A GEOGRAFIA DA RELIGIÃO COMO UM SUBCAMPO INTELECTUAL ACADÊMICO DA GEOGRAFIA CULTURAL1 Patrícia Frangelli2 Doutoranda em Geografia - PPGG/UFRJ Bolsista CAPES [email protected] RESUMO O presente artigo, resultado da pesquisa elaborada durante o mestrado no Programa de Pós-Graduação em Geografia da UERJ (PPGEO-UERJ), configura-se como um estudo no âmbito da História do Pensamento Geográfico no qual privilegia-se a relação geografia e religião expressa no subcampo da geografia cultural: geografia da religião. Seu objetivo central é compreender a dinâmica de desenvolvimento deste subcampo, expresso nos estudos que vem se realizando nesta área e melhor compreendida se elaborarmos o seguinte questionamento: em que contexto se desenvolveu e vem se desenvolvendo o subcampo em tela? Com o objetivo de concretizá-la, nos utilizamos do conceito de campo e do método reflexivo interpretado por Pierre Bourdieu (1989), conjugadas as três dimensões da cultura de Raymond Williams (1992); das congruências interdisciplinares das ciências sociais que abordam o fenômeno religioso, sendo elas a Sociologia e a Antropologia; como também da relação geografia culturalgeografia da religião. A importância desta proposta consiste na tentativa de incluir nos debates a cerca da História do Pensamento Geográfico, subcampos não tradicionalmente analisados ou parcialmente diluídos em determinadas matrizes de pensamento. PALAVRAS-CHAVE História do pensamento geográfico, Geografia da religião, Método reflexivo, Campo de Pierre Bourdieu. 1 Artigo constitui parte integrante da Dissertação de Mestrado intitulada: Estudando um subcampo intelectual acadêmico: a geografia da religião no Brasil – 1989-2009,sob a orientação da Profa. Dra. Zeny Rosendahl. Dissertação (Mestrado) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Geografia, Rio de Janeiro. Fev/2010 - FRANGELLI, P. 2 Doutoranda em Geografia e bolsista da CAPES, do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGG/UFRJ).Mestre em Geografia pelo PPGEO/UERJ. Ex-bolsista do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Espaço e Cultura (NEPEC). O presente artigo configura-se como um estudo no âmbito da História do Pensamento Geográfico no qual privilegia-se a relação geografia e religião expressa no subcampo da geografia cultural: geografia da religião. Porém antes de iniciarmos propriamente a discussão a cerca da possibilidade do subcampo da Geografia da Religião pertencer ao campo da Geografia denominado Geografia Cultural, nos pareceu essencial em um primeiro momento, situar o subcampo em tela e salvaguardar uma maneira de realizar estudos com foco na História do Pensamento Geográfico. O CONCEITO DE CAMPO Em 1968, Pierre Bourdieu (1989) escreveu o livro “O Poder Simbólico” no qual dedica o Capítulo III à gênese propriamente do conceito de campo e de habitus, sendo para nós o conceito em tela, porém antes mesmo de demonstrá-lo, o autor realiza dois capítulos iniciáticos - Capítulo I e II-, aos quais suas reflexões são respectivamente a análise do poder simbólico e uma introdução à sociologia reflexiva. De maneira crítica, podemos dizer que esta ordem não foi escolhida aleatoriamente e tampouco com o objetivo de se salvaguardar. Foram assim postas, com objetivo de preparar o leitor para aquilo que é primordial no entendimento de um campo: a luta pelo poder. Poder este muitas vezes invisível aos olhos, porém não imperceptível ou ideal - este poder se mostra imaterial devido a sua própria natureza-. No primeiro capítulo, Bourdieu (1989) nos familiariza nos universos simbólicos, ou propriamente nas formas simbólicas sendo elas materiais ou imateriais, nos quais se insere o mito, a língua, a arte, os instrumentos de conhecimento e de construção do mundo, e entre eles, a própria ciência e o fazer científico. Os universos simbólicos pertencem às formas sociais, visto que são arbitrárias e socialmente constituídas. Possuidores de imaterialidade ou efetivamente imateriais, estas condições de sobrevivência tornam-se visíveis à medida que são simbolicamente reconhecidas como valores, algumas vezes como somente do próprio grupo social e outras vezes, elevado a valores dos demais grupos - como nas construções simbólicas dos grupos hegemônicos conforme reflexões de Williams (1992)-. Enquanto formas sociais compõem sistemas simbólicos que visam à construção da realidade de forma cognicível e, enquanto, poder de construção, também se apresentam como poder simbólico. Nesta concepção, o poder simbólico apresenta-se ora como ideologia, ora como cultura. 1 Faz-se necessário entender o que são as categorias de análise tais como: ideologia e cultura, para perceber a sutileza do poder simbólico. Por ideologia, Marilena Chauí (1980) nos fala de um conjunto de idéias ou representações, normas e regras imateriais, não vinculados diretamente as condições de produção material de existência. Essa concepção está calcada numa suposição de que as idéias e o mundo encontram-se separados, o que se configura na alienação, no qual o homem produtor não se vê como produzindo a sua própria realidade. A ideologia como uma espécie de máscara, oculta a realidade e faz através do discurso, do símbolo e das projeções materializadas, os homens crerem que certas entidades são independentes, legítimas e legais, as quais devem se submeter. O poder simbólico oriundo da ideologia faz com que certas idéias representem efetivamente aquilo que ocorre na existência real - realidades pseudoautônomas - porque vistas como construídas independentemente da vontade dos homens. Enquanto que por cultura, Raymond Williams (1992) define as práticas sociais construídas pelas interações humanas nas mais diversas escalas, compostas por um sistema de significações acoplado em três dimensões dividas apenas para fins de interpretação: (a) modo de vida global - que inclui o savoir-faire de maneira geral-; (b) sistema de significação - que inclui os derivados da semiótica, a ideologia-; (c) atividades artísticas e intelectuais - consideradas atividades de revelação e do pensamento, respectivamente, sem fins necessariamente utilitários-. A cultura se apresenta como a produção e reprodução efetiva das condições materiais e imateriais de dado agrupamento humano, apresentando-se cotidianamente como vivência. Pode-se pensar, então, que a cultura é compreendida como aquilo que produz a realidade humana. O poder simbólico oriundo da cultura é ela mesma a capacidade humana de produzir, reproduzir e modificar toda a realidade, efetivamente. Contemporâneo de Pierre Bourdieu, as concepções de Raymond Williams se integram de maneira engenhosa, um elucidando o pensamento do outro. Williams também se interessou pela produção cultural, porém em um sentido voltado as questões de lutas de classe e dominação simbólica propriamente, enquanto Bourdieu voltou-se as lutas de poder no interior dessa produção cultural, ao qual, se focarmos na segunda dimensão selecionada - (b) sistema de significação-, localizaremos os sistemas simbólicos, e então o poder simbólico e o seu respectivo campo simbólico. Por campo, Pierre Bourdieu (1989) denomina o espaço - entendido como extensão-, de produção social e histórica de relações interativas objetivas e de 2 autonomias relativas, internas e externas em dialética. Esta autonomia relativa é o que parece tornar um campo princípio de sua gênese, como também norma de sua própria transformação, porém ao expor essas relações objetivas como internas e externas a si, compreende-se que não há uma efetiva autonomia. Em suas próprias palavras: Compreender a gênese social de um campo, e apreender aquilo que faz a necessidade específica da crença que o sustenta, do jogo de linguagem que nele se joga, das coisas materiais e simbólicas em jogo que nele se geram, é explicar, tornar necessário, subtrair ao absurdo do arbitrário e do não-motivado os actos dos produtores e as obras por eles produzidas e não, como geralmente se julga, reduzir ou destruir (BOURDIEU, 1989, p. 69). Em nossa análise sobre as reflexões de Pierre Bourdieu, o campo deve ser compreendido como um sistema de forças, nos quais os agentes e redes que compõem este campo interagem consciente e inconscientemente, de forma material e imaterial, de maneira a se combaterem e/ou unirem em um determinado espaço-tempo social, simbólico e historicamente construído. Comungamos com Bourdieu (1989), a posição que ocupam neste campo depende das propriedades de suas posições, delimitadas pelo seu peso funcional e de um esfera simbólica imaterial determinada pelo inconsciente cultural (BOURDIEU, 1968). Qualquer que seja o campo, ele é imbricado pela particularidade da sociedade histórica em que se encontra inserido. Possui instâncias específicas de seleção e de consagração, visando uma concorrência pela legitimidade dos seus atos enquanto agentes pertencentes do campo. Podemos verificar que as forças do campo, por estarem em constante movimentação, se encontram algumas vezes em congruência e outras em conflito, mas sempre pertencendo a uma esfera de disputa de poder. Quando o interesse de reconhecer essa disputa de poder, ou seja, este campo, é nas Instituições Acadêmicas, do saber de modo geral, configura-se um campo intelectual (BOURDIEU, 1968). O CAMPO INTELECTUAL ACADÊMICO: ATUAÇÕES COMPLEXAS NO ESPAÇO-TEMPO Na esfera das Instituições Acadêmicas, assim como nas demais esferas, as identidades dessas instituições determinam uma identidade geral. As interações pessoais e impessoais, institucionalizadas ou não, e os jogos de poder acabam por compor um campo específico do saber que se apresentam de forma complexa. O campo intelectual acadêmico possui por identidade geral e se define a partir do que Bourdieu (1968) chamou de autonomização metodológica. Esta autonomização é formada a partir das 3 autonomias relativas dos agentes configurados em instituições ou enquanto pessoas detentoras do saber ou legitimadas a tal, reconhecidas por um inconsciente cultural legitimador e legalizador. No campo intelectual acadêmico ocidental, a história da vida intelectual perpassa a história das idéias filosóficas, teológicas e científicas, verificadas seus momentos históricos nos quais prioriza-se uma ou outras perante as demais. No sentido das autonomias relativas externas, a produção social e histórica das relações interativas objetivas confundem-se com a história das sociedades e das idéias naquela sociedade, como também dos fatos científicos gerais e outras relações, enquanto que em termos das autonomias relativas internas encontram-se em interações de poder no que se refere ao peso funcional de algumas entidades de pesquisa, agências de fomento, autores reconhecidos etc., configuradas no peso funcional. Esses agentes internos interagem modificando suas posições, reformulando sua esfera simbólica material ou imaterial de atuação, agindo de forma a modificar o inconsciente cultural, em suas lutas específicas de seleção e consagração. Como nos diz Bourdieu (1968, p. 107): À medida que se multiplicam e se diferenciam as instâncias de consagração intelectual e artística tais como as academias e os salões (onde, sobretudo, no século XVIII, com a dissolução da corte e de sua arte, a aristocracia se mistura à intelligentsia burguesa, adotando seus modelos de pensamento e suas concepções artísticas e morais), e também as instâncias de consagração e de difusão cultural tais como as editoras, os teatros, as associações culturais e científicas; à medida, também, que o público se expande e se diversifica, o campo intelectual se constitui como sistema sempre mais complexo e mais independente das influências externas (daí por diante mediatizadas pela estrutura do campo), como campo de relações dominadas por uma lógica específica, que é a da concorrência pela legitimidade cultural. As idéias de Bourdieu nos faz pensar que essas lutas específicas de seleção e consagração colocam os agentes em constante concorrência por sua legitimidade. Nesse sentido, tais idéias de lutas de poder se aproximam das reflexões de Raymond Williams (1992) devido a necessidade profunda de detalhamento interno e externo das produções culturais e também da identificação das relações existentes. Da mesma maneira nos leva a refletir que, um campo nada mais é que o desdobramento das relações sociais no espaço-tempo específicos, desdobramentos esses identificados nas inter-relações, nos conflitos e nas interações. Resumidamente, na vivência direta ou indireta que articulam à vida social. Trazer Williams (1992) para a discussão de campo, e mais especificamente do campo intelectual acadêmico significa relembrar que as instituições acadêmicas, 4 agências de fomento e agentes intelectuais, possuem enquanto cultura e enquanto compostas por pessoas, uma ordinariedade. O autor nos diz que a cultura é ordinária, porque é por natureza comum a todos. Através desta percepção, é possível observar que as práticas intelectuais ou as ações dos agentes intelectuais são maneiras de se expressar, produzir e reproduzir suas condições de vida, subordinada aos modos de vida e valores que são incorporados ao longo de suas trajetórias intelectuais e vivências sociais. Outro aspecto deve ser considerado em nossa análise. É a busca por legitimação. Trata-se de uma progressiva transformação de determinados eventos científicos, de editoras científicas ou não, de produções de determinados grupos conhecidos como de excelência, de autores e de determinadas formas metodológicas de savoir-faire, considerados como detentores de fonte de autoridade. Tais fontes de autoridade muitas vezes nos levam a pensar que alguns atores intelectuais possuem uma autonomia frente ao seu campo até mesmo assumindo a postura desde a indiferença à inconsciência cultural, determinando por seu poder simbólico, a ascensão ou demérito de outros atores, porém essa autonomia mantém-se relativa (BOURDIEU, 1968). Essa forma de observar a questão da legitimidade revela a singularidade histórica a qual Bourdieu se referenciava. Sendo um texto de 1968, a conjuntura de concepção do campo ainda se refere às entidades universitárias fossilizadas antes da revolução de maio de 1968 na França. Hoje este modelo deve ser revisto, pois as três dimensões no que se refere aos seus agentes, se confundem, não sendo tão facilmente determinadas, sendo a conjuntura político-social considerada prioridade no discurso acadêmico. Essa mudança, não se deve apenas aos conflitos de 1968, mas também na própria ampliação das instituições. Elas se legitimam no espaço-tempo, não as cabendo apenas uma classificação arbitrária. Ocorre fatores novos além de novas condições de acesso a informação/conhecimento. A representação do inconsciente cultural proporcionadas pela globalização, pelos meios de comunicação, o meio técnicoinformacional e pela modernização do transporte; as interações em rede, o papel crucial da espacialidade na contemporaneidade, como também as tecnologias envolvidas na escrita e afins, modificam o modo de observar o mundo, os significados e consequentemente o campo intelectual acadêmico. 5 O MÉTODO REFLEXIVO A adoção de um método norteador para o trabalho representa a maneira pela qual se deseja atingir um objetivo proposto. Esta adoção não assegura que nenhum erro venha a ocorrer, mas regula de maneira prévia diversos parâmetros a fim de chegar a determinado resultado. Segundo Darcila Simões (2008), o método é uma série de regras utilizadas com vistas à solução de problemas. Regras estas gerais que torna possível testar criticamente e selecionar hipóteses e teorias para a solução do problema, resultado esse que será pautado no modelo de raciocínio pelo qual optou o pesquisador/estudioso. Seguindo este raciocínio optamos pelo método reflexivo interpretado por Bourdieu (1989). Neste texto de 1989, o autor emprega o método a fim de propor uma sociologia reflexiva no qual a pesquisa se apresenta como uma atividade racional, no qual o objeto é construído, mas ele - objeto - também é posto em causa enquanto objeto pré-construído. O método é definido pelo autor como um modus operandi, ou seja, um modo de produção científico, uma postura que supõe um modo de percepção ou princípio de visão, no qual se admite que o objeto pré-construído pertence as esferas dos nossos interesses, mas sem deixar de problematizar estes interesses. A construção do objeto pressupõe uma postura ativa e sistemática, no sentido de construir um sistema coerente de relações, interrogando-se constantemente a fim de não modelizar o objeto, fossilizando-o (BOURDIEU, 1989). A literatura pesquisada nos ensina que não modelizar o objeto significa reconhecer a particularidade do objeto em estudo contra a tendência de universalização vigente, porém reconhecendo que através de interrogações gerais, é possível generalizálo, ao extrair as características invariantes que o objeto oculta sob a aparência de sua singularidade. Esta consciência faz com que o objeto seja percebido também como socialmente construído, visto que ele nem é preso em sua singularidade, nem em sua universalidade, mas decomposto de modo a atingir uma cogniscibilidade (BOURDIEU, 1989). Pierre Bourdieu (1989) considera um dos instrumentos mais eficazes para a familiarização deste modus operandi, a história social dos problemas, dos objetos e dos instrumentos de pensamento. Neste sentido, um estudo na História do Pensamento Geográfico, ao ter como objeto os conceitos, as trajetórias, o desenvolvimento da disciplina, os métodos ou metodologias empregadas, realiza essa tentativa de retomada 6 do objeto ao mundo. Este método ou postura se aproxima bastante da hermenêutica (compreendida ou como método, ou como postura) no sentido de considerar não somente o objeto préconstruído, mas também os esquemas cognitivos que originam esta construção. A interrogação sobre as condições sócio-históricas espaços-temporais do objeto em termos matérias, imateriais e ideais, ou seja, as estruturas objetivas, cognitivas e subjetivas mostram-se como prerrogativas dos dois métodos (BOURDIEU, 1989). Estas idéias marcadas nos parecem necessárias para refletir o conjunto de interações, tanto do conteúdo da proposta dos autores apresentados quanto à maneira como o conhecimento é produzido em determinadas condições sócio-históricas espaçostemporais, especificamente do campo intelectual acadêmico ao qual a geografia da religião se insere. É apoiado nesta postura que pretendemos entrar propriamente na dinâmica do subcampo intelectual acadêmico da geografia da religião, na tentativa de evitar os erros tendenciosos, que podem surgir e/ou de outras naturezas. Para tal iniciaremos pelo contexto histórico em que a retomada dos estudos do fenômeno religioso ocorreram na academia. O FENÔMENO RELIGIOSO NAS CIÊNCIAS SOCIAIS Neste tópico de análise visamos demonstrar um apanhado geral das diferenciações entre três ciências que estudam a religião. Três ciências selecionadas por nós. Tal escolha ocorreu devido ao fato de que tradicionalmente duas destas ciências vêm abordando de maneira sistemática estudos nos quais as questões religiosas aparecem como objetos centrais de pesquisa. Estas duas ciências são: a Antropologia e a Sociologia. A Geografia completa as três. A tradição antropológica de discutir a religião tanto em sociedades primitivas tecnologicamente quanto em sociedades contemporâneas complexas esteve presente nos estudos relacionados à cultura e à religião. Os conceitos são clássicos nestas pesquisas até os dias de hoje. A Antropologia vem abordando o fenômeno religioso, principalmente, em sua dimensão simbólica - semiótica-, e cognitiva. A Sociologia privilegia a análise do fenômeno religioso na vida de relações: nas estruturas formais da sociedade sendo estás interpretadas nas instituições e nas intersecções com a política e economia principalmente. Acrescentamos que buscamos na comparação com estas ciências sociais compreender qual o âmbito de independência e interdisciplinaridade 7 que as ciências estabelecem entre si e também com a religião em seu sentido dogmático. Esta reflexão parece completar a relevância dos estudos religiosos numa perspectiva geográfica. Vejamos. (a) Sociologia da Religião Segundo Martin Riesebrodt e Mary Konieczny (2005), a sociologia da religião emerge dos pressupostos levantados pela filosofia do iluminismo de um lado, e da crítica ao romantismo europeu de outro. Diversas foram as tentativas de tornar a religião um objeto dos estudos científicos e a sociologia conduziu estas tentativas em diferentes caminhos, visto que a religião no Ocidente está intrinsecamente vinculada a história e o modo de ser da sociedade ocidental. Para compreender como a sociologia classicamente interpreta o fenômeno religioso faz-se necessário reler as abordagens de Karl Marx (1996), Émile Durkheim (2003, 4ª ed.) e Max Weber (1999) - autores que representam o pensar clássico na academia acerca do fenômeno religioso, e versaram sobre estas questões ao longo do século XIX e início do século XX-, permanecendo como fundamentais ainda hoje na compreensão da abordagem espacial da religião. Ao continuar o raciocínio de Riesebrodt e Konieczny (2005), até o final da década de 70 do século XX, muitos sociólogos acreditavam que as sociedades modernas caminhavam para um processo de secularização no qual, até aquele ponto os fenômenos religiosos já se apresentavam mais ou menos compreendidos, ressaltados as peculariedades das diferentes sociedades e de suas instituições religiosas ou modos de vivenciar o fenômeno. Este processo de secularização, acreditavam eles, conduziriam a religião a esfera privada, da vivência do sagrado no self, ou mesmo que os valores embutidos na sociedade permaneceriam, sendo as tradicionais formas de vivenciar a religião, elas sim abandonadas, ou se não abandonadas, seriam transfiguradas para as chamadas religiões civis, no qual a nação, o estado e os símbolos nacionais substituiriam a religião enquanto veneração de algo sobrenatural. Em outra abordagem, acreditava-se que as instituições religiosas se adaptariam ao processo de secularização, estancando-o, na reafirmação do seu universo simbólico. E estas previsões mostraram-se mais coerentes com os fatos observados na conjuntura histórica ao longo do final do século XX, isto é, a ressurgência das instituições religiosas com relativa autonomia pública, remarcando identidades éticas e seus modos e práticas de viver no mundo (MATA, 2006). 8 Esta ressurreição acarretou não somente mudanças paradigmáticas nas bases de pesquisa da sociologia da religião que determinavam como compreendidos os fenômenos religiosos, ou mesmo sobre sua irrelevância perante outros campos de interesse vinculados a sociedade, pois a religião em sua relativa autonomia apresentava capacidades de adaptação não antes estudadas. Neste ponto os autores destacam a importância de novas releituras da religião, incluindo os aspectos não somente institucionais nos quais muitas vezes recaem em aspectos simplificados, bairristas ou utilitários das ações sociais, mas também aspectos subjetivos que privilegiem os atores religiosos individualmente. A literatura aponta que mesmo as ciências sociais mais tradicionais apresentam divergências de abordagem do fenômeno religioso devido a certa incompatibilidade entre ciência e religião. É possível reconhecer porque isto ocorre: (a) no âmbito da natureza do conhecimento trazido por cada uma: a ciência, o conhecimento experimental, e a religião, o conhecimento revelado; e (b) principalmente devido a manutenção de determinados preconceitos vivenciados na academia de maneira um tanto uniforme acerca da temática do fenômeno religioso. Apesar da crítica ressaltada acima, ressalta-se cada vez mais, o recrudescimento de pesquisas envolvendo sociedade e religião. À medida que se favorece o reconhecimento da interdisciplinaridade tanto entre as ciências quanto na relação ciência, política e religião, observando o limite de interpolação entre as partes envolvidas, ou seja, a independência de cada uma das partes em questão. (b) Antropologia da Religião O interesse em estudar a religião é antigo na ciência antropológica. Diferentemente das demais ciências sociais que precisam justificar arduamente seu vínculo ou interesse em estudar a religião, a antropologia por se apresentar sensível aos aspectos que envolvem o humano em suas construções culturais, possui forte tradição, configurando-se na vanguarda dos estudos sobre religião. Rosalind Hackett (2005) nos traz alguns aspectos a refletir. Ela nos diz que a antropologia da religião vem experimentando um longo reconhecimento no decorrer do século XX e ao final da década de 1990, apresenta renovação teórica com o desenvolvimento de novos artigos, pesquisas e comunidades de estudiosos. A renovação teórica é vasta e várias são as reflexões. Uma delas é devido a crescente importância da 9 religião como formadora de identidade e também fonte de resistência local e transnacional de grupos sociais. Esses aspectos têm gerado uma forte necessidade por parte de especialistas de busca de conhecimento e compreensão do fenômeno, como também idéias diversificadas em contextos múltiplos e diferenciados. O novo olhar da antropologia da religião pode ser traçado através de três fatores gerais: (1) alterações na natureza e na localização do fenômeno religioso (movimento de pessoas, influência da mídia de massa religiosa, forças do mercado); (2) grande interdisciplinaridade entre as disciplinas acadêmicas; e (3) a crítica derivada do póscolonialismo, pós-estruturalismo e pós-modernismo. As pesquisas indicam que desde o século XIX através dos relatos de viajantes, as questões relativas à identidade e à interpretação de idéias religiosas, como símbolos e suas práticas vem se apresentando de forma constante nesta ciência. Sem dúvida, a profundidade alcançada nos dias atuais demonstra o desenvolvimento da Antropologia do início da cientificação da disciplina aos dias de hoje. Esse desenvolvimento se reflete nas questões técnicas, teóricas e metodológicas. As noções teóricas atuais vêm enfatizando itens como: a importância do holismo, do contexto, da prática e das relações de poder, e incorporando à crítica as posições e interesses próprios dos pesquisadores. E para os estudiosos, inclusive Hackett, a antropologia da religião insere-se também nesse novo contexto, apresentando-se incrivelmente bem posicionada para responder as questões sociais e culturais prementes às identidades, às diferenças, aos conflitos, às questões da mídia religiosa, os recrudescimentos e aos modos de ser mediados pela religião - o ser-nomundo e a compreensão dele na vida - no mundo globalizado. Na esfera brasileira, pode-se perceber cada vez mais uma formação sólida acerca de um pensar genuinamente nacional em antropologia da religião. Essa comunidade científica nacional cresceu exponencialmente entre 1930 e 1980, apresentando em 1990 e a partir dos anos 2000 uma diversidade de temas, publicações, linhagens e reconhecimento internacional. Hoje pode-se observar os espaços significativos que estes estudos ocupam na produção do conhecimento. As abordagens tornaram-se interdisciplinares e o aprimoramento teórico-metodológico a fim de compreender os problemas do fenômeno religioso a partir de uma base própria nacional e a busca por repostas próprias a realidade brasileira são claras. Esta busca torna-se necessária quando se percebe a força cultural que a religião exerce no Brasil e na América Latina. 10 De modo geral, a visão antropológica brasileira enfatiza a religião como uma expressão simbólica da sociedade, explorando a religião em sua dimensão cognitiva. Surgem destas discussões releituras de conceitos caros tanto à antropologia quanto à sociologia, tais como: cultura, rituais, crenças, igrejas, seitas e secularização. Estes conceitos se plurificam, esquivando-se de concepções unívocas. O contexto religioso contemporâneo não apenas estuda as especificidades das religiões, mas busca também estudar como cada religião comporta-se no choque e contato com o outro, sendo este outro o diferente, expresso tanto em uma outra religião como em outras esferas da sociedade - a esfera política, econômica, as questões de gênero etc. (MARIZ, 2006). (c) Geografia da Religião Os autores selecionados neste breve estudo e narrados nos itens anteriores demonstraram panoramicamente como seus respectivos campos de estudo vêm abordando as pesquisas em religião, demarcando a importância da interdisciplinaridade e estabelecendo de uma maneira mais ou menos explícita, a compreensão do fenômeno religioso e a mudança de paradigma dos últimos 20-30 anos do século XX. Em destaque, apresentamos a tendência à secularização da sociedade minimizada pelo recrusdecimento da religião na mesma, como pensam alguns autores. A antropologia da religião vem traçando, contemporaneamente, como um de seus três fatores gerais de tendência para estudos às questões relacionadas a alteração na natureza e na localização dos fenômenos religiosos. Porém, Chris Park (2005) nos relata que raramente a Geografia aparece em livros de religião ou coletâneas de antropologia e sociologia da religião, mesmo que alguns estudiosos da antropologia admitam que muitas das questões interessantes sobre o desenvolvimento das religiões - a sua difusão e o impacto que imprimem na vida de relação - são enraizados em fatores geográficos. Pode-se perceber que essa afirmação por si só justificaria a possibilidade de estudos sob a ótica da geografia. Reforçando a hipótese, incluímos as idéias de Flickeler (1999, p. 7): Mas já que todas as religiões criaram, no curso de seu desenvolvimento, um cultus mais ou menos manifesto, sendo o mesmo espacial e temporalmente perceptíveis através de eventos mágicos ou simbólicos, de objetos e comportamentos, os fenômenos religiosos aparecem em relação real com a superfície terrestre, podendo ser, portanto estudados geograficamente. 11 A exemplo, dois temas essencialmente geográficos podem ser mencionados: (a) primeiro, a difusão ou distribuição da religião, e (b) em segundo, a delimitação de espaços sagrados e lugares sagrados. Estes dois temas revelam significativamente a dinâmica espaço-temporal da religião conectando-a nas questões tanto subjetivas, como a relação do homem religioso com determinado lócus, quanto objetivas, como a delimitação territorial de instituições religiosas. Esses temas elucidam inclusive questões ideológicas fundadas em tradições, nos costumes e nas convenções sociais que definem a apropriação do lócus para fins práticos de reconecção sobrenatural. Elucidam também as práticas ritualísticas, as difusões de idéias, as relações de poder e as motivações subjetivas, inclusive permitindo entender determinados movimentos migratórios constantes, como o deslocamento de peregrinos islâmicos a cidade de Meca - Arábia Saudita-, e de romeiros a cidade de Aparecida no estado de São Paulo - Brasil-. Segundo Park (2005), dois grandes blocos de questionamentos são comumente explorados pelos geógrafos da religião, visto que são rapidamente definidos em termos de espaço e lugar, são eles: (a) a distribuição da religião; e (b) os lugares sagrados e os espaços sagrados, e como eles influenciam o deslocamento das pessoas. No primeiro grande bloco, a distribuição da população pode ser abordada em diversas escalas, do global ao local. Na escala global, um importante questionamento refere-se a força cultural de algumas religiões em diferentes lugares e quanto essa força é capaz de influenciar e ocasionar habitus, conflitos, costumes, enfim práticas morais, éticas, comportamentais, políticas etc. Esse poder pode se expressar através da difusão de grupos religiosos e compartimentações no interior do mesmo grupo. As mudanças ao longo do tempo pertencem a este bloco, assim como seu vigor e fenecimento. Desta maneira, questionamentos acerca dos processos que podem explicar certos padrões ou irregularidades nas mudanças no interior ou exterior das religiões no espaço e tempo também podem ser pontuados (PARK, 2005). Já o segundo bloco, refere-se aos lugares sagrados e espaços sagrados. O principal e norteador questionamento focaliza-se na prerrogativa do porquê de alguns lugares serem considerados sagrados e “portanto” especiais, e não na possibilidade de todos os lugares serem considerados sagrados. Por considerar certos lugares mais dotados do sagrado do que outros, muitas religiões - ou praticamente todas as religiões amplamente conhecidas-, ativamente encorajam seus seguidores a visitarem estes lugares sagrados, gerando deste modo o fenômeno religioso da peregrinação. Esse 12 movimento de seguidores religiosos ou peregrinos, para e aos lugares sagrados proporciona uma dinâmica religiosa especial e claramente geográfica capaz de alterar e impactar significativamente economias locais, algumas vezes extrapolando sua área de abrangência (PARK, 2005). O geógrafo ainda nos diz que as variações espaciais proporcionadas pelo fenômeno religioso no interior e entre os países, e o padrão global da religião são interessantes em si mesmos porque eles ilustram a diversidade cultural existente entre os agrupamentos humanos. Tal padrão global geralmente reflete a interação de muitos fatores diferentes, que proporcionam oportunidades interessantes para o estudo da difusão das idéias e do movimento das pessoas como também da dinâmica das populações humanas. Em menor escala, seus padrões e a difusão da religião revelam propriedades interessantes acerca da persistência, da tolerância e da motivação humana na construção da vivência cotidiana e sagrada. Park (2005) ainda se refere a questões não tão claras a primeiro instante e que se aplicam ao interesse que se estende para além das pessoas e seus sistemas de crença, abrangindo temas intrinsecamente geográficos como espaço sagrado, lugares sagrados e direções sagradas. O sistema de crenças humano no qual as crenças religiosas se incluem são o principal combustível para as práticas religiosas que têm expressões espaciais, como exemplos já citados, as peregrinações e as visitas a lugares sagrados. Rosendahl, em 2006, apresentou no V SNEC/ I SNEC, “Os caminhos da Construção Teórica: Ratificando e exemplificando as relações entre espaço e religião” no qual trouxe para o debate trabalhos de geógrafos preocupados em estabelecer metodologias e teorias em geografia da religião. Resgatando nomes como de Paul Fickeler, Pierre Deffontaines, Max Sorre e David Sopher, a geógrafa caracterizou estes trabalhos como pertencentes a uma maneira tradicional de abordar o fenômeno religioso, caracterizada pela descrição de realidades religiosas essencialmente materiais e perceptíveis espacialmente. Resgatando esse apanhado teórico-metodológico tradicional, destacamos do texto de Rosendahl (2006) que: (1) Paul Fickeler (1947 apud Rosendahl 2006) demarca que os estudos em geografia da religião devem ser orientados na interação ambiente-religião, entendido ambiente como: população, natureza, lócus, país - todos atributos espacializáveis-. 13 (2) Pierre Deffontaines (1948 apud Rosendahl 2006) esses estudos devem se orientar na influência da religião na fixação e no ordenamento dos lócus populacionais, focando sobre a história do povoamento. (3) Max Sorre (1957 apud Rosendahl 2006), nos diz que a religião se apresenta como fator de união, status quo, ressaltando a atitude religiosa dos grupos como reflexo da crença a que se dedicam, surgindo então o conceito de espaço religioso e as atividades religiosas inerentes a este espaço singular. (4) David Sopher (1967 apud Rosendahl 2006), se refere ao objeto da geografia da religião como sendo os sistemas religiosos organizados e institucionalizados, os quais devem ser compreendidos em sua evolução, condicionalidade ao comportamento humano, sua organização espacial e distribuição geográfica. Devido aos paradigmas geográficos da época, todos os geógrafos supracitados são unânimes em ressaltar que o conteúdo teológico-filosófico das religiões por si só não fornecem base para uma análise geográfica rigorosa (ROSENDAHL, 2006). Porém pós-1970, esta maneira de praticar a pesquisa em geografia da religião sofreu sérias críticas. Reconhecendo a insuficiência de seus princípios materiais frente à complexidade das religiões e da maneira pelas quais as demais ciências estudavam o fenômeno religioso cada vez mais alicerçadas em imaterialidades como: ideologias, sistemas de representação e valores - elementos nos quais o positivismo não consegue abarcar-, em meados da década de 1970 surgem trabalhos nos quais tanto os aspectos materiais quanto os não-materiais começam realmente a ser abordados (ROSENDAHL, 1994, 1996). Essa mudança de paradigma ocorreu, segundo Claval (1999) devido a “descoberta” ou o entendimento da variabilidade dos agrupamentos humanos no tempo e no espaço precisamente. Mais do que isso, o entendimento da natureza destes agrupamentos influenciado pela filosofia do materialismo histórico-dialético geográfico, como também as filosofias do significado valorizando o simbólico. A importância recai sobre a análise da construção dos indivíduos e suas subjetividades tanto em sua psicologia - teorias sobre a individualidade na sociedade, o esquizóide-, como também a partir de interações ou da vida de relações, influenciando na transferência de valores, técnicas, atitudes, idéias e outros. Nesta medida, a geografia da religião aparece teórica e metodologicamente contextualizada. Na abordagem tradicional, o fenômeno religioso era interpretado em 14 análises regionais nas quais se realizavam espécies de inventariados dos efeitos, costumes e tradições espacializadas. Como nos diz Rosendahl (2002) a materialidade strictu senso da cultura, e, por conseguinte da religião, era estudada, porém o poder transformador da religião enquanto agente modelador do espaço não era privilegiado. Essa contextualização a aproxima significativamente da abordagem cultural em Geografia. Devido a mudança do paradigma e a maior interdisciplinaridade entre as disciplinas sociais, a geografia da religião segundo a autora recebe reconhecimento pois os estudos sobre a compreensão do mundo que englobam as relações de grupos e indivíduos com a natureza, a sociedade, entre si, configurando comportamentos geográficos e vivências em termos de sentimento, idéias, ideologias e símbolos, passam a ter arcabouço epistemológico para serem abordados, como também encontram similitudes nas demais disciplinas. Mesmo os estudos que privilegiam a dimensão ontológica da relação Deus, homem e espaço ganham possibilidades reais de serem trabalhados. Este contexto contemporâneo permite então estudos a cerca das imaterialidades da cultura e por extensão, da religião. Assim, a fé, as motivações religiosas dos atores sociais e suas marcas no espaço integram-se como parte fundamental dos estudos geográficos em religião (ROSENDAHL, 2006). Deste modo podemos definir o estudo geográfico da religião, como nos diz Rosendahl (1994, 1996), como um estudo voltado para a compreensão da manifestação espacial do sagrado. Essa manifestação deve ser entendida como uma combinação entre a motivação religiosa na criação, modificação ou destruição de determinados lócus, objetivando satisfazer um impulso religioso em produzir, reproduzir e influenciar simbolicamente certos lócus a fim de cumprir com essa necessidade de união do homem com a sua religiosidade. Nas palavras de Terra (2009, p. 2): a crença, a fé, a atividade religiosa e a prática religiosa permitem ao homem religioso vivenciar seus espaços sagrados, percorrer seus lugares sagrados, configurar paisagens ou regiões religiosas e pertencer a um território religioso. O geógrafo Manfred Büttner (1985) apud Rosendahl (1994) sugere três partes essenciais nos estudos espaciais sobre religião, no qual pode-se perceber claramente uma metodologia para os estudos do fenômeno religioso. Esta metodologia pode ser reinterpretada a luz dos paradigmas contemporâneos. A primeira parte de sua metodologia revista compreende uma investigação minuciosa a cerca da comunidade religiosa sob o reconhecimento da estrutura espacial; 15 de sua origem; das atitudes comportamentais e mentais de seus membros; das estruturas sociais associadas e dos processos de transformação da mesma na sociedade. A segunda parte considera a experiência individual, recorrendo a ferramentas tanto etinográficas, quanto semióticas ou fenomenológicas, a fim de elucidar símbolos; signos; valores e significados; aspectos da vida de relações e modo de ser de um sistema religioso no âmbito dos indivíduos envolvidos. E a terceira parte se refere a dialética entre religião e lócus propriamente, no qual se evidencia que a religião deve ser compreendida como um agente modelador espacial singular, pois simbólico, que influencia nos habitus, nos ethos, na sociedade e na organização espacial desta mesma sociedade. Respeitando essa metodologia revista, podemos averiguar que a experiência religiosa individual e coletiva, em lócus determinados espaço-temporalmente, proporcionam vivências e percepções singulares (ROSENDAHL, 1996, 2006). Neste contexto, a geografia da religião em escala mundial se desenvolve 3. Os geógrafos, de maneira geral, realizaram revisões bibliográficas sobre a temática geografia e religião, destacando a pluralidade passível de pesquisa e sua interdisciplinaridade com as demais ciências sociais, porém não chegaram a realizar uma sistematização do subcampo a ser investigado ou um modus operandi possibilitador de uma identidade plena para o subcampo. CONCLUSÃO Como foi demonstrado ao longo do artigo, de maneira breve, religião e geografia apresentam afinidades visíveis e interdisciplinaridade. Isso é possível na medida em que compreendemos a situação humana no qual o homem está necessariamente sob influência das condições espaços-temporais, ressaltando o fato de que o homem é o ator, produzindo, reproduzindo e transformando a sua realidade- para compreensão da vida, do seu ser no mundo e do seu self propriamente-. Deste modo, indiferentemente ao desinteresse dos geógrafos, as demais ciências sociais, com destaque a antropologia vem avançando nos estudos sobre estas condições. Demonstrado assim algumas apreensões sobre religião e ciência social, 3 Para mais detalhes ver Rosendahl (2004). 16 percebemos o desenvolvimento da geografia da religião enquanto subcampo da Geografia Cultural. REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. O poder Simbólico. Rio de Janeiro: Difel, Bertrand Brasil, 1989. 311 p. ___________. Campo Intelectual e projeto criador. In: POUILLON, Jean. Problemas do estruturalismo. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1968, p.104-145. CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 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