A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO OS GRILOS DOS GERAIS: APROPRIAÇÃO DE TERRAS E CONFLITO AGRÁRIO NO NORTE DE MINAS SANDRA HELENA GONÇALVES COSTA1 Resumo: Neste artigo analiso o processo de formação da propriedade privada da terra no Norte de Minas Gerais, especificamente, as práticas de grilagem ocorridas nos municípios de Grão Mogol e Riacho dos Machados. Enfoco a legislação, as práticas de apropriação de terras devolutas e a renda da terra, desde o início do século XX, quando o governo federal deixou a cargo dos governos estaduais e nas mãos de oligarquias regionais a tarefa da implementar uma política de ocupação. Analiso os conflitos territoriais atuais envolvendo, de um lado, as instituições estatais e a ação das empresas siderúrgicas no desmatamento do Cerrado e da Caatinga, e do outro, os camponeses e quilombolas dos gerais. A base teórica encontro nas teses de Martins (1979 e 1994) sobre desenvolvimento do capitalismo rentista no Brasil e nas teses de Oliveira (1997 e 1999) acerca do desenvolvimento do capitalismo na agricultura no Brasil de forma desigual, contraditória e combinada. Palavras-chave: Grilagem de terras, Norte de Minas, Território Abstract: In this article analyzes the private property of the formation process of the land in the North of Minas Gerais, specifically, grabbing practices that occurred in the municipalities of Grão Mogol and Riacho dos Machados. I focus on the legislation, the “terras devolutas” appropriation practices and land rent. Since the early twentieth century, when the federal government has the responsibility of state governments and in the hands of regional oligarchies the task of implementing a policy of occupation. I analyze the current territorial conflicts involving, on the one side, state institutions and the action of the steel companies in the deforestation of the Cerrado and Caatinga, and the other side, peasants and the general maroons. The theory was found in the Martins thesis (1979;1994) on development of the rentier capitalism in Brazil and the Oliveira thesis (1997;1999) on the development of capitalism in the brazilian agriculture unequally, contradictory and combined way. Key-words: Land Grabbing; North of Minas; Territory 1 – Introdução No presente trabalho abordo a questão agrária e o processo apropriação privada da terra em municípios do Norte de Minas, o marco inicial situo no período entre 1897 a 1911, em que a regulação legal sobre as terras no Brasil passou por uma 1 - Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, DEGEO/FFLCH/USP, bolsista de Doutorado CNPq. E-mail de contato: [email protected] 1288 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO transição. Quando o governo federal ao não implementar uma política de ocupação das terras devolutas, deixou a cargo dos governos estaduais e nas mãos de oligarquias regionais tal tarefa. Neste contexto, as práticas de grilagem ocorridas nos cartórios das comarcas de Grão Mogol e Riacho dos Machados2 são evidências empíricas de que as elites locais, associadas politicamente às oligarquias regionais, nas primeiras décadas do século XX, valeram-se da posição de poder e das “brechas” jurídicas da regulamentação e fiscalização federal para grilar terras públicas, costume reproduzido nas décadas seguintes. Quando, a grilagem nos imóveis foi revalida pela sucessão de regulamentações, que mesmo inconstitucionais foram legitimando a grilagem neste municípios como em outros no norte do Estado e no Jequitinhonha. Em meio a esta questão, inserida nas disputas territoriais que estão por trás da estrutura fundiária do Estado de Minas Gerais, analiso o caso da empresa RIMA INDUSTRIAL S/A que, confirma como o capitalismo, mesmo aquele que se coloca na vanguarda da produção mundial para o mercado globalizado, encontra-se ancorado nas formas mais atrasadas de reprodução, como o desmatamento, sonegação fiscal, grilagem de terras públicas. A base teórica encontro no materialismo dialético em Marx (1986) e Luxemburg (1976). Nas teses de Martins (1979 e 1994) sobre desenvolvimento do capitalismo rentista no Brasil calcado em práticas políticas atrasadas e na tese de Lígia Osório Silva (2008) sobre a passagem das terras públicas para o domínio privado, que analisam o caráter rentista inerente ao processo de constituição da propriedade privada da terra no capitalismo no Brasil. Isto quer dizer que, no Brasil, o desenvolvimento do modo capitalista de produção se concretiza, principalmente, através da fusão do capitalista e do proprietário de terra em uma mesma pessoa. Este processo que teve sua origem na escravidão vem sendo cada vez mais soldado, desde a passagem do trabalho escravo para o trabalho livre, particularmente com a Lei de Terra de 1850 e o final da escravidão. Esta é também, a leitura realizada por Oliveira (1997;1999), sobre o o desenvolvimento do capitalismo na agricultura no Brasil, e aprofundada em seus mais recentes estudos acerca da formação capitalista da propriedade da terra no Brasil 2 Analisados na pesquisa de doutorado em andamento : “A questão da origem da propriedade da terra no Norte de Minas Gerais”, orientada pelo Prof. Dr. Ariovaldo Umbelino de Oliveira DEGEO-FFLCH-USP. 1289 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO (Oliveira:2010; Oliveira e Faria:2009). Para analisar a formação capitalista da propriedade da terra no Brasil, e entender as raízes da formação da classe dos proprietários de terra e as origens do latifúndio no Brasil recorri às leituras de Silva (op.cit), Motta (2009). Para a questão específica da análise da documentação histórica mineira e da legislação fundiária mineira tem sido fundamentais as teses de Carrara (1999) e Lamas (2003) e o artigo de Espíndola, et al (2010) e Campos (2007). Esta pesquisa partiu de uma questão apresentada por Oliveira (2015), em uma pesquisa inédita sobre a "Estrutura fundiária e grilagem de terras no norte de Minas Gerais" quando da discriminação da Cadeia Dominial dos Imóveis circunscritos em uma área entre os municípios de Riacho dos Machados e Serranópolis de Minas, ele detectou, “vícios de origem” nas matrículas de imóveis rurais registrados nos Cartórios de Registro de Imóveis das comarcas de Grão Mogol e Porteirinha,MG. Naquela ocasião Oliveira levantou uma questão: de que as elites locais se anteciparam à ação do Estado, e com o apoio do judiciário dividiram as terras entre si, através da estratagema dos pedidos de divisão judicial das “fazendas” sem base legal para tal, e sobretudo porque transformou simples recibos de compra e venda como portadores do direito. Diante desta questão e face à questão agrária em Minas Gerais tenho analisado a legislação estadual de terras, a ação do Estado e o impacto socioterritorial das empresas de plantio de eucalipto e mineração sobre as terras dos geraizeiros, caatingueiros e vazanteiros no Norte de Minas. 2-Desenvolvimento Esta pesquisa busca desvendar as particularidades do processo de formação da propriedade privada da terra em Minas Gerais, por meio da grilagem, na porção territorial que compreende 24 municípios pertencentes às Comarcas de Grão Mogol, Montes Claros, Francisco Sá, Porteirinha e Salinas. Eles tem sofrido o impacto das políticas estatais, principalmente aquelas que entregaram as terras aos monopólios de plantio de Eucalipto e Pinus nos gerais. A questão geral que norteia esta análise centra no debate sobre o processo de constituição da propriedade privada da terra no Brasil, fundamentado na concepção de que o desenvolvimento capitalista moderno se faz de forma desigual e contraditória e, tem em sua raiz o caráter rentista e continua colocando necessariamente também entre suas 1290 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO contradições principais, as formas da apropriação privada da terra. A grilagem de terras no norte de Minas Gerais se insere neste debate e tem as suas especificidades a serem reveladas. O ordenamento territorial mineiro tem um marco específico no século XVIII, quando ainda o Norte de Minas, estava subjugado aos limites das Capitanias de Pernambuco e Bahia. Com a descoberta dos corpos minerários na região diamantífera se instaurou uma preocupação interna e externa (Coroa Portuguesa) em definir os limites da Capitania de Minas Gerais, ordenar a fundação de Vilas e demarcar a jurisdição das freguesias, para que, com isso pudessem exercer mais controle sobre as terras a serem exploradas pela mineração, como também foi uma preocupação, o abastecimento destas áreas. Sobre a regulação e ao ordenamento fundiário, no período colonial, a Ordem Régia de 14 de abril de 1738, foi apontada por Carrara:(2007) como a origem do levantamento fundiário em Minas Gerais. Neste bojo, (MOTTA, 1998:121-122) apontou como problemas enfrentados pela Coroa Portuguesa, a implantação de instituto jurídico para promover o cultivo, o crescimento de categorias sociais estranhas aos semeiros, e a incapacidade de efetivar o controle e fazer cumprir as suas exigências que acabavam por estimular o crescimento da figura do posseiro. As concessões de sesmarias obedeciam a ritmos distintos na região mineradora e na região dos currais. De acordo com Carrara (op.cit:164) na primeira as concessões foram instrumentos secundários de legitimação da propriedade “visto que a velocidade com que as terras eram compradas e vendidas diminuíam a necessidade de recurso às petições”. Enquanto nos currais, onde a circulação monetária era menor se comparada com as áreas mineradoras. Donde o autor entende que as sesmarias nas regiões mineradoras consolidavam um domínio, na ausência de outros instrumentos legais, como as escrituras de compra e venda. Assim, o mercado de imóveis, constituiu uma outra forma de acesso à propriedade privada. O que está colocado por este autor, é que mesmo antes do estatuto jurídico da propriedade privada da terra no Brasil, na prática havia uma forma privilegiada de acessá-la pela compra e pela venda. 1291 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO No início da República, dois documentos legais interessando as terras públicas devolutas do Estado de Minas Gerais3. foram editados antes mesmo da promulgação da Constituição Estadual de 1891. O Decreto nº 174 de 23 de agosto de 1890, regulou a arrecadação do produto da venda de terras no Estado de Minas Gerais. Ele teve como ponto central a destinação da arrecadação obtida com a venda de terras públicas devolutas estaduais para o “desenvolvimento da colonização”. E mais, começava a abrir caminho para a venda de terras devolutas fora da hasta pública, no que refere-se aos lotes que deixassem de ser arrematados. E o Decreto nº 179 de 30 de agosto de 1890 foi o segundo ato legal sobre as terras devolutas em Minas Gerais, consistiu em: "... uma intervenção do governo provisório republicano que não havia definido ainda a atribuição dos estados sobre as terras devolutas. Trata-se da criação de colônias (“burgos”) com o objetivo de alavancar a produção agrícola via mão de obra assalariada." Esse Decreto em seu artigo 1º trazia a tendência à destinação das terras devolutas estaduais às elites escravagistas que tinham ficado sem os trabalhadores escravos com a abolição e aos novos capitalistas que se implantavam no campo. Por sua vez, a Constituição Estadual de Minas Gerais de 1891 também, repete em seu Artigo 3º o princípio da defesa da propriedade privada em sua plenitude emanada da primeira Constituição da República. A primeira lei de terras do Estado de Minas Gerais a Lei no 27 de 25 junho de 1892 – regulou a medição e demarcação das terras devolutas e criou na então Secretaria da Agricultura, Comércio e Obras Pública uma seção especial para o serviço de terras e colonização. Em seu primeiro artigo garantia o princípio vindo da Lei de Terras de 1850 que prescreveu o acesso às terras públicas devolutas pela compra e venda. As medições previstas na lei, definiram lotes de 25 hectares como padrão para a venda das terras devolutas. No artigo 9 º permitia a possibilidade da separação do domínio público do privado pela via administrativa: Dentre outros pontos, também estabeleceu como condição para a venda a necessidade da morada habitual nas terras adquiridas. Este marco temporal, é chave para investigar os títulos originários dos imóveis e buscar as 3 Os conteúdos completos das legislações citadas neste artigo encontram-se disponíveis no sítio eletrônico da Assembleia Legislativa de Minas Gerais http://www.almg.gov.br/consulte/legislacao. 1292 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO irregularidades nas matrículas e nas áreas dos imóveis registrados nos cartórios de Grão Mogol e Porterinha (a Fazenda Tapera é um dos imóveis em estudo) 4. Desde meados do século XIX até os dias atuais, o aparato jurídico político do Estado, foi colocado à disposição da legitimação da apropriação rentista e foi criando condições para a formação da classe dos proprietários de terra em Minas Gerais. Para isto, na Primeira e na Segunda República, uma sucessão de Leis e Decretos foram aprovados sem intenção se solucionar os conflitos sociais e aos conflitos legais (esses muitas das vezes inconstitucionais gestados na Câmaras Legislativa Mineira, provavelmente composta por oligarquias rentistas). Ao contrário, os mecanismos legais foram acionados toda fez que os proprietários de terras necessitaram expandir o poderio sobre as terras, toda vez que a grilagem de terras necessitasse ser legitimada. Os municípios de Grão Mogol e Riacho dos Machados, foram inseridos nessa dinâmica. De forma conflituosa, porque nesta paisagem de transição, entre o Cerrado e Caatinga, os camponeses e os quilombolas foram desenvolvendo uma particular relação com meio que permitiu construir identidades de luta pelas terras de uso comum, pelo território de morada, trabalho e reprodução da vida. Território das formas de se alimentar e de ser, nos gerais, nas vazantes dos rios, córregos, riachos e na mata seca da caatinga, construíram as identidades geraizeiras, vazanteiras e caatingueiras. O processo de formação da propriedade privada da terra na região, pretende subjugar, tais dinâmicas de organização territorial e de reprodução da vida. As elites locais, a partir dos anos 1950/60, apoiadas nas políticas de Estado se articularam com as empresas capitalistas, expandido a grilagem, desterritorializando camponeses, desmatando o Cerrado, apropriando-se da água e agudizando a questão hídrica e fundiária. Donde foi fundamental a atuação da Ruralminas, na expulsão dos posseiros e favorecimento dos grileiros. Corrupção reinventada no Instituto de Terras de Minas Gerais ITER-MG, como denunciado nos processos recentes sobre “a grilagem de terras da família Meneghetti” (Folha Regional de Taiobeiras:2013), e também a “Operação Grilo” (Associação do Ministério Público de Minas Gerais:2013). O primeiro, refere-se a um esquema de grilagem chefiado pela 4 COSTA, S.H.G. Terra seca, chão fecundo: grilagem de terras e conflito agrário no Norte de Minas Gerais (no prelo). Artigo aceito para apresentação no Simpósio Internacional de Geografia Agrária SINGA, 2015 1293 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO família Meneghetti envolveu também empresários ligados à Florestaminas, Replasa e Foscalma, além de ex-oficiais dos cartórios de registro de imóveis de Rio Pardo de Minas e Salinas. E o segundo a um esquema que organizou corruptos de órgãos do governo, empresas de exploração florestal, funcionários de cartórios e prefeitos de diversos municípios, em torno da especulação e rentismo envolvendo interesses minerários (ouro e minério de ferro). O contexto recente, tem sido também protagonizado pela “territorialização dos monopólios” das empresas siderúrgicas e de exploração mineral. Como é o caso da MINERAÇÃO RIACHO DOS MACHADOS LTDA (uma empresa subsidiária da empresa canadense Carpathian Gold Inc.), a FLORESTAS RIO DOCE SA (incorporada pela VALE), a RIMA INDUSTRIAL SA, a SICAFE PRODUTOS METALÚRGICOS LTDA, SIFLOR FLORESTAMENTO E REFLORESTAMENTO LTDA). Ou seja, os municípios do Norte de Minas não escaparam da escalada de dimensões territoriais empreendida pelas mineradoras, e pelas siderúrgicas, que desmatam e queimam a vegetação nativa, trazem consigo a exploração do trabalho nas carvoarias. Plantam eucalipto, para serem queimados como combustível aos fornos das caldeiras das siderúrgicas. Processo que tem modificado drasticamente o regime de uso comum das terras pelos camponeses. O caso da empresa RIMA INDUSTRIAL é um exemplo, de como as empresas capitalistas realizam sua produção, lucro ou extraem sua renda ancoradas nas formas mais atrasadas. A RIMA INDUSTRIAL S/A (2015) revela ocupar 40 mil hectares com 65 milhões de árvores plantadas para produção de carvão vegetal para suas próprias fábricas e produtos para o “mercado madeireiro”. Explora 430mil ton/ano de minério. Além de ser líder na produção e comercialização de ligas à base de silício no Brasil. Este empresa envolve também corrupção, grilagem, política e políticos do alto escalão do governo mineiro, desmatamento, sonegação fiscal, grilagem de terras públicas, conforme foi revelado pela operação “Máfia do Carvão”, na qual foi envolvido o ex-Deputado Federal Bernardo Santana Moreira (PR-MG)5, que foi diretor da empresa, acusado de envolvimento nas operações de venda ilegal de carvão obtido pelo desmatamento 5 O ex-deputado federal Bernardo Santana (PR-MG) é filho de José Santana de Vasconcelos Moreira (PR-MG) que foi deputado Federal entre 1987-2011. Conforme detalhei sua trajetória e de outros políticos mineiros latifundiários na representação dos interesses ruralistas no Mestrado (COSTA,2012:201) 1294 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO clandestino de mata nativa do Cerrado. Segundo Supremo Tribunal Federal (STF:2014) foi feita a denúncia contra o deputado, pela suposta prática de crimes associados à “Máfia do Carvão”, ele seria o responsável pelo fornecimento de carvão vegetal extraído de mata nativa para empresas siderúrgicas de Minas Gerais, entre 2005 e 2010. A RIMA INDUSTRIAL S/A é a empresa que tem a maior área plantada com eucalipto no município de Riacho dos Machados, MG. A empresa possui sob arrendamento sete glebas de terras devolutas públicas estaduais. Além, dessas duas áreas, possuiu quatro imóveis em seu nome. Um destes imóveis é denominado Fazenda Rodiador também apresenta dois problemas que remetem inevitavelmente à fraude. Em primeiro lugar, sua cadeia sucessória remeteu à Gleba 91 da divisão judicial da Fazenda Marimbo, cuja descrição da área, também foi alterada sem justificativa alguma entre uma transcrição e outra do imóvel, quando o imóvel foi adquirido por M. G. R. Em segundo lugar, a localização da área objeto da Transcrição no 1.769 Livro 3-T fls. 291 e 291, de 09/09/1954, é a Gleba 91 da divisão judicial da Fazenda Marimbo, pertencente a A. N. P. e está localizada à margem direita do Córrego Rodiador à jusante da estrada que ligava com Grão Mogol/MG, depois, da Lagoinha, que ficou atualmente entre a rodovia asfaltada MG-120 e o leito da antiga estrada, quando ambas cruzam o citado córrego. Entretanto, na Planta Imobiliária, área que a RIMA INDUSTRIAL S/A tem localizado o imóvel é parte da Gleba 76 (também apropriada indevidamente pela FLORESTAS DO RIO DOCE S/A, e principalmente sobre as Glebas 95 e 153 também destinadas a ausentes, e as Glebas 28, 75 e 78 com destinatários. Inclusive, parte da Gleba 134 da FLORESTAS DO RIO DOCE S/A, hoje da CISAM SIDERÚRGICA S/S, entre as Glebas 76, 78 e 75 foi apropriada pela RIMA INDUSTRIAL S/A. Ou seja, são registros cartoriais que circulam na região, porém não são detentores das posses correspondentes. Via de regra, circularam pelas mãos de grileiros conhecidos na região, como no seguinte caso: Em 1983, O. M. M. adquire as duas glebas, porém não tinha a posse da área correspondente. Fez uso das mesmas como garantia em hipotecas, e, depois vendeu-as. Depois de mais duas transações as duas glebas foram compradas pela RIMA INDUSTRIAL S/A. Assim, pode ser observado, corroborando com o que escreve Oliveira (2015), que a propriedade capitalista da terra mesmo sem a própria terra, também é objeto de compra e venda no mercado, pois, há sempre alguém querendo se beneficiar dele. Uma coisa é 1295 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO certa, e esta matrícula é prova cabal, mesmo sem a terra correspondente em si, ela foi objeto de hipoteca. O caso dessa empresa demonstra que o latifúndio do presente, tem logrado se apropriar das terras camponesas e quilombolas através de ações fraudulentas, que tem como um dos locus principais os cartórios de registros de imóveis. Considerações Todo este processo histórico de privatização das terras e desenvolvimento das formas capitalistas de produção no campo nos gerais, dialeticamente, tem produzido resistências camponesas e quilombolas, que expressam a contradição e as resistências de um povo que reclama por produzir nas terras e que elas sejam “soltas” que na trincheira da luta territorial tem logrado enriquecer o debate ambiental, no que tange ao modo de se relacionar com as particularidades ecológicas na paisagem de transição entre o Cerrado e a Caatinga. Este texto se soma às lutas e resistências históricas, desde a memória dos indígenas cujo sangue se juntou ao território das águas e ao suor dos povos que irrigam de esperanças do sertão dos gerais. 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