentes na
fraga que lhes serve de fundação, construídas de granito ou de xisto, cobertas de lousa
ou colmo, ou então, sinal dos tempos florescentes de telha de canudo, pouco se
diferenciando duma região para outra […] (Távora, Pimentel e Menéres, 1988, p. 39).
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 51 – Casas em Castro Laboreiro, construção em granito (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 38)
Ilustração 52 - Casa do povoado, construção em granito, Manhouse, S. Pedro do Sul. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 83)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Região de Trás-os-Montes e Alto Douro
A vida repete-se em cada ano e os anos contam-se de inverno a inverno. Porque com
a caída das primeiras neves, a vida vai-se recolhendo às casas. Depois, longos dias,
as casas e os caminhos ficam, como a serra, rendidos à neve. E até ao degelo, quando
a vida recomeça inteira, é a submissão do homem. (Felgueiras, Araújo e Dias, 1988,
p.129)
Ilustração 53 – Situação da zona
2 no País. (Arq. Pop. Portuguesa,
1988, p. 123)
Ilustração 54 – Serra do Marão. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 128)
Esta região, classificada no Inquérito como “Zona 2”, é essencialmente constituída por
serras. A poente, nos limites do noroeste português, é marcada pelas serras do
Barroso e do Marão; no interior, pelas serras de Padrela, da Nogueira e de Bornes; e
ainda pelos vales do Tâmega, do Douro e do Tua.
O clima, ainda que influenciada pelo atlântico, através da serra da Padrela, é
essencialmente continental, com grandes amplitudes térmicas, devido às elevadas
altitudes das serras e as baixas altitudes dos vales dominantes, definindo, deste modo,
a zona em duas grandes subdivisões regionais: a terra fria e a terra quente. A primeira
resulta das elevadas altitudes planálticas do norte e nordeste e a segunda tem origem
nas correntes térmicas do interior, oriundas do Douro.
A região é geologicamente dominada pelo xisto, contendo pequenas porções de solo
granítico, que vai-se tornando a dominante geológica à medida que se aproxima da
Humberto José Barros da Silva
65
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
região do Minho, como se poderá constatar no mapa geológico. Consequentemente,
estas matérias geológicas tornam-se matéria-prima das construções, que são, na sua
maioria, feitas de xisto.
Muros, socalcos ou paredes de casas aparecem-nos sempre com um amontoado de
calhaus que as arestas cortantes do xisto pontilham de reverberações, de tonalidades
muito variadas. Acompanhando as curvas dos caminhos, ou cortando abruptamente
quebras e esquinas, esses panos pintalgados, por vezes de altura um pouco
desconforme, são furados por um ou outro buraco, porta baixa, postigo receoso, mais
reduzidos ainda pelos fortes enquadramentos que os defendem. (Felgueiras, Araújo e
Dias, 1988, p. 136)
Ilustração 55 – Mapa geológico com a separação da Terra fria e Terra quente (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 124)
Além do xisto, a lousa é outro material que caracteriza as construções desta zona. A
expressão que imprime nas coberturas das casas resulta do seu aspeto natural e da
maneira como é aplicada: “como uma cascata de pedaços irregulares, simplesmente
justapostos, ou numa progressiva ordenação de tamanhos e formas, realçadas pelas
linhas brancas das juntas tomadas a cal.” (Felgueiras, Araújo e Dias, 1988, p. 139)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 56 – Pormenor de um telhado de lousa rematado nas juntas com argamassa, Boavista, Marão (Arq. Pop. Portuguesa, 1988,
p. 139)
Ilustração 57 – Revestimento de
parede em lousa, Cotorinho, Marão.
(Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 138)
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Ilustração 58 – Construção em xisto numa curva de caminho, Montes (Arq. Pop. Portuguesa,
1988, p. 136)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Regiões da Beira Alta e Beira Baixa
Prolifera nesta região do país uma gente rija e aguerrida, cuja a epopeia tem sido a luta
milenária para arrancar ao solo pouco generoso um sustento escasso. Homens em
quem tal luta gerou hábitos de trabalho sem tréguas nem desfalecimento, de
sobriedade, de economia e um estranhado amor ao terrunho que lhes resiste, mas que
os alimenta e lhes revela a medida das suas forças criadoras. Em contrapartida,
mantém-nos num primitivismo de vida, de interesses e de aspirações que impressiona
e, frequentemente, confrange. (Amaral, Lobo e Malato,1988, p. 8)
Ilustração 59 – Situação da
zona 3 no país. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 3)
Ilustração 60 – Os vales de Cotarredor (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 7)
Estas regiões foram classificadas de “Zona 3”, sendo que Beira Alta estende-se para o
norte da Serra da Estrela, em terrenos acidentados e rochosos, e onde o granito
configura maior predominância por entre os numerosos cursos de água que
fragmentam o solo. A Beira Baixa distingue-se pelo clima continental e pela
constituição geológica, em que predominam terrenos xistosos muito antigos, tendo
ainda a particularidade de assemelhar ao tipo geográfico alentejano, onde não existe
serra, pedominando campos arborizados, com montado ou olival, a que Leite de
Vasconcelos10 designou de “Beira alentejana”.
O clima, embora não se manifeste com o rigor das zonas 1 e 2, apresenta-se com
fortes amplitudes térmicas, variando entre o inverno chuvoso e gélido, e o verão seco
e quente, onde a temperatura chega a atingir os 37ºC.
10
José Leite de Vasconcelos (1858-1941) foi um arqueólogo e etnógrafo português. Tem como sua obra
literária de destaque “O Dialeto Mirandez” (1882), “Religiões da Lusitana (1897), “Etnologia Portuguesa”
(1933), “Antroponímia Portuguesa” (1928) e “Lições de Philologia Portuguesa” (1911).
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68
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 61 – A semelhança dos arredores de Pinhel, Guarda, com as planícies alentejanas (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 6)
No que respeita à constituição geológica, os terrenos desta zona são maioritariamente
constituídos por solo granítico a norte e xistoso a sul. “Predominam ali os terrenos de
rochas graníticas, propícios ao cultivo de cerais, especialmente o centeio; a leste de
Pinhel, estende-se uma zona de terrenos xistosos, onde crescem a vinha, a oliveira e
a amendoeira.” (Amaral, Lobo e Malato, 1988, p. 5)
Ilustração 62 – Mapa geológico (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 13)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Das reservas geológicas representadas no mapa, o granito, sendo a composição mais
abundante do território, é, logicamente, o mais aplicado nas construções. A
generalidade do seu emprego e a variedade das suas aplicações decorre da sua
abundância. De um modo geral os construtores extraiam o granito das pedreiras do
seguinte modo:
Abrem-se furos profundos, percutindo e esmilhando a pedra com um ponteiro de ferro e
um maço. A explosão da pólvora ou da dinamite, com que se enchem depois esses
furos, fratura a pedra em blocos maiores ou menores, que os pedreiros trabalham em
seguida. E bastam pequenos jeitos dados aos ponteiros durante a furação, por homens
experientes, para que a pedra quebre, sensivelmente, nas dimensões desejadas. Com
pequenos guilhos, percutidos ao longo de linhas traçadas, obtém-se um rigor ainda
maior de fratura, quando se pretende extrair pedras para a cantaria, que os pedreiros
«lavram» depois a cinzel, para lhes alisarem os parâmetros. Nas pedras correntes,
destinadas às alvenarias, o pico é, porém, a ferramenta usual de trabalho com que se
afeiçoam. E falta apenas, para fazer as paredes, elevá-las com o auxílio de um guincho
de madeira ou de ferro, que enrola o cabo suspenso de uma roldana presa numa
armação de três varas de pinheiro. (Amaral, Lobo e Malato, 1988, p. 63)
Ilustração 63 - Mapa dos materiais correntes de construção (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 61)
Contudo nas extensas áreas do sul da Beira, as construções em granito perdem
protagonismo, devido à sua escassez, predominando o xisto como material de maior
abundância e consequentemente mais acessível para construção local. É aplicado,
praticamente na sua forma natural de extração, em paredes de alvenaria e coberturas
simples, disposto em lascas sobre uma estrutura de madeira ou em pavimentos de
lareiras e casas.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 64 – Construção em xisto, uma casa em Outeiro da Vinha (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 64)
Em termos construtivos, os povoados destas regiões estabelecem uma estreita
relação com o ambiente natural, pela preponderância da atividade agrícola e pelo
emprego rudimentar dos materiais locais, com tendência para o uso da pedra (granito
e xisto), que vai sendo trabalhada conforme o território assim o permite, estabelecendo
uma relação cromática e tectónica com a envolvente. “As casas, irregulares, são de
granito, onde há granito, ou de xisto, onde o solo é xistoso, ou ainda de xisto e granito,
nas zonas de transição; e, com o tempo, tomam a cor geral da região em que
assentam.” (Amaral, Lobo e Malato, 1988, p. 15)
Os materiais das coberturas – telha canudo, lajes de xisto e colmo – também adquirem
uma patine própria do sítio, que, em concordância com a materialidade das casas e as
suas adaptações topográficas, contribuem para uma perfeita integração das
construções no meio. “Desta circunstância, aliada à adaptação do casario ao terreno,
ressalta uma associação tão íntima entre as casas e a paisagem que, de longe, é por
vezes difícil distinguir a aldeia perdida entre penedias e árvores.” (Amaral, Lobo e
Malato, 1988, p. 15)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 65 – Aglomerado de casas em granito com cobertura de colmo, Bigorne. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 71)
Ilustração 66 - Pormenor de cobertura «colmada». (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 71)
Ilustração 67 – A simbiose entre um aglomerado de casas em granito e a sua envolvente, Sortelha. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 15)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Regiões da Estremadura, Ribatejo e Beira Litoral
É uma zona de transição e contrastes. Sintra e Arrábida, separadas de poucos
quilómetros, são expressões violentas do que à volta se mostra esbatido e pleno de
cambiantes. […] O tejo aparece-nos como fronteira entre uma zona plana, onde a
horizontalidade só é agitada pelas serras da Arrábida e de Palmela, e uma outra
estruturada pelo maciço estremenho, cujas alturas vão morrer nos campos do
Mondego ou nos areais do litoral. (Pereira, Freitas e Dias, 1988, p. 339)
Ilustração 68 – Situação da zona 4
no País. (Arq. Pop. Portuguesa,
1988, p. 123)
Ilustração 69 – Praia em Palheiros da Tocha (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 125)
Estas regiões, classificadas de “Zona 4”, distinguem-se pelos grandes contrastes
climáticos, de influência oceânica e mediterrânica. Por outro lado a natureza do solo
contribui também para as dicotomias que caracterizam a zona, conjungando-se,
assim, uma série de fatores geográficos que contribuem para a diversidade
paisagística, que se formaliza entre serras e planícies, praias e areais.
As areias, que o vento sopra da costa sententrional, invadem uma área que penetra
quilómetros para o interior. Onde esta invasão não se dá, a natureza do solo
uniformiza-se com ela. O burgau e a terra arenosa consentem uma vegetação rasteira
e odorosa de urzes, rosmaninho ou flores se S.João, entre as grandes manchas do
pinhal verde-negro que impremem carácter à região.[…] “ (Pereira, Freitas e Dias,
1988, p. 125)
Humberto José Barros da Silva
73
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A arquitetura de produção reflete o quotidiano dos seus habitantes, exprimindo os
seus hábitos e necessidades. Os tipos de povoamento, as casas, as instalações
agrícolas ou industriais refletem em si a constituição social do povo e muitos aspetos
do seu modo de habitar. “A evolução dum aglomerado é um fenómeno quase biológico
– na sua estrutura reflete a sua razão de ser, vida, declínio, e ainda os factores que
condicionam essa sequência, como a juventude, a doença ou a velhice marcam um
corpo.” (Pereira, Freitas e Dias, 1988, p. 141)
A forma ou natureza do terreno (arenoso ou rochoso, planície ou serra) em que o
aglomerado se expande, são igualmente fatores de transformação do seu corpo ou
estrutura. Quando, por exemplo, um povoado se fixa num terreno acidentado, as ruas
adaptam-se à sua morfologia, gerando percursos e acessos orgânicos, entre escadas
e rampas, articulados com as casas justapostas ou amontoadas entre si. Há nas
soluções um recurso constante à linha curva, pois de curvas são constituídos os
terrenos, onde por vezes surge espontâneamente uma casa construída em
concordância com um desnível favorável à sua implantação:
As ruas enovelam-se ou quebram-se em pequenos troços, na necessidade de
adaptação. O aglomerado ganha uma maleabilidade quase orgânica. A preciosidade do
terreno uma dimensão justa, de acordo com as exigências da escala humana. As ruas
estreitas e tortuosas foram feitas para os peões ou para os animais. Os automóveis são
intrusos. (Pereira, Freitas e Dias, 1988, p. 142)
Ilustração 70 - Um aglomerado concentrado em Azenhas do Mar. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 143)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Sesimbra, por exemplo, entalada entre serras e mar, é um aglomerado cujo tecido
urbano se adapta às acentuadas imposições topográficas da serra, articulando
engenhosamente a transição das terras altas pra o mar. “Os edifícios amontoam-se
sem deixar espaço entre si, senão estreitos saguões. As ruas dispõem-se paralelas ao
mar, ajustando-se às lombas ao longo do percurso ribeirinho. Escadas ou calçadas
empinadas quebram esse movimento e convergem para a praia.” (Pereira, Freitas e
Dias, 1988, p. 143)
Ilustração 71 – Esboço de um aglomerado em Sesimbra. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 143)
Ilustração 72 – Sesimbra. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 142)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Estas regiões têm tanto de contrastes como de materiais de construção. Os solos são
ricos em calcário; areias e grés. Deste modo as populações, pela variedade das
condições naturais que estas regiões apresentam, tiram proveito de quase toda a
gama de materiais que a natureza fornece, entre as quais, a cal, a pedra, a terra crua
(adobe e taipa), a madeira e o colmo. O calcário é a pedra dominante nas construções
(pela sua abundância litológica), com exceções para o granito, na serra de Sintra; o
xisto, na orla confinante com a região beirã ao longo do rio Zêzere; ou o basalto
aplicado nos arredores de Lisboa, embora de forma reduzida, devido à sua escassez.
Na zona arenosa do pinhal de Leiria utiliza-se a madeira abundante, e ao sul do Tejo,
nas terras de cereais e palha, usa-se o colmo nas construções de menor relevância.
Ilustração 73 – Mapa Geológico. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.
172)
Humberto José Barros da Silva
Ilustração 74 – Mapa dos materiais de construção. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 172)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 75 – Construção em pedra calcário, Arneiro,
Santarém. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 175)
Ilustração 76 – Construção em pedra calcário, Arneiro, Santarém.
(Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 175)
Ilustração 77 – Parede de taipa, Arneiro, Santarém. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 180)
Ilustração 78 – Parede de adobe, Arneiro, Santarém. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 180)
Ilustração 79 – Casa de madeira, praia de Mira. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 186)
Ilustração 80 – Interior de uma casa de madeira, praia de
Pedrógão. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 184)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Região do Alentejo
Pertence a Zona um gigantesco anfiteatro de face voltada para o atlântico, até onde
desce em largos plainos, num jogo subtil, de vastas e suaves ondulações, que lhe dá
horizontes recuados. Não lhe falta aqui e ali, a cortina brusca, mas sempre modesta, de
alguma serra que acrescenta à sua beleza própria a nota de imprevisto e à sensação
da planura o instrumento de contraste. (George, Gomes e Antunes, 1988, p. 3)
Ilustração 81 – Situação da zona 5 no país. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p.3)
Ilustração 82 – Planície alentejana. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p.
24)
Esta região, classificada no Inquérito de “Zona 5”, ocupa uma grande parte da mais
vasta província de Portugal (cerca de um terço do país), embora com uma densidade
populacional diminuta (28 hab./km2). É constituída, na sua maioria, por extensas
planícies, estando praticamente isento do acentuado relevo que caracteriza as regiões
do norte.
Para além do rio Sado, Mira e Guadiana, os cursos de água são pouco frequentes. O
clima é mediterrânico-continental, manifestando-se quente e seco, o que implica a
criação de mecanismos de redução do calor tórrido que se faz sentir nesta zona,
nomeadamente, o emprego da cal nas paredes exteriores e ausência de grandes
aberturas para o exterior das habitações.
Humberto José Barros da Silva
78
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 83 – Emprego da cal nas habitações, Alegrete - Caiações sucessivas ao longo de gerações concedem aos edifícios texturas
inesperadas. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 56)
Os brancos muros do Alentejo, de tijolo, adobe e cal, altos e redondos, têm um
contorno esbatido, que ano após ano se molda à rua. Numa estranha subtiliza, são
muros onde a luz se retém e se devolve, onde a cal absorve o reflexo, onde se evita o
brilho, mas onde o branco é intenso e luminoso. (Rodrigues, 2009, p. 64)
No panorama geológico, esta zona denota uma certa diversidade na sua composição.
O solo do Baixo Alentejo é de constituição paleozoica, com uma mancha terciária
entre Alvito e Odemira; o granito, bastante disseminado, predomina em Évora; os
xistos são frequentes em Portalegre, Elvas e Arronches; o calcário abrange os
conselhos de Estremoz, Borba e Vila Viçosa, enquanto uma faixa diorítica atravessa o
distrito de Beja, originando barros de qualidade. “O que este barro esconde e mostra é
o trânsito do ser no tempo e a sua passagem pelos espaços […] Este grão que aflora
à superfície é uma memória […] a marca que ficou de um corpo deitado. […] ”
(Saramago, 2000, p. 84)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 84 - Mapa geológico. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 10)
No panorama da construção, o emprego da cal, da taipa e do tijolo sobressaem como
formas dominantes de edificação. A importância da cal na construção alentejana é
intensa e vasta, “quase como um elemento de símbolo” (George, Gomes e Antunes,
1988, p. 55), é utilizada para o revestimento das paredes e constituição das
argamassas. O tijolo, material tradicional, assume também um papel importante no
panorama da construção. A taipa (constituída por grãos de areia e brita ligados por
argila) é um método bastante comum em todo o Alentejo, predominando, porém, na
zona sul. A sua granulometria é determinada empiricamente, pela experiência antiga
da sua aplicação, delegada de geração em geração.
Humberto José Barros da Silva
80
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 85 - Construção em Taipa com cunhais de tijolo, Vidigueira. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 37)
Ilustração 86 – Casas geminadas, aplicação de cal e tijolo. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 39)
Embora não seja dominante o emprego da pedra como expressão arquitetónica, como
é frequente nas regiões do norte, o granito, o xisto e o calcário são os que a zona mais
fornece, adquirindo certa importância nalgumas regiões. O granito, bastante
disseminado, domina em Évora, como já foi dito, mas também em Portalegre,
Vidigueira, Gafete e Pias. Já o xisto é a pedra mais frequente no Alentejo. A sua
estrutura lamelar, quando aplicado em parede de alvenaria sem reboco, oferece uma
curiosa textura e uma paleta diversificada de tons, que contrasta, por vezes, com o
Humberto José Barros da Silva
81
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
emoldurado de reboco caiado dos vãos (Monsaraz). Contudo, a pedra nestas regiões
é mais aplicada nos pavimentos, cantarias, calçadas das ruas, fundações das paredes
de taipa ou tijolo, e até como fundações naturais.
Ilustração 87 – Construção em xisto, Monsaraz (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 49)
Ilustração 88 – Construção em granito, Terena. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 49)
Ilustração 89 – Construção em pedra calcário. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 49)
Ilustração 90 – Construção em granito, Terena. (Arq. Pop.
Portuguesa, 1988, p. 49)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Região do Algarve
Sô da Serra, sô Serrenha
Peso o Algarve às arrobas,
Sô da Serra tenho pão
E o Algarvio tem farrobas
Ilustração 91 – Situação da zona 6
no país. (Arq. Pop. Portuguesa,
1988, p. 123)
Ilustração 92 – Localidade de Ferragudo, Portimão. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 126)
Esta região, classificada de “zona 6”, apresenta uma orografia de baixo-relevo, com
exceção do conjunto de serras de Monchique e Caldeirão, que formam uma imponente
barreira
natural
que
o
separa
das
planícies
alentejanas,
protegendo-o
simultaneamente dos ventos dominantes a norte e noroeste. Voltado completamente a
sul, o Algarve encontra-se exposta às influências do mar mediterrâneo e do norte de
África. Esta situação geográfica privilegiada é um fator preponderante na sua
individualização e caracterização face às restantes regiões do país.
Se a constituição geológica orienta e define o destino do homem no lugar,
comummente o clima desse lugar determinará a sua vida, moldando a sua existência
física e psíquica e definindo a sua actividade, o seu comportamento, o seu agregado
familiar, a sua habitação, o povoado e a região. (Martins, Castro e Torres, 1988, p. 159)
Esta província, pela sua situação geográfica, apresenta condições climáticas muito
particulares. Situada entre o oceano atlântico e as serras que a protegem dos ventos
do norte, goza, na sua maior extensão (desde o Cabo de S. Vicente até à Foz do
Guadiana), de uma excelente exposição a sul, o que determina os fatores
Humberto José Barros da Silva
83
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
caracterizadores do seu clima mediterrâneo e subtropical, dadas as influências dos
ventos do continente africano. É também uma região extremamente seca, com o mais
baixo índice de pluviosidade do país.
Nesta zona, o clima, mais do que qualquer outro fator geográfico, assume um papel
determinante no modo vida das populações, definindo o tipo de atividades humanas
de subsistência, os hábitos do quotidiano e até a própria tipologia arquitetónica,
através da implementação recorrente de varandas, pátios, alpendres, terraços, entre
outros elementos arquitetónicos que evidenciam um clima favorável à extensão da
casa para o exterior, gerando novos mecanismos de relação com a habitação, o meio,
e própria socialização entre os moradores. “Também a arquitetura popular estabelece
relações profundas com os sítios através do saber acumulado de gerações,
consubstanciando-se na organização social do espaço e no uso dos materiais de
construção.” (Marques, 2001, p. 33)
O revestimento dos edifícios a cal é outro mecanismo impulsionado pelo clima seco e
quente, aumentando a refração dos raios solares sobre as casas, possibilitando uma
boa temperatura-ambiente no interior das mesmas.
Se ao aparecimento de diferenciados materiais correspondem características especiais
nas edificações, também a específicas condições climáticas, correspondem as formas
construtivas mais próprias a essas condições. O homem, com o seu engenho, cria os
meios de adaptação ao ambiente que o rodeia, procurando o mais produtivo
aproveitamento da terra e a técnica mais adequada à construção do seu abrigo, de
acordo com as condições geológicas e climáticas. (Martins, Castro e Torres, 1988, p.
162)
Do ponto vista geológico, esta zona não difere muito da região alentejana, aliás é uma
das características das regiões do sul do país, pródigos de solos argilosos, grés,
calcários e arenosos. Semelhanças geológicas que geram edifícios e métodos de
construção semelhantes.
Esta zona é dominada por terrenos de transição entre a grande mancha de xistos
argilosos e a mancha mais recente da orla marítima (cenozoicos e antropozoicos). No
Algarve, do oriente a ocidente, predominam os afloramentos calcários, grés, argilas e
areias, nas imediações serranas surgem afloramentos de rochas vulcânicas
(doleritos); e em Silves, encontra-se ainda o arenito (grés de Silves), uma rocha de cor
vermelho escuro, que serviu para a edificação do Castelo e da Sé desta cidade.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 93 – Mapa geológico. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 174)
Ilustração 94 – Mapa dos materiais. (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 174)
Quanto aos materiais, a existência de bons terrenos calcários e argilosos, facilita a
obtenção de cal e materiais cerâmicos, que, juntamente com a taipa, são largamente
aplicados na construção. O calcário emprega-se mais vulgarmente como alvenaria
autoportante e em cantarias de portas e janelas.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O emprego de elementos cerâmicos no Algarve está generalizado nos mais diversos
âmbitos de aplicação, desde os pavimentos interiores e exteriores às paredes e
coberturas, quer sejam estas em telhado ou abóbadas. O seu fabrico encontra-se
disseminado por toda a faixa litoral, com alguns afloramentos ao longo dos vales.
Ilustração 95 - Corte esquemático de uma cobertura em abóbada de tijolo maciço (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 184)
Ilustração 96 - Cobertura em abóbada, Faro (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 184)
Já o emprego do adobe como alvenaria tem pouca expressão, aparecendo
restritamente em pequenas áreas da Zona. Encontra-se essencialmente em terrenos
arenosos, onde o acesso a outros materiais é mais difícil.
Para elevação de paredes, a taipa é o material mais utilizado nesta zona, abrangendo
todo o litoral algarvio até ao vale do Sado. Esta predominância deve-se à abundância
de terrenos argilosos e à própria economia de meios para sua execução. As paredes
de taipa, quando bem executadas, são muito duradouras e a sua espessura oferece
boas condições de isolamento térmico. Contudo necessita de algumas precauções na
sua execução, tais como, evitar o contacto com a humidade do solo, através da
construção de uma fundação em alvenaria de pedra, elevada acima do solo.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 97 – Construção em taipa assente sobre fundação de alvenaria de pedra, Odemira (Arq. Pop. Portuguesa, 1988, p. 176)
Na área que abrange Silves, encontra-se o arenito, denominado «grés de Silves», que
é uma rocha formada por grânulos de quartzo aglutinados por um cimento que lhe
confere uma cor avermelhada escura. É uma rocha que aplica-se em alvenarias
irregulares, em muros de vedações ou mesmo em soleiras. A sua aplicação na
construção do Castelo e da Sé de Silves conferiu a estes monumentos uma cor,
textura e estereotomia singulares.
Ilustração 98 – Castelo de Silves. (Urry, 2015)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
2.2. A “ESCOLA DE VENEZA”: ENTRE O TERRITÓRIO E A ARQUITETURA
ANALÓGICA
O pensamento “lógico” é o que se exprime em palavras dirigidas ao mundo exterior na
forma de discurso. O pensamento “analógico” é percebido, ainda que irreal, imaginado
mesmo que silencioso; não é um discurso, mas uma meditação sobre temas do
passado, um monólogo interior. (Jung, Nesbitt, 2008, p. 377)
Na década de 1970, a arquitetura italiana exerceu uma posição significativa no
panorama internacional, muito por conta dos seus membros neorracionalistas mais
proeminentes, os arquitetos Aldo Rossi11 e Vittorio Gregotti12, que dedicados ao estudo
das tipologias da cidade tradicional, reinventaram os seus conteúdos identitários,
refundando, na arquitetura e urbanismo, o conhecimento da composição arquitetónica
na história e na dinâmica dos processos urbanos. Com uma postura crítica do
movimento moderno, pela rutura total com a “tradição” e “história”, estes arquitetos
reintroduzem esses termos nos seus trabalhos.
Conhecidos coletivamente como La Tendenza13, estes neorracionalistas italianos
procuraram “restabelecer as fundações teóricas do projeto arquitetónico” (SoláMorales, 1984, p. 15). Um movimento que refundamentou os conhecimentos de teoria
da cidade, constituindo, a partir da análise urbana e da individualidade dos seus
factos, uma relação indissociável entre a forma urbana e a tipologia arquitetónica. Ou
seja, uma conceção do projeto de arquitetura como expressão da cidade.
11
Aldo Rossi (1931-1997) foi um arquiteto e teórico italiano, formado pela Politécnica de Milão. Lecionou
no Instituto Universitario de Archittetura di Venezia e nas Universidades de Harvard, Rice e Yale. Foi
editor de Casabella e autor de “A arquitetura da cidade” (1966) e de “A Scientific Autobiography” (1981).
Foi distinguido, em 1990, com o Prémio de carreira Pritzker e, em 1992, com a medalha Thomas
Jefferson de Arquitetura. É famoso pelos seus desenhos e projetos de inspiração clássica, com recurso a
formas geométricas simples. Entre as suas obras construídas, destaca-se o premiado Hotel II Pallazo, em
Fukuoka, no Japão; o Cemitério de San Cataldo, em Modena, na Itália (1972); o Teatro del Mundo, para
Bienal de Veneza (1979); o Centro Fontivegge, em Perugia, na Itália (1988) ou o Monumento a Sandro
Pertini, em Milão, Itália (1990).
12
Vittorio Gregotti (1927) é um arquiteto e professor italiano, formado pela Politécnica de Milão. Leciona
arquitetura no Instituto Universitario di Archittetura di Venezia. É sócio e diretor do escritório Gregotti
Associati, com sedes em Veneza e Milão. Foi também editor-chefe da revista Casabella, escrevendo na
altura diversos artigos de grande repercussão na arquitetura. É autor de vários livros, entre os quais Il
Territorio dell’a Archittetura (1966). Gregotti dirigiu ainda as secções de Arte e Arquitetura da Bienal de
Veneza de 1974 a 1976. Autor de projetos de grande escala, tem como projetos mais proeminentes, o
Estádio Olímpico de Barcelona; o Centro Cultural de Belém, em Lisboa, o Teatro Arcimboldi de Milão e
Universidade da Calábria (concurso público ganho).
13
La Tendenza foi um grupo constituído por arquitetos neorracionalista italianos da década de 1960,
destacando-se Aldo Rossi, Vittorio Gregotti, Manfredo Tafuri, Giorgio Grassi, entre outros. Críticos do
movimento moderno, reintroduziram na arquitetura conceitos como “tradição”, “história” e “monumento”.
Humberto José Barros da Silva
88
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Sobre esta analogia entre o edifício e o seu contexto, Rossi refere que “apenas dentro
da sucessão lógica dos factos urbanos se poderá avaliar com maior precisão o
carácter formalista de certas propostas […] ” (Rossi, 2001, p. 16), referindo ainda que:
Resulta aqui cada vez mais precisa a relação entre particular e geral: é possível
estabelecer as características do lote gótico que se ligam estreitamente à tipologia da
casa gótica, a chamada casa do mercador. Encontramos uma tipologia deste género
em muitas situações diferentes: em Veneza, na Alemanha, em Budapeste e por toda a
parte da Europa. Cada situação é caracterizada por um seu próprio e particular aspeto,
por ser aquela precisa arquitetura; mas por outro lado, é reportável a um desenho
geral. Este desenho geral podemo-lo definir como forma tipológica. (Rossi, 2001, p. 16)
Neste sentido, a forma tipológica de uma determinada proposta arquitetónica, que se
quer enquadrada no seu contexto físico, e como tal numa lógica urbana, tornar-se-á
tangível através de um processo de leitura e classificação de outras formas
preexistentes que, em conjunto, poderão enquadrar-se na lógica urbana, através da
identificação do elemento comum que as possa unificar:
Uma forma que, após se ter precisado mediante a relação com diferentes realidades,
se torna um modo para afrontar a realidade; um modo, porém, com se divide o terreno
e se fixam os caracteres da casa, num certo quadro histórico. (Rossi, 2001, p. 16)
Contudo, o presente estudo, ao fazer referência à “Escola de Veneza”, e mais
concretamente a estes dois arquitetos, não pretende traçar um quadro de referência
para o estudo de uma teoria de cidade, mas sim referir a maneira análoga como
ambos adicionam os conceitos de lugar e genius loci ao programa neorracionalista
para a cidade e a para as tipologias de construção da forma. Conceitos que são
elucidativos para a temática em questão, pois reforçam a condição argumentativa do
presente estudo. Pois é na sua forma e conteúdo é que reside a fundamentação e
validação da arquitetura. Portanto a arquitetura analógica é um importante exercício de
reinvenção do modo de pensar e fazer arquitetura, a partir de um processo de
associações de pensamento e formas primitivas de edificar, e o modo como estas
aludem ao território. Este método associativo de projeto fundamenta-se de maneiras
diferentes nos dois arquitetos, como refere Colquhoun14:
14
Alan Colquhoun (1921-2012) foi um arquiteto, historiador, crítico e professor britânico. Formou-se pelo
Edinburgh College of Art e pela Archictetural Association of London, onde veio a lecionar mais tarde. Foi
também professor convidado, em 1966, pela Universidade de Princeton. Colquhoun foi autor de inúmeros
artigos e ensaios, e realizou inúmeras palestras e conferências. Entre as suas principais obras destaca-se
o seu ensaio “Modernidade e tradição clássica: ensaios sobre arquitectura 1980-87”, que versa a
presença fundadora da tradição clássica na modernidade arquitetónica.
Humberto José Barros da Silva
89
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Mantendo-se aberto à contingência, Gregotti parecem mostrar o “tipo” no processo de
sua erosão ou transformação. Rossi mostra-o em tal nível de generalidade que, não
sendo mais vulnerável à interferência da tecnologia ou da sociedade, [o tipo]
permanece congelado numa eternidade surreal. (Colquhoun, Nesbitt, 2008, p. 377)
Segundo Gregotti, a origem da arquitetura deriva, sobretudo, do simples gesto de
assentar uma pedra no chão, o que representa um ato de reconhecimento de um
lugar. Esta consciência revela que “Fenomenólogos como Gregotti também aludem à
necessidade de que o local da construção intensifique, condense e indique com
exatidão a estrutura da natureza e como o homem a percebe”. (Nesbitt, 2008, p. 443)
Gregotti refere ainda que a tarefa do arquiteto define-se na criação de uma “arquitetura
do contexto”, revelando a natureza por meio da medição, da transformação e da
utilização da paisagem. Pois segundo Heidegger15 “a medição é o poético de habitar”
(Heidegger, 1971, p. 221), o que assemelha-se à importância que o arquiteto italiano
atribui à medida e estudo da natureza como condição de uma perfeita integração da
arquitetura no seu espaço envolvente.
As intervenções formais revelam a verdade poética do local da construção (“a essência
do contexto ambiental”), que se torna indispensável porque a paisagem e a natureza
são vistas em geral como “a soma total de todas as coisas” geográficas e históricas.
São exemplos dessa modificação: ordenar geometricamente a natureza, idealizá-la e
evocá-la como um espelho da verdade. (Gregotti, 1993, p. 400)
Sobre esta revelação poética do local de construção a partir da formulação de uma
ideia de intervenção que coadune com a “essência do seu contexto ambiental”, Carol
Burns,16 refere que “a estratégia do local de Gregotti é sugestiva do «local construído»,
ou o que se poderia chamar de abordagem tectónica para a criação de uma
paisagem”. (Burns, 1991, p. 146). O que é coerente com o seu modo de pensar a
arquitetura, senão veja-se o seu projeto para a Universidade da Calábria, que deixa
evidente a importância que o território tem no seu trabalho, cuja análise se fará mais
adiante. Sobre o «local construído» Burns refere ainda que: “[…] the site is initially
construed and finally achieved in the architectural work. The problems attendants to
siting have a pervasive and profound impact on buildings. […] “ (Burns, 1991, p. 1)
15
Martin Heidegger (1889-1976) foi um filósofo alemão. Seguramente um dos pensadores fundamentais
do século XX, quer pela recolocação do problema do Ser e pela refundação da Ontologia, quer pela
importância que atribui ao conhecimento da tradição filosófica e cultural.
16
Carol J. Burns é uma arquiteta e teórica norte-americana, formada na Universidade de Yale, onde é
professora e investigadora, bem como nas universidades de Harvard e MIT. É autora do ensaio “On site:
Arquitetural preoccupations” e presidente da Comissão de Arte de Boston.
Humberto José Barros da Silva
90
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Embora o seu ensaio “O território da arquitectura” trate, sobretudo, de questões de
teoria e história, não deixa de ser uma ferramenta teórica útil para o exercício da
arquitetura, como o próprio afirma, ao revelar que as contingências do projeto para
universidade da Calábria fizeram-lhe lembrar algumas reflexões sobre o ensaio, o que
revela a influência que a essência física da história exerce no seu trabalho. Nas
palavras do próprio:
É o ambiente físico que nos cerca, como se transforma em coisas visíveis, como reúne
significados profundos que se diferenciam não só pelo que o ambiente aparenta ser,
mas também pelo que ele é estruturalmente. O ambiente compõe-se dos vestígios da
sua própria história. Por isso, se é na geografia que os sinais da história se consolidam
e sobrepõem numa forma, o projeto arquitetónico tem a missão de chamar a atenção
para a essência do contexto ambiental por meio da transformação da forma. (Gregotti,
Nesbitt, 2008, p. 373)
O contexto ambiental torna-se, assim, a soma de todas as coisas, um reportório de
presenças materiais, cujas relações cabe à arquitetura desvelar. Portanto, o ambiente
enquanto matéria operativa de projeto, não pode ser destituído da sua totalidade
geográfica, nem da sua organização histórica, permitindo que as ideias de projeto se
adaptem às características específicas do território.
“O projeto deve condizer com a tradição reguladora do estilo e do métier. Mas o que
confere veracidade e concretude a essa tradição é sua compatibilidade com o sítio,
pois somente percebendo o local como um ambiente específico podem aflorar as
exceções que geram a arquitectura. (Gregotti, Nesbitt, 2008, p. 375)
Exceções que transformam o lugar em arquitetura, revelando um ato simbólico e
natural do Ser na sua relação inevitável com os lugares, com o ambiente físico, com a
ideia da natureza enquanto totalidade de todas as criações.
Segundo Burns, “In architectural design, the demands of relating a building to physical
location are necessary and inevitable” (Burns, 1991, p. 1). Esta inevitabilidade atribui à
arquitetura, antes da sua condição primordial de abrigo, a capacidade de
reconhecimento de um lugar, e somente depois a sua função primária de abrigo,
porque segundo Gregotti, a origem da arquitetura não é a cabana primitiva, “pois antes
o homem pôs uma pedra no chão para reconhecer um lugar no meio do universo
desconhecido e, assim, mediu e modificou esse espaço.” (Gregotti, Nesbitt, 2008, p.
374). O arquiteto refere ainda que:
Existem fundamentalmente dois modos de uma pessoa se localizar em relação ao
contexto. Os instrumentos do primeiro modo são imitação mimética, a assimilação
Humberto José Barros da Silva
91
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
orgânica e a complexidade visível. O segundo emprega medidas: distância, definição,
rotação, dentro da complexidade. No primeiro caso o problema é espelhar a realidade;
no segundo caso, determinar o duplo. Este último baseia-se numa laboriosa divisão:
levantar uma parede, construir uma cobertura, definir regiões, produzir um espaço
interior densamente articulado que corresponda à fragmentação e às diferenças de
comportamento. Dessa maneira, um exterior simples aparecerá como uma medida da
complexidade do ambiente maior. (Gregotti, Nesbitt, 2008, p. 374)
A citação do arquiteto torna-se elucidativa na análise da obra do museu do Côa
enquanto "território construído”, que alude às características do sítio. A sua
materialidade que, não sendo uma coisa da natureza, assemelha-se ao seu suporte
geológico, agregando-lhe a sua natureza artificial, que se quer tão expressiva e
autêntica como o seu suporte natural.
Segundo Gregotti, o seu “trabalho atual explora as implicações do desenvolvimento de
uma arquitetura do contexto. “Isso levou-me a enfrentar o problema da execução de
obras de grande escala […] “ (Gregotti, Nesbitt, 2008, p. 375). Veja-se o seu projeto
para a Universidade da Calábria17 – a ideia central da proposta baseou-se num
princípio de assentamento –, uma analogia ao contexto rural do sítio e o modo
histórico da sua ocupação através de assentamentos. Gregotti apropria-se deste
princípio e cria um eixo estruturante no território que, na extensão do seu alinhamento,
vai adaptando-se ao terreno sinuoso e articulando o programa de forma linear ao
longo do eixo.
Ilustração 99 – Universidade da Calábria, Cozenza, Itália, 1972 – Vista aérea do conjunto, a relação entre o alinhamento do Eixo
proposto e o existente. (Universidade da Calábria, 2015)
17
O projeto para a Universidade da Calábria foi concretizado no âmbito de um concurso realizado em
1974 e vencido por um grupo formado pelos arquitetos E. Battisti, V. Gregotti, H. Matsui, P. Nicolin, F.
Purini, C. Rusconi Clerici. O planeamento urbano coube a Laris. Colaboraram no projeto: P. Cerri, V.
Gregotti, H. Matsui (Gregotti Associati); G. Grandori, G. Ballio, A. Castiglioni, G. Colombo (engenheiros de
estrutura); Tenke VRC (engenheiros).
Humberto José Barros da Silva
92
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 100 – Planta de situação do complexo da Universidade da Calábria, Vittorio Gregotti (Nesbitt, 2008, p. 373)
Esta estratégia de intervenção “funciona como um modo de bitolar a paisagem”, refere
o arquiteto, além de evidenciar o caráter de um projeto de grande escala. Interessado
na refundamentação da história e princípios da cidade tradicional, Gregotti concebeu o
complexo da Universidade, segundo um princípio de assentamento, porque estes
eram os métodos tradicionais e característicos de ocupação territorial da Calábria.
O projeto estabelece uma interação entre sistemas morfológicos da paisagem e
sistemas funcionais do programa. O primeiro consiste, como já foi dito, numa
sucessão linear de departamentos da universidade ao longo do sistema de colinas até
à planície do rio Crati. Os edifícios que alojam as atividades dos departamentos
acomodam os vários níveis do terreno e se dispõem ao longo de um plano quadrado,
no eixo de uma ponte. O segundo sistema já leva em conta a morfologia das colinas, a
sua sucessão de declives (pelos quais passa o sistema rodoviário local) e a sua
relação com a estrutura de casas térreas, destinadas aos alojamentos da
universidade, que se distribuem ao longo da vertente norte. Já a vertente sul, como se
encontra ocupada com o cultivo de oliveiras, optou-se por uma estratégia de
alternância de unidades residenciais e espaços naturais. Os serviços da universidade,
abertos para o exterior, situam-se no plano de convergência entre o sistema da ponte
e as rodovias que percorrem o alto das colinas.
Humberto José Barros da Silva
93
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 101 – Vista do eixo estruturante da Universidade da Calábria (Skyscrapercity, 2015)
A “Escola de Veneza” ao reintroduzir na arquitetura moderna e contemporânea termos
como “tradição” e “história”, dos processos tradicionais de edificação adaptados
tipologicamente ao seu contexto (que eram antigamente, segundo Rossi e Gregotti,
métodos de grande coerência entre o edificado e a cidade na sua totalidade)
contribuíram, ativamente, para reflexões profundas sobre a influência do sítio e da sua
história na produção arquitetónica. Renunciando, deste modo, o ideal do Estilo
Internacional – de um terreno plano e desobstruído –, bem como de alguns arquitetos
contemporâneos,
como
Peter
Eisenman18,
Rem
Koolhaas19,
Frank
Gehry20
(percursores do desconstrutivismo e de uma arquitetura tecnológica), entre outros
18
Peter Eisenman (1932) é um arquiteto e teórico norte-americano, e um dos fervorosos representantes
do desconstrutivismo em arquitetura. Professor de arquitetura da cátedra Irwin S. Chanin, na Cooper
Union, fundou e dirigiu o Instituto de Arquitetura e Estudos Urbanos e foi editor da revista Oppositions e
da coleção Oppositions Books. Recebeu o título de mestre em Arquitetura pela Universidade de
Columbia. Escreveu “Houses of Cards” (1987) e “Fin d’Ou T Hou S. (1985), e além de inúmeras obras
teóricas, Eisenman é responsável por várias obras construídas, como o premiado Wexner Center for the
Visual Arts, da Universidade de Ohio; a sede da Koizumi Sangyo Corporation, em Tóquio; o Memorial do
Holocausto, em Berlim; ou a Igreja do Jubileu, em Roma.
19
Rem Koolhass (1944) é um arquiteto e teórico holandês e sócio fundador do Office for Metropolitan
Architecture (OMA) de Roterdão. Exerce atualmente o cargo de professor da arquitetura na Universidade
de Harvard, além disso lecionou nas universidades de Rice e Cornell e na Architetural Association School,
onde se formou em arquitetura em 1972. Trabalhou inicialmente como jornalista no Haagse Port e como
cenógrafo de filmes. A partir de 1968 instalou-se em Londres para frequentar o curso de arquitetura na
Architetural Association School, onde elaborou alguns projetos e âmbito teórico, como “The Berlin Wall as
architecture e “Exodus, or the Voluntary Prisioners of Architecture”. Foi ainda distinguido com o
Rotterdam-Maaskant Prize (1991); o Japanese Award for the Best Building (1991), o Gaudi Award (1992)
e o Prémio Pritzker. Da vasta obra construída encontra-se a Casa da Música, no Porto; a Torre CCTV, em
Pequim, na China, ou Biblioteca Central de Seattle.
20
Frank Gehry (1929) é um arquiteto norte-americano, nascido em Toronto, no Canadá. Formado pelas
Universidades de Southern California e Harvard, iniciou atividade como arquiteto em Los Angeles em
1963. Entendendo a arquitetura como a arte de produzir esculturas habitáveis, afirma que as obras de
escultura, como as de Brancusi, exercem mais influência no seu trabalho do que os grandes mestres da
arquitetura. Em 1989 foi distinguido com Prémio de carreira Pritzker. Da sua vasta obra, destacam-se o
Museu de Arte da Universidade de Minnesota (1990); a Sala de Concertos Walt Disney (1989), Los
Angeles, na Califórnia; e o Museu Guggenheim (1993-1997), em Bilbau, Espanha.
Humberto José Barros da Silva
94
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
arquitetos neoliberais, que desconsideram o lugar como elemento preponderante na
produção arquitetónica.
Rem Koolhaas […] comporta bem a atitude neoliberal muito em voga neste final do séc.
XX, que enfatiza uma nítida atomização de individualidades e que tenta legitimar
qualquer intervenção, por mais discutível que ela seja do ponto de vista ético, desde
que seja justificável pelo estatuto “artístico” do arquiteto. […] (Neves, 2001, p. 9)
Estes arquitetos, neoliberais, consideram os valores tradicionais de lugar obsoletos,
face aos avanços das sociedades contemporâneas, que se querem globalizadas e
tecnológicas, e que a evolução predominantemente urbana acaba por uniformizar os
lugares e como tal tornar obsoletas as intervenções que se formalizaram a partir do
lugar. Atitude contrariada pelo “regionalismo crítico” de Frampton, que apela à
resistência perante à homogeneização do ambiente construído, fenómeno que já se
torna notório devido à modernização das técnicas construtivas e à industrialização dos
materiais de construção.
[…] O fenómeno da universalização, apesar de ser um avanço para a humanidade,
institui uma espécie de subtil destruição não só das culturas tradicionais […] mas
também do que denominarei provisoriamente de núcleos criadores das grandes
culturas, esse núcleo a partir do qual interpretamos a vida, e que chamarei de antemão
de núcleo ético e mítico da humanidade. […] Frampton, Nesbitt, 2008, p. 504)
Por outro lado temos aqueles que corroboram com Gregotti, e “que continuam a
entender o lugar como uma entidade fenomenológica que encerra significados e
formas específicas” (Neves, 2001, p. 7). O arquiteto japonês Tadao Ando21 reconhece
que a obra arquitetónica gera uma nova paisagem (o tal lugar construído, sugerido por
Gregotti) e por isso tem a responsabilidade de enaltecer as características particulares
21
Tadao Ando (1941) é um arquiteto japonês e membro honorário do Instituto Americano de Arquitetos
(AIA). Fundou e dirige o escritório Tadao Ando Architects & Associates, em Osaka, Japão. Seus projetos
foram objeto de exposição na Europa, Ásia e Estados Unidos, e de numerosas monografias, entre as
quais Tadao Ando: Buildings, Projects, Writings (1984) e Tadao Ando: Details (1991). Autodidata, Ando foi
professor convidado nas Universidades de Yale, Columbia e Harvard. Foi distinguido com os prémios
Pritzker (1995); Mainichi Art Prize, pelo projeto da Capela do Monte Rokko; Japanese Cultural Design
Prize, pelo conjunto habitacional em Rokko, e ainda com a Medalha Alvar Aalto; Medalha de Ouro de
Arquitetura, pela Academia Francesa de Arquitetura (1989); Prémio de Arquitetura Carlsberg, Dinamarca
(1992), Prémio da Academia de Arte do Japão (1993); AIA Gold Medal, do Instituto Americano de
Arquitetos, o Prémio Kyoto (2002), entre outros. Tem ainda entre as suas obras de maior destaque o
Museu das Crianças, Himeji, Hyogo (1987-89); a Row House, em Osaka, Japão (1976); a Igreja da Luz,
em Ibaraki, Osaka, Japão (1989); o Museu de Arte Moderna de Fort Worth, Texas, Estados Unidos
(2002); Pulitzer Arts Foundation, Missouri, Estados Unidos (2001), entre outros. As suas origens culturais
aguçaram a sua sensibilidade em relação à natureza e ao próprio lugar na relação com a arquitetura. Pois
a tradição japonesa denota uma ligação muito intensa com a natureza, diferente porém da ocidental. Uma
sensibilidade que, segundo o arquiteto, “engendrou uma cultura que diminui a ênfase na fronteira física
entre a residência e a natureza circundante e que, ao contrário, instala um limiar espiritual. Ao mesmo
tempo em que protege a habitação humana da natureza, procura trazê-la para dentro da casa. Não há
uma demarcação clara entre interior e exterior, mas uma permeabilidade recíproca. […] “ (Ando, Nesbitt,
2008, p.497).
Humberto José Barros da Silva
95
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
de um determinado lugar. Pois “A finalidade da arquitetura é basicamente a
construção do lugar” (Ando, 1984, p. 134).
2.3. O LEGADO DA ESCOLA DO PORTO: ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA
PORTUGUESA E A RELAÇÃO COM O LUGAR.
“Sem a representação de lugares, a arquitetura teria sido impossível em qualquer
cultura” (Muntañola, 2002, p. 66)
Etimologicamente, a palavra ‘Lugar’ deriva do latim ‘Locãle’, que significa «do lugar».
Embora encerre vários significados, dependendo do objeto de estudo, a definição que
mais se enquadra no âmbito da arquitetura talvez seja a de um “espaço ocupado pelo
um corpo”. (Dicionário da língua portuguesa, Porto Editora, 2013)
Norberg-Schulz22 refere, desta forma natural, fragmentos do nosso espaço
existencial23:
O nosso mundo-da-vida quotidiana consiste em fenómenos concretos. Compõe-se de
pessoas, animais, flores, árvores e florestas, pedra, terra, madeira e água, cidades,
ruas e casas, portas, janelas e mobílias. E consiste no sol, na lua e nas estradas, na
passagem das nuvens, na noite e no dia, e na mudança das estações. Mas também
compreende fenómenos menos tangíveis, como os sentimentos. Isto é, o que nos é
“dado” é o “conteúdo” da nossa existência. […] (Norberg-Schulz, Nesbitt, 2008, p. 444)
No quotidiano, lidamos com coisas concretas, que constituem o nosso mundo e que se
relacionam de modo complexo entre si, em que alguns fenómenos podem
compreender outros, ou formam um ambiente para outros. Na linguagem comum dizse que os atos e acontecimentos têm lugar, ou que as pessoas é que dão sentido ao
lugar, ou até mesmo na gíria popular do «põe-te no lugar dele ou dela», entre outras
termos comuns do quotidiano. A verdade é que o desenrolar de um acontecimento é
indissociável a uma localização, porque ela é parte da nossa existência. Mas deverá o
“lugar” ser entendido apenas como uma localização abstrata? Ou podemos encará-la
também com uma entidade espiritual, algo sensorial, que possui substância material,
forma, cor, textura, odor, e que juntas determinam uma qualidade ambiental, que nos
22
Christian Norberg-Schulz (1926-2000) foi teórico norueguês e professor na Escola de Arquitetura de
Oslo. Tem entre as obras fundamentais “Intentions in Architecture” (1963); “Existence, Space &
Architecture” (1971); “Architecture: Meaning and place” (1988). As suas obras estão ligadas à
interpretação textual das ideias de Martin Heidegger, sobretudo no ensaio do filósofo alemão “Construir,
habitar, pensar”.
23
O espaço existencial é um “sistema relativamente estável de esquemas percetivos ou imagens de um
ambiente circundante. Sendo uma generalização abstraída das semelhanças de muitos fenómenos, esse
espaço existencial tem um «caráter objetivo».” (Norberg-Schulz, 1975, p.19)
Humberto José Barros da Silva
96
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
transmite uma certa atmosfera – uma sensação tangível apenas pelo espírito, pelas
emoções que sentimos perante determinado ambiente, construído ou construído.
Segundo Zumthor24 essa “atmosfera comunica com a nossa perceção emocional […] ”
(Zumthor, 2009, p. 13). Pois “tudo nos toca […] Tudo, as coisas, as pessoas, o ar,
ruídos, sons, cores, presenças materiais, texturas e também formas (Zumthor, 2009, p.
17). Portanto “um lugar é um fenómeno qualitativo ‘total’, que não se pode reduzir a
nenhuma das suas propriedades, como as relações espaciais, sem que se perca de
vista a sua natureza concreta.” (Norberg-Schulz, Nesbitt, 2008, p. 445)
Portanto se a atmosfera é percebida através da relação corpo/espaço, então podemos
concluir que a relação do nosso corpo com o corpo da arquitetura (mediada pelos
fenómenos de um dado ambiente) poderá refletir-se na materialização do edifício. Isto
pela forma como se apreende a qualidade ambiental do seu contexto. Deste modo, o
edifício será o resultado final desse entendimento, dessa dialética entre o arquiteto
(enquanto utente e projetista) e o lugar. Pois, segundo Zumthor, “existe um efeito
recíproco entre as pessoas e as coisas” (Zumthor, 2009, p. 17).
Dito isto, pode-se entender o lugar com uma entidade constituída por uma dimensão
física e espiritual, que juntas determinam a estrutura do lugar. Enquanto a dimensão
física adestra-nos da sua qualidade de espaço ou paisagem, de uma organização
tridimensional dos elementos que o compõe; a dimensão espiritual revela-nos a sua
atmosfera, a sua essência, que é o resultado das relações espaciais de todos
elementos que lhe dão forma e sentido, incluindo o homem.
24
Peter Zumthor é um arquiteto suíço, nascido em 1943 em Basileia. Tem formação de marceneiro,
mestre-de-obras e arquiteto na Kunstgewerbeschule Basel e no Pratt Institute, em Nova Iorque na década
de 1960. É professor na Accademia di architettura, Università della Svizzera Italiana, em Mendrisio.
Vencedor do Prémio Pritzker em 2009, tem entre as suas obras mais importantes, as “Termas de Vals
(Vals, Suíça, 1996); o “museu Kunsthaus Bregenz (Bregenz, Áustria, 1997); pavilhão da Suíça para Expo
2000 (Hanôver, Alemanha, 2000) e o ”Museu Kolumba (Colónia, Alemanha, 2007).
Humberto José Barros da Silva
97
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 102 - Esquema da noção de lugar em Hegel (Muntañola, 1996, p. 27)
Na estrutura do lugar, a sua dimensão física (o espaço) pode conter inúmeros
significados, seja na teoria da arquitetura, seja na filosofia, na literatura ou noutras
disciplinas que trazem à luz este conceito. Segundo Arnheim25 na perspetiva de
Platão, o espaço é “a mãe e o recetáculo de todas as coisas criadas e visíveis e por
uma qualquer forma sensível […] a natureza universal que recebe todos os corpos”
(Arnheim, 1997, p. 17). Aristóteles desenvolveu uma teoria do lugar (Topos), em que o
espaço é a soma de todos os lugares, um campo dinâmico de relações e propriedades
qualitativas. E Kant26 na sua conceção metafisica deste conceito refere o espaço com
uma categoria “a priori” do pensamento humano, diferente e independente deste:
O espaço é uma representação, a priori, que fundamenta todas as intuições internas.
Não se pode nunca ter uma representação de que não haja espaço […] consideramos,
por conseguinte, o espaço a condição de possibilidade dos fenómenos […] e uma
representação a priori, que fundamenta necessariamente todos os fenómenos externos
[…] o espaço é representado como uma grandeza infinita dada. […] É essencialmente
uno […] o fundamento de todos os seus conceitos é uma intuição a priori (que não é
empírica).” (Kant, 1985, p. 64/65)
25
Rudolf Arnheim (1904-2007) foi um psicólogo alemão e um dos principais estudiosos da teoria da
Gestalt (Psicologia da forma) na arte.
26
Immanuel Kant (1724-1804) foi um visionário filósofo alemão, nascido em Königsberg, onde foi
professor universitário. Partindo do racionalismo do filósofo Christian Wolff e do empirismo de David
Hume, é levado a superar as atitudes dogmáticas e céticas, manifestando as suas ideias numa pequena
dissertação “De mundi sensibilis atque intelligibilis forma et principis” (1770), que após dez anos de
reflexão, levou-o à sua obra fundamental, Crítica da Razão Pura (1781).
Humberto José Barros da Silva
98
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Segundo Norberg-Schulz, na perspetiva de Piaget27, “ a ideia de um mundo
estruturado desenrola-se gradualmente durante a infância (talvez a base das poucas
intuições a priori) e compreende uma série de acontecimentos necessariamente de
noções espaciais” (Norberg-Schulz, 1975, p. 19). O teórico refere ainda que o espaço
arquitetónico pode definir-se como uma concretização do espaço existencial, uma vez
que:
O espaço existencial é um conceito psicológico que denota os esquemas que o
Homem desenvolve em interação com a envolvente, para progredir satisfatoriamente
[…] a relação do Homem com o espaço arquitetónico consiste, numa parte, em tentar
integrar a sua estrutura nos seus esquemas pessoais e, por outra, em transpor os seus
esquemas em estruturas arquitetónicas concretas, com o objetivo de alcançar o
primeiro e que o segundo possa vir a ser uma contribuição ao desenvolvimento dos
espaços existenciais de outros. (Norberg-Schulz, 1975, p. 46/47)
Na mesma linha de pensamento Heidegger entende que o homem e o espaço são
indissociáveis, uma vez que a existência em si é espacial. Do mesmo modo MerleauPonty28 refere o seguinte: “temos dito que o “espaço é existência, da mesma maneira,
poderíamos ter dito que a existência é espacial” (Merleau-Ponty, 1996, p. 334). E
Norberg-Schulz refere que “o interesse do Homem pelo espaço tem raízes
existenciais”, pois:
deriva de uma necessidade de adquirir relações vitais no ambiente que o rodeia, para
dar sentido e ordem a um mundo de acontecimentos e acções […] a sua orientação
para diferentes objetos pode ser cognitiva ou afectiva, pelo que em qualquer dos casos,
deve estabelecer um equilíbrio dinâmico entre ele e o ambiente que o rodeia […]
(Norberg-Schulz, 1975, p. 9)
O teórico refere ainda que “para conquistar uma base de apoio existencial, o homem
deve ser capaz de orientar-se, mas ele também tem de identificar-se com o ambiente,
isto é, tem de ser como está em determinado lugar” (Norberg-Schulz, Nesbitt 2008,
455). Esta ideia é compatível com a de Lynch,29 que entende a legibilidade dos
elementos que formalizam o espaço como fundamental para a orientação e interação
27
Jean Piaget (1896-1980) foi um epistemólogo e psicólogo suíço, considerado com um dos mais
importantes pensadores do séc. XX. Tem entre a sua vasta obra literária “A Construção do Real na
Criança (1970) ”, “A Epistemologia Genética e a Pesquisa Psicológica” (1974), “A Psicologia da
Inteligência” (1958), “A Noção de Tempo na Criança”, “A Formação do Símbolo na Criança - Imitação,
jogo e sonho, imagem e representação” (1971).
28
Maurice Merleau-Ponty (1908-1961) foi um filósofo e fenomenólogo francês, discípulo de Edmund
Husserl, com a sua obra mais importante “Fenomenologia da Perceção”, procurou dar seguimento aos
pensamentos do seu mestre e precursor.
29
Kevin Lynch (1918-1984) foi um urbanista e escritor norte-americano. Tendo como obra fundamental “A
Imagem da Cidade” (1960), o seu grande contributo para o urbanismo deu-se através da análise e estudo
empírico das atitudes comportamentais dos indivíduos no espaço urbano, o modo como estes processam
as informações do ambiente que os rodeiam, à medida que progridem no espaço
Humberto José Barros da Silva
99
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
do Homem no ambiente que o rodeia, porque é através da clarividência das imagens
projetadas na sua mente, sejam elas uma recordação ou uma sensação imediata, que
o Homem processa a informação, para depois determinar a sua progressão no
espaço.
No processo de orientação, o elo estratégico é a imagem do meio ambiente, a imagem
mental generalizada do mundo exterior que o indivíduo retém. Esta imagem é o produto
da perceção imediata e da memória da experiência passada e ela está habituada a
interpretar informações e a comandar acções. A necessidade de conhecer e estruturar
o nosso meio é tão importante e tão enraizado no passado que esta imagem tem uma
grande relevância prática e emocional no indivíduo.” (Lynch, 1999, p. 14)
Rudolf Arnheim entende que o espaço é experimentado como um recetáculo que
precede os objetos que abarca, um cenário no qual todas as coisas tomam lugar e
sentido. “Se não tomássemos em consideração esta maneira espontânea e universal
de olhar o mundo, não poderíamos acalentar a esperança de compreender a natureza
da arquitetura como uma organização de edifícios colocados num dado espaço
contínuo.” (Arnheim, 1997, p. 17).
Esta precedência do espaço sobre todas as coisas é compatível com a conceção de
Kant, com já se constatou, que classifica o espaço como uma categoria “apriorística”
da existência humana, uma representação, “a priori”, que fundamenta todos os
fenómenos externos que nos rodeiam.
Talvez o grande exemplo, para “ilustrar” a importância existencial de todas estas
propriedades espaciais mencionadas, de natureza essencialmente topológica, sejam
as pesquisas de Piaget, sobre a conceção de espaço das crianças – de que a ideia de
um mundo estruturado desenrola-se gradualmente durante a infância, e que
compreende uma série de acontecimentos de noção, essencialmente, espacial. E “os
modos geométricos de organização somente se desenvolvem mais tarde na vida, para
atender a necessidades especiais e geralmente são vistos como uma definição mais
«exata» de estruturas topológicas básicas. […] ” (Norberg-Schulz, Nesbitt, 2008, p.
450). Essa noção gradual do espaço desenvolve-se à medida que o homem interage
com os objetos, adquirindo, ao longo do tempo, uma consciência sobre o significado
que encerram, e consequentemente estabelece-se uma ligação de afeto com o(s)
lugar(es), de que esses objetos fazem parte.
Portanto, torna-se necessário entender o lugar não apenas como uma localização
abstrata, mas como uma entidade constituída de coisas concretas, que possuem
Humberto José Barros da Silva
100
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
substância material, uma qualidade ambiental, uma atmosfera que nos adestra da sua
essência, do seu espírito. O que nos conduz, inevitavelmente, à antiga noção romana
do “genius loci”, ou seja, a ideia do espírito de um determinado lugar, que estabelece
um elo com o sagrado, e que cria um outro lugar ou um oposto com o qual a
humanidade deve defrontar, a fim de habitá-lo. “Os antigos reconheciam a suma
importância de entrar em acordo com o genius da localidade onde viviam. Em tempos
passados, a sobrevivência dependia de uma boa relação com o lugar […] “ (NorbergSchulz, Nesbitt, 2008, 454). Este termo foi introduzido por Norberg-Schulz, talvez a
figura mais proeminente na teoria da arquitetura, no que concerne ao fenómeno do
lugar. A sua obra teórica está intimamente ligada à adoção de uma fenomenologia da
arquitetura. Sendo a fenomenologia definida inicialmente por Edmund Husserl30 "como
uma investigação sistemática da consciência e os seus objetos.” (A Dictionary of
Philosophy, 1984, p.157).
Norberg-Schulz identifica o potencial fenomenológico na arquitetura como a
capacidade de dar significado ao ambiente mediante a criação de lugares específicos.
[…] Ele interpreta o conceito de habitar como estar em paz num lugar protegido. Assim,
o cercamento, o ato de demarcar ou diferenciar um lugar no espaço se converte no ato
arquetípico da construção e a verdadeira origem da arquitetura. […] (Nesbitt, 2008, p.
443)
O teórico – que entende a fenomenologia como um método que exige um retorno às
coisas em oposição às abstrações e construções mentais – realça ainda que certos
elementos arquitetónicos como parede, chão ou teto, devem ser entendidos como
horizontes, fronteiras ou enquadramentos da natureza.
A relação interior-exterior, que é um aspeto principal do espaço concreto, sugere que
os espaços possuem graus variados de extensão e cercamento. […] De modo geral,
tudo o que fica encerrado se manifesta como «figura» contra o vasto fundo da
paisagem. […] (Norberg-Schulz, Nesbitt, 2008, p. 443)
Além do foco no lugar, para o teórico a fenomenologia abrange a tectónica, porque
através do detalhe, esta poderá manifestar ou conferir forma a uma qualidade
ambiental peculiar de um determinado ambiente. O que nos remete para questão
fulcral do presente estudo: a consonância entre a materialidade da arquitetura e o seu
contexto.
30
Edmund Husserl (1859-1938) foi um matemático e filósofo alemão, fundador da escola da
Fenomenologia. Influenciado por filósofos como Descartes e Immanuel Kant, e crente do empirismo,
Husserl acreditava que a experiência é a fonte de todo o conhecimento, o que o direcionou para uma
investigação de redução fenomenológica segundo o qual um determinado assunto poderá vir a conhecer
diretamente uma essência, mediante o seu estudo, pois só assim se poderá determinar a sua essência.
Humberto José Barros da Silva
101
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Esta evocação do lugar e da tectónica tornou a fenomenologia numa influente escola
de pensamento entre alguns arquitetos contemporâneos. Ela despertou um novo
interesse nas qualidades sensoriais dos materiais, da luz, da cor, da textura, bem
como a ressonância dos sentimentos mais profundos do arquiteto, que o projeto possa
transmitir, enaltecendo o potencial poético e metafórico da tectónica na relação com o
lugar e com o próprio habitar. Segundo Zumthor, “o processo de projetar baseia-se
numa cooperação contínua entre o sentimento e o intelecto.” (Zumthor, 2009, p. 21).
“Não creio que se possa falar de projeto sem falar de desejo. O projeto é o modo
através do qual intentamos transformar em ato a satisfação de um desejo nosso”.
(Gregotti, 2004, p. 11).
Este ato, como metáfora da expressão arquitetónica do imaginário do arquiteto, pode
ser entendido a partir da conceção de Bachelard31 sobre o poder criador da ‘metáfora’
e da ‘imagem’, referindo que:
A metáfora vem dar corpo concreto a uma impressão difícil de exprimir. […] A imagem,
obra de imaginação absoluta, extrai todo o ser da imaginação […] a uma imagem
podemos dar o nosso ser de leitor, ela é doadora do ser. […] obra pura da imaginação
absoluta, é fenómeno do ser, um dos fenómenos específicos do ser falante.
(Bachelard, 1989, p. 87/88)
Esta relação [tectónica] entre a arquitetura e o lugar é recorrente na arquitetura
contemporânea portuguesa, como analisaremos de seguida algumas obras que
evidenciam esta comunhão entre a arquitetura e o lugar no panorama arquitetónico
português, com enfoque inicial na Escola do Porto, como referência nacional desta
militância entre os arquitetos portugueses na forma como exploram o sentido
existencial do lugar nos seus projetos. Depois de um breve enquadramento sobre a
Escola e as suas figuras mais proeminentes (Távora, Siza Vieira e Souto de Moura),
faremos referência a três projetos que demonstram inequivocamente a influência que
a “doutrina” da Escola Porto exerce sobre a arquitetura contemporânea portuguesa.
Hoje, na arquitetura portuguesa contemporânea são visíveis os laços que a ligam à
natureza, aos sítios e aos lugares. Tome-se como exemplo as piscinas de Leça em
Matosinhos, de Siza Vieira, onde o betão se alia harmoniosamente com os rochedos,
ou Pousada de Santa Marinha em Guimarães onde Fernando Távora projetou um
edifício que se submete deliberadamente à envolvente e se funde com o terreno. […]
(Neves, 1993, p. 16)
31
Gaston Bachelard (1884-1962) foi um filósofo e poeta francês, o referido excerto pertence à sua obra
“A Poética do Espaço”.
Humberto José Barros da Silva
102
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A Escola do Porto
A Escola do Porto foi, sobretudo, plataforma coletiva nunca perfeita nem pacífica, não
com o objetivo de academizar um património comum, estabilizando uma soma de
códigos formais, mas com o desejo de transformar uma suposta inteligência comum do
fenómeno da arquitectura em projeto pedagógico institucionalizado. O atelier privado e
a escola foram plataformas complementares de aprofundamento e garantia de vínculos
culturais e disciplinares duráveis e transmissíveis. (Figueira, 2002, p. 13)
A “Escola do Porto” enquanto referência nacional de um modo de fazer e pensar a
arquitetura tornou-se uma referência da cultura arquitetónica portuguesa. É entendida
como uma entidade onde os melhores arquitetos da cidade davam aulas e de onde
partem, e regressam, as experiências arquitetónicas mais consistentes e reveladoras a
nível nacional. No entanto a história da Escola é feita essencialmente por algumas das
suas figuras mais proeminentes. “São todavia personagens cujo gesto poético
atravessa e argumenta inelutavelmente a cultura arquitetónica portuguesa” (Figueira,
2002, p. 19)
Foi sede de cumplicidades entre personagens tão ricas como os arquitetos Carlos
Ramos, Arnaldo de Araújo, Fernando Távora, Álvaro Siza, Souto Moura e tantos
outros. Carlos Ramos como professor (desde 1940), e depois como Diretor (a partir de
1952), expandiu culturalmente a Escola. Ramos32, como o seu comportamento flexível
e inteligente, iria deslumbrar gerações de estudantes e arquitetos, criando um novo
ritmo de funcionamento e urbanidade no seio da Escola. Com a liderança de Ramos, a
instituição é alavancada pedagogicamente, desenvolvendo uma maior tensão criativa
e valores que fazem mover o Moderno.
Com a proliferação do Modernismo na Europa, o ensino da arquitetura em Portugal
continuava sem integrar conscientemente as aspirações modernistas. E com uma
32
Carlos Ramos (1892-1969) foi um arquiteto português, nascido no Porto e formado pela Escola de
Belas-Artes de Lisboa (1915-1921). Foi colaborador do arquiteto Ventura Terra (1919-21) e do arquiteto
Raul Lino (1921). Numa fase inicial, a sua obra foi influenciada pela Art Déco, evoluindo posteriormente,
entre a década de 1920 e 1930, para uma tendência racionalista, de aproximação às obras do arquiteto
alemão Walter Gropius e a Bauhaus. Devido à aposentação do Arquiteto Marques da Silva, é convidado a
integrar o corpo docente da EBAP – Escola de Belas-Artes do Porto –, onde tornou diretor da instituição
em 1952. Ao integrar a ESBAP, Ramos depara-se com um ensino tradicional, mas retrógrado face à
realidade vigente, o que o levou a implementar uma profunda restruturação pedagógica, atualizando os
métodos de trabalho e liberalizando as regras de concursos, organizando seminários de teoria de
Arquitetura, estimulando a introdução da cadeira de Urbanismo, entre outras medidas que alavancaram o
ensino da instituição. Fundada sobre o legado da Aula de Desenho e Debuxo (1780) e da Academia
portuense de Belas Artes (1836), e ascendente direta das atuais faculdades de Arquitetura e de Belas
Artes da Universidade do Porto, a ESBAP constituiu, no século XX, uma das experiências pedagógicas e
artísticas mais bem-sucedidas em Portugal. Após a desvinculação do curso de Arquitetura em 1979, que
daria origem à atual Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto [FAUP], a ESBAP permaneceu
em funcionamento até 1992, ano em que é criada a Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto.
Humberto José Barros da Silva
103
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
instituição que necessitava de uma validação que acabasse com a demanda
oitocentista dos mestres (Marques da Silva, Rogério de Azevedo ou Manuel Marques),
urgia uma rápida integração de um novo núcleo de ideias. E Ramos, numa atitude
visionária, em 1950, resolve chamar para cargos de assistentes de ensino alguns dos
jovens estudantes mais prodigiosos da Escola, entre os quais Mário Bonito, Agostinho
Ricca, José Carlos Loureiro, João Andresen, Octávio Lixa Filgueiras, Arnaldo Araújo e
Fernando Távora, que na altura manifestou um certo desagrado pelo modelo de
ensino praticado, considerando-o uma “desorientação terrível”, e sobre o qual
manifesta-se neste tom: “não era um ensino moderno, mas sim um ensino onde na
conceção de certos edifícios se podia utilizar aquilo que então se chamava o estilo
moderno […] caminhávamos entre modelos de templos romanos […] “ (Távora,
Figueira, 2002, p. 28)
Carlos Ramos created an atmosphere of opennness within and allowed the young
teachers academic freedom. He himself is said to have built none of his own projects,
out of the conviction that this would enable him to preserve maximum teaching freedom
at a time when all that was ‘modern’ was regarded as an enemy of the regime. (Fleck,
1995, p. 103)
O arquiteto Carlos Ramos confia, assim, aos novos assistentes a gestão do ensino da
arquitetura, gerindo sempre, com habilidade e consenso, as ideias expostas pelos
jovens assistentes. Com uma nova gestão da cultura de ensino, a Instituição –
designada na altura de Escola de Belas Artes do Porto – ganha uma nova expressão,
com atividades académicas e recreativas, promovidas e apoiadas pelo Diretor Ramos,
que fariam da Escola do Porto uma Instituição autossuficiente, distante de quaisquer
contingências do opressivo quotidiano salazarista.
Ilustração 103 – Palácio dos Braguinhas – Edifício da antiga Escola Superior de Belas Artes do Porto [ESBAP] e atual instalação da
Faculdade de Belas da Universidade do Porto [FBAUP]. (Universidade do Porto, 2015)
Humberto José Barros da Silva
104
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Entretanto, em 1948, realiza-se o 1º Congresso Nacional de Arquitetura, que viria a
ser revelador, gerando uma profunda reflexão sobre as fragilidades que abrangem a
profissão e o ensino. Enquadrado num contexto tradicional, o congresso opôs
resistência à arquitetura do regime, consubstanciando-se na afirmação do Moderno,
nomeadamente, na cultura da Carta de Atenas e na resolução do problema
habitacional, aspeto último que veio a dar o mote para a reflexão sobre “O Problema
da Casa Portuguesa”, manifestada por Távora, em 1947.
Aberto o confronto e havendo uma opinião generalizada sobre a reforma do ensino
ministrado nas Escolas de Belas Artes Portuguesas, o congresso viria a incutir nos
arquitetos portugueses maior consciência ideológica, marcando, assim, o fim de uma
época de convenções, embora tardia, dos ditames da arquitetura moderna, entretanto
generalizada por toda a Europa.
Com esta nova consciência que o congresso despertou no arquitetos, atitude
progressista do modernismo viria a ser a posta em causa, e contrabalançada com a
consolidação da visão tradicionalista da arquitetura portuguesa, uma vez que a matriz
modernista não resolvia por si só o problema identitário da “Casa Portuguesa”. Esta
reflexão sobre a efetivação de uma identidade arquitetónica nacional viria a originar o
“Inquérito à Arquitetura Popular em Portugal”. E assim o “regionalismo” da arquitetura
popular viria a ser determinante na efetivação de uma arquitetura portuguesa que se
pretendia moderna, mas consentânea com o seu território de produção, instaurandose assim uma comunhão entre o moderno e a tradição. Uma comunhão que Távora
sempre considerou vital para um progresso sustentado da arquitetura portuguesa, que
não deve negligenciar a evolução histórica do panorama arquitetónico, mas também
não pode, no processo, desvalorizar os valores do seu espaço cultural.
A partir desta reflexão, os princípios modernistas de contexto nacional já não podem
representar somente o lado incontornável do progresso, mas terão que se adaptar à
cultura portuguesa, à uma arquitetura moderna e contemporânea que ressalve os
valores e o legado da arquitetura regional, pois essa é certamente, segundo Távora, a
que melhor define o espaço cultural de um povo.
Portugal é dotado de belíssimos sítios naturais e os nossos passados deixaram-nos
excelentes lições quanto ao equilíbrio sítio-edifício, mas em face dos crimes que vemos
cometerem-se aqui e ali contra a nossa paisagem, não será difícil concluir que tal
sentimento de equilíbrio abandonou os nossos contemporâneos pois que, de um modo
quase geral, quando um edifício de hoje se instala num sítio, perdem-se um e outro por
Humberto José Barros da Silva
105
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
ausência de relações corretas entre ambos. E se um mau edifício pode ainda ser
suportável numa rua ou numa praça, na medida em que estas dominem sobre ele, um
edifício mal relacionado com um sítio significa todo um extenso trecho de paisagem
destruído, toda uma oportunidade perdida. E também assim se vai delapidando o
nosso espaço. (Távora, 1996, p. 59)
A Escola do Porto restabelecerá o seu campo de ação a partir dessa consciência, de
uma produção arquitetónica vinculada ao seu contexto. Fundamentada inicialmente
com as obras de Távora, a partir das décadas de 50 e 60, e mais tarde com as de Siza
e Souto de Moura, que elevaram para outra dimensão o legado arquitetónico que
regeu as obras de Távora.
O lugar como conceito físico, fenomenológico e ontológico é, sem dúvida, um pilar
fundamental de quase toda a arquitetura portuguesa depois da revolução de 1974.
Aquilo que se denomina vulgarmente como a «Escola do Porto», e que teve uma
influência quase unânime nos arquitetos portugueses depois dessa data, sublinhava
consecutivamente a importância dos lugares na formulação das ideias e das
intervenções do arquiteto Siza Vieira e, nesse aspeto, uma referência fundamental.
(Neves, 2001, p. 8)
A partir das obras destes três arquitetos, fixa-se o expoente máximo do legado da
Escola do Porto, o que lhe atribui projeção e consolidação internacional. Projeção que
terá tido início com o lançamento, em 1986, da primeira monografia internacional
sobre Álvaro Siza: “Professione poética”, tendo como ilustração da capa o
emblemático edifício de Siza Vieira “Bonjour Tristesse”, em Berlim. A potência
retroativa da publicação terá dado o mote para a difusão internacional da arquitectura
contemporânea portuguesa e consequentemente da Escola do Porto.
A Escola, enquanto instituição, e as pessoas envolvidas continuam, ressalva, mas
como um lastro: qualquer coisa que fica quando um objeto se move com muita
velocidade e deixa sempre qualquer coisa para trás, acho que é essencialmente isso
que se vive nos últimos 20 anos no Porto. (Figueira, 2011)
Ilustração 104 – Edifício “Bonjour Tristesse”, Berlim, Álvaro Siza Vieira. (Testa, 1996, p. 75)
Humberto José Barros da Silva
106
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Importa ainda ressaltar um aspeto determinante na caracterização do legado da
Escola do Porto, quer como processo criativo, quer como processo de leitura e
compreensão do lugar, que compreende “a passagem pelo desenho, como uma
espécie de instrumento primário de entendimento do mundo, essa aprendizagem
básica e arcaica, é talvez o legado mais bonito e estruturante da Escola do Porto”.
(Figueira, 2011)
A mão […] é um vínculo mítico entre a imaginação do arquiteto e a sua obra. […] em
movimento desponta como uma promessa: não de um edifício, mas de algo edificado
no uso, de uma ligação sinóptica entre sujeito e objeto. Mesmo essa arquitetura não é
mais do que um gélido fac-símile da mão. Na mão está o derradeiro sonho de uma
arquitetura vivant – de uma arquitetura viva. (Kahn, 2002, p. 73)
Ilustração 105 – Siza Sketch perspective for the expansion of the city of Macau in collaboration with Fernando Távora. (Fleck, 1995,
p.104)
Este método primitivo de utensílio técnico-operativo em arquitetura condensa nestes
arquitetos um olhar, uma subtileza e sensibilidade profundas na leitura do lugar. Pois
segundo Kahn33 “o desenho conduz a forma à presença” (Kahn, 2002, p. 39). Veja-se
33
Louis Kahn (1901-1974) foi um arquiteto americano, nascido na Estónia. A sua obra caracteriza-se
pelas combinações de formas puras, inspiradas por vezes na arquitetura clássica ou medieval, e pela
manipulação expressiva dos materiais no seu estado aparente, desprovidos de qualquer outro
revestimento. O seu projeto para a extensão da Galeria de Arte da Universidade de Yale (1951-1953)
marcou a chegada da monumentalidade à arquitetura moderna americana, embora a sua obra se situe
Humberto José Barros da Silva
107
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
o exemplo dos esquissos preliminares para o projeto das Piscinas de Leça, em que
Siza desenhou as rochas para que estas se articulassem com a geometria dos
tanques, resultando, visualmente, uma piscina essencialmente natural, “calcetada”
pelas próprias rochas. Para Siza, “ «Os esquissos de viagem», não são desenhos
isoláveis dos esquissos operatórios. São a presença do desenho plástico na actividade
de investigação e projectação construtiva. […] esses esquissos povoam os desenhos
arquitectónicos de Siza." (Rodrigues, 1992, p. 18). Esquissos que condensam no olhar
o sentido existencial do lugar, bem como as suas qualidades menos tangíveis ao
observador comum, que traduzem-se em diálogos poéticos nos seus projetos. “Álvaro
Siza observa, retém e vivifica a memória com os traços de uma paixão imaginativa.
Pensamento, sentimento e vontade; num mesmo movimento de vida, de perplexidade
diante das aparências da realidade e duma outra realidade que nem todos veem.”
(Rodrigues, 1992, p. 19)
Esta visão romântica da arquitetura, proliferada pela Escola do Porto nas últimas
décadas, despertou uma certa militância e convergência de pensamentos entre os
arquitetos portugueses. Um corporativismo ideológico que irá definir, de um modo
geral, a arquitetura contemporânea portuguesa como uma arquitetura de produção
vinculada ao lugar, ao seu contexto físico e cultural, mantendo assim vivo um legado
fundado por Távora e prosseguido por Siza Vieira, seu discípulo, e posteriormente por
Souto Moura, discípulo de Siza. E assim se implementou, na Escola do Porto, um
enredo entre mestres e discípulos que manteve inabalável este sentido existencial do
lugar na arquitetura contemporânea portuguesa, senão veja-se as três obras, que
analisaremos de seguida, destes arquitetos, que evidenciam esta narrativa existencial
(e inevitável, como refere Carol Burns) entre a arquitetura e o lugar: “A casa-dos-24”,
de Fernando Távora; “As Piscinas de Leça”, de Siza Vieira e a “Casa de Moledo”, de
Souto de Moura.
“A Casa dos 24”, Porto, Fernando Távora.
Sem programa concreto, destinado a ser, apenas, um memorial e centro de
informações turísticas, contendo dados históricos e referências sobre a cidade do
Porto, a “Casa dos 24”,34 da autoria de Fernando Távora,35 insere-se na antiga malha
nos limites do Estilo Internacional, não estando totalmente envolvido nele. A título de curiosidade, Kahn
conseguia desenhar com ambas as mãos simultaneamente.
34
A “Casa dos 24” constituía um órgão deliberativo da administração municipal de Lisboa, e mais tarde
expandiu-se a outras cidades do Reino de Portugal. Foi criada em 16 de Dezembro de 1383, por D. João I
Humberto José Barros da Silva
108
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
da cidade, incorporando o seu léxico medieval espontâneo e sóbrio, numa coerência
de forma e matéria. O edifício implanta-se sobre as ruínas de um antigo torreão que
albergava os antigos Paços do Conselho da cidade do Porto, denominada “Casa da
Câmara”, onde funcionou, em tempos, a vereação municipal da cidade do Porto. A sua
construção remonta ao séc. XV, tendo sido erguida junto à muralha românica “Sueva”.
Considerada a primeira sede do poder municipal, destinava-se à representação da
assembleia da Câmara, e a sua designação popular “Casa dos 24” deve-se ao facto
de aí se terem reunido os 24 representantes das corporações de ofícios, que
regulamentavam o processo produtivo artesanal, para o controle da técnica de
produção das mercadorias. Como forma de manter viva essa memória, o novo edifício
também é denominado pela mesma expressão popular.
A antiga Casa dos 24 encontrava-se implantada na base da muralha românica, num
patamar intermédio entre a Rua de S. Sebastião e o Terreiro da Sé, e apresentava
uma forma de torreão, com paredes maciças em granito, que atingiam uma altura de
22m, guarnecidos no topo com ameias (elemento arquitetónico característico da
arquitetura medieval) Serviu de instalação aos antigos Paços do Conselho da cidade
do Porto, desde o período medieval até finais do séc. XVIII. Mas em 1875, já em
estado de abandono, foi completamente destruído por um incêndio, restando apenas
uma parte da fachada, orientada para rua S. Sebastião.
(Mestre de Avis), com o objetivo de permitir que os mesteirais participassem na governação da cidade.
Era composta por dois representantes de cada uma das doze corporações de ofícios da cidade,
conhecidas por “bandeiras”, os quais eram coletivamente conhecidos pelos “Vinte e Quatro”. Na
sequência da implantação do liberalismo em Portugal, as casas dos vinte e quatro foram extintas.
35
Fernando Luís Cardoso de Meneses e Távora (1923-2005) formou em arquitetura em 1946 na Escola
Superior de Belas Artes do Porto (ESBAP) – atual Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto
(FAUP), tornando-se assistente na mesma em 1951, a convite do Arquiteto Carlos Ramos (docente da
Escola), e mais tarde professor. Foi um dos impulsionadores do Departamento de Arquitetura da
Universidade Coimbra – em colaboração com os arquitetos Alexandre Alves Costa, Domingos Tavares e
Raul Hestnes Ferreira –, onde foi posteriormente homenageado com a atribuição do Doutoramento
Honoris Causa em 1993. Como personalidade distinguiu-se no panorama da arquitetura nacional devido
ao seu aguçado sentido crítico em defesa dos valores identitários nacionais, nunca desvalorizando os
ditames de uma arquitetura moderna, mas sim adaptá-la à cultura arquitetónica portuguesa, que encontra
o seu ponto nevrálgico na arquitetura vernacular portuguesa. Assumiu-se, deste modo, como um arquiteto
nacionalista, cuja tradição e o passado constituem um legado de deveras importância para a identidade e
cultura de um povo [português]. Tem entre as suas obras literárias mais importantes “O Problema da
Casa Portuguesa” (1945), a participação no “Inquérito à arquitetura Popular” (1955/60) e o ensaio “Da
Organização do Espaço” (1962). Participou no primeiro Congresso de Arquitetura Nacional, em 1948, e
no VIII, IX e X Congresso Internacional da Arquitetura Moderna (CIAM), em 1951, 1953 e 1956
respetivamente.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 106 - A ruína da antiga Casa dos 24 (Gomes, 2008)
Mas antes de aprofundarmos o estudo da obra, importa referir o contexto histórico e
urbanístico em que esta se enquadra, evidenciando, também, a forma notável como
Távora evoca a memória do lugar, através da recriação da antiga Casa dos 24, tendo
sido esta uma referência da urbe portuense.
O tecido urbano medieval em que se insere o atual o edifício e o conjunto da Sé do
Porto era constituída por um aglomerado de habitações assentes em ruelas sinuosas,
que cercavam a Sé, que, por sua vez, também eram cercadas pela antiga muralha
sueva. A Sé, situada numa sobranceira da cidade, enquadrava-se num tecido urbano
densamente construído (como a maioria das cidades medievais, articuladas por
espaços intersticiais, densamente construídos) e, como tal, desprovida de uma área
ampla que pudesse destacar a sua monumentalidade. Confrontava-se com uma
envolvente exígua, necessitando de uma certa expansão da sua área de influência,
algo que coadunasse com a sua imponência. Esta reorganização (legítima ou não)
viria a acontecer na década de 1930, na sequência de uma reestruturação urbana,
ordenada pela Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, que, seguindo
um conceito higienista, no âmbito da política de intervenção nos monumentos do
Estado Novo, procedeu à limpeza da área, demolindo uma série de edifícios que
punham em causa a conservação física e social daquela zona da cidade. Vários
edifícios ali localizados desapareceram, juntamente com a torre designada
popularmente como a Casa dos 24.
Humberto José Barros da Silva
110
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 107 – Processo de demolições do arranjo
urbanístico,1939. (Gomes, 2008)
Ilustração 108 – Vista do Terreiro da Sé, com o antigo torreão da
“Casa do 24” à esquerda. (Gomes, 2008)
Esta reestruturação, para além de resolver o problema da degradação física daquela
zona, pretendia expandir o Terreiro da Sé, atribuindo-lhe uma perspetiva mais nobre
sobre a cidade, garantindo simultaneamente uma área desimpedida e visitável para as
“Comemorações do Duplo Centenário”, referente à Fundação da Nacionalidade (1140)
e à Restauração da Independência (1640). E assim foi criada uma praça monumental,
debruçada sobre a paisagem urbana da cidade do Porto.
Ilustração 109 – Configuração da praça após reestruturação.
(Gomes, 2008)
Ilustração 110 – Comemorações do Duplo Centenário, 1940.
(Gomes, 2008)
A intervenção urbanística trouxe uma nova monumentalidade para a Sé e o Palácio
Episcopal, em detrimento da extinção de uma parte histórica da cidade e, com ela, o
desaparecimento parcial da sua memória. No entanto, não deixa de ser questionável,
Humberto José Barros da Silva
111
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
ou pelo menos discutível a validade desta ação infligida a um tecido urbano histórico,
uma das zonas mais antigas da cidade. É neste princípio, de reflexão e ressalva da
memória coletiva da cidade, que assenta o projeto de Távora – a ideia de referenciar
um facto histórico, amenizando a sua trágica demolição. Assim nasce a proposta de
recriação da antiga torre da Casa dos 24, outrora uma referência da cidade do Porto,
restituindo-se a memória de uma das mais importantes funções da organização civil e
política da história da cidade.
A evocação de uma referência histórica outrora construída no mesmo local foi a
estratégia preconizada para referenciar historicamente o sítio. E para tal foi escolhida
a ruína da antiga torre devastada pelas demolições, onde veio implantar-se o novo
edifício, com uma aparência pétrea, evocando o corpo granítico do antigo torreão, e
estabelecendo, simultaneamente, a mesma relação corpórea com a Catedral, com a
muralha sueva, com a escadaria e com todo o léxico tectónico característico do
medievalismo.
Esta obra enquadra-se no âmbito de uma encomenda feita pela Câmara Municipal do
Porto, na segunda metade da década de 1990, para a realização de três projetos
públicos para zona histórica, atribuídos aos arquitetos Fernando Távora, Alcino
Soutinho e Álvaro Siza. A Távora coube a tarefa de projetar a Casa dos 24, um
projeto, à partida, sem programa concreto, o que concedeu ao arquiteto um certo grau
de liberdade na preconização da proposta, permitindo-lhe focar-se na relação da
arquitetura com o lugar, e no confronto com as “feridas” que permaneceram no tecido
urbano, após o arranjo urbanístico que decorreu na áreas envolventes da Sé, no
âmbito das Comemorações do Duplo Centenário.
O edifício proposto por Távora assenta em dois princípios: a evocação histórica do
lugar, através da recriação da antiga torre, e o assentamento literal do novo corpo
sobre as ruínas deste. A forma como o edifício se “cose” à ruína remanescente do
antigo torreão e o modo como se agrega à escadaria da muralha, fá-lo enquadrar-se
perfeitamente no tecido urbano.
A proposta assume duas escalas distintas na adaptação à topografia do sítio. Para
quem observa o edifício num plano inferior à plataforma da Catedral (Rua de S.
Sebastião), este assume a escala das torres da Igreja, mas para quem se confronta
como o mesmo à cota de chegada da plataforma (Terreiro da Sé), assume,
Humberto José Barros da Silva
112
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
intencionalmente, uma presença mais modesta, perante a imponência da Sé, não
querendo confrontar-se com esta, mas coexistindo com ela.
A sua suposta camuflagem (aclamada pela materialidade e patine do tempo sobre a
obra), a sua imposição formal (que evoca a antiga torre) e a articulação com a
preexistência (colagem sobre a ruína), traduzem uma convergência de tempos,
assumindo-se, invariavelmente, como um edifício projetado à imagem do lugar e da
sua história. Um exemplo paradigmático da relação [tectónica] entre a arquitetura e o
lugar.
O edifício, contemplado do Terreiro da Sé, assume-se com um autêntico monólito
“diluído” na imponente massa pétrea da Catedral, como se fosse um corpo
complementar desta, dada a sua proximidade e materialidade. Mas visto da fachada
poente, assume maior leveza, potenciada pelo enorme envidraçado que encerra a
volumetria.
Ilustração 111 – Vista da fachada sul – a relação tectónica e cromática com a
envolvente. (Dias, 2015)
Ilustração 112 – Vista da fachada poente e a
ruína da antiga torre. (Dias, 2015)
O desenho do edifício parte de uma planta de base quadrada. É constituído por uma
estrutura de paredes de betão em forma de um “U”, assentes na ruína da antiga torre.
O edifício é limitado por três faces opacas, abrindo-se, a poente, a quarta face, num
enorme envidraçado que permite a contemplação da esmagadora vista sobre a cidade
e o Douro.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 113 – Plantas e cortes do projeto de execução (Gomes, 2008)
Ilustração 114 – Esquisso do enquadramento urbano do edifício e alçados do anteprojeto, 1996 (Gomes, 2008)
Volumetricamente, o edifício enquadra-se no conjunto urbano através de uma
associação metafórica do antigo corpo do torreão, na sua proporção e matéria. Assim,
o seu corpo de betão, que compõe as três faces opacas, é revestido com placas de
granito serrado, simulando o corpo maciço, de granítico, da antiga torre. Esta presença
pétrea do edifício pretende dar continuidade à cor, estereotomia e textura da ruína
remanescente sob o novo corpo, como se de uma “colagem” se tratasse. A
sobreposição intencional entre novo e antigo, imposta por Távora, é bem evidente na
fachada norte, adossada à escadaria que liga o Terreiro da Sé à rua de S. Sebastião.
No entanto, a solidez exterior do edifício esbate-se na transparência interna do
mesmo, ou seja, o imponente envidraçado, que encerra a sua quarta face, devolve ao
interior a transparência e leveza que o exterior, intencionalmente, recusa.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 115 – Vista da fachada norte, adossada à escadaria de acesso à Rua de S. Sebastião. (Urry, 2015)
Esta intervenção é mais um testemunho da reconhecida dedicação do arquiteto
Fernando Távora na salvaguarda do património histórico e na preservação da cultura
arquitetónica portuguesa. Mais do que afirmar a obra em si, Távora procurou
implementar instrumentos de sensibilização para futuras intervenções de restauração
urbana. Portanto, será legítimo encarar esta obra como um ato coercivo, de resposta à
demolição parcial de um tecido urbano histórico, lançando, assim, mais uma
importante reflexão sobre a importância da preservação da memória coletiva do
património histórico [português].
A leitura de Távora fixa-se na delapidação e na descontinuidade do espaço como fim
trágico da cidade que o homem está a construir. […] coloca a intervenção arquitetónica
a ler e a resolver as desavenças do território, numa leitura de um futuro todo
imaculado, carregado de nostalgia. (Figueira, 2002, p. 36)
Ilustração 116 - Vista panorâmica da “Casa dos 24” integrada na malha urbana (Urry, 2015)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Piscina das Marés, Leça da Palmeira, Álvaro Siza Vieira.
A Piscinas de Leça, dissimulada entre a estrada e o mar, torna-se ela própria parte
integrante da paisagem, fundindo com esta, estabelecendo uma relação forte com a
natureza. “O sítio constitui um dos fundamentos do desenho arquitetónico, sendo
indutor de referências para a lógica da conceção. (Duarte, 2002, p. 66)
Próximas da Casa de Chá, da autoria de Siza Vieira36, as Piscinas estão implantadas
ao longo da avenida marginal de Matosinhos – um passeio ribeirinho que se estende
ao longo de um quilómetro, delineado por um paredão que inflete junto ao promontório
da Boa Nova. A construção, imersa e adossada à muralha costeira, numa cota inferior
à da avenida, torna-se impercetível, deixando imperturbada a linha do horizonte.
O projeto só se formalizou, após a Câmara Municipal de Matosinhos ter aprovado a
implantação dos tanques nas rochas. Em termos programáticos, esta obra consta de
duas piscinas; uma para adultos e outra para crianças, e um edifício de apoio. O
edifício, para além da relação tectónica que estabelece com as rochas, adapta os seus
aspetos programáticos à morfologia do terreno.
Nesta simbiose entre natural e artificial, um plano intangível na sua projeção direciona
o nosso olhar para a linha do horizonte, elevando o caráter místico do edifício. Siza
refere que o ângulo de 45º que descreve o plano evoca Taliesen West, do arquiteto
36
Álvaro Joaquim de Melo Siza Vieira (1933) é um arquiteto português, nascido em Matosinhos e
formado na antiga Escola Superior de Belas-Artes do Porto [ESBAP] entre 1949-1955. Considerado a
figura mais proeminente da arquitetura contemporânea portuguesa, iniciou a vida profissional muito cedo
(1955), mas no entanto o seu talento foi reconhecido mais rapidamente no estrangeiro do que em
Portugal, principalmente através das obras de recuperação do bairro judeu de Veneza e do bairro
Kreuzberg, em Berlim. Construiu a sua primeira obra em 1954, dando assim início à sua prematura
carreira na sua cidade natal. Discípulo de Távora, a edificação do seu projeto “4 Casas em Matosinhos”,
quando era ainda estudante, deu polémica, devido à sua audácia e inovação para a época. É em
Matosinhos que se encontram alguns dos seus trabalhos mais emblemáticos, entre os quais a Piscina da
Quinta da Conceição (1958-1965), a Piscina das Marés (1961-1966), a Casa de Chá da Boa Nova (19581965), e mais recentemente a marginal de Leça da Palmeira (2006). Entre essas obras destacam-se
ainda o Centro Galego de Arte Contemporânea e a Faculdade de Jornalismo, ambos em Santiago de
Compostela, Agência bancária Pinto & Sotto Mayor (1971-74); o edifício de habitação “Bonjour Tristesse”,
em Berlim (1980-84), Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (1986-99); Escola Superior de
Educação, em Setúbal (1986-94), Plano do Chiado (1988), Igreja de Santa Maria e Centro Paroquial de
Marco de Canavezes (1990-96); Museu de Arte Contemporânea, Fundação Serralves (1991-99), Pavilhão
de Portugal da Expo ’98 (1995-98); o Centro Cultural Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, Brasil,
Pavilhão de Portugal da Expo de Hannover, em colaboração com Souto de Moura (1999-2003), a Casa
de Chá da Boa Nova (1963), entre outros projetos da sua vasta obra. Entre as inúmeras publicações da
sua vasta obra encontra-se o seu ensaio de reflexão “Imaginar a Evidência”, sobre algumas obras suas.
Foi ainda distinguido com inúmeros prémios, entre os quais a Medalha Alvar Aalto [1988), o Prémio de
carreira Pritzker (1992), o Prémio Europeu de Arquitetura Mies Van der Rohe (1988), Prémio Nacional de
Arquitetura (1993), o Prémio Secil de Arquitetura (1996 e 2000), entre outros da sua extensa lista. É ainda
doutor “Honoris Causa” pelas mais diversas universidades, entre as quais a Universidade Politécnica de
Valência, de Lausanne, a Universidade de Palermo, Lusíada, Coimbra, entre outros.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
americano Frank Lloyd Wright (1937), que na altura fosse uma revelação para o
arquiteto:
Recordo que quando começava o projeto, comprei um livro sobre a obra de Frank
Lloyd Wright, e certos aspetos, certas partes da sua obra, como a casa do deserto,
tiveram uma influência positiva sobre o meu trabalho. Na piscina está presente o poder
da sua essencialidade geométrica, concretizando-se, mesmo, a sua presença nos 45º
de implantação utilizados por Wright no seu projeto. Lembro-me que, então Wright foi
para mim uma via de libertação. (Siza Vieira,1995, p. 32)
Ilustração 117 – Planta Piscina das Marés. (Siza, 1999, p. 58)
Ilustração 118 – Planimetria do complexo Taliesin West. (Wright, 2007, p. 129)
Ilustração 119 – Perspetiva do plano a 45º. (Siza, 1999, p. 82)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A hierarquia topográfica e morfológica sobre a qual o programa se desenvolve evoca
conotações espaciais, históricas e sociais associadas ao ritual do banho, pela forma
como desempenhamos espacial e socialmente as tarefas que, de forma sequencial,
nos levam ao banho. Como refere Frampton: “ […] as piscinas de Leça – da terra até
ao mar – dividem-se em cinco elementos sequenciais. São estes, a avenida marginal,
o edifício dos balneários, a formação rochosa, as piscinas encastradas na rocha, e
finalmente o próprio mar” (Frampton, 1989, p. 177).
O lugar questiona a importância do tempo na condição contemporânea, na sua
progressão e heterogeneidade, nas suas fragmentações e descontinuidades. Contudo,
os valores da memória, das referências que constituem e definem os seus atributos,
criam um sentido de libertação da mente, pois o simples facto de ir à piscina não se
destina somente a nadar, mas também a articular significados próprios ao sentido mais
profundo do lazer, definindo o lugar sociocultural e psicológico dos acontecimentos.
(Duarte, 2002, p. 66)
Nesta intervenção, as duas linguagens tectónicas que formalizam a cobertura e as
paredes do edifício integram uma dicotomia entre o telúrico e o efémero. No primeiro
caso a força telúrica do natural sugere uma articulação profunda e indissociável com a
terra/terreno, como se dela fizesse parte. No segundo caso a efemeridade e leveza da
cobertura, em ripados de madeira, folheado a cobre, sugere uma estrutura transitória
assente numa perene e intemporal.
Ilustração 120 – Pormenor da cobertura em estrutura de madeira assente nas paredes de betão, (Siza, 1999, p. 59)
Mas é na construção das piscinas que a articulação topográfica revela,
verdadeiramente, o conceito arquitetónico de integração com o lugar: Enquanto a
piscina para adultos formaliza geometricamente uma assumida ortogonalidade; a das
Humberto José Barros da Silva
118
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
crianças descreve uma curva elegante, condizente com a organicidade das rochas.
Siza nas suas palavras refere que:
Pretendia otimizar as condições criadas pela natureza, que já ali tinha iniciado o
desenho de uma piscina. Era necessário tirar partido dos mesmos rochedos,
complementando a contenção da água somente com as paredes estritamente
necessárias. (Siza vieira, 2009, p. 47)
Ilustração 121 – Articulação das piscinas com as rochas. (Ganshrit, 2004, p. 75-94)
A integração da formação rochosa no projeto elevou a complexidade de implantação
das fundações das paredes estruturais de betão, que exigiu uma delicada execução
de forma a preservar as rochas, que se fundem magistralmente com as plataformas de
veraneio, que se apresentam camufladas, pela relação tectónica e cromática que
estabelecem com as rochas e o areal da praia. “A Piscina de Leça encontra uma forma
plástica que dialoga as formas lineares do betão com a presença rugosa dos
rochedos. Resposta expressiva e funcional à aptência dum lugar junto do mar.”
(Rodrigues, 1992, p. 77)
Ilustração 122 - A simbiose entre o betão, as rochas e o areal. (Siza, 1999, p. 60)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Do ponto de vista dicotómico matéria/materialidade, o complexo das piscinas possui
uma homogeneidade notável. Cor, tom, sombras e patine variam hierarquicamente
dentro de uma escala de contantes permutações de aparência, sazonalmente e ao
longo do dia.
A relação tectónica estabelecida pela cuidadosa articulação entre as rochas e o
edifício em seus múltiplos percursos, parede, plataforma, escada e acessos, remetenos a cada instante, para o confronto com o poder telúrico da natureza. Esta obra é
um exemplo paradigmático do “território enquanto matéria de construção” de uma ideia
de projeto vinculada à matéria tectónica do terreno, perspetivando a própria matéria do
tempo sobre a obra.
Ilustração 123 – A patine do tempo sobre o betão e as rochas, resultando na fusão entre o natural e o construído. (Olhares, 2015)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Casa de Moledo, Caminha, Eduardo Souto Moura
Na programática das residências, a temática da ruína é recorrente nos projetos de
Souto de Moura37, pela exaltação do objeto arquitetónico à condição de ruína, uma
relação sítio/arquitetura que à partida já se encontra consolidada pela matéria do
tempo sobre a ruína. Morfologicamente, a presença do novo corpo é “diluída” na
preexistência, passando a coexistir com ela, e estabelecendo estrategicamente uma
relação de fusão com o seu contexto, uma vez que a presença entrópica da ruína já
consolidou essa relação ao longo tempo.
Ilustração 124 – Vista Poente da ruína adossada à casa. (Gili, 1997, p. 45)
Com um orçamento limitado, o programa base do projeto desta casa é tão simples
quanto a sua execução: recuperar uma ruína, consolidando-a como jardim, e construir
a casa ao lado.
37
Eduardo Elísio Machado Souto de Moura (1952) é um arquiteto português nascido e formado no Porto,
pela Escola de Belas Artes do Porto e pela Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, onde
leciona atualmente. Enquanto estudante, colaborou no ateliê de Siza Vieira entre 1974 e 1979. Em 1980
conclui a licenciatura e inicia atividade liberal, recebendo na altura o seu primeiro prémio, atribuído pela
Fundação Engenheiro António de Almeida. As grandes referências culturais na sua formação são: Siza
Vieira, seu Mentor; os arquitetos Mies Van der Rohe (1886-1969) e Aldo Rossi (1931-1997), as grandes
experiências californianas dos anos 50 e 60 sobre as “Case study houses”, a arte minimalista de Donald
Judd e Sol Lewitt; Bernardo Soares, um dos heterónimos de Fernando Pessoa (1888-1935), Ronald
Barthes (1915-1980), pensador e escritor francês, pelo pintor catalão Antoni Tapiès e pelo artista plástico
alemão Joseph Beuys (1921-1986). Foi professor convidado nas mais diversas faculdades de Arquitetura
europeias, entre as quais a Faculdade de Arquitetura de Paris-Belleville (1988), Faculdade de Arquitetura
de Harvard e Dublin (1989), ETH de Zurich (1990/91) e Faculdade de Arquitetura de Lausanne (1994). A
sua obra é objeto de inúmeras publicações, tendo como principais projetos, o Mercado e o Estádio
Municipal de Braga, a Casa das Artes, a Casa do Cinema de Manoel de Oliveira, o edifício Burgo no
Porto, a Reconversão do Convento de Santa Maria do Bouro, o Metro do Porto, entre outros projetos. Foi
distinguido com o prémio de carreira Pritzker em 2011. A título de curiosidade, pela proximidade cultivada
por estes arquitetos, Souto Moura vive no Porto, numa moradia com 3 habitações por ele projetado, e
onde é vizinho de Siza Vieira. Para além de trabalhar num edifício que partilha com o seu mestre Siza
Vieira.
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Para construi-la foi necessário a desmontagem do muro de contenção do talude
adossado à ruína, para se proceder à escavação da terra. Construída a casa – em
negativo –, recriou-se o muro de contenção, e a casa, escavada e dissimulada, tornase, assim, parte integral do terreno e da paisagem, dando continuidade ao conjunto de
taludes, como se fosse mais um socalco que humaniza as vertentes do terreno.
A casa propriamente dita é uma “caixa” de vidro, que relaciona-se, visualmente, com o
rochedo (a nascente), descoberto entretanto durante a construção, e que resultou na
criação de uma segunda fachada de vidro. A poente a casa abre-se às paisagens do
Douro. Adossada à ruína e encravada por entre os muros rústicos de contenção, que
se prolongam para o seu interior, ela remete-nos para a rusticidade das construções
tradicionais características do Norte, mas com uma linguagem moderna, minimalista,
“miesiano”38, se assim for elucidativo designar.
Ilustração 125 - Planta do piso – O rochedo torna-se parte integrante da estrutura espacial da casa. (Gili, 1997, p. 46)
38
Termo referente ao Arquiteto Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969), pelo minimalismo dos seus
projetos, à semelhança da Casa de Moledo, que é influenciada certamente pelas suas obras, como por
exemplo o “Pavilhão Alemão” na exposição mundial de 1929, em Barcelona; e mais concretamente a
“Casa Farnsworth”, no Illinois, Estados Unidos.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 126 – Vista da cobertura assente sobre o terreno,
referenciando uma nova topografia humanizada. (Toy, 1999, p. 86)
Ilustração 127 – Vista Poente – A casa estabelece uma
relação de continuidade com os muros de contenção dos
socalcos. (Gili, 1997, p. 45)
No entanto, uma vez que a casa encontra-se dissimulada na paisagem, o arquiteto
estabelece um contraponto interessante, ao assumir a laje de cobertura como um
corpo novo e autónomo na paisagem, que assenta simplesmente no terreno,
simbolizando a intervenção humana na natureza e marcando a presença da casa vista
de cima. “From the outset, the roof of the House at Moledo was exposed in order to
declare itself a new object. It is visible as if it has fallen from the sky.” (Toy, 1999, p.
85).
Se vista de baixo, a casa se quer integrada na paisagem e na lógica exuberante dos
socalcos que estratificam o terreno; vista de cima, a sua presença é aclamada pelo
corpo autónomo da cobertura, que afirma-se com uma nova topografia do lugar. “Em
Moledo o tema é aquele da cobertura, da casa como uma ‘mesa’ […] como um objeto
‘colocado’ sobre o terreno […] “ (Baglione, 1999, p. 89)
Ilustração 128 - Vista nascente da relação que o rochedo estabelece com o interior e exterior da casa. (Toy, 1999, p. 87)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 129 - Pormenor construtivo das fachadas Nascente/Poente. (Futagawa, 1999, p. 85)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Centro das Artes – Casa das Mudas, Paulo David.
“Toca-nos a especificidade do lugar” (David, 2007, p. 24)
Ilustração 130- Centro das Artes- Planta de Localização (David, 2007, p. 34)
O Centro das Artes, da autoria do arquiteto Paulo David39, implanta-se na linha de
festo de uma colina no conselho da Calheta, na zona poente da ilha da Madeira,
próxima da cidade do Funchal, estando delimitado, a nascente, pelo concelho da
Ponta do Sol e, a norte, pelo conselho de Porto Moniz. O centro resulta de uma
ampliação da já existente “Casa da Cultura da Calheta”, e conta com uma área
coberta de 12.000 m2. Com um núcleo programático completamente novo e autónomo,
39
O arquiteto Paulo David (1959) é natural do Funchal. Licenciou-se em Arquitetura pela Faculdade de
Arquitetura da Universidade Técnica de Lisboa [F.A/U.T.L] em 1989. Foi colaborador do arquiteto Gonçalo
Byrne entre 1988 e 1989e do arquiteto Carrilho da Graça no mesmo ano de 1989, tendo iniciado atividade
liberal em 1996. Foi assessor do Departamento de Planeamento Estratégico da Câmara do Funchal entre
1995 e 2003, e professor assistente convidado na Universidade da Madeira entre 2001 e 2004. Integrou
as exposições “Itinerários e arquitetura” (1989), “Cumplicidades” (1999), “Geração 90” e “Habitar Portugal
(2003), promovidas pela Ordem dos Arquitetos, nos projetos selecionados da Região Autónoma da
Madeira. Integrou também, em 2004, a “Exposição Arquitetura e Design de Portugal” (1990/2004). Foi
nomeado para o Prémio Europeu de Arquitetura Contemporânea Mies Van Der Rohe em 2005, com o
Centro das Artes – Casa das Mudas e distinguido com o Prémio de Arquitetura da Cidade do Funchal
(1996, 1ª edição); Prémio “ A Pedra na Arquitetura”, 7ª edição, com o projeto Centro das Artes – Casa das
Mudas (2005); Prémio Enor, 1ª edição, também com o Centro das Artes – Casa das Mudas (2005); o
Prémio “Fad” – Arquitetura Ibérica, com a obra Complexo das Salinas – Câmara dos Lobos (2007);
Prémio Internacional da Pedra na Arquitetura, “Marmomacc”, 42ª edição em Padova, com o Complexo
das Salinas (2007); Prémio Internacional de Arquitetura em Pedra, Verona, também com a obra do
Complexo das Salinas (2007); Prémio Carreira da Secção portuguesa da Associação Internacional dos
Críticos de Arte – Ministério da Cultura (2007), e em 2012 foi distinguido com Medalha Alvar Aalto (2012),
tendo sido o 10º arquiteto, a nível internacional, a receber tal honra, desde a instituição do prémio em
1967, tendo sido o seu primeiro vencedor o arquiteto finlandês Alvar Aalto, como a própria denominação
do prémio assim o indica. Com este prémio, o arquiteto Paulo David junta-se, assim, ao arquiteto Álvaro
Siza Vieira, que também foi distinguido com o mesmo prémio em 1988.
Humberto José Barros da Silva
125
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
o Centro inclui um auditório, biblioteca, loja, cafetaria, restaurante, área para
exposições e uma extensa zona de ateliers e oficinas artísticas.
Esta entidade cultural tem como objetivo sensibilizar o público para as artes em geral e
para a importância da cultura na sociedade madeirense. E para isso aposta na
descentralização da oferta cultural, desenvolvendo uma política inclusiva, que permita
a diferentes grupos sociais e etários o acesso à cultura, ao lazer e à produção artística
e cultural.
A ideia motriz do projeto tem por base a recriação do monte, “esculpindo” o corpo do
edifício na sua matéria pétrea. Conceptualmente, este processo de subtração de
matéria resulta num conjunto de peças esculpidas na superfície montanhosa, gerando,
numa subversão, espaços negativos, relativamente aos acessos pela cobertura, o que
resultou na criação de uma nova topografia, atribuindo ao edifício um carácter dual –
qualidade de natureza, enquanto “formação rochosa habitada”; e qualidade de artifício,
enquanto intervenção humana na paisagem. Com esta estratégia de implantação, em
que a cobertura surge em primeiro plano na confrontação com o edifício, os volumes
escavados propõem uma experiência subterrânea do corpo no espaço, deixando
imperturbada a contemplação da esmagadora vista sobre o mar.
Ilustração 131 – Cortes – O edifício atuando como topografia humanizada, gerando espaços, por subtração, na massa rochosa da
colina (David, 2007, 38)
Humberto José Barros da Silva
126
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O edifício procura adaptar-se às condições topográficas, levando ao limite a sua
projeção sobre a encosta, e estabelecendo uma relação vertiginosa com a falésia e o
mar. Para além da sua implantação, a estreita relação com o lugar é veiculada pelo
seu corpo revestido de pedra basáltica – uma rocha vulcânica, com tonalidades que
esbatem-se do cinzento-escuro ao preto e com uma textura fina e vítrea –, que
ambiciona fundir-se com a paisagem, ajustando-se às suas constantes permutações
de aparência.
Ilustração132 – A mutação cromática do edifício ao longo dia (David, 2007, p. 35)
A forma como o edifício gera uma topografia humanizada na colina, quer pela
evocação da sua matéria geológica, quer pela lapidação da sua massa pétrea,
confere-lhe à colina qualidade de matéria habitável, gerada por rasgos, percursos e
espaços expectantes que induzem o visitante a explorar os seus limites.
Este processo de subtração de massa, que gera vazios no edifício, atribui-lhe um
aspeto de afloramento fragmentado, no seu núcleo, pelos movimentos tectónicos e
processos
de
erosão
do
solo,
remetendo-nos
para
as
transformações
geomorfológicas, de origem vulcânica, que o território da Madeira esteve sujeito
durante os processos de solidificação das suas paisagens, ocorridos com o
Humberto José Barros da Silva
127
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
arrefecimento rápido da lava em contacto com a frente de mar, gerando um equilíbrio
raro entre Forma e Lugar.
Muntañola40, no seu ensaio «arquitetura como lugar», refere que “o lugar e a
arquitetura são objetos privilegiados para estudar a dialética entre a lógica do lugar e
experiência que temos dele”. (Muntañola, 1996, p. 18). Estas narrativas [tectónicas]
entre o lugar e a arquitetura, entre o natural e o artificial, são uma constante nas obras
do arquiteto Paulo David, mais concretamente uma metodologia de projeto, que evoca
o lugar através da materialidade.
A forte fisionomia visual das paisagens vulcânicas da ilha da madeira potencia este
sentido refinado do arquiteto na exaltação do lugar. “Este território insular de orografia
forte, de configuração piramidal […] tornam as intervenções do arquiteto fortes e
precisas […] “ (David, 2007, p. 25). Os seus edifícios vivem de uma certa abstração
entre o natural e o artificial, celebrado pela força telúrica do território, como o conjunto
do Complexo das Salinas, Câmara dos Lobos, onde o paredão e as plataformas se
fundem com os rochedos; ou o Pavilhão do vulcanismo, onde o corpo pétreo do
pavilhão estabelece uma relação tectónica muito intensa com a falésia em que se
encastra, como se brotasse dela.
Na Madeira, a paisagem assume uma preponderância extrema e é, ela própria,
representativa de economia e turismo. A questão da paisagem pelas memórias
anteriormente referidas reflete-se num respeito e numa consciência de não “gritar” mais
alto que a dimensão telúrica da morfologia territorial.” (David, 2007, p. 27)
40
Josep Muntanõla (1940) é um arquiteto e teórico espanhol, professor catedrático da Universidade
Politécnica da Catalunha e teórico de arquitetura. Tem entre a sua vasta obra teórica “La arquitectura
como Lugar” (1974), “Topogénesis dos” (1978), “Topogénesis uno” (1979), “Topogénesis três” (1980),
“Topos y logos” (1978), “Poética y arquitectura” (1981), “Comprender la arquitectura” (1985), “Retórica y
arquitetctura” (1985), “El niño y la arquitectura” (1984), “El niño y el medio ambiente: orientaciones para
los niños de 7 a 10 años de edad” (1984). A sua contribuição para a teoria da arquitetura incluem a teoria
da génese do lugar (topogénesis), bem como as investigações sobre o desenvolvimento das capacidades
cognitivas e arquitetónicas das crianças.
Humberto José Barros da Silva
128
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 133 – Complexo das Salinas, Câmara dos Lobos, Ilha da madeira - A relação tectónica entre o paredão e as plataformas
com os rochedos, recriando e humanizando uma nova topografia que ambiciona fundir-se com as rochas.
Ilustração 134 – Pavilhão do vulcanismo, Ilha da Madeira – A relação que o corpo pétreo do pavilhão estabelece com a falésia, como
se brotasse dela. (Barbosa, 2015
Este diálogo constante que os seus projetos estabelecem com a paisagem deriva da
condição periférica da sua função enquanto arquiteto no arquipélago da Madeira, o
que lhe permite exercer a profissão com um certo desprendimento, alheio a quaisquer
virtuosismos arquitetónicos que negligenciem a ligação intrínseca da arquitetura com o
seu contexto geográfico, cultural e social, que deixando de ser consentâneos perdem
a autenticidade e visibilidade nos seus aspetos mais intrínsecos. “Lidar com o mar,
numa ilha, sem o imediatismo óbvio, é o desafio que assinala as suas melhores
obras.” (Milheiro, 2007, p. 12). O arquiteto refere ainda que “este estado de
insularidade, embora reconhecendo a sua situação ultraperiférica, estimula o propósito
de exercer a profissão com serenidade, distante de outras contaminações […] ”
(David, 2007, p. 25). Pois “a ideia da volumetria e do objeto arquitetónico ser
preponderante em relação à paisagem é algo com que não me entusiasmo. (David,
2007, p. 25).
Humberto José Barros da Silva
129
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A arquitetura de Paulo David está indelevelmente marcada pelo contexto geográfico em
que optou trabalhar, a Madeira. O arquiteto tem a seu favor um conhecimento profundo
da realidade física e social onde se insere, facto esse a que não será estranha a
concepção arquitectónica que fundamenta as suas principais propostas.” (Baptista,
2007, p. 12)
Numa sociedade que celebra a globalização (apesar das vicissitudes que isso possa
implicar), a condição periférica do seu trabalho liberta-o de quaisquer dogmas
arquitetónicos que ponham em causa a identidade do território, atribuindo-lhe uma
consciência do tempo sobre as coisas, a forma como poderão gerar uma identidade
consentânea com o seu contexto físico e cultural, ou deixar em aberto, como
dimensão oculta, a possibilidade de o território, com as suas valências, conferir-lhes
essa identidade. “Para o arquiteto madeirense, a paisagem não é uma realidade
cenográfica unitária, previamente dada e inteiramente disponível, mas uma construção
humana assente numa experiência temporal de descoberta […] ” (Baptista, 2007, p.
12)
A arquitetura de Paulo David fundamenta-se, portanto, na ideia de indissociabilidade
entre a realidade natural e a humanizada, mediadas por ações e intervenções
transformadoras que lhes confere sentido. Na Casa das Mudas, o arquiteto procura
fundir a topografia natural com a humanizada, atribuindo ao edifício um caráter de
ambivalência, entre natureza e artifício. Bem como no Complexo das Salinas, onde
evoca tectónica e topograficamente o afloramento do terreno (formado pela
estratificação vulcânica e o consequente arrefecimento da lava em contacto com o
mar), recriando uma nova dimensão espacial, uma qualidade ambiental híbrida, que
harmoniza a paisagem natural com a artificial, que funde-se com as rochas num
anseio dual de integração/dissimulação e simultaneamente de destaque/revelação.
Centro de Educação e Interpretação Ambiental da Paisagem Protegida do
Corno de Bico.
O território
A Paisagem Protegida do Corno de Bico está inserida no conselho de Paredes de
Coura, no Distrito de Viana do Castelo. Situa-se no sudeste do conselho, onde os seus
limites a Nascente e Sul coincidem, respetivamente, com os conselhos de Arcos de
Valdevez e Ponte de Lima. A Norte está limitada entre Cenoi e Lamas.
Humberto José Barros da Silva
130
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 135 - Mapa de localização da Paisagem Protegida do Corno de Bico (Paredes de Coura, 2015)
Sendo uma paisagem protegida, compreende uma área de paisagens naturais,
seminaturais e humanizadas, cujas características e valores naturais ou culturais
conferem-lhe um especial interesse a nível regional e nacional. Deste modo, a
Paisagem Protegida do Corno de Bico constitui um valioso Património Natural de vida
animal e vegetal. O clima de extremos, onde o inverno é muito frio e o verão muito
quente e seco, fomenta a sua biodiversidade, que conta com 430 espécies vegetais e
188 espécies de animais vertebrados. A sua estrutura montanhosa por natureza, de
encostas, rios, manchas preciosas de carvalhal e blocos de granito, bem como as
suas diferentes unidades de paisagem – florestas, bosques, campos de cultivo, cursos
de água – oferecem um enorme leque de recursos de alimentação, reprodução e
habitats naturais às mais diversas espécies de animais.
Com uma área de cerca de 2175 hectares, e abrangendo 5 freguesia do conselho de
Paredes de Coura – Bico, Castanheira, Cristelo, Parada e Vascões – a Paisagem
Protegida do Corno de Bico compreende uma região essencialmente montanhosa,
sendo o Corno de Bico a elevação de maior altitude, com 883 metros de altura. No
topo das encostas verdejantes predominam um aglomerado caótico de blocos de
granito (rocha dominante da região) que conferem a paisagem um aspeto
aparentemente caótico, em que a sequência de muretes e socalcos, que permitem a
prática da agricultura, conferem a paisagem e própria região um aspeto característico.
Humberto José Barros da Silva
131
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O caráter rural desta região é patente nos povoados fortificados, monumentos
fúnebres do Neolítico que ainda subsistem como testemunhos dos primórdios da
civilização, bem como os espigueiros, moinhos, socalcos e campos agrícolas que
encerram a paisagem, traduzindo o esforço da população que tem vindo a ocupar a
região.
Ilustração 136 - paisagem do Corno do Bico (Câmara municipal de Paredes de Coura, 2015)
Para além de usufruir do estatuto de Paisagem Protegida, esta região, por ser uma
zona de elevada importância na conservação de uma variedade de habitats e espécies
ameaçados a nível europeu, consta ainda na Lista nacional de Sítios de Importância
Comunitária – Rede Natura 2000 – ao abrigo da Diretiva Habitats.
A obra
Localizado na Colónia Agrícola da Boalhosa41 (construída em 1940), em Chã de
Lamas, o Centro de Educação e interpretação Ambiental do Corno de Bico [CEIA], da
autoria do Atelier da Bouça42, integra um conjunto de três edifícios, dois dos quais
41
A Colónia Agrícola da Boalhosa, construída em 1940, enquadra-se no âmbito de um planeamento
paisagístico, para o meio rural e zonas de habitação social, desenvolvido pela junta de Colonização
Interna. Do projeto inicial da Colónia foram construídas as casas dos colonos, o Forno Comunitário, a
Escola e a Casa do Professor, tendo ficado a Igreja por construir, destinada ao terreno onde se implanta o
edifício sede.
42
O Atelier da Bouça estabeleceu actividade liberal em 2008, no Porto, e integra a dupla de arquitetos
portugueses Filipa de Castro Guerreiro e Tiago Macedo Correia, licenciados pela Faculdade de
Arquitetura da Universidade do Porto em 2000, período a partir do qual começaram a desenvolver vários
projetos em parceria, dos quais se destacam a ampliação da Escola Profissional do Alto Minho Interior
[EPRAMI] Paredes de Coura (Prémio Categoria Jovem Arquiteto, Arquitetura em Tijolo de Face à Vista
CVG 2004/05) e o Centro de Interpretação Ambiental da Paisagem Protegida do Corno de Bico (finalista
dos Prémios FAD 2008 e nomeado para o Prémio Europeu de Arquitetura Mies Van Der Rohe, em 2009).
Em 2001 fundaram, em parceria com o arquiteto Bruno Figueiredo, um espaço de experimentação
profissional, que denominaram Laboratório de Arquitetura, na sequência dos 1ºs Prémios nos concursos
para o Centro de Monitorização e Interpretação Ambiental (CMIA) de Matosinhos e para a Escola Básica
Humberto José Barros da Silva
132
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
preexistentes, reabilitados e reconvertidos em cantina e pousada, e o terceiro é o
CEIA (edifício sede), um edifício novo, que implanta-se num terreno cujo plano previa
uma igreja. Os três edifícios integram uma área de intervenção de 8.000 m 2, tendo
apenas 1.075 m2 de área edificada. O projeto do CEIA enquadra-se no âmbito de uma
estratégia local de recuperação do conjunto da Colónia, através da análise do seu
projeto inicial. Sendo uma área protegida, a proposta de intervenção assenta num
princípio de preservação da imagem global da colónia, e neste sentido era necessário
uma solução que não desvirtuasse essa imagem. Deste modo a monumentalidade da
igreja projetada inicialmente foi substituída pela inclusão do maciço arbóreo existente
no projeto, que revelou-se o elemento motriz da intervenção – como se o edifício
tivesse sido gerado por osmose, por entre os troncos e copas das árvores. “A sua
monumentalidade foi substituída pela consideração do maciço de árvores, entretanto
presente, como o princípio fundador do projeto” (Guerreiro e Correia, 2009, p. 48).
Ilustração 137 – Plantas de implantação do piso 0 e piso 1 do conjunto – Note-se na planta do piso 0 como os pilares do edifício do
CEIA se confundem com os troncos das árvores. (Guerreiro e Correia, 2007, p. 102)
de Paredes de Coura, obras selecionadas para as exposições ‘Habitar Portugal’ (2000-2002 e 20032005). Estes arquitetos manifestam nos seus trabalhos uma cuidada relação com o lugar e com a
construção da paisagem, bem como a preservação da identidade social e cultural do contexto de
intervenção. Focados em projetos de restauração e reabilitação urbana, esta dupla constitui mais um
leque de discípulos que proliferam a “doutrina” da Escola de Porto, tendo inclusive Filipa Guerreiro
colaborado com Álvaro Siza Vieira entre 1999 e 2000.
Humberto José Barros da Silva
133
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 138 - Corte longitudinal do conjunto (Guerreiro e Correia, 2007, p. 101)
A opção de suspender o edifício sobre uma série aparentemente desordenada de
pilares que se assemelham e misturam-se com os troncos do maciço arbóreo minimiza
o impacto da intervenção e permite libertar o terreno, preservando a fruição e
continuidade da estrutura arbórea. Em termos percetivos, os troncos das árvores
extravasam o corpo do edifício, ao brotar do terreno e elevam-no do solo,
estabelecendo-se assim uma geometria equilibrada entre natural e artificial. Esta
estratégia cria simultaneamente uma espécie de átrio exterior, um momento de pausa
à chegada do local, e até de abrigo sob o edifício e as copas das árvores, permitindo
uma confrontação mais reveladora do conjunto (estrutura arbórea e edifício).
Ilustração 139 - Vista do alçado poente – A alavancagem do edifício sugere o desabrochar dos troncos do solo, que elevam-no do
terreno, mantendo a fruição do mesmo e respeitando a sua condição de paisagem protegida, incrementada também pela “camuflagem”
do corpo entre o maciço arbóreo, com o intuito de amenizar o impacto visual do edifício na envolvente. Integração e preservação são
assim as palavras de ordem desta intervenção sensível ao território e, por isso, consentânea com a sua finalidade. (Guerreiro e Correia,
2009, p. 51)
Os pilares, para além da sua função estrutural, desempenham um papel fulcral na
fundamentação da ideia de projeto, na medida em que a sua superfície polida e
cilíndrica assemelha-se a dos troncos das árvores, da qual foi subtraída a sua camada
externa (córtex) para o revestimento do edifício, num processo de transferência de
Humberto José Barros da Silva
134
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
matéria, em que a “pele” do edifício é gerada, por osmose, pela camada epidérmica
dos troncos. Este princípio conceptual de apropriação da matéria do maciço arbóreo
para a materialização do edifício remete-nos para as construções vernaculares, em
que a matéria do território materializa os edifícios, que passam a estar ancorados ao
sítio, de forma inalienável.
Ilustração 140 – Vista do alçado sul – Note-se, numa transferência de matéria, a relação conceptual entre os troncos naturais com os
artificias e o revestimento do edifício: como se tivessem transferido a camada epidérmica que reveste os troncos para o corpo do
edifício. (Nautilus, 2015)
Ilustração 141 - Pormenor construtivo do edifício em estrutura de betão com revestimento exterior de madeira. (Guerreiro e Correia,
2007, p. 103)
Humberto José Barros da Silva
135
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O desenho da longa rampa de acesso deriva, para além da estratégia de cumprir a
inclinação regulamentar, da organicidade do lugar e da disposição aleatória das
árvores, gerando um percurso sinuoso e cinematográfico entre os troncos, alargando
deste modo a extensão e o domínio do edifício, onde o visitante é induzido a
deambular entre o maciço arbóreo até à entrada principal, confrontando-se com o
edifício sempre em perspetivas progressivamente variáveis.
Ilustração 142 – Vista norte – rampa de acesso ao edifício (Guerreiro e Correia, 2009, p. 52)
A madeira, enquanto revestimento exterior, também estabelece um diálogo com o
conjunto preexistente das décadas 1940/50, evocando o caráter intemporal do mesmo,
pela imagem de modernidade que o conjunto, de forma visionária, representa até hoje,
partilhando o protagonismo com os novos equipamentos contemporâneos. A
conservação da estrutura e composição dos edifícios existentes sustentou uma
estratégia de recuperação e reconversão dos mesmos. A antiga escola passou a
cantina, com acréscimo do volume da cozinha; e a casa do professor converteu-se em
pousada (centro de acolhimento), mantendo as funções dos espaços existentes, mas
agregando um novo volume de camaratas que redesenha a frente da praça.
Humberto José Barros da Silva
136
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 143 – Planta de implantação – reconversão dos edifícios existentes (Guerreiro e Correia, 2007, p. 102)
Ilustração 144 – Vista nascente da ampliação proposta – a relação de continuidade do novo corpo da pousada com o preexistente (a
antiga casa do professor, no fundo da imagem). (Guerreiro e Correia, 2007, p. 101/102)
Humberto José Barros da Silva
137
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O Museu da Luz
Um museu é um contentor do tempo. A significação cultural da paisagem é um
processo de duração, através do qual a experiência de habitar o tempo, contínuo ou
fragmentado, inscreve no espaço da realidade vestígios e símbolos referenciadores de
memória coletiva ou individual. (Taborda, 2007, p. 78)
O Museu da Luz surge de um desejo de evocar memórias da antiga Aldeia da Luz,
situada no concelho de Mourão, distrito de Évora, entretanto submersa pelas águas da
barragem do Alqueva. Os primeiros estudos para a construção de uma barragem na
zona mais seca do país realizaram-se na década de 1950, em pleno Estado Novo.
Com esta gigantesca estrutura pretendia-se essencialmente garantir uma reserva de
água vital na luta contra a seca, o abastecimento regular de água às populações; a
disponibilização de água para agricultura no sul do país, cobrindo uma área de rega de
110 mil hectares e a produção de energia hidroelétrica.
Para os habitantes da Aldeia da Luz, a sua extinção, caso a construção da barragem
avançasse, era algo pouco provável. Entretanto, ao longo dos anos esta
improbabilidade de submersão da aldeia virou um mito, que veio a tornar-se realidade
com a retoma dos trabalhos em 1993, altura em que se iniciou os primeiros inquéritos
à população sobre o destino da nova aldeia, que viria ser concluída após as obras do
paredão da barragem, em 2002.
Com o avançar das obras e a nova aldeia a ganhar forma, a iminência do abandono
forçado das casas, a transformação da paisagem, a perda de terrenos, hortas e
campos de cultivo e toda história de uma vida originaram uma onda de angústia e
revolta dos habitantes – uma reação que, segundo os relatos da comunidade local, foi
deliberadamente controlada por parte do poder central através da aparente indecisão
sobre os avanços e recuos que ditaram o desfecho inevitável da construção da
barragem. “Esta suspeição faz parte de um contexto real em que todo o processo de
Alqueva tem decorrido, num clima permanente de conflito de ideias, de fazer e
desfazer, de tentativa e erro, muito sentido pela população […] “ (Saraiva, 2003, p.
109). Uma estratégia dissimulada que visava o controlo emocional e reacionário dos
habitantes, para que estes não se insurgissem política e socialmente contra o projeto.
Tal terá sido conseguido através da sonegação generalizada de informação sobre o
processo, bem como uma série de dados contraditórios que deixavam um rasto de
incertezas sobre o desfecho da obra, mantendo assim adormecida a revolta da
população, que, num clima permanente de incertezas e sonegação, tomaram por mito
Humberto José Barros da Silva
138
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
o então inevitável desfecho da construção da barragem e a consequente submersão
da Aldeia. E quando as obras da barragem avançaram e a nova aldeia começou a ser
construída, a angústia apoderou-se dos habitantes ao confrontarem-se com um mito
que tornou-se realidade.
Ilustração 145 – Barragem do Alqueva (Comissão Nacional Portuguesa de Grandes Barragens, 2015)
Ilustração 146 - Vista aérea da antiga Aldeia da Luz (Pinto, 2011)
Humberto José Barros da Silva
139
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 147 - Localização da antiga Aldeia da Luz (Pinto, 2011)
Todo o processo de conceção e concretização da nova aldeia foi, forçosamente,
prolongado e difícil, formando-se, após longos anos e vários concursos públicos,
equipas multidisciplinares de técnicos para projetar o novo núcleo da Luz, com os
vários equipamentos públicos, inclusive os que vieram a ser os marcos do novo núcleo
– a igreja matriz, o cemitério e o Museu. Deste processo de submissão e abandono de
toda memória coletiva local, a transladação do cemitério constitui o expoente máximo
da violação de privacidade dos habitantes, desbravando memórias que intensificaram
o âmago de uma comunidade que já se sentia vitimada pela decisão superior de
submergir a aldeia. Este espaço viria a constituir conjuntamente com a igreja e o
museu o conjunto mais simbólico da nova Aldeia da Luz.
O simbolismo e o sentimento de pertença à velha aldeia prendem-se, também, com a
importância da igreja matriz, que, segundo a lenda, foi erigida no mesmo local do
aparecimento da Virgem e da origem do povoado da Luz. “O Museu da Luz instalou-se
num espaço de paisagem novo. É neste contexto que codifica a memória
simultaneamente como tempo passado do lugar desaparecido e como identidade do
lugar novo no tempo presente. (Taborda, 2007, p. 78). Esta intensa carga simbólica do
antigo núcleo para o novo é descrita pelos autores da seguinte forma:
A deslocação da Aldeia da Luz é um ato de substituição, uma dupla e simultânea ação
de fundação e destruição. Neste duplo processo de transformação da paisagem, a
Humberto José Barros da Silva
140
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
antiga aldeia permanece como embrião conceptual – uma primeira natureza elaborada
durante séculos de apropriação do território e uma segunda pensada e construída
como uma nova identidade. A fundação do lugar constituído pela Igreja da Nª Sª da
Luz, o cemitério transladado e um museu dedicado aos territórios da luz é um dos
principais cenários dessa substituição. A Igreja da Nª Sª da Luz é uma referência de
fixação que dá identidade e nome à aldeia. O cemitério permanece como figura regular
branca que acompanha o declive do terreno. A edificação do conjunto museu, igreja e
cemitério procura absorver, numa nova situação topográfica e geográfica, as analogias
ao lugar da antiga Igreja da Nª Sª da Luz. A igreja e o cemitério como fortes elementos
identitários, preexistências únicas e museu como elemento estruturante do novo lugar,
dotado de carga representativa da substituição. (Pacheco e Clément, 2004, p. 55)
Ilust. 148 - A nova Aldeia da Luz com o conjunto da Igreja, cemitério e Museu em primeiro plano (Pinto, 2011)
Ilustração 149
Humberto José Barros da Silva
- Localização da nova Aldeia da Luz (Pinto, 2011)
141
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 150 - Vista poente do conjunto: Museu, cemitério e Igreja (Pacheco e Clément, 2004, p. 49)
Situado nos limítrofes da nova Aldeia da Luz e da barragem do Alqueva, o Museu da
Luz, da autoria dos arquitetos Pedro Pacheco43 e Marie Clément desenvolve-se
parcialmente no subsolo, libertando a cobertura para a fruição e apropriação do
espaço público, e deixando imperturbável a imensa planura da paisagem alentejana.
“De tal modo o museu absorve a horizontalidade e o silêncio do território alentejano
que, hoje, dir-se-ia o elemento fundador da nova Aldeia da luz.” (Roseta, 2004, p. 48).
Enquanto na “Casa das Mudas” a paisagem vulcânica do território madeirense, com a
sua acentuada topografia, ditou o corpo basáltico do edifício; e no “Centro de
Educação e Interpretação Ambiental do Corno de Bico” o maciço arbóreo do terreno
fundamentou o seu corpo de madeira suspenso sobre os troncos/pilares; no Museu da
Luz a aridez e horizontalidade da paisagem alentejana ditaram a presença silenciosa
do seu corpo de xisto meio “submerso” no solo, evocando, em parte, a antiga aldeia
submersa pelas águas do Alqueva. “A Sala da Luz, a figura principal do museu,
constitui em conjunto com as chaminés de luz a única marca visível da presença do
edifício na paisagem. […] “ (Pacheco e Clément, 2004, p. 55)
43
Pedro Pacheco é mais um discípulo da “Escola do Porto”, licencia-se em arquitetura, em 1991, na
Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto [FAUP]. Estagiou em Barcelona com Josep Llinàs, em
1990, tendo como orientador o arquiteto Eduardo Souto Moura. Colaborou no Porto com Fernando Távora
entre 1992 e 1996, altura em que forma atelier, em Lisboa, com José Adrião entre 1996 e 2004,
retomando colaboração conjunta em 2013. Trabalhou em coautoria com Marie Clément nos projetos para
as aldeias da Luz e Estrela entre 1998 e 2007, e é professor convidado na Faculdade de Arquitetura da
Universidade de Lisboa desde 2004 e no Departamento de Arquitetura da Universidade de Évora desde
2012. A sua prática profissional enquanto arquiteto abrange um amplo e diversificado campo de ação, da
arquitetura ao urbanismo e reabilitação, bem como design de interiores e de mobiliário. Dos projetos
realizados destacam-se as obras do Museu da Luz, os cemitérios da Luz e da Estrela, a reconstrução da
Igreja da Luz e a reabilitação do seu atelier. Foi ainda distinguido com diversos prémios pelo conjunto do
museu, cemitério e igreja da Luz, entre os quais o Prémio Internacional de Arquitetura de Pedra, Verona,
Itália (2005), Prémio do Património Cultural da União Europeia (2005), Prémio Europeu de Arquitetura
“Luigi Cosenza”, Nápoles, Itália (2004), Prémio Menhir 2004 e uma Menção Honrosa na categoria de
Melhor Museu Português 2003-2005, atribuída pela Associação Portuguesa de Museologia.
Humberto José Barros da Silva
142
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 151 - Corte e alçado Norte do Museu (Pacheco e Clément, 2004 p. 52)
Ilustração 152 – Vista norte – Os planos que denunciam a presença do edifício na paisagem. (Museudaluz, 2015)
O processo de desmontagem da Aldeia da Luz traz à superfície informações várias,
tanto de caráter arqueológico como antropológico, histórico e arquitetónico, que
abrangem além da própria aldeia todo um território. O museu é o espaço contentor que
permite armazenar e classificar essa informação, resultado de todo o processo de
substituição, que, além de registo físico, estabelece uma intencional cumplicidade ente
a situação das duas aldeias. (Pacheco e Clément, 2004, p. 55)
Para além da condição de recetáculo dos seus artefactos e da sua própria história, o
desejo de evocar as memórias de uma aldeia desaparecida subentende-se no modo
como o conjunto (museu, cemitério e igreja) se posiciona no terreno, evocando
relações consolidadas com a antiga aldeia. No seu interior um vão direciona o olhar
para o lugar onde jaz a aldeia submersa. Até a decisão de reconstruir a nova igreja da
Luz à imagem da antiga, utilizando técnicas tradicionais, denota um desejo de
reminiscência do que foi outrora a aldeia. “A necessidade de deslocalizar rápida,
geográfica e socialmente a povoação da Luz redefiniu culturalmente a sua importância
de localidade e impôs a [re]construção de marcas topo-menmónicas capazes de
continuar uma lembrança-memória no espaço novo da Luz relocalizada.” (Taborda,
2007, p. 78)
Humberto José Barros da Silva
143
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Assim o Museu da Luz, de Pedro Pacheco e Marie Clément, parte de uma ideia
fundadora de um tempo e de um lugar que permanece na memória coletiva e que
agora se consubstancia na nova relação telúrica com a paisagem, com a qual se
articula deixando registos racionais da passagem do Homem. A luz e a escala
constituem os factores sobre os quais se exerceu o domínio simbólico de apropriação
de um tempo fundador: (Quintas, 2004, p. 47)
Ilustração 153 – Vista para antiga localização da Aldeia. (Museudaluz, 2015)
Ilustração 154 - Planta de implantação do conjunto – Igreja, cemitério e Museu. (Pacheco e Clément, 2004, p. 49)
Implantado estrategicamente no limite do eixo Nascente-Poente da aldeia, o edifício
redesenha a topografia do sítio numa relação mais telúrica com a paisagem,
Humberto José Barros da Silva
144
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
condensada pelo seu “encaixe” no terreno e pelo seu corpo de xisto, que assume a
sua horizontalidade e espectro cromático. “Construir o museu em xisto aproxima-o,
inevitavelmente, mais à terra, solo xistoso e a uma ideia de fundação.” (Pacheco e
Clément, 2004, p. 55)
Ilustração 155 - Vista poente do conjunto – A integração do museu na paisagem – a relação cromática e topográfica com o território.
Desta perspetiva o edifício assume uma espécie de embasamento da nova Aldeia da Luz. (Pacheco e Clément, 2004, p. 49)
Em termos construtivos, as paredes do edifício são constituídos por dois panos de
xisto, em tons terra, que revestem a estrutura de betão. O xisto intensifica a
implantação estratégica do museu, potenciando a sua integração na paisagem, bem
como a sua horizontalidade, que é mediada pela estereotomia da pedra – tiras de
pedra paralelepipédicas com dimensões de 60x5x7 cm, aplicadas horizontalmente
sobre a superfície de betão, incrementando em termos percetivos a horizontalidade do
edifício, que flui na imensa planura da paisagem.
[…] das paredes do Museu da Luz ecoa uma força original. […] O caráter fundador da
pedra, reforçado pela decisão de enterrar o edifício e pela sua vocação memorial,
pertence a um tempo distante da atualidade efémera. Pertence ao tempo da criação
que permite a Miguel Ângelo discutir com Corbusier as proporções ideias da obra
helenística. (Roseta, 2004, p. 50)
A singularidade da aplicação da pedra remete-nos para a magistralidade do arquiteto
suíço Peter Zumthor no domínio dos materiais, que conjuga a essência de cada
material ao contexto geográfico e programático do projeto. “Nas «grutas» termais
utiliza a matéria da montanha; numa pequena capela, o acolhimento da madeira; num
museu de arte contemporânea, o insólito casamento entre o vidro e o betão. Deste
modo de pensar nunca resultará uma griffe reconhecida globalmente. (Roseta, 2004,
p.50). “Pois cada projeto é uma história” (Pacheco, 2004, p.50), como é subentendido
na obra de Zumthor, que refere o seguinte:
Humberto José Barros da Silva
145
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
[…] O sentido nasce quando se consegue criar no objeto arquitetónico significados
específicos de certos materiais que só neste singular objeto de podem sentir desta
maneira. Quando trabalhamos com este objetivo, temos sempre que voltar a perguntar,
o que um determinado material pode significar num determinado contexto
arquitetónico? Boas respostas a estas perguntas podem tornar claro, sob uma nova
luz, o modo com esses materiais costumam ser utilizados e as suas próprias
características sensoriais e significativas. Se conseguirmos, os materiais na arquitetura
podem transmitir som e brilho. (Zumthor, 2009, p. 10)
Ilustração 156
– Estereotomia da pedra. (Pacheco e Clément, 2004, p. 50)
Ilustração 157 – Pormenor do revestimento das tiras de pedra (xisto) sobre a estrutura de betão (Basulto e Assael, 2015)
Humberto José Barros da Silva
146
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
3. O MUSEU DE ARTE E ARQUEOLOGIA DO VALE DO CÔA
3.1. OS AUTORES
Esta dupla de arquitetos, Tiago Pimentel [1973] e Camilo Rebelo [1972], formados na
Escola do Porto – Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto [FAUP] –
integram o vasto grupo de arquitetos contemporâneos que denotam, na sua prática
profissional, uma certa militância e predileção pela dialética arquitetura/lugar
proliferada pela Escola do Porto.
Tiago Pimentel licenciou-se em Arquitetura em 1998, tendo frequentado a “Technische
Universiteit Delft” [TUDelft], na Holanda, como bolseiro do programa Erasmus. Foi
colaborador do arquiteto João Álvaro Rocha, entre 1999-2002. Exercendo atividade
liberal desde 2001, é autor premiado com o 1º prémio no concurso internacional para a
conceção do Museu do Côa, em coautoria com Camilo Rebelo, que licenciou-se em
Arquitetura em 1996 e é professor na FAUP desde 1999, tendo sido colaborador de
Eduardo Souto de Moura, entre 1994-1998, e do Herzog & de Meuron, entre 1998/99.
Foi também professor convidado na “École Polytechnique Féderale de Lausanne”
[EPFL] entre 2008-2011, na “Escuela Técnica Superior de Arquitectura de Navarra” e
na “Accademia di Architettura di Mendrisio” entre 2011/12. Exercendo atividade liberal
desde 2000, é autor premiado com o 1º prémio no concurso internacional para a
conceção do Museu do Côa em 2004, em coautoria com Tiago Pimentel, tendo sido
também distinguido com o prémio Bauwelt, em 2013, pelo mesmo projeto. Recebeu
ainda uma menção honrosa no concurso internacional para a conceção do Museu de
Arte Modena de Varsóvia, em 2007, em coautoria com a arquiteta Suzana Martins e o
3º prémio no concurso para o Museu do Carro Elétrico do Porto, em 2010.
Aquando do concurso para o Museu do Côa, os jovens arquitetos já contavam com
alguma experiência profissional na vertente museológica, com a participação conjunta
no projeto da “Nacional Contemporary Art Centre for Carlow”, em Irlanda. E no caso
particular de Tiago Pimentel, para além deste projeto, colaborou com o arquiteto João
Álvaro Rocha no projeto do Museu dos S.Firmines, em Pamplona. O arquiteto
confessa ainda que o que mais o motivou a participar no concurso para o Museu do
Côa é o facto de um museu “ser sempre um programa de exceção. Penso mesmo que
nos últimos 50 anos é um dos temas mais apetecidos por todos os arquitetos.”
(Pimentel, 2004, p. 36).
Humberto José Barros da Silva
147
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
‘Oporto’ is not Porto Fino, Porto Novo, or Porto Santo, but simply o Porto, ‘the Harbour’.
[…] Oporto is peculiar city, comparable in many respects with Lisbon and yet entirely
different: its image is heavier, denser, darker, rife with contradictions; Nordic and
rigorous, in many ways still marked by the influence of England, its old trading partner,
and by a climate of rain and fog. Oporto is also southern and chaotic, fantastically
colourful in sunshine, particularly so after rainfall. Although, the opalescent anthracite of
granite is dominant, it serves to underline the intense colours of the green landscape,
the brick-red roofs, the blue sky and the myriad touches of other hues. The evening sun
adds a dazzing gold reflected by the many small window panes. Then the granite
gleams like black gold. The most special thing about Oporto is its particular topography,
which has necessarily led to many unusual architectural solutions with stairways, ramps
and arcade passages. […] it is Oporto as a whole, not any individual aspects of its
beauty, that make the town worth seeing. (Fleck, 1995, p. 7)
Porto é uma cidade cosmopolita, e já começara a sê-lo no final do século XIX, com um
núcleo urbano de consolidada produção industrial, que veio a definir um momento de
afirmação regional, evidenciada nos edifícios que se erguem entre a nova e aclamada
solicitude do ferro e a tradição telúrica dos materiais tradicionais. O surgimento das
pontes sobre o Douro; a Academia da Marinha e do Comércio (1807); o Palácio da
Bolsa (1880); a Escola de Belas Artes; bem como a importância do caminho-de-ferro,
com a Estação de S. Bento (1901), entre outros marcos históricos e culturais da urbe,
que selaram o compromisso da cidade com o progresso. Porto começa então a
aclamar-se como uma cidade gradualmente evoluída, atingindo atualmente um
estatuto de uma metrópole cosmopolita – turística, artística e culturalmente.
Ou simplesmente próspera, daí resultando um certo furor progressista que aclimata o
gosto pelas novas tecnologias e pelas artes associadas às novas técnicas. […] Elevado
a uma condição, o espaço geo-cultural do Porto define uma sensibilidade que na
consciência do seu estado periférico encontra o consolo da criação descomprometida.
(Figueira, 2002, p. 24).
Esta riqueza (i)material, cultural e intelectual que prolifera na cidade Invicta, torna os
arquitetos do Porto, enquanto utentes e projetistas, mais ávidos e sensíveis aos
fenómenos que os rodeiam, e como tal mais capacitados para os desafios da
profissão, o que irá, consequentemente, aprimorar a sensibilidade e o próprio instinto,
que, aliado a uma sólida formação, irão determinar o modo de criar e produzir
arquitetura. Pois segundo Muntañola “um corpo presentativo, tanto emotivo, sensitivo
e motor, está na origem das habilidades do corpo como arquiteto, tanto enquanto
intenção como enquanto estímulo. […] “ (Muntañola, 1979, p. 21)
Instalados pessoal e profissionalmente no seio cultural da cidade Invicta, esta dupla de
arquitetos provêm de um legado pedagógico intimista, de uma cultura de ensino
Humberto José Barros da Silva
148
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
escola-atelier/mestre-discípulo, que tem a sua “génese na tradição das Beaux-Arts, a
partir da qual, gradualmente, a matriz racionalista, via Bauhaus, imporá lógicas de
aprendizagem Modernas. (Figueira, 2002, p. 37)
Todavia, não é este legado racionalista que impera na práxis profissional dos
arquitetos contemporâneos formados na Escola (bem como na arquitetura
contemporânea portuguesa), mas sim um legado que promove “uma arquitetura do
contexto”, que Távora impulsionou (ainda sob as diretrizes do modernismo, tendo a
produção arquitetónica tradicional como referência) e Siza vieira e Souto deram
continuidade, estabelecendo a ponte para o que se reconhece hoje como uma
arquitetura contemporânea portuguesa vinculada ao lugar. Um vínculo que se
estabelece a partir do “Problema da Casa Portuguesa”, que viria a determinar a
realização do Inquérito à Arquitetura Popular em Portugal, cuja adaptação à uma
realidade vigente foi veiculada, inicialmente, por Távora, como resposta à crise de
identidade que assolava a cultura arquitetónica portuguesa em pleno fulgor
modernista. E que Távora, de forma visionária, considerou oportuno reavaliar, para
depois se ajustar às premissas de uma arquitetura portuguesa que se quer moderna (e
contemporânea) mas identitária. “Este tipo de preocupações são redimensionados por
Távora, ao longo dos anos 50, num plano que se divide entre a apologia do Moderno e
um processo de encontrar o lugar [...] “ (Figueira, 2002, p. 44). É a dialética
arquitetura/lugar o legado da Escola do Porto patente nos projetos apresentados na
presente investigação, bem como na arquitetura contemporânea portuguesa, de um
modo geral.
Para lá de todas as conclusões que se poderão tirar do Inquérito será nesta espantosa
e procurada coincidência que a Escola do Porto vai encontrar o seu húmus: a
racionalidade espontânea da arquitetura popular em consonância com a erudição do
programa racionalista. (Figueira, 2002, p. 49)
Esta dialética entre a arquitetura, o homem e o seu espaço físico e cultural, é bem
evidente na práxis desta dupla de arquitetos, que demonstraram todo o seu fulgor no
projeto do Museu. E note-se a tenra idade (31 e 32 anos) que tinham aquando do
concurso, ou seja, a formação académica estava atuar no seu estado embrionário mas
simultaneamente com uma carga de influência da “Escola” muito recente, e como tal
muito intensa, o que proporcionou aquela leitura peculiar do território, originando um
objeto arquitetónico à imagem do seu contexto histórico-geográfico.
Humberto José Barros da Silva
149
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
[…] qualquer abordagem ao meio ambiente construído pelo homem, seja através do
edifício isolado, seja através de um conjunto de edifícios que dão consistência a um
determinado espaço, seja Bairro ou cidade, deve também considerar as inserções
culturais do indivíduo, isto é, é essencial avaliar a dimensão cultural e antropológica de
toda esta problemática. Este facto torna-se importante, porque a perceção que o
homem tem do mundo à sua volta, depende em grande parte da cultura a que
pertence, e de tudo o que lhe está intrinsecamente associado, e isso vai posteriormente
traduzir-se nos seus modos de sentir, de atuar e, consequentemente, de criar. (Mariz,
2010, p. 21)
Esta abordagem conceptual ao projeto do Museu revela, além do talento dos autores,
a carga pedagógica desta visão romântica da arquitetura proclamada pelos mestres,
que é transmitida aos arquitetos formados na Escola do Porto, e assimilada por esta
dupla de arquitetos, que se apropriaram dela como ferramenta projetual para
descodificar e elaborar uma proposta surpreendente para a conceção do museu, que
denota uma carga simbólica transversal a todos aspetos a que reporta enquanto
estrutura museológica, quer pela analogia ao território, quer pela referência históricogeográfica que alberga enquanto suporte expositivo.
A Escola do Porto é vista como uma instituição onde os melhores arquitetos davam
aulas e de onde partem, e regressam, as mais consistentes experiências
arquitetónicas. A relação atelier-escola/mestre-discípulo incute, assim, aos alunos uma
maior consciência da prática e contingências da profissão, e essa aproximação acaba
por estabelecer reflexões comuns (entre mestre-discípulo) de abordagem aos projetos,
cuja solução arquitetónica encontra-se nas contingências do lugar.
Camilo Rebelo, por exemplo, colaborou Souto Moura (1997/98) e posteriormente com
Herzog & de Meuron44 (1998/99). E estes dois arquitetos estabelecem, nos seus
projetos, uma relação forte com o território, notabilizado pelo uso expressivo dos
44
Herzog & de Meuron é uma dupla de arquitetos suíços, nascido da cidade de Basel, em 1950.
Licenciaram-se em arquitetura em 1975 na “Swiss Federal Institute of Technology” [ETH Zürich],
orientados pelos professores Aldo Rossi e o suíço Dolf Schnebli, tendo sido convidados, em 1977, a
trabalhar como assistentes do professor suíço. Decididos a estabelecerem-se na sua cidade de origem,
iniciam atividade liberal em 1978, fundando o seu próprio atelier nas margens do rio Rhein. Em 1994 são
convidados a lecionar na Universidade de Harvard e a partir de 1999 lecionam na ETH Zürich e na ETH
Studio Basel (Instituto de Pesquisa e Transformação Urbana, integrado no Instituto Federal de Tecnologia
de Zurique e liderado pela dupla helvética). Em 2001 viriam a ser distinguidos com prémio de arquitetura
Pritzker. Da vasta obra da dupla helvética destacam-se dois projetos que evidenciam esta relação
[matérica] entre a arquitetura e o lugar: A torre de controlo ferroviário “Signal Box Auf dem Wolf”, em
Basel, Suíça, realizado entre 1991-94, que incorpora na sua pele de cobre distorcida a aparência (em
termos de cromáticos e tectónicos) dos carris ferroviários, fundando-se deste modo o edifício no seu
contexto; e a adega “Dominus Winery”, em Yountville, na California, EUA, realizado entre 1996-98.
Situada num vasto contexto paisagístico de propriedades vinícolas de Napa Valley, o edifício, com o seu
corpo de gabião, estabelece uma integração paisagística particular com estrutura geométrica as vinhas.
Humberto José Barros da Silva
150
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
materiais, na procura incessante de expressões construtivas que coadunem com as
contingências do território e com os próprios requisitos programáticos.
A abordagem ao território como ponto de partida do projeto é uma estratégia bem
evidente na obra de Camilo Rebelo, se observarmos os projetos da Ktima house e
Tree house, na Grécia, em que as casas se encontram encastradas no terreno,
adaptando-se à sua morfologia, e redesenhando os seus limites no aclamado
contraste entre a cambiância dos tons áridos e verdejantes do território e as
superfícies reluzentes (do branco caiado, típico das construções gregas) da nova
silhueta (habitável) imposta ao terreno. Ou ainda o projeto para o Museu de Arte
Moderna de Varsóvia, em que o edifício estabelece uma relação de continuidade com
o maciço arbóreo do quarteirão adjacente.
Ilustração 158 - Museu de Arte Moderna de Varsóvia, Polónia – A relação com o maciço arbóreo. (Rebelo, 2015)
Ilustração 159 - Ktima House, Grécia – Fachada e planta de implantação. (Rebelo, 2015)
Humberto José Barros da Silva
151
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 160 –Tree House, Pigadakia, Grécia (Rebelo, 2015)
“Os arquitetos transformam os sítios que lhe são dados noutros sítios que se
expressam por novos modos de habitar aqueles sítios. Transformam poeticamente os
sítios em outros que se lhe assemelham.” (Hipólito, 2011, p. 39). É este princípio que
orienta o trabalho deste arquiteto, que deixa sempre uma marca e um gesto indelével
no território, gerindo de forma equilibrada o protagonismo da arquitetura no seu
contexto, porque académica e culturalmente é este diálogo poético que sempre
estabeleceu com os sítios que lhe advém do espírito e do seu espaço de formação
(Escola e cidade do Porto) enquanto utente e projetista.
Neste sentido, “ […] uma parte da existência do homem é alimentada por pulsões que
lhe chegam do mais profundo do seu ser, desta zona que se chamou o inconsciente.”
(Hall, A Dimensão Oculta, Lisboa, 1986, p. 12). Um inconsciente que lhe induz modos
próprios e intuitivos de ação, mas que ao mesmo tempo encontra-se intimamente
ligado aos seus padrões culturais e percetivos, como reforça Zumthor, quando refere
que:
As raízes do nosso entendimento arquitetónico encontram-se nas nossas primeiras
vivências: o nosso quarto, a nossa casa, a nossa rua, a nossa aldeia, a nossa cidade, a
nossa paisagem – cedo as experimentamos de forma inconsciente, e mais tarde as
comparamos com as paisagens, cidades e casas que se vieram juntar. As raízes do
nosso entendimento arquitetónico encontram-se na nossa infância, na nossa juventude:
encontram-se na nossa biografia. (Zumthor, 2009, p. 65)
Assim verificar-se-á na práxis destes arquitetos ações resultantes de experiências e
atitudes culturais, sentimentos e pensamentos que irão traduzir-se num modo de
intervir direcionado para o lugar, porque é a partir do território que as soluções
arquitetónicas encontram (ou devem encontrar) as suas formas. Porque a formação
académica e cultural assim os induziram e seduziram. Esta identificação ou
Humberto José Barros da Silva
152
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
autorreconhecimento de um de lugar em outro que nos é íntimo durante o processo
criativo é explicado por Schulz da seguinte forma:
Identificação significa, para os fins desta análise, ter uma relação amistosa com
determinado ambiente. […] O que queremos dizer é que o ambiente é vivido como
portador de um significado. Em que os objetos de identificação são propriedades
concretas do ambiente e que as pessoas geralmente desenvolvem relações com elas
durante a infância. [...] Os sistemas percetuais compõem-se de estruturas universais,
inter-humanas, e também de estruturas condicionadas pela cultura e determinadas pelo
lugar. […] Nós entendemos que a identidade das pessoas é, em boa medida, uma
função dos lugares e das coisas. […] A identidade humana pressupõe a identidade do
lugar. (Schulz, Nesbitt, 2008, p. 456/457)
É portanto a exaltação e preservação da identidade do lugar (físico e cultural) o legado
da Escola do Porto, transmitida a esta dupla de arquitetos, que revelam no seu
trabalho uma certa militância desta crença no lugar. Uma crença partilhada entretanto
pelos restantes elementos da classe formados na Escola, bem como pela arquitetura
contemporânea portuguesa, de um modo geral, como se evidenciou nos diversos
projetos aqui apresentados. A necessidade de uma produção arquitetónica vinculada
ao seu contexto é de extrema importância para instaurar uma certa ordem espacial ao
território, de forma a dar continuidade ou mesmo preservar situações territoriais
previamente consolidadas. Pois segundo Távora, é a partir das circunstâncias préexistentes que se afirma a obra.
O arquiteto, “pela sua profissão, é por excelência um criador de formas, um
organizador do espaço; mas as formas que cria, os espaços que organiza, mantendo
relações com a circunstância, criam circunstância […] E da circunstância deverá ele
contrair os aspetos negativos e valorizar os aspetos positivos, o que significa, afinal,
educar e colaborar. E colaborará e educará também com a sua obra realizada. A sua
posição será, portanto, de permanente aluno e de permanente educador […] “ (Távora,
1996, p. 73/74)
Humberto José Barros da Silva
153
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
3.2. O TERRITÓRIO
–
Ilustração 161
Enquadramento
geográfico da região que integra o Plano
Estratégico de Promoção Turística do
Vale do Côa e Alto Douro. (Arte-coa,
2015)
Ilustração 162 – Vale do Côa. (Ilustração nossa, 2015)
O vale do Côa enquadra-se numa região compreendida entre o Alto Douro e a Beira
Alta, e é constituída por 10 conselhos que integram o Plano Estratégico de Promoção
Turística do Vale do Côa e Alto Douro. Situa-se num conjunto de montanhas a
nordeste de Portugal, nas imediações da Vila Nova de Foz Côa, no distrito da Guarda.
É uma região de extensos olivais sobre solos predominantemente xistosos, banhado
pelo rio Douro e Côa. Este último encerra, ao longo do vale, um expressivo ciclo
artístico, de cronologia pré-histórica, moderna e até contemporânea, predominando,
nos últimos dezassete quilómetros do seu leito, centenas de gravuras do Paleolítico
Superior.
Ao longo de milénios, os rochedos de xisto, que delimitam o seu leito, foram-se
convertendo em painéis de expressão artística, com milhares de gravuras legadas
pelo impulso criador dos nossos antepassados, que por aqui passaram durante as
suas longas cruzadas de vida itinerante (nómada). Remontando ao seu período
artístico mais remoto, estas gravuras ao ar livre e os habitats identificados são na sua
maioria datadas do período do Paleolítico Superior, embora alguns achados
arqueológicos denotem vestígios do período neolítico, Calcolítico, Idade do Ferro,
Gravetto-Solutrense, Magdalenense, Tardiglaciar e ainda vestígios de representações
Humberto José Barros da Silva
154
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
religiosas da Época Moderna e contemporânea, altura em que os últimos gravadores
do Côa abandonaram o fundo do vale.
Ilustração 163 – Arte do séc. XVI-XX (Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 164 – Arte da Idade do Ferro – 1º milénio AC
(Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 165 – Arte Magdalenense e Tradiglaciar 15.0009.000 AC. (Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 166 – Arte do Período Gravetto-Solutrense 30.00015.000 AC (Ilustração nossa, 2015)
O Vale do Côa, com a descoberta das gravuras, tornou-se uma autêntico “recetáculo
de arte” ao livre, como elucida o arquiteto Camilo Rebelo (coautor do projeto do Museu
do Côa), na sua abordagem conceptual ao projeto, designando as gravuras rupestres
como sendo a primeira forma de Land art (arte da terra) da história da Humanidade –
uma perspetiva que o levou a conceber o Museu enquanto “instalação na paisagem”,
evocando as pedreiras locais de xisto, suporte artístico das gravuras rupestres. Com
as sucessivas descobertas arqueológicas de novos núcleos e gravuras, foi necessário
delimitar uma área territorial (e administrativa, gerida pela Fundação Côa Parque) que
circunscrevesse todo o conjunto artístico, que designou-se Parque Arqueológico do
Humberto José Barros da Silva
155
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Vale do Côa (PAVC). Mas atualmente os limites geográficos dos achados
arqueológicos circunscritos ao Parque expandiram-se para fora da área delimitada
pelo mesmo, isto devido ao aprofundamento das investigações arqueológicas na
região, desde a criação do PAVC, em 1996, que fez expandir o espaço geográfico que
abrange os ciclos rupestres existentes no Vale do Côa.
A ênfase na preservação não apenas das gravuras paleolíticas recentemente
descobertas mas de toda a paisagem do Côa pode ser assim compreendida como uma
estratégia que visa o controlo do território onde se inserem os achados arqueológicos.
A simples conservação dos núcleos de gravuras rupestres não conferiria àqueles que
se envolvessem nesse processo o direito de definirem as regras de apropriação e
organização do território onde tais núcleos se inserem. Só a preservação da paisagem
no seu conjunto, enquadrada pela figura legislativa de um parque arqueológico, poderia
conferir esse direito.” (Xavier, 2000, p. 115 e116)
Ilustração 167 - Mapa do Parque Arqueológico do Vale do Côa (Ilustração nossa, 2015)
Humberto José Barros da Silva
156
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O PAVC foi implementado após a Resolução do Conselho de Ministros nº 42/96 de 22
de Março, tornando-se um organismo público e serviço dependente do Instituto
Português de Arqueologia (IPA), sob a tutela do Ministério da Cultura. Tem como
objetivo gerar investimento e riqueza, assim como a função de gerir e preservar todo o
conjunto paisagístico do Côa, bem como organizar visitas públicas aos achados
arqueológicos daquela que é considerada atualmente a maior reserva de arte rupestre
a céu aberto até hoje conhecida. Aqui foram identificados 28 núcleos de arte rupestre,
ao longo dos últimos dezassete quilómetros do rio Côa, até à sua confluência com o
Douro.
Estes núcleos contêm gravuras datadas, na sua maioria, do Paleolítico superior,
testemunhando a mais antiga expressão de arte do mundo, com cerca de 30.000 anos
de existência. Para além das gravuras paleolíticas, estes núcleos também
apresentam, como já foi dito, vestígios de pinturas e gravuras do período Neolítico e
Calcolítico, e ainda gravuras da Idade do Ferro e até mais recentes, do séc. XVII ao
séc. XX.
A Canada do Inferno foi o primeiro sítio a ser identificado com arte paleolítica no Vale
do Côa, contendo 46 rochas distribuídas pelas vertentes dos vales, na margem
esquerda do rio Côa. Para além do paleolítico superior, este sítio possui, ainda que em
menor número, gravuras de cronologia moderna e contemporânea. Estas últimas
encontram-se, na sua maioria, submersas nas águas da albufeira da Barragem do
Pocinho.
Ilustração 168 - Vista nascente da Canada do Inferno: gravuras rupestres junto ao leito do rio Côa (Ilustração nossa, 2015)
Humberto José Barros da Silva
157
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 169 - Canada do Inferno: réplica da rocha 11 (Ilustração nossa, 2015)
As investigações arqueológicas realizadas nos últimos anos no Vale do Côa
demonstram que existiu em tempos, no Paleolítico Superior, grupos humanos
instalados em acampamentos no fundo do vale ou nas zonas planálticas (onde se
instalavam durante o período de caça).
Estes caçadores paleolíticos acabariam por perceber que os planaltos eram os sítios
mais adequados para a caça de animais de grande porte, uma vez que estes teriam
que vir em busca da água resultante do degelo primaveril das camadas de neve que
acumulavam nestas paisagens durante o inverno. Daí que os vestígios arqueológicos
encontrados apontem para a existência de antigos acampamentos nas áreas elevadas
dos planaltos, revelando um tipo de ocupação orientado para a caça.
Para além destes acampamentos que evidenciam uma passagem célere pelas zonas
planálticas, as escavações arqueológicas viriam a revelar uma dualidade (de
permanência e transição) na ocupação do território do Côa, ao descobrir vestígios de
estadias mais prolongadas no fundo do vale, do que nos planaltos. Estes
assentamentos tinham um caráter mais permanente, revelado pelos vestígios do
quotidiano do caçador paleolítico, durante a sua passagem pelo Vale do Côa.
Humberto José Barros da Silva
158
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 170 - Réplica do quotidiano de um caçador paleolítico no seu acampamento no Vale do Côa. (Ilustração nossa, 2015)
É no longo período do Paleolítico que o Homem começa a relacionar-se com o
ambiente de forna estratégica, caso contrário perecia na incapacidade da sua
adaptação ao mesmo. A capacidade de interagir com o meio e de modificá-lo veio a
depender das suas transformações anatómicas e fisiológicas ao longo do tempo, que
lhe foram sendo úteis para se adaptar às vicissitudes do ambiente em constante
transformação. Esta capacidade de adaptação torna-se o fator dominante da condição
humana, possibilitando a adaptação e evolução civilizacional no tempo e no espaço.
Sendo a arquitetura um produto de intenções materializadas sobre o ambiente físico,
pode-se remeter a origem do seu processo operativo e as contingências da sua
relação com o território à condição existencial do Homem no seu estado primitivo, que,
enquanto nómada (coletor e caçador), projeta mental e graficamente as suas ações e
investidas no território, convicto de que elas poderão ser concretizadas conforme
planeado
previamente.
Esta
associação
compreende
pressupostos
como
a
capacidade mental que o Homem desenvolveu, a partir do Paleolítico, ao colocar a si
próprio e aos elementos exteriores num espaço unitário, revelando uma consciência
de si e da sua condição existencial perante situações reais do ambiente circundante.
Consequentemente, o Homem passa a adquirir capacidades que o permitem projetar
mentalmente situações passíveis de exequibilidade no território, articulando a ação
imaginada com a realidade existente. Deste processo há que salientar ainda a
capacidade de comunicação por símbolos, legando-nos graficamente (gravuras) a sua
condição existencial à data.
Humberto José Barros da Silva
159
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Historicamente, as representações simbólicas desempenharam sempre um papel
fundamental na arquitetura, que utiliza a linguagem e o desenho como veículos de
expressão do pensamento e comunicação das intenções de projeto, o que define a
arquitetura como um gesto simbólico sobre o território – uma ideia construída,
materializada e simbolizada por um corpo.
[…] a obra realizada é sobretudo legitimada a falar também da sua carga teórica,
precisamente porque vem expressa como história do próprio tempo e não apenas
como meditação prolongada do arquiteto. A obra de arquitetura torna-se uma imagem,
um signo, que é expressão dos limites, das tensões, das esperanças da coletividade.
(Botta, 1998, p. 26)
Segundo Arnheim, Hegel45 define como «simbólica» a primeira de três fases da
arquitetura, sendo a clássica e romântica as outras duas fases, sobre as quais refere o
seguinte:
As ideias expressas na arquitetura primitiva não são mais que «representações gerais,
sem forma, abstrações elementares da natureza, misturadas e separadas de maneiras
diversas, combinadas com pensamentos da realidade espiritual». […] Nas suas torres,
obeliscos e labirintos, a arquitetura primitiva, e fundamentalmente a oriental, exprime
diversas ideias sociais e religiosas. Na segunda fase, a clássica, a arquitetura grega
incorpora a função ou utilidade do edifício convertendo-se numa envoltura, um
ambiente para homens e deuses. […] na terceira fase, ou fase romântica, representada
pelo gótico cristão, a expressão combina-se com a utilidade; […] Na catedral gótica, a
utilidade, embora presente fisicamente, não está à vista, o que confere ao edifício em
conjunto um aspeto de existência independente. A utilidade prática transformou-se
naquilo que serve a devoção subjetiva da mente. (Arnheim, 1997, p. 201)
Outras das capacidades do homem do Paleolítico é a de reproduzir imagens que
evocam elementos de um dado ambiente, com o intuito de concretizar no terreno as
intenções projetadas mentalmente (gravuras rupestres). Assim como a arquitetura, na
sua ligação inevitável ao sítio, ambiciona incorporar em si os fenómenos mais
característicos que definem a qualidade ambiental da envolvente. E como estes
elementos se apresentam de forma abstrata no território, a arquitetura atribui-lhes um
corpo, uma forma concreta, que agregados ao objeto arquitetónico passam a adquirir
qualidade de imagem – a metáfora do corpo texturado do Museu do Côa enquanto
representação simbólica do xisto, suporte das gravuras rupestres.
45
Georg Friedrich Hegel (1770-1831) foi um filósofo alemão e um dos criadores do idealismo alemão,
uma corrente filosófica da década de 1780, iniciada pelo filósofo alemão Immanuel Kant, seguida por
Fichte e Schelling e consumada em Hegel, que desenvolveu uma estrutura filosófica abrangente do
Idealismo, aferindo, de um modo integrado, a relação entre mente e natureza, sujeito e objeto. Hegel tem
entre as suas principais obras a “Fenomenologia do Espírito” (1807), a “Enciclopédia das Ciências
Filosóficas” (1817) e “Princípios da Filosofia do Direito” (1820).
Humberto José Barros da Silva
160
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 171- Fachada Norte do Museu e uma réplica de um painel de xisto do Vale de José Esteves 16: A semelhança entre a cor,
textura, fragmentações e assimetrias da fachada com as da réplica. (Ilustração nossa, 2015)
Relativamente à representação imagética do real, a explicação mais aceite atualmente
sobre as pinturas e gravuras rupestres, é que essa arte era realizada por caçadores,
como processo de premonição da captura dos animais. Ou seja, o caçador (e artista)
paleolítico acreditava na consumação da caça desde que possuísse a priori a imagem
do animal ferido mortalmente, convicto que tal aconteceria na realidade se assim o
representasse graficamente. Portanto o Homem desde esse período já denotava a
capacidade de projetar mentalmente as suas ações no território, mediante um
processo de planeamento e registo antecipado dessas ações, o que se compadece
com o processo criativo em arquitetura, como refere Botta46:
A obra de arquitetura concretiza a síntese entre o pensamento do arquiteto (ainda que
abstrato ideológico) e a realidade. Uma realidade que é antes de mais a condição
geográfica: a arquitetura transforma uma condição de natureza numa condição de
cultura. Esta transformação modifica um equilíbrio espacial existente num novo
equilíbrio. O encontro entre o mundo ideológico do pensamento, o mundo abstrato do
desenho e o mundo da realidade é também encontro com uma situação histórica, com
uma entidade cultural, com uma memória da qual o território está impregnado e que,
julgo, a arquitetura deve reler e repropor através de novas interpretações, como
testemunho das aspirações, das tensões, das vontades de mudança do nosso tempo.
(Botta, 1998, p. 25)
46
Mário Botta (1943) é um arquiteto e designer suíço nascido em Mendrisio (Cantão Italiano) e formado
em Milão pelo Instituto Universitário di Architecttura de Veneza. Foi colaborador dos arquitetos Le
Corbusier e Louis Kahn, tendo iniciado atividade liberal em 1970, em Lugano, Suíça. De tendência
modernista, foi claramente influenciado por Kahn e Carlo Scarpa (que foi seu professor). A sua obra
caracteriza-se pelo rigor geométrico das suas formas e pela conjugação dos valores da arquitetura
tradicional com as diretrizes do movimento moderno, o que se irá traduzir-se numa arquitetura que
privilegia o tijolo aparente e a pedra, conjugados como formas geométricas que se assemelham a
grandes monumentos na paisagem. O excerto acima refere-se ao seu ensaio “Ética de Construir” (1998).
Humberto José Barros da Silva
161
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
3.3. O MUSEU
Do contexto histórico do projeto
A intenção de construir um museu dedicado à arte rupestre do Vale do Côa
formalizou-se após a criação do Parque Arqueológico do Vale do Côa (PAVC),
inaugurado a 10 de Agosto de 1996, seguida, em 1997, pela candidatura da arte
rupestre do Vale do Côa a Património da Humanidade, classificação atribuída pela
Unesco em 1998. Este marco histórico na cultura portuguesa despertou o Ministério da
Cultura para a necessidade de salvaguarda e valorização deste legado históricoartístico, bem como a sua difusão cultural, que decidiu então avançar com a ideia da
construção de um museu que preservasse esta memória artística.
O processo para a construção do Museu foi iniciado em 1998, tendo sido realizado o
primeiro contrato em 29 de Dezembro de 1999, durante o mandato do ex-Ministro Dr.
Manuel Maria Carrilho. Nesta primeira fase, ainda sob a acesa polémica do Côa47 –
gravuras versus barragem –, elaborou-se um projeto de proporções gigantescas, cuja
implantação seria na encosta norte da abandonada barragem do Côa, nas imediações
dos achados arqueológicos da Canada do Inferno e do Rego da Vide. A sua versão
consolidada contava com uma área coberta de 14.000 m2, dos quais cerca de 1.900
seriam dedicadas às salas de exposição permanente. Era um projeto integrado, que
pretendia englobar a Canada do Inferno na sua estrutura, tornando acessível a visita,
in loco, de todas as gravuras.
A evolução desta primeira fase decorreu ao longo do mandato de três Ministros da
Cultura, mas entretanto este ambicioso projeto viria a ser abandonado em 2002,
devido às alterações governamentais, que levaram a sucessivas reavaliações do seu
programa e dimensão, numa altura em que o projeto de arquitetura já se encontrava
na fase de aprovação do Estudo Prévio.
47
Entre 1994 e 1995, desenvolveu-se uma campanha para a preservação do património arqueológico do
Vale do Côa, em detrimento da suspensão das obras de construção da barragem do Foz Côa, pela EDPPorto, que, de modo a salvaguardar o que já havia investido na construção da barragem, sugeriu (na
“Audiência Pública”, realizada em Vila Nova de Foz Côa, no dia 11 de Novembro de 1991) que se
retirassem os achados arqueológicos da zona de conflito, para que não fossem inundados, admitindo,
ainda que de forma dúbia, “ser a sua obrigação preservar a memória […] dos vestígios arqueológicos
situados na área a submergir, o que se fará mediante o seu levantamento documental ou transladação
dos elementos mais importantes […] ”. Mas para os arqueólogos não se tratava apenas de salvaguardar
as gravuras rupestres, e sim todo o conjunto paisagístico onde se inserem, como refere o arqueólogo
Vítor Oliveira Jorge: “ […] o monumento a preservar era o vale […] e não cada conjunto de gravações per
si. Painéis com gravuras e sem gravuras, acidentes de terreno, cursos de água, toda a geomorfologia do
vale são, em suma, neste caso, a verdadeira valência cultural […] ” (Jorge, 1995, p. 365)
Humberto José Barros da Silva
162
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Na segunda fase do empreendimento, após a visita ao Parque Arqueológico, no final
de 2002, o então Ministro da Cultura, Dr. Pedro Roseta e o Ministro do Ambiente e do
Ordenamento do Território, Dr. Isaltino de Morais, rescindiram o anterior contrato,
optando por um novo local para a construção do Museu, que só poderia ser definido
mediante parecer do IPA e do IPM. E após a apresentação do relatório do Instituto
Português de Arqueologia [IPA] e do Instituto Português de Museus [IPM], o sítio
escolhido recaiu numa encosta junto à margem esquerda do Rio Douro, ao cimo da
foz do Rio Côa, na zona norte do Parque Arqueológico – um local com um amplo
horizonte visual sobre a paisagem do Douro, aspeto que viria a ser preponderante na
implantação do Museu, que na sua condição de “instalação na paisagem”, assume-se
com um autêntico miradouro suspenso sobre os vales do Douro.
Ilustração 172 – Museu do Côa – A cobertura enquanto miradouro, imagem 3D do concurso. (Seabra, 2004, p. 30)
Após a definição do sítio de intervenção, o IPA foi encarregue de promover as ações
necessárias para o concurso e para as expropriações dos terrenos, desenvolvendo
todo o processo em colaboração com o IPM, a Ordem dos Arquitetos [AO] e Câmara
Municipal de Vila Nova de Foz Côa [CMVNFC]. De seguida procedeu à revisão do
programa museológico, cadernos de encargos, minuta do contrato de projeto, imagens
e levantamento topográfico. Esta revisão teve a colaboração do IPM, do Museu
Nacional de Arqueologia (MNA), do Centro Nacional de Arte Rupestre [CNART] e do
Parque Arqueológico do Vale do Côa [PAVC].
Este projeto foi concebido no âmbito de um concurso público lançado, em Novembro
de 2003, pelo Ministério da Cultura em colaboração com a Ordem dos Arquitetos,
Humberto José Barros da Silva
163
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
tendo sido reconhecido com o 1º prémio, de entre as 37 propostas, por ser “uma peça
de arquitetura de cariz escultórico e emblemático, assumidamente contemporâneo e
acrescentando mais-valias à paisagem” (relatório final do júri do concurso, Seabra,
2004, p. 30).
Para uma paisagem com valor cultural de exceção, onde a coexistência de dois
“Patrimónios da Humanidade” – O Douro Vinhateiro e a Arte Rupestre do Vale do Côa
– é uma realidade, era imperativo a conceção de um edifício de qualidade, que fosse
ao encontro de tal excecionalidade.
O projeto apresenta uma organização muito compacta, uma figura forte […]
extraordinária e carismática. Uma inventiva e adequada resposta à integração na
envolvente. O acesso revela-se bem pensado, introduzindo um compasso de espera
entre a chegada, com uma noção clara da paisagem e da envolvente, e a descida ao
espaço do museu. Os conceitos utilizados na memória descritiva são notáveis e
reveladores da consciência da proposta. Os espaços expositivos estão bem
organizados e o acesso aos serviços bem resolvido. A estrutura funcional apresenta-se
adequada às exigências expressas no programa de intervenção, tendo contudo alguns
aspetos que requerem maior reflexão. A solução demonstra flexibilidade evolutiva. Boa
exequibilidade da solução, à luz dos atuais modos de construção. (Seabra, 2004, p.
30/31)
Ilustração 173 – Fachada sul – Imagem 3D do concurso, perspetivando-se uma forte fisionomia visual do corpo projetado sobre a
encosta, (Seabra, 2004, p. 33)
Humberto José Barros da Silva
164
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Segundo o júri, a qualidade da solução arquitetónica preconizada compreendia as
seguintes componentes: “Adequabilidade ao programa de intervenção, integração na
envolvente, estrutura funcional, flexibilidade intrínseca da solução e exequibilidade da
solução”. Estas componentes deram resposta e fundamento aos temas mais
relevantes que marcaram o debate em torno de todas a soluções apresentadas no
concurso, entre as quais: “A relação do construído com a paisagem e com o território,
com destaque para as questões da escala e perceção; a relação dos acessos e
estacionamento com o edifício, o território e a paisagem; o equilíbrio e flexibilidade das
áreas expositivas, abordagem do programa funcional, a otimização de funcionamento
e manutenção, e a facilidade de execução técnica e financeira”.
Da obra: A metáfora como motor de criação
A relação entre racionalidade e sensibilidade, aplicadas à concretização da ideia de um
autor, tem um sistema operativo sobejamente testado no campo criativo ao longo do
séc. XX, a partir do momento em que a produção artística deixa de representar
figurativamente a realidade, para passar a integrar o modo particular como o artista vê
essa realidade. O resultado final acrescenta ao mundo a realidade transformada pela
sensibilidade do autor. […] A dificuldade acrescida na descodificação do processo
passa a depender da metáfora, como motor de criação. (Hipólito, 2011, p. 7)
O museu arqueológico do Foz Côa, na sua condição de “instalação na paisagem”,
assume-se como um paradigma do território enquanto matéria construtiva, na medida
em que incorpora, em si, a matéria tectónica e histórico-geográfica da paisagem em
que se insere. Deste modo, o edifício pretende manter uma continuidade cromática e
tectónica com o território, ajustando-se às suas constantes permutações de aparência.
A ideia prevalece, assim, sob a forma de uma massa híbrida, produto de uma fusão
entre a textura e pigmento do xisto (matéria geológica do território e suporte artístico
da gravuras rupestres), que significa contexto e organicidade; e as características
plásticas e tectónicas do betão, pela sua capacidade de integração na paisagem, bem
como pela sua abundância e retórica construtiva nas paisagens do Douro.
Procurando a continuidade cromática da paisagem, optámos por uma expressão
produzida por betão com adição de pigmento, semelhante à cor do xisto (matéria
abundante no local), resultando numa massa híbrida com textura (obtida por moldes
feitos sobre as rochas locais). (Rebelo e Pimentel, 2010)
Humberto José Barros da Silva
165
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 174 – A massa híbrida de betão com textura e pigmento do xisto. (Ilustração nossa, 2015)
Na sua dimensão tipológica, enquanto metáfora corpórea de uma matéria geológica
autêntica (xisto), as qualidades tectónicas do betão tornaram-no o material mais lógico
para expressão conceptual da obra, resultando um museu construído pelo (e para)
território, numa coerência de escala, forma e matéria, que procura estabelecer um
diálogo entre natural/artificial que não desvirtue, mas complemente e enalteça a
condição preexistente.
Quanto à composição do betão (na sua aparência pigmentada lisa ou com relevo), as
especificações técnicas do projeto de estruturas referem que os pigmentos a utilizar
deverão ser inorgânicos resistentes aos raios ultravioletas, para que se conserve no
tempo as cores do xisto impressas no betão, nos tons castanho, amarelo e verde.
Para se atingir os tons necessários, a quantidade de pigmento teve que variar entre
0,2% e 5% do peso do cimento, tendo a mistura dos inertes condicionado a sua
dosagem, pelo que foi necessário um processo de experimentação até se atingir a
coloração pretendida.
Em termos percetivos, esta coloração tripartida dos tons do xisto atribuiu ao betão uma
capacidade notável de transmutação das suas superfícies em função das variações
cromáticas do ambiente ao longo do dia e sazonalmente, e ainda consoante o ângulo
e distância do observador. “A sua perceção é uma realidade mutável, consequência da
sua materialidade. A sua observação é possível de vários ângulos, mas também de
distâncias variáveis, surgindo como um monólito de xisto de diferentes expressões […]
” (Rebelo e Pimentel, 2010)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 175 – A constante permutação das superfícies cambiantes de betão ao longo do dia. (Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 176 – Enquadramento do edifício na paisagem – Vista da fachada sul. Note-se a presença enigmática do corpo monolítico
sobre a encosta. (Cortesia de Rebelo e Pimentel, 2015)
Por una parte, la arquitetctura transforma (imita) la natureza gracias a su capacidad
constructiva, por outra parte, transforma (imita) el «habitat» social, gracias a su
capacidad de «habitabilidade». Finalmente, y aquí radica la doble mimesis, el objeto
arquitectónico «imita la doble imitación» a través de una transformación exteriorizada
de segundo grado y «mimetiza» lo construído en lo habitado, y lo habitado en lo
construído. (Muntañola, 1981, p. 57)
Distante, o edifício funde-se com a paisagem, assemelhando-se a uma formação
rochosa – lapidada na encosta pelos processos naturais de erosão do solo –, que
revela o caráter habitável do seu corpo pelas frestas de diferentes calibres que
dinamizam as fachadas e acentuam o caráter enigmático da sua presença isolada na
Humberto José Barros da Silva
167
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
imensidão da paisagem. Mas à medida que o olhar se aproxima do corpo estranho,
mas não menos interessante, este começa a revelar-se tangível na sua forma
compacta – um edifício cuja função é albergar um espaço museológico, não
necessitando por isso de grandes aberturas nas fachadas, de modo a não retirar
protagonismo aos artefactos expostos. Neste sentido, […] “a forma é a configuração
que torna visível um conteúdo, e talvez aconteça mesmo que esse conteúdo em si não
seja visível em absoluto.” (Arnheim, 1997, p. 350)
Relativamente ao processo construtivo, o edifício é constituído por uma estrutura de
betão maciço (liso no interior e com relevo no contorno exterior), com algumas lajes
mistas. As fachadas apresentam-se em betão aparente pigmentado, com relevo, e as
zonas não transitáveis da cobertura são capeadas com placas de betão prefabricadas
com a mesma superfície, pigmentada com relevo.
Ilustração 177 – O capeamento da cobertura com as placas
prefabricadas. (GOP, 2015)
Ilustração 178 – Aspeto final das placas montadas e a
diferença entre as superfícies texturadas dos contornos
exteriores e as lisas do interior (rampa de acesso ao interior
do museu), demarcando claramente o limite entre um
ambiente mais agreste e natural e outro mais sensível e
humanizado. (Ilustração nossa, 2015)
Para obtenção de relevo semelhante à textura do xisto, os painéis de cofragem foram
revestidos com moldes em polímero (silicone), por ser um material mais sensível e por
isso mais eficaz na obtenção de um relevo mais verosímil, que se estende
verticalmente pelas superfícies das fachadas. Como a execução destes moldes tinha
custos elevados, por uma economia de meios, encomendou-se um número restrito de
moldes (devido a elevada capacidade de reutilização dos mesmos) e definiu-se uma
área de aproximadamente 120 m2 de montagem alternada dos mesmos, que divididos
em painéis de 60, 90 e 120 cm, foram sendo repetidamente (des)montados durante
toda a obra. Esta alternância intencional da ordem e posicionamento dos painéis,
Humberto José Barros da Silva
168
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
definidos no projeto de arquitetura, originou uma estereotomia assimétrica, que
conferiu dinâmica e um certo cunho regional às fachadas, que parecem ter sido
montadas com placas de xisto extraídas do próprio terreno, à semelhança das
construções tradicionais.
O museu, na sua condição de instalação na paisagem, procura ainda estabelecer um
diálogo com a encosta onde se insere, conferindo-lhe uma nova topografia e silhueta,
cuja forma triangular resulta da confluência dos vales (do Forno e de José Esteves).
Da fisionomia visual desta dialética resulta um corpo monolítico lapidado na própria
encosta, ajustando-se à sua forma triangular, como a pedra ajusta-se às mãos de um
escultor. Segundo Muntañola, “el poder de una imagen cualquiera y su capacidad
«analógica», o de semblanza, se apoya en su grado y en cualidad «de isotopia». […]
Muntañola, 1981, p.65). Neste sentido, a forte imagem é, também, potenciada pela
sua condição de promontório sobre a paisagem, cuja materialidade procura
harmonizar o gesto com a própria paisagem, que dela não se poderá desvincular.
Num museu situado numa encosta da Foz do Côa parece ser importante o sentido
afirmativo do seu corpo, quer na leitura da sua relação com a paisagem, quer quanto à
sua natureza tipológica, que deve ser formalizada enquanto massa física, não deixando
quaisquer ambiguidades e equívocos quanto à sua localização. (Rebelo e Pimentel,
memória descritiva, 2010).
Ilustração 179 – Localização do Museu na confluência dos vales. (Cortesia dos arquitetos Camilo Rebelo e Tiago Pimentel, 2015)
Ainda quanto à sua natureza tipológica, enquanto monólito habitável, o museu
manifesta-se como sendo mais uma expressão artística da paisagem do Côa, à
semelhança do vasto conjunto artístico do Vale, agregando, deste modo, a sua história
Humberto José Barros da Silva
169
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
à do lugar. Uma história e um lugar que, segundo os arquitetos, fundamentam o
conceito de todo o projeto, ao referirem-se à arte rupestre, que qualifica de forma
única as margens do rio Côa, como sendo, provavelmente, “a primeira forma de Land
art da história da Humanidade” – esta condição revelou-se desde logo o motor
conceptual do projeto.
A land art caracteriza-se genericamente de duas formas distintas. Na primeira, a
condição de intervenção na paisagem é executada com elementos naturais,
promovendo continuidade, onde a geometria de caráter abstrato se impõe, destacando
a intervenção. Na segunda, a estratégia é a de trabalhar um corpo, desenhado
especificamente para um lugar, promovendo um diálogo íntimo entre artificial/natural e
aumentando deste modo a complexidade temática da composição do mesmo. O
território sugere neste caso uma dupla leitura, pois é o suporte natural da paisagem,
com que se pretende intervir e dialogar, mas também é consequência da intervenção
do homem numa natureza modelada, enfatizando a condição artificial.” (Amaral, 2004,
p. 37)
Neste movimento artístico, surgido nos Estados unidos no final dos anos 60, que
propôs elaborar obras de arte a partir da natureza e do território, as intervenções
relacionam-se em regra com as características dos locais onde a obra é construída,
tais como a ocupação do solo, materiais geológicos ou características climáticas, em
que a matéria-base é próprio território, onde a paisagem surge como meio operativo.
Os primeiros materiais a serem trabalhados pelo Homem foram a pedra e a terra, e
são os mais usados nas intervenções da land art. As culturas pré-históricas já os
utilizavam, atribuindo-lhe conotações simbólicas de imortalidade, estabilidade e
confiança. A pedra, sendo um material de escultura por excelência, assume uma
condição de elemento primordial na história da paisagem. A sua localização, forma e
características geológicas, permitem estabelecer uma relação mais próxima e íntima
entre o objeto e o seu contexto. Quanto apresentado no seu estado puro, a pedra
ganha uma carga simbólica mais adequada às intenções de fundação de uma obra no
seu contexto. Deste modo a evocação do xisto, no seu estado puro, atribui-lhe
conotações simbólicas sobre um tempo, um lugar e uma [pré]história. Esta matéria
geológica, convertida em matéria construtiva e compositiva, torna-se veículo de
expressão conceptual para um diálogo poético entre a arquitetura e o lugar. Pois a
“arquitetura, mais que intrometer-se numa paisagem, serve para explicá-la. (Hipólito,
2011, p. 37)
Humberto José Barros da Silva
170
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
A dimensão poética da arquitetura é importante, essencialmente, porque o sítio não
deverá ser utilizado como uma citação das suas evidências, mas antes como um
complexo sistema de relações que funcionam tanto conceptualmente como
figurativamente (embora na maior parte das vezes a figura esteja disfarçada de
conceito). […] A metáfora é o motor deste processo inventivo, desde a ideia difusa à
forma configurada. (Hipólito, 2011, p. 39)
Em termos programáticos, o território volta a assumir um papel determinante na
conceção do museu, pois os valores plásticos e culturais da paisagem sugeriam uma
abordagem subtil, quase de fusão com a envolvente, onde o corpo do museu assume
uma presença dual: Se por um lado, à chegada, ele é visualmente inexistente,
assumindo uma condição de plataforma de fruição (estacionamento, espaço de
miradouro e entrada do museu), não pretendendo interferir mas sim potenciar a
contemplação da esmagadora paisagem do Douro; por outro, assume no extremo do
seu percurso uma escala vasta, consentânea com a monumentalidade da paisagem
em que se insere, vertendo naturalmente ao longo da encosta, para revelar a sua
presença na totalidade.
Ilustração 180 - A presença (dis)simulada do museu denunciada apenas pelos muros que delimitam o perímetro de implantação
(Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 181 – Vista da fachada sul e nascente – A mudança de escala do edifício, que evolui de uma presença abstrata para um
corpo concreto. (Cortesia de Rebelo e Pimentel, 2015)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 182 - Alçado Sul - A preservação da topografia permite libertar o edifício no extremo da encosta, resolvendo
simultaneamente os acessos de serviços e proporcionando um confronto mais intenso com o vale. (Rebelo e Pimentel, 2015)
A preservação da condição natural da topografia permitiu libertar o terreno no seu
extremo, suspendendo o edifício sobre a encosta, de modo a resolver eficazmente
uma série de requisitos programáticos, entre os quais o acesso de serviço, que é
efetuado discretamente pela fachada sul, sob o corpo suspenso; o restaurante
panorâmico, que estabelece uma relação intensa com a paisagem, porque a
preservação da condição topográfica do terreno assim o permite; as áreas expositivas
e administrativas, que se encontram na parte do corpo libertado pelo terreno; e a
entrada do museu, que, aproveitando habilmente o declive natural do terreno, os
arquitetos optaram por efetuá-la no sentido descendente do terreno, através de uma
rampa/fenda que estrava o corpo em toda a sua extensão, projetando o visitante para
o interior cavernoso, onde subjaz o espaço expositivo, que se conserva silencioso, na
penumbra do tempo primitivo, cuja história pretende dar a conhecer, remetendo o
homem para o seu velho mundo há muito desaparecido.
Progressivamente envolto por planos que vão ganhando escala com o verter do
terreno, o visitante, à medida que desce a rampa, vai perdendo a paisagem de vista,
para depois contemplá-la num impulso de êxtase pela sua avassaladora presença,
que a pausa sobre o seu olhar amplificou, após o confronto com interior envolto em
escuridão. Um percurso dotado de uma presença cinematográfica notável, pela forma
como estabelece a transição entre o exterior e o interior, entre o visitante, a história e o
lugar.
Há um elemento que estrutura o corpo – a rampa que rompe a massa de forma
contínua, percorrendo todo o programa, desde a plataforma de chegada até às salas
de exposição. Esta fenda descendente conduz o utente para dentro da densa massa,
transportando-o, de modo gradual, da paisagem intensa, luminosa e infinita até à
realidade interior e escura da sala gruta, que nos remete para um tempo primitivo.
(Rebelo e Pimentel, 2010)
Humberto José Barros da Silva
172
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 183 – A penumbra da rampa de acesso ao interior do museu remete o visitante para um tempo primitivo, onde subjazem as
salas “grutas”. (Ilustração nossa, 2015)
Esta analogia à um tempo primitivo denota o cunho autóctone que o edifício
estabelece com o seu contexto histórico-geográfico, ao estabelecer um paralelo entre
as grutas (o habitat do homem primitivo e suporte da arte rupestre) e a escuridão das
salas expositivas, que nos remetem para ambientes cavernosos, palcos da arte
primitiva. Pois “Se uma peça de arquitetura apenas conta o mundano e o visionário,
sem fazer oscilar com ele o seu lugar concreto, sinto falta da ancoragem sensorial da
obra no seu lugar, do peso específico do local.” (Zumthor, 2009, p. 42)
A estratégia museológica assenta essencialmente no princípio de distinguir em
organização, materialidade e luminosidade o espaço de exposição permanente e
temporário. Deste modo a luz é utilizada como elemento de caracterização espacial,
que permite criar uma atmosfera museológica de caráter cenográfico, em que as salas
de exposição temporária representam uma atmosfera mais iluminada, erudita e
efémera, em constante mudança dos trabalhos expostos; e as salas de exposição
permanente remetem-nos para uma atmosfera mais densa e cavernosa, projetando o
visitante um tempo primitivo, que o espaço expositivo pretende dar a conhecer.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 184 – Espaço de exposição permanente – Sala expositiva "A" dedicada ao Vale do Côa como património mundial da
humanidade e o corredor de acesso às salas de exposição permanente. (Ilustração nossa, 2015)
Ilustração 185 - Sala de exposição temporária (Ilustração nossa, 2015)
O edifício é constituído por quatro pisos, a cobertura/estacionamento/miradouro,
correspondente ao piso 2; o piso 1, correspondente às áreas administrativas; o piso 0,
à área expositiva; e o piso -1 corresponde às áreas de serviço, restaurante/bar e
estacionamento privado. Espacialmente o programa encontra-se bem resolvido, a
presença das áreas administrativas não entram em conflito com a área pública de
exposição, mantendo separado os acessos às zonas de serviço e administração, esta
última denunciada apenas por frestas de diferentes calibres que seccionam a fachada
norte. A rampa é um elemento estruturante do programa, uma vez que trespassa o
edifício em toda a sua extensão, separando a zona administrativa da expositiva,
articulando, a partir desta diferenciação, todo o espaço museológico, desde a
plataforma de chegada ao espaço do lobby, encerrando o percurso nas salas de
exposição.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 186 - Planta Piso 0 - área expositiva: 01- Acesso público – átrio exterior, 02 - Serviço educativo, 03- Acesso público – entrada
norte, 04- Investigação – sala de arquivos, 05- Entrada do auditório, 06- auditório, 07- Museu – átrio interior, 08- Loja, 09- Átrio público –
acesso aos elevadores, 10- Sanitários, 11- Armazém, 12- Cacifos, 13- Armazém, 14- Salas de exposição temporária, 15- Corredor das
salas de exposição, 16- Salas de exposição permanente, 17- Depósito, 18- Sala de museografia, 19- Oficinas, 20- Laboratório de
fotografia. (Cortesia de Rebelo e Pimentel, 2015)
Ilustração 187 - Planta piso -1: 01- Escada – Entrada, átrio do restaurante, 02- Acesso público – restaurante, 03- Átrio público –
restaurante, 04- Auditório, 05- Sanitários, 06- Cafetaria, 07- Bar/Restaurante, 08- Restaurante, 09- Cozinha, 10- Dispensa – armazém,
11- Sanitários, 12- Acesso de serviço, 13- Área de serviço, 14-Estacionamento, 15-Área técnica. (Rebelo e Pimentel, 2015)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Humberto José Barros da Silva
176
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE O MUSEU
4.1. O MUSEU ENQUANTO TERRITÓRIO CONSTRUÍDO
Trabalhar com o terreno significa hoje, como sempre, colaborar com a sua morfologia,
mas significa sobretudo utilizá-lo como matéria de composição. Matéria de composição
em que este é algo mais do que um suporte. Mais do que ser a fundação, o terreno
pode hoje ser parte do próprio edifício. E o edifício, mais do que um objeto pousado ou
encaixado no local, com mais ou menos preocupações contextualistas, é parte desse
terreno, desse local e desse contexto. (Rodrigues, 2009, p. 52)
O Museu enquanto território construído apresenta-se aqui sob uma analogia à
arquitetura vernacular portuguesa, pelo modo como o edifício incorpora em si as
qualidades tectónicas e sensoriais do xisto (suporte geológico do território e das
gravuras), atribuindo-lhe uma forma concreta – um atributo recorrente na arquitetura
tradicional, onde a pedra é extraída do próprio terreno, para a construção das casas.
Se a priori a pedra, no seu estado natural, possui mera condição de matéria geológica,
com a sua aplicação na construção, passa a adquirir qualidade de imagem, na medida
em que o objeto arquitetónico confere-lhe forma e simbolismo, pois o xisto,
incorporado metaforicamente no corpo do Museu, passa a representar simbolicamente
o território construído, fundando-se um nexo [arqui]tectónico entre o edifício e o sítio –
uma lógica construtiva (de matéria/materialidade) que pauta os trabalhos de Zumthor,
que refere o seguinte, a propósito do seu projeto para as Termas de Vals:
Sem recorrer primeiro a imagens predefinidas, adaptando-as posteriormente ao
programa, procurámos antes responder a questões fundamentais relacionadas com o
lugar, com a tarefa arquitetónica e com os materiais – montanha, pedra, água – que, à
partida não tinham qualidade de imagens. Só após termos conseguido responder,
passo a passo, às perguntas relativas ao lugar, ao material e à tarefa, se
desenvolveram gradualmente estruturas e espaços que nos surpreenderam e dos
quais acredito que contêm o potencial de uma força originária que vai para além do
arranjo de formas estilisticamente preconcebidas. […] as leis próprias das coisas
concretas como montanha, pedra, água na perspetiva de uma tarefa arquitetónica,
engloba a possibilidade de captar algo da natureza originária e “civilizacionalmente
ingénua” desses elementos, de o exprimir e desenvolver uma arquitetura que parte das
coisas e volta para as coisas. […] (Zumthor, 2009, p. 31)
Esta condição “civilizacionalmente ingénua” da matéria do território que permite a
arquitetura conferir-lhe uma forma, um significado, uma imagem, remete-nos para a
espontaneidade das construções vernaculares, que na falta de recursos e meios
industrializados sobeja a capacidade de improviso e habilidades artesanais do povo,
que, com os materiais locais, moldam o território, conferindo-lhe forma e função, onde
Humberto José Barros da Silva
177
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
a condição telúrica do lugar manifesta-se de forma natural e espontânea, pois o
território se autoconstrui com os seus próprios elementos.
Ilustração 188 - Fachada norte – A relação entre a superfície da fachada e o bloco de xisto que brota do solo. Esta imagem sugere o
território construído na forma do edifício a partir dos afloramentos de xisto. (Ilustração nossa, 2015)
Na arquitetura contemporânea, esta condição é manipulada mediante um discurso
poético e metafórico, em que o artificial incorpora as qualidades tectónicas e
sensoriais do natural, e no fim do processo o que os separa é a natureza atómica que
os define, porque quanto a aparência, essa torna-se semelhante, criando, em alguns
casos, a perceção de um território esculpido de modo a albergar um ambiente
habitável, como o Museu assim o sugere – lapidado na paisagem, como se de uma
formação rochosa de xisto se tratasse.
Conceptualmente, a arquitetura atribui ao território uma imagem e uma forma
concreta, pois agrega ao seu corpo os elementos que o tornam legível enquanto
suporte de acontecimentos e fenómenos. No caso do Museu, o edifício reconstrói,
física e historicamente, o território em dois aspetos fundamentais: através da sua
forma triangular, lapidada pela confluência dos vales, redefinindo a topografia da
encosta; e a evocação do xisto enquanto matéria geológica do território e suporte das
gravuras rupestres. Deste modo o Museu torna-se a imagem representativa do
território construído, o seu nexo [arqui]tectónico, pois agrega ao seu corpo a matéria
tectónica do terreno em que se implanta, num processo de lapidação da encosta,
Humberto José Barros da Silva
178
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
gerando, conceptualmente, um afloramento de xisto habitável – o edifício torna-se o
próprio território construído.
Ilustração 189 - Planta de implantação – A forma triangular do museu gerada pela confluência dos vales do Forno e de José Esteves.
(Rebelo e Pimentel, 2015)
Ilustração 190 – O aspeto de afloramento de xisto e a relação cromática que o edifício estabelece com o território, gerando uma
perceção de corpo esculpido na encosta, mediante lapidação da mesma – a encosta deixou de ser apenas terreno e passou a ser
construção. (Vimeo.com, 20-4-2015)
A forma do corpo é triangular e resulta dum processo de lapidação ditado pela
geometrização abstrata da topografia, uma vez que o ponto mais alto do terreno
(implantação) está entalado entre dois vales (Vale de José Esteves e Vale do Forno) e
abre uma terceira frente ao encontro dos Rios Douro e Côa. (Rebelo e Pimentel, 2010)
Humberto José Barros da Silva
179
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
O Museu, com a sua aparência de afloramento de xisto, assemelha-se às construções
tradicionais da região nortenha, onde o granito e o xisto dividem a hegemonia
construtiva e compositiva das edificações, que de um modo peculiar distinguem a
região norte do país – uma região de solos predominantemente graníticos e xistosos,
que ditam uma arquitetura de produção cujos edifícios apresentam-se bastante
enraizados no território, pelo brutalismo das suas formas e superfícies pétreas. São
erguidos com blocos de pedra retirados do solo ou das pedreiras, através de um
processo de explosão das mesmas em pequenos fragmentos que permitem o seu
emparelhamento na construção.
Neste sentido, o Museu reforça a sua condição de território construído, sugerindo um
corpo semelhante às construções tradicionais, quer pela forma espontânea de
ocupação do terreno, preservando a sua topografia, quer pelo brutalismo e
estereotomia das fachadas assimétricas, que conjugados num só corpo, conferem ao
Museu uma conotação vernacular, como se tivesse sido construído com placas de
xisto, de diferentes calibres, justapostos entre si de forma irregular, com fretas de
escalas distintas, que denunciam o caráter habitável e rudimentar do corpo. O Museu
conjuga, assim, erudição com espontaneidade e contemporaneidade com tradição,
assumindo-se como objeto intemporal e paradigmático da assunção de valores que
fundamentam a arquitetura tradicional e contemporânea portuguesa na relação com o
lugar. Valores que Távora considerou imprescindíveis para a fundação do espaço
arquitetónico português:
Em verdade há que defender, teimosamente, a todo o custo, os valores do passado
mas há que defendê-los com uma atitude construtiva, quer reconhecendo a
necessidade que deles temos e aceitando a sua atualização, quer fazendo-os
acompanhar de obras contemporâneas. (Távora, 1996, p. 58)
Esta coexistência de valores entre a arquitetura contemporânea e a vernacular é
sugerida no “Regionalismo Crítico” de Frampton, que propõe, como alternativa aos
estereótipos da homogeneização do ambiente construído, uma arquitetura autêntica,
em harmonia com seu espaço físico e cultural, baseada em dois aspetos essências: a
consciência do lugar e a tectónica.
O regionalismo crítico […] é uma expressão dialética. Busca intencionalmente
desconstruir o modernismo universal a partir de imagens e valores localmente
cultivados e, ao mesmo tempo deturpar esses elementos autóctones com o uso de
paradigmas originários de fontes alienígenas. (Frampton, Nesbitt, 2008, p.506)
Humberto José Barros da Silva
180
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
No caso do museu, a autenticidade do edifício deriva da sua peculiar integração na
paisagem, numa exaltação dos valores da arquitetura vernacular (pela relação
corpórea que estabelece com o sítio), enquadrados no âmbito de um panorama
arquitetónico contemporâneo que se quer progressista mas sempre identitário com o
seu contexto físico e cultural. “Assim, uma obra exemplar de arquitetura evoca a
essência onírica do lugar com inescapável materialidade da construção” (Nesbitt,
2008, p. 503)
Segundo Tadao Ando48 “a presença da arquitetura – a despeito do seu caráter
autossuficiente – cria inevitavelmente uma nova paisagem. Isso implica a necessidade
de descobrir a arquitetura que o próprio sítio está pedindo.” (Ando, Nesbitt, 2008,
p.497). No caso do Museu, o que o sítio sugere antes de mais é uma arquitetura que
não desvirtue mas complemente, enaltecendo o potencial da sua condição sobranceira
e privilegiada sobre a paisagem. Desta condição resultou uma fusão do edifício com o
terreno, de modo a preservar a magnífica vista sobre a paisagem, não a perturbando,
mas sim proporcionando uma condição mais humanizada para a sua contemplação e
fruição, como de apresentará de seguida.
4.2. O MUSEU ENQUANTO LUGAR
Um lugar reconhece-se porque é construído […] existe porque uma construção
qualquer o identifica. Essa construção é uma marca, um sinal, um registo de uma
vontade em assinalar um fragmento no território […] com o projeto ou o desenho que
configura o pensamento do arquiteto se definem estratégias que revelam qualidades
que antes não eram visíveis. Determina-se aqui, neste preciso momento, a
inauguração de lugar. Sendo assim o lugar o fim e não o princípio do projeto. A
consciência deste ato transforma a atitude e o ato de projetar. Principalmente, introduz
a reflexão de que a intervenção arquitetónica é […] manipuladora das possibilidades
que existem apenas como potencial, e que foram, num dado processo, detetados e
tratados como uma evidência […] a atribuição de uma materialidade a um lugar deve
assim ser um ato consciente, já que permanente na função do arquiteto. (Milheiro,
2004, p. 79)
Na sua condição de instalação na paisagem, o Museu aponta para o desenho de uma
nova topografia, assumindo-se como nova paisagem construída, com poder criador
48
Tadao Ando é um arquiteto japonês, membro do Instituto Americano de Arquitetos (FAIA). Fundou e
dirige o escritório Tadao Ando Architetcs & Associates, e, Osaka, Japão. Seus projetos foram objeto de
exposição na Europa, Ásia e na América do Norte – Estados Unidos –, e de inúmeras monografias, entre
as quais Tadao Ando: Buildings, Projects, Writings (1984) e Tadao Ando: Details (1991). Autodidata, este
arquiteto foi professor convidado nas universidades Yale, Columbia e Harvard. Foi também distinguido
com os Prémios Pritzker (1995); o Mainichi Art Prize, pela obra da Capela do Monte Rokko; e com o
Japanese Cultural Design Prize, pelo projeto do conjunto habitacional em Rokko.
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
capaz de transformar o sítio em lugar, perante a sua condição de miradouro – uma
plataforma de lazer, um espaço prazeroso, de fruição, pausa e contemplação da
magnífica paisagem do Douro. Uma condição que enaltece o potencial do próprio local
para o efeito, devido à sua localização sobranceira e privilegiada sobre a paisagem.
À chegada ao local, o edifício sugere, antes de qualquer condição museológica que
lhe seja imposta, um espaço de miradouro, uma plataforma de contemplação da
paisagem, sugerida pela condição sobranceira do sítio. Uma condição que existia
apenas como possibilidade, pelo seu enquadramento geográfico privilegiado na
paisagem, potenciada, no entanto, pela implantação estratégica do Museu, que se
apresenta parcialmente enterrado, deixando em primeiro plano o cenário dos montes e
vales, que passam a ter como plateia a cobertura do edifício, que é simultaneamente
estacionamento, espaço de lazer e miradouro. Com esta simbiose entre paisagem
natural e construída, o sítio converte-se em lugar – um espaço prazeroso, afeto ao
olhar contemplativo, que deixa de ser um mero ato de observar, para passar a
pressupor atos de meditação, de admiração e retiro da alma, pelo devaneio que a
imensidão da paisagem incita. “O miradouro é então um dos lugares onde se conhece
e reconhece a paisagem e, ainda que por vezes sem nada construir, é um dos locais
onde se processa o nosso encontro (talvez contemplativo) com o mundo.” (Rodrigues,
2009, p. 124).
Ilustração 191 – Acesso ao Miradouro Sul (Ilustração nossa,
2015)
Humberto José Barros da Silva
Ilustração 192 – Acesso ao Miradouro Norte (Ilustração nossa,
2015)
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
Ilustração 193 - Planta de cobertura (piso 2): 01- Estacionamento, 02- Acesso ao miradouro sul, 03- Miradouro norte, 04- Entrada,
rampa de acesso ao museu. (Cortesia de Rebelo e Pimentel, 2015)
Este gesto transformador do sítio em lugar, pela conceção do museu enquanto
miradouro e plataforma de múltiplos acontecimentos, é compatível com a de Schulz,
que refere a condição existencial da construção em arquitetura como “a arte que faz
um sítio tornar-se um lugar, isto é, revelar os significados presentes de modo latente
no ambiente dado.” (Schulz, Nesbitt, 2008, p. 454). O Museu explora assim as
potencialidades do sítio, enaltecendo a sua condição prévia, de um ambiente com um
genius loci latente, capaz de elevar o sítio à condição de lugar, e como tal a uma
dimensão espiritual prazível.
Infelizmente, hoje a natureza perdeu muito da sua antiga abundância e a nossa
capacidade de percebê-la também se enfraqueceu. Por isso, a arquitetura
contemporânea tem um papel a cumprir no sentido de proporcionar às pessoas lugares
arquitetónicos que as façam sentir a presença da natureza. Quando isso acontece, a
arquitetura transforma a natureza por meio da abstração e modifica o seu significado.
Quando a água, o vento, a luz, a chuva e outros elementos naturais são abstraídos da
arquitetura, esta se transforma num lugar no qual as pessoas e a natureza se
defrontam em permanente estado de tensão. Creio ser esse sentimento de tensão que
poderá despertar as sensibilidades espirituais latentes no homem contemporâneo.
(Ando, Nesbitt, 2008, p. 497)
Assim, o museu enquanto miradouro suspenso sobre a vasta paisagem transmite uma
imagem tão intensa que deixa um lastro de emotividade, compreensível para lá de
quaisquer significados arquitetónicos que o edifício possa encerrar, pois são emoções
tangíveis apenas pelo espírito. Isto é, a arquitetura apenas proporciona condições para
que tais impressões ocorram, seduzindo, induzindo e condicionando, de forma
intencional, o modo como o utente confronta-se com objeto arquitetónico, para que a
leitura do objeto seja o mais consentâneo com as intenções projetuais do arquiteto,
que “possui a missão atuante de responsável credível e materializador do lugar,
Humberto José Barros da Silva
183
Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
tornando-o revelado aos sentidos e razão da sociedade, e, tendo esse lugar uma
preexistência em potência, do sítio do destino […] “ (Chaves, 2001, p. 51).
Ilustração 194 – O Museu enquanto miradouro. (Ilustração nossa, 2015)
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
5. CONCLUSÃO
Do presente estudo, conclui-se que a relação que a arquitetura estabelece com o lugar
revela (ou pode revelar) identidades únicas em cada intervenção, atribuindo a cada
obra um cariz singular, que desde a pré-história define os lugares. Diferenças e
singularidades que o Homem sempre explorou, desde a sua fase nómada até à
atualidade, seja por razões de sobrevivência, artísticas ou de estratégias de
ordenamento do território. A verdade é que, sendo “filhos do átomo”, a nossa condição
existencial é consumada inevitavelmente sobre uma superfície, é epidermicamente
que nos relacionamos com o mundo exterior, e a epiderme envolve sempre um corpo,
e um corpo compreende sempre um espaço interno e outro externo. E, portanto, essa
condição existencial, que é-nos inata, respalda inevitavelmente sobre uma superfície e
um ambiente concreto, sobre um território que aparta e define fronteiras físicas e
culturais, que, por sua vez, determinam a forma como cada cultura interage com o seu
espaço geográfico. Uma lógica geográfica e antropológica que define modos de
convivência e noções de território e das suas valências para a fundação e apropriação
do lugar, enquanto entidade fenomenológica que define o homem na relação com o
seu meio.
É sob esta noção existencial do lugar que a arquitetura deve operar, enquanto
disciplina primordial na estruturação do mundo habitável, estabelecendo mecanismos
que adestrem o homem no encontro com as suas raízes, opondo resistência ao seu
desenraizamento dos lugares e da cultura a que pertence, e contrariando
simultaneamente o argumento sobre a transformação sucessiva dos lugares, que
fundamenta a produção arquitetónica contemporânea neoliberal, que desvaloriza o
sítio enquanto matéria operativa de projeto, justificado pela sua constante alteração ao
longo do tempo.
Oposta à legitimação neoliberal da afirmação do objeto arquitetónico enquanto ideia,
desvalorizando a relação que este possa estabelecer com a sua envolvente, a
arquitetura contemporânea portuguesa procura nos valores tectónicos da paisagem o
fundamento para uma produção arquitetónica que enalteça ou reforce a qualidade e
potencialidade das paisagens portuguesas, fortalecendo a identidade das regiões e
fomentando a militância dos arquitetos na reafirmação e consolidação de uma cultura
arquitetónica cuja contemporaneidade passa pela reinterpretação de valores
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
tradicionais, instituindo-se o novo a partir de linguagens reconhecíveis da arquitetura
regional.
Esta práxis que prolifera na arquitetura contemporânea portuguesa ganha destaque,
sobretudo, numa época marcadamente globalizada, que promove a “homogeneização
do ambiente” construído, como referiu Frampton, no seu “regionalismo crítico”. Uma
época parcialmente descomprometida com a fundação do lugar pela obra construída,
que promove uma produção de arquitetura-objeto – consumada pelo seu virtuosismo e
monumentalidade –, em detrimento de uma arquitetura de contexto, que promova uma
certa ordem e harmonia com a envolvente em que se circunscreve, estabelecendo
uma relação de familiaridade com os espaços que propõe. Uma época que privilegia a
massificação da produção arquitetónica (bem como a sua especulação), em
detrimento do contributo da arquitetura para a regeneração das paisagens
(humanizadas ou não), comprometendo, assim, a longo prazo, os valores culturais e
históricos que ligam o homem ao seu contexto físico e cultural.
Neste sentido, o território enquanto matéria construtiva e operativa de projeto, quer
seja na verdadeira assunção do termo, quer seja numa conceção metafórica, deve
gerar mecanismos de sensibilização que ofereçam resistência a essa cobiça que
desvirtua os sítios, apontando novas direções no reencontro da arquitetura com o
homem e as suas raízes ancestrais, em prol de uma linguagem capaz de comunicar e
integrar as intervenções arquitetónicas no universo cultural a que pertencem; à
semelhança, por exemplo, da arquitetura vernacular, que serviu (e serve) atualmente
de referência para estudos de sustentabilidade dos novos edifícios, apontando
caminhos para novas investigações sobre a otimização, desempenho e conforto
térmico dos mesmos, e amenizando o flagelo do impacto climático que assola
atualmente o mundo industrializado.
Assim como as investigações na área da sustentabilidade dos novos edifícios têm
como referência certas características das construções vernaculares, é de igual
importância que esses mesmos edifícios contribuam para a preservação ou
regeneração (se for o caso) da identidade do conjunto em que se inserem,
conservando, assim, a sua memória coletiva; como as construções vernaculares, que,
na inesperada virtude da sua espontaneidade, continuam atualmente a servir de
diretriz aos arquitetos contemporâneos, com enfoque para os portugueses, que
reconhecem nelas signos inteligíveis de uma intemporalidade e autenticidade capaz
Humberto José Barros da Silva
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Um paradigma do território enquanto matéria construtiva: O museu arqueológico do Foz Côa
de resistir a quaisquer dogmas arquitetónicos que negligenciam os valores culturais do
universo a que pertencem.
O presente estudo pretende, portanto, reforçar a importância de uma produção
arquitetónica de contexto, para a perpetuação da singularidade histórica e cultural dos
sítios, que é o que distingue e define o quotidiano dos povos no encontro com o seu
contexto histórico-geográfico. Mas o estudo pretende ainda, sobretudo, sensibilizar os
jovens arquitetos para o escrutínio do olhar atento sobre os sítios, não apenas como
recurso projetual, mas como forma de estar no quotidiano – um método de treino
mental e espiritual que aguçarão os nossos sentidos enquanto projetistas. Porque as
respostas para um bom projeto de arquitetura residem, para além da experiência do
arquiteto no domínio da sua profissão, na consciência social sobre as coisas e
vicissitudes do quotidiano, que se traduzirão, sobretudo, na sensibilidade do olhar
atento (quase obsessivo) sobre o território, daí o termo escolhido para a
fundamentação do tema, porque o território tudo abarca – as pessoas, os edifícios, a
atmosfera, a história, as culturas, as paisagens, os sítios, os lugares. E se
apreendermos estes fenómenos com assertividade, boas respostas e soluções
surgirão certamente no ato de projeto.
A presente investigação ambiciona, assim, contribuir para o “agitar” de consciências,
fomentando a militância entre os jovens arquitetos no vislumbre de uma produção
arquitetónica que privilegie, como ferramenta projetual, os valores do espaço cultural a
que pertence, não desvirtuando mas antes complementando ou potenciando as
condições existentes, sugerindo caminhos que se traduzam em obras que contribuam
progressivamente para uma estável convergência de tempos do património
arquitetónico português, entre edifícios novos e preexistentes, entre paisagens
naturais e humanizadas. Assim como o Inquérito à arquitetura popular portuguesa, a
“doutrina” da Escola do Porto, o Museu do Côa e os projetos Casa das Mudas, Centro
de Interpretação Ambiental de Corno do Bico e o Museu da Luz contribuem para a
consolidação do estatuto da arquitetura contemporânea portuguesa como sendo,
culturalmente, uma arquitetura vinculada ao lugar. Se a arquitetura vernacular conferiu
ao panorama arquitetónico português mecanismos para a fundação de uma cultura
arquitetónica do lugar, a Escola do Porto consubstanciou-a, proliferando e
influenciando ideologicamente, a partir das suas figuras mais proeminentes (Távora,
Siza Vieira e Souto Moura), inúmeras gerações de arquitetos do Pós 25 de Abril. É
esta militância ideológica que o presente estudo ambiciona registar.
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