Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 POSSÍVEIS ABORDAGENS DE SAÚDE NOS ENREDOS DE FILMES COMERCIAIS Karine Rudek1 Eliane Gonçalves dos Santos2 Resumo: Esta pesquisa tem por objetivo buscar nos filmes comerciais um instrumento potencializador do trabalho pedagógico, uma vez que essas mídias trazem em seu enredo múltiplos saberes e conhecimentos, valores, crenças e distintos estilos de vida, além de apresentarem uma linguagem acessível ao público. O trabalho teve como finalidade analisar dois filmes comerciais ―Uma prova de amor‖ (EUA, 2009) e ―Epidemia‖ (EUA 1995). Por meio de um estudo descritivo e exploratório analisamos as abordagens de saúde apresentadas nas duas películas. Após longa imersão, identificamos as abordagens biomédica, comportamental e socioecológica nos filmes, sendo que prevalecem cenas do modelo biomédico. Por conseguinte, acreditamos que os filmes são instrumentos que podem possibilitar um alargamento nas compreensões de educação em saúde na escola. Palavras-chave: Educação em Saúde. Formação de professores. Cinema. Introdução A formação de professores requer reflexão e análise da prática de sala de aula, buscando indícios para qualificá-la e transformá-la. Deste modo, escolhemos olhar para as questões da Educação em saúde presentes em filmes, pois este recurso cinematográfico pode servir de subsídio para o trabalho do professor. Conforme Monteiro e Bizzo (2015) a temática saúde se faz presente no currículo escolar desde o final do século XIX, porém, ainda é muito presente a abordagem biomédica no currículo escolar. É necessário o alargamento da compreensão de saúde na escola, no intuito de proporcionar maiores contribuições para a promoção da saúde individual e coletiva. Nesse contexto, é importante retomar os conhecimentos dos alunos e ampliar os significados trazidos do seu meio social, a fim de que o discente seja capaz de analisar/criticar e avaliar as informações do cotidiano, tornando-se um indivíduo ativo e participante da ação para promoção da saúde não apenas na prevenção de doenças. Por conseguinte, em vista do grande valor que a sociedade tem atribuído às novas tecnologias como ferramentas didáticas para o ensino, porque essas podem propiciar discussões e tomada de consciência sobre diversos assuntos, que se tomam os filmes comerciais como um caminho para possibilitar debates e reflexões sobre educação em saúde 1 Acadêmica do curso de Ciências Biológicas – Licenciatura/Universidade Federal da Fronteira Sul/Cerro Largo/[email protected] 2 Professora do curso de Ciências Biológicas– Licenciatura/Universidade Federal da Fronteira Sul/ Cerro Largo/[email protected] SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4161 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 na escola, Mocellinargumenta que o cinema também ensina verdades importantes sobre a condição humana e pode ser encarado como um convite a futuras discussões. Desta forma, pensando as potencialidades dos filmes no ensino de Ciências e Biologia, que esse trabalho visa encontrar indícios para discutir as questões de Educação em Saúde presente nos enredos com o auxílio de dois filmes comerciais. Iniciando a reflexão acerca do Ensino de Educação em Saúde Ao longo dos anos a visão dominante de saúde no currículo escolar tem-se pautado no modelo biomédico o qual compreende a saúde como a ausência da doença. Desta maneira, tenta-se refletir acerca da educação em saúde, bem como, o quão importante é no ambiente escolar abordar está temática nas atividades e relacioná-las como cotidiano dos alunos, a fim de promover um melhor entendimento do tema. Mohr (2002) e Venturi (2013), a partir de suas pesquisas em livros didáticos e entrevistas com professores sinalizam que as concepções de educação em saúde que circulam no âmbito escolar são as de atitude higienistas, tendo em vista os parâmetros comportamentais dos indivíduos, as mudanças nos hábitos, assim como nas atitudes, mediante uma exposição simplista do conteúdo. No atual cenário educacional, há a prevalência do modelo biomédico sob o modelo biopsicossocial. Assim, é importante compreendermos o que defini cada um desses conceitos em saúde. O modelo biomédico,de acordo com Batista(2014, p. 23)é aquele ―inspirado na visão mecanicista do ser humano, considera que saúde é mera ausência de doença e que, como numa máquina, se uma das peças se ‖avaria‖, há que se centrar na sua reparação‖. Para Tesser e Luz (2002, p. 366) estemodelo ― tem mais relação aos cuidados (prevenções de doenças) com a saúde e a prática médica é alicerçado somente na cura da doença sem levar em consideração a qualidade de vida do próprio sujeito‖. Castiel (2004, p. 3) apresenta que há a abordagem comportamental, a qual visa―alterar os padrões individuais de exposição aos riscos, por meio das mudanças comportamentais‖. Este modelo destaca a promoção da saúde incidida nos atos, nos hábitos e na melhoria da qualidade de vida do indivíduo relacionando–se agora com sua família. A abordagem socioecológica – biopsicossocial- é entendida por Martins et. al. (2012, p. 5) como o bem-estar, ou seja, visão integral do sujeito nas dimensões física, psicológica, social e ambiental. Este modelo promove a saúde com ações coletivas não apenas as ações individuais, mas na coletividade, ressaltando a qualidade de vida muito evidente, assim, como as análises dos desejos e anseios do sujeito. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4162 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 O conhecimento desses modelos no processo formativo de professores é de suma importância, pois podeampliar e possibilitar outra compreensão dos alunos sobre tal temática. Julgamos que uma possibilidade de iniciar a apresentação ou discussão de temas sobre a saúde possa ser por meio de filmes, uma vez que essas mídias trazem em seus enredos múltiplos saberes e conhecimentos, valores, crenças e distintos estilos de vida, além de apresentarem uma linguagem acessível ao público, assim, como, ricas imagens as quais prendem à atenção dos sujeitosdurante a exibição fílmica. O Cinema como potencializador de discussão e aprendizagem Perante os desafios que os professores encontram no processo ensino-aprendizagem na atualidade, busca-seconhecer e explorar mais em aulas as tecnologias, como por exemplo, o cinema na prática docente. Tendo em vista que os alunos na sua grande maioria possuem acesso diário a diferentes recursos tecnológicos como celular, televisão, internet, e maior domínio destas mídias do que o professor em alguns casos. Desta forma, torna-seformidável a aproximação deste universo tecnológico (filmes comerciais) para dentro da sala de aula, como forma de contextualização e mediação no ensino.Sabendo que este tipo de metodologia ―provoca‖ o interesse dos alunos e ao mesmo tempo integra seu cotidiano ao da escola (NAPOLITANO, 2005). A utilização da ferramenta midiática em sala de aula muito depende da transformação da prática docente. Estes avanços na formação docente proporcionarãonovas habilidades e descoberta, deste modo, desenvolvendo a linguagem, o pensamento, a concentração e prendendo a atenção dos alunos, tendo em vista o quão atrativo são as cenas. Com a admissão deste instrumentonas aulas, o professor instiga e envolve os alunos, tornando estámais produtiva, diversificada e mais reflexiva, Santos (2013, p.68) aponta que O filme não é utilizado no contexto escolar como simples ilustração, mas sim, como forma de promover uma análise crítica da narrativa e das representações fílmicas, consideradas como elementos propulsores de pesquisas e debates temáticos. Assim, o filme estabelece uma articulação com o currículo/conteúdo, habilidades e conceitos que são categorias básicas da relação de ensino-aprendizagem escolar. O trabalho como cinema na sala de aula proporciona uma gama de conhecimentos e informações de determinados contextos e momentos históricos, portanto, pensar essa ferramenta no ensino, não se limita apenas a assistir ao filme, mas instigar um olhar mais crítico e reflexivo sobre o que está sendo visualizado. Assim, julga-se importante citar os SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4163 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 filmes como um instrumento didático para debater a temática saúde, visto as inúmeras possibilidades e contextos que a midiática proporciona aos seus espectadores. É válido ratificar que através deste trabalho, temospor finalidade analisar dois filmes (comerciais) que abordam em seu enredo representações de saúde. A inquietação pela análise de filmes é motivada pela forma que essa tecnologia pode ser fonte positiva para divulgação da promoção da saúde no contexto escolar, o qual ainda se encontra ancorada no modelo biomédico. Cabe destacar, como aponta Gutfreind (2008, p.3) ―o cinema e o seu vínculo com outras mídias funciona como um produto de base da sociedade contemporânea, participando do imaginário de uma determinada sociedade e da experiência dos indivíduos‖.Assim o filme se torna um importante instrumento de conhecimento da realidade. Caminho metodológico Seguindo os elementos teóricos de Lüdke e André (2013), essa é uma pesquisa qualitativa em educação com recorte para a Educação em Saúde, a partir deste fizemos um estudo descritivo e exploratório para analisar os aspectos de saúde e de doença apresentadosem dois filmes comerciais, bem como destacar em algumas cenas as três possíveis abordagens distintas de saúde apontadas Martins et al.(2012), sendo elas:(1) biomédica; (2) comportamental; e (3) socioecológica (biopsicossocial). Para a concretização do trabalho foram utilizados como instrumento de análise os filmes comercias, estes que se aproximamdo cotidiano, trazendo histórias de vida, assim como relações de saúde. Os filmes selecionadosforam: 1) Epidemia (EUA, 1995). 2) Uma prova de amor (EUA, 2009). Primeiramente fizemos a análise dos filmes como um todo, buscando identificar possíveis abordagens de saúde, inseridas no enredo das duas midiáticas. Conforme as contribuições de Penafria(2009), o objetivo da análise fílmica é explicar/esclarecer o funcionamento de um determinado filme e propor-lhe uma interpretação. Algumas reflexões O cinema se caracteriza como uma ferramenta que facilita a comunicação entre professor e aluno em sala de aula, pois este possibilita ao aluno assistir, escutar e conhecer algo não vivenciado na realidade ou algo vivenciado concretamente, mas de forma protegida através das lentes. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4164 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 Desta forma, o uso de filmes em sala de aula contribui de acordo com Napolitano (2005), Santos eScheid (2014) para reflexão de vários temas como, por exemplo, questões de saúde, visto que esta ferramenta contribuir na análise das imagens e na leitura crítica relacionando os acontecimentos com mundo real. Moran (1995, p. 3) menciona: O vídeo nos seduz, informa, entretém, projeta em outras realidades (no imaginário) em outros tempos e espaços. O vídeo combina a comunicação sensorial-cinestésica, com a audiovisual, a intuição com a lógica, a emoção com a razão. Combina, mas começa pelo sensorial, pelo emocional e pelo intuitivo, para atingir posteriormente o racional. Nesta perspectiva, ao trabalhar em sala de aula está temática desafiadora para os professores, pretende-se com o uso do cinema, auxiliar no alargamento do entendimento da educação em saúde nas práticas pedagógicas. Assim, usando os filmes como um instrumento potencializador do pensamento crítico a respeito de questões referente à Promoção da Saúde, bem como, na qualidade de vida do sujeito. Ao propor a análise dos filmes ―Epidemia‖ (1995) e ―Uma prova de amor‖ (2009), buscamos identificar como essa ferramenta por meio da sua história, das imagens apresenta e possibilita a reflexão da saúde em seu enredo. De acordo com Scliar3 há diferentes entendimentos do conceito de saúde ao longo da história da humanidade, o qual foi sendo modificado de acordo com o contexto histórico, cultural e social de cada época. Dessa forma o trabalho com esses dois filmes buscará contextualizar esse conceito também dentro de um determinado espaço e tempo. Análises dos Filmes O filme ―Epidemia‖ (EUA, 1995),do gênero suspense e ficção cientifica, foi lançado em 1995, dirigido por Wolfgang Petersen, estrelado por Dustin Hoffman, Rene Russo, Morgan Freeman e Kevin Spacey. O mesmo traz um resgate do acontecimento que marca o ano de 1995,uma epidemia viral, semelhante ao Ebola, masno filme este é referido por ―Motaba‖, no Zaire.As pessoas infectadas com ovírussão acometidas por uma febre mortal (do mesmo modo como o Ebola), este foi descoberto na selva africana em 1967 - assim como o Ebola - através de um experimentofeito pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos no desenvolvimento de armas biológicas. 3 Moacyr Jaime Scliar (Porto Alegre, 23 de março de 1937 — Porto Alegre,27 de fevereiro de 2011) foi um escritor brasileiro. Formado em medicina, trabalhou como médico especialista em saúde pública e professor universitário. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Moacyr_Scliar. Acesso em 04 de agosto de 2016. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4165 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 Para manter o segredo da existência dovírus enão gerar pânico na cidade, dois oficiais do exército americano, foram destinados a destruírem o campo onde o vírus foi encontrado.Alguns anos depois, em 1995, o vírus ressurgiu no Zaire. O vírus acaba por se disseminar na cidade da Califórnia. Vale ressaltar que tanto o local do surgimento do vírus, o Zaire, como a época desta ―descoberta‖, 1967 e depois, 1995, são as mesmas dos fatos reais e do filme, sendo que a diferença está no nome do vírus sendo no filme Motaba, ao invés de Ebola.Contudo, o filme relata um fato real ocorrido na época4. O filme tem início com cenas da selva na África e um macaquinho este precursor de toda epidemia. O mesmo apresenta a rápida contaminação de um povoado africano e do acampamento militar americano localizado nessa área, por uma doença desconhecida que avançava rapidamente matando as pessoas em pouquíssimo tempo. Tratava-se de uma nova doença contagiosa. Como forma de controle e isolamento desta, o governo decide lançar uma bomba sob o acampamento a fim de ―realizar uma limpeza total‖, na tentativa de eliminar o vírus. Tendo em vista que, alguns macacos que estavam contaminados sobrevivem, ironicamente por conta do tráfico de animais, um macaco infectado com o vírus é contrabandeado para uma cidade dos EUA, esse espalha o vírus pela cidade, as autoridades ficam em alerta quando a população começa a apresentar os sintomas da doença, porém o contágio se desencadeia rapidamente, assim o exército coloca a cidade sob quarentena. Na trama o coronel-médico Sam Daniels (Dustin Hoffman), corre contra o tempo, pois ele terá de encontrar o hospedeiro do vírus e produzir uma vacina. Ao analisarmos o filme Epidemia, denotamos em seu enredo uma forte abordagem do modelo biomédico, pois desde as primeiras cenas são apresentadas situações em que temos a doença, o contágio e formas de prevenção. Citamos como medida extrema desse entendimento, a cena 02:35min-03:05minaonde o avião americano lança a bomba sob o acampamento, apresentando uma atitude preventiva drástica de controle do vírus. Assim, como no isolamentoe a quarenta da população apresentado na cena 47:00min-48:01min. Em todo o filme tem-se a preocupação de entender a doença cena 21:36min-22:44min, isolar o vírus cena 03:50 min-06:00 min, encontrar o tratamento e curar a população, conforme a cena 01:23:00-01:26:00 retrata a captura do hospedeiro da doença, o macaquinho. Um ponto que merece destaque e reflexão é o contexto histórico em que está midiática foi lançada no mercado, a mesma data de 1995, momento que o mundo vivia o pesadelo de 4 http://thoth3126.com.br/ebola-pandemia-do-virus-foi-criada-na-africa/ http://evunix.uevora.pt/~sinogas/TRABALHOS/2000/virol00_Ebola.htm SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4166 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 uma possível contaminação pelo vírus Ebola.Menéndez e Medina (2001, p.3) ―asseveram que os filmes são um novo espaço, pois outorgam grande valor ao mundo simbólico. São, na verdade, fontes de informação sobre a ocasião em que foram produzidos, refletindo a realidade política e social daquele momento‖. De acordo com autores Monteiro e Bizzo (2011) o modelo biomédico está presente no entendimento da população. De acordo com os teóricos, já no final do século XIX em materiais didáticos encontravam-se abordagens sanitaristas para o ensino, assim como nas orientações dos documentos oficiais, esse modelo tem forte presença no contexto escolar. Assim, ao propor uma discussão sobre o modelo de saúde, biomédica, este filme apresenta um rico repertório e possibilidades para o professor alavancar um olhar mais crítico e atendo dos alunos para questões biológicas como as doenças virais, vacinas, tráfico de animais silvestres, não neutralidade da ciência, questões sociais e culturais, correlacionado os acontecimentos para que os alunos compreendam a saúde como algo mais amplo e complexo, que envolve fatores sociais, políticos, psicológicos e ambiental. ―Uma prova de amor‖ (EUA, 2009) foi o segundo filme analisado. No seu enredo, a discussão central é sobre a leucemia e o tratamento de Kate, o desgaste da relação familiar dos Fitzgerald. Como já mencionado, as midiáticas fílmicas retratam questões emergentes de um dado momento e contexto histórico. Sob essa perspectiva, o referido filme trata de uma temática que neste século XXI, cresce assustadoramente, os casos de neoplasias malignas (câncer), bem como as discussões acerca das doações de órgãos. Informaçõescontidasno SEER (Surveillance, EpidemiologyandResults) revelaram que de 2005 a 2009 a incidência neoplasias malignas (câncer) em crianças de 0 a 14 anos e jovens aumentou em torno de 0,5% por ano, esta tendência tem sido mantidadesde o ano de 1975. Em contrapartida, tendo em vista,os avanços nas estruturas hospitalares e na capacitação e qualificação médica constantemente evoluindo, a mortalidade de criança e adolescentes tem diminuído em 50% nas últimas 3 décadas, de 4,9 em 1975 para 2,1 em 2009.(SOUZA, 2013). O filme ―Uma Prova de Amor‖ (EUA) foi lançado em 2009, dirigido por Nick Cassavetes e tem no elenco Cameron Diaz, Jason Patrick, Abigail Breslin, Sofia Vassilieva, Evan Elligson e Alec Baldwin. O enredo conta a história de uma família cuja filha mais velha tem uma doença muito grave, leucemia.Cansada de lutar contra a leucemia há anos, dos infindáveis tratamentos e agora de um provável transplante de rim Katedecide morrer e pede ajuda para sua irmã caçula, a qual foi projetada e concebida para salvá-la. À pedido de sua irmã Kate, Anna vai aos tribunais e reivindicao direito sobre seu corpo (emancipação médica), com isso o direito de não transplantar o rim para a irmã. Kate SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4167 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 não aguentaria ver sua irmã sofrer mais uma vez todos os procedimentos médicos, como por exemplo, a cirurgiapara o transplante para tentar prolongar sua vida. Mas, Sara não consegue entender o porquê de Anna não querer salvar a irmã. Sara, não percebe a vontade de Kate de acabar com o seu sofrimento e da sua família. A mãeobstinada em manter a vida da filha, não enxerga que a mesma já havia desistido de lutar, de sonhar, de viver desde que seu primeiro amor com o qual pode experimentar algumas aventuras amorosas, morre de complicações da mesma doença, a leucemia. Logo, um ponto que merece destaque no desenrolar da história é o contexto familiar, o quão a família foi vítima da doença, pois durante anos de tratamento sua mãe dedicou maior parte do seu tempo para cuidá-la deixando de lado seu irmão do meio, o qual também necessitava de sua atenção, pois era disléxico, o casamento e sua profissão de advogada. Também Anna, a irmã caçula desde o nascimento foi submetida a intervenções cirúrgicas a fim de manter a vida da irmã mais velha. A adolescente apresenta ao público suas angústias ao perceber que as ações e energias dos membros de sua família giram em torno do cuidado com ela, que seus irmãos não tinham carinho e atenção suficientes de seus pais, em decorrência da sua doença. Na trama, percebemos por meio de algumas cenas, alguns cuidados mais humanizados, por parte da equipe médica tanto para com o paciente como da família, são exemplos dessas situações o acompanhamento dos familiares por psicólogos e uma equipe de assistentes, a orientação do médicode deixar a menina (Kate) em fase terminal fazer um passeio com a família, a qual realiza seu último pedido, ir à praia. Destarte, a partir da análise do filme trazemos para a discussão algumas cenas, estas que abordam as representações de saúde que estão imersas no enredo, destacando o modelo biomédico, comportamental e biopsicossocial. Como resultado de cenas, podemos abordar relações do modelo biomédico este assinalado por Cutolo, (2006 pág.16), ―caracterizado pela explicação unicausal da doença, pelo biologicismo, fragmentação, mecanicismo, nosocentrismo, recuperação e reabilitação, tecnicismo, especialização‖.Comparando o ser humano com uma máquina, levando em consideração o fator de ter saúde aquele associado a ausência da doença. É a doença e sua cura, o diagnóstico individual e o tratamento, o processo fisiopatológico que ganham espaço (CUTOLO, 2006). Destacamos nas cenas a seguir algumas representações deste modelo, retratando essas características sendo elas: a09:25 min – 11:18min, logo pela manhã Sara (mãe) vaiao quarto da pequena Kate que não queria levantar, percebe neste momento o surgimento de alguns SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4168 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 sintomas da doença como a indisposição, logo identifica uma mancha nas costas de Kate, sendo que não existia antes. A partir deste momento, vai a busca de um possível diagnóstico para a menina, recorrendo a ajuda médica. Sãorealizados vários procedimentos médicos comocoletas de sangue, da medula e alguns exames, os médicos constatam aos pais de Kate, Sara e Brian, o diagnóstico da doença, leucemia, começando então uma grande luta pela vida. Nesta cena é visível as abordagens do modelo biomédico, aonde se destaca os sintomas, o diagnóstico da doença e prováveis tratamentos, bem como o tratamento―frio‖ do médico ao informar o diagnóstico da menina aos pais. Na cena 13:58min - 15:35min, diante do diagnóstico de leucemia da filha e da situação desoladora em que se encontram, ficamos diante de um outro fato, a questão ética, quando o médico da família sugere uma nova vida, uma gravidez projetada de acordo com as necessidades de Kate, poderia ser a escolha para prolongar a vida da menina, mas, não a cura conforme coloca o médico, sugerindo uma fertilização in vitro. Desta maneira, Anna é concebida, e como ela em outro momento do filme afirma, para ser ―o seguro de vida da irmã‖. Ela é a combinação genética perfeita para prover material genético à Kate no seu tratamento. Ao desenrolar do filme, é possível perceber uma transição do modelo biomédico para o modelo comportamental, uma visão mais abrangente em relação à doença quando antes se falava em modelo biomédico, sendo que, o foco não está apenas na preservação da saúde, mas de analisar os comportamentos que contribuem para a qualidade de vida do indivíduo, os hábitos de vida adotados, os hábitos alimentares, assim como, o ambiente familiar e social do paciente também se caracterizam como modelo comportamental. Na cena 23:30 min – 26:09min, Sara não aguenta mais ver a filha fechada no seu quarto com vergonha, depressiva, com baixa autoestima, afirmando que as pessoas iriam ridicularizá-la por estar careca e com uma aparência muito abatida. Para amenizar a situação ela resolve cortar/raspar seu cabelo igual ao de Kate. Assim despertando em sua filha uma maior confiança de sair de casa e enfrentar o mundo e sua doença, através deste gesto Kate percebe que é independente da doença e consegue assumir uma postura mais feliz e sadia frente todos os problemas que a cerca. Kate encontra-se em seu quarto,cena 01:20:47 –01:21:16 quebrando as coisas, ouvindo um som alto e bebendo, ao ser questionada por Anna ela diz que está fazendo uma festa de despedida, dizendo: ―Adeus mãe, adeus droga de hospital, vou ver o Taylor! ‖, tomando remédios para morrer. Segundo as contribuições deKovács (2002), raramente os SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4169 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 pacientes são consultados, acerca dos seus desejos, sempre havendo uma preocupação com os sintomas da doença e com a doença em si, deixando-se de lado o indivíduo. Pode-se dizer que Kate foi tomada por raiva, por todo processo que vinha passando e por perder o namorado, Taylor (Thomas Dekker), que também tinha leucemia. Segundo Castiel (2004) ―a abordagem comportamental está interessada primeiramente em alterar os padrões individuais de exposição ao risco, por meio das chamadas ―mudanças comportamentais‖. Na cena 01:22:50 –01:23:44Kate resolveu falar com sua irmã sobre sua vontade de morrer, pois ela já se sentia pronta para enfrentar a morte e que não queria o transplante de rim, ela faz suas considerações o quanto sofrimento sua doença está causando à família. Principiando com sua irmã Anna que várias vezes submetidas a procedimentos clínicos, correndo graves riscos de vida e ainda mais este de doar seu rim a ela, sendo que não teria uma garantia de vida com este procedimento. Também destaca que o casamento de seus pais estar em uma situação complicada, seu irmão mais velho este que tinha problemas de dislexia, mas ninguém percebia. Nas três passagens selecionadas, podemos perceber algumas mudanças de comportamento e atitudes que colaboram para a melhoria da vida da personagem, bem como, de sua família, pois, aspectos emocionais, cognitivos e comportamentais interferem de maneira direta na saúde. Finalmente, o filme com todo seu rico enredo aborda em algumas cenas o modelo biopsicossocial, este que se caracteriza por representar a promoção da saúde, sendo aquele modelo que privilegia a visão integral do sujeito nas dimensões física, psicológica e social, se contrapondo, portanto, ao modelo biomédico. (SILVA et al. 2011) Os cuidados paliativos (assistência) apresentados na cena 40:30 min – 41:39min, fase terminal de vida de Kate, os médicos, assistentes e toda sua equipe tentam contrapor as vontades da mãe em levar a menina para casa, como uma alternativa para que ela pudesse entregar-se ao seu fim, mostrando um olhar mais humanizado, dizendo não para os avanços medicinais, aos quais exaustivamente foram testados. O médico e equipe tentam convencer a mãe de enfrentar a morte de Kate em casa em contato com a família, com um ambiente onde ela possa se sentir melhor nos últimos dias de vida que restam, assim como, proporcionando para a família a oportunidade de viver esse luto saudável. Outra cena 01:05:34 – 01:07:21 que é aceitável perceber uma abordagem biopsicossocial é a parte em que o pai consegue entender através da equipe médica, que Kate precisa de um ambiente mais humanizado e uma melhor qualidade de vida,aceitando assim sua vontade de ir à praia. Na cena 01:09:22 – 01:13:31Kate se sente melhor consegue SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4170 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 esquecer por algum tempo seus problemas e sentir-semelhor neste ambiente.Discutir saúde e doença na escola perpassa por um entendimento mais amplo e profundo do que de fato seja esse conceito, que muito mais do que isolar, identificar e tratar, é importante prevenir, ter uma formação que contemple o sujeito em seu contexto e na sua integralidade. Portanto, vemos que o cinema pode ser um aliado do professor para incitar essa e outras discussões sobre saúde, mas é necessária, uma formação inicial, que contemple uma compreensão mais alargada de saúde. Considerações finais A partir das análises dos filmes comerciais, ―Epidemia‖ (1995) e ―Uma prova de amor‖ (2005), podemos pensar e refletir sobre os modelos de saúde. Lembrando que cada filme contém suas especificidades, mas, ambas as películas retrataram situações reais de determinadas épocas ao tratarem da doença viral ebola e da leucemia, temas relevância no ensino de Biologia. Embora a descrição das cenas simule muito pouco a imponência destes filmes comerciais, foi possível retirar múltiplas informações para discussão de temas biológicos, ambientais,políticos, culturais e sociais em sala de aula, pensando num entendimento mais amplo da educação em saúde. Acreditamos ser necessário ampliar a discussão, apropriação e significação da educação em saúde no espaço escolar, a fim de que todos os atores envolvidos no processo de ensino e aprendizagem abordem, tratem e reflitam de uma maneira mais abrangente as questões de saúde. O trabalho desenvolvido com esses dois filmes possibilitou perceber que esses são instrumentos poderosos no ensino, contudo é notável o número reduzido de publicações que tratam conjuntamente do uso de filmes para discutir temas de educação em saúde e o trabalho pedagógico do professor, os quais poderiam servir de subsídio para auxiliar tanto em pesquisas como na prática docente. Pois, o trabalho com filmes possibilita ao professor promover debates, discussões, atividades e aprendizagens sobre várias temáticas. Em nossa imersão nessas midiáticas podemos identificar as três abordagens de saúde: biomédica, comportamental e biopsicossocial, bem como perceber as relações dessas com os contextos social e ambiental, a fim de possibilitar um alargamento nas compreensões de educação em saúde na escola. Porém, é importante frisarmos que o planejamento do trabalho com o cinema em sala de aula requer muito do professor, visto que ele deva estar preparado, assistido ao filme anteriormente, realizado suas análises e conclusões, para que os objetivos com o uso de filmes SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 4171 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 em sala de aula sejam atingidos, e os alunos percebam como o filme pode ser um instrumento com potencial no ensino. Referências BATISTA, Ana Rita Almeida. Perceção dos profissionais de saúde face à adesão dos utentes aos programas de reabilitação. Tese de Doutorado. Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu.2014. CASTIEL, L. D. Promoção de saúde e a sensibilidade epistemológica da categoria ‗comunidade‘. Revista de Saúde Pública, São Paulo, 38(5), 2004.p. 615-622. CUTOLO, L. 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