Seção III B Capítulo 40 Avaliação do homem infértil Carlos Roberto Ferreira Jardim Quando se avalia um casal infértil, o homem deve ser investigado já na primeira visita, não importando o período de infertilidade relatado. Sabemos que 15% dos casais apresentam dificuldades na sua fertilidade e que o fator masculino responde pelo menos pela metade das causas. Consensualmente, a propedêutica do casal com problemas na fertilidade só é recomendada após um ano de relações sexuais bem-distribuídas ao longo do ciclo menstrual sem uso de métodos contraceptivos e na ausência de gravidez neste período. A investigação inicial do fator masculino se deve ao fato de que esta abordagem é bastante simples, eficiente, pouco invasiva e com relação custo-benefício interessante. A história clínica bem-colhida, dirigida e o exame físico minucioso, especialmente na área genital, fornecem dados importantes no processo investigativo. A seqüência que sugerimos nesta avaliação seria: a) Anamnese detalhada e direcionada; b) Exame físico; c) Exames complementares. Anamnese Consideraremos a seguir os fatos de maior relevância na história do paciente. História de trauma genital Com lesão testicular que possa levar à atrofia do órgão. Traumas raquimedulares que possam justificar problemas com emissão e ejaculação seminal. Acidentes vasculares no testículo Tais como torções, bastante freqüentes na infância e adolescência, podem resultar em atrofia do órgão. Cirurgias pregressas Tais como hernioplastias e cirurgias escrotais que possam lesar os ductos deferentes. Cirurgias que afetem o colo vesical causando ejaculação retrógrada e cirurgias de denervação, tais como simpatectomia, que afetam a emissão seminal. Anomalias congênitas É fundamental saber sobre a correta migração dos testículos, já que as criptorquidias ou ectopias uni ou bilaterais, mesmo quando corrigidas cirurgicamente, podem ser responsáveis pela infertilidade masculina. Nas hipospádias ou epispádias severas não-corrigidas a deposição seminal pode ser inadequada. Período da infertilidade Hábitos do paciente Sabemos que o tabagismo pode afetar o movimento flagelar dos espermatozóides. O alcoolismo pode levar à redução na produção germinativa, bem como drogas tipo maconha e cocaína. Quanto mais longo for este período pior o prognóstico, já que aí estarão provavelmente causas mais graves, tais como endometriose mais severa na mulher ou oligoastenozoospermia grave no homem. 137 Untitled-2 137 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia História de fertilidade pregressa Parece ser de melhor prognóstico aqueles casos em que já houve gravidez anterior com a parceira atual ou com outras parceiras. fisário ou por problemas primários intrínsecos do órgão pode gerar ausência ou deficiência de virilização. Desta maneira, a avaliação da distribuição dos pêlos e gordura corporal, mamas etc. deve contribuir nesta investigação. História de infecção pregressa Devemos investigar processos inflamatórios pregressos que possam afetar a fertilidade masculina, tais como prostatites, epididimites, DST etc. O relato de orquite viral pós-parotidite, principalmente quando bilateral na infância ou adolescência, é importante para justificar atrofia testicular. Fatores de risco Levaremos em consideração algumas situações relatadas que podem influenciar na fertilidade do paciente, tais como: uso de alguns medicamentos deletérios (quimioterápicos, imunossupressores, esteróides anabolizantes, nitrofurantoinas etc.), drogas recreativas (cocaína, heroína, maconha etc.), doenças crônicas (diabete melito severo, insuficiência renal, lupus eritematoso sistêmico etc.), fatores ocupacionais (radiações, calor excessivo etc.), estresse oxidativo, varicocele na adolescência etc. Problemas com o início da puberdade Tanto a puberdade precoce quanto a tardia podem trazer alterações estruturais testiculares que podem levar à infertilidade. Problemas com hábitos sexuais As disfunções ejaculatórias e eréteis, bem como a freqüência das relações, devem ser investigadas devido à sua importância no processo da fertilidade conjugal. Exame físico Um exame geral bastante exaustivo deve ser realizado, já que algumas doenças sistêmicas (endócrinas, por exempo) podem afetar a fertilidade. A avaliação genital pode fornecer elementos de grande importância diagnóstica. Vamos relacionar alguns parâmetros de relevância que devem ser avaliados. Caracteres sexuais secundários A presença de sinais de virilização facilita identificar função androgênica adequada. A deficiente produção de testosterona testicular por falta de estímulo hipo- Exame da genitália externa Escroto Talvez o achado mais importante no exame escrotal seja a varicocele, dilatação das veias do plexo pampiniforme, considerada consensualmente uma das mais importantes causas de infertilidade masculina. Nestes casos, os pacientes devem ser examinados de pé, com manobra de valsalva, em ambientes com temperatura aquecida, já que o frio faz retrair o escroto, dificultando o exame adequado. Pênis Importantes dados tais como tamanho, posição do meato uretral e outras anomalias. Testículos A presença de ambos os testículos, devidamente escrotalizados, deve ser conferida. O volume é relacionado com a presença de tecido germinativo. Quanto menor o órgão, menor a quantidade daquele tecido. Estima-se que um testículo normal tenha cerca de 4,5 x 3,5 cm de diâmetros longitudinal e transverso. É importante que haja simetria. A consistência é elementochave no exame físico: os pré-púberes têm menor consistência. Quando adulto, o amolecimento pode significar substituição do tecido germinativo por líquido tubular, como acontece na aplasia germinativa ou parada de maturação. Em alguns casos pode ser bem consistente como, por exemplo, no Klinefelter. Epidídimos Atenção especial deve ser dada ao exame da junção epididimodeferencial, sede freqüente de anomalias e seqüelas de processos inflamatórios que podem levar à infertilidade. Aumento de volume e da sensibilidade são dados importantes. A palpação também nos informa sobre eventuais agenesias com conseqüente azoospermia. Deferentes Apresentam-se ao exame físico como cordões endurecidos com cerca de 3 mm de diâmetro e devem ser examinados em todo trajeto inguinoescrotal. A agenesia, espessamentos ou atrofias podem estar 138 Untitled-2 138 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia relacionados com a infertilidade. Obviamente cirurgias pregressas como vasectomia ou infecções devem ser questionadas. Vitalidade Considera-se normal a presença de 75% de espermatozóides vivos. Morfologia Exames complementares Espermograma Exame rotineiro mais importante na investigação da fertilidade masculina, sendo colhido habitualmente por masturbação, com abstinência sexual média de três dias. Devido a problemas freqüentes com a coleta, devemos exigir, no mínimo, duas amostras para melhor avaliação. As primeiras gotas emitidas contêm 85% dos espermatozóides, sendo importante orientar o paciente neste aspecto. O ambiente da coleta deve ser adequado. Citaremos alguns parâmetros importantes no espermograma. Volume Normal entre 1,5 a 5,0 mL. A hiperespermia pode ser devida a infecções da próstata e vesículas seminais. A hipoespermia resulta quase sempre de obstrução, hipoplasia ou agenesia das vias eferentes. A aspermia freqüentemente reflete alterações neurológicas. Cor Branco acinzentado ou opalescente. Cor castanha ou avermelhada pode sugerir hemoespermia. Cor amarelada sugere infecção (leucoespermia). Viscosidade Aumenta com a infecção. pH Normal entre 7,2 e 8. Nos casos de pH ácido e baixo volume, pensar em obstrução ou agenesia das vias seminais. Plasma seminal com pH acima de 8 sugere infecção. Concentração Consideram-se normais valores superiores a 20 milhões de espermatozóides por mililitro de sêmen. A análise de 100 a 200 espermatozóides permite afirmar como normal o espermograma que apresente acima de 30% de espermatozóides ovais, com peça intermediária e cauda bem-definida. Análise bioquímica A dosagem da frutose deve ser realizada em casos de azoospermia com pH baixo e volume inferior a 1,5 mL. Dosagens hormonais Se o paciente apresenta espermograma normal, a princípio, as dosagens hormonais seriam dispensáveis. Devem-se dosar hormônios nos casos confirmados de infertilidade cujos espermogramas acusem oligo ou azoospermia. Os principais hormônios envolvidos com a espermatogênese são FSH, LH, testosterona e prolactina. São possíveis casos de oligozoospermia com dosagens hormonais normais como ocorre na varicocele e nas alterações genéticas tipo microdeleções do cromossomo Y, por exemplo. O FSH elevado geralmente traduz insuficiência de túbulos seminíferos, com conseqüente oligo ou azoospermia. Em casos de azoospermia com FSH normal, provavelmente a deficiência está no processo de espermatogênese. Quando o paciente se apresenta com oligo ou azoospermia e FSH baixo, devemos pensar em deficiência hipotalâmica ou hipofisária (por exemplo, síndrome de Kallman). Provas funcionais Em casos de espermogramas normais repetidamente, alguns testes funcionais podem ser realizados visando avaliar a capacidade dos espermatozóides em percorrer o trajeto genital feminino: teste de interação com o muco cervical, provas imunológicas etc. Motilidade Considera-se satisfatório espermograma com mais de 50% dos espermatozóides apresentando motilidade graus A e B. Biópsias testiculares Indicadas para diferenciar as azoospermias obstrutivas dos quadros de falência germinativa. Achados 139 Untitled-2 139 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia mais freqüentes: espermatogênese normal, hipoespermatogênese, parada de maturação das células germinativas, aplasia germinativa (síndrome das células de Sertoli) e hialinização testicular. Exames de imagem Ultra-sonografia transretal: deve ser indicada nos casos de suspeita de obstrução dos ductos ejaculatórios ou hipoplasia/agenesia das vesículas seminais. Deferentografia Muito pouco utilizada atualmente. Serve para avaliar obstrução nas vias seminais eferentes. Leitura recomendada 1. Neves PA. Infertilidade masculina. Ateneu. 2002 Algoritmo propedêutico recomendado 2. I Consenso Brasileiro de Infertilidade Masculina da SBU. BG Cultural. 1999. 3. Hellstrom WJG. Male Infertility and Sexual Dysfunction. Springer. 1997. 4. Telöken C. Fertilidade e Infertilidade Humana. Medsi. 1997. 140 Untitled-2 140 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 41 Interpretação do espermograma Carlos Teodósio Da Ros Cláudio Telöken A avaliação laboratorial inicial da fertilidade do homem é realizada através de um espermograma, a partir do qual obtemos informações referentes à espermatogênese e à permeabilidade do trato genital. O volume normal é acima de 2 mL, sendo que volumes menores podem estar relacionados com obstruções do trato genital. Um pH aumentado sugere a possibilidade de processo infeccioso, enquanto que um pH baixo pode significar processo obstrutivo ou até mesmo agenesia de ductos deferentes. Uma baixa concentração espermática pode ser devida à obstrução parcial dos ductos ejaculadores, co- leta inadequada ou também deficiência androgênica. Diante de ausência de espermatozóides, deve-se pensar em ejaculação retrógrada, obstrução do trato germinativo ou ainda falência testicular. A motilidade espermática pode ser um fator compensatório em homens com baixa contagem de espermatozóides. Se houver grande número de espermatozóides aglutinados, isto pode ser devido a um processo inflamatório ou imunológico, que deve ser avaliado por meio de testes específicos. O estudo da morfologia espermática é o mais sensível meio de avaliação do epitélio germinativo. Tabela 1: Valores normais segundo a Organização Mundial de Saúde, 1999 141 Untitled-2 141 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia Espermatozóides morfologicamente anormais são geralmente células funcionantes incapazes, sem condições fisiológicas de fertilização. A leucocitospermia também é um fator relevante nesta avaliação. Considera-se normal uma concentração de até 1 x 106 leucócitos/mL, porém é importante a diferenciação entre leucócitos e células germinativas imaturas, através de técnicas de fixação com peroxidase. Leitura recomendada 1. I Consenso Brasileiro de Infertilidade Masculina. Sociedade Brasileira de Urologia. BG Editora e Produções Culturais Ltda. São Paulo. 1999. 2. Guzick DS, Overstreet JW, Factor-Litvak P, Brazil CK, Nakajima ST, Coutifaris C, Carson SA, Cisneros P, Steinkampf MP, Hill JA, Xu D, Vogel DL. National Cooperative Reproductive Medicine Network. Sperm morphology, motility, and concentration in fertile and infertile men. N Engl J Med 2001 Nov 8; 345 (19): 1388-93. 3. Menkveld R, Kruger TF. Advantages of strict (Tygerberg) criteria for evaluation of sperm morphology. Int J Androl 1995 Dec; 18 Suppl 2: 36-42. 4. Menkveld R, Wong WY, Lombard CJ, Wetzels AM, Thomas CM, Merkus HM, Steegers-Theunissen RP. Semen parameters, including WHO and strict criteria morphology, in a fertile and subfertile population: an effort towards standardization of invivo thresholds. Hum Reprod 2001 Jun; 16 (6): 1165-71. 5. World Health Organization: WHO Laboratory Manual for the examination of Human Semen and Sperm-Cervical Mucus interaction. Cambridge, England, Cambridge University Press, 1999. 142 Untitled-2 142 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 42 Azoospermia Eduardo B. Bertero Azoospermia é definida como a ausência de espermatozóides no ejaculado ou fluido seminal e ocorre em, aproximadamente, 10% a 20% de homens inférteis e 2% da população geral. No passado, o prognóstico destes homens era muito sombrio. No entanto, após o advento de técnicas de reprodução assistida, mais especificamente, da injeção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI), tornou-se possível tratar a maioria dos pacientes com azoospermia. É estimado que as anormalidades genéticas são responsáveis por até 30% dos casos de infertilidade masculina que se apresentam com azoospermia ou oligoastenoteratozoospermia. A microdeleção do cromossomo Y está presente em 13% dos homens com azoospermia. Por existir forte evidência de uma base genética para as causas de infertilidade masculina, muitos autores sugerem que seja realizada uma nova classificação de azoospermia. Azoospermia pode ser devida à estimulação hormonal inadequada (hipogonadismo hipogonadotrópico), anormalidade na espermatogênese e obstrução ductal. Classicamente, divide-se em azoospermia obstrutiva e não-obstrutiva (Tabela 1). Mesmo que ICSI seja aplicado, ainda é importante a classificação em obstrutiva e não-obstrutiva por duas razões: primeiro, ICSI tem melhor prognóstico em casos de Tabela 1: Classificação de azoospermia 143 Untitled-2 143 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia obstrução e, segundo, a alteração genética de base é distinta nas duas classificações de azoospermia. Avaliação A avaliação do homem azoospérmico consiste em realizar anamnese, exame físico e teste laboratorial apropriado. A maioria dos homens terá obstrução ductal ou falência testicular. Anamnese Questões específicas sobre fertilidade prévia, idade da maturação sexual e história de anomalias congênitas devem ser esclarecidas. Anosmia ou distúrbios visuais podem sugerir alterações hipofisárias e endócrinas. Antecedente de cirurgia escrotal, herniorrafia ou orquiepididimite podem estar associadas com azoospermia obstrutiva, enquanto que passado de criptorquidia, quimioterapia e torsão de cordão podem estar relacionadas com azoospermia não-obstrutiva. Alguns medicamentos podem causar azoospermia, como é o caso de esteróides anabolizantes. estiverem normais, não há necessidade de outros exames. No caso da testosterona estar diminuída, é necessária a dosagem de hormônio luteinizante (LH) e de prolactina. A inibina beta pode ser dosada por ser mais específica na avaliação da espermatogênese que o FSH, embora não seja considerada consensual na avaliação inicial. Embora a maioria dos homens que apresenta FSH elevado seja portadora de falência testicular, não existe um valor acima do qual o diagnóstico de obstrução seja excluído. Até recentemente, pacientes com azoospermia e FSH elevado duas vezes mais que o normal eram desencorajados a realizar biópsia, pois a falência testicular era óbvia. No entanto, atualmente, estes homens podem se beneficiar de extração testicular ou ICSI. Portanto homens com suspeita de falência testicular poderão se beneficiar da biópsia testicular. FSH, testosterona e LH diminuídos sugerem hipogonadismo hipogonadotrópico, e estudos de imagem devem ser considerados para descartar neoplasias ou massas do sistema nervoso central. Homens com FSH normal, volume seminal reduzido e ao menos um deferente palpável devem ser submetidos à ultra-sonografia transretal à procura de obstrução unilateral de ducto ejaculador. Avaliação genética Exame físico Distribuição de cabelo e gordura corporal, presença de ginecomastia e informações sobre a virilização do paciente podem nos dar indícios do estado hormonal. O volume testicular pode ser indicativo de falência. Infertilidade é mais comum em homens com tumores testiculares, por isso devem ser excluídos. É imperativo em qualquer homem com azoospermia que seja examinado o escroto à procura dos vasos deferentes. Varicocele pode ou não estar associada à azoospermia. Avaliação laboratorial O espermograma forma a base da investigação laboratorial, já que por meio dele é dado o diagnóstico de azoospermia. O sêmen deve ser colhido em duas amostras separadas por cerca de 15 dias e com uma abstinência sexual de três dias. A dosagem de frutose é importante já que níveis baixos ou ausentes podem implicar causa de obstrução ductal. A avaliação hormonal inicial inclui a dosagem de testosterona e hormônio folículo-estimulante (FSH). Se ambos A avaliação genética do homem com azoospermia deve ser iniciada com a realização do cariótipo, já que anormalidades são encontradas em 13,7% dos casos. A avaliação tem dois fundamentos: primeiro, a procura por anomalias genéticas tais como Klinefelter, monossomias, translocações ou inversões; segundo, porque, com o advento de métodos de reprodução assistida, muitos destes casais, anteriormente, vistos como “inférteis”, hoje poderão conceber e transmitir ou não suas alterações cromossômicas à sua prole. Estes casais devem ser aconselhados sobre tais riscos, antes de entrarem em algum programa de reprodução humana. Conclusão Os recentes avanços no tratamento da infertilidade conjugal mudaram a avaliação e prognóstico do paciente com azoospermia. A aplicação de métodos de reprodução assistida em homens com azoospermia severa deve ser realizada após extensa avaliação física, laboratorial e, principalmente, genética. 144 Untitled-2 144 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia Algoritmo de avaliação e conduta para o paciente com azoospermia.CT, tomografia computadorizada; RM, ressonância magnética; AID, inseminação artificial com doador de esperma; FSH, hormônio folículo-estimulante; IVF, fertilização in vitro; LH, hormônio luteinizante; MESA, aspiração microcirúrgica de espermatozóide do epidídimo; TESE, extração de espermatozóide testicular. Leitura recomendada 1. Kolettis PN. The evaluation and management of the azoospermic patient. J Androl, 23: 293-303, 2002. 2. Ezeh UI. Beyond the clinical classification of Azoospermia: opinion. Hum Reprod, 15: 2356-9, 2000. 3. Campbell AJ, Irvine DS. Male infertility and intracitoplásmica sperm injection (ICSI). Br Med Bull, 56: 616-29, 2000. 4. Forti G, Krausz C. Clinical review 100: Evaluation and treatment of the infertile couple. J Clin Endocrinol Metab, 83: 4177-88, 1998. 5. Silber SJ. New concepts in operative andrology: a review. Int J Androl, 23: 66-76, 2000. 145 Untitled-2 145 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 43 Varicocele Paulo Augusto Neves Introdução A varicocele corresponde à dilatação das veias que integram o plexo venoso pampiniforme, que drena os testículos. O plexo venoso reúne-se formando a veia espermática interna, que, à esquerda, drena perpendicularmente na veia renal e, à direita, diretamente na veia cava. Este dado anatômico permite explicar a maior incidência da patologia no lado esquerdo. A varicocele está presente em aproximadamente 15% da população em geral (incluindo adolescentes e adultos), porém sua incidência está aumentada em homens com infertilidade, ao redor de 35% a 40% dos casos. Desta forma, há muito se infere a presença da varicocele como causa de infertilidade masculina. Inúmeros estudos verificaram que a varicocele leva ao declínio progressivo da espermatogênese, e à redução do volume testicular. Observa-se, no espermograma, oligospermia acompanhada de redução das formas móveis (astenospermia), em geral com alteração da morfologia (formas alongadas). Após a correção cirúrgica, em geral observase melhoria dos padrões seminais e da histologia testicular em aproximadamente 80% dos casos. As taxas de gravidez espontânea após o tratamento cirúrgico atingem 30% a 40% dos casais no primeiro ano após a cirurgia. Desta forma, ao se deparar com casais com infertilidade, cujo parceiro apresenta varicocele, deve-se considerar inicialmente a correção cirúrgica da enfermidade. Aspectos anatômicos Em geral, clinicamente as varicoceles são observadas como lesões isoladas à esquerda (ao redor de 70% das vezes) e bilaterais em aproximadamente 15% dos pacientes. A presença de varicocele isolada à direita deve levar à suspeita de dificuldade de drenagem da veia espermática junto à veia cava, como, por exemplo, tumor renal com invasão venosa. A etiologia parece estar ligada a alterações do sistema venoso espermático interno (ausência ou incompetência de valvas, pressão hidrostática elevada etc.). À histologia testicular, observam-se diversos graus de alteração histológica, desde afilamento do epitélio germinativo até parada de maturação em estágios mais avançados. Clinicamente, observa-se diminuição do volume e assimetria testicular. Estas alterações são reversíveis, quando a cirurgia é realizada na ausência de atrofia importante. Diversas hipóteses tentam explicar o efeito deletério da varicocele sobre a espermatogênese: refluxo de metabólitos renais e das adrenais para o testículo afetado, hipóxia (estase sangüínea), disfunção hormonal, hipertermia escrotal etc. Até o momento, nenhum estudo concluiu definitivamente a etiopatologia da lesão testicular. Diagnóstico O diagnóstico é eminentemente clínico, por meio da visualização e/ou palpação dos vasos dilatados 147 Untitled-2 147 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia junto ao testículo. O exame habitualmente é realizado com o paciente em pé, em ambiente aquecido, em repouso, e após realizar manobra de Valsalva. A varicocele clínica pode ser graduada em três graus – grau I: vasos palpáveis à manobra de Valsalva; grau II: vasos palpáveis e visíveis à manobra de Valsalva; grau III: vasos visíveis na posição supina, sem a necessidade de manobra de Valsalva. Até alguns anos, utilizavam-se testes diagnósticos auxiliares para a detecção de varicoceles, como o Doppler, termografia ou exame ultra-sonográfico, que revelavam a presença de varicoceles subclínicas. Entretanto, o seguimento de pacientes em longo prazo, operados ou não, devido à presença de varicocele subclínica, não revelou diferenças quanto às taxas de gravidez espontânea. Assim, atualmente, não mais se valoriza a presença de varicocele subclínica. Tratamento Em geral, indica-se a correção cirúrgica (ligadura das veias do plexo pampiniforme) para os pacientes com infertilidade. A dor escrotal também pode ser um fator de indicação, assim como o aspecto estético. Em crianças e adolescentes, a indicação da cirurgia é controversa. De maneira geral, a maioria dos autores indica a correção cirúrgica quando houver assimetria testicular significativa ou parada do crescimento testicular (disparidade de volume superior a 20%). A perda de massa testicular parece ser progressiva com a idade e, na adolescência, observa-se crescimento compensatório após a correção, favorecendo a indicação cirúrgica nesta faixa etária. Técnicas cirúrgicas Diversas técnicas cirúrgicas têm sido empregadas: abordagem retroperitoneal (técnica de Palomo), abordagem inguinal (técnica de Ivanissevich) e, mais modernamente, a técnica subinguinal microcirúrgica (Marmar). Em todas, a veia testicular e seus ramos são ligados, sempre se atentando para a preservação da artéria testicular. A técnica subinguinal com ligadura microcirúrgica de todos os ramos da veia espermática (técnica de Marmar) ganhou popularidade entre os urologistas especializados no tratamento da infertilidade masculina, tendo em vista o menor índice de complicações (edema, hidrocele) e de recidiva (inferior a 1% dos casos). Realiza-se uma incisão junto ao anel inguinal externo, expõe-se o cordão espermático e, sob magnificação (através de lupa ou microscópio cirúrgico), ligam-se todas as veias que integram o plexo pampiniforme. Através da magnificação, em geral é possível localizar e isolar a artéria espermática. Sendo esta uma cirurgia que envolve uma pequena incisão de pele e subcutâneo, é difícil considerar válidas outras modalidades de cirurgia, como por exemplo a abordagem laparoscópica ou a oclusão venosa percutânea. Correção bilateral e azoospermia A maioria dos estudos atuais procura determinar o papel da varicocelectomia bilateral, mesmo na presença de varicocele clínica apenas à esquerda. Da mesma forma, o benefício primário da ligadura da varicocele em pacientes azoospérmicos com parada da maturação, seria a possibilidade do surgimento de espermatozóides móveis no ejaculado. Sempre é preferível utilizar-se espermatozóides colhidos no ejaculado que espermatozóides colhidos diretamente nos testículos na técnica de fertilização in vitro e ICSI (injeção intracitoplasmática de espermatozóides), tendo em vista as melhores taxas de sucesso da técnica com espermatozóides do ejaculado. Leitura recomendada 1. Orejuela FJ, Moreira Jr SG, Lipshultz LI. Varicocele. In Neves PA, Rodrigues Netto Jr N. Infertilidade Masculina. Editora Atheneu, São Paulo, 2002, capítulo 6, pp. 113-22. 2. Marmar JL, DeBenedicts TJ, Praiss D. The management of varicoceles by microdissection of the spermatic cord at the external inguinal ring. Fertil Steril, 43: 583-8, 1985. 3. Matthews GJ, Matthews ED, Goldstein M. Induction of spermatogenesis and achievement of pregnancy after microsurgical varicocelectomy in men with azoospermia and severe oligospermia. Fertil Steril, 70 (1): 71-5, 1998. 148 Untitled-2 148 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 44 Tratamento clínico da astenozoospermia Fábio Firmbach Pasqualotto Eleonora Bedin Pasqualotto A motilidade é uma das características espermáticas principais para estabelecer gravidez in vivo e, infelizmente, a astenozoospermia é a alteração mais comum encontrada na análise seminal. A diminuição da motilidade pode indicar alterações estruturais ou metabólicas nos espermatozóides; entretanto, fatores extrínsecos como infecção do trato genital também possuem um papel importante nas alterações da motilidade espermática. Após a liberação do espermatozóide dos túbulos seminíferos, o espermatozóide fica armazenado no epidídimo. Acreditava-se que a permanência no epidídimo fosse necessária para a aquisição da motilidade espermática, no entanto, achados recentes (espermatozóides do testículo podem possuir motilidade) sugerem que muitos dos componentes necessários para a motilidade estão presentes no próprio espermatozóide e que a maturação epididimária, talvez, seja mais um fenômeno tempo-dependente do que previamente pensado. Causas da astenozoospermia Permanência prolongada no plasma seminal, uso de espermicidas ou prolongada exposição ao frio, síndrome dos cílios imóveis, anticorpos antiespermatozóides, deficiência da proteína carboxilmetilase, defeitos parciais no axonema, necrospermia, infecção. Dentre possíveis causas, mas ainda necessitando comprovação, destacam-se disfunção epididimária, varicocele, fatores inibidores no plasma seminal e espermatozóides, deficiência de fatores seminais necessários para movimentação, defeitos funcionais no axonema, e baixos níveis de zinco. Como causa improvável destacam-se alterações hormonais (por exemplo: diminuição da testosterona). Infecção As infecções representam indicações potenciais de terapêuticas específicas em infertilidade masculina, pois, além de promoverem diminuição da motilidade espermática, elas contribuem de diferentes maneiras para prejudicar a fertilidade: inibem a interação espermatozóide-oócito, afetam a função espermática, produzem excesso de ERO e obstrução nos túbulos seminíferos ou epidídimos, causando azoospermia obstrutiva. As infecções sintomáticas devem ser identificadas e tratadas. O tratamento deve ser realizado com doxiciclina 100 mg duas vezes/dia por 14 dias e nos pacientes alérgicos a derivados de tetraciclina usa-se a eritromicina 1,5 g/dia por 10 a 14 dias. O tratamento da parceira também é necessário, e deve ser realizado em conjunto. A azitromicina também pode ser utilizada em dose única de 1 g. Tratamento clínico Carnitina A L-carnitina e acetilcarnitina possuem papel fundamental no metabolismo energético intracelular. 149 Untitled-2 149 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia No fluido epididimário, a L-carnitina está presente em uma concentração 200 vezes superior comparada ao plasma seminal. Estudos não-controlados demonstraram que a L-carnitina (3 mg/dia) e a acetilcarnitina administradas via oral por até seis meses aumentaram a motilidade e a concentração espermática em pacientes com astenozoospermia idiopática. Encontrado nos EUA, ainda não liberado para uso no Brasil. Antiinflamatórios não-esteróides Evidências sugerem que as prostaglandinas possam exercer efeito inibitório na esteroidogênese testicular e motilidade espermática. Embora os mecanismos de ação sejam incertos, tal terapia objetiva suprimir a síntese de prostaglandinas no intuito de melhorar a produção e a qualidade dos espermatozóides. Antioxidantes A toxicidade ao oxigênio é um fenômeno inerente a todas as espécies que necessitam de ambiente aeróbio para a sua sobrevivência. Assim como outras células que vivem em condições aeróbias, a produção de Espécies Reativas de Oxigênio (ERO) pelos espermatozóides origina-se principalmente da atividade metabólica normal. A motilidade espermática é o indicador mais sensível do estresse oxidativo. Baixas concentrações de ERO causam uma diminuição reversível na motilidade espermática devido à depleção do ATP intracelular e insuficiente fosforilação da proteína do axonema. Estudos prévios detectaram que 25% a 40% das amostras seminais de homens inférteis apresentam altos níveis de ERO, sugerindo que determinadas causas de infertilidade possam estar associadas com a presença de elevados níveis destas espécies. Altas concentrações de ERO estão diretamente relacionadas com o fenômeno da peroxidação lipídica (LPO), a qual, promovendo uma perda na fluidez da membrana espermática, prejudica o bom funcionamento do espermatozóide, a motilidade e a sua fusão com o oócito. O papel benéfico da terapia medicamentosa relacionada à interferência das ERO na infertilidade masculina tem recebido muita atenção nos últimos anos. Ainda que existam muitas evidências revelando o papel desempenhado pelas ERO em pacientes com infertilidade, o debate em relação ao valor dos antioxidantes na melhora dos parâmetros seminais permanece por ser estabelecido. Enquanto que Moilanen e colegas mostraram que o tratamento com vitamina E por três semanas não causou alteração nas caracte- rísticas seminais e taxas de gravidez, Suleiman e colegas encontraram aumento na motilidade espermática e taxas de gravidez ao realizarem um estudo duplocego randomizado e cruzado. Kessopoulou e colegas comprovaram recentemente que a terapia com vitamina E pode ser usada em alguns grupos de homens inférteis. O ácido ascórbico (vitamina C) reduz e, em alguns casos, até previne a oxidação de moléculas biológicas. Rolf e colegas, estudando pacientes astenozoospérmicos e com oligoastenozoospermia moderada, não observaram melhora nos parâmetros seminais ao usarem altas doses de vitaminas C e E em estudo duplo-cego placebo-controlado. Dawson e colegas detectaram aumento na concentração espermática de pacientes fumantes normozoospérmicos com vitamina C usada por nove meses. Donnelly e colegas concluíram que a suplementação de ascorbato e alfatocoferol nos meios de cultura não resulta em aumento da motilidade dos espermatozóides. Pentoxifilina Derivados da metilxantina como cafeína, teofilina e pentoxifilina têm sido descritos como estimulantes in vitro da motilidade espermática. Pentoxifilina é administrada 400 mg três vezes ao dia por três a seis meses, apresentando efeitos colaterais mínimos. Dentre outras terapias em estudo destacam-se o ácido folínico, magnésio, bloqueadores de mastócitos, calicreína e acupuntura. Leitura recomendada 1. Kessopoulou E, Powers HJ, Sharma KK, Pearson MJ, Russell JM, Cooke ID, Barratt CL. A double-blind randomized placebo cross-over controlled trial using the antioxidant vitamin E to treat reactive oxygen species associated male infertility. Fertil Steril, v. 64 (4), pp. 825-31, 1995. 2. Mahmoud AM, Comhaire FH, Christophe AB. Oral antioxidants and male infertility. Hum Reprod, v. 14 (12), pp. 3149-50, 1999. 3. Pasqualotto FF, Sharma RK, Nelson DR, Thomas AJ, Agarwal A. Relationship between oxidative stress, semen characteristics, and clinical diagnosis in men undergoing infertility investigation. Fertil Steril, v. 73 (3), pp. 459-64, 2000. 4. Rolf C, Cooper TG, Yeung CH, Nieschlag E. Antioxidant treatment of patients with astheno- zoospermia or moderate oligoasthenozoos- permia with high-dose vitamin C and vitamin E: a randomized, placebo-controlled, double-blind study. Hum Reprod, v. 14 (4), pp. 1028-33, 1999. 5. Sharma RK, Pasqualotto FF, Nelson DR, Thomas AJ Jr, Agarwal A. Relationship between seminal white blood cell counts and oxidative stress in men treated at an infertility clinic. J Androl, v. 22 (4), pp. 575-83, 2001. 150 Untitled-2 150 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 45 Manipulação de gametas Agnaldo Pereira Cedenho Uma opção de tratamento para a infertilidade masculina grave foi introduzida há pouco mais de dez anos. Esta técnica, conhecida no idioma inglês, abreviadamente, por ICSI (intracytoplasmic sperm injection), permitiu que homens com graves alterações no espermograma, azoospérmicos não-obstrutivos e mesmo azoospérmicos obstrutivos se tornassem pais genéticos. Antes deste período, os casais cujos maridos apresentassem essas alterações eram aconselhados a serem tratados por inseminação artificial intra-uterina com sêmen de doador. Indicações de ICSI Espermatozóides do ejaculado Oligozoospermia; Astenozoospermia; Teratozoospermia; Anticorpos antiespermatozóides; Falhas repetidas na fertilização com IVF; Sêmen criopreservado de pacientes com câncer e curados; Distúrbios ejaculatórios. Espermatozóides do epidídimo O processo de fertilização As barreiras físicas que devem ser vencidas para que ocorra a fertilização são: células do cumulus; zona pelúcida e membrana vitelina. Somente espermatozóides morfologicamente normais e hiperativados são capazes de atravessar o cumulus e atingir a zona pelúcida. Isto ocorre sem nenhuma atividade enzimática, apenas pelo movimento vigoroso dos espermatozóides hiperativados. Todavia, quando os espermatozóides são em número pequeno ou apresentam alterações qualitativas importantes, eles não conseguem penetrar no oócito. Por outro lado, como possuem material genético normal, se forem mecanicamente introduzidos no oócito, fertilizarão normalmente. Ausência congênita bilateral dos deferentes; Síndrome de Young; Falha na vasoepididimostomia; Falha na vasovasostomia; Obstrução dos ductos ejaculatórios. Espermatozóides do testículo Todas as indicações para espermatozóides do epidídimo; Azoospermia causada por insuficiência testicular. Determinantes do sucesso com ICSI Os três parâmetros clássicos do espermograma, concentração, motilidade e morfologia parecem não 151 Untitled-2 151 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia influenciar no resultado com a ICSI. Contudo há alguma discussão em relação à morfologia. Alguns autores acreditam que a morfologia tem influência na taxa de implantação, enquanto outros acreditam que não há influência da morfologia sobre a taxa de implantação. Todos são invariáveis em apontar a idade da mulher, ou seja, a qualidade da reserva ovariana, como o principal responsável pelo sucesso neste programa (Gráfico 1). Riscos genéticos para a prole quando empregamos ICSI Embora existam artigos na literatura apontando uma incidência maior de anormalidades relacionadas Gráfico 1: Porcentagem de nascimentos empregando-se a técnica de ICSI de acordo com a idade da paciente ao cromossomo sexual, ICSI é compatível com o nascimento de crianças saudáveis, e é um procedimento que não pode mais ser considerado experimental. Ainda que os dados atuais não sugiram que a ICSI aumenta o risco de alterações genéticas na criança, uma preocupação tem sido discutida quando são empregados sêmens com graves alterações ou de pacientes azoospérmicos. Homens com sêmen muito alterado têm uma freqüência maior de anormalidades cromossômicas nas suas células somáticas e nos espermatozóides. A ausência congênita bilateral dos ductos deferentes é freqüentemente associada a uma ou várias mutações no gene da fibrose cística (FC). Somam-se a isto que microdeleções na região AZF do cromossomo Y têm sido encontradas em 3% a 15% dos homens com oligozoospermia grave e azoospermia não-obstrutiva. Uma vez que a gravidez pode ser obtida utilizando-se espermatozóides desses pacientes, isto levanta a possibilidade da criança nascer ou manifestar mais tarde o mesmo quadro clínico do pai. Leitura recomendada 1. Devroey P. Clinical application of new micromanipulative technologies to treat the male. Human Reprod 13: pp. 112-22,1998. 2. Silber SJ. Intracytoplasmic sperm injection today: a personal review. Human Reprod 13: pp. 208-18, 1998. 3. Shen S, Khabani A, Klein N, Battaglia D. Statistical analysis of factors affecting fertilization rates and clinical outcome associated with intracytoplasmic sperm injection. Fertil Steril 79: pp. 355-60, 2003. 152 Untitled-2 152 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 46 Contracepção masculina Rui Yamasaki O que vem ocorrendo nos últimos anos é muito mais controle de natalidade que o tão largamente discutido planejamento familiar. Cumpre-nos discorrer, antes de mais nada, essas diferenças marcantes. tomadas e detectar decisões inconseqüentes que fatalmente levarão ao arrependimento. Escolha do método – um compromisso mútuo Controle de natalidade Consiste em ações geralmente impostas por governos, em que se deseja diminuir o número de pessoas existentes (no caso de superpopulação: China e Índia), ou de aumentar a população (Segunda Guerra Mundial). Planejamento familiar Conjunto de ações que possibilita o casal escolher o número de filhos que deseja e no momento que deseja, proporcionando informações e meios necessários para que possa decidir, consciente e voluntariamente, sem a interferência do governo ou grupos, sendo, portanto, um exercício do direito de cidadania. A responsabilidade da escolha do método contraceptivo deve caber sempre ao casal que procura o Serviço de Planejamento Familiar, e isto precisa ficar bem claro, bem como os inconvenientes e os riscos de tais procedimentos. O casal deverá passar por consulta médica e, após certificar-se do estado de saúde e correção de eventuais moléstias, seguir o procedimento padrão para ser submetido ao método escolhido. Individualmente, os casais que optarem pela esterilização cirúrgica, terão que ser submetidos à avaliação psicológica, para ponderar as decisões que serão Nossa intervenção deve seguir o pressuposto básico legal de que todos têm o direito à escolha dos padrões de reprodução que lhes convenham, como indivíduos ou casais. O bom relacionamento dos profissionais com o paciente ou casal viabiliza a troca de informações e assegura a opção feita, sendo necessário perceber como e porquê essa decisão foi tomada. Para que o casal ou indivíduo possa optar livremente, é necessário o conhecimento de todas as alternativas existentes, as indicações, as contra-indicações e os efeitos colaterais dos diferentes métodos. Sem intercorrências, uma vez escolhido e fornecido, o casal deve estar ciente que qualquer método necessita de controle médico periódico, maior ou menor, dependendo do caso, e quais os sinais ou sintomas de alerta que indiquem um retorno ao serviço. De maneira geral, podemos dividir a contracepção masculina em: Contracepção não-cirúrgica (métodos naturais) 1) Método do ritmo, do calendário ou tabela (OginoKnaus); 153 Untitled-2 153 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia 2) Método térmico, curva térmica basal ou temperatura; 3) Método do mucocervical ou Bilings ou da ovulação; 4) Método sintotérmico (combinação dos três citados anteriormente); 5) Coito interrompido – é o método mais antigo, estando mencionado na Bíblia e, apesar de pouco eficaz, ainda é uma das formas de anticepção mais utilizadas no mundo, por falta de informação, por questões morais, religiosas ou econômicas. Métodos de barreira bioquimicamente os espermatozóides antes deles alcançarem o útero. Podemos citar: nonoxinol-9 e menfegol (TS-88). Ação de esteróides Atuam estimulando ou inibindo a espermatogênese. Progesterona e derivados Inibem a produção de espermatozóides. Compensam a perda de andrógenos resultantes da supressão das células de Leydig: danazol (600 mg/d), testosterona (200 mg/m). Condom Testosterona (enantato de testosterona) Não se sabe até hoje a origem da palavra condom, embora alguns autores afirmem ser uma derivação da palavra condus, que significa receptáculo. A história de que “(...) um certo Dr. Condom, médico do rei Carlos II da Inglaterra, século XVII, ofereceu-lhe este para evitar filhos...” não foi comprovada. O anatomista italiano Fallopio, em 1504, afirmou que um envoltório de linho usado no pênis durante a relação sexual seria o suficiente para impedir a disseminação de doenças. Talvez tenha sido esta a primeira citação sobre condom. Inicialmente, eram feitos de membranas intestinais de animais, sendo por isto relativamente caros. Em meados do século XIX, passaram a ser de borracha e atualmente são de látex, tornando o preço mais acessível. Condom ou preservativo é popularmente conhecido como camisa-de-vênus ou simplesmente camisinha. É o método de barreira mais empregado em todo mundo. Tem sido usado durante séculos, inicialmente para prevenir doenças de transmissão sexual e, posteriormente, como método contraceptivo. Basicamente, seu uso é estimulado para a prevenção da AIDS, contudo temos que reconhecer que, mesmo por via indireta, seu efeito contraceptivo tem sido importante. Não se deve começar a relação sexual sem o condom e só colocá-lo antes da ejaculação. Em muitos casos, antes da ejaculação, pode ser expelido líquido seminal contendo espermatozóides. Outros métodos de barreira (feminino): diafragma cervical, capuz cervical, condom feminino. 200 mg IM/semana – azoospermia em 120 dias, sua suspensão reverte ao aparecimento de espermatozóides em três a sete meses. Gossypol Substância derivada do algodão, observada na China, onde trabalhadores que manipulavam produtos oriundos desta semente, apresentavam alto índice de contracepção. Eficácia não comprovada. Vacinas anticonceptivas Vacinas que atuam como: a) antígeno dos espermatozóides; b) antígeno da zona pelúcida; c) antígeno de HCG; d) antígeno do LH-RH. Riscos: efeitos teratogênicos, assim como efeitos agudos e crônicos com seu uso, principalmente imunológicos e endocrinológicos. Injeção dos deferentes Obstrução dos deferentes com injeção de substâncias químicas esclerosantes, por via percutânea: solução de etanol 90% (0,25%) e aldeidofórmico 3,6%. Contracepção cirúrgica Dispositivo para bloqueio temporário dos deferentes Métodos químicos Espermaticidas É um método de barreira físico-químico, composto de substância inerte, que atua mecanicamente, formando uma película que recobre a vagina e o colo do útero, impedindo a penetração dos espermatozóides no canal cervical, como também imobilizando Dispositivo intracanal de oclusão: DIOR (Free, MJ, 1975). Vasectomia A ligadura cirúrgica dos deferentes pode ser um dos métodos mais simples, seguros e satisfatórios 154 Untitled-2 154 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia da contracepção masculina. Praticada há mais de um século, inicialmente para impedir complicações das prostatectomias e depois, erroneamente, com o objetivo de promover o rejuvenescimento sexual; na atualidade propagou-se amplamente no controle da natalidade e no planejamento familiar. Técnica sala de pequena cirurgia, observados cuidados habituais de assepsia e antissepsia; tricotomia da região escrotal; anestesia local com xilocaína 2% sem adrenalina; deferente é identificado e mantido junto à pele escrotal à custa de “pinça apreensão”, fazendose incisão, realizada neste local, de aproximadamente 2 cm. A incisão cirúrgica pode ser bilateral ou unilateral na rafe mediana escrotal; exposição do deferente, tripsia do canal com pinças hemostáticas, secção e retirada de um segmento de 1 cm do deferente. Ligadura dos cotos do deferente, após dobrá-los, com catgut 4.0 cromado; hemostasia cuidadosa e sutura do plano muscular e cutâneo com pontos separados com catgut 4.0 simples; recomenda-se o uso de suspensório escrotal e evitar esforço físico; cuidados contraceptivos deverão ser observados por um período de dois a três meses pós-vasectomia e, neste intervalo, orientamos o paciente para que tenha pelo menos dez ejaculações; em geral, um espermograma é solicitado após três meses, para confirmação da azoospermia. O casal deve ser devidamente orientado quanto às possíveis complicações, falhas, contra-indicações e temores (dano orgânico, dano sexual, dano familiar, dano moral, temor da irreversibildade etc.). Aspectos médicos-legais da contracepção (Lei no 9.263, de 12/01/96. Esterilização cirúrgica) Regula o parágrafo 7º do artigo 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências. Citam-se, a seguir, os artigos e parágrafos que se julgam mais relevantes e importantes aos urologistas. Artigo 1º - O planejamento familiar é direito de todo cidadão, observando o disposto nesta lei. Artigo 3º - O planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde. Artigo 6º - As ações de planejamento familiar serão exercidas pelas instituições públicas e privadas, filantrópicas ou não, nos termos desta lei e das normas de funcionamento e mecanismos de fiscalização pelas instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde; Parágrafo único: Compete à direção nacional do Sistema Único de Saúde definir as normas gerais de planejamento familiar. Artigo 9º - Para o exercício de direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção. Parágrafo único: a prescrição a que se refere o “caput” só poderá ocorrer mediante avaliação e acompanhamento clínico e com informação sobre os seus riscos, vantagens, desvantagens e eficácia. Artigo 10º - Somente será permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações: I. Em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de 25 anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce; II. Risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por dois médicos. Parágrafo 1o - É condição, para que se realize a esterilização, o registro de expressa manifestação da vontade em documento escrito e firmado, após a informação a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções de anticepção reversíveis existentes. Parágrafo 3 o - Não será considerada a manifestação de vontade, na forma do Parágrafo 1o, expressa durante ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente. Parágrafo 4o - A esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será executada através da laqueadura tubárea, vasectomia ou outro método 155 Untitled-2 155 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia cientificamente aceito, sendo vedada através da histerectomia e ooforectomia. Parágrafo 5o - Na vigência da sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges. Parágrafo 6o - A esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada na forma da Lei. Artigo 11. Toda esterilização cirúrgica será objeto de notificação compulsória à direção do Sistema Único de Saúde. Artigo 12. É vedada a indução ou instigamento individual ou coletivo à prática da esterilização cirúrgica. Artigo 13. É vedada a exigência de atestado de esterilização ou de teste de gravidez para quaisquer fins. Artigo 14. Cabe à instância gestora do Sistema Único de Saúde, guardado o seu nível de competência e atribuições, cadastrar, fiscalizar e controlar as instituições e serviços que realizam as ações e pesquisas na área do planejamento familiar. Parágrafo único: Só podem ser autorizadas a realizar esterilização cirúrgica as instituições que ofereçam todas as opções de meios e métodos de contracepção reversíveis. Artigo 15. Realizar esterilização cirúrgica em desacordo com o estabelecido no art. 10 desta Lei. Pena: reclusão de dois a oito anos, e multa se a prática não constitui crime mais grave. Artigo 16. Deixar o médico de notificar às autoridades sanitárias as esterilizações cirúrgicas que realizar. Pena: detenção de seis meses a seis anos e multa. Artigo 17. Induzir ou instigar dolosamente a prática de esterilização cirúrgica. Pena: reclusão de um a dois anos. Artigo 18. Exigir atestado de esterilização para qualquer fim. Pena: reclusão de um a dois anos e multa. Artigo 19. Aplica-se aos gestores e responsáveis por instituições que permitam a prática de qualquer dos atos ilícitos previstos nesta lei, o disposto no “caput” e nos parágrafos 1o e 2o do artigo 29 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Convém ainda mencionar alguns artigos do Código de Ética Médica. Resolução CFM no 1.246/88. É vedado ao médico: Artigo 42: Praticar ou indicar atos médicos desnecessários ou proibidos pela legislação do país. Artigo 43: Descumprir legislação específica nos casos de transplantes de órgãos ou tecidos, esterilização, fecundação artificial e abortamento. Artigo 67: Desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre método contraceptivo, devendo o médico sempre esclarecer sobre a indicação, a reversibilidade e o risco de cada método. Conclusão Dos métodos de contracepção masculina, a vasectomia constitui o mais eficaz, porém suas indicações, contra-indicações, técnica, cuidados especiais, complicações, falhas e temores deverão ser relevantes à orientação do casal. O urologista deve estar consciente e conhecedor dos aspectos médicos-legais vigentes da nossa Legislação. Leitura recomendada 1. Haws JM, Morgan GT, Pollack AE, Koonin LM, Magnani RJ, Gargiulo PM. Clinical aspects of vasectomies perfomed in the United States in 1995. Urology, 52, p. 685, 1998. 2. Schegel SG, Goldstein M. Vasectomy. In: Goldstein, M, ed. Surgery of male infertility. Philadelphia: WB. Saunders Co. 35, 1985. 3. West PJ, Bartelt RC, Medicolegal aspects in Urology. Urol Cin NA 7: p. 153, 1980. 4. Brandell RA, Goldtein M. Elective Sterilization. In: Office Urology. The Clinician’s Guide. Humana Press Totowa, New Jersey, 2000. 5. Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. 156 Untitled-2 156 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 47 Fertilidade pós-vasectomia Edson Borges Junior A vasectomia tornou-se um método de esterilização masculina bastante comum, visto sua grande eficácia, baixo custo e baixa morbidade, representando 8% de todos os métodos contraceptivos utilizados. Calcula-se que são realizadas cerca de 500 mil vasectomias anualmente nos Estados Unidos. Entretanto, devido a uma série de razões, como novo relacionamento, desejo de um novo filho, dor escrotal ou mesmo motivos religiosos, alguns destes homens buscam alternativas para recuperar sua fertilidade. Como não existem contra-indicações maiores do ponto de vista cirúrgico, ético-legal ou moral, independentemente do motivo pelo qual o homem quer restabelecer sua fertilidade, cada vez mais o urologista é consultado sobre a possibilidade de gravidez destes homens vasectomizados. Revendo um pouco a fisiologia da função testicular, sabemos que os espermatozóides continuam a ser produzidos pelos túbulos seminíferos, independentemente de estarem ou não alcançando o plasma seminal. Então, para o homem vasectomizado, pelo fato de ter uma produção espermática normal, ficam duas alternativas na restauração de sua fertilidade: reversão da vasectomia ou técnicas de fertilização assistida com utilização dos espermatozóides epididimários/testiculares na fecundação in vitro. Reversão da vasectomia A cirurgia de reversão da vasectomia consiste na reconstrução desta obstrução, restabelecendo a passagem dos espermatozóides para o plasma seminal e ejaculação. Lembrando um pouco a anatomia, o epidídimo é um túbulo único de quatro metros, terminando em uma porção convoluta (junção epidídimo-deferencial), dando seguimento ao canal deferente, um órgão composto pelas camadas serosa, muscular e mucosa, de 1 mm de diâmetro interno. 157 Untitled-2 157 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia Para a reconstrução cirúrgica, o canal deferente é abordado através de uma incisão escrotal, procurando reconhecer o local da vasectomia prévia, excisão do tecido deferencial obstruído e reconstrução ad integrum do canal deferente (vasovasostomia). Em algumas situações, existem obstruções ao nível do epidídimo, havendo necessidade da realização da epididimovasostomia. Vários estudos da literatura já comprovaram a superioridade da técnica microcirúrgica, quando comparada à cirurgia onde não foi usada a magnificação. Então, esta é uma cirurgia preferencialmente realizada com o paciente sob anestesia peridural, raquidiana ou geral, em ambiente hospitalar, com o uso de microscópio. A vasovasostomia pode ser realizada em plano único, envolvendo as três camadas do ducto deferente, ou em dois planos (mucoso e seromuscular), parecendo não haver diferenças nos resultados de permeabilidade e gravidez. bilitando resultados de permeabilidade e gravidez em 60% e 30% respectivamente. Para a epididimovasostomia, os resultados são inferiores, ficando a permeabilidade entre 35% a 85% e a gravidez entre 13% a 56%. Aspecto do líquido do canal deferente Quanto mais fluido for o líquido de saída do coto testicular do canal deferente ou maior a presença de espermatozóides neste líquido no momento da cirurgia, maior a probabilidade de sucesso da reversão. Faz-se então necessária a observação intra-operatória da presença de espermatozóides neste líquido deferencial. Anticorpos antiespermatozóides A presença de anticorpos contra os espermatozóides ocorre em 50% dos homens vasectomizados, parecendo não influenciar nos resultados da reversão da vasectomia, ficando desaconselhada sua pesquisa. Experiência Alguns fatores prognósticos devem ser observados Tempo de vasectomia Quanto maior o tempo da vasectomia, piores são as possibilidades de se obter espermatozóides no ejaculado. Resultados do Vasovasostomy Study Group, na análise de 1.247 homens submetidos à vasovasostomia: É um dos principais fatores prognósticos; atualmente, deve fazer parte da formação urológica o treinamento em microcirurgia. É importante ser lembrado que os espermatozóides podem demorar até um ano para aparecer no líquido ejaculado. E, retomada a fertilidade, o casal também pode naturalmente demorar um ano para obter a gravidez. Dessa forma, para a indicação de uma reversão da vasectomia, torna-se fator primordial o tempo disponível que este casal dispõe para engravidar. Melhores resultados são conseguidos quando a mulher tem menos de 37 anos. Recuperação de espermatozóides do epidídimo e técnicas de reprodução assistida Vasectomia realizada há três anos: 97% sucesso Vasectomia realizada de três a oito anos: 88% sucesso Vasectomia realizada de nove a 14 anos: 79% sucesso Vasectomia realizada há mais de 15 anos: 71% sucesso Mesmo quando a reversão não propicia o aparecimento de espermatozóides no ejaculado, a proposta de uma nova cirurgia não fica descartada, possi- Espermatozóides podem ser recuperados do epidídimo através de aspiração microcirúrgica – MESA (microcirurgical sperm aspiration) ou através da punção aspirativa percutânea – PESA (percutaneous epididymal aspiration). O MESA é um procedimento relativamente complicado com certas desvantagens, como a necessidade de internação e anestesia, maior experiência do cirurgião e maior custo. 158 Untitled-2 158 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia Reversão da vasectomia Melhor técnica é a microcirúrgica; Possibilidade média de permeabilidade igual a 85% e de gravidez igual a 52%; Melhores resultados quando a mulher tem menos de 37 anos. Bloqueio do cordão espermático com xilocaína Para a obtenção dos óvulos, é necessária estimulação hormonal ovariana, o acompanhamento por ultra-som e dosagens hormonais e punção ovariana por ultra-som. Como efeitos adversos das técnicas de reprodução assistida podemos citar a hiperestimulação ovariana, causada pelo hiperestrogenismo imposto durante a administração hormonal, e a multiparidade. ICSI – injeção de um único espermatozóide no óvulo Os resultados de gravidez também estão diretamente relacionados com a idade da esposa e com o tempo de vasectomia. Mulheres acima de 39 anos de idade e vasectomias realizadas há mais de 15 anos levam a um pior prognóstico. Mulheres até 30 anos de idade 55% gravidez com nascimento Mulheres de 31-35 anos de idade 42% de gravidez com nascimento Mulheres de 36-39 anos de idade 32% de gravidez com nascimento Mulheres com 40 anos de idade ou mais 15% de gravidez com nascimento Punção percutânea do epidídimo com agulha fina O TESA é um procedimento ambulatorial, sob anestesia local, de baixo custo, levando a uma taxa de recuperação em mais de 95% dos homens vasectomizados. Os espermatozóides obtidos do epidídimo são preparados laboratorialmente e utilizados para fecundação in vitro pela técnica de ICSI (intracytoplasmic sperm injection), injeção de um único espermatozóide dentro do óvulo. Reversão da vasectomia ou ICSI? A despeito dos recentes avanços das técnicas de reprodução assistida, a reanastomose microcirúrgica permanece como tratamento de escolha para o homem vasectomizado, independentemente do tempo da vasectomia. 159 Untitled-2 159 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia A microcirurgia tem menor custo, menor morbidade e traz melhores resultados quando comparada com a fertilização assistida. Existem, porém, algumas situações em que a reprodução assistida torna-se a alternativa terapêutica de escolha. Indicações das técnicas de reprodução assistida Insucesso da reversão microcirúrgica, opção do paciente que não quer ser submetido a um procedimento cirúrgico, desejo de uma única gestação, possibilidade de resultados mais rápidos e parceira com declínio de sua capacidade reprodutiva (mulheres com 37 anos de idade ou mais). Leitura recomendada 1. Belker AM, Thomas AJ jr, Fuchs EF et al: results of 1469 microsurgical vasectomy reversal by vasovasostomy study Group. J Urol 145:505, 1991. 2. Meniru GI, Gorgy A, batha S, Clarke RJ, Posiadly BT and Craft IL: Studies of percutaneous epididymal sperm aspiration (PESA) and intracytoplasmic sperm injection. Hum reprod Update, 4:57-62, 1998. 3. Palermo G, Jorris H, Devroy P et al: Pregnancy after intracytoplasmic sperm injection of a single spermatozoa into a oocyte. Lancet 304(8810): 17-18, 1992. 4. Pasqualotto FF, Rossi-Ferragut L, Rocha CC, Iaconelli A Jr, Borges E Jr. Outcome of in vitro fertilization and intracytoplasmic sperm injection of epididymal and testicular sperm obtained from patients with obstrutive and nonobstrutive azoospermia. J Urol 167: 1753-6, 2002. 160 Untitled-2 160 11/03/04, 10:51 Seção III B Capítulo 48 Reposição androgênica no homem Sidney Glina A reposição androgênica no homem é um assunto bastante em moda. Entretanto, antes de se falar na terapia é necessário definir por que, em quem e quando esta reposição pode ser necessária. É inquestionável que quando existe a não produção de testosterona pelos testículos ou quando esta é insuficiente, antes ou depois da puberdade, caracterizando quadro de hipogonadismo, o tratamento hormonal é prioritário. Nestes casos incluem-se as disfunções hipotalâmicas-hipofisárias (hipogonadismo hipogonadotrófico) em que o tratamento faz-se preferencialmente com gonadotrofinas e as disfunções testiculares (hipogonadismo hipergonadotrófico) congênitas (criptorquidia, anorquia, síndrome de Klinefelter etc.) ou adquiridas (trauma, cirurgia etc.) e o tratamento é à base de reposição de testosterona. O homem, ao contrário da mulher, não tem uma fase definida na vida em que, fisiologicamente, existe interrupção da produção de andrógenos. Na menopausa, os ovários cessam ou diminuem significativamente a produção de estrógenos. Os testículos produzem continuamente testosterona desde a puberdade até o fim da vida. Entretanto, ocorre uma diminuição desta produção (1% ao ano) a partir dos 40 anos de idade, associada ao aumento da globulina circulante que transporta os andrógenos (SHBG), diminuindo conseqüentemente a fração disponível aos tecidos e aos órgãos. Em 20% dos homens esta diminuição pode atingir níveis abaixo da normalidade, o que pode causar sintomas. Esta situação clínica vem sendo chamada de deficiência androgênica do envelhecimento masculino (DAEM). Os sinais e sintomas da DAEM Os sinais e sintomas da DAEM são diminuição da libido e da qualidade das ereções; alterações do humor com diminuição da atividade intelectual e orientação espacial, depressão, diminuição da força e massa muscular, cansaço, alterações na distribuição da gordura corpórea com acúmulo no abdome e alterações do sono. Porém, este quadro clínico pode decorrer de várias situações, independentes da deficiência androgênica, tais como depressão, estresse, falta de atividade sexual por falta de parceira, vida sedentária, medicações e co-morbidades. Por isso, o quadro clínico não é suficiente para justificar a reposição hormonal, e deve haver confirmação laboratorial. Diagnóstico laboratorial DAEM caracteriza-se por uma diminuição da concentração plasmática da testosterona. Ainda não existem evidências suficientes na literatura para respaldar a reposição androgênica em homens sintomáticos com níveis normais de testosterona, porém nos limites inferiores da normalidade. O diagnóstico é feito pelos níveis da testosterona total, cujos valores normais geralmente estão entre 300 e 1.000 ng/dL, sugerindo-se a reposição em indivíduos sintomáticos com níveis abaixo de 200 a 250 ng/dL. 161 Untitled-2 161 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia Idealmente deveria ser dosada a fração biodisponível da testosterona, método caro e pouco realizado em nosso meio. A testosterona livre poderia ser um bom parâmetro, entretanto o método utilizado pela maioria dos laboratórios brasileiros, a quimioluminiscência, é sujeito a muitas variações metodológicas e pouco recomendado. Uma boa opção é a testosterona livre calculada pela fórmula de Vermeulen, a partir da dosagem da testosterona total e da globulina de transporte dos andrógenos (SHBG). Quando a dosagem de testosterona total encontrase abaixo do normal, sugere-se repetir o exame e, se confirmado, dosar a prolactina para afastar hiperprolactinemia, que requer tratamento diferenciado. Tratamento A reposição androgênica é um tratamento a longo prazo, geralmente por toda a vida. As drogas e vias de utilização estão na Tabela 1. A suplementação suprafisiológica pode ser acompanhada por riscos para a próstata (piora de quadros de obstrução infravesical ou evolução do carcinoma prostático); fígado, mama (ginecomastia), piora de dislipidemia, policitemia ou apnéia do sono. Assim, o câncer de próstata e de mama são contra-indicações absolutas para a reposição de testosterona; a hiperplasia benigna da próstata, policitemia, apnéia do sono, ginecomastia e insuficiência hepática constituem contra-indicações relativas. Tabela 1: Reposição androgênica 162 Untitled-2 162 11/03/04, 10:51 Guia Prático de Urologia Aconselha-se que no primeiro ano o paciente seja avaliado trimestralmente; fazendo-se o toque retal, dosando-se os níveis sangüíneos do antígeno prostático específico (PSA), colesterol total e suas frações, triglicérides, enzimas hepáticas e hemograma. A partir do segundo ano a avaliação pode ser anual. O parâmetro de melhora é a evolução clínica do paciente. Leitura recomendada 1. Damião R, Glina S e Telöken C. Eds- I Consenso Brasileiro Sobre Disfunção Erétil da Sociedade Brasileira de Urologia. São Paulo, BG Cultural, 1998. 2. Morales A, Lunenfeld B. Androgen replacement therapy in aging men with secondary hypogonadism. Ag Male, 2001;4:151-62. 3. Sociedade Brasileira de Urologia, II Consenso Brasileiro de Disfunção Erétil. São Paulo, BG Cultural, 2002. 4. Glina S, Puech-Leão P, Reis JMSM e Pagani E – Disfunção sexual masculina. São Paulo, Instituto H. Ellis, 2002. 163 Untitled-2 163 11/03/04, 10:51