Aprendizagens Mútuas em Situação de Cuidados

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APRENDIZAGENS MÚTUAS EM SITUAÇÃO DE CUIDADOS PALIATIVOS:
O PAPEL DO EDUCADOR HOSPITALAR
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Profa. Dra. Sandra Papesky Sabbag
Telefone: (11) 98512-9355
E-mail: [email protected]
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Doutora e Mestre em Psicologia da Educação (PUC-SP), Pedagoga (USP). Acesso ao currículo
na plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/9132027088336273
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SUMÁRIO
Introdução
p.3
Objetivos
p.8
Desenvolvimento
p.9
Resultados obtidos
p.12
Referências Bibliográficas/Bibliografia
Agradecimentos
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INTRODUÇÃO
A ELABORAÇÃO PSÍQUICA DA DOR
“A dor é uma ferida que precisa de atenção para ser curada. Atravessá-la e superá-la
significa encarar nossos sentimentos honesta e abertamente, expressando-os e liberando-os por
completo, tolerando-os e aceitando-os por quanto tempo for preciso, até que a ferida se cure.
Temos medo de que a dor nos derrube se tomarmos conhecimento dela. A verdade é que a dor,
quando nos permitimos experienciá-la, se dissolve, passa. A dor não expressa é dor que dura
indefinidamente.” (TATELBAUM, Judy, apud RINPOCHE, 2008: 391)
Apesar de reconhecermos que a dor marca também a experiência do gênero humano,
aprendemos desde cedo a eliminá-la tão logo a sentimos, sem procurar compreender através dela.
A automedicação, por exemplo, é uma atitude que exemplifica esse nosso “medo de sentir dor”.
Isto sem falar nas dores que não passam com analgésicos comuns: dor de cotovelo, dor de
mágoa, dor de amor não correspondido, desconforto do nó na garganta quando a alma parece
sufocada, dor da perda de um ente querido...dores humanas que recusamos a enfrentar muitas
vezes, dores das quais fugimos pela rotina estafante do cotidiano, iludindo-nos de que “não pensar
na dor já seja suficiente para não senti-la ou eliminá-la” e, assim, caímos na condição da dor que
dura indefinidamente como revela a citação acima. Nesta condição, a dor muda de cara, mas sem
deixar de ser dor: fica com cara de medo, de timidez, de ansiedade, de fobia, de agressividade, de
tantas outras formas de maus jeitos consigo e com o mundo.
Comigo não foi tão diferente até pouco tempo atrás. Tive o privilégio de conviver com um
companheiro com câncer de próstata por aproximadamente 8 anos, tempo que durou nossa união
conjugal. Motivados pela paixão e pelo Amor, vivenciamos as dores e as alegrias que marcaram as
diferentes fases da progressão da doença, do tratamento e de suas sequelas: prostatectomia,
radioterapia, hormonioterapia, perda da capacidade muscular da bexiga (devido a radioterapia) uso
de sonda, cateterismo intermitente, cistostomia, quimioterapia. Outras dores estavam associadas à
progressiva limitação física: ansiedade a cada exame de PSA, qualquer dor (até unha encravada)
podia significar metástase, a perda de qualidade da vida sexual, a mudança de outros tantos
planos tão sonhados, a aposentadoria por invalidez, as várias procurações em cartório para que eu
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pudesse decidir e intervir socialmente por ele, o medo de sofrer, o medo de morrer – e de morrer
de dor insuportável.
Em meio a tudo isso que compôs nossa história de vida juntos, buscávamos formas de nos
divertir e de enfrentar a realidade que insistia em nos fazer o convite ao enfrentamento como via de
superação e de aprendizagem. O amor cresceu e transformou-se numa forma de Amor mais
fraterna, incondicional, capaz de também durar indefinidamente pelo potencial de nos aproximar
como pessoas em condição de educação permanente, condição esta em que as trocas mútuas e
incessantes, a reciprocidade, a cumplicidade tornam-se as principais ferramentas de apoio à Vida.
Resolvemos integrar efetivamente o tema da morte em nossas Vidas quando descobertas
as metástases de pelve, ossos, fígado e pulmão. A quimioterapia paliativa trouxe-nos à realidade:
nascer e morrer são etapas do ciclo natural da vida, no entanto, a proximidade de lidar “de perto”
com a morte ao vivenciar doenças terminais como câncer e AIDS (e mesmo as doenças
autoimunes) pode causar uma reconfiguração no modo como olhamos a Vida e passamos a nos
relacionar com ela: cada dia tem começo, meio e fim – o plano é do dia, é do curto prazo, pois a
dimensão a médio e a longo prazo passam a não fazer mais parte de nosso repertório. Ao invés de
almejarmos a cura, almejamos a minimização da dor, o “sofrer menos possível”. E passamos a nos
contentar com as coisas mais simples: a vontade de comer um doce sem enjoar, ficar sem
náuseas por um dia, conseguir andar um quarteirão sem ficar com a sensação de que deu a volta
no mundo, e ainda ter uma palavra de conforto para a pessoa que demonstra ter dó de seu estado
e não consegue esconder por trás daquele olhar: “Nossa, não acredito que isto está acontecendo
com ele/a...”
Continuei minha rotina de trabalho profissional, mas assumi definitivamente o papel de
cuidadora. Trabalhava sem parar, fora e dentro de casa, em constante estado de alerta, tentando
escutar meu parceiro, compartilhar um pouco da sua dor, do seu sofrimento, desde que percebi
que sua alegria não mais sorria nos seus lábios. Buscava ler, compreender, dialogar com outras
pessoas, desenhar, escrever, arrumar e desarrumar gavetas como se assim eu conseguisse me
arrumar um pouco por dentro, pois eu também doía de uma dor que não se descreve por falta de
palavras. Até que um dia encontrei as palavras que traduziam minha angústia:
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“A pessoa com câncer não tem nenhuma escolha a não ser suportá-lo, mas o cuidador tem
de decidir o tempo todo ficar lá. E tem sido muito duro para mim, como cuidadora, superar a
tristeza ou a sensação de pisar em ovos ao lado da pessoa, ou conviver com suas escolhas de
tratamento. O que devo fazer e como devo apoiá-la? Devo ser honesta sobre o que realmente
sinto? Para o cuidador é como uma montanha-russa emocional. E o que me faz normalmente ficar
é o amor. Simplesmente amá-la, isso é o mais importante.” (Vicky Wells, apud WILBER, 2007: 332)
Observava com rigor os cuidados com a sua alimentação, higiene, temperatura; tinha de
pagar as contas, fazer de tudo por mim e por ele, preparar minhas aulas, coordenar o curso e, em
meio a isso tudo, tinha uma vontade de sumir, de ficar só de repente, de cuidar de mim. Fui me
dando conta de que eu também adoecia moral e espiritualmente e necessitava de introspecção,
cuidados dos outros, ajuda, solidariedade. Passei a verbalizar isso, e mesmo quando não o fazia
meu silêncio já tudo dizia, meu cansaço era visível.
Até que um dia, meu esposo querido virou-se para mim e disse: “San, me leva pro hospital
que já não tenho mais forças nas pernas...” E foi assim que o internei pela última vez, em
05/02/2010: já na cadeira de rodas, dependendo das pessoas para tudo: comer, andar, ir ao
banheiro, tomar banho, escovar os dentes,...isso parece que se deu do dia para a noite, mas na
verdade o comportamento manifesta-se assim como resultado de um processo de degeneração
orgânica crescente, lenta e progressiva.
Os últimos 38 dias de hospitalização que precederam a morte biológica de meu esposo
foram cruciais para que eu intensificasse minha atenção nas múltiplas possibilidades de
aprendizagem que a situação convidava-me a vivenciar. Comecei a refletir com mais profundidade
em algumas leituras que me foram de fundamental importância ao longo do período de julho/2009
a março/2010, sobretudo os livros Graça e Coragem e O Livro Tibetano do Viver e do Morrer
(ambos indicados como referências).
Passei a vislumbrar possibilidades de “ajudar as pessoas a morrerem bem, por ajudá-las a
viver com mais intensidade e interesse cada dia, cada instante”. Era exatamente isso que fazia
com meu esposo: dialogava com ele (mesmo nos momentos de sua “inconsciência”), colocava as
músicas de sua preferência, acariciava-o, beijava-lhe as mãos, os lábios, a testa, cortava suas
unhas, fazia sua barba, abraçava-lhe sempre que podia. Passei a compreender que sua forma de
comunicar nos últimos dias era através da agitação motora, da eventual fala desconexa, do não
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querer comer. Aprendi a aceitar seu novo padrão de comunicação: mexer-se demais, os picos de
febre e tremores, sua mão na minha porque por mim colocada. Acreditava (e acredito) que ainda
que inconsciente, o espírito/mente percebe de algum modo a energia do toque, da música, da
palavra, pois a convicção de que a morte biológica é um evento que simultaneamente encerra e
prenuncia outro ciclo sempre ecoara em mim, e cada vez mais era fortalecida pelas circunstâncias
que eu e ele vivemos juntos, transitando pela complexidade da doença como companheira de
nossos dias, com lições a ensinar-nos.
O PAPEL DO EDUCADOR HOSPITALAR
Os princípios filosóficos da transitoriedade da vida terrena e da transcendência da morte
biológica numa perspectiva de continuidade da existência humana mobilizaram-me à escrita deste
projeto.
O desejo é estar efetivamente junto com o outro nessa passagem, é atuar na travessia, é
ajudar a estabelecer pontes entre o passado e um incerto porvir, sem qualquer apelo moral ou
religioso, antes respeitando as crenças e os princípios protagonizados pelo paciente e/ou familiar.
“Basta estar junto”, como dizia meu esposo, fosse com o calor do toque, o olho no olho, ora no
silêncio, ora na situação de diálogo. Basta ser humano e vivenciar a empatia, esta capacidade de
se colocar no lugar do outro; basta ser autêntico e espontâneo (coerente consigo mesmo) no
sentido de disponibilizar o seu melhor para que a dignidade de ambos seja preservada, alimentada
e transmutada nessa perspectiva cíclica e complexa do viver humano que de modo observável
inicia-se com o nascimento e conclui-se com a morte biológica.
Quanto à ascendência ao nascimento e à descendência da morte, são temáticas
existenciais que marcam a filosofia e a história da Humanidade. De qualquer modo, são questões
que nos aproximam, mas moldam-se à “verdade sagrada” de cada pessoa. O respeito às verdades
de cada um é que deve sustentar os processos de aproximação, constituição do vínculo afetivo e
realização de atividades parceiras possíveis que impliquem em aprendizagens mútuas
propriamente ditas (descritas no item Metodologia).
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É justamente esse clima de respeito às individualidades que vai permitir ao educador
hospitalar atuar sem fugas ou atropelos, podendo mediar a passagem para o porvir incerto,
ajudando os envolvidos a construirem a percepção de que ainda que o caminho seja dolorido e
povoado de incertezas, as aprendizagens podem ser mútuas, benéficas e prazerosas quando o
sentimento de parceria se qualifica como fraterno, porque honesto e compromissado com as
sutilezas que podem gerar algum conforto e, por isto, facilitar o aprendizado na esfera terrena
minimizando a dor da agonia que muitas vezes ainda são verbalizadas pelos pacientes com outros
nomes e formas de expressão do tipo: parece que não caibo mais em mim mesmo, quero dormir
por dias a fio, não vejo a hora de tudo isso acabar e poder voltar para casa (em estado de
confusão mental, podem não referir-se diretamente à casa material na qual moraram, mas à
sensação de conforto e segurança aprendidas no decorrer da vida associadas à ideia de lar).
Cabe ao
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educador hospitalar propiciar a pacientes e familiares experiências que a
sabedoria oriental tibetana ensinou-me particularmente ao longo desse último ano com meu
esposo: ser livre do apego às experiências boas e livres da aversão às experiências negativas.
(RINPOCHE, 2008: 109). Propiciar essas experiências requer a sensibilidade do educador
hospitalar em conduzir o paciente e/ou familiar a redirecionar o olhar para dentro de si.
“Olhar para o interior exige de nós grande sutileza e coragem - nada menos que uma
mudança completa em nossa atitude em relação à vida e à mente. Estamos de tal modo viciados
em olhar para fora de nós mesmos, que perdemos quase por completo o acesso ao nosso ser
interior. Ficamos apavorados com a ideia de olhar para dentro, porque nossa cultura não nos dá a
mais vaga ideia do que encontraremos. Podemos até pensar que se o fizermos correremos o risco
de enlouquecer. Esse é um dos últimos e mais engenhosos estratagemas do ego para evitar que
descubramos nossa verdadeira natureza.
(...)
Às vezes penso que não queremos fazer perguntas verdadeiras para saber quem somos,
por medo de descobrir que existe uma outra realidade diferente desta. O que essa descoberta faria
da maneira como vivemos até agora? Como nossos amigos e colegas reagiriam ao que agora
sabemos? Que faríamos com esse novo saber? Com o conhecimento vem a responsabilidade. À
vezes, mesmo quando a porta da cela se escancara, o prisioneiro prefere não sair.” (RINPOCHE,
2008: 80-81)
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Educador hospitalar: pessoa que se dispõe a realizar ações intencionais e sistemáticas em ambiente
hospitalar, numa perspectiva de colaborar com aprendizagens mútuas de todos os envolvidos nessas ações,
inclusive ele próprio. O significado de educador hospitalar que proponho integra a dupla condição de
ensinante e aprendente nesse contexto.
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Lidar com a proximidade da morte pode ajudar o paciente a fazer este movimento de olhar
para si. Sem ter nada a perder, pode ser a ocasião do maior ganho nesta Vida: encontrar-se
consigo mesmo. Rever os feitos, reconciliar-se consigo e tentar fazer o mesmo com os outros, falar
o que pensa, externar seus sentimentos, tornar realidades até então sonhadas. Dentro dos limites
impostos pela doença, expandir-se como Pessoa, estabelecer finalmente relações autênticas com
os outros, fazer do tempo seu aliado para fazer valer cada dia, cada momento, superando o que
muito se faz com o tempo: o adiamento das coisas que realmente importam e que acredito
sobreviver à morte do corpo: a transparência da sua humanidade possível com todas as virtudes e
dificuldades que integram-nos. Ser quem se é, de fato.
Por outro lado, educadores hospitalares ao se colocarem como parceiros do paciente cuja
doença o convida insistentemente a olhar para si, só poderão efetivamente ajudá-lo nesse
processo se também se dispuserem a fazer o mesmo, isto é, olhar para si e realizar tudo que esse
olhar demanda em condições saudáveis, demonstrando aprender com a experiência do outro. Em
condições saudáveis, estabelecer relações mais autênticas com a Vida, ser mais honesto consigo
mesmo, cuidar de si, valorizar as possibilidades de aprendizagem que aparecem e redimensionar o
tempo, evitando adiar compromissos e possibilidades de comunicar sentimentos e pensamentos.
Nesse sentido é que estabelecem-se experiências de aprendizagens mútuas entre pacientes, seus
familiares e educadores hospitalares. Desse modo, todos se ajudam na complexa teia da vida,
onde caminhos se cruzam para alguma finalidade existencial máxima que podemos supor que
inclua viver e morrer bem, como experiências comuns a todos nós.
OBJETIVOS
- colaborar na assistência a pacientes em etapa de cuidados paliativos e seus familiares;
- propiciar momentos de conforto de ordem mental/emocional/espiritual através da
alternância de diálogo e silêncio, da compreensão da relação entre corporeidade e comunicação,
do favorecimento de preferências (assuntos, leituras, músicas, memórias);
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- dialogar com as equipes de profissionais de saúde e familiares, facilitando aproximações
entre ambos dada a observação do comportamento e escuta do paciente em situações de
interação com o educador hospitalar;
- facilitar o contato e a reflexão sobre os eventos cíclicos que marcam a existência humana
(nascer, viver, morrer, porvir incerto ou pós-morte), respeitando as convicções de ordem religiosa
ou filosófica de pacientes e familiares.
DESENVOLVIMENTO
METODOLOGIA
Como o programa se pauta numa abordagem educacional, esta caracteriza-se pela
intencionalidade e sistematização de ações voltadas aos objetivos propostos. Para facilitar a
explicitação de possíveis ações (as quais me pautei na experiência com meu esposo e na
experiência com outra paciente que conheci no hospital, em condições similares às dele e que de
algum modo ofereceu-me apoio à escrita deste projeto em poucos dias), apresento-as em etapas
que podem ajudar a definir a periodicidade das visitas do educador hospitalar, bem como os
critérios para sua adesão a essa atividade voluntária.
Etapa da aproximação – conhecimento do paciente que demonstrar potencial em querer
receber as visitas do educador hospitalar pela equipe de enfermagem; apresentação de ambos
pela mediação da equipe de enfermagem; breve explicitação do programa pelo educador
hospitalar: “receber visitas sistemáticas (definir o período) para dialogar, ‘estar junto’, fazer novas
amizades, enfim, tornar mais prazerosa a estadia no hospital”; consentimento (ou não) do paciente
e familiar (pode ser que às vezes apenas o familiar vá desejar esse contato em razão do desgaste
físico e psíquico em que se encontra e possa vislumbrar momentos nos quais será ouvido e
cuidado);
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Etapa da formação do vínculo de confiança – situação de conversa (quando for
possível) na qual o paciente fala de si, conta de sua vida, fala da doença, enfim, o tom da conversa
é dado pelo paciente e cabe ao educador hospitalar também falar de si procurando sintonizar-se
com o tom da condução da conversa dado pelo paciente (por ex.: falar da vida pessoal e/ou
profissional, compartilhar preferências e coisas que não gostam seja na atitude das pessoas, seja
em relação a si mesmos/as, etc);
Etapa das aprendizagens mútuas – à medida que o vínculo de confiança vai se
fortalecendo, dialogar torna-se oportunidade de refletir sobre a Vida, sobre estar ali no hospital,
sobre o que a visita do educador hospitalar tem proporcionado ao paciente/familiar em termos de
experiências/aprendizagens, do mesmo modo sobre o que o contato com o paciente/familiar tem
proporcionado de aprendizagens ao educador hospitalar. Podem combinar realizar algumas
atividades parceiras juntos como, por ex., a escrita de um diário ou cartas (o educador se coloca
na condição de escriba), compartilhar fotografias de episódios significativos da vida de ambos, etc.
OUTRAS CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS IMPORTANTES
Caso o paciente manifeste “confusão mental” ou mesmo mantenha-se desacordado, cabe
ao educador falar com ele, tocá-lo, contar-lhe algo de si, fazer uma leitura ou cantar uma canção
que saiba ter sido um dia de seu repertório preferido. É importante que a sensibilidade intuitiva do
educador hospitalar bem como o diálogo com os profissionais da saúde inspirem-lhe as melhores
situações de interação com pacientes e familiares envolvidos no programa.
Falar da vida, da morte, de medos e inseguranças podem vir à tona em qualquer uma das
etapas descritas; é importante que o educador hospitalar se paute sempre na condição de que
deve falar ou responder àquilo que o paciente/familiar manifestar desejo e ansiedade. Também
deve falar e responder à medida que perceber que houve satisfação da outra parte, ou seja, nem
falar mais, nem menos, mas o suficiente para aquele momento.
Caso haja algum imprevisto e o educador hospitalar fique impedido de comparecer no dia e
horário combinados, deve telefonar ou avisar de alguma maneira o paciente/familiar que o espera.
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É preciso cuidar de oferecer retornos, feedbacks, pois isto demonstra respeito e reforça o elo de
confiança e cumplicidade entre as pessoas envolvidas.
Ao educador hospitalar caberá registrar detalhes que julgar importantes após a visita, pois
isto o ajudará a pensar o próximo contato, a planejar algo ou a selecionar algum material para
apresentar ao paciente/familiar (ex.: livro, imagens, fotos...). Isto revela também o cuidado, a
atenção, o compromisso com a continuidade da relação de aprendizagem entre as pessoas. A
sistematização de ações educativas implica necessariamente planejamento e continuidade; não se
trata de visita improvisada, mas de visita planejada (que significa lidar também com a
imprevisibilidade de situações, numa perspectiva criativa, flexível, porém sustentada por elementos
já pensados que facilitam a reconfiguração de alguma ação).
PERIODICIDADE DAS VISITAS DO EDUCADOR HOSPITALAR
As visitas podem ser diárias ou semanais, mas deve-se considerar tanto a disponibilidade
do educador hospitalar quanto o quadro clínico do paciente e disponibilidade do familiar que deseja
participar do programa.
CRITÉRIOS DE ADESÃO DO EDUCADOR HOSPITALAR
ï Conhecer primeiramente o projeto ao manifestar interesse pelo “trabalho voluntário”
(saber que tipo de trabalho é este, em que estado o paciente se encontra, bem como as possíveis
condições psíquicas de seus familiares diante da gravidade do quadro);
ï Disponibilizar-se a aprender com o outro (pacientes, familiares, profissionais da Saúde e
da Educação), independente de convicções religiosas e filosóficas e da diversidade cultural;
ï Comprometer-se com as visitas nos dias e horários programados;
ï Disponibilizar-se para dialogar sobre o trabalho com outros educadores em situação de
encontro de formação, mediado pela responsável pela supervisão do programa.
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RESULTADOS OBTIDOS
O projeto foi elaborado em 2010 e encaminhado para alguns hospitais privados do
município de São Paulo. Apresentei-o em Congresso Internacional com foco na Sustentabilidade
(Cuba, fevereiro/2012) com aprovação do Comitê Científico da Universidade de Medicina de
Havana. Há um vídeo no Youtube em que divulgo esta proposta. Infelizmente, 4 anos da sua
idealização e não tive retorno de Instituições de Saúde para tornar o projeto parte da política
interna hospitalar. Nesse período, desenvolvo-o como cidadã, na modalidade de trabalho
voluntário, quando sou contactada por algum membro da família de paciente em situação paliativa,
ou mesmo indicada por profissional da Saúde que já me conhece. Contactada, inicio e participo
junto aos pacientes e familiares em hospital no horário destinado para visitas.
Nesses 4 anos, colocar o projeto em prática, tem me permitido acompanhar as pessoas em
seus conflitos, ser confidente, ser mediadora de diálogos entre pacientes e familiares e/ou
membros da equipe profissional. Creio que pela natureza desta ação, quantificar não é preciso. De
todo modo, pude acompanhar 4 pessoas que já foram a óbito e mantenho contato com outras em
tratamentos paliativos, porém em domicílio. De acordo com as necessidades das pessoas, busco
aprender formas de propiciar conforto: cuido das unhas, faço massagens, leio, fico perto sem falar
nada, falo de mim quando querem saber, estudo Medicina Quântica (GOSWAMI, 2006) e aplico
toque quântico - energização com toques leves em partes do corpo da pessoa (GORDON, 2008);
já providenciei alguma guloseima preferida quando houve liberação da dieta; ajudei em tarefas de
desapego de roupas e outros pertences (quando o paciente pede sugestão do que fazer com o que
não irá mais usar); participei de cerimônias de cremação na escolha de músicas prediletas para
homenagear o ente que partiu, bem como para proferir palavras de conforto a todos, a pedido da
família que me agregou nesse período de convívio; também já rendi o familiar-acompanhante
durante a madrugada para que fosse para casa dormir um pouco, troquei fraldas, auxiliei na
higiene pessoal e troca de curativos e...estive presente em momentos que precederam a morte
biológica, para abraços de despedida.
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Essas são algumas ações e aprendizagens que têm colaborado para ambas as partes,
para que a transição seja mais leve e sempre com indício de cura: mesmo que o corpo não
evidencie sinais de cura, a energia, o espírito, a alma, ou qualquer outro termo que valha para o
que fica de nós e transcende a vida na matéria, siga na trajetória muldimensional da existência das
espécies vivas do Universo.
Hoje gostaria de trabalhar, como educadora hospitalar, junto a equipes multidisciplinares
de cuidados paliativos profissionalmente (e não apenas voluntariamente), tendo em vista a
dedicação de tempo e investimento emocional, espiritual, intelectual e físico que a tarefa exige.
Aguardo oportunidade e serviço, e defendo a tese de que todos nós, sem exceção, na Terra,
estamos em condição paliativa: necessitamos de cuidados mútuos, de fraternidade, de
companheirismo, de Amor, de escuta sem julgamento, de apoio e incentivo ao exercício de uma
autonomia que se consagra na reciprocidade, da liberdade responsável em relação a si e ao outro,
do respeito às singularidades – o que vai ao encontro de ações ambientais sustentáveis porque
sustentabilidade pressupõe atitudes humanitárias baseadas no respeito, na compaixão, na
empatia.
Em tempos em que testemunhamos “os riscos de viver numa sociedade de mercado”,
como analisa o filósofo e professor de Harvard, Michael Sandel (REVISTA GALILEU, 2014), por
experiência própria ou por observação, vivenciamos esses riscos traduzidos pela descartabilidade
a que estamos sujeitos e sujeitamos os outros, pela falta de consideração, pela ausência da atitude
de não se colocar no lugar do outro, nas ocasiões da prestação de um favor somente na condição
de receber algo em troca. Nesse contexto, este projeto tem por finalidade resgatar o melhor do
humano em cada um de nós, devolvendo-nos a condição identitária digna de ser único no mundo
tal como nosso semelhante, independente de situação socioeconômica, raça, cultura, opção
sexual, religião, de estar são ou doente. Aprendizagens mútuas em situação de cuidados
paliativos: o papel do Educador Hospitalar pode qualificar nossa existência na Terra e, como
temos aprendido ao participar da realização deste trabalho, a perceber que nossa Família Humana
se amplia, pois sempre haverá quem cuide, quem possa estar perto, quando os laços frágeis da
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consanguinidade são superados pelos laços fortes da Fraternidade, estes sim que permitem
comunidades globais efetivamente sustentáveis.
REFERÊNCIAS
GORDON, Richard. Toque Quântico: o poder de curar, 3ª.edição. SP: Madras, 2008.
GOSWAMI, Amit. O Médico Quântico: orientações de um físico para a Saúde e a Cura. SP:
Cultrix, 2006.
REVISTA GALILEU. Você venderia seu rim? Nem por R$ 350 mil? SP: Editora Globo, no.276,
julho/2014, p.40-49.
RINPOCHE, Sogyal. O Livro Tibetano do Viver e do Morrer, 11ª. edição. SP: Talento/Palas
Athena, 2008.
WILBER, Ken. Graça e Coragem: espiritualidade e cura na vida e morte de Treya Killam Wilber.
SP: Gaia, 2007.
BIBLIOGRAFIA
BARBIER, René. A Pesquisa-Ação (tradução de Lucie Didio). Brasília: Plano Editora, 2002.
DAMÁSIO, António R. O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. SP: Companhia
das Letras, 1996.
________. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos sentimentos. SP: Companhia das
Letras, 2004.
KÜBLER-ROSS, Elisabeth. A Roda da Vida: memórias do viver e do morrer. RJ: Sextante, 1998.
LESHAN, Lawrence. O câncer como ponto de mutação, 3ª. edição. SP: Summus, 1992.
MORIN, Edgar. A Via para o futuro da Humanidade. RJ: Bertrand Brasil, 2013.
SERVAN-SCHREIBER, David. Podemos dizer adeus mais de uma vez. RJ: Objetiva; Fontanar,
2011.
VARELLA, Drauzio. Por um fio. SP: Companhia das Letras, 2004.
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AGRADECIMENTOS
Aos Queridos
Roberto e Nelma
Sem Vocês, eu não teria me disponibilizado para compreender a Dor, a Vida, a Morte.
Sem Vocês, meus medos teriam continuado maior do que Eu.
Com Vocês, minha coragem ousou fluir e meus medos ficaram pequeninos
Do tamanho que consigo carregá-los e transformá-los
Quem sabe até, brincar com eles.
E perceber que posso morrer de tudo, menos morrer de medo
E isto já não é uma das maiores lições desta Vida?
Minha Gratidão e meu Amor Incondicional, sempre.
Sandra
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