Texto resumido e comentado visando entender como a Filosofia se

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Harry Edmar Schulz
Professor Titular
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
HUMANIZAÇÃO COMO FERRAMENTA DE AUMENTO DE INTERESSE NAS EXATAS
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Texto resumido e comentado visando entender como a Filosofia se autoapresenta, como se auto-define para aqueles que pretendem seguir estudos
filosóficos, com base no texto original do autor Antonio Trajano Menezes
Arruda.
Elaborador: Harry Edmar Schulz1
Professor na área de Mecânico dos Fluidos, Fenômenos de Transporte
Universidade de São Paulo
Término do texto: 02 de Maio de 2010
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Título: A FILOSOFIA: SUA NATUREZA, SEUS PROBLEMAS, SEU MÉTODO
Autor: Antonio Trajano Menezes Arruda
Veículo: Texto escrito para o “Caderno de Formação em Filosofia da Educação” do
Curso de Pedagogia do Projeto Pedagogia Cidadão.
Páginas: 21 a 38.
1 – INTRODUÇÃO: A AUTO-APRESENTAÇÃO DA FILOSOFIA
A intenção de verificar as estratégias seguidas por diferentes autores para
apresentar suas idéias e convencer as pessoas das eventuais “verdades” com as
quais se deparam, com o intuito final de aplicar essas estratégias (se eficientes) para
transmitir idéias filosóficas para alunos da área de exatas, levou naturalmente à
leitura crítica de diferentes textos de Filosofia.
Entendo que toda leitura é um exercício de comunicação com o autor,
exercício este que se sujeita ao estado momentâneo de nossos conhecimentos,
convicções, emoções, enfim, ao conjunto de componentes que nos faz ser como somos
neste presente. Assim, toda leitura envolve uma componente tendenciosa, que é a
interpretação momentânea do leitor.
Portanto, uma leitura continuada, sistematicamente repetida ao longo de
nosso tempo (vida), pode contribuir positivamente para avaliarmos diferentes pontos
de vista do objeto (texto) que lemos. Resta, entretanto, a necessidade de objetividade
quando pretendemos aplicar os conceitos derivados de exercícios filosóficos. Como é
preciso que nos rendamos a esta objetividade, a busca de textos de apresentação da
própria Filosofia, verificando como os autores a entendem em primeiro lugar, pode
auxiliar no entendimento das estratégias de “convencimento” que esta área emprega.
No presente texto comentado eu me coloquei como um iniciante em Filosofia,
que busca entender a área na qual está se aventurando. Evidentemente não é possível
abandonar o objetivo primeiro de assimilar as estratégias de apresentação de idéias,
o que sempre implica em um desenvolvimento anterior que me coloca nessa posição
de assimilador. Mas creio ter conseguido destacar seqüências de idéias no texto
original que podem gerar dúvidas ao iniciante em Filosofia, e que tentarei evitar ao
colocar a Filosofia para os meus alunos.
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2 – ESTUDO PROPRIAMENTE DITO
O autor inicia o texto com o item intitulado: “O que a Filosofia é”. Partindo do
que denomina “problema ou questão da Filosofia”, o autor menciona que há vários
problemas nas diferentes disciplinas da Filosofia. Uma primeira definição de Filosofia
é apresentada, assumindo, de antemão, que a noção de “problemas filosóficos” esteja
já definida. A definição proposta é: caracteriza-se “a Filosofia como sendo a atividade
de busca de respostas para esses problemas”, sendo essa busca ”racional,
intersubjetivamente partilhável e desinteressada”. A racionalidade proposta é a que
não envolve a fé, enquanto que a segunda característica envolve a comunicação e
reprodutibilidade por terceiros. O desinteresse é deixado para ser comentado em outra
parte do texto.
Comentário HES: O autor é feliz em assumir a Filosofia como uma atividade.
Porém não tem a mesma felicidade ao definir a Filosofia de forma recorrente,
admitindo que os problemas filosóficos são definidos de antemão. O iniciante, que
visa entender a Filosofia enquanto atividade, tem que partir de um pressuposto que
ele não pode avaliar a priori, uma vez que não conhece a extensão dos estudos em
Filosofia. Por outro lado, essa definição recorrente pode ser aplicada para qualquer
atividade humana. Por exemplo, considerando as Engenharias, pode-se caracterizar
a Engenharia como sendo a atividade de busca de respostas para problemas de
Engenharia, sendo essa busca :racional, intersubjetivamente partilhável e
desinteressada. Essa forma de definição cai na obviedade.
No segundo parágrafo desta primeira página (p.21) o autor apresenta uma
definição “passageira” de Filosofia, na qual diz que “a Filosofia é apenas uma entre
muitas outras modalidades da busca de conhecimento caracterizada pelos três
elementos acima”, enfatizando o conhecimento teórico, a episteme. Daí o autor
discorre sobre a estrutura dada a seu texto.
Comentário HES: O autor agora foi feliz em apresentar a Filosofia associada
a outras modalidades de busca de conhecimento. Essa é uma definição simpática, que
não coloca a Filosofia acima de outras atividades humanas e permite ao leitor
construir uma primeira idéia acerca do que consiste esta atividade. O adjetivo
“passageira” foi usado porque o autor não se ateve a uma explicação desta
definição, como no primeiro parágrafo.
O segundo item do texto tem o título: O espanto/perplexidade como origem da
episteme. O autor inicia dizendo que “a grande tese” a ser compreendida é de que o
espanto ou perplexidade “sempre foi e continua sendo a origem da episteme (em
particular da Filosofia)”. Daí o autor emprega figuras de repetição para enfatizar o
espanto e usa exemplos de ótica e resistência dos materiais. Na seqüência, ele
comenta que há fatores que bloqueiam essa perplexidade, como “o hábito, o costume,
os preconceitos, os estereótipos, o apego às idéias recebidas e o receio de questionar
coisas aceitas”. Em adição, o autor sugere que há condições favoráveis à
perplexidade, passando a descrevê-las.
Comentário HES: O autor se apóia em uma tese comumente aceita. Todavia,
particularmente considero que o conhecimento pode ter várias origens ou causas
motivadoras. Defendo que sua origem pode repousar tanto na curiosidade (ou
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perplexidade) como na necessidade (sobrevivência), ou na competição
(posicionamento relativo em um setor social ou em toda a sociedade). Essa é uma
conclusão pessoal, ainda particular, mas tanto a necessidade de sobrevivência como
a competição geram conhecimento. Embora eu não creia que a existência de outras
causas motivadoras do conhecimento venha a invalidar os argumentos em torno da
geração de conhecimento, entendo que essa geração perde um pouco de sua áura de
pureza, se assim podemos empregar esse termo. A competição e a sobrevivência, em
diferentes áreas do conhecimento, podem envolver atitudes não-contemplativas, e
eventualmente destrutivas (pensemos nos exemplos das guerras e suas ferramentas,
desenvolvidas em condições de intensa competição e luta pela sobrevivência).
Continuando com o texto, no parágrafo indicado com a letra (A), página 22, o
autor menciona uma condição favorável à perplexidade como: “Não se deixar
dominar pela inércia do hábito”. O autor comenta que o hábito “tem o inconveniente
de gerar uma falsa impressão de conhecimento”, exemplificando com um caso físico
(tentar “acender” uma luz queimada) o que ocorre também intelectualmente. Assim, o
autor nos incita a vencermos a inércia do hábito para vermos um objeto como se fosse
pela primeira vez e fazermos as perguntas filosóficas a respeito dele. No parágrafo
indicado com a letra (B), página 22, o autor coloca mais uma condição favorável à
perplexidade: “Predisposição e coragem intelectual de admitir que podemos estar
enganados”. A argumentação do autor caminha pelos fatos de que nossas opiniões,
ainda que arraigadas, podem não ter o fundamento que se supunha tivessem. O autor
comenta que somos o resultado de muitas influências, que nos dão nossa identidade e
nossas crenças, e que é difícil abandonar ou modificar ambas. Porém, apesar dessa
dificuldade, o autor recorre ao nome de “coragem intelectual” para defender a
adequação dessa atitude, de admitir erros, eventualmente sobre todo um conjunto de
nossas crenças, mesmo frente a um público.
Comentário HES: Os comentários do autor são pertinentes, no tocante a
manter-se alerta para enxergar um problema e no tocante a admitir que uma idéia
seguida não era correta. Não há, no momento, comentários adicionais.
O parágrafo seguinte, indicado pela letra (C), página 23, coloca como
condição favorável à perplexidade, a “predisposição para se livrar de preconceitos e
estereótipos”. Nesse caso, o autor afirma que todos nós temos preconceitos, que temos
“uma visão unilateral de nós mesmos e dos grupos a que pertencemos”. O autor
menciona que os preconceitos são prejudiciais à episteme e que, para livrar-se deles é
preciso identificá-los. Uma sugestão apresentada é a de interagir socialmente com
diferentes grupos ou pessoas. A partir de um exemplo da guerra contra o Talebã, o
autor afirma que “temos preconceito contra os diferentes”, que “o diferente tende a ter
um efeito de agressão em nós”. Na seqüência, o autor utiliza o exemplo da opção
sexual. Os comentários são concluídos com uma abordagem acerca de estereótipos. O
autor comenta que o “estereótipo é também uma idéia pré-formada” e “um retrato
distorcido e exagerado” do estereotipado. Finalmente, afirma que preconceitos e
estereótipos são uma rede cultural à qual estamos atados e que nos dificultam
experimentar a perplexidade e chegar à episteme.
Comentário HES: A descrição do autor relativa aos preconceitos e
estereótipos é adequada. Sendo uma exortação ao abandono de posturas culturais
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que de alguma forma carregam em si essas características, apenas posso aprovar
essa descrição/exortação. Não há, no momento, comentários adicionais.
Na página 25 o autor apresenta o item: “Os problemas filosóficos”,
lembrando, no parágrafo anterior a este item, que tudo o que foi até agora dito é
válido para todas as formas de episteme. O autor diz que, para iniciar, a melhor forma
de caracterizar as questões filosóficas é enumerá-las. Daí passa a enumerar exemplos
de questões conceituais, seguidas de questões comparativas, questões de linguagem
humana e de filosofia da moral. O autor não se atém a detalhar qualquer questão, por
mais interessante que seja, mas arrola justamente questões que despertam o interesse
do leitor.
Na página 26, no terceiro parágrafo, essa série de exemplos é interrompida
com uma afirmação e uma pergunta acerca de critérios. O autor comenta que todos
acham que o certo e o errado existem, mas indaga qual é o critério que usamos para
criticar ou louvar um ato. Em seguida o autor pergunta ao leitor como ele (o leitor)
sabe que um ato é eticamente louvável? Daí é usado o exemplo de maltratar uma
velhinha indefesa em um terreno baldio, um ato eticamente condenável, mas sob qual
critério? O autor sugere a resposta: eu sei com base na minha formação. Mas então é
colocado o fato de que pessoas igualmente honestas e inteligentes podem diferir
grandemente em suas opiniões. Mais um exemplo é aventado, o do incesto,
usualmente condenado nas sociedades ocidentais, mas, segundo o autor, aceitável em
outras sociedades. À pergunta: “quem tem razão quanto ao certo e errado?” é dada
uma resposta cristã, que remete àquilo que está nas escrituras. Mas aos não-cristãos
isso nada significa. O autor então comenta que essa situação de perplexidade e
espanto nos motiva a tentar solucionar o problema.
Comentário HES: O autor inicia com questões conceituais, que exigem certa
erudição para serem abordadas pelo leitor, para depois apresentar questões
comparativas, que, por envolver temas polêmicos ou conceitos não absolutos, são de
tratamento difícil (a importância relativa entre a liberdade individual e a segurança
coletiva, as vantagens do belo sobre o feio, etc.). A seqüência de questões continua
com esse enfoque, embora em áreas distintas. Avalio essa abordagem como positiva,
porque coloca o leitor em frente a uma “vitrine” de questões filosóficas, dando-lhe
uma noção do universo de questões particulares com as quais a Filosofia pode se
ocupar. Isso pode situar mais adequadamente o iniciante. Ao falar daquilo que pode
ser eticamente louvável ou condenável, o autor nos coloca a questão dos critérios que
usamos. Ao evidenciar que os critérios são relativos, menciona que nos encontramos
em uma situação de espanto e perplexidade e que nos colocamos a filosofar. Se
filosofar for questionar critérios, então o exemplo é aplicável. Talvez seja mais
conveniente dizer que filosofar é também questionar critérios.
A pagina 27 do texto original é dedicada aos problemas da Filosofia. O autor
os coloca como personagens centrais em um palco ao longo da história da Filosofia e,
a partir dessa colocação, tenta relacionar a perplexidade ou espanto com o problema
filosófico, afirmando que a perplexidade, se existente, é para com a resposta ao
problema. A questão entre determinismo e liberdade humana é colocada como
exemplo (gerador de perplexidade). Em um passo seguinte, o autor apresenta a
relação mencionada na forma: “um problema, e só um problema, é o que gera espanto
ou perplexidade”. Daí conclui: ”nada é capaz de provocar espanto/perplexidade a não
ser um problema, uma questão”. No terceiro parágrafo dessa página (27) o autor
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procura elucidar o que é um problema, respondendo que ele é formulável em uma
sentença interrogativa, caso contrário não é problema. Mas mais coisas são
necessárias para se ter um problema, e o autor as arrola em seguida. O autor coloca
essas “coisas” como vinculadas ao estudioso. A primeira é o interesse pelo problema
filosófico. Esse existe como função da personalidade do estudioso. A segunda coisa é
que o estudioso deve vivenciar a situação como problema. Deve ser uma necessidade
emocional do estudioso que o faça buscar uma solução. Daí o autor cita Karl Popper,
que considera que o problema “perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito”, e
Gilbert Ryle, que considera o problema “um distúrbio do sistema” da pessoa, a ser
eliminado com a proposição de uma resposta. Finalmente, na página 28, no último
parágrafo deste item, o autor volta à sua comparação com uma peça de teatro,
colocando agora os problemas e o método usado no seu tratamento como personagens
principais dessa peça. Todo o restante, os filósofos e suas escolas, são elementos
passageiros.
Comentário HES: Colocar os problemas, e, posteriormente, os métodos para
tratá-los no centro de um palco histórico, é uma boa forma de mostrar em torno do
que se movimenta a Filosofia. O autor, uma vez que considera a perplexidade, ou o
espanto, como a única causa motivadora de perguntas que geram a “episteme” em
Filosofia, relaciona então a perplexidade com o problema. Sua afirmação inicial de
que só um problema gera perplexidade parece indicar que essa perplexidade
implicará em ação posterior para tentar resolver o problema. De fato, isso não é
assim, porque se pode imaginar que, em um dia de calma contemplação, uma pessoa
queira observar o seu entorno apenas para se sentir bem. Belas evoluções de
pássaros e borboletas (uma visão ideal, evidentemente) podem gerar perplexidade,
mas ainda assim simplesmente serão observadas pela sua beleza, sem
questionamentos. Para suplantar esse vácuo entre a perplexidade e a ação (vamos
pensar, camarada: isso é um problema!), o autor coloca condicionantes no
observador: ele deve ser interessado e deve viver o problema. Em outras palavras,
não há problema impessoal. Ele existe se alguém se interessa por ele. Por exemplo,
se ninguém se interessar pela extinção da humanidade devido ao mau-uso da
natureza, isso não é um problema.
Como já comentei, opino que a necessidade pode, por exemplo, também levar
à busca de respostas. A possibilidade de auto-extinção pode eventualmente
representar um incentivo a se buscar soluções que nos permitam avançar para
tempos ainda não vividos (sobrevivência). De forma prática, para a Filosofia, ainda
que hajam temas para os quais eventualmente a contemplação viesse a gerar uma
perplexidade, a inexistência de seres humanos (todos extintos) talvez viesse a
representar um empecilho para o levantamento de uma questão filosófica (ou seja, o
imperativo criador passa a ser a sobrevivência e não a perplexidade)
Na página 28 o autor introduz o item: “Sobre o método em filosofia”, acerca
do qual discorre ao longo de dez páginas, comentando, entre outros temas, os
componentes subjetivos e objetivos do método. Inicialmente é mencionado Karl
Marx, na forma: o homem só põe problemas que pode ou resolver ou mostrar que não
são problemas. Por conseguinte, devem haver procedimentos repetíveis que
corresponderiam ao método de resolução em Filosofia. O autor menciona que os
problemas-objeto são filosóficos, e, como tal, não há um conjunto respeitável de
problemas já resolvidos (talvez nenhum) que nos permita vislumbrar o método
trilhado. O autor ainda menciona que as epistemes “mais sólidas”, como as científicas,
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dispõem de métodos. Em seguida, o autor informa que, apesar de não haver método,
há verdades universalmente aceitas (com a ressalva de esse universal permitir
exclusões), mencionando seu uso na metafilosofia (reflexão sobre a Filosofia), e as
enumera.
a) Origem da Filosofia na perplexidade, no espanto.
b) As questões são tão ou mais importantes que as respostas conferidas.
c) Superação da ignorância ignara, para substituí-la pela ignorância douta,
necessária para encontrar soluções para os problemas filosóficos.
d) A Filosofia fundamenta-se em sua história escrita.
e) Não se pode ensinar Filosofia, porque não existe um corpo de doutrinas
subscritas pelos filósofos. Só se pode ensinar a filosofar.
f) Deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na formulação de teses
e princípios a serem demonstrados e defendidos.
Comentário HES: A observação de Marx é usada para sustentar a
possibilidade de existência de um método de estudo em Filosofia, uma vez que o
homem só propõe a si mesmo problemas que têm condições de serem resolvidos. Mas,
em seguida, o autor menciona que é possível que nenhum problema-objeto da
Filosofia tenha sido resolvido e que, portanto, não há qualquer método aparente.
Ora, a leitura de um texto didático que induz a um pensamento, para em seguida
refutá-lo, parece antes um jogo de palavras em que o interlocutor é posto ante a
questão: Você aceita minha asserção? Sim ou não? Se não, você não precisa seguir
lendo. Se sim, você lê e cai na minha armadilha! Mas o leitor principiante não tem
opção de não ler e, portanto, passa a ser vítima desse jogo de palavras, que antes
causa a impressão de distorcer do que de esclarecer características da Filosofia. Eu
questiono, portanto, se essa é uma forma didática de apresentação.
Vale aqui abrir um aposto, porque a minha posição pessoal é de querer uma
imagem positiva para a Filosofia, no sentido de que ela seja atraente para iniciantes
(tenho o objetivo de transmitir idéias com cunho filosófico). Assim, meus comentários
naturalmente pretendem valorizar esse aspecto, embora possam eventualmente não
atingir o objetivo dessa valorização. A questão do método é importante porque a
Filosofia, em princípio, busca o conhecimento, o que entende-se ser uma coisa
importante para o ser humano. Mas “Porque é importante gerar conhecimento?”é
uma pergunta vinculada aos próprios objetivos do ser humano, cuja discussão nos
remete novamente às motivações humanas como necessidades, curiosidades e
competição.
Voltando ao texto: propor, com base em uma afirmação filosófica, que pode
haver um método, para depois dizer que os filósofos não conseguiram produzir
provavelmente nenhuma resposta aos problemas relevantes e que se desconhece,
portanto, qualquer método, pode causar antes a impressão de que os filósofos são
incapazes de estabelecer métodos que os habilitem a responder suas questões. Caso o
leitor assuma essa postura, pode também assumir a postura conseqüente: “eu não
vou continuar a gastar meu tempo com pessoas que não sabem o que fazem”, que,
pessoalmente, considero que deveríamos nos esforçar para que não se estabeleça.
Nesse contexto, isto é, nessa seqüência de raciocínio, pode soar estranho que se
aceite haver “verdades universalmente aceitas”, uma vez que, segundo as afirmações
anteriores, nenhuma pergunta relevante foi de fato resolvida (devo enfatizar,
entretanto, que esta não é a minha visão). Nessa seqüência de verdades também
podem ser tecidos comentários:
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Verdade a) Comentei anteriormente que discordo de a perplexidade ser a
única causa do conhecimento. Eventualmente a Filosofia apenas considere o tipo de
conhecimento gerado através da perplexidade, uma vez que o autor destaca a origem
da Filosofia está no espanto (posição existente na literatura de forma geral). Ou seja,
o que foi gerado com outra motivação não é Filosofia. Se este for o caso, então é
preciso, ao longo de um texto didático, esclarecer este ponto ao leitor iniciante.
Por exemplo, se um conjunto de profissionais da saúde obtém a cura de uma
doença que aflige o ser humano, trazendo implicações de bem-estar e longevidade e
conclusões acerca do funcionamento de nosso organismo, as quais têm reflexos no
pensamento humano, deve-se frisar que essas conseqüências no pensamento não são
Filosofia, porque trata-se de conhecimento gerado de uma necessidade humana e não
do espanto. Por outro lado, se o conjunto de pensamentos e discussões que se gera a
partir de uma informação científica puder ser considerado parte da Filosofia, então a
origem da Filosofia não está apenas no espanto.
Verdade b) Sei que o autor acrescentou “...que foram e têm sido dadas a
elas” junto ao substantivo “respostas”. Portanto, o autor considera a temporalidade
da pergunta. Ela (a pergunta) pode deixar de ser importante ao se encontrar a
resposta ou quando o conhecimento científico eventualmente mostrar que se trata de
uma pergunta mal colocada. Em contato pessoal mantido com o autor do texto
perguntei sobre a sua posição frente à perenidade das questões da Filosofia e ele
enfatizou que não considera esta perenidade e que admite que as resposta venham a
ser atingidas. Caso contrário, nas palavras do autor, “ficaríamos deprimidos” com a
certeza da busca infrutífera.
Considerando essa posição, creio que é preciso ser menos genérico ao
apresentar esta segunda “verdade” ao iniciante, para evitar que se afirme
simplesmente que “as perguntas são mais importantes que as respostas”, porque uma
postura decorrente desta asserção pode ser: “Então não estudarei para solucionar
problemas. As soluções são supérfluas, uma vez que as perguntas são o objeto mais
importante. Assim, afirmo que serei apenas um questionador ou inquisidor. Posso vir
a ser um brilhante questionador, mas serei inútil.” Devemos ser absolutamente
claros junto aos estudantes, porque há ainda uma segunda conotação perniciosa
nessa “verdade”, se ela for inconvenientemente apresentada: a de que o filósofo
resolve coisa nenhuma. Ele se ocupa com a teoria da geração do conhecimento, mas
de fato nada precisa gerar.
Sem procurar levantar polêmicas, mas problematizando o uso indevido das
“verdades”, pergunto a mim mesmo se uma Universidade pode admitir que se
transmita a idéia de que essas instituições formarão apenas inquisidores
(questionadores), e não pessoas habilitadas a empregar suas faculdades intelectuais
para resolver as questões colocadas. Em um contexto de uma sociedade que
caminha tentando resolver seus problemas, suas limitações, seus absurdos e
combater sua ignorância, pode o filósofo caminhar pela vida utilizando as soluções
“mundanas” do dia-a-dia formuladas pelos seus semelhantes, mas em nada
contribuindo? Assim, parece-me que devemos cuidar para que essa segunda verdade
não seja um convite à inação, ou um “refúgio”, que permita ao filósofo se acomodar
sem produzir respostas. Sendo eu uma pessoa que adentra na Filosofia com um
objetivo didático, gostaria de ter uma imagem mais simpática da Filosofia (talvez
frente à sociedade), tanto para divulgá-la como para conviver com ela enquanto
caminhando por seus meandros. Creio que a apresentação dessa segunda “verdade”
deve reforçar o contexto temporal de forma menos ambígüa, como: “...as respostas
apresentadas até a presente data”. A expressão “tem sido” acrescenta uma idéia de
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continuidade que considero indesejável. Sem a contextualização mais clara, essa
“verdade” não me parece algo positivo. Mais uma vez comento que em contato
pessoal com o autor ficou evidente de que ele defende esta ênfase na temporalidade.
Menciono que, ao longo de minha existência já ouvi várias vezes afirmações
como a de “ser necessário saber perguntar”, ou de que “uma boa pergunta é
essencial”, mas as situações eram retóricas, sem conseqüências. Entretanto, quando
alguém apresenta a resposta a uma questão crucial, como o tratamento de uma
doença, ou um procedimento legal adequado, ou um material novo a ser empregado
em nossas atividades, sem dúvida não se trata de retórica, mas de ações que
beneficiam toda a sociedade, inclusive os filósofos (a menos que estes não fiquem
doentes, estejam acima da lei e não usem os benefícios da tecnologia, como os
computadores e seus derivados, por exemplo – postura que, evidentemente, nenhum
filósofo jamais assumirá). Assim, se as respostas às questões filosóficas forem sendo
apresentadas ao longo dos anos e transmitidas à sociedade na forma de
conhecimento gerado, serão essas respostas a contribuição real.
Como ilustração final, talvez valha a pena ainda comentar que pode haver
quem argumente que as questões filosóficas são aquelas que não foram resolvidas
nos cerca de 2.300 anos de existência da Filosofia ocidental. Também pode ser
argumentado que aquelas que tiveram respostas mostraram não ser questões desse
campo do conhecimento. Não me parece um absurdo admitirmos que algumas
questões hoje existentes terão resposta no futuro. Talvez venham a formar uma nova
área da ciência e saiam do contexto da Filosofia. Mas isso não significa que não
estamos fazendo Filosofia agora, ao abordarmos essas questões. Além do mais, é
preciso lembrar que são justamente essa possibilidade de respostas e de evolução
para novas áreas da ciência que justificam a própria existência da Filosofia. Caso
contrário, se de antemão estabelecemos que não teremos respostas a qualquer das
perguntas feitas, então não vale a pena continuar investindo recursos e esforços de
mentes brilhantes nesse campo então assumidamente estéril para a humanidade. A
garantia de sobrevivência da espécie humana e de seus coabitantes nessa esfera, a
evolução futura, o estabelecimento das metas mais distantes, o crescimento
enquanto civilização, o conhecimento de si mesma, não me parece que possam ser
deixadas nas mãos de uma classe de pensadores que assumidamente se limitará à
perplexidade e à teorização epistêmica, sem a componente da ação em prol de
respostas viáveis. Se abolirmos o objetivo de obter respostas, então estaremos
apregoando a inutilidade e a inconveniência da Filosofia.
Finalzando: Enfatizo que a minha preocupação é o cuidado que deve ser
tomado para evitar uma imagem da Filosofia como aquela descrita.
Verdade c) É interessante observar essa terceira verdade, que aqui foi
apresentada após ter sido afirmado que provavelmente nenhum problema relevante
foi resolvido ao longo da história da Filosofia. Isto porque ela estabelece um ritual
de dois passos para fazer algo que ninguém fez. Novamente (na presente tentativa de
entendimento) argumento com base na leitura do iniciante, para o qual as verdades
aceitas pelos eruditos são ainda objetos de profunda meditação. Na seqüência
apresentada no texto, a terceira verdade causa a impressão de ser algo como um
ritual de iniciação: resolverás os problemas se e quando abandonares o estado de
ignorância ignara para acenderes ao estágio de ignorância douta. Creio que o
posicionamento dessa verdade no texto tirou-lhe o potencial de eventual relevância
que poderia imprimir no leitor.
É preciso enfatizar, entretanto, que entendo que se pretende honestamente
mostrar condições a serem satisfeitas pelo estudioso em Filosofia. Entendo também
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que se pretende formalizar um senso comum com esta verdade. Nesse sentido, se a
ignorância ignara representa o estágio de desconhecimento do problema como um
todo e a ignorância douta representa o estágio de conhecimento do problema e de
seus condicionantes, porém evidentemente sem conhecer sua solução, então trata-se
de uma verdade válida para qualquer área na qual se pretenda resolver um problema
(seja este um problema prático, do dia-a-dia, ou não). Possivelmente poderei
resolver um problema com maior segurança se conhecê-lo com maior detalhe, isto
é, conhecendo os seus condicionantes (seja para instalar uma torneira no banheiro
de casa, ou para explicar o sentido da frase literária e contraditória de Marx, que
disse que “tudo o que é sólido desmancha no ar” - Manifesto Comunista). Assim, o
que me causa desconforto não é a formalização do senso comum para localizar
melhor o estudante, mas a menção dessa “verdade” em um contexto que, no meu
entender, minimiza a eficácia da sua mensagem.
Verdade d) Concordo com a apresentação do autor, no sentido de que
entendo que o conhecimento da história da Filosofia, com o encadeamento de seus
modelos, seus autores, as tentativas de resolução dos problemas, é importante tanto
para tomar conhecimento daquilo que foi importante nos diferentes períodos da
história humana, como para verificar quais questões permanecem em aberto.
Adicionalmente, uma vez que questões permanecem em aberto, vale a pena observar
quais argumentos foram utilizados nas tentativas de resposta anteriores, de forma a
“continuar a construção de uma resposta”, sem reiniciar o estudo de um estágio
muito primitivo.
Frisa-se que não se defende reduzir a Filosofia à sua história, o que faria com
que nosso avanço para o futuro seria “de ré”, “condenando-nos” a apenas comentar
textos escritos por sábios do passado e a parafrasear suas idéias. A Filosofia, no meu
entender, é criativa e ativa, e não meramente repetitiva. (Para mim, pretendo que
seja viva e aplicada).
Verdade e) Essa observação parece que, a primeira vista, não acrescenta
conhecimento ao principiante. Ela introduz, pomposamente (ou seguindo uma
formalização mais erudita), uma pretensa impossibilidade, mas que é transformada
em uma questão de interpretação sobre o que se pode fazer. Assim, temo que essa
verdade universal seja confundida com um jogo de palavras.
Note-se que o autor já definiu a Filosofia como uma atividade. Assim, ensinar
uma atividade subentende que há alguma ação implícita naquilo que se transmite. Ou
seja, enfatiza-se o verbo e não o substantivo. Portanto, ensinar Filosofia implica de
fato ensinar a Filosofar. Não me parece haver sentido em enfatizar a
impossibilidade, uma vez que a ação está implícita na definição de Filosofia.
Pareceu-me, em alguns momentos da leitura, que há uma certa segmentação
ao apresentar a Filosofia ao iniciante (alguma descontinuidade, como no caso de se
dizer que a Filosofia é atividade e depois, esquecido disso, dizer que se ensina a
Filosofar, sem fazer a conexão natural entre essas idéias) Quer me parecer que isso
decorre do grande volume de “impossibilidades” já assumidas pelos profissionais
experientes (inclusive no tocante à própria definição da Filosofia, acerca da qual,
torna-se a frisar aqui, o texto em análise foi muito feliz). Acerca de filosofar, espero,
inclusive, que tenhamos condições de ensinar a filosofar criativamente, excitando as
capacidades intelectuais de nossos jovens a propor respostas às questões com as
quais estabelecerão contato.
Concluindo: exprimir uma verdade universal apresentando inicialmente a
negação de “um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade” parece-me
contraproducente para a apresentação de uma visão do que seja Filosofia.
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Verdade f) A posição de racionalidade e desinteresse é sempre desejável.
Nada há a acrescentar quanto a esta forma de busca das respostas. Enfatizo, apenas,
que após o leitor ter sido informado de que historicamente não se conseguiu atingir
respostas definitivas, que não se vislumbrou um método de abordagem (uma situação
que a leitura do texto permite inferir que poderá se manter), ele pode se perguntar se
vale a pena empregar seus melhores esforços para obter resultados provavelmente
pífios. Vale a pena gastar uma vida nisso? Note que o iniciante estará empenhando
a sua própria vida ao abraçar a atividade da Filosofia. Portanto, esse é um
problema crucial para ele. Creio que esse problema, por conseguinte, passa a ser
crucial para os profissionais atuais em Filosofia, a menos que se assuma que essa
vida não represente um bem de valor relevante para a continuidade dos estudos na
área.
No segundo parágrafo da página 29 o autor apresenta uma segunda dificuldade
para a formulação de um método em Filosofia, que é a ligação entre o método e a
doutrina substantiva do filósofo. O autor menciona William James, filósofo
pragmático, que afirmou que a história da Filosofia é em grande medida a história de
um conflito de temperamentos. Uma vez que o temperamento é pessoal, torna-se
difícil sustentar conclusões que pedem razão e impessoalidade. O autor menciona que
“a Filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedimentos que não
dependem da subjetividade de cada um”. Posteriormente o autor cita um texto de
Bertrand Russel, em que se critica o uso das opiniões dos filósofos para provar suas
crenças, seguido de uma citação de Friedrich Nietzsche, que sugere que se busque os
objetivos seguidos pelo filósofos (“qual moralidade ou edificação é visada”) e que
acredita que um “impulso” pode empregar um falso conhecimento como instrumento.
O autor menciona que o impulso é a vaidade e aproveita o “momento literário” para
confrontar as posições que defendem que a Filosofia é uma episteme respeitável, no
mesmo nível de muitas outras, e que a Filosofia envolve o subjetivismo temperalista.
O autor menciona que as duas posições caracterizam duas doutrinas substantivas
antagônicas, que usam métodos diferentes, o que dificulta responder a questão acerca
do método em Filosofia. Em seguida, o autor considera que deve dizer algo positivo
sobre o método em Filosofia, optando enumerar componentes subjetivos e objetivos
desse método.
Comentário HES: O autor é bastante articulado e erudito, fornecendo
argumentos que justificam a asserção de que é difícil apresentar um método para a
Filosofia. Considero que sua argumentação está bem colocada no contexto restrito
do método. Porém podem surgir dúvidas a respeito de sua adequabilidade no
contexto do texto como um todo. Interessantemente o autor escolhe como exemplo
uma questão que contrapõe visões pessoais e impessoais na Filosofia. A discussão
parece que pretendia conduzir a uma posição sem definição (e o faz efetivamente no
contexto do método), mas isto é um tanto prejudicado pela postura anterior do autor
no texto, quando, para vencer o vácuo entre a perplexidade e a ação do filósofo,
colocou condicionantes no observador, a saber, que ele deve ser interessado e deve
viver o problema. Com esses condicionantes pode-se argumentar que não há
problema impessoal. Assim, não há indefinição no texto como um todo (se a
indefinição era o objetivo, os condicionantes postos no observador impedem atingilo).
11
Na página 30 o autor apresenta o item “Componentes Subjetivos”, relativos ao
método em Filosofia, classificando-os em éticos e temperamentais. Inicialmente
Claude Bernard é citado, com sua afirmação de que o cientista deve desprender-se de
seus preconceitos e idéias recebidas antes de entrar em seu laboratório, postura esta
definida como ética. O autor então enfatiza que, em Filosofia, o amor à verdade deve
suplantar todos os outros amores, ainda que legítimos, que com ele conflitem. O autor
sugere um juramento profissional, nos termos “Prometo, na medida de minha
capacidade, por o interesse pela descoberta da verdade e pela sua justificação, acima
de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com ele”. Este é o componente
ético do método, que o autor relaciona com a característica desinteressada da
episteme.
O componente de temperamento é apontado como a identificação emocional
com o jogo de buscar a verdade, no qual metaforicamente marca-se gol a favor
quando a verdade é encontrada ou aproximada e marca-se gol contra quando “se
defende o erro porque deseja que ele fosse verdade”. Assim como num jogo de
futebol não tem graça marcar um gol “ilegal” (fora das regras), também não tem graça
defender uma tese escondendo dados e fabricando evidências. Se a verdade é o
objetivo de disputar o jogo, não tem sentido desrespeitar as regras.
Comentário HES: O autor discorre talvez apaixonadamente acerca da
verdade, ilustrando bem os componentes éticos e temperamentais. O primeiro pode
ser resumido como o “compromisso com a verdade” e o segundo como o
“envolvimento emocional com a busca da verdade”. Considero a sua proposta de
juramento profissional muito interessante. Não há, no momento, comentários
adicionais.
No último parágrafo da página 31 o autor discorre sobre a importância de
enfatizar os elementos éticos e temperamentais, porque há forças internas poderosas
que agem contra eles. Daí são mencionados os moralistas franceses, arrolando autores
dos séculos XVI, XVII, XVIII e mencionando continuadores nos séculos XIX e XX.
Segundo o autor, os moralistas pensaram acerca dos fatores internos que atuam como
obstáculos ao amor à verdade e às regras de sua busca. Entre esses fatores estão o
amor-próprio e a vaidade. Sobre o amor próprio, o autor cita Blaise Pascal (século
XVII), com um texto em que as contradições pessoais são evidenciadas e se conclui
que o ser humano toma cuidado em cobrir seus defeitos aos olhos dos outros e aos
seus próprios olhos. Adicionalmente, o texto citado menciona que todos os seres
humanos possuem esse amor próprio, em maior ou menor grau, inclusive Pascal, ao
qual o autor, em um comentário, também se alinha. Um texto de Arthur Shopenhauer
(século XIX) é citado, evidenciando que a filosofia universitária é tortuosa, cheia de
rodeios, e comprometida com interesses eclesiásticos, de ministério, de editores, de
estudantes e de amigos. O autor volta a frisar a necessidade de colocar o amor à
verdade e as regras do jogo acima de tudo, educando o espírito e a sensibilidade,
podendo isto ser muito difícil.
Comentário HES: O autor faz questão de trazer ao leitor a informação
considerada mais adequada para pensar acerca da verdade e da obediência às
regras. A leitura é bastante agradável, mesmo no tocante aos textos citados. O
iniciante consegue vislumbrar a importância do tema “verdade” e trava contato com
a linha de pensamento de alguns nomes relevantes da Filosofia. Não há, no momento,
comentários adicionais.
12
Na página 33, terceiro parágrafo, o autor abre um parênteses na sua
apresentação, no qual cita Pascal (século XVII), Schopenhauer e Nietzsche (século
XIX). O autor frisa a atualidade desses autores, mas faz uma apologia a Pascal, uma
vez que seu período de vida está distante temporalmente e culturalmente do nosso,
tendo sido contemporâneo de Descartes. O autor elogia Pascal como filósofo moral e
da mente e como pensador do conhecimento humano.
Comentário HES: Nesse caso, o autor demonstra a sua admiração pessoal
pelos pensadores citados. O parágrafo é apresentado como parênteses e de fato é
isto. A sua presença no texto não é necessária para a compreensão geral. Não há, no
momento, comentários adicionais.
Na continuação do texto, após o parágrafo anterior, página 33, o autor
menciona que os componentes éticos e temperamentais não possuem uma distinção
completa, havendo certa superposição. A coragem intelectual anteriormente
apresentada é novamente mencionada, situando-a entre os dois componentes, por
exigir um temperamento condizente e um apropriado senso de dever, e possuir uma
dimensão ética indispensável. É mencionado que o traço temperamental é necessário,
mas não é suficiente. Posteriormente o autor comenta que os componentes
temperamental e ético são tanto mais importantes quanto menos controle científico se
tem na formulação e na defesa de hipóteses, afirmando que os filósofos dependem
dessas duas condições em grau maior do que as epistemes que possuem outros
recursos científicos. O autor conclui esse item dizendo que “o praticante da episteme
filosófica precisa ser mais virtuoso, no que diz respeito àquelas duas qualidades, do
que os praticantes das demais modalidades da episteme”.
Comentário HES: De forma geral, o autor apresenta opiniões próprias acerca
da interação entre componentes éticos e temperamentais e da sua maior necessidade
em áreas com menor controle científico. Nesse particular, creio que o autor parte de
um ponto de vista típico do praticante da Filosofia, uma vez que pressupõe que há
menor controle científico nesta área do conhecimento, sendo necessário, portanto,
ser mais “virtuoso”. Creio ser difícil afirmar isto sem ter transitado pelas outras
áreas do conhecimento com alguma profundidade, para entender o que é considerado
uma hipótese nessas áreas, bem como para entender o que é o método e as exigências
da verdade nelas. Ao iniciante em Filosofia pode ser interessante considerar-se
“mais virtuoso”, ou “mais amigo da verdade”, ou ainda “mais solicitado pela
verdade”, uma vez que isso naturalmente tende a situar a pessoa em um “nível moral
superior” com relação àquelas que se ocupam com o “conhecimento mais
mundano”. Mas, sem poder evitar a repetição, momentaneamente não vejo isso como
uma verdade, justamente por ter atuado em outras áreas, e com alguma
profundidade. Temo que tal afirmação possa produzir uma postura algo “pedante”
do estudante de Filosofia (portanto antipática).
O presente comentário decorre de uma reflexão menos reticente, ou seja, mais
expedita acerca do texto. O comentarista se dá o direito de evoluir em suas
afirmações e convicções, à medida que organizar a sua própria ignorância e
conseguir localizá-la nos diferentes nichos da Filosofia.
Na página 34 o autor apresenta o último item do seu texto, intitulado
“Componentes Objetivos”. O autor retorna à tese de que os problemas da Filosofia
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são mais importantes que as respostas a eles, utilizando como apoio afirmações de
Bertrand Russel, que basicamente repete a tese e valoriza a Escola de Mileto, e de
Karl Jaspers, que completa seu pensamento dizendo que toda resposta se converte em
uma nova questão. O autor então afirma que as questões filosóficas são interessantes
em si mesmas e que aqueles que as acham interessantes simplesmente querem
respondê-las, e que um problema não é independente de um sujeito particular. O
filósofo Julián Marías é mencionado, retornando ao assunto de que um problema tem
que ter uma relação visceral com o estudioso, o que é denominado de
problematicidade. Daí é mencionado que as questões da Filosofia estão entre as que
despertam mais fortemente o interesse dos seres humanos e que são questões que se
colocam repetidamente.
Comentário HES: Aqui o autor usa a expressão “...os problemas da Filosofia
são mais importantes que as respostas a eles.” Daí exemplifica e discorre
considerando esta asserção. Como já comentei, creio ser necessário o abrandamento
dado pela temporalidade, ou seja, considerar as respostas “até o momento
apresentadas”.
No segundo parágrafo da página 35 o autor comenta que a Filosofia se
apresenta como levantadora, clarificadora, modificadora e crítica de questões, e como
investigadora da relação entre as questões no momento sociocultural no qual surgem.
Colocando, então a Filosofia como um conjunto de questões, é colocada a pergunta
sobre o método de trabalhá-las. É mencionado o filósofo Isaías Berlin, que diz que
não se sabe bem como buscar uma resposta às questões filosóficas, por não se tratar,
entre outras coisas, de questões científicas, fazendo-se, então, o que se pode paciente
e esforçadamente. Novamente é enfatizado que a Filosofia, portanto, é uma atividade,
e não um corpo de proposições afirmadas como verdadeiras. Ludwig Wittgenstein é
mencionado, para o qual a Filosofia é uma atividade “terapêutica intelectual” que visa
livrar-nos de males doutrinais. Também Julían Marías e Ortega y Gasset são
mencionados, para os quais a Filosofia é um “quehacer” (a fazer).
Comentário HES: Apesar da valorização das questões, colocando a Filosofia
como um conjunto de questões (se for só isso, quanto mais questões tivermos
arroladas, mais forte será a nossa Filosofia - e talvez uma decorrência seja: quanto
mais questões um filósofo fizer, melhor filósofo e mais reconhecido será), mencionase o exemplo de Berlin, de buscar respostas. Esta busca de respostas é que, no meu
entender, deve ser valorizada.
Como aposto, comento que não saber como buscar respostas a um problema e
tentar pacientemente e esforçadamente obtê-las não é uma prerrogativa da Filosofia.
Talvez nem seja da Filosofia em maior grau (no sentido de o filósofo ter que ser mais
“virtuoso”, como antes aventado). Senão, o que dizer, por exemplo, da busca da cura
da gripe? (inexiste até o momento, sendo que mesmo a vacina é obtida a partir de um
conjunto de cepas que provavelmente envolverá aquelas que dominarão o período),
ou o estudo de fontes não poluentes de energia? (Qual será essa fonte? Como será
utilizada? Se o método científico é tão evidente, como é geralmente considerado pelos
autores de textos filosóficos, porque a resposta ainda não está disponível?). Exemplos
de problemas matemáticos podem também ser aventados, como o caso do último
teorema de Fermat. Se o “método científico” é tão evidente, porque o problema não
foi imediatamente resolvido, tendo consumido séculos de estudos? Agora que está
resolvido, qual é mais importante? A pergunta ou a resposta?, ou o conjunto das
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respostas decorrentes das perguntas intermediárias? Também podemos mencionar os
problemas do milênio: por exemplo, porque as equações de Navier-Stokes
representam um problema tão formidável? Nos exemplos mencionados também havia
e há a paciência e o esforço, também havia e há o “quehacer”. E se alguém em
Filosofia acreditar que a afirmação de Wittgenstein, de que a Filosofia é uma
atividade terapêutica intelectual, só se aplica de fato à Filosofia, então estará
errando em maior grau. O envolvimento com o problema, a busca pela solução, o
desconforto pela existência das questões não respondidas, o prazer intelectual pelo
ato de pensar objetivamente, encontram-se, na minha opinião, em todas as atividades
humanas que exigem o pensamento criativo e objetivo. O prazer na atividade
intelectual se dá com a própria atividade intelectual, independente da área
específica na qual está sendo aplicada.
No segmento do texto que está sendo comentado há, portanto, o aspecto
positivo de, ao apresentar a Filosofia como um conjunto de questões, colocar também
a busca de respostas a essas questões. No tocante às afirmações dos filósofos
mencionados, não me parece que sejam afirmações exclusivas para a Filosofia.
Porém, considerando o contexto didático, creio que, sendo uma valorização da
atividade intelectual realizada em Filosofia e apresentada por profissionais de
renome da área, atrairá o iniciante. Há que se cuidar, todavia, com a possibilidade
de gerar uma atitude pedante.
No segundo parágrafo da página 26, com base nas afirmações anteriores, o
autor pergunta: Qual seria o método? E responde o que ele teria que ser:
- um método para a atividade de estudar e trabalhar as questões.
- um método para detectar questões que vale a pena levantar (devem ter
repercussão).
- um método para avançar a compreensão dos temas e questões, seu
surgimento, ressurgimento, transformações, relacionamento com a história e outros
elementos não filosóficos.
- um método que mostre como devemos nos abrir para modificações de nossa
visão da problemática, de sua atualidade ou não.
Na resposta a sua pergunta, o autor diz que há uma disciplina que se destaca
na teoria do método filosófico, que é a Filosofia da Linguagem, por ser “prudente
metodologicamente, apoiar-se no mais próximo para conhecer o mais distante, no
mais concreto para conhecer o mais abstrato, no mais familiar e observável para
conhecer o menos familiar e não observável”. Daí o autor sugere ser uma boa idéia
estudar a linguagem, o instrumento do filósofo (que não possui outro produto de
avanços tecnológicos). Analisar os comportamentos e ações da linguagem para
direcioná-los de forma a melhor pensar as questões filosóficas é a sugestão do autor.
O autor então exemplifica a reflexão feita sobre o erro categorial, que consiste em
colocar em uma categoria um objeto que não pertence a ela. Os exemplos são as
entidades “mente” e “consciência”. Nós usamos esses termos como usamos o termo
“mesa”. Por este último ter associação com um objeto de existência comprovável,
também assumimos que mente e consciência existam como objetos de existência
comprovável.
Comentário HES: Aqui o autor conta com sua erudição para apresentar suas
asserções e explicações. Embora eu não tenha compreendido porque o método tem
que ter as características mencionadas, voltado exclusivamente para as questões,
também não posso oferecer argumentos que apóiem ou não as proposições do autor.
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Apenas considero que um método deveria estar buscando formas de obter respostas.
A Filosofia da Linguagem, utilizada como exemplo, é desconhecida no presente
momento para mim e qualquer opinião que a considere exigirá de mim leitura
específica e detalhada. Aqui o conteúdo do texto, portanto, ainda encontra as
barreiras decorrentes do desconhecimento pessoal e que prejudicam o meu
entendimento do tema. Entretanto, como estou na posição de um iniciante, o mesmo
texto talvez encontre barreiras similares em outros iniciantes, o que pode indicar que
deixou de ser tão didático quanto desejado.
Na página 37 o autor comenta que filósofos como Gottlob Frege e
Wittgenstein defendiam idéias como “romper com o domínio da palavra sobre o
espírito” e “libertar-se do feitiço, do enfeitiçamento, da linguagem”, permitindo
sugerir que a “Filosofia da Linguagem é uma disciplina metodológica primeira”. O
autor comenta que na Filosofia da Linguagem busca-se clarificar conceitos, levando a
uma compreensão analítica elaborada. Daí uma série de exemplos de questões é
arrolada, mostrando que o seu exame pode ser auxiliado pela Filosofia da Linguagem.
Na seqüência o autor afirma que a linguagem é orientadora e desorientadora do
intelecto, um instrumento do acerto quando se acerta e um instrumento do erro
quando se erra. Conhecer a linguagem, portanto, permite promover o acerto e prevenir
o erro.
Comentário HES: Apenas conto com o senso comum acerca da linguagem.
Para mim está claro que o desconhecimento de seus detalhes ou o seu mau uso
impedem uma comunicação adequada. De resto, valem as observações do comentário
anterior.
O autor finaliza resumindo suas reflexões sobre o método em Filosofia. Nas
condições subjetivas, cita novamente a filosofia européia continental, com os
moralistas franceses e seus continuadores. Para os componentes subjetivos, comenta
que considerou a Filosofia Analítica. O autor termina dizendo que ambas tradições
usadas confluem, porque pensam as questões da Filosofia Faule, questões de método
quanto questões substantivas.
Comentário HES: Não encontrei o termo Filosofia Faule.Não sei a que se
refere.
Ao observar que o autor apresentou como componente objetivo do método a
reafirmação da tese “as perguntas são mais importantes que as respostas”, não
consegui ver como isso poderia ser entendido como “objetivo”. O autor valoriza as
questões, sendo que as características que evidencia para um método são todas
voltadas para as questões. A Filosofia da Linguagem é colocada como exemplo, mas
o iniciante não a conhece. Adicionalmente, parece-me que ela é colocada no sentido
de aclarar conceitos usados nas questões, salvo melhor juízo. Dessa forma, o item
“Componentes Objetivos” não produziu, em mim, uma impressão de entendimento,
ou mesmo de que há componentes objetivos no método científico apresentado para a
Filosofia.
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Comentário Final:
O texto procura clarificar alguns conceitos da área de Filosofia. De forma
geral, é um texto que conta com a experiência do autor e sua erudição para
apresentar as idéias relativas à FILOSOFIA: SUA NATUREZA, SEUS PROBLEMAS, SEU
MÉTODO. Como pessoa interessada nas estratégias de apresentação e
“convencimento” de idéias, opino que o texto evidencia algumas incertezas existentes
em Filosofia, algumas ênfases colocadas propositalmente e outras acidentalmente. A
leitura do texto e dos comentários evidencia onde o texto me satisfez e onde eu
entendo que a estratégia de apresentação não me pareceu convincente. Contudo, este
é um texto necessário ao iniciante, porque trás termos, conceitos, idéias, com as
quais o estudante se deparará no avançar de seus estudos. Assim, o esforço do autor
deve ser louvado, uma vez que fornece uma primeira visão do universo da Filosofia.
Harry Edmar Schulz
Professor Titular
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Estudo: HUMANIZAÇÃO COMO FERRAMENTA DE AUMENTO DE INTERESSE NAS EXATAS
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