A REESCRITA DE BILHETES ORIENTADORES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES Sabrine Weber (Apresentadora)1 Francieli Matzenbacher Pinton (Co-autora)2 Gisele Souza e Silva (Co-autora)3 Cristiane Fuzer (Orientadora)4 INTRODUÇÃO No contexto escolar, o trabalho com orientação e avaliação de produções textuais é, em geral, de responsabilidade do professor de língua portuguesa. Este, mais do que ter claros princípios teóricos sobre linguagem e sobre ensino-aprendizagem, precisa vivenciar o processo de escrita como interlocutor e orientador para os textos produzidos pelos seus alunos. Essa tarefa de avaliar se constitui como uma parte do processo de orientação para a escrita, na qual o professor tem a oportunidade de acompanhar o desenvolvimento empreendido pelos alunos. Antunes (2006, p.174) declara que a avaliação do texto é um momento para o aluno, em diálogo com o professor, “aprender e descobrir outras opções ou outras restrições da língua, fixando-se não apenas em fugir do errado, mas de encontrar a melhor maneira de dizer o que se quer dizer para os fins que se tem em mente”. Nessa perspectiva, uma estratégia interventiva para a produção textual de estudantes foi proposta por Ruiz (2001), a correção textual-interativa. Essa forma de avaliação assume uma relação dialógica com o texto do aluno e é realizada por meio de bilhetes orientadores, nos quais são feitos elogios e fornecidas sugestões e instruções para a melhora nas produções dos estudantes. Como argumentam Gonçalves e Bazarim (2009, p. 11), os bilhetes contribuem para “uma compreensão mais refinada do gênero ensinado e ajudam a promover mudanças automotivadas, uma vez que lançam o olhar do aprendiz sobre o próprio texto.” Em função do impacto que esses bilhetes orientadores provocam nos textos dos alunos, é evidente a importância das escolhas linguísticas feitas pelo professor no momento da interlocução mediada pela escrita. 1 Acadêmica de graduação do curso de Licenciatura em Letras – Português, da UFSM. Participante do projeto Ateliê de Textos. Bolsista PROLICEN UFSM. ([email protected]) 2 Professora Adjunta do Departamento de Letras Vernáculas da UFSM. ([email protected]) 3 Graduada em Letras e participante do projeto Ateliê de Textos. ([email protected]) 4 Professora Adjunta do Departamento de Letras Vernáculas da UFSM. Coordenadora do projeto Ateliê de Textos. ([email protected]) Compartilhando desse ponto de vista, o projeto de extensão “Práticas orientadoras no processo de produção e avaliação de textos na perspectiva textualinterativa” (GAP/CAL 029622, FUZER, 2009), ao qual este trabalho está vinculado, tem desenvolvido atividades no sentido de preparar professores em formação da área de Letras para conduzir o processo de ensino e aprendizagem de produção textual com provimento de feedback aos textos produzidos por alunos de ensino fundamental em oficinas de leitura e produção de textos, denominadas Ateliê de Textos. OBJETIVO Este trabalho tem por objetivo analisar a reescrita de bilhetes orientadores produzidos por uma professora em formação do curso de Letras para auxiliar o processo de escrita de alunos de ensino fundamental participantes da oficina de leitura e escrita Ateliê de Textos no ano de 2013. REFERENCIAL TEÓRICO E METODOLOGIA Para fundamentar teoricamente o estudo, tem-se por base o conceito de gênero na perspectiva sistêmico-funcional que, segundo Martin e Rose (2007, p.23), é um “processo social organizado por estágios e orientado para propósitos sociais”. Também se utiliza o conceito de gênero na perspectiva sociorretórica, em que, conforme Bazerman (2006, p. 23), gêneros são “formas de vida, modos de ser. São frames para a ação social. São ambientes para a aprendizagem. São os lugares onde o sentido é construído.” Considera-se, no estudo, a noção de texto como processo organizado em três estágios: pré-escrita, escrita e pós-escrita, conforme propõe Soares (2009). A intervenção nos textos é feita pelo bilhete orientador, caracterizado por Buin (2006) como um gênero que possibilita o desenvolvimento de ações e atitudes produtivas ao processo de formação do professor e aluno, pois possibilita uma interação afetiva e efetiva. Nesse sentido, como destaca Fuzer (2009), é fundamental o professor apropriarse do gênero bilhete orientador a fim de envolver seus alunos no processo de reescrita. Para produção dos bilhetes orientadores, utilizam-se os quatro movimentos retóricos identificados por Fuzer (2012): reações do leitor ao texto do aluno, elogios à produção, orientações para a reescrita e incentivo à reescrita. Para a análise, foram selecionados os bilhetes orientadores, fornecidos como feedback, aos textos de dois alunos do ensino fundamental participantes do Ateliê de Textos em uma escola pública em Santa Maria, RS. Os bilhetes orientadores foram elaborados por uma acadêmica do quarto semestre do curso de Licenciatura em Letras, que ministrou a oficina no ano de 2013. Após a primeira versão do bilhete orientador, a equipe do projeto, constituída por professores formadores e professores em formação inicial e continuada, auxiliou na revisão e reelaboração do bilhete a fim de ajustar-se aos movimentos do bilhete orientador (Fuzer, 2012) e de contribuir para o fornecimento de orientações mais precisas ao texto do aluno. A reescrita do bilhete orientador, após as reflexões e contribuições feitas pela equipe, foi comparada com a primeira versão. Os passos da análise incluíram: (1) leitura e análise da primeira versão dos bilhetes orientadores produzidos pela professora em formação; (2) análise do bilhete orientador reelaborado após as orientações fornecidas pela equipe do projeto e (3) comparação entre a primeira versão do bilhete orientador e a sua versão reescrita, considerando as escolhas linguísticas presentes em cada texto. RESULTADOS ALCANÇADOS E PÚBLICO ENVOLVIDO Em relação à organização dos bilhetes orientadores, foi possível identificar a adequação os movimentos e passos propostos por Fuzer (2012) já na primeira versão do bilhete. Entretanto, na reescrita, após as orientações orais da equipe do Ateliê de Textos, foram realizadas substituições de expressões de modo a facilitar o processo de reescrita do aluno a um fim específico: publicação dos textos em uma coletânea. As alterações realizadas podem ser categorizadas em dois movimentos: expansão e/ou reformulação da orientação ao estudante. A expansão acontece quando uma informação fornecida no bilhete orientador é ampliada. Pode-se verificar essa categoria na comparação entre os excertos da primeira versão e da versão reescrita de um bilhete orientador: “[...] Você apresentou muito bem alguns elementos da narrativa como a descrição do protagonista e do espaço de acontecimento das ações.” (1ª versão do bilhete orientador.) “[...] Você iniciou muito bem seu conto, que contém as características do gênero conto de fadas, como a frase de identificação temporal “era uma vez”, a descrição do protagonista e do espaço onde ele vivia. Isso é a contextualização, que está boa!” (2ª versão do bilhete orientador.) No movimento “contextualização” da primeira versão, a expressão “alguns elementos”, usada para elogiar o texto, torna vaga a informação. Já na segunda versão, essa expressão foi substituída por “características do gênero conto de fadas, como a frase de identificação temporal “era uma vez”, a descrição do protagonista e do espaço onde ele vivia.”, fornecendo mais detalhes sobre a apresentação da narrativa produzida pelo aluno. Já a reformulação acontece quando o professor em formação altera a instrução dada na primeira versão, após a discussão com a equipe do projeto. Isso pode ser verificado comparando os seguintes exemplos: “[...] Também parabenizo-lhe pela utilização do discurso direto. Há, porém, alguns ajustes que ainda devem ser feitos para que se texto possa ficar mais de acordo com a proposta de produção. Vamos lá?” (1º versão do bilhete orientador) “[...] Também destaco a tentativa de utilização do diálogo. Há, porém, alguns ajustes que ainda devem ser feitos para que seu texto possa ficar de acordo com a proposta de produção. Vamos lá?” (2ª versão do bilhete orientador) Nota-se, pela reformulação da frase em destaque, que a professora em formação modalizou o elogio fornecido ao texto do aluno após reconhecer, por meio de discussões com a equipe, que o fragmento do texto em que o aluno utiliza o discurso direto ainda necessita de ajustes. No decorrer do bilhete orientador, o aluno recebe a orientações que permitem adequar seu texto à proposta. Nessa categoria, pode-se inferir que a professora reformula a informação acerca de discurso direto e amplia o conhecimento de critérios a serem considerados, em cada versão do texto, para a condução do processo de escrita, evidenciando, dessa forma, que o bilhete orientador auxilia na formação do professor. As atividades deste trabalhado envolveram uma professora em formação, que ministrava a oficina de leitura e escrita e produzia os bilhetes orientadores. A equipe do Ateliê de Textos era formada pela professora coordenadora do projeto, duas mestrandas e três graduandas, que forneciam orientações e sugestões à ministrante da oficina para a reescrita dos bilhetes orientadores. Os beneficiados eram alunos de séries finais do ensino fundamental participantes da oficina que recebiam os bilhetes orientadores e, a partir deles, reescreviam seus textos, os quais foram publicados, no final do processo, na coletânea “Contos e recontos: de leitores a escritores”. INDICADORES DE AVALIAÇÃO UTILIZADOS Como critérios utilizados para a avaliação do processo de formação de uma professora de produção textual, foram considerados a adequação dos bilhetes orientadores aos quatro movimentos estudados e a sua constituição docente em termos de reformulação e expansão das informações presentes em cada versão dos bilhetes orientadores. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTUNES, I. Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola, 2003. BAZERMAN, C. 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