Cirurgia robótica

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Dezembro 2011/Janeiro-Fevereiro 2012
Ano 2 s no 9
Oncologia para todas as especialidades
Especial SBOC
XVII Congresso Brasileiro de
Oncologia Clínica: muito além
da oncologia clínica
Entrevista
Uma nova forma de abordar as
doenças não transmissíveis:
uma entrevista com Gene Bukhman,
da Universidade Harvard
Quiz
Teste seus conhecimentos
em oncologia
Cirurgia robótica
Sempre a melhor opção?
Conheça as vantagens, as desvantagens
e as polêmicas dessa técnica
ginecologia | nutrição | do bem
sumário
entrevista
8
capa
12
Cirurgia robótica: vantagens, desvantagens e polêmicas da técnica
aplicada à oncologia
especial SBOC
18
XVII Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica: na ausência de grandes
novidades científicas, a interdisciplinaridade foi a palavra de ordem
nutrição
30
Avaliação e planejamento nutricional em câncer
Dan Linetzky Waitzberg, Letícia De Nardi, Lilian Mika Horie
e Claudia Cristina Alves
ginecologia
38
Prevenção do câncer de ovário
Jesus Paula Carvalho
do bem
42
Unidades móveis de prevenção levam informação
e prevenção de câncer aos cantos distantes do Brasil
quiz
46
A cada edição, um caso novo e pouco comum. E o diagnóstico é...
Evandro Lucena
curtas
48
Notícias da indústria, iniciativas, prêmios:
um giro pelo mundo da oncologia
calendário
50
Programe-se: eventos e congressos
para anotar na agenda
Com um modelo inovador de abordagem das doenças não transmissíveis, o professor de Harvard Gene Bukhman propõe uma maneira
diferente de enxergar a saúde
Conselho
editorial
Editor clínico:
Sergio D. Simon
I – Cancerologia clínica
Oncologia clínica:
André Moraes (SP)
Anelisa Coutinho (BA)
Auro Del Giglio (SP)
Carlos Sampaio (BA)
Claudio Petrilli (SP)
Clarissa Mathias (BA)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Fernando Medina (SP)
Gothardo Lima (CE)
Igor Morbeck (DF)
João Nunes (SP)
José Bines (RJ)
Karla Emerenciano (RN)
Marcelo Aisen (SP)
Marcelo Collaço Paulo (SC)
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)
Nise Yamaguchi (SP)
Oren Smaletz (SP)
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)
Roberto Gil (RJ)
Sebastião Cabral Filho (MG)
Sérgio Azevedo (RS)
Sergio Lago (RS)
Onco-hematologia:
Carlos Chiattone (SP)
Carmino de Souza (SP)
Daniel Tabak (RJ)
Jane Dobbin (RJ)
Nelson Spector (RJ)
Vânia Hungria (SP)
Transplante de medula:
Jairo Sobrinho (SP)
Luis Fernando Bouzas (RJ)
Nelson Hamerschlak (SP)
Yana Novis (SP)
II – Biologia molecular
Ada Alves (RJ)
André Vettore (SP)
Carlos Gil (RJ)
Helenice Gobbi (MG)
José Cláudio Casali (RJ)
Luísa Lina Villa (SP)
Maria Isabel Achatz (SP)
III – Cancerologia
cirúrgica
Neurologia:
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)
Marcos Stavale (SP)
Cabeça e pescoço:
Luis Paulo Kowalski (SP)
Vergilius Araújo (SP)
Tórax:
Angelo Fernandez (SP)
Riad Naim Younes (SP)
Abdômen:
Ademar Lopes (SP)
José Jukemura (SP)
Laercio Gomes Lourenço (SP)
Marcos Moraes (RJ)
Paulo Herman (SP)
Mama:
Alfredo Barros (SP)
Antonio Frasson (SP)
Carlos Alberto Ruiz (SP)
Maira Caleffi (RS)
Urologia:
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)
Miguel Srougi (SP)
Ginecologia:
Jorge Saad Souen (SP)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Sophie Derchain (SP)
Tecido osteoconjuntivo:
Olavo Pires de Camargo (SP)
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)
IV – Radioterapia
Ludmila Siqueira (MG)
Paulo Novaes (SP)
Robson Ferrigno (SP)
Rodrigo Hanriot (SP)
Wladimir Nadalin (SP)
V – Cuidados paliativos
e dor
Ana Claudia Arantes (SP)
Claudia Naylor Lisboa (RJ)
Fabíola Minson (SP)
João Marcos Rizzo (RS)
Ricardo Caponero (SP)
Ano 2 • número 9
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
Editorial Lilian Liang
[email protected]
Sergio Azman
[email protected]
Comercial Simone Simon
[email protected]
Direção de arte Luciana Cury
[email protected]
Pré-impressão Ione Gomes Franco
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
Acompanhe a Onco& no
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6
Impressão: Ipsis Gráfica e Editora
Tiragem: 10 mil exemplares
ISSN: 2179-0930
Jornalista responsável: Lilian Liang (MTb 26.817)
Colaboraram nesta edição: Andrea Murta, Claudia
Cristina Alves, Conceição Lemes, Dan Linetzky
Waitzberg, Evandro Lucena, Jesus Paula Carvalho,
Letícia De Nardi, Lilian Mika Horie
ERRATAS (edição número 8)
Na matéria “A vez da oncogeriatria”, a especialista
Theodora Karnakis foi erroneamente descrita como
responsável pelo programa de geriatria do Hospital
Israelita Albert Einstein. Ela é responsável pelo programa de oncogeriatria do mesmo hospital.
Na matéria “Quem cuida do cuidador”, ed. 8, as imagens da página 53 são do livro De Volta para Casa –
Um Documentário sobre o Tratamento Domiciliar no
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
Brasil, de André François. As imagens da página 55 é que pertencem ao livro Cuidar – Um Documentário sobre a Medicina Humanizada no Brasil, do mesmo autor.
A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, uma publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica, traz
informações sobre oncologia a profissionais de todas as especialidades
médicas. De circulação bimestral, tem distribuição nacional e gratuita
por todo o território nacional. A reprodução do conteúdo da revista é
permitida desde que citada a fonte. A opinião dos colaboradores não
reflete necessariamente a posição da revista.
Avenida Vereador José Diniz, 3720 – cj. 406
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Um ano de conquistas
N
O ÚLTIMO SÁBADO DE OUTUBRO, RECÉM-
XVII CONGRESSO BRASILEIRO
DE ONCOLOGIA CLÍNICA, EM GRAMADO, FUI
recebida pela manchete no Jornal Nacional: “Expresidente Lula está com câncer na laringe e vai
passar por sessões de quimioterapia e radioterapia
a partir de segunda-feira”.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de algumas semanas com dores na garganta
e uma rouquidão persistente, e diante da insistência da presidente Dilma Rousseff, ela mesma
ex-paciente de câncer, foi finalmente fazer os exames. Foi diagnosticado naquele sábado com câncer de laringe. Começou a fazer o tratamento na
semana seguinte e, numa imagem emblemática de
força e coragem, raspou o cabelo e a barba, que
era sua marca registrada.
Enquanto isso acontecia, circulavam pelas redes
sociais inúmeras campanhas que repercutiam a
doença do ex-presidente, todas elas com o mesmo
teor: “Lula, faça o tratamento pelo SUS”. Não entrarei
na questão da solidariedade com um paciente de
câncer, seja ele quem for, ou da qualidade do sistema
de saúde público. Tudo isso já foi exaustivamente
discutido após o diagnóstico do ex-presidente.
O que prefiro ressaltar é que o câncer é sempre
um golpe. É um período de incerteza, revolta e insegurança, e só o paciente pode escolher como enfrentá-lo. Lula, me parece, escolheu o caminho do
otimismo. E por ser uma figura pública, suas ações
são acompanhadas por 200 milhões de brasileiros.
Acredito que a doença de Lula pode ter efeitos
positivos na luta contra o câncer – não só porque
traz a doença de volta à pauta, mas porque Lula
personifica tantos fatores que se procuram enfatizar
em campanhas mas que, sem rosto, se perdem na
comunicação. O Lula paciente, sem vínculo com
CHEGADA DO
partidos ou ideologias, presta a partir do exemplo
um inesperado serviço à saúde: fazer o exame para
detecção precoce, seguir à risca o tratamento proposto pelos médicos, adotar mudanças no estilo de
vida, encarar com otimismo esse período difícil.
Aqui na Onco&, nosso objetivo é exatamente
este: ajudar, através de informação isenta e de qualidade, nesse esforço de conscientização sobre prevenção e diagnóstico precoce para que outros
pacientes, figuras públicas ou não, tenham essa
mesma oportunidade.
Na última edição do ano, o balanço é inevitável.
E é muito bom perceber que em 2011 conseguimos
trazer tantos aspectos diferentes do câncer – novidades científicas, temas polêmicos, saúde pública,
iniciativas pioneiras – à discussão. Embora costume
dizer que “quanto mais sabemos, menos sabemos”,
creio que estamos no caminho certo.
No ano que vem, queremos continuar nessa jornada. Em 2012 queremos fazer mais, informar mais,
ajudar mais. E só podemos sonhar com isso porque
contamos com muita gente comprometida nesse trabalho, gente que acredita que por trás do trabalho
existe uma missão. Estar cercada de pessoas assim
dá significado ao que fazemos todos os dias.
Você, leitor, é parte disso. Esse é nosso maior
presente. E por isso, muito obrigada.
Boas festas e um ótimo 2012!
Lilian Liang
* Jornalista especializada na
cobertura de saúde, é editora da
Onco& – Oncologia para todas
as especialidades
Contato: [email protected]
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
7
entrevista
Solidariedade global
Professor de Harvard e diretor de cardiologia na ONG Partners in
Health, Gene Bukhman defende a abordagem em grupo das doenças
não transmissíveis, inclusive o câncer, com integração de serviços e
melhor uso de recursos
Por Andrea Murta
Divulgação
C
Gene Bukhman
* Diretor do Programa Global
em Doenças Não Transmissíveis
e Mudança Social da Escola de
Medicina da Universidade
Harvard; diretor de cardiologia
da ONG Partners in Health
8
ARDIOLOGISTA DE FORMAÇÃO,
GENE BUKHMAN
PODERIA FACILMENTE OCUPAR SEU TEMPO APE-
NAS ENTRE A ESCOLA DE MEDICINA DA UNIVERsidade Harvard, onde dirige o Programa Global em
Doenças Não Transmissíveis e Mudança Social, e o
atendimento em hospitais de ponta em Boston
(EUA). Mas, tanto quanto possível, prefere deixar o
conforto de lado e viajar 11 mil quilômetros até
Ruanda para viver outro papel: o de conselheiro
sênior do governo local, ajudando a integrar
serviços para doenças não transmissíveis endêmicas, como câncer cervical, e revolucionando o sistema de saúde do país africano.
Bukhman faz parte da Partners in Health (Parceiros na Saúde, ou PIH, na sigla em inglês), organização baseada em Boston voltada a melhorar a
oferta de serviços de saúde em comunidades carentes e marginalizadas pelo mundo. Ruanda é apenas um dos 12 países em que os 13 mil funcionários
da PIH atuam – estão incluídos, por exemplo, Peru,
Rússia, Lesoto e até Cazaquistão.
A organização defende uma forma de integrar
serviços que inicialmente desafia a lógica predominante em países pobres, enxergando as doenças não
transmissíveis como grupos abordáveis em conjunto. A tarefa exige esforço e tempo, mas, segundo
Bukhman, pode tornar a aplicação de recursos
muito mais eficiente e reduzir a mortalidade de
vários tipos de câncer.
“Estamos vivendo em uma época em que a injustiça de termos pessoas morrendo por doenças
curáveis é cada vez mais óbvia”, afirma.
Além de cardiologista-chefe da PIH, Bukhman
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
também aconselha a Força-Tarefa Global para Expandir o Acesso ao Tratamento e Controle do Câncer em Países em Desenvolvimento. Ele é formado
pela Universidade do Arizona, onde também obteve
o Ph.D. em antropologia da medicina, e realizou a
residência no Brigham and Women’s Hospital
(Boston). Completou estudos em cardiologia no
Beth Israel Deaconess Medical Center e é certificado
em medicina interna e cardiologia, com competência específica em ecocardiografia.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista
que ele concedeu a Onco&.
Onco& – A Assembleia de Alto Nível da ONU
para Doenças Não Transmissíveis (entre elas as
cardiovasculares, diabetes, câncer e doenças
mentais), ocorrida em setembro em Nova York,
terminou numa espécie de anticlímax, com poucas linhas de ação concretas. Como o senhor
avalia a reunião? Afinal, câncer é prioridade em
saúde pública?
Gene Bukhman – A comparação que tem sido feita
para a Assembleia é o encontro de alto nível sobre
a aids que ocorreu em 2001, realizado sob um contexto muito diferente devido ao clima econômico
global. [A crise financeira] baixou as expectativas
desta vez. Mas, assim como ocorreu com o encontro
sobre o HIV, teremos de esperar alguns anos para
avaliar com precisão os resultados da Assembleia.
A ação contra o HIV/aids se desenvolveu muito
nos anos seguintes ao encontro, então ainda vejo
motivos para ser otimista em relação às doenças não
transmissíveis. Uma das coisas mais importantes
que foram feitas é que o encontro reuniu pessoas de
grupos diversos que lidam com a mesma batalha, de quem atende
crianças diabéticas dependentes de insulina a doenças do coração, oncologistas etc. Considero um grande sucesso que essa comunidade
consiga manter a solidariedade.
Sobre se o câncer é prioridade em saúde pública... bem, acho que
está ficando cada vez mais difícil dizer a sério que algumas doenças
são mais importantes ou mais prioritárias do que outras. Estamos
vivendo em uma época em que a injustiça de termos pessoas morrendo
por doenças curáveis é cada vez mais óbvia, e muitos tipos de câncer
são parte dessa história. Insisto nisso porque é preciso abordar essas
doenças a partir de uma comunidade integrada. Todos lutamos contra
doenças não transmissíveis.
Onco& – A presidente Dilma Rousseff anunciou em março um investimento de R$ 4,5 bilhões em ações de prevenção de câncer
de mama e de colo do útero no Brasil. Só dinheiro resolve o problema do câncer nos países em desenvolvimento? Vacinar todo
mundo contra o HPV, por exemplo, é o caminho para erradicar o
câncer de colo do útero?
Bukhman – O Brasil é um país que inspirou o mundo todo com
seu programa para a aids. Sem dúvida, recursos são parte importante
da nossa batalha contra o câncer. E não estamos falando de recursos
que não existem. Eles estão disponíveis globalmente, mesmo no ambiente econômico atual. Quando digo que o Brasil é inspirador,
quero dizer que ainda pode ser um líder no desenvolvimento de estratégias para fornecer serviços, vacinas etc. em larga escala. Se fosse
fazer sugestões, diria, de forma geral, que a chave para a eficiência
é abrir a porta para tratar também condições relacionadas com as
doenças principais que queremos abordar. Isso leva a um aproveitamento máximo dos recursos.
Não sei dizer quais são os gargalos que o Brasil enfrenta, mas
começaria observando se há demanda por serviços médicos que gravitam em torno do câncer de mama e cervical que poderiam ser abordados em grupo. Isso envolve treinamento e infraestrutura.
63% dos 7,6 milhões de mortes devidas ao câncer ocorreram em
países em desenvolvimento. Até 2030, estima-se que esses países
carregarão 70% do fardo mundial do câncer, mas ainda assim só
5% dos recursos para a doença são destinados a eles. A mentalidade ainda não está mudando?
Bukhman – A linguagem que usamos para falar do mundo em desenvolvimento está ficando mais complicada e mudando muito. Há
50 anos, havia uma divisão clara entre países ricos e “o resto”. Pensávamos em países de renda baixa que tinham muitas coisas em
comum, da Ásia à América Latina e à África. Mas, ao longo das últimas décadas, o desenvolvimento desses países foi muito desigual. É
muito difícil colocar Xangai ou São Paulo na mesma categoria de uma
área rural da Libéria.
É comum pensar que, depois de todo o sucesso que tivemos em
combater doenças infecciosas em países pobres, mudanças no estilo
de vida (especialmente queda na atividade física e aumento do fumo)
acabaram atuando como motores para o aumento das doenças não
transmissíveis. Acho essa mentalidade problemática. Pode ser verdadeira para São Paulo, Cidade do México ou Cape Town, mas não
acontece da mesma forma em Ruanda ou Serra Leoa.
Além disso, há outra história para as doenças não transmissíveis,
incluindo o câncer: elas sempre foram parte significativa do fardo dos
países pobres. A natureza dessas doenças pode ser diferente quando
temos as mudanças de estilo de vida que comentei antes, mas daí
falaremos em câncer de pulmão influenciado por esses fatores em São
Paulo, enquanto na Libéria falaremos de câncer cervical. Mesmo nos
países mais pobres, as doenças não transmissíveis compõem historicamente pelo menos 20% das enfermidades, o que é muito significativo. A diferença está no tipo de doença.
Onco& – Como essas diferenças mudam a abordagem do tratamento para o câncer no mundo em desenvolvimento?
Bukhman – Temos duas implicações. Primeiro, em alguns ambientes
Onco& – A PIH acaba de lançar o relatório “Closing the Cancer
Divide: A Blueprint for Improving Cancer Care in Low and Middle
Income Countries” (Acabando com as diferenças no câncer: um
plano para melhorar o tratamento ao câncer em países de baixa
e média renda”, em tradução livre). Que lições o Brasil pode
tirar dele?
Bukhman – Há exemplos de países com os quais o Brasil pode se
identificar, como o México, que fez esse salto no acesso ao tratamento
para muitos cânceres no contexto da universalização dos seguros-saúde
ou do aumento progressivo da cobertura. Isso pode ser algo que o
Brasil queira observar. E também temos bons exemplos de países de
renda média que estão fazendo progresso na tentativa de aumentar o
acesso a tratamentos sem levar o serviço público à falência.
há uma correlação importante com a idade da população. Quando você
tem uma população relativamente jovem, a condição individual de cada
câncer não respeita uma epidemiologia específica, e nenhum tipo compõe a parte mais importante do total das doenças. A distribuição é
maior. Isso exige uma descentralização e integração de serviços. É preciso pensar quais grupos de atendimento podem ser oferecidos juntos,
qual tipo de treinamento é mais adequado.
Em segundo lugar, essas condições muitas vezes são evitáveis a partir
de detecção precoce e vacinação. O custo em um ambiente pobre não é
necessariamente tão alto, porque não é algo que domina a epidemiologia.
Creio que o principal determinante para trabalhar com câncer é a distribuição etária e se há ou não muitos habitantes com mais de 65 anos.
É importante mencionar também a prevalência de HIV nesses
países, que facilita o desenvolvimento de alguns tipos de câncer.
Onco& – Antigamente o pensamento dominante era de que o
Onco& – O senhor fala de uma abordagem integrada. O relatório
câncer era uma doença de países desenvolvidos. Houve uma virada
– em 2008, 53% dos 12,7 milhões dos novos casos de câncer e
da PIH fala em diagonalização. O que isso quer dizer exatamente?
Bukhman – Doenças específicas podem, com a descentralização de
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
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“Estamos vivendo em uma época em que a injustiça
de termos pessoas morrendo por doenças curáveis é cada vez mais óbvia,
e muitos tipos de câncer são parte dessa história”
serviços, ser um ponto de partida para oferecer um espectro mais
amplo de serviços de saúde. Esse é um aspecto da diagonalização.
Um exemplo clássico é do câncer cervical. Você pode pensar inicialmente em um planejamento para prevenir e tratar o câncer, mas
chega a uma situação em que atende a vários outros tipos de demandas
de saúde que não estão sendo atendidas nos serviços clínicos normais,
como exames de mama, biópsias, tratamento de infertilidade etc.
Ou seja, integramos vários serviços relacionados. Outro exemplo
pode ser com câncer de mama, que abre a possibilidade de tratamento
crônico para várias outras condições. Muitos pacientes vão precisar de
tamoxifeno e vai ser necessário criar todo um sistema para garantir
que exista um estoque do medicamento, além de verificação de comparecimento dos pacientes, se estão respondendo ao tratamento, e até
questões relacionadas a seguros-saúde.
Ou seja, para qualquer condição mais exigente será preciso uma
estrutura de suporte completa. Acabamos apoiando a descentralização
de todo um sistema.
Onco& – O câncer cervical pode ser considerado em vários casos
uma doença transmissível (devido ao fato de o HPV ser fator de
risco). Isso facilita de alguma forma a integração de serviços?
Bukhman – Para mim, o fato de que um agente infeccioso pode ter
dado origem a doenças não transmissíveis (câncer, doenças do
coração) não é o fator mais importante para a forma de atendimento.
O mais importante é determinar a plataforma de serviços necessária
para o tratamento. O que as doenças não transmissíveis compartilham,
isto é, o que nos faz agrupar câncer cervical e problemas do coração
na mesma categoria, é o fato de que são muito prevalentes, difíceis de
lidar e envolvem dano a órgãos, resultando em um problema muito
mais desafiador para sistemas de saúde nacionais.
Por outro lado, do ponto de vista da prevenção, faz muita diferença. No caso do câncer cervical, é preciso organizar campanhas de
vacinação [contra o HPV]. Um dos principais problemas é que será
preciso ter instituições estabelecidas para lidar com essa abordagem.
E há o fato de que muitas condições que compartilham necessidade dos mesmos serviços exigidos para o atendimento a pacientes
com HIV/aids. Isso pode ser útil, particularmente no contexto de
doadores internacionais. Se ligarmos, por exemplo, o HIV com alguns
tipos de câncer, isso torna o recebimento de fundos mais fácil. Muitos
programas focados no tratamento do HIV parecem ser capazes de expandir o atendimento a doenças de alguma forma ligadas à aids.
10
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
A dificuldade aqui é que pacientes com o mesmo tipo de câncer
mencionado acima não poderiam receber o tratamento se fossem HIV
negativos. Isso seria muito limitador para um programa.
Onco& – Como o senhor vê hoje o desafio de integrar prevenção
e tratamento? Uma visão disseminada é a de que é melhor em
termos de custo-benefício concentrar recursos em prevenção no
mundo em desenvolvimento e deixar o tratamento, que é mais
caro, para países ricos.
Bukhman – Obviamente ninguém quer adquirir uma doença, e a
situação se complica muito depois que ela se instala. Se é possível
prevenir, ótimo. Mas muitas, muitas condições não são evitáveis. E,
mesmo se fossem, isso não ajudaria quem já está doente. Não é interessante ter esse tipo de abordagem fragmentada – essa visão, creio,
já caiu. Não se fala sobre tratamento de doenças já adquiridas em
termos de custo-benefício.
Por exemplo, o número de pacientes com doenças pediátricas é
pequeno, e tratar todos eles não é o que vai quebrar o orçamento. Enquanto isso, prevenção tem como alvo muito mais gente, e isso encarece as operações.
O que é vital é estabelecer o quão eficaz a abordagem pode ser.
Eficácia é um critério que funciona melhor para estudar custos. Dá
para conseguir muita coisa com tratamentos. Dependendo do caso,
um investimento de US$ 200 a US$ 1.000 tem eficácia de 50% ou
80% pelos próximos 16 anos.
Agora, se as ferramentas que temos à disposição são muito caras,
temos de avaliar o porquê desse custo. Pode ser pelo funcionamento
do mercado, ou podem estar usando métodos caros quando há alternativas mais baratas.
Onco& – O senhor pode dar exemplos de como baixar custos?
Mesmo economizando, câncer não é das doenças mais baratas.
Bukhman – Para muitas coisas o custo é bem baixo. Estamos falando
de tratamentos com tempo limitado, não uma entrega de medicamento
para algo crônico, que vai durar a vida toda.
Uma das variáveis mais importantes é que drogas a baixo custo
podem não estar disponíveis em determinado país se não forem
compradas em grandes quantidades. E é um círculo vicioso, porque
não compram muito justamente porque o preço é alto, e dessa forma
o preço não cai.
Mas, em muitos casos, as drogas são bem baratas e os tratamentos
não custam muito, além do fato de o número de pacientes não ser tão
alto. Abordar o tratamento de tipos de câncer tratáveis não é tão caro
assim. É uma das coisas mais interessantes da epidemiologia.
Outras coisas são mais complicadas, como treinamento, especialmente ligado a cirurgia, e questões ligadas a até que ponto a radioterapia
é fundamental – onde colocamos o limite para o valor dessa intervenção, pois há um ponto em que sua eficácia já não é tão boa.
Onco& – O relatório da PIH menciona que, em muitas situações,
drogas para o controle da dor não estão disponíveis. Em muitos
casos o problema não é o custo, mas a organização do sistema de
saúde e até barreiras culturais. O senhor já enfrentou esse tipo
de dificuldade?
Bukhman – O que quisemos dizer é que esse é um problema facilmente contornável. Remédios para dor podem ser incrivelmente
baratos, e quando vemos a dificuldade de obter drogas em alguns lugares a questão não é o preço. Há certa preocupação em torno desse
tipo de medicamento devido ao risco de roubo e tráfico, e há falta de
reconhecimento da importância de mitigar dor e sofrimento dos pacientes. Creio que podemos chamar isso de cultural.
Onco& – A questão do treinamento de pessoal é um investimento
de longo prazo. Como isso deve ser equilibrado com necessidades
de curto prazo, em termos de destinação de recursos?
Bukhman – É uma ótima pergunta. Uma das questões é que o treinamento para um enfoque integrado requer longo prazo para ser implementado, se compararmos com uma intervenção mais limitada. Mas
vemos isso da seguinte forma: se você encontra o grupo certo de
serviços que podem ser oferecidos em conjunto, o treinamento não é
tão complicado. Não vai levar anos, e sim alguns meses. E a integração
de serviços é uma intervenção mais durável do que o treinamento em
uma doença específica.
É claro que alguns tipos de serviços requerem treinamento de
longo prazo e supervisão de apoio, particularmente os ligados a cirurgia para câncer de mama ou quimioterapia pediátrica. Isso significa
que precisamos levar muito a sério a necessidade de uma excelente
formação médica no nível da pós-graduação. E realmente isso é muito
ambicioso e de longo prazo.
O desafio de muitos países pobres é a falta de supervisão – é preciso criar uma primeira geração de médicos que possam contribuir
para a formação dos próximos. Isso envolve parcerias entre lugares
com treinamentos mais desenvolvidos. É importante ter médicos supertreinados do Brasil, da Índia, dos EUA, que possam ir para esses
países por alguns anos para apoiar a formação de profissionais que
possam levar o trabalho adiante.
Onco& – No Brasil há uma preocupação em melhorar o treinamento para o atendimento primário, de forma a facilitar a identificação de sinais de alerta e acelerar diagnósticos. Ocorre o
mesmo em outros países onde o senhor trabalha?
Bukhman – Sim, totalmente. Primeiro, o reconhecimento de condições
que podem ser tratáveis é muito importante. Para o paciente, é crucial
saber que potencialmente há um tratamento: isso ajuda a minimizar o
estigma, de forma parecida ao que vimos com o HIV, e facilita a busca
por atendimento. Claro, isso para tipos mais óbvios, como blastomas,
sarcomas, alguns tipos de câncer de mama avançados.
A questão, porém, se complica em termos de testes que enfermeiros e funcionários do atendimento primário podem fazer. No caso
do câncer cervical, já temos estratégias bastante avançadas. Mas outros
tipos podem ser mais complicados, e cada país tem de estudar o que
pode ou não fazer.
De toda forma, detecção precoce é fundamental para as chances
de cura, então é algo que merece investimento.
Onco& – Outra dificuldade que pode aparecer é que, mesmo quando
o diagnóstico é feito e o tratamento pode começar, há falta de
profissionais de apoio que possam fazer acompanhamento dos
efeitos, como cardiologistas. Esse é um problema global?
Bukhman – Tem razão, é um desafio global. Muitas vezes as pessoas
optam por tratamentos que são menos agressivos pela falta de
acompanhamento disponível – por exemplo, preferindo não fazer
quimioterapias mais tóxicas. Por outro lado, muitos dos tratamentos
mais modernos não dependem de atendimento de especialistas, como
você pode pensar. Por exemplo, não é obrigatório que um ultrassom
do coração seja feito por um cardiologista, particularmente para o tipo
de doença de que estamos falando. Um clínico geral ou um enfermeiro
especializado pode fazer uma avaliação mínima do coração para saber
se o paciente pode receber um certo tipo de quimioterapia.
Acho que o ponto mais amplo aqui é de novo a integração dos
serviços a partir da plataforma do atendimento primário. E os desafios
não são insuperáveis.
Onco& – A PIH defende que muito pode ser feito com recursos já
disponíveis hoje. Para onde esses recursos estão indo então?
Bukhman – Em qualquer sistema, especialmente um que tentou se
expandir rapidamente, é muito difícil ser eficiente nas primeiras tentativas. Vimos nos últimos dez anos investimentos significativos em
sistemas de saúde, mas não houve tempo suficiente para otimizar o
uso dos recursos. Para usá-los melhor, eu sugeriria destinar uma
porção maior para médicos e enfermeiras e treinamento de pessoal de
apoio. Isso não tem sido feito de forma satisfatória.
Em muitos lugares os gastos com saúde ainda são muito, muito
baixos, na casa dos US$ 20, US$ 30 dólares per capita em países
mais pobres, enquanto nos EUA fica em US$ 5 mil e, num país
como o Brasil, em torno de US$ 150 per capita. Acho muito difícil
encontrar um sistema de saúde que aborde toda a questão das
doenças tratáveis e evitáveis com investimentos de US$ 25 dólares
per capita. A atenção ao câncer vai exigir uma expansão dos limites
da solidariedade global.
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
11
capa
Tempos modernos?
A cirurgia robótica se apresenta como mais uma ferramenta
no arsenal contra o câncer. Veja quais as vantagens e os
limites dessa técnica
Por Conceição Lemes
E
STAÇÃO CONSOLAÇÃO DO METRÔ DE SÃO PAULO,
AVENIDA PAULISTA COM RUA AUGUSTA. DIARIAMENTE, PESSOAS DE TODAS AS ETNIAS, CULTURAS,
religiões e classes sociais embarcam e desembarcam
para ir e vir do trabalho, comer, realizar compras,
encontrar amigos. Recentemente, juntei-me a essa
multidão e, por curiosidade, perguntei aleatoriamente a homens e mulheres que passavam por ali.
Se precisasse ser operado(a), você escolheria:
a) Cirurgia convencional, aberta (o médico realiza as incisões e ressecções de tecidos com as
próprias mãos)?
b) Cirurgia com robô? (cirurgia assistida por
computador, cirurgia robótica e cirurgia robótica
assistida são seus outros nomes; o médico, em um
console joystick parecido com controle de
videogame, manipula os “braços” do robô, que faz
as incisões e ressecções).
Surpresa zero. Dos 30 passantes ouvidos, 28
optaram pelo robô. Inovações tecnológicas seduzem, mesmo, aqui e lá fora.
“Os pacientes querem o robô. Muitos vem à
consulta apenas para perguntar: ‘Você usa o robô?
Ok, bem, obrigado’”, conta o urologista Jeffrey A.
Cadeddu, do Southwestern Medical Center, da
Universidade do Texas, nos EUA. “E vão embora.”
Nos EUA há cerca de mil robôs cirúrgicos em
atividade, segundo informações da Strattner, empresa que representa no Brasil o fabricante, a Intuitive Surgical.
No Brasil há apenas três, todos em hospitais pri-
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vados de São Paulo: Albert Einstein, Sírio-Libanês e
Oswaldo Cruz. A razão é o elevadíssimo preço.
Como há apenas uma empresa no mercado mundial,
a falta de concorrência se reflete nos valores.
Segundo Paulo Mattera, da Strattner, cada um
custa, em média, R$ 2,5 milhões. A manutenção
gira em torno de R$ 200 mil por ano.
Para complicar, os planos e seguros de saúde
não reembolsam o aluguel do robô, que custa de
R$ 6 mil a R$ 12 mil (dependendo da cirurgia),
sempre pago pelos pacientes. Aqueles sem plano de
saúde ou sem direito a internação nesses hospitais
têm de pagar ainda a operação propriamente dita,
ou seja, tudo particular. Resultado: uma conta bem
salgada para o doente.
“Em todos os lugares a cirurgia robótica é mais
cara do que a aberta; aumenta em 30%, em média,
o custo da operação”, atenta o urologista Sidney
Glina, professor livre-docente de urologia da Faculdade de Medicina do ABC e chefe da Clínica
Urológica do Hospital Ipiranga, em São Paulo. “É
uma desvantagem.”
“Em compensação, a cirurgia robótica diminui
o tempo de internação”, replica o também urologista e cirurgião Gustavo Caserta Lemos, do Hospital Israelita Albert Einstein. “O paciente retorna
mais rápido à suas atividades normais.”
“Tem muita gente fazendo cirurgia robótica
desnecessariamente para uma porção de situações
em que o robô nada agrega em relação à via laparoscópica”, observa o cirurgião do aparelho digestivo e coloproctologista Raul Cutait, professor
associado de cirurgia da FMUSP. “Novas tecnologias
passam sempre a imagem de modernidade. As
questões-chave são: quanto realmente beneficia o
tratamento do paciente e a que custo?”
“Assim como a cirurgia laparoscópica e a convencional, a robótica tem um papel. É para cirurgias oncológicas absolutamente regradas”, pondera
o cirurgião Raphael Paulo de Paula Filho, responsável pelo setor de Cirurgia Oncológica do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo.
“Fora disso, é marketing. Não tem justificativa. Pacientes podem se prejudicar quando o método não
for bem planejado ou bem indicado.”
O robô é mais uma
ferramenta de trabalho
Realmente o assunto é polêmico. Divide os
cirurgiões. Não me admiro, portanto, de a essa altura muitos de vocês estarem questionando: Afinal,
o que é realmente a cirurgia robótica?; Ela substitui
o cirurgião?; Vale mesmo a pena usar o robô em
cirurgias para o tratamento do câncer?; Em que tumores está sendo utilizada?; E os resultados?; Qual
o estado da arte?; O que dizem os estudos disponíveis?; O que fazer quando um paciente diz que
quer o robô?...
Para começar, o procedimento nasceu da necessidade de as Forças Armadas norte-americanas fazerem cirurgias a distância. Foi na década de 1990.
A expectativa era ter braços robóticos em hospitais
próximos aos fronts, como Afeganistão e Iraque.
Funcionaria assim: nos EUA ou em outra parte do
mundo, o cirurgião principal, atuando num joystick,
faria o procedimento. Transmitidos por internet,
esses dados iriam até o robô no campo de batalha.
Esse projeto, porém, não foi adiante. Primeiro,
devido às limitações na velocidade de transmissão
de dados. Segundo, à impossibilidade de operar no
campo de batalha sem que houvesse alguém que
mexesse no robô in loco. “A pessoa que opera o robô
tem de estar ao lado do doente”, frisa um cirurgião
que pediu que seu nome não constasse da matéria
e a quem chamaremos de doutor R*.
“Na verdade, ao longo de muitos anos o robô
foi uma tecnologia procurando uma aplicação
para valer”, atenta Cutait. Até que, com o advento
da cirurgia laparoscópica para o câncer de próstata, alguns médicos notaram que ficava mais fácil
operar por laparoscopia com a ajuda do robô do
que sem ele. Essa operação exige uma sutura
muito fina da uretra com a bexiga e os braços
robóticos permitem alguns movimentos que não
se tem na cirurgia laparoscópica.
“Atualmente, a melhor indicação para o uso do
robô é para cirurgia de próstata, pelo simples fato
de que realmente facilita tecnicamente a sutura da
bexiga com a uretra, ou seja, pode haver um ganho
na qualidade do procedimento”, informa Cutait.
“Assim, nos Estados Unidos, cerca de 70% das
cirurgias de câncer de próstata são hoje realizadas
por via laparoscópica com o auxílio do robô.”
Lá, a operação robótica começou entre 1999 e
2000. Aqui, em 2008.
“O robô é mais uma ferramenta de trabalho”, diz
Lemos. “Tem todas as vantagens da laparoscopia,
acrescida de visão tridimensional e pinças articuladas, o que permite movimentos mais precisos.”
Na sala de cirurgia, para operar, o cirurgião
senta-se à frente do console de um computador, que
é conectado a uma torre, onde ficam os braços
robóticos. Uma vez manipulados os controles, o sistema traduz imediatamente os movimentos de mãos,
pulsos e dedos do cirurgião para a extremidade dos
instrumentos dentro da cavidade endoscópica. As
tesouras, pinças e porta-agulhas do robô repetem,
dentro da cavidade, os mesmos movimentos que o
cirurgião faz no console.
“Efetivamente o robô é um escravo”, afirma
Lemos. “Faz apenas o que o cirurgião manda, não
tem autonomia nenhuma. Tanto que, se tirarmos o
olho do console, o robô trava imediatamente devido
ao sensor de presença.”
“Nem tanto ao céu
nem tanto à terra.
O robô não é
a melhor coisa
do mundo, sem
o qual a gente
não pode viver,
mas também não é
a personificação
do mal. É mais
um bisturi, um
instrumento
de cirurgia”
As vantagens da robótica,
segundo quem a faz
Na verdade, Lemos e o doutor R só têm elogios à
cirurgia robótica:
* Permite realizar procedimentos de alta complexidade de modo mais simples, sem abrir o paciente. É a abordagem mais avançada de cirurgia
minimamente invasiva.
* Suas pinças articuladas, com movimentação
de 270 graus, possibilitam manobras e suturas difíceis na cirurgia laparoscópica, cujos instrumentos
rígidos não têm mobilidade.
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* Garante ao médico visualizar o que está sendo
operado em três dimensões em alta definição, com
aumento de até 12 vezes.
* Filtra os movimentos involuntários da mão,
tirando tremores. Há vários filtros. O cirurgião que
tem a mão firme pode usar o filtro de 2 para 1. Já
aquele que treme bastante usaria um filtro de 5 para
1, por exemplo. Assim, de cada dois ou cinco movimentos, só passa um pelo robô.
“À medida que os anos avançam, algum tremor
pode surgir. Com o robô isso desaparece. Além de
uniformizar a mão do cirurgião, possibilita mais
precisão e aumenta o acesso a cirurgias complexas
em que as mãos não podem tremer nada”, afirma o
doutor R. “O robô universaliza a cirurgia. O sujeito
não precisa ter tanto dote natural para ser um
grande cirurgião.”
* Garante postura mais confortável, ergonômica, durante a operação, já que os cotovelos do
cirurgião ficam apoiados no console. Assim, fica
mais descansado, principalmente nas cirurgias longas. E isso melhora a perfomance.
“A cirurgia robótica é menos invasiva, causa
menos dor no pós-operatório, menor trauma cirúrgico”, diz Lemos. “Consigo fazer anastomose da bexiga com uretra de forma mais precisa; em vez de
manter por dez dias a sonda uretral na prostatectomia
radical, seis são suficientes.”
Indicações, eficácia e limites,
também por quem faz
Segundo Mattera, da Strattner, a cirurgia robótica é
atualmente empregada em tumores de próstata,
rins, útero, reto, cólon, estômago, fígado, pâncreas,
duodeno, pulmões, esôfago, base de língua, mediastino, baço, entre outros.
“Nós temos usado em tumores não muito
grandes de reto, cólon, estômago, vesícula biliar,
esôfago, pâncreas (ressecções parcial e total) e fígado”, afirma o doutor R. “Está havendo no
mundo inteiro um boom para tirar a glândula
tireoide por meio de robótica sem abrir o pescoço,
através de pequena incisão na axila da paciente,
sobretudo em mulheres.”
Lemos utiliza em tumores de próstata, rins
(pequenos e grandes), adrenal e linfadenectomia
retroperitoneal em casos de tumor de testículo.
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E a eficácia?
“Os estudos no mundo inteiro têm demonstrado que a operação com robô tem os mesmos resultados da cirurgia aberta”, afirma o doutor R.
“Mas em nossa casuística e experiência os resultados da robótica são, sem dúvida, superiores.”
“No caso da prostatectomia radical, a
robótica, no mínimo, empata em todos os parâmetros”, diz Lemos. “Em alguns parâmetros é
até melhor. Por exemplo, causa menor impotência. Com robô, ela atinge 15% dos operados; já
na cirurgia convencional, aberta, 30%. A incontinência urinária é revertida mais rapidamente.
Na robótica, demora 44 dias em média; na operação convencional, 160 dias.”
E as desvantagens?
“As mesmas da cirurgia laparoscópica”, diz o
doutor R. “Se tiver um campo muito difícil, bastante
proximidade de vaso grande, é preciso abrir o paciente para completar a cirurgia.”
O que isso significa?
“Começamos com o robô. Caso cheguemos a
algum ponto em que se duvida da sua eficácia sem
abrir o abdômen, aí partimos para a cirurgia
aberta”, esclarece o doutor R. “Isso acontece numa
minoria de casos. Na maioria, com os resultados
dos exames pré-operatórios, dá para saber se vamos
fazer com robô ou aberta.”
“É preciso dar a devida dimensão
ao uso do robô”
Cutait, Glina e De Paula pensam diferente. Perguntei-lhes se consideram imprescindível a cirurgia robótica. A resposta dos três foi a mesma: não.
Nenhum, porém, é contra o método. Mas todos
são críticos.
“Na área de aparelho digestivo, o impacto é
limitadíssimo por enquanto”, considera Cutait. “Há
uma experiência inicial para tratamento do câncer
de pâncreas e de reto. Em ambos os casos, para
situações muito específicas. Pâncreas, quando se
tira a cabeça dele, pois há suturas muito delicadas.
Reto, porque pode ajudar homens com pelve muito
estreita. Agora, nada que a experiência do cirurgião
não resolva sem robô.”
“É preciso tomar cuidado para que não se faça
a apologia do uso de uma tecnologia que o fabricante e alguns cirurgiões alardeiam como fundamental e que, na verdade, não o é na maioria dos
casos”, adverte Cutait. “Isso pode criar no imaginário da população a falsa percepção de que, sem
robô, as cirurgias são inferiores. É preciso dar a devida dimensão ao uso do robô.”
“O grande problema do robô é a curva de
aprendizagem muito grande”, expõe Glina. “Não é
algo que se aprende em duas ou três vezes. E como
no Brasil os robôs estão em hospitais privados e não
há simulador, dificulta muito o aprendizado. Em
consequência, o cirurgião acaba aprendendo a fazer
a cirurgia robótica nos seus próprios pacientes, que
ainda pagam pelo seu custo.”
De Paula concorda com Glina: “Realmente, a
curva de aprendizagem é muito longa. Primeiro,
é preciso saber fazer bem a aberta, que é a mãe de
todas as cirurgias. Depois, saber operar bem por
laparoscopia. Para depois, então, se lançar do
robô. São três etapas. Não dá para pular nem inverter uma delas”.
Glina fez o curso de robótica nos Estados
Unidos, treinou e chegou à conclusão de que o
método não é tão bom para operar quanto na
aberta. Numa prostatectomia radical, ele demora
duas horas e meia na cirurgia aberta; com robô, 5
horas, em média.
Lemos aparteia: “Eu demoro duas horas numa
prostatectomia radical com robô”.
“E do ponto de vista operatório, a robótica, na
minha mão, não pareceu ser melhor do que a
aberta”, retoma Glina. “Se eu tivesse feito tantas
cirurgias de robô quanto fiz de cirurgias abertas,
talvez fosse igual. Mas, por enquanto, não é. Por
isso, aos meus pacientes eu indico a aberta para a
prostatectomia radical.”
“Também não há dados que nos permitam dizer
que os resultados da cirurgia robótica na prostatectomia radical são melhores do que os da cirugia
aberta”, afirma Glina. “Há até trabalhos que
mostram que os resultados da robótica são piores
em relação à incontinência e à impotência por
causa da curva de aprendizado.”
“Se pegarmos um cirurgião que já fez 5 mil
cirurgias com robô, como há alguns nos EUA,
provavelmente o resultado dele é igual ou superior”, acrescenta Glina. “Mas, se considerarmos a
média dos cirurgiões que operam com robô, não é
igual à média dos que fazem cirurgia aberta.”
Cirurgiões altamente qualificados, como
K. Ashutosh Tewari, do Weill Cornell Medical
College, em Nova York, dizem que demora cerca
de 200-300 procedimentos para as cirurgias assistidas por robô se tornarem altamente proficientes.
Tewari fez 3,2 mil.
“Para cirurgias oncológicas
absolutamente regradas”
Usando esta frase de um colega de equipe, De Paula
costuma brincar com os residentes: Tudo dá para
fazer. Contorcionistas de circo, por exemplo, entram dentro da mala. A questão é para quê.
O mesmo se aplica à cirurgia robótica para tumores: Tudo dá para fazer. Para quê? Qual a vantagem de se aprender essa tecnologia? O que o
paciente ganha?
O robô, vocês observaram um pouco atrás, está
sendo empregado em uma gama imensa de tumores. Porém, segundo o estado atual da arte, as
indicações são bem limitadas.
* O robô é recomendado para cirurgias oncológicas absolutamente regradas, ou seja, aquelas em
que a lesão é pequena e a palpação desnecessária,
portanto, quando se sabem o começo, o meio e o fim
da operação. Basicamente, tumores pequenos de
próstata, endométrio, colo do útero.
“No caso de paciente obeso, o método de eleição
para tumor de próstata é o robô, desde que com
grupo bem treinado”, diz De Paula. “É difícil operar
tanto por cirurgia aberta quanto por laparoscopia.”
* Para os demais tumores, como pâncreas, reto
e estômago, a cirurgia robótica é discutível, faz-se
para simplesmente entrar na “mala”. “A não ser que
seja para dizer que faz robótica, não tem justificativa usá-la em pâncreas”, opina De Paula. “Além
disso, há o risco eventual de não estar sendo suficientemente radical.”
* “Especificamente em relação ao tumor de reto,
o robô e a laparoscopia não são a melhor indicação
e o doente não evolui diferente”, julga De Paula.
“Estou convencido de que a cirurgia aberta é a
“Efetivamente
o robô é um escravo.
Faz apenas o que
o cirurgião manda,
não tem autonomia
nenhuma. Tanto
que, se tirarmos
o olho do console,
o robô trava
imediatamente
devido ao sensor
de presença”
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“Assim como
a cirurgia
laparoscópica e a
convencional, a
robótica tem um
papel. É para cirurgias oncológicas
absolutamente
regradas”
melhor. Vou continuar fazendo, pois já vi muitas recidivas de tumor de reto operado por cirurgia laparoscópica que talvez não precisassem acontecer.”
* Já tumores pequenos de próstata, endométrio
e colo do útero podem ser operados por cirurgia
robótica, laparoscópica ou aberta, convencional. As
três estão corretas. Comparativamente ainda não se
tem números definitivos para mostrar que o resultado de um é melhor que o de outro. A tendência é
que sejam muito parecidos. O médico deve optar
por aquela que ele sabe fazer melhor.
* É incorreto começar com robótica, depois
mudar para aberta no meio. Tem de se entrar para
fazer a técnica escolhida, seja robô, laparoscopia
ou aberta.
* O robô não tem a mínima indicação para tumores que exigem grandes ressecções, em múltiplos órgãos, cujas cirurgias saem do beabá e nas
quais se tem de agir conforme as lesões se apresentam. Mesmo que sejam de próstata, endométrio e colo do útero.
“Nem tanto ao céu nem tanto à terra”
“O futuro do robô é brilhante na cirurgia oncológica,
ele ainda nem começou”, empolga-se o doutor R.
“Nós, cirurgiões, já temos de começar a nos envolver
com ele, para que as próximas gerações de robôs,
mais leves, mais ágeis, não nos peguem desprevenidos, sem ter experiência com o robô mais autoescola, que é com o qual estamos trabalhando.”
“Nem tanto ao céu nem tanto à terra”, vislumbra
Glina. “O robô não é a melhor coisa do mundo, sem
o qual a gente não pode viver, mas também não é a
personificação do mal. É mais um bisturi, um instrumento de cirurgia. É um método para ser usado
quando for preciso.”
Cutait vai na mesma linha: “A tendência é os
robôs terem as suas indicações, mas não serão tão
espetaculares como apregoam. É preciso dar a devida dimensão ao seu uso”.
Como saber se é um caso para robótica, laparoscopia ou cirurgia aberta?
“Estadiando adequadamente o tumor com exames pré-operatórios”, frisa De Paula. “Não se pode
deixar de indicar um método por não saber fazê-lo.
Está errado. Eu posso não indicar por não achar
que é o melhor para aquele paciente.”
Voltemos ao começo desta reportagem. Lem-
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bram-se da enquete com homens e mulheres na Estação Consolação do Metrô de São Paulo? Absolutamente despretensiosa, ela dá pistas de como os
pacientes podem acabar fazendo uma opção seduzidos pelas novas tecnologias.
Pois bem, uma pesquisa publicada pela revista
americana Medical Care mostra que hospitais que
compram robôs cirúrgicos acabam realizando mais
operações de câncer de próstata, sugerindo que a
tecnologia se tornou uma força motriz por trás de
decisões sobre os cuidados dos homens com
câncer. Sugere ainda que a forma como os homens
são tratados de câncer de próstata parece ser
influenciada por vários fatores, incluindo a tecnologia e os objetivos de marketing dos hospitais e
médicos, em vez de evidências científicas sobre
benefícios e riscos.
O estudo, conduzido por pesquisadores da
Universidade de Nova York e outras instituições,
acompanhou as compras de robô cirúrgico em
554 hospitais, juntamente com o tratamento dado
a mais de 30 mil homens que receberam diagnóstico de câncer de próstata entre 2001 e 2005.
Segundo o estudo, quando um hospital adquire
robôs cirúrgicos, os homens daquela região são mais
propensos a uma cirurgia para tratar câncer de próstata do que antes de a tecnologia ser adquirida. A
compra de um robô levou a um aumento médio de
29 operações por ano por hospital.
Os dados sugerem ainda que pacientes que
poderiam ser candidatos a opções não cirúrgicas
tendem a ser direcionados para a cirurgia robótica
em seu lugar. Para os pesquisadores, os resultados
são preocupantes, pois a prostatectomia radical
pode resultar em uma série de complicações, incluindo incontinência e impotência.
Conclusão: a cirugia robótica não é para todo
mundo, mas isso não quer dizer que ela não seja para
ninguém. Estejam atentos às evidências científicas
deste momento. Procurem se cercar de colegas sérios
para saber qual caso tem mais ou menos indicação.
Afinal, a vida dos pacientes depende disso.
* O cirurgião havia aceitado participar desta reportagem,
mas depois pediu que seu nome fosse retirado. Como as
suas opiniões espelham o que está sendo feito em termos
de cirurgia robótica no Brasil, mantivemos algumas delas
e vamos chamá-lo doutor R.
especial SBOC
Com o foco no indivíduo
A
17A EDIÇÃO DO CONGRESSO BRASILEIRO DE ONCOLOGIA
CLÍNICA, REALIZADO EM GRAMADO (RS) ENTRE 26 E 29 DE OUTUBRO, FOI PARA O TEMA “INDIVIDUALIZAÇÃO E HUMANIZAÇÃO DO
Tratamento”. Em dias de avanços alucinantes da ciência e investimentos
cada vez maiores da indústria farmacêutica em busca de novas drogas,
a comissão organizadora do congresso deu espaço para outras áreas envolvidas no tratamento do paciente de câncer, como cuidados paliativos,
psico-oncologia e enfermagem oncológica, entre outros.
Embora o congresso não tenha trazido grandes novidades científicas, a variedade de temas relacionados ao câncer – e não apenas à oncologia clínica – constituiu um dos grandes atrativos do evento. Saíram
ganhando os quase 3 mil participantes do encontro, que puderam conferir as discussões em suas próprias áreas de atuação e em áreas relacionadas: as salas destinadas aos simpósios paralelos ao congresso
brasileiro – o XI Congresso Brasileiro de Enfermagem Oncológica, o
III Simpósio de Farmácia em Oncologia e o II Simpósio Internacional
de Psico-Oncologia – contaram com participantes de diversas especialidades envolvidos nos debates.
“O objetivo foi realmente fazer com que houvesse um intercâmbio
de ‘expertises’ nos mais diferentes aspectos da assistência oncológica”,
explicou o oncologista clínico José Luiz Miranda Guimarães, presidente do congresso, organizado pela Sociedade Brasileira de Oncologia
Clínica. “Nesse particular aspecto, fiquei com a nítida sensação de missão cumprida.”
A seguir, você acompanha algumas entrevistas com os coordenadores dos módulos que procuraram abordar o paciente de um aspecto mais humanizado e individual.
ÊNFASE DA
José Luiz Miranda Guimarães, presidente do XVII
Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica
O tema do congresso deste ano foi “Individualização e Humanização
do Tratamento”, com grande ênfase na multidisciplinaridade do
câncer. De onde veio a ideia do tema? O que esse destaque, num
congresso desse porte, diz sobre os rumos do câncer?
Não foi uma simples ideia. O tema é reflexo de uma mudança de paradigma mundial na plataforma da pesquisa de novas moléculas. A intensificação de um melhor entendimento nos mecanismos da gênese
do câncer e de novas descobertas de vias de sinalização celular nesses
últimos anos permite que haja um esforço em desenvolver moléculas
com mecanismos de ação muito específicos. Portanto, sendo chamadas
de drogas alvo específicas ou ditas inteligentes, muitas delas preservam
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em parte as células não cancerosas. Logo, a consequência prática é a
possibilidade concreta de proporcionar tratamentos menos tóxicos
para as células normais do hospedeiro.
Por outro lado, há um consenso internacional da importância da
humanização oncológica na assistência aos doentes, o que sem sombra
de dúvida agrega um valor inestimável para a qualificação no atendimento oncológico global.
Quais os principais destaques científicos do evento? Há quem diga
que o congresso da SBOC é muito mais uma oportunidade de revisão
do que de conferir novidades, como na ASCO. O senhor concorda?
Na minha modesta opinião, a montagem desse congresso não se preocupou em propiciar destaques. O destaque é o próprio participante
e ouvinte, pois o congresso é montado para a sua razão de ser, qual
seja, o médico interessado na assistência ao paciente oncológico.
De certa forma, não há como desconsiderar que o Congresso
Brasileiro de Oncologia Clínica não seja um palco de revisões dos temas.
Não possuímos e não somos um celeiro de pesquisadores inovadores e
tampouco há incentivos vultosos em pesquisa genuinamente nacional.
Evidentemente que, nesse quesito, as pesquisas básicas são realizadas
em um número muitíssimo reduzido de instituições acadêmicas de excelência. Apesar das enormes dificuldades vivenciadas diariamente
pelos acadêmicos e pesquisadores (burocracia, recursos financeiros, recursos materiais, falta de planejamento e diretriz institucional, politicagem etc.), o congresso oferece espaço para a apresentação em
plenário dos melhores trabalhos nacionais, o que dá visibilidade concreta da produção científica de pesquisadores brasileiros.
Farmacoeconomia e políticas de atenção oncológica foram duas
sessões muito bem comentadas no congresso. Que motivos
levaram a comissão a incluir tais temas na programação?
Farmacoeconomia e políticas de atenção oncológica sempre tiveram
espaço nos congressos anteriores da SBOC, sobretudo pelo simples
fato de que esses temas têm repercussão direta e imediata no atendimento de nossos pacientes. De um lado a indústria oferecendo novos
medicamentos com um custo elevado, de outro as agências governamentais sendo lentas nas suas deliberações, o Ministério da Saúde
procurando não incorporar e agregar tratamentos inovadores em razão
do custo, e a saúde suplementar aperfeiçoando ferramentas para implementar critérios de custo-efetividade. E por último o dueto médico
e paciente e toda a sorte de regras; nós querendo proporcionar o que
há de melhor para o nosso doente e o paciente querendo receber o
que há de mais efetivo em termos de tratamento. E quem irá financiar?
Portanto, são temas palpitantes e sempre repercutem positivamente.
Qual o balanço desse congresso?
Infelizmente, até o momento, não houve uma reunião da comissão organizadora e tampouco um balanço oficial do congresso. Mas para um
Congresso Brasileiro comandado por mineiros, organizado por cariocas, tendo como maioria de conferencistas paulistas e albergado pelos
gaúchos, não tenho dúvida que do ponto de vista científico as metas
foram alcançadas.
Ricardo Caponero, coordenador do módulo de Cuidados
Paliativos/Reabilitação/Nutrição
Você foi um dos coordenadores do módulo de cuidados paliativos
do congresso da SBOC. Quais foram os critérios e as dificuldades
para a escolha dos temas?
A ideia é trazer sempre algo de prático e que possa sensibilizar o oncologista para os cuidados paliativos, sem abordar os aspectos específicos e as discussões mais profundas, frequentes em eventos específicos
de cuidados paliativos. Nesse aspecto, a seleção dos temas não causou
dificuldades para as escolhas.
É difícil falar de humanização sem falar de cuidados paliativos.
Você acha que estamos num nível mais maduro de discussão do
tema no Brasil? Diante dos modelos tão bem-sucedidos no Canadá, parece que ainda estamos engatinhando. O que podemos fazer
para melhorar isso?
É verdade. É difícil falar de individualização e humanização sem olhar,
de fato, para o ser humano como pessoa e não apenas como o hospedeiro de uma neoplasia maligna. Nesse contexto a integração dos
cuidados paliativos, desde o início do tratamento antineoplásico, é fundamental para que se atinjam os objetivos propostos.
As discussões estão amadurecendo no Brasil, mas ainda estamos
só nas discussões, na teoria. Algo que os psicanalistas chamariam de
“muita oralidade e pouca penetração”. Temos muitos obstáculos a
vencer, desde barreiras culturais imensas até aspectos práticos de financiamento da saúde.
O Canadá está, de fato, muito mais adiantado do que nós. É por
isso que eles foram convidados no ano passado, quando da realização
do Fórum de Expansão dos Cuidados Paliativos no Brasil, capitaneado
pela dra. Claudia Naylor, do INCA (HC-IV, ex-CSTO).
Para melhorar essa situação é que realizamos o Fórum do Rio. Saímos de lá com algumas forças-tarefa com missões específicas. Esperamos
que novas reuniões desse grupo já possam trazer proposições mais concretas de atuação. A ideia é elaborar um documento e, através do INCA,
fazer com que essas proposições cheguem ao Ministério da Saúde.
Hoje fala-se tanto em “humanização da medicina” que se corre o
risco de a expressão ficar batida. Como enfatizar a importância
dos cuidados paliativos nesse contexto sem banalizar o tema?
Já vi serviços em que a “humanização” consistiu em colocar um relógio,
um calendário e um vaso de flor no quarto do paciente. Obviamente
as necessidades estão muito além disso. O ser humano sempre foi o
alvo central de toda a ação médica, mas ele está sendo visto pela lente
da tecnocracia. O importante é mudar a visão, escutar e ouvir o que
os pacientes desejam e adequar esses desejos ao que podemos, de fato,
oferecer, ao mesmo tempo em que limitamos nossa oferta terapêutica
ao que o paciente deseja receber. O símbolo dessa nova postura é o
trabalho da dra. Jenifer Temel, publicado no New England Journal of
Medicine. Um estudo randomizado de fase III (alto nível de evidência)
que mostra os reais benefícios dos cuidados paliativos em evitar o sobretratamento, melhorando a quantidade e a qualidade da vida.
Poucos oncologistas estiveram presentes nas sessões de cuidados paliativos do congresso. Como: (a) diminuir esse gap entre
o que se prega e o que se faz, já que eles reconhecem a importância dos cuidados paliativos mas poucos os praticam; (b)
melhorar a interface entre todos os profissionais envolvidos no
tratamento do câncer?
Pela própria definição da OMS, os “cuidados paliativos” são sempre
multiprofissionais. O primeiro problema é que os oncologistas acham
que sabem o que são cuidados paliativos e acham que sabem oferecer
esse tipo de atenção aos seus pacientes. Esse erro de julgamento é a
primeira coisa a ser corrigida. Como você disse, os oncologistas reconhecem a importância dos cuidados paliativos, só que eles acham que
estão praticando.
A interface dos profissionais é relativamente boa. Todos os serviços
especializados acabam tendo farmacêuticos, enfermeiros e, geralmente,
psicólogos. Assim, o que é necessário não é melhorar a interface, que
já existe (tanto que o congresso era multiprofissional), mas sim mudar
o foco dessa interface. O que deve começar a mudar esse cenário é a
recém-publicada portaria da AMB – CNRM e CFM que cria a “Medicina Paliativa” como área de interesse. Isso vai permitir que os residentes de oncologia, e de outras cinco áreas, possam estender sua
formação em mais um ano e se capacitar melhor nessa nova área.
Quais palestras em cuidados paliativos você destacaria como as
que mais renderam durante o congresso?
É difícil selecionar. Cada uma teve seu aspecto positivo. Cada uma tinha
uma mensagem específica e todos os que estavam lá o faziam para transmitir uma mensagem, nem que fosse para relatar suas dificuldades em
colocar os cuidados paliativos na prática. Por isso, acho que o mais importante foi ter esse espaço no congresso, juntando pessoas que vivem
os cuidados paliativos no seu cotidiano, com mais ou menos dificuldade,
e que puderam mostrar suas realizações e, por que não, seus sonhos.
Para saber mais:
www.paliativos.org.br
www.cuidadospaliativos.com.br
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Iara Aydos, coordenadora do módulo de Farmácia
em Oncologia e presidente da Sociedade Brasileira
de Farmácia em Oncologia
Quais foram os critérios e os principais desafios no desenvolvimento da grade da programação?
Procuramos abordar os assuntos mais interdisciplinares e relacionados
a gestão de riscos e auditoria farmacêutica. Esses temas são desafios
encontrados pelos farmacêuticos que já dominam os temas específicos
de farmacotécnica dos medicamentos oncológicos mas necessitam
ainda se desenvolver nas atividades clínicas e de gestão de processos.
Qual o papel do farmacêutico em oncologia hoje e como ele se
encaixa no grande quebra-cabeça da oncologia?
Adquirir medicamentos e materiais, preparar e dispensar as doses
de quimioterápicos são tarefas fundamentais, que devem ser complementadas por um estreito entrosamento entre os membros da
equipe em benefício de uma maior qualidade no atendimento
prestado ao paciente.
Quais são os grandes desafios da farmácia em oncologia hoje? E
quais as tendências?
A relação interdisciplinar é um grande desafio na medida em que o
farmacêutico precisa administrar as diversas necessidades dentro da
EMTA-Equipe Multidisciplinar de Terapia Antineoplásica. Essa nova
forma de atuar abre espaço para profissionais com formação clínica
que trabalham em conjunto com a equipe, junto ao paciente, no esclarecimento e na orientação quanto a utilização de medicamentos,
registro e tratamento de reações adversas e orientações em geral.
Como melhorar a interação entre as várias áreas envolvidas no
tratamento do paciente de câncer?
Qualificar cada vez mais os farmacêuticos nas questões da interdisciplinaridade através do conhecimento dos processos envolvidos
em cada segmento. Ao médico cabem o diagnóstico, o estadiamento e
a prescrição da terapia dentro do protocolo indicado. Ao farmacêutico
compete viabilizar as doses dentro de critérios de biossegurança e assepsia que possibilitem à enfermagem a correta administração ao paciente. O paciente deve ser o centro desse esforço conjunto.
Que aulas foram destaque durante a programação? Por quê?
Todas as aulas foram de grande importância, mas ressaltaria a da
canadense Carole Chambers, que tratou da gestão dos riscos relacionados à medicação, mostrando que a realidade do seu serviço é
similar à realidade brasileira, enfatizando a necessidade de dupla
checagem em várias etapas do processo de prescrição, manipulação
de doses e administração. E a aula da Marcia Manfredi, que abordou
assuntos relacionados ao pagamento dos tratamentos – o alto custo
dos tratamentos e a viabilidade financeira dos serviços têm de ser
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acompanhados para que se mantenham a qualidade e a farmacoeconomia. Um perfeito entendimento entre os serviços e fontes pagadoras deve contemplar transparência e disposição para o diálogo
técnico, tendo o paciente como o maior cliente.
Como o farmacêutico em oncologia se encaixa no tema do congresso “Individualização e Humanização do Tratamento”?
Através da “atenção farmacêutica”, esse profissional presta informações
relacionadas à terapia medicamentosa de forma individual aos pacientes e a seus cuidadores, reconhecendo as dificuldades relacionadas
ao estresse causado pelo diagnóstico e as reações adversas dos tratamentos. Essa atuação efetiva tem apresentado excelentes resultados na
adesão aos tratamentos, contribuindo para um melhor desfecho.
Para saber mais: www.sobrafo.org.br
José Claudio Casali da Rocha, coordenador do módulo
de Genética e Oncologia Translacional
Quais foram os critérios e os desafios para montar a grade de
oncogenômica no pré-congresso?
O maior desafio foi fazer um programa que abordasse temas atuais em
uma linguagem acessível ao oncologista e a toda equipe interdisciplinar,
formada por psicólogos, enfermeiros, biomédicos e farmacêuticos.
A oncogenética vem aos poucos deixando de ser discutida em
salas fechadas. A interdisciplinaridade do câncer, principalmente
no que diz respeito à genética, já é uma realidade?
A interdisciplinaridade é o nosso grande objetivo. O oncogeneticista
passa a integrar a equipe de cuidados do paciente e aproxima a família
para junto da equipe, esclarecendo riscos e medidas de prevenção individualizadas para cada um. O conhecimento de biologia do DNA, da
célula tumoral e as intervenções precisam traduzidos de maneira que
paciente e equipe entendam a informação genética de forma adequada.
O tema do congresso foi “Individualização e Humanização do
Tratamento”. Como a genética pode ajudar nisso?
A informação genética precisa ser bem passada e trabalhada no sentido
de se fazer o diagnóstico correto e traçar uma linha de ação para intervir
nos riscos presentes e futuros. Sabemos que as mudanças de hábitos,
como o cuidado do corpo e da mente, podem atenuar riscos genéticos,
por isso a avaliação psicológica e nutricional é fundamental.
O congresso foi uma arena interessante para a troca de informações entre as diferentes áreas de atuação. As discussões atingiram as expectativas?
Os objetivos foram plenamente atingidos. A estratégia foi oferecer
uma abordagem combinada de teoria aplicada na prática no curso
pré-congresso de oncogenômica. Com casos clínicos reais e a participação de todo o público presente na extração de DNA de
morango e de saliva, conseguimos aproximar os profissionais de oncologia da oncogenética. Durante o congresso, o módulo de
Genética e Oncologia Translacional foi bem avançado, começando
por epidemiologia molecular, patologia molecular, farmacogenética
e, por último, uma palestra internacional da dra. Laura MacConail,
chefe do Instituto de Genoma e do Departamento de Medicina
Personalizada da Universidade Harvard, sobre os desafios de aplicar
a oncogênomica na prática.
O que essa maior atenção à oncogenética diz sobre os caminhos
que a oncologia deve seguir nos próximos anos?
A oncogenética já é uma subespecialidade da oncologia e deverá, nos
próximos anos, ampliar sua atuação nas famílias com câncer hereditário e na área de farmacogenética e marcadores tumorais prognósticos e terapêuticos. Nosso maior desafio atualmente é definir modelos
onde essa prática possa ser estendida ao SUS.
Cristiane Sachotene Vaucher, coordenadora do módulo
de Enfermagem Oncológica e presidente da Sociedade
Brasileira de Enfermagem Oncológica
Quantos enfermeiros oncológicos existem no Brasil hoje? Quantos
estavam no congresso da SBEO este ano?
Não tenho o registro de todos os enfermeiros que trabalham em oncologia no Brasil. No congresso tivemos aproximadamente 500 enfermeiros participantes.
Quais foram os critérios e as principais dificuldades para montar
o programa de enfermagem oncológica do congresso?
O critério foi atingir todas as áreas de atuação do enfermeiro, que vão
desde a prevenção até a paliação, e não tivemos nenhuma dificuldade
em montar a programação para enfermagem.
Quais sessões você destaca como as que mais tiveram repercussão
durante o congresso e por quê?
Tivemos com destaque as palestras:
• “Eventos adversos em quimioterapia”, pois ressaltou a importância da vigilância constante para que esses eventos não aconteçam, evitando dessa forma danos ao paciente e à própria equipe de saúde.
• “A taxonomia da NANDA e a SAE em Oncologia” e “A integração NANDA, NIC e NOC na prática da enfermagem oncológica”,
pois foi colocado que na prática podemos fazer todas as etapas do
processo de enfermagem mesmo nos locais que não têm toda a tecnologia da informática.
• “A utilização de terapias alternativas por pacientes oncológicos”,
pois sabemos que muitos pacientes utilizam essas terapias e hoje já
existem estudos comprovando sua eficácia em pacientes em tratamento quimioterápico.
• “O papel do enfermeiro no Programa Nacional de Controle do
Tabagismo”, pois sabemos que a melhor forma de prevenção das
doenças ocasionadas pelo tabaco é através das ações educativas.
Na solenidade de abertura do evento, ressaltou-se muito a
questão da multidisciplinaridade do câncer. É só teoria ou já constatamos isso na prática? Como?
Na prática isso já está ocorrendo, cada vez mais precisamos da ação
de todos os profissionais da área de saúde para que o paciente tenha
uma efetiva recuperação.
Existe consciência, tanto de médicos quanto de enfermeiros, de
que a enfermagem oncológica exige uma formação específica?
Como mudar esse quadro?
Hoje já está claro que, para que o paciente receba um atendimento de
qualidade, é necessário que este seja feito por profissionais capacitados
cientificamente. Os pacientes requerem um atendimento qualificado,
aliado a muito conhecimento científico e prático, pois sua instabilidade
clínica ocorre em qualquer etapa do tratamento. Infelizmente, muitas
vezes os gestores do serviço não têm a conscientização da importância
e da diferença que faz no serviço um profissional qualificado para atuar
com pacientes oncológicos.
Como você descreve o papel do enfermeiro oncológico no cuidado
do paciente de câncer? Estamos perto do modelo ideal? Quais os
principais obstáculos para atingi-lo?
O papel do enfermeiro é imprescindível na ação do cuidar, pois dentre suas competências está uma atuação direta em ações de prevenção
primária e secundária no controle do câncer, desenvolvendo ações
educativas, apoiando medidas legislativas e auxiliando no diagnóstico
precoce. Além dos atos de prestar assistência no tratamento, reabilitação,
cuidados paliativos e atendimento aos familiares, e também no desenvolvimento de ações de integração junto aos profissionais da equipe
multidisciplinar e a identificação de fatores de riscos ocupacionais para
a prática de enfermagem na assistência ao paciente oncológico.
Ainda não estamos perto desse modelo em todo o Brasil. Certamente os centros mais desenvolvidos conseguem atingir esse padrão
de excelência, mas isso não acontece com cidades mais distantes e
menos desenvolvidas.
O principal obstáculo para conseguir essa excelência ainda é a falta
de recursos financeiros para deslocar profissionais para grandes centros,
onde acontecem os cursos que capacitam o enfermeiro a atuar com o
paciente oncológico. Ainda existem muitos gestores que não veem a
necessidade de ter um profissional qualificado no cuidado do paciente.
Para saber mais: www.sbeonet.com.br
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
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Regina Liberato, coordenadora do módulo de
Psico-Oncologia e presidente da Sociedade
Brasileira de Psico-Oncologia
Como foi a organização da grade e o que se pretendeu com ela?
A gente tinha um objetivo, que defende há tempos, que é o trabalho
em equipe interdisciplinar. A grade tinha como prioridade apresentar
temas atuais e que pudessem ser de uso, de proveito dos diversos
profissionais que lidam com oncologia. Nossa preocupação era também
que fossem temas abrangentes, para que os outros profissionais
pudessem se interessar. Como estávamos num congresso de oncologia
clínica, sabíamos que a população seria variada. A ideia era que nossa
grade atendesse todos os profissionais do congresso.
O congresso enfatizou a ideia de humanização e individualização. Embora essa já seja uma máxima da psico-oncologia, dá
para dizer que já chegamos à interdisciplinaridade na oncologia
como um todo?
O congresso procurou dar ênfase à humanização e ao tratamento individual para fazer bom atendimento, para olhar para o paciente de
maneira singular. Não há, em oncologia, como fazer isso de forma separada, porque implica diferentes dimensões do humano.
Já passamos por um período de multidisciplinas, quando se falava
a respeito do paciente, mas cada um com a responsabilidade de sua
área específica. Hoje falamos em interdisciplinaridade, porque estamos
aprendendo a efetuar trocas, a achar linguagem comum entre profissionais que atendem, que dão assistência e estão aprendendo a trocar
informações sobre isso. Nosso objetivo é chegar à transdisciplinaridade,
quando poderemos fazer o atendimento em conjunto de forma mais
sistemática, mais afinada, onde o indivíduo seja visto pela equipe de
maneira mais constante.
Um bom exemplo de interdisciplinaridade foram as sessões de oncogenética no pré-congresso em Gramado. Estávamos num curso em que a
maioria eram médicos e vários profissionais de aconselhamento genético
falando uma linguagem comum, respeitando os limites de cada um.
A psicologia, de certa forma, faz parte da rotina de todo profissional que lida com câncer, não? Isso foi representado nos participantes nas sessões de psico-onco?
Pela variedade de temas, todas as aulas foram muito cheias. Falamos
de temas relacionados a cuidadores, a pacientes, aos próprios profissionais de saúde, que cada vez mais sofrem da síndrome de burnout.
São aspectos importantes, porque a unidade de cuidados vai muito
além do paciente oncológico. Abordamos também a relação mentecorpo, com profissionais de várias áreas na mesa. Como os temas eram
muito abrangentes, tivemos médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos,
farmacêuticos, enfermeiros e, lógico, muitos psicólogos na sala.
Saímos do congresso muito felizes, com muita gente interessada
em saber mais sobre a psico-oncologia. Foi um resultado extremamente proveitoso.
A SBOC foi muito generosa e bastante feliz ao trazer esses outros
profissionais para dentro do congresso para trocarmos informações. A
inclusão e a humanização nós estamos discutindo em todas as áreas
da sociedade. Em saúde ela ainda é incipiente. Para humanizar, é preciso entender o que é o humano, viver com as diferenças, conviver,
aprender a conviver. Não é um trajeto muito simples, mas foi muito
corajoso fazer um congresso com todos juntos, e bastante gratificante.
Para saber mais: www.sbpo.org.br
SBOC em pílulas
Oncologia Clínica – Terapia Baseada
em Evidências
Se o lançamento tivesse sido numa livraria, a
fila certamente teria virado o quarteirão. O
lançamento do livro Oncologia Clínica – Terapia Baseada em Evidências durante o XVII
Congresso da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, no estande do laboratório
Roche, foi sucesso de público. O livro, que se
propõe a ajudar os oncologistas na árdua
tarefa de se atualizar na área do câncer, é uma iniciativa do Centro de
Oncologia do Hospital Sírio-Libanês.
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Editada pelos oncologistas Artur Katz, Claudio Luiz Ferrari, Frederico Perego Costa, Gustavo dos Santos Fernandes, Paulo Marcelo Hoff,
Ricardo Marques, Vanderson Rocha e Yana Novis, a obra procura ajudar
na tarefa de selecionar a informação mais relevante para o bom exercício
da prática diária. Para isso, destaca o nível de evidência reconhecido para
cada uma das condutas indicadas pelos estudos, orientando os leitores
quanto ao peso que os resultados das diferentes pesquisas devem ter e
apontando o grau de recomendação através de uma versão modificada
do modelo proposto pelo Grading of Recommendations Assessment,
Development and Evaluation Working Group (GRADE).
A primeira edição, com 3 mil exemplares, patrocinada pela Roche,
terá distribuição gratuita.
Grupo Brasileiro de
Tumores Gastrointestinais
já prepara consensos
nacionais para
tratamento
O XVII Congresso da Sociedade
Brasileira de Oncologia Clínica foi o local escolhido para o lançamento
oficial do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais.
Segundo a oncologista Anelisa Coutinho, idealizadora do grupo
juntamente com os oncologistas Paulo Hoff e Gabriel Prolla, a ideia
veio da alta incidência de tumores gastrointestinais observada atualmente. “São doenças extremamente incidentes, e com alguns profissionais no Brasil já com foco de interesse direcionado para isso. Não
são muitos, mas já começam a surgir profissionais com interesse especial em tratamento de tumores gastrointestinais”, afirmou.
O grupo está há um ano em fase de planejamento e já possui uma
série de ações e projetos em andamento, como a elaboração de consensos brasileiros para o tratamento desses tumores que substituam
as diretrizes americanas utilizadas hoje. “A tentativa de criar guidelines
brasileiros que possam ser atualizados com frequência é um dos focos.
Já fizemos a reunião para elaboração do consenso de câncer de cólon,
e temos agendada a reunião para câncer de estômago e esôfago. No
próximo ano temos planejados os consensos dos cânceres de reto,
canal anal, pâncreas e vias biliares”, disse.
Anelisa conta que o grupo também pretende ser um fórum para
discussões, simpósios e consultas no que se trata de tumores gastrointestinais. O objetivo é que seja algo de fácil acesso aos profissionais,
através da internet ou de publicações impressas. “Pretendemos uniformizar uma linguagem, e convergir essa linguagem para o grupo de
tumores gastrointestinais. Além disso, vamos fazer um registro de
casos, para que o Brasil tenha mais dados estatísticos”, explicou.
Ela ressaltou ainda que, apesar de a diretoria atual ser composta basicamente por oncologistas clínicos, o grupo está aberto a todo médico
ou profissional de saúde com interesse em tumores gastrointestinais.
1o Prêmio Roche em
Câncer de Mama
Para incentivar a pesquisa no
Brasil do câncer mais letal entre
as mulheres, o 1o Prêmio Roche
em Câncer de Mama buscou fomentar a análise epidemiológica do
câncer de mama nos diversos serviços públicos e privados do país, retratando um cenário mais próximo da realidade nacional. O prêmio é
uma iniciativa da empresa em conjunto com o Grupo Brasileiro de Estudos em Câncer de Mama (GBECAM), que avaliou os trabalhos a partir de critérios como originalidade, relevância e revisão de literatura.
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A premiação aconteceu durante o XVII Congresso Brasileiro de
Oncologia Clínica, em Gramado. Entre os 58 trabalhos submetidos
por pesquisadores de diversos estados, a primeira colocação ficou com
Lucas Silveira, de Florianópolis, com o estudo “Mortalidade por câncer
de mama, em homens, no Brasil entre 1997 e 2008”.
O autor terá todas as despesas pagas para comparecer ao Simpósio Anual de Câncer de Mama de San Antonio 2011, o mais importante encontro científico da área, que ocorre em dezembro, nos
Estados Unidos. O segundo lugar, que também viajará a San Antonio, ficou com Adriana Regina Gonçalves Ribeiro, do Hospital A.C.
Camargo, de São Paulo, com o estudo “HER2 com FISH indeterminado ou inconclusivo em câncer de mama: limitação terapêutica e
desafio diagnóstico”. A Roche ainda irá patrocinar a ida do 3o ao 5o
colocados ao congresso da ASCO 2012, em Chicago, Estados
Unidos. As pesquisas dos 20 finalistas estão disponíveis no site
www.dialogoroche.com.br/premioroche.
Projeto Universo
MOC (UniMOC)
Durante o XVII Congresso Brasileiro de
Oncologia Clínica, o
oncologista clínico Antonio Carlos Buzaid,
em parceria com a
Dendrix e com apoio
da Roche, lançou o
Universo MOC (UniMOC), um ambiente virtual de cunho informativo
destinado a médicos para discussão de casos teóricos acerca de tratamentos do câncer. O site tem o objetivo de melhorar a capacitação
profissional de médicos e universalizar o acesso às evidências científicas sobre a oncologia.
O projeto foi desenvolvido a partir de uma demanda observada no
site do Manual de Oncologia Clínica do Brasil (www.mocbrasil.com),
onde os usuários usavam o canal Fale Conosco para postar dúvidas e
propor discussões sobre tratamentos do câncer. A frequência dessas
ocorrências levou os editores do Manual a criar o Universo MOC, destinado especificamente a isso.
No UniMOC, as discussões se dão de forma inovadora. Os
usuários – médicos cadastrados no site do MOC, com CRM válido,
independentemente da especialidade – formulam questões teóricas,
sem referenciar casos clínicos específicos. As questões são analisadas
pelo coordenador Marcelo R. S. Cruz e encaminhadas para os consultores do projeto, médicos especialistas nos diversos tipos de
câncer (oncologistas, radioterapeutas, cirurgiões, mastologistas, entre
outros). Em seguida, os consultores elaboram respostas em formato
de vídeo e as disponibilizam na Videoteca do UniMOC para todos
os médicos que queiram pesquisar sobre o caso.
A principal novidade do projeto, segundo a própria equipe, são as
respostas em formato de vídeo, o que torna a pesquisa mais prática e
dinâmica para os usuários do site.
Em nota, a Dendrix, empresa responsável pela edição do UniMOC,
explica que os casos postados podem receber mais de uma resposta e
destaca: “As respostas não devem ser compreendidas como recomendações terapêuticas para casos individuais, mas como opiniões técnicas
com finalidade meramente informativa”.
Para saber mais, acesse: http://mocbrasil.com/unimoc
Ator global em campanha
contra o câncer
A Glenmark conferiu um tom global ao
XVII Congresso da Sociedade Brasileira
de Oncologia Clínica. A empresa trouxe o ator Herson Capri, atualmente na
novela Aquele Beijo, da Rede Globo,
para falar sobre sua experiência e
ressaltar a importância do diagnóstico
precoce e do acesso a exames e tratamento de câncer – essenciais na sua
própria luta e vitória contra a doença.
“A Glenmark acredita em saúde
acessível a uma maior parte da população, promovendo no Brasil
medicamentos genéricos para tratamento do câncer. Sempre lutamos
para que mais pacientes tenham acesso ao tratamento, e nos deparamos com um depoimento do Herson em que ele dizia exatamente
isso”, explicou Ana Luiza Neves, gerente de produtos de oncologia da
Glenmark.
Daí à aparição em Gramado não precisou de muito. Capri é um
dos personagens do livro Sem Medo de Saber, de Ilan Gorin, com depoimentos de personalidades públicas que foram pacientes de câncer
e no qual ele enfatiza a importância do diagnóstico precoce da doença.
“Desenhamos o projeto de o Herson estar no estande e autografar
o livro, chamando atenção sobre a importância do diagnóstico precoce
e do acesso a exames e tratamentos. Ambos os projetos – Acesso ao
Diagnóstico e Acesso ao Tratamento – serão conduzidos com maior
força pela Glenmark ao longo de 2012”, disse Ana.
Oncogeriatria – Uma Abordagem Multidisciplinar
A oncogeriatria ganhou mais uma obra de peso em Gramado. O
livro Oncogeriatria – Uma Abordagem Multidisciplinar, escrito por 58
autores de várias especialidades e instituições, visa disseminar o conhecimento atual sobre as particularidades do paciente idoso com
câncer, propondo a geriatras, oncologistas e onco-hematologistas que compartilhem seus conhecimentos em prol
do restabelecimento da saúde do idoso
com câncer.
O livro aborda em profundidade os
pacientes geriátricos e suas peculiaridades no contexto do câncer. Um
desafio e tanto, considerando a heterogeneidade da população: as capacidades físicas variam entre os indivíduos,
bem como as comorbidades e as expectativas de vida. Essa heterogeneidade afeta decisões terapêuticas, principalmente as relacionadas a tratamentos potencialmente tóxicos. O
grande avanço no conhecimento sobre o câncer e sua patogênese, nos
últimos 20 anos, vem permitindo a descoberta de tratamentos cada
vez mais seguros, eficazes e menos tóxicos – benefícios que, pouco a
pouco, vêm se estendendo a pacientes idosos e muitas vezes frágeis.
Clinical
Trials Brazil
Em parte inspirado
pelo site clinicaltrials.
T rials B razil gov, o projeto Clinicalo site da Pesquisa Clínica em Oncologia
TrialsBrazil (CTB), patrocinado neste último
ano pelo laboratório
Boehringer Ingelheim do Brasil, foi apresentado no congresso da
SBOC. Esse patrocínio permitiu um novo layout e uma reformulação
completa do seu conteúdo.
O CTB, que é uma iniciativa única no Brasil, foi idealizado pelos
oncologistas clínicos Carlos Barrios, Daniel Herchenhorn e Everardo
Saad e, atualmente, é coordenado pela pesquisadora Andrea
Mangabeira. O objetivo do projeto é servir como um repositório de
informações a respeito da pesquisa clínica em oncologia, no qual são
cadastrados os centros de pesquisa e os estudos clínicos que estão
sendo realizados. Essa iniciativa é importante para a divulgação dos
estudos conduzidos no Brasil, já que o país conta com pesquisadores
e estudos de nível internacional.
Durante o congresso, o CTB foi apresentado pelo dr. Carlos Barrios
na sessão de pesquisa clínica, além de ser divulgado aos participantes
por meio de folders e também por vias digitais (tablets conectados à
internet) no estande da Boehringer Ingelheim, onde os congressistas
tiveram a oportunidade de conhecer melhor o projeto, esclarecer dúvidas e expor suas impressões iniciais e sugestões sobre o site.
Para saber mais, acesse: www.clinicaltrialsbrazil.com.br
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Guia Prático para Solicitação de
Testes Moleculares em Oncologia
A Progenética, com apoio da Roche,
lançou em Gramado o Guia Prático para
Solicitação de Testes Moleculares em Oncologia, de autoria de Carlos Gil Ferreira,
Mariano Zalis e Marcos Pinho.
A obra é produto de uma lacuna identificada na oncologia. Segundo o prefácio
Videolaparoscopia e atenção ao médico
generalista foram os destaques da 10a edição
do Congresso Brasileiro de Cirurgia Oncológica
Outro importante evento na área da oncologia foi o X Congresso
da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica, que aconteceu no
mês de outubro, no Rio de Janeiro, paralelamente ao VII Gastrinca
e ao II Curso de Oncologia Essencial. Essa edição teve como tema
principal “Cirurgia Oncológica em Evidência – Buscando Qualidade em um Brasil Desigual”.
Rubens Kesley, presidente do congresso, afirmou que, apesar
da dificuldade de obter patrocínio, o congresso fez parcerias importantes, essenciais para a viabilização do evento. “Uma das
principais dificuldades foi a falta de patrocínio. As indústrias, de
uma maneira geral, não nos apoiaram diretamente, não vestiram
a camisa do congresso. Isso é normal. O cirurgião não é um prescritor de remédios. E o instrumental cirúrgico dura 15 anos.
Então é difícil para a indústria olhar para um cirurgião como
uma fonte para ela. Mas felizmente contamos com um grupo
grande de apoio. Tivemos apoio da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), da Sociedade Brasileira de Radioterapia,
do Instituto Nacional de Câncer. Sem esses apoios esse congresso
não teria acontecido.”
Segundo Kesley, essa edição trouxe uma evolução tanto na
qualidade dos palestrantes como na quantidade de participantes.
“Tivemos mais participantes, na prática quase duplicamos esse
número. Além disso, o centro de convenções utilizado permitiu
uma proximidade maior entre os convidados internacionais, na-
28
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
do livro, devido à falta de formação consistente sobre biologia molecular, muitas vezes faltam “conhecimento técnico e segurança para
escolher um teste molecular, avaliar se a sua metodologia está adequada, enviar o material de maneira adequada e, sobretudo, interpretar corretamente os resultados no sentido da correta tomada de
decisão terapêutica”.
Cobrindo as maiores dúvidas dos oncologistas ao lidar com os
novos testes da oncologia molecular, o livro se propõe a ser um guia
na hora de solicitar um teste a um laboratório especializado.
cionais e congressistas. Foram oito convidados internacionais,
entre eles o prof. dr. Dominique Elias (Instituto Gustave Roussy,
França); o prof. dr. Yuman Fong (MSKCC, EUA); e o prof. dr. Yuji
Nimura (Universidade de Chiba, Japão)”, diz.
Entre os assuntos debatidos, o papel dos tratamentos oncológicos pré e pós-operatórios, procedimentos preservadores
de órgãos, cirurgias multiorgânicas, cirurgia da superfície peritoneal, cirurgia hepatobiliopancreática avançada e os cuidados
perioperatórios que buscam diminuir a morbidade e mortalidade
cirúrgica e os tratamentos radioquimioterápicos. Além disso, a
videolaparoscopia em câncer foi abordada pela primeira vez.
Apesar de ser um tema já discutido nas áreas afins, nunca tinha
sido abordado pelos cirurgiões de câncer. “A videolaparoscopia
não é mais uma coisa do futuro, é realmente o nosso dia a dia.
Hoje é possível realizar as principais cirurgias de câncer pela via
laparoscópica. Isso foi um grande ganho. Outro passo importante
foi ter uma área exclusiva de ginecologia oncológica com grandes
nomes internacionais.”
Outro destaque do congresso foi o Projeto Oncologia Essencial, voltado para o médico generalista – o profissional que terá o
primeiro contato com o doente com câncer –, que trouxe grandes
nomes da oncologia nacional para falar com o médico não especialista sobre diagnóstico precoce, estadiamentos básicos e cuidados paliativos.
O saldo final, na avaliação de Kesley, foi bastante positivo para
a Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica. “Integração talvez
seja a palavra mais importante de um congresso. Não existe uma
sociedade forte onde cada um pensa de um jeito. E para pensar da
mesma maneira é preciso se reunir, conversar, ouvir outras opiniões.
O congresso sem dúvida é um grande ponto de união. E quando
você realiza essa aproximação há um ganho científico. Mudam-se
opiniões. O fato de podermos interagir e conversar abertamente
oferece um novo olhar ao médico, que pode modificar sua conduta
médica, do seu dia a dia, a partir dessa interação.”
Nutrição oncológica
Na mesma ocasião aconteceu o II Congresso Brasileiro de Nutrição Oncológica do Instituto Nacional de Câncer (INCA) e a
V Jornada Internacional de Nutrição Oncológica, reunindo renomados profissionais nacionais e internacionais da área de nutrição em câncer.
O evento, que teve como tema os “Avanços na Assistência, Ensino e Pesquisa em Nutrição Oncológica”, contou com o lançamento do II volume do “Consenso Nacional de Nutrição
Oncológica”, documento elaborado por dezenas de profissionais
de saúde ao longo dos dois últimos anos. O consenso aborda condutas nutricionais recomendadas para paciente crítico oncológico,
paciente idoso oncológico e para sobreviventes de câncer, apresentando ainda as propostas para o uso de antioxidantes, fitoterápicos e dietas imunomoduladoras.
Por Sergio Azman
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
29
Divulgação
nutrição
Avaliação e planejamento
nutricional em câncer
Dan Linetzky Waitzberg
* Professor associado do
Departamento de Gastroenterologia
da FMUSP; coordenador do Laboratório de Metabologia e Nutrição
em Cirurgia (Metanutri – LIM 35);
diretor do Grupo de Nutrição
Humana (GANEP)
Letícia De Nardi
* Nutricionista; mestre pelo
Programa de Pós-Graduação em
Gastroenterologia da Faculdade de
Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP); pesquisadora
do Laboratório de Metabologia e
Nutrição em Cirurgia (Metanutri –
LIM 35 – FMUSP); especialista
em nutrição clínica pelo Grupo
de Nutrição Humana (GANEP)
Claudia Cristina Alves
* Nutricionista; doutora em ciências
pelo Programa de Pós-Graduação em
Oncologia da FMUSP; pesquisadora
do Laboratório de Metabologia e
Nutrição em Cirurgia do Departamento de Gastroenterologia da
FMUSP (Metanutri – LIM 35); especialista em nutrição clínica pela
Faculdade São Camilo
Lilian Mika Horie
* Nutricionista; mestranda pelo
Programa de Pós-Graduação em
Gastroenterologia da FMUSP;
pesquisadora do Laboratório de
Metabologia e Nutrição em Cirurgia
(Metanutri – LIM 35 – FMUSP);
especialista em Nutrição Hospitalar
em Hospital Geral do Instituto
Central do Hospital das
Clínicas da FMUSP
Contato: [email protected]
30
Avaliação nutricional
A avaliação nutricional do paciente oncológico deve
ser feita já no momento da primeira consulta e realizada periodicamente ao longo de todo o tratamento.
Os métodos de avaliação nutricional mais utilizados na prática clínica são a avaliação nutricional
subjetiva global, associada a medidas de variáveis
antropométricas, laboratoriais e nutricionais.
Questionário de avaliação nutricional
A avaliação nutricional por meio de aplicação
de questionário é simples, de baixo custo e possibilita rápida identificação de pacientes com risco
nutricional. Pode ser utilizado já no primeiro contato com o paciente. Caso se verifique algum grau
de desnutrição ou risco de desnutrição, a avaliação
nutricional deve ser mais aprofundada, mediante a
análise de critérios objetivos.
Para pacientes com câncer, três questionários
específicos foram validados, como se observa na
Tabela 1.
Medidas antropométricas
A antropometria caracteriza-se por ser um
método simples, de baixo custo, não invasivo e de
alta confiabilidade. Sua finalidade é identificar a
quantidade e a distribuição dos principais determinantes da composição corporal.
O peso corporal pode ser utilizado como percentual de perda de peso, percentual de peso ideal
ou peso ajustado, índice de massa corpórea (IMC)
e como marcador indireto da massa proteica e reservas de energia.
Mediante a obtenção do peso e da altura do paciente, é possível calcular o índice de massa corporal
(IMC), ou índice de Quetelet. O IMC é muito utilizado e difundido como método de avaliação do estado nutricional e leva em consideração o peso em
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quilos, dividido pela altura em metros ao quadrado.
O peso atual é útil para o cálculo da porcentagem de alteração de peso habitual do paciente, que
pode ser classificado em perda ponderal moderada
ou grave, considerando-se o tempo e a quantidade
de peso perdido, como ilustra a Tabela 2. Considera-se perda de peso não intencional de 10% ou
mais do peso corpóreo nos últimos seis meses como
déficit nutricional importante e com relação direta
ao mau prognóstico dos pacientes com câncer.
Informações relacionadas à história clínica dos
pacientes com câncer podem indicar mudanças recentes da alteração corpórea e hábitos alimentares.
Além disso, o exame físico pode revelar precocemente sinais de desnutrição, como perda de massa
muscular, perda de força muscular e depleção dos
estoques de gordura.
Medidas de composição corporal
A avaliação da composição corporal na prática
clínica pode ser realizada por meio das pregas
cutâneas e de bioimpedância elétrica. A utilização
da circunferência do braço (CB) e as pregas cutâneas podem ser ferramentas importantes para
diagnosticar o estado nutricional do paciente, principalmente na falta do peso corporal. A CB representa a somatória dos tecidos ósseo, muscular e
gorduroso; a prega cutânea do tríceps (PCT) se refere à estimativa das reservas e/ou comprometimento de tecido adiposo; e a circunferência
muscular do braço (CMB) reflete a quantidade ou
o grau de depleção da reserva muscular. A Tabela 3
apresenta a classificação do estado nutricional, segundo Jellife 1996.
A bioimpedância elétrica (BIA) é um método não
invasivo, rápido, sensível, indolor e relativamente
preciso que pode ser aplicado à beira do leito para
avaliação da composição corporal. É um método
Tabela 1 Características de três questionários para câncer, adaptada de Huhmann, 2005
Itens de
questionário
Modelos de
avaliação
Ref
Dados inclusos
17
Histórico de perda de peso,
ingestão alimentar, sintomas,
atividades, demanda metabólica,
avaliação física. É realizada pelo
paciente e por avaliador.
36
Miniavaliação
nutricional
18
Histórico de perda de peso,
ingestão alimentar, atividades,
estresse fisiológico, dados
antropométricos. É realizada
por um avaliador.
37
Instrumento de
triagem de desnutrição
3
Histórico de perda de peso,
alterações no apetite. É realizada
pelo próprio paciente.
38
Avaliação nutricional
subjetiva global
Adaptado de: Huhmann e Cunninghan, 2005
Tabela 2 Classificação da perda de peso habitual em porcentagem
Período
Perda grave (%)
Perda moderada (%)
1 semana
1 mês
3 meses
6 meses ou +
≤ 2,0%
≤ 5,0%
≤ 7,5%
≤ 10,0
> 2,0%
> 5,0%
> 7,5%
> 10,0%
Fonte: Blackburn, 1977
Tabela 3 Classificação do estado nutricional de acordo com CB, PCT, CMB e sexo
70%
60%
10
23
20
8
20
17
7,5
18
15
90%
80%
70%
60%
15
25
21
13
22
18
11
20
16
9
17
13
Masculino
Eutrófico
90%
80%
PCT
CB
CMB
12,5
29
25
11,3
26
23
Feminino
Eutrófico
PCT
CB
CMB
16
27
23
Classificação
Fonte: Jellife, 1996
• >120%: obeso
• 110% - 120%: sobrepeso
• 90% - 110%: eutrófico
• 80% - 90%: desnutrição leve
• 60% - 80%: desnutrição moderada
• <60%: desnutrição grave
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
31
“ A avaliação
nutricional do
paciente oncológico
deve ser feita já
no momento da
primeira consulta”
estimativo dos volumes hídricos, a partir da resistência de uma corrente elétrica e da estatura do paciente.
A análise da BIA é feita por meio de passagem de corrente elétrica da baixa amplitude (500 a 800mA) e
alta frequência (50kHz), mensurando os componentes primários, a resistência (R), a reactância (Xc),
a impedância (Z) e o ângulo de fase (AF).
Catalano e colaboradores avaliaram o estado nutricional de pacientes com câncer por meio de BIA e
variáveis antropométricas e verificaram que, apesar
de os índices antropométricos apresentarem valores
dentro da normalidade, o exame de BIA revelou
desnutrição, através da alteração da razão da massa
extracelular e massa intracelular.
Entretanto, em situações de edema e ascite a
avaliação da composição corporal por esses métodos deve ser interpretada com cautela.
Nas últimas décadas, estudos têm investigado
o papel do ângulo de fase como possível marcador
de saúde em diversas condições de doença, como
câncer de pulmão, insuficiência renal, queimados
e crianças desnutridas.
Gupta e colaboradores (2004) avaliaram o
papel prognóstico do ângulo de fase e a média do
tempo de sobrevida de 58 pacientes portadores de
câncer de pâncreas estágio IV. Pacientes com ângulo
de fase <5,0º (n=29) tiveram média de tempo de
sobrevida de 6,3 meses, enquanto os pacientes com
ângulo de fase >5,0º tiveram média de tempo de
sobrevida de 10,2 meses, p<0,02. Esse estudo sugere que o ângulo de fase é um importante
indicador prognóstico em câncer de pâncreas
avançado. Entretanto, mais estudos, com número
maior de pacientes e diferentes tipos de câncer,
ainda são necessários.
Medidas bioquímicas e imunológicas
A avaliação laboratorial nutricional considera
medidas bioquímicas de proteínas de síntese hepática, hemograma, leucograma e medidas plasmáticas de minerais, oligoelementos e vitaminas.
Em condições mórbidas, os níveis das proteínas
plasmáticas de síntese hepática podem estar alterados,
como doença hepática, metástase, disfunção renal,
doença inflamatória intestinal, drogas, estresse e lesão.
A Tabela 4 ilustra o uso clínico e as limitações das
proteínas plasmáticas.
A hemoglobina é uma proteína de transformação
metabólica muito lenta e sua diminuição ocorre mais
tardiamente na depleção proteica. É um índice sensível, mas pouco específico da desnutrição, podendo
se alterar quando há perda sanguínea, estados de
diluição sérica e transfusões sanguíneas.
A contagem total de linfócitos (CTL), ou linfo-
Tabela 4 Proteínas plasmáticas: uso clínico e limitações em avaliação nutricional
Proteínas
Meia-vida
Uso clínico
Limitações
Albumina
14-21 dias
Índice prognóstico de
gravidade
Hidratação, distúrbio
renal, hepático
>3,5g/dL = normal
3,0-3,5g/dL = depleção leve
2,4-2,9g/dL = depleção moderada
<2,4g/dL = depleção grave
Transferrina
8-9 dias
Índice prognóstico e
monitorização
Alteração do
metabolismo do ferro
150-200mg/dL = depleção leve
100-150mg/dL = depleção moderada
< 100mg/dL = depleção grave
Pré-albumina
2 dias
Monitorização e depleção aguda
Distúrbio renal,
hepático e inflamação
20mg/dL = normal
10-15mg/dL = depleção leve
5-10mg/dL = depleção moderada
< 5mg/dL = depleção grave
Proteína transportadora do
retinol
12 horas
Índice prognóstico de
gravidade
Distúrbio hepático,
inflamação, diminuição
de vitamina A e zinco
Valores inferiores a 3mg/dL
indicam desnutrição
Valores de referência
Fonte: Coppini, 2004
32
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
citometria, mede as reservas imunológicas momentâneas, indicando
condições do mecanismo de defesa celular do organismo. Valores encontrados entre 1.200 e 2.000/mm3 são considerados depleção discreta;
entre 800 e 1.199, depleção moderada; e valores menores que 800 indicam depleção grave.
Necessidades energéticas e nutricionais
A necessidade energética diária de pacientes com câncer varia de
acordo com diversos fatores: idade, sexo, peso, altura, atividade, composição corporal e condições fisiológicas.
O aumento de peso é um efeito colateral comum em mulheres com
câncer de mama em tratamento quimioterápico (QT) adjuvante. Campbell e colaboradores verificaram o efeito da QT adjuvante em dez mulheres portadoras de câncer de mama. Os autores não encontraram
mudanças no gasto energético de repouso antes e após QT (1.189,68
± 80,27 vs 1.205,76 ± 56,71 kcal/d; p =0,74). Além disso, as pacientes
não ganharam peso durante o tratamento (663 ± 5,1 vs 68,2 ± 5,0 kg;
p =0,09), entretanto apresentaram aumento de massa gorda (24,2 ±
3,8 vs 26,5 ± 3,2kg; p=0,04), enquanto a massa muscular permaneceu
inalterada. Os autores sugerem que essa alteração na composição corporal pode ter uma importante implicação na saúde dessas mulheres.
A estimativa do gasto energético é uma importante ferramenta para
nortear a terapia nutricional. Ele pode ser calculado por diversos métodos, como calorimetria indireta, direta, água duplamente marcada e
fórmulas preditivas (equações). As fórmulas utilizam variáveis como
peso, altura, idade, sexo e superfície corporal e são muito utilizadas
na prática clínica, por serem simples de calcular, não invasivas, sem
custo e de amplo acesso. As equações mais utilizadas para estimar o
gasto energético são as de Harris-Benedict (1919), apresentada na
Tabela 5, e a fórmula baseada no peso (Tabela 6).
A recomendação de ingestão proteica e de micronutrientes para pacientes com câncer varia em função da idade, estado nutricional prévio
do paciente, tipo de tumor, tratamento adotado e condição clínica. De
maneira geral, seguem-se os critérios apresentados na Tabela 7.
Tabela 5 Fórmula para cálculo da necessidade energética
estimada através da equação de Harris-Benedict
Equação de Harris-Benedict
Homens
GEB = 66,5 + (13,7 x peso) + (5 x altura) - (6,8 x idade)
Mulheres GEB = 655 + (9,6 x peso) + (1,8 x altura) - (4,7 x idade )
GET
GET = GEB x FA x FE x FT
GEB = gasto energético basal (Kcal/dia); peso em Kg; altura em cm; idade em anos; GET =
gasto energético total; FA = fator atividade, FE = fator estresse; FT = fator térmico.
O fator atividade relaciona-se à capacidade de locomoção do indivíduo, sendo: confinado à
cama (fator = 1,2), deambulando pouco (fator = 1,25) e deambulando (fator = 1,3).
Segundo Long (1979), para pacientes com câncer e também para aqueles em tratamento
quimioterápico e/ou radioterápico, recomenda-se aplicar um fator estresse de 1,25.
O fator térmico relaciona-se à temperatura corporal elevada: 38ºC (fator 1,1); 39ºC (fator
1,2); 40ºC (fator 1,3); e 41ºC (fator igual a 1,4).
Tabela 6 Fórmula para cálculo da necessidade energética estimada através
de valor calórico preestabelecido e peso corpóreo do indivíduo
Equação gasto energético total baseado no peso
Tipo de paciente
Objetivo
20-25
Acamado ou sedentário
Manutenção
30-35
Hipermetabólico,
anabolismo
Ganho de peso, suprimento
de maior demanda
Kcal/Kg peso/dia
Fonte: Justino et al, 2004
34
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
Tabela 7 Recomendação de ingestão proteica e de micronutrientes
para pacientes com câncer
Eutrófico submetido a estresse terapêutico
Calorias totais
Calorias não proteicas
25kcal/kg a
35kcal/kg
100% a 200% do gasto
energético de repouso
Proteínas
Solução padrão de
aminoácidos (NPT) ou
proteína íntegra (NE)
0,25 – 0,35g nitrogênio/kg/dia
ou 1,5 a 2,0g proteína/kg/dia
Vitaminas
Solução padrão balanceada
Vitamina K ≥ 10 mg/dia
Vitamina B1, B6 > 100 mg/dia
Antioxidantes: vitaminas A, C, E
Elementos traços
Solução padrão completa
Zinco 15-20 mg/dia
Selênio 120 µg/dia
Eletrólitos
Adaptação diária sódio, potássio, cálcio
Fósforo > 16 mMol/dia
Magnésio > 200 mg/dia
Fonte: Nitenberg, 2000
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Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
35
ginecologia
Prevenção do
câncer de ovário
O
CÂNCER DE OVÁRIO É O MAIS LETAL DE TODAS
AS NEOPLASIAS MALIGNAS GINECOLÓGICAS. MENOS DE UM TERÇO DAS MULHERES ACOMETIDAS
Divulgação
sobrevive cinco anos após o diagnóstico. A prevenção do câncer de ovário constitui um dos
grandes desafios da medicina, e por muito tempo
todas as tentativas foram no sentido de identificar
a lesão precoce nos ovários e extirpá-la. Entretanto,
essas estratégias, na sua quase totalidade, resultaram em grandes fracassos.
No estudo denominado “Prostate, Lung, Colorectal and Ovarian (PLCO) Cancer Screening
Trial”, uma população de 78.216 mulheres foi rastreada para câncer de ovário. No grupo de estudo,
39.105 mulheres fizeram dosagem do CA 125,
anual, por seis anos, e ultrassonografia transvaginal
anual por quatro anos. No grupo controle, 39.111
mulheres fizeram exames rotineiros usuais. O
seguimento máximo foi de 13 anos.
A Tabela 1 demonstra a incidência de câncer de
ovário e de morte nos dois grupos.
É interessante notar que, além de não ter impacto na redução da mortalidade por câncer de
Jesus Paula Carvalho
* Professor livre-docente de ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; coordenador
do Serviço de Ginecologia Oncológica
do Instituto do Câncer do Estado de
São Paulo (ICESP)
Contato: [email protected]
38
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
ovário, no grupo de rastreamento houve 3.285
falso-positivos, que por sua vez resultaram em
1.080 cirurgias desnecessárias e 163 complicações1.
Para prevenir um tipo de câncer é necessário
saber como ele se origina, quais os fatores de risco,
quais as lesões precursoras e como ele se desenvolve a partir dessas lesões.
Em todos os demais tipos de câncer ginecológico, os fatores de risco, as lesões precursoras
e até mesmos alguns agentes etiológicos são bem
conhecidos.
Nos ovários, entretanto, até muito recentemente
o único fator de risco conhecido era a quantidade
de ovulação. Quanto maior o número de ovulações
apresentava a mulher, maior era o risco de câncer
de ovário (teoria de Fathalla)2.
Isso motivou a única medida preventiva do
câncer de ovário até pouco tempo atrás: a
diminuição no número de ovulações, com o uso de
anovulatórios, ou seja, as pílulas anticoncepcionais.
De fato, o uso de anovulatórios orais por mais de
cinco anos é capaz de reduzir o risco de câncer de
ovário em até 50%3.
Tabela 1: Desfecho de uma população submetida a um programa de
rastreamento para câncer de ovário, comparada com uma população controle
Controle
Estudo
No de mulheres
39.111
39.105
Casos de câncer
176
(4,7/10.000)
212
(5,7/10.000)
Mortes
100
118
Falso- positivos
3.285
Cirurgias
1.080
Complicações
163 (15%)
Mortes por
outras causas
2.914
2.924
Conclusões: O rastreamento não diminuiu a mortalidade por câncer de ovário.
Exames falso-positivos resultaram em complicações
Além do uso de anovulatórios orais, outra medida preventiva recomendada era a salpingo-ooforectomia profilática nas pacientes com
reconhecido risco familiar para câncer de ovário.
São consideradas pacientes de risco para câncer de ovário as mulheres portadoras de mutações nos genes BRCA1 e BRCA2, cuja chance
de desenvolver câncer de ovário ao longo da vida pode chegar a mais
de 50%. Por esse motivo, a recomendação é que sejam retirados os
ovários e as tubas uterinas quando elas tiverem idades entre 35 e 40
anos4. Evidentemente, as consequências hormonais e reprodutivas
dessa conduta não são desprezíveis.
A partir dos anos 2000 alguns fatos relevantes mostraram que as
estratégias de prevenção e diagnóstico precoce do câncer do ovário
pareciam estar equivocadas5-8.
Estudando peças operatórias de pacientes submetidas a salpingoooforectomias profiláticas, diferentes autores observaram o mesmo
fenômeno: a lesão precursora do carcinoma invasivo do ovário não se
encontrava no ovário, mas sim nas tubas uterinas, mais exatamente na
porção terminal das fímbrias9. Esse fato motivou o início de estudos
sistemáticos das fímbrias, e os achados reforçaram ainda mais essas
primeiras impressões.
O câncer mais frequente no ovário é o carcinoma seroso, com aproximadamente 80% dos casos. O carcinoma seroso inicia-se na porção
terminal das fímbrias, onde pode ser encontrado com frequência na sua
forma pré-invasiva ou intraepitelial (neoplasia intraepitelial tubárica).
As tubas uterinas têm um tropismo pela ferida ovulatória no
ovário. No momento da ovulação, as tubas uterinas movimentam-se e
colocam suas fímbrias em íntimo contato com a ferida ovulatória, com
a finalidade de fazer a captação do óvulo. Nesse momento, células neoplásicas, ou com grande potencial neoplásico, presentes nas extre-
midades das fímbrias são implantadas no ovário e a neoplasia maligna
que ali se origina se desenvolve de forma rápida, fazendo pensar que
o ovário é o sítio primário10,11.
Isso explica por que a ovulação constante é fator de risco para
câncer de ovário. Existem fortes evidências de que os únicos tumores
realmente originados nos ovários sejam os tumores das células germinativas. Os tumores epiteliais (carcinomas) na sua grande maioria
são tumores originados em outros sítios e implantados precocemente
nos ovários. Esse fato constitui uma mudança radical de paradigma e
deve provocar uma revisão de todas as estratégias de prevenção e diagnóstico precoce do que convencionamos chamar de câncer de
ovário, quando o mais correto seria chamá-lo de “câncer no ovário”.
Todos esses estudos e achados são ainda muito recentes e as consequências naturais desses fatos novos são muitas:
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I, Clavel-Chapelon F, Engel P, Kaaks R, Schütze M, Steffen A, Bamia C, Trichopoulou A, Zylis D, Masala G, Pala V, Galasso R, Tumino R, Sacerdote C,
Bueno-de-Mesquita HB, van Duijnhoven FJ, Braem MG, Onland-Moret NC,
Gram IT, Rodríguez L, Travier N, Sánchez MJ, Huerta JM, Ardanaz E, Larrañaga
N, Jirström K, Manjer J, Idahl A, Ohlson N, Khaw KT, Wareham N, Mouw T,
Norat T, Riboli E. Oral contraceptive use and reproductive factors and risk of
ovarian cancer in the European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition. Br J Cancer l2011.
a) a ooforectomia profilática deixa de fazer sentido e deve ser substituída pela salpingectomia profilática, com consequências muito
menos danosas para o bem-estar da mulher;
b) os programas de rastreamento e diagnóstico precoce focados
nos ovários estarão sempre fadados ao insucesso, pois quando a
doença chega ao ovário ela já é uma doença secundária;
c) são necessárias novas estratégias no sentido de estudar as lesões
precursoras nas tubas uterinas;
d) devem ser identificados os fatores de risco para a transformação
neoplásica das fímbrias uterinas.
Tudo isso está apenas começando. O que se pode concluir, entretanto, é que os conceitos referentes à carcinogênese ovariana estão passando por uma mudança radical de paradigmas.
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
39
do bem
Diagnóstico sobre rodas
Unidades móveis de prevenção realizam exames
e ajudam a aumentar a conscientização sobre o câncer
Por Sergio Azman
O
DIAGNÓSTICO PRECOCE DO CÂNCER TEM CON-
TRIBUÍDO CADA VEZ MAIS PARA REDUZIR A TAXA
“Apesar do trabalho
dos agentes de
saúde e dos exames,
a falta de informação
e o medo de descobrir
a doença atrapalham
a ação das
unidades móveis”
42
DE MORTALIDADE PELA DOENÇA. QUANDO DEtectado no estágio pré-sintomático, ou seja, antes
que algum sintoma da doença se manifeste, o
câncer pode ser tratado e as chances de cura se tornam bem maiores.
Para realizar esse diagnóstico e levar informação
e tratamento, se necessário, o Hospital do Câncer
de Barretos possui seis unidades móveis (ônibus e
carretas adaptadas) que percorrem o país realizando
exames preventivos de câncer de mama, pele, próstata e câncer de colo do útero, além de duas
unidades fixas (Barretos e Juazeiro, na Bahia).
O trabalho teve início em 1994, para melhorar
o diagnóstico precoce de câncer na região de Barretos, no interior do estado de São Paulo. Os casos
que chegavam até a instituição, principalmente os
relacionados a mama e colo do útero, quase sempre
estavam em estágio avançado. Por isso, decidiu-se
realizar uma busca ativa de mulheres para exames
preventivos. Com o sucesso da iniciativa o projeto
cresceu e passou a atuar não somente em Barretos,
mas em outras regiões do país, num trabalho de
prevenção de câncer pioneiro na América Latina.
As unidades móveis de prevenção realizam diferentes tipos de exames e vão a diferentes localidades
do país. São realizados exames preventivos de câncer
de mama e colo uterino (Unidades I, II, IV, V e VI),
e de pele, próstata e colo uterino (Unidade III).
No caso do câncer de pele, além dos exames, os
pacientes podem ser tratados na própria unidade
móvel, equipada com um centro cirúrgico completo
para a realização de cirurgias ambulatoriais.
Ana Maria Batista da Silva, enfermeira que esteve recentemente numa ação na cidade de Guaraci,
no interior paulista, coordenando os exames de
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
mamografia e Papanicolau, explica que as consultas
são todas agendadas anteriormente pelos agentes de
saúde locais. “A enfermeira de Barretos, responsável
pela prevenção, entra em contato com o município,
e a equipe do local seleciona as vagas. As enfermeiras da cidade fazem uma triagem e, uma vez selecionadas as pacientes, nós mandamos os kits de
cadastro. É tudo feito com antecedência”, diz.
Segundo ela, a partir do momento em que a
unidade vem para a cidade, a prefeitura é responsável por tudo, desde o exame até o final do
tratamento, se for necessário. “Quando a cidade solicita a unidade já são passadas as exigências, e uma
delas é que a cidade seja responsável pelo paciente.
Se uma paciente é diagnosticada, a próxima conduta
é o município encaminhá-la para Barretos. O resultado é enviado para avaliação dos médicos e, caso
julguem necessário, são solicitados exames complementares. Se for constatado câncer de mama, por
exemplo, ela já começa o tratamento”, diz.
Medo, vergonha e falta de informação
Apesar do trabalho dos agentes de saúde, que visitam os pacientes em suas casas, agendam e explicam os exames, a falta de informação e o medo de
descobrir a doença (como se o fato de não saber da
existência do câncer, por si só, já representasse a
cura) atrapalham o trabalho das unidades móveis.
“O preventivo pode ser colhido em qualquer
posto de saúde. Mas é só falar que é ‘o caminhão do
Hospital do Câncer’, já começam a pensar de outro
jeito, acham que viemos buscar o câncer nelas.
Além disso, às vezes existem falhas dos agentes ao
passar a informação correta e, outras vezes, em
cidades com população muito humilde, são os pacientes que não conseguem compreender essa informação”, lamenta Ana Maria.
os dois exames, ao descobrir que não poderia realizar a mamografia, pois já tinha feito no ano anterior (a recomendação é que o exame seja feito a
cada dois anos), desistiu também de fazer o Papanicolau. As enfermeiras argumentaram, demonstraram a importância do exame, mas não teve jeito.
Saiu brava, batendo o pé.
Daniela Lopes Maciel, agente de saúde da
cidade de Guaraci, conta que muitas vezes encontra
resistência dos pacientes, que não querem fazer o
exame. “A mamografia elas dizem que é porque dói,
e a maioria diz ter vergonha de fazer o Papanicolau.
Então temos de conversar, explicar que as pessoas
que irão fazer o exame não são de Guaraci, que são
de outra cidade. Falamos da importância do exame,
vamos cativando até concordarem.”
Apesar desses casos, há também quem tenha
consciência da importância do diagnóstico precoce.
Waldemar Zenário, 71 anos, é casado há 41 anos e
sempre acompanha sua esposa nas visitas ao médico.
Ele mostra uma consciência surpreendente sobre a
necessidade dos exames preventivos e sobre sua
própria saúde. “Acho uma boa coisa isso, queria que
viesse para os homens também. Antes vinha, não tem
vindo mais. Naquela época eu era mais novo, e meu
“Eu ganho meu dia
quando visito uma
família que oferece
resistência por um,
dois, três anos e
determinada hora
eu consigo levá-la
para o posto”
Imagens: Sergio Azman
Pisciane Piva, enfermeira que também esteve
em Guaraci com a unidade móvel, afirma que
muitas pessoas faltam às consultas e ressalta a importância do trabalho realizado pelo agente de
saúde. “Muitas mulheres marcam e não vêm. O
número de faltas chega a 50% dos agendamentos.
Às vezes ela não pode vir por causa do trabalho, ou
são as exigências de cada exame. Acontece muito
de a mulher vir e não poder fazer. Por isso o trabalho do agente de saúde é fundamental antes de a
unidade móvel chegar ao município”, diz.
Apenas um dia acompanhando os profissionais
na cidade de Guaraci, que naquela tarde contava
com um caminhão e um ônibus com capacidade
para realizar, juntos, 70 mamografias e 180 exames
de Papanicolau, foi suficiente para perceber que o
trabalho de convencer algumas mulheres a fazer os
exames não é fácil. Uma mulher de 58 anos, que já
havia feito alguns exames na carreta em anos anteriores, disse que foi até lá por iniciativa própria.
“Nós temos que valorizar nossa saúde, né?” No entanto, na hora em que foi chamada para o exame,
onde ela estava? Atravessando a praça, a passos largos. Fugindo. Literalmente.
Outra mulher, de 51 anos, que pretendia fazer
Ao lado: unidade móvel de prevenção
do Hospital do Câncer de Barretos
Abaixo: Railda Zenário (primeira da
fila) aguarda atendimento na unidade
móvel de prevenção
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
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Imagens: divulgação
Tour de Prevenção da Sociedade
Brasileira de Dermatologia
Tour de Prevenção
da SBD em números
Em 2010, foram atendidas
durante o Tour 2.579 pessoas. Apenas 33,54% delas
disseram se expor ao sol com
proteção solar, e a maioria,
62%, admitiu não usar proteção. Casos de câncer de
pele na família foram relatados em 14,25% dos atendimentos, e 207 pessoas foram
diagnosticadas com câncer de
pele, ou seja, 8%.
Este ano, ainda não contabilizada a última parada do
Tour, no Rio de Janeiro, o
número de pessoas atendidas
já ultrapassava os 3,5 mil.
44
PSA (antígeno prostático específico, um dos critérios
utilizados para detecção do câncer de próstata) era
baixo. Os médicos diziam que eu não precisava, que
meu PSA era abaixo de 0,1. Mas agora, no último
exame que eu fiz, deu 0,8. Vou fazer novamente,
porque acho que é importante cuidar”, diz, revelando
conhecimento pouco comum sobre o tema.
Sua mulher, Railda Zenário, 62 anos, diz que
sempre faz os exames, apesar de não gostar. “Hoje só
fiz o Papanicolau. Queria fazer a mamografia, mas
não deixaram porque fiz no ano passado. Eu não gosto de fazer o exame, fico muito sem graça. É chato. É
importante saber que a gente não tem nada, mas eu
não gosto. Tenho vergonha, mas nunca deixei de ir.”
Railda também veio acompanhada da irmã,
Reni Ângela Carvalho, agente de saúde em São José
do Rio Preto. Ela revela que, em sua experiência
como agente, também encontra muita resistência
nas visitas que faz. “Eu ganho meu dia quando visito uma família que oferece resistência por um,
dois, três anos e determinada hora eu consigo levála para o posto. Pessoas que não têm cultura, principalmente, acham que não têm muito risco porque
não estão sentindo nada. E muitas delas dizem a
frase ‘Quem procura acha’”, conta. “Mas antes achar
do que ser encontrado.”
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
Vem chegando o verão...
A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) também possui um caminhão de atendimentos gratuitos à população para diagnosticar e tratar o
câncer de pele – que é o mais incidente no Brasil,
segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA),
correspondendo a 25% de todos os tumores malignos registrados no país. Para 2011, são esperados 113.850 novos casos.
O Tour de Prevenção é feito por um caminhão
itinerante, com o apoio da La Roche-Posay, que
percorre dez cidades brasileiras realizando diagnósticos e encaminhando os pacientes para que possam passar pelo tratamento indicado.
O trajeto inclui capitais como Palmas, São Luís,
Teresina, Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife, Salvador e Rio de Janeiro.
Diferente das unidades móveis do Hospital do
Câncer de Barretos, o Tour de Prevenção acontece
apenas uma vez ao ano. Neste ano o roteiro teve
início em setembro, durante o 66o Congresso Brasileiro de Dermatologia, realizado em Florianópolis.
Terminou no Rio de Janeiro, no fim de novembro,
no dia exato da Campanha Nacional de Prevenção
ao Câncer de Pele, que oferece atendimento gratuito
simultâneo em 23 estados e no Distrito Federal.
Mais que oferecer atendimento à população, o
objetivo do caminhão é chamar a atenção das pessoas para o câncer de pele. “O caminhão é muito
vistoso. É um grande veículo de divulgação e
podemos atuar na prevenção primária, ou seja,
impedir que ele aconteça. Não visamos fazer atendimentos e achar que vamos resolver todo o problema. Acaba sendo um processo de divulgação”,
afirma Marcus Maia, coordenador da Campanha
Nacional de Prevenção ao Câncer de Pele (CNPCP).
Segundo Maia, o caminhão vai aonde possa
fazer uma divulgação do câncer de pele, tanto para
médicos e público geral como para as autoridades
sanitárias locais. “Um dos objetivos é estimular os
médicos de atenção primária. Todo mundo vai ao
pediatra, ao clínico geral, ao ginecologista. Queremos estimular esses profissionais, principalmente
os geriatras, a analisar a pele do paciente e a orientar, tentando evitar que o câncer de pele ocorra.”
Ele ressalta que, apesar de a prevenção primária ser
o principal foco no câncer de pele, o Tour também
ajuda a esclarecer a população sobre as características da doença, os sinais, as formas de prevenção
e a importância do diagnóstico precoce.
Apesar de não realizar agendamento prévio, o
Tour de Prevenção tem forte adesão pelos locais
onde passa. “Quando chegamos, tem fila na frente.
A população procura, já tem certa noção dos sinais.
As mulheres são mais atentas, fazem o preventivo.
Os homens já são mais difíceis. O que acontece é
que, quando você faz uma boa divulgação, existem
muitas adesões de pacientes de risco. Entre 8% e
10% das pessoas que comparecem estão com
câncer de pele. O que não significa que esse
número represente a população geral.”
Uma vez diagnosticado, o paciente deve ser
acompanhado. “Não adianta apenas diagnosticar.
Só aceitamos que as cidades participem do Tour se
forem resolutivas.” Por isso, além da prevenção
primária e secundária, para o paciente diagnosticado com câncer é oferecido também o tratamento
gratuito nos serviços credenciados à SBD.
“Quando chegamos,
tem fila na frente.
A população
procura, já tem certa
noção dos sinais.
As mulheres são
mais atentas,
fazem o preventivo.
Os homens já são
mais difíceis”
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
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quiz
Quebra-cabeça
O quiz é uma seção interativa de Onco& que convida leitores a dar opiniões,
levantar dúvidas e emitir hipóteses do caso apresentado
Novo caso
Paciente feminina de 71 anos, branca, casada, natural
do Rio de Janeiro.
Apresenta baixa acuidade visual progressiva no olho direito
há seis semanas. Refere dor torácica à direita quando inspira e
apresenta tosse seca há alguns meses. Nega outros sintomas.
Submetida a mastectomia da mama direita há mais de 20
anos. Câncer de mama segundo relato da própria paciente.
Colecistectomia e apendicectomia há mais de 25 anos. Nega
diabetes. Nega HAS.
Ao exame oftalmológico observamos acuidade visual corrigida de 20/200 no olho direito e 20/20 no olho esquerdo. Segmento anterior sem anormalidades em ambos os olhos.
Fundoscopia sob midríase (fotos 1 e 2) revelou no olho direito massa grande, de aproximadamente 6 mm de base e 1,5 mm
de elevação (medida pela ultrassonografia scan B ocular), brancacenta, localizada em polo posterior. Observamos ainda pig-
mentação de aspecto moteado e má delimitação de bordos. Há
um descolamento seroso de retina associado. Fundoscopia sob
midríase dentro dos limites da normalidade no olho esquerdo.
Testes de função hepática, hemograma e bioquímica do
sangue normais em ambos os olhos.
Foi solicitado exame de tomografia computadorizada de
tórax. Fotos a seguir.
Qual é o seu diagnóstico?
Qual o tratamento?
Evandro Lucena
Médico oftalmologista do Instituto Nacional de Câncer (INCA)
Ex-fellow Harvard Medical School/Massachusetts Eye and Ear
Infirmary
Mande suas respostas para:
[email protected]
Os resultados serão divulgados
no site www.revistaonco.com.br
e na próxima edição de Onco&.
46
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
Resposta do quiz anterior – edição 8
CLKA, sexo feminino, branca, 58 anos
- Retirou um nódulo mamário há mais de dez anos
(sem neoplasia - sic).
- Colecistectomia laparoscópica há um ano.
- Há três meses notou abaulamento na parede abdominal,
interpretado como hérnia.
- No momento está com dor severa em parede abdominal
e torácica, de difícil controle com analgésicos simples.
Antecedentes pessoais: hipertensão arterial controlada.
Medicação em uso: Bezerol, Benicar.
Tomografia computadorizada de tórax (08/07/2011): lesão expansiva infiltrativa heterogênea e de contornos irregulares, localizada no terço inferior da parede torácica anterior, medindo 7,1 x
5,0 cm nos maiores eixos transversos. Essa lesão envolve o terço
inferior do corpo do esterno e o apêndice xifoide, estendendo-se
para os planos subcutêneos do quadrante inferomedial da mama
esquerda. Junto ao seu contorno inferior nota-se lesão com as mesmas características, que infiltra o músculo reto abdominal direito
e os planos subcutâneos adjacentes, medindo 3,6 x 3,4 cm.
Destacam-se linfonodomegalias nas cadeias mamárias internas medindo até 3,3 x 1,7 cm (com componente que se insinua
para o mediastino anterior), axilar esquerda (2,7 x 1,9 cm) e
retropeitonal (1,2 cm).
Pequeno nódulo sólido heterogêneo com 1,1 cm no quadrante inferomedial da mama esquerda.
Anatomopatológico em 14/07/2011: biópsia de massa de
parede torácica. Positivo para células neoplásicas malignas, presença de células epitelioides atípicas, contendo vacúolos claros
intracitoplasmáticos.
Imuno-histoquímica em 30/07/2011:
RE neg. RPg. neg. Her2 neg. (Score 0)
p53 positivo focal e fraco
Ki-67 em cerca de 80% das células
Citoqueratina 5/6 focalmente positivo
Qual o diagnóstico provável?
Neoplasia de mama. Os exames mostram lesão profunda no
parênquima mamário e uma disseminação não usual, exclusivamente para a cadeia mamária interna e, por extravasamento linfonodal, invasão por contiguidade do esterno e parede torácica
e abdominal alta. Secundariamente, extensão do comprometimento para linfonodos retroperitoneais.
Qual a melhor proposta terapêutica?
Pelo comprometimento dos linfonodos retroperitoneais, trata-se
de um estádio clínico IV. A imuno-histoquímica mostra negatividade para RE/RPg e HER2, com Ki-67 elevado (80%), sugerindo
uma neoplasia basal-símile. Dessa forma, a indicação é para
quimioterapia sistêmica antineoplásica. Os esquemas mais adequados de tratamento ainda não estão definidos por consenso. Os
mais usuais são as combinações de taxano e antraciclina, e paclitaxel e bevacizumabe. A radioterapia pode ajudar no controle da
dor local. O uso de bisfosfonato é questionável, por não se tratar
de metástase óssea, mas sim de uma lesão óssea por contiguidade.
No caso em questão a paciente recebeu paclitaxel + bevacizumabe
+ radioterapia antálgica, e a evolução está sendo satisfatória.
Ricardo Caponero
Oncologista clínico da Clínica de Oncologia Médica de São Paulo
Tem algum caso interessante que gostaria de divulgar?
Mande para [email protected]
Onco& dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012
47
curtas
Risco de câncer
em pacientes
transplantados
Receptores de órgãos transplantados
têm um risco elevado de desenvolver
32 tipos diferentes de câncer, segundo
um novo estudo feito nos EUA com
transplantados que descreve a gama de
tumores malignos que podem ocorrer.
Pesquisadores do National Cancer
Institute (NCI) avaliaram dados médicos de mais de 175.700 pacientes transplantados, representando cerca de 40%
de todos os receptores de transplantes de
órgãos no país. Os resultados do estudo
foram publicados em novembro no Journal of the American Medical Association.
“Embora o transplante seja uma
terapia salva-vidas para pacientes com
estágio final da doença em órgãos, ele
também coloca os receptores em
maior risco de desenvolver câncer, em
parte por causa dos medicamentos administrados para suprimir o sistema
imunológico e evitar a rejeição do
órgão. O risco de câncer entre os pacientes transplantados se assemelha ao
de pessoas com infecção por HIV, cuja probabilidade é elevada para os
cânceres relacionados com infecção
devido à imunossupressão”, disse o
autor Eric A. Engels, MD, do Departamento de Infecções e Imunoepidemiologia, Divisão de Epidemiologia
e Genética do Câncer do NCI.
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dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
Prêmio incentiva produção científica
em oncologia clínica
Criado para incentivar a produção científica em oncologia
clínica, o Prêmio Professor Sebastião Cabral Filho é uma
homenagem a um dos mais
destacados profissionais da
medicina brasileira, que dedicou boa parte de sua vida à pesquisa e à prática clínica em oncologia.
Em sua primeira edição, o prêmio conta com o apoio da Sociedade Brasileira
de Oncologia Clínica (SBOC), da Sociedade Brasileira de Cancerologia (SBC) e da
Sandoz do Brasil. Ele é aberto para residentes, estudantes de especialização em oncologia clínica e profissionais formados na área até dezembro de 2008. Os trabalhos
devem ser inscritos gratuitamente pelo site www.premiosebastiaocabral.com.br até
31 de maio de 2012.
O primeiro colocado assistirá ao encontro promovido pela Sociedade Americana
de Oncologia Clínica (ASCO), em Chicago (EUA), em 2013. Já o autor do segundo
estudo premiado terá lugar garantido no Congresso da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), em 2013.
FDA retira autorização do uso
de bevacizumabe para câncer
de mama avançado
O FDA retirou em meados de novembro a autorização do uso da droga Avastin
(bevacizumabe) para tratar o câncer de mama em estágio avançado. Segundo o
órgão, não há comprovação de que o medicamento seja capaz de prolongar a vida
dos pacientes com a doença. Além disso, a droga apresenta efeitos colaterais
graves, como trombose e hipertensão. Ela segue recomendada para combate de
outros tipos de câncer, como colorretal, pulmonar, renal e cerebral.
Em nota, a Roche no Brasil afirmou que a decisão está limitada apenas ao
mercado americano. “A Roche reitera que Avastin continua como uma alternativa
válida para médicos e pacientes que lutam contra o câncer de mama metastático,
uma doença grave que tem poucas possibilidades de tratamento.”
A decisão do órgão americano de retirar a indicação do uso para câncer de
mama não traz reflexos imediatos no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) informou que, por enquanto, nenhuma revisão da recomendação brasileira será feita. A ideia é apenas reforçar o monitoramento de eventuais
reações adversas do medicamento.
Fonte: Veja
Doadores de Sabedoria
disseminam experiências
Foi lançado em São Paulo o
Doadores de Sabedoria, uma
oportunidade para pessoas que
vivenciaram ou se encontram em situações-limite em função de
doenças graves como o câncer de compartilhar suas vivências e aprendizados. O objetivo é valorizar a importância da vida plena, da atenção
ao próximo e do cuidado com a saúde física, mental e espiritual.
A iniciativa, uma parceria entre Instituto Oncoguia, Museu da Pessoa e consultoria in futuro, reunirá depoimentos que serão contados
por meio do programa “Conte sua História”, do Museu da Pessoa (espaço expositivo e estúdio aberto para que toda e qualquer pessoa
possa gravar sua história ou indicar alguém), e ficarão disponíveis nos
sites dos Doadores de Sabedoria (www.doadoresdesabedoria.com.br),
do Instituto Oncoguia, da in futuro e na página do Museu.
Os depoimentos também serão divulgados nas mídias sociais,
Twitter e Facebook, além de sites e blogs.
Glenmark
Farmacêutica
vence Scrip
Awards 2011
Um dos mais importantes prêmios da indústria farmacêutica
mundial, o Scrip Awards 2011 elegeu a Glenmark Farmacêutica como a vencedora em duas categorias: Best Company
in an Emerging Market (Melhor Empresa em Mercados Emergentes) e Best Overall Pipeline (Melhor Pipeline Global).
Além das categorias em que foi vencedora, a empresa
também havia sido indicada como finalista em outras duas:
“Acordo de Licenciamento do Ano”, com GBR 550; e “Executivo do Ano”, com Glenn Saldanha, presidente da empresa.
Para saber mais sobre a premiação, acesse: www.scripintelligence.com/awards/2011_winners/
calendário 2011/2012
2011
Evento
Data
Local
Informações
2011 CTRC-AACR San Antonio
Breast Cancer Symposium
6 a 10 de dezembro
San Antonio, EUA
www.sabcs.org
1a Jornada de Reabilitação
em Oncologia do ICESP
9 e 10 de dezembro
São Paulo, SP
www.icesp.org.br
2o Simpósio de Cuidados
Paliativos do HUPE Edição 2011 –
Formação e Comunicação
9 e 10 de dezembro
Rio de Janeiro, RJ
www.hupe.uerj.br
Data
Local
Informações
2012 Gastrointestinal Cancers
Symposium (ASCO)
19 a 21 de janeiro
San Francisco, CA, EUA
www.gicasymposium.org
Multidisciplinary Head and
Neck Cancer Symposium (ASCO)
26 a 28 de janeiro
Phoenix, AZ, EUA
www.headandnecksymposium.org
2012 Geniturinary Cancers
Symposium (ASCO)
2 a 4 de fevereiro
San Francisco, CA, EUA
www.gucasymposium.org
ABC do Câncer: Abordagens
Básicas para o Controle do Câncer
1 a 29 de fevereiro
Plataforma de Educação
a Distância do INCA
www.ead.inca.gov.br/
VI Congresso Latino-Americano
de Cuidados Paliativos
14 a 17 de março
Curitiba, PR
www.vicongresoalcp.org/bienvenidos
XIII Congresso Brasileiro
de Oncologia Pediátrica
17 a 20 de abril
Natal, RN
www.cbopnatal.com.br/index.php
ASCO Annual Meeting 2012
1 a 5 de junho
Chicago, IL, EUA
www.chicago2012.asco.org
2012
Evento
Calendário de eventos de 2011/2012 completo e atualizado:
50
dezembro 2011/janeiro-fevereiro 2012 Onco&
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