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nunca pare de sonhar
Coleção COMUNIDADE E MISSÃO
•O diálogo das religiões, A. Torres Queiruga
•Curso de preparação para ministérios leigos, Diocese de Caxias do Sul
•A Igreja do futuro e o futuro da Igreja — Perspectivas para a evangelização na
aurora do terceiro milênio, Agenor Brighenti
•Discípulos e missionários — Reflexões teológico-pastorais sobre a missão na
cidade, Dom Benedito Beni dos Santos •A vocação: convite para servir, Pe. José Dias Goulart
•Vida Religiosa — Da convivência à fraternidade, G. Colombero
•Ovelha ou protagonista? — A Igreja e a nova autonomia do laicato do século
XXI, Renold J. Blank
•Herdeiros de Abraão — O futuro das relações entre muçulmanos, judeus e cristãos, Bradford E. Hinze e Irfan A. Omar •A unidade da Igreja — Ensaio de eclesiologia ecumênica, Elias Wolff
•Acompanhamento de vocações homossexuais, José Lisboa Moreira de Oliveira
•Padres para amanhã — Uma proposta para comunidades sem Eucaristia, Fritz Lobinger
•Dicionário de Aparecida — 42 palavras-chave para uma leitura pastoral do
Documento de Aparecida, Paulo Suess
•As noites de um profeta — Dom Helder Câmara no Vaticano II, José de Broucker
•Para compreender o Documento de Aparecida — O pré-texto, o con-texto e o
texto, Pe. Agenor Brighenti
•Fé viva — Como a fé inspira a justiça social, Curtiss Paul DeYoung
•Dom Helder Câmara — Um modelo de esperança, Martinho Condini
•Mártir da Amazônia — A vida da irmã Dorothy Stang, Roseanne Murphy
•Equipes de ministros ordenados, Dom Fritz Lobinger, Pe. Antonio Jose de
Almeida
•A profecia na Igreja, José Comblin
•Leigos e leigas — Força e esperança da Igreja no mundo, Cezar Kuzma
•Igreja comunhão, participação, missão, João Panazzolo
•Discípulos e missionários na paróquia, Luiz Gonzaga da Rosa
•Diaconia da palavra: o ministério e a missão do diácono permanente, Julio
César Bendinelli
•Encontro com Cristo — Vencer medos, viver de esperança, Bruno Carneiro Lira
•Dom Helder Câmara: profeta para os nossos dias, Marcelo Barros
•Impulsos e intervenções — Atualidade da missão, Paulo Suess
•Por uma paróquia missionária à luz de Aparecida, Gelson Luiz Mikuszka
•O presbítero consagrado nos Institutos Seculares, Giuseppe Forlai
•Concílio Vaticano II — Reflexões sobre um carisma em curso, João Décio Passos
•Sujeitos no mundo e na Igreja, João Décio Passos (org.)
•O bispo, Carlo Maria Martini
•Evangelho e instituição, Marcelo Barros
•Dicionário da Evangelii Gaudium, Paulo Suess
•Nunca pare de sonhar — O presbítero que ama Jesus e sua Igreja, Pe. Jésus
Benedito dos Santos
Pe. jésus benedito dos santos
nunca pare de sonhar
O presbítero que ama Jesus
e sua Igreja
Direção editorial: Claudiano Avelino dos Santos
Assistente editorial: Jacqueline Mendes Fontes
Revisão:Caio Pereira
Tarsila Doná
Rodrigo Moura de Oliveira
Diagramação: Dirlene França Nobre da Silva
Capa: Marcelo Campanhã
Impressão e acabamento: PAULUS
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Santos, Jésus Benedito dos
Nunca pare de sonhar: o presbítero que ama Jesus e sua Igreja / Jésus Benedito dos
Santos. — São Paulo: Paulus, 2015. — (Coleção Comunidade e missão)
ISBN 978-85-349-4179-2
1. Concílio Vaticano (2.: 1962-1965) 2. Igreja Católica - Clero 3. Jesus Cristo - Pessoa
e missão 4. Missão da Igreja 5. Presbíteros 6. Utopia 7. Vocação sacerdotal I. Título.
II. Série.
15-05162
Índices para catálogo sistemático:
1. Presbíteros: Missão pastoral: Cristianismo 253
1ª edição, 2015
©PAULUS – 2015
Rua Francisco Cruz, 229 • 04117-091 São Paulo (Brasil)
Fax (11) 5579-3627 • Tel. (11) 5087-3700
www.paulus.com.br • [email protected]
ISBN 978-85-349-4179-2
CDD-253
Agradecimentos
Se alguém passar por este livro e for despertado para
buscar a realização dos seus sonhos, penso que valeu a pena
todo o esforço. Se alguém passar por este livro e for despertado para caminhar rumo à felicidade, à vida plena, penso que
não foi em vão toda a luta. Se alguém passar por este livro e
se dispuser a continuar sonhando e acreditando na realização
de seus sonhos, sendo despertado para buscar a força mais
potente do universo, que é a fé, penso que valeu o empenho.
Se alguém passar por este livro e conseguir abraçar mais plenamente a riqueza dos documentos do Concílio Vaticano II,
penso que alcançamos nosso objetivo, e assim louvo e agradeço
ao Deus da vida.
Agradeço de modo especial a todos que contribuíram
para a realização do sonho deste livro: Dom Marco Aurélio
Gubiotti; Presbíteros Mauro Ricardo de Freitas, Robson Aparecido da Silva, Valdair Benedito Pires, Antônio Van Baalen,
Simão Cirineo Ferreira e Edpo Francisco Campos; os leigos e
leigas Lúcio Flávio Coutinho, Edna Vilela Silva Santos, Miriam
Cibele Rodrigues Carvalho Souza, Marcos Roberto de Faria,
Helena Aparecida Reis Fraga e Marcelo de Paula.
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Epígrafe
Sonho de um jovem que morava no Centro-oeste dos Estados Unidos
(autor desconhecido)
Por ser filho de um domador de cavalos, tinha uma vida
quase nômade, mas desejava estudar. Perseguia o ideal da
cultura. Dormia nas estrebarias, cuidava dos animais fogosos
e, nos intervalos, à noite, procurava a escola para iluminar a
inteligência. Numa dessas escolas, certa vez, o professor pediu
à classe que cada aluno contasse seu sonho. O que desejavam
para suas vidas.
O jovem, tomado de entusiasmo, escreveu sete páginas.
Desejava, no futuro, possuir uma área de oitenta hectares e
morar numa enorme casa de quatrocentos metros quadrados.
Desejava ter uma família muita bem constituída. Estava tão
entusiasmado que não somente descreveu, mas desenhou
como ele sonhava a casa, as cocheiras, os currais, o pomar.
Tudo nos mínimos detalhes. Quando entregou o trabalho,
ficou esperando, ansioso, pelas palavras de elogio do mestre.
Contudo, três dias depois, o trabalho foi devolvido com
uma nota sofrível. Depois da aula, o professor o procurou e
falou:
– O seu sonho é um absurdo. Imagine, você é filho de
um domador de cavalos. Você será um simples domador de
cavalos. Escreva um sonho que possa se tornar realidade e eu
lhe darei uma nota melhor.
O jovem foi para casa muito triste e contou ao pai o que
havia acontecido. Depois de ouvi-lo, com calma, o pai afirmou:
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Nunca pare de sonhar
– O sonho é seu, meu filho. Faça o que quiser... Essa
decisão é sua. Persista nesse sonho ou procure outro.
O jovem meditou e, no dia seguinte, entregou a mesma
página ao professor. Disse-lhe que ficaria com a nota ruim,
mas não abandonaria seu sonho. Essa história foi contada
para várias crianças pelo dono de um rancho de oitenta hectares, uma enorme casa de quatrocentos metros quadrados e
uma família muito bem constituída, próximo de um colégio
famoso dos Estados Unidos, o qual empresta para crianças
pobres passarem os fins de semana.
Depois de terminar a história, o dono do rancho revelou
ser o jovem que recebeu a nota ruim, mas não desistiu do sonho. E o mais incrível é que, depois de trinta anos, o professor
das crianças visitou o local com seus alunos. Certo dia resolveu
apresentar-se, ao entender que o proprietário era seu antigo
aluno, e confessou: “Fico feliz que o seu sonho tenha escapado da minha inveja. Naquela época eu era um atormentado.
Tinha inveja das pessoas sonhadoras. Destruí muitas vidas.
Roubei o sonho de muitos jovens idealistas. Graças a Deus,
não consegui destruir o seu sonho, que faz bem a tantas vidas”.
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Prefácio
Sonho nos lembra de outra palavra: utopia. É claro que
não são sinônimas, pois enquanto a primeira se liga mais à
imaginação, à criação de imaginários, a segunda tem a força
da articulação de vários sonhos para atingir um ideal que
parece inatingível. Porém, nosso autor quis que pensássemos
nas possibilidades de uma nova articulação da Igreja e do
ministério presbiteral em chave de sonho, pois nos convida
a imaginar que a realidade pode ser mudada, purificada, encontrando seu espaço na história, deixando, portanto, de ser
um não lugar (οὐ τόπος), como os dicionários insistem em
traduzir a palavra utopia. Se levarmos em conta a definição
do escritor uruguaio Eduardo Galeano, bem que poderíamos
relacionar os sonhos desta obra à utopia: “A utopia está lá no
horizonte. Aproximo-me dois passos e ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais
que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia?
Serve para isto: para que eu não deixe de caminhar”. É este o
espírito deste livro do Pe. Jésus Benedito: que ninguém pare
de sonhar, que ninguém deixe de caminhar.
Ler esta obra é mergulhar nos documentos conciliares
do maior evento eclesial do século XX – o Concílio Vaticano
II – e dar novo alento ao sonho de ver uma Igreja mais próxima de Jesus Cristo, com presbíteros mais identificados com o
sacerdote verdadeiro. Se tomarmos a tradição sacerdotal, Jesus
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nela não se enquadra, e só pode ser entendido como um leigo
judeu, frequentador de sinagogas e não de templos, onde se
realizavam os sacrifícios. Porém, à luz do texto neotestamentário conhecido como Carta aos Hebreus, podemos afirmar
que Jesus foi verdadeiramente sacerdote, pois seu sacrifício foi
existencial, entregando a sua vida para que todos tivessem vida.
Padre Jésus Benedito nos coloca exatamente nesse ponto
axial da vida e missão de Jesus Cristo, como parâmetro máximo
para a vida de todos os presbíteros. Com a perspectiva sugestiva
do sonho, o autor nos leva a sonhar com novas possibilidades
de superar o atual clericalismo que tomou conta da Igreja e nos
distanciou do ministério pé no chão, que mais se aproxima
da práxis de Jesus Cristo.
O convite insistente para que todos sonhem com esse
novo presbítero como protagonista da construção da realidade
eclesial não exclui, de forma alguma, a participação efetiva de
leigos e leigas, pois o presbítero, no espírito do Concílio Vaticano II, só pode ser compreendido na perspectiva da eclesiologia
total. Tal eclesiologia tem como fundamento o sacramento
do Batismo e não da Ordem, seguindo o esquema da Lumen
Gentium, que antepõe o conceito de Povo de Deus ao de Igreja
hierárquica. O Batismo nos iguala e a Ordem nos distingue.
E tal distinção só tem sentido se for feita para ilustrar que os
ministros ordenados estão a serviço da totalidade do povo de
batizados, do Povo de Deus.
A opção pelo vocábulo presbítero, em vez de sacerdote,
também obedece ao espírito do Concílio Vaticano II, que no
seu documento Presbyterorum Ordinis refere-se à dimensão
sacerdotal, como uma ao lado das outras duas, que complementam os três múnus do Cristo atribuídos ao ministério
presbiteral: sacerdote, profeta e rei (pastor).
O presbítero que emerge desta obra do Pe. Jésus é aquele
homem que entendeu que, antes de ser presbítero, é preciso
ser homem no meio do povo, ser irmão de todos os irmãos
Prefácio
e irmãs que compõem o Povo de Deus, ser cristão entre os
cristãos. Como tal, não é reduzido ao homem do altar, mas
também ao homem da rua, como sonha o papa Francisco com
presbíteros de uma Igreja em saída e não presos às sacristias.
Estar na rua como profeta e pastor, ater-se aos sinais
dos tempos, solidarizar-se com os pequenos e marginalizados,
denunciar, com sua vida, as injustiças da sociedade desigual
em que vivemos e anunciar, com intrepidez, a Boa-Nova do
Reino, tudo isso convém àquele que, digna e responsavelmente,
aceitou estar no presbiterado. É homem que agrega e promove
a verdadeira comunhão e paz, como atesta o profeta que esta
é fruto da justiça.
O profetismo no ministério do presbítero, como o concebe Pe. Jésus, implica também estar aberto ao novo e com discernimento crítico; ser cultivador da mística e da espiritualidade
profundas e cuidador da vida e da formação de novos profetas.
Quando o autor fala do pastoreio no ministério presbiteral, o
faz destacando que é preciso, para ser presbítero-pastor, ter a
paixão por Cristo e a paixão de Cristo pelo povo, para não se
tornar um mero funcionário da instituição. Lembra-nos que o
Decreto Conciliar Presbyterorum Ordinis coloca, como eixo da
ação presbiteral, a caridade pastoral, sem a qual o presbítero
pode ser até um bom profissional, mas não um padre, segundo
o coração de Cristo.
Os quatro capítulos bem articulados nos adentram de
cheio no espírito do livro: sonhar um novo presbítero à luz
de uma nova Igreja. A eclesiologia do Concílio concebe a
Igreja como toda ministerial, fomentadora de comunhão e
de participação de todos, em que todos são chamados à santidade, em que se entende que a autêntica hierarquia querida
por Jesus Cristo é a do serviço: “Quem quiser ser o primeiro,
seja o servidor de todos”; em que se cultiva uma mariologia
real, na qual Maria aparece como modelo de Igreja; em que
se antecipam as alegrias do Reino para o hoje da história. A
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eclesiologia conciliar supera a dicotomia fé e vida, fé e política,
denunciando como grave perigo separar a fé que se professa
do estilo de vida que se vive. A Igreja precisa fomentar a centralidade da Palavra em profunda sintonia com a fé celebrada,
articulando a mesa da Palavra com a da Eucaristia. Precisa ser
a Igreja do verdadeiro ecumenismo, baseada no diálogo com a
sociedade, com os cristãos de outras Igrejas e com homens e
mulheres de outras religiões. Precisa ser a Igreja que venceu a
tentação do proselitismo e do espírito apologético, por meio
de um espírito missionário, que se move mais por irradiação
e testemunho que por meio da pregação e dos discursos. Esse
é o conteúdo do primeiro capítulo.
Pe. Jésus percebe que esse modo de ser Igreja enfrenta, na
atualidade, uma profunda crise, e desenvolve o segundo capítulo tratando pormenorizadamente dos pontos cruciais dessa
barafunda eclesial pela qual passa a instituição na sociedade
hodierna. Ele detecta que há uma lacuna séria no sentido do
pertencimento, na divisão entre os cristãos, no desencanto
com a humanidade, que muitas vezes deixa de sonhar e de
fomentar a sociedade justa e de igualdade das oportunidades.
Aborda ainda a crise do profetismo, que paralisa os homens e
mulheres de boa vontade, tornando muito distante o sonho
de outro mundo possível.
O terceiro capítulo trata do presbítero sonhador, homem de fé e sujeito na Igreja de Cristo, e da urgente tarefa de
purificação e atualização da fé e dos sonhos dos presbíteros.
Tal purificação supõe a coragem de perceber que não vivemos
mais, na expressão do autor, sob o manto sagrado protetor
da família certinha e da Igreja pura e distante da “sujeira”
do mundo. Agora é preciso perceber que todos estão no mesmo barco da humanidade, e é aí o lugar onde os presbíteros
precisam gerar novos sonhos, novas pessoas de autêntica e
profética fé. Sem uma vida profunda de espiritualidade e de
mística, cultivada por momentos de silêncio e de busca de um
Prefácio
contato mais direto com Deus, também por meio de retiros
espirituais, renovados e renovadores, nada ou pouca coisa se
consegue! Esse presbítero sonhador é o homem que passou
pela aventura metanoica, ou seja, uma real conversão para
uma vida plena em Cristo.
O quarto e último capítulo traz um elenco de testemunhos de sonhadores e sonhadoras que tiveram a coragem de
relatar seus sonhos, suas esperanças, suas crenças. Com esses
parceiros e parceiras de sonho, Pe. Jésus partilha o próprio
sonho, tornando-se assim o presbítero sonhador, que nos
interpela para que não paremos de sonhar e nos tornemos
construtores de uma Igreja renovada, purificada e em constante processo de reforma, no melhor espírito conciliar da
Igreja semper reformanda.
Pe. Manoel Godoy
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Introdução
O papa Francisco diz na sua Exortação Apostólica que
tem um sonho: “Sonho com uma opção missionária capaz
de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os
horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem
um canal proporcionado mais à evangelização do mundo
atual que à autopreservação” (EG, 27). O Concílio Vaticano
II é um grande sonho da Igreja, sonho ousado de evangelizar,
humanizar, cristianizar a humanidade, sonho de diálogo com
a modernidade. Entendemos que o presbítero deve ser uma
pessoa de fé e de sonhos. E ele está aí dentro dessa Igreja, da
qual é chamado a encarnar o sonho, dentro do espírito do
Concílio Vaticano II.
Falar do espírito do Concílio Vaticano II é falar da sua
essência. Assim, ser um presbítero de fé e de sonhos, no espírito
do Vaticano II, é abraçar esse Concílio e viver sua essência.
Tal sonho deve estar cravado no coração de todo aquele que
busca a ordenação presbiteral e, na sua maturidade, assume
a missão de dialogar, cristianizar, evangelizar e humanizar
o mundo moderno. Afinal, ser presbítero é ser uma pessoa
madura na fé (2Tm 2,1-2), um discípulo-missionário, um
propagador da fé cristã a todos os que dele se acercam. Sua
missão é fazer com que “Cristo habite pela fé nos corações dos
fiéis e que sejam todos arraigados e fundados no amor” (Ef
3,17), tornando-se “filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo”
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(Gl 3,26). Tal missão implica ser um presbítero sonhador, à
semelhança de Cristo, que foi o maior vendedor de sonhos de
que já se teve notícias. Jesus plantou no coração das pessoas o
sonho do Reino de Deus. Assim, ser um presbítero de fé e de
sonhos na Igreja de Cristo, no espírito do Vaticano II, implica
investir o melhor de si mesmo para gestar no coração de todos
os sonhos de Deus.
O presbítero, por natureza, é um educador da fé e dos
sonhos do povo de Deus na Igreja de Cristo. Diversos desafios
se apresentam nessa sua missão evangelizadora. Mas penso
que o maior desafio está relacionado à pessoa do presbítero,
isto é, perder a esperança, e assim não sonhar com a Igreja
de Cristo nem ter fé. Outra questão que se apresenta, nessa
mesma linha, é do presbítero, pelo fato de ter alcançado a graça
do presbiterato, cair na tentação de não sonhar nem procurar
crescer e amadurecer na fé. Isso poderá acontecer devido à
função que é chamado a exercer, isto é, presidir as orações,
estar à frente da comunidade, sentir-se escolhido por Jesus.
Na verdade, celebrar missas, casamentos, batizados, unção
dos enfermos, confessar os fiéis, visitar os doentes não torna
o presbítero uma pessoa de fé nem um sonhador na Igreja de
Cristo. Psicologicamente, o presbítero é tão necessitado de
fé, de sonhos, de conversão, de crescimento e de amadurecimento, numa palavra, de Jesus Cristo quanto qualquer outro
ser humano. O que torna o presbítero alguém ímpar em sua
missão evangelizadora e educadora da fé e dos sonhos do povo
de Deus, na Igreja de Cristo, é seu processo contínuo de acolhida de Cristo em sua vida e o compromisso que resulta do
seu encontro com Cristo a cada novo dia. Para isso não basta
gostar de ser presbítero, mas amar e viver como presbítero,
comprometendo-se, a cada novo dia, com Jesus e sua Igreja,
propagando a fé, a esperança e a caridade.
A falta de fé e de sonhos de um presbítero dentro da Igreja
de Cristo não reflete a sua verdade, isto é, aquilo que ele é ou
Introdução
é chamado a ser de fato: um homem de fé e de sonhos, um
homem de Deus, pastor do seu povo. Muitos, ao serem ordenados presbíteros, mudam o exterior, colocam uma vestimenta
eclesiástica, mas o interior acaba ficando longe das pegadas
e sentimentos de Jesus Cristo (Fl 2,5), longe do espírito do
Concílio Vaticano II. Ser um presbítero de fé e de sonhos na
Igreja de Cristo, com o espírito do Concílio Vaticano II, implica
deixar que sua vida seja superordenada e transformada pelo
Evangelho de Cristo, alcançando o ideal de ser sacerdote, pastor
e profeta. Ser um presbítero implica abraçar a eclesiologia Povo
de Deus, buscando viver em comunhão com os bispos e com
todos os batizados, fazendo emergir o rosto de uma Igreja do
serviço, do diálogo e toda ministerial, e que favoreça a atuação
efetiva dos irmãos leigos e leigas.
A Igreja é a comunidade daqueles que têm fé. Na passagem de Mt 16,18, na qual Jesus diz a Pedro: “Eu te digo: tu és
Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas
do inferno não prevalecerão contra ela”, vemos que o que fez
Simão ser Pedro foi a sua profissão de fé. Foi sobre a fé em
Jesus proferida por Pedro que teve início a construção da Igreja.
Assim, a Igreja se constrói sobre a fé de Pedro e de todos os
seguidores de Cristo ao longo dos séculos. Sem fé em Cristo,
não há Igreja. A Igreja nasce onde as pessoas se reúnem em
torno da fé em Cristo e continuará existindo a partir da fé no
Cristo Ressuscitado, na força do Espírito Santo. Ela é o novo
Povo de Deus, conforme afirma o Vaticano II, povo formado
pelos homens e mulheres que, crendo, voltam seu olhar para
Jesus Cristo e sua mensagem.
A Carta aos Romanos (8,9) ensina: “Vós não viveis
segundo a carne, mas segundo o espírito, se realmente o Espírito de Deus mora em vós. Se alguém não tem o Espírito de
Cristo, não pertence a Cristo”. Ter o espírito de Cristo é ter
seus sentimentos (Fl 2,5). No espírito do Concílio Vaticano II,
somos convidados a nunca parar de sonhar com a implanta-
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ção do Reino de Deus entre nós. Para isso precisamos abraçar
os sentimentos que os santos padres desse Concílio tiveram:
sonhos de renovação da Igreja que pudesse melhor evangelizar
o mundo moderno.
A dinâmica de ser um presbítero de fé e de sonhos na
Igreja de Cristo, no espírito do Concílio Vaticano II, implica
uma constante conversão pastoral do presbítero. Ele deve
tomar consciência de que é o primeiro necessitado da fé e,
por isso, deve buscá-la incessantemente, e que deve sonhar
com a implantação do Reino de Deus aqui e agora, buscando
tornar o pedacinho do mundo no qual ele é chamado a atuar
um “cantinho do céu”.
Buscar ser um presbítero de fé e de sonhos na Igreja de
Cristo, no espírito do Concílio Vaticano II, significa estar com
o coração aberto para que seja gestada, por obra do Pai e pelo
poder do Espírito Santo, a cada novo dia, a imagem do Filho de
Deus, como um interminável processo evolutivo psicológico e
ao mesmo tempo espiritual em sua vida. Muitas vezes o presbítero quer estar atualizado nas últimas informações e tecnologias para poder melhor atuar pastoralmente, quer saber usar
as ferramentas mais avançadas na pastoral, quer ter a mídia de
última geração, quer estar em dia com a pastoral da juventude,
dos divorciados, dos homossexuais etc. Isso é necessário e obrigatório, pois faz parte de tornar-se uma pessoa atualizada, mas
não se pode de modo algum negligenciar plasmar no crente o
autêntico discipulado do Mestre Jesus, a identificação com a
sua causa, a paixão pela vontade do Senhor, algo que o Concílio Vaticano II traz de maneira muito forte e que Aparecida
cunhou na expressão “ser discípulo missionário”. É necessário
estar próximo da cultura do nosso tempo, estar atualizado, ser
sensível, mas tudo isso só tem valor se for feito com fé e paixão
por Cristo, caso contrário, poderá ser um bom profissional, mas
não um presbítero-pastor, um homem de Deus, alguém de fé
e de sonhos, no espírito do Concílio Vaticano II.
Introdução
Amar a Igreja de Cristo, como diz Bento XVI (27/02/2013),
“significa ter coragem de fazer opções difíceis”. Trazer essa
fala para pensar o presbítero, sobretudo no mundo atual,
no espírito do Concílio Vaticano II, implica o presbítero ter
a coragem de ir em direção oposta à própria vontade, para
abraçar a cruz e fazer a vontade de Deus, renunciando a toda
glória, poder e dominação, para melhor cumprir sua missão
presbiteral; para abraçar a cruz do dia a dia, doando sua vida
em favor de mais vida para todos, sobretudo dos mais pobres
e necessitados, buscando sua libertação e promoção humana;
para não deixar que as cruzes do ministério presbiteral roubem sua esperança, seus sonhos, sua fé; para ter a coragem de
enfrentar os grandes problemas, avanços e questionamentos
na atualidade. Significa também ter um coração aberto para
acolher as mudanças culturais, políticas, econômicas e sociais
de seu tempo, sem deixar de ser profeta. Mas isso somente vai
acontecer a partir de uma conversão profunda do presbítero,
purificação de sua fé e de seus sonhos.
Segundo a eclesiologia do Concílio Vaticano II, o presbítero deve ter, com transparência, a centralidade da Palavra de
Deus e um coração orante e celebrativo, considerando a Eucaristia como fonte e cume de toda a vida da Igreja (Sacrosanctum
Concilium, 10). Assim, evitando a tentação de ser presbítero
“mais ou menos”, ele deve buscar a cada novo dia, à luz da
eclesiologia do Concílio Vaticano II, viver profundamente
inserido no presbitério, sendo homem da Palavra de Deus, do
sacrifício eucarístico, da partilha e profunda intimidade com
Deus e união com seu povo.
Ser um presbítero de fé e de sonhos, na Igreja de Cristo, com o espírito do Concílio Vaticano II, implica fugir da
tentação de falar mal da Igreja de Cristo, de seus irmãos no
presbitério e de seus pastores. Tal atitude parece não condizer
com a conduta de presbítero algum. E ainda, às vezes, é fácil o
presbítero dizer que ama a Igreja de Cristo. Difícil é caminhar
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junto com o povo de Deus, dispondo-se a estar no meio de
pessoas de carne e osso, com seus dons e talentos, mas também
com seus dramas, imperfeições e contradições, sobretudo dos
menores e simples, educando a fé desse povo de Deus.
Segundo o papa Francisco (30/01/2014), “não se entende um cristão sem Igreja. O cristão não é um batizado que
recebe o Batismo e, depois, segue adiante pelo seu caminho.
O primeiro fruto do Batismo é fazer-se pertencente à Igreja,
ao povo de Deus. Não se entende um cristão sem Igreja. E,
por isso, o grande Paulo VI dizia que é uma dicotomia absurda amar Cristo sem amar a Igreja; escutar Deus, mas não a
Igreja; estar com Cristo à margem da Igreja. Não se pode. É
uma dicotomia absurda”. Sabemos que, antes da pessoa ser um
presbítero, ela é um cristão. É como cristão que ela abraçou
a missão presbiteral. Tal missão, além de viver a pertença à
Igreja, implica amá-la mesmo que ele fique, parafraseando o
papa Francisco, “acidentado, ferido e enlameado por ter saído
pelas estradas”, “por ter saído do comodismo e fechamento de
se agarrar às próprias seguranças” (EG 49). Além de estar na
Igreja e de amá-la, o presbítero, como cristão, deve buscar a
cada dia ser modelo de virtude para todo povo de Deus (1Tm
4,11-16), sendo testemunha de fé, esperança e amor em meio
a todas as adversidades de seu ministério presbiteral.
Ser presbítero de fé e sonhos na Igreja de Cristo, com
o espírito do Concílio Vaticano II, implica amar a Igreja e
caminhar com ela, fazendo parte dessa família. A Igreja é o
espaço ideal para o povo fazer a experiência comunitária da
fé, louvar, bendizer, alimentar-se do Pão da Palavra e do Pão
da Eucaristia, fazendo a experiência de amar e ser amado. Ela
é a casa do presbítero, a casa do cristão.
Sabemos que há muitos presbíteros que nunca leram
um documento do Concílio Vaticano II do começo ao fim,
nem sequer se deram ao prazer de estudar, rezar e aplicar o
Concílio em seu ministério presbiteral. O mesmo se pode dizer
Introdução
da grande maioria de nossos leigos cristãos. Este livro quer
ser um modo agradável de ler os documentos deste Concílio,
buscando traduzi-lo em vida e missão de ser Igreja de Jesus
Cristo na atualidade.
Assim, este livro quer ser uma boa companhia para o
presbítero e para os demais leitores e leitoras, proporcionando-lhes refletir sobre a fé e os sonhos do presbítero na Igreja de
Cristo, no espírito do Concílio Vaticano II, fortalecendo todos
no serviço ao povo de Deus. Ele tem, como fundamento e
inspiração, a Eclesiologia do Concílio Vaticano II e, como fio
condutor, a pedagogia de Jesus, descrita de modo especial na
perícope do Evangelho de Lucas 24,13-35. Nesta, vemos os
discípulos de Emaús desanimados, abandonando seus sonhos,
e o forasteiro, que escuta esses discípulos desacreditados de
seus sonhos, caminha com eles, leva-os ao discernimento, à
luz da Palavra de Deus e os alimenta com a Ceia. Através de tal
pedagogia, os discípulos retornaram para a comunidade. De
maneira bem resumida, podemos dizer que qualquer evangelizador, se quiser que as pessoas retornem para a comunidade,
deve primeiro começar a caminhar com elas, ouvindo-as e
redimensionando seus sonhos, numa nova ordem à luz da
Palavra de Deus, abrindo-lhes os olhos com a partilha da Ceia.
Essa é a pedagogia antiga e nova da evangelização, e acredito
que é o espírito da Eclesiologia do Concílio Vaticano II, que é
um processo capaz de levar a pessoa de volta para a comunidade, construindo ou reconstruindo sua fé e seus sonhos. É
tal inspiração e pedagogia que se pretendeu usar neste livro.
O conteúdo deste livro está dividido em quatro capítulos.
Um primeiro sobre os sonhos de ser Igreja de Jesus Cristo, no
espírito do Concílio Vaticano II; um segundo sobre o Concílio Vaticano II e as crises de fé e sonhos na era moderna;
um terceiro sobre o ser presbítero de fé e de sonhos na Igreja
de Cristo, no espírito do Concílio Vaticano II; e um quarto
capítulo sobre a fé e a Igreja dos sonhos, à luz do espírito do
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Nunca pare de sonhar
Concílio Vaticano II. Em tudo se procurou refletir sobre a
importância de ser um presbítero de fé e de sonhos no espírito
do Concílio Vaticano II.
Desejo-lhe boa leitura e novos sonhos para continuar
tecendo o tapete da vida, cheio de fé e sonhos na Igreja de Jesus
Cristo, segundo o espírito do Concílio Vaticano II.
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