Corvídeos: enorme variação de tipos - IB-USP

Propaganda
Mundo das Aves
Corvídeos: enorme variação de tipos
David Watkins / Dreamstime
Popularmente conhecidos
como Gralhas, Gaios ou
Corvos, os representantes
da família Corvidae estão
distribuídos por todo
o mundo. São aves que
chamam a atenção pela
notável inteligência e pela
capacidade de algumas
espécies de imitar
sons e até mesmo de
pronunciar palavras. No
Brasil, as poucas espécies
existentes dessa família
são conhecidas como
Gralhas
Por LUÍS FÁBIO SILVEIRA
T
ronco, pernas e bico robustos.
Olhar penetrante, de quem está
em constante investigação. Características como essas estão presentes
nos representantes da família dos Corvídeos (Corvidae), formada por corvos,
gralhas e gaios. Distribuídos por todo
o mundo, em hábitats com as mais
variadas formações vegetais, que vão
das montanhas geladas do Himalaia
aos desertos africanos, os Corvídeos
pertencem ao gênero Cyanocorax, que
quer dizer literalmente Corvo-Azul.
Destacam-se também pelo comportamento complexo nas interações entre
indivíduos e por estarem entre as aves
mais inteligentes, liderança que ocupam lado a lado com os papagaios.
Mais famoso
Talvez o Corvídeo internacionalmente
mais conhecido e comum seja o Corvo, personagem de muitas lendas e histórias. Por ser
de grande porte, provavelmente muita gente
nem imagina que pertença à ordem dos passeriformes. Mas os maiores e mais pesados
passeriformes conhecidos são Corvídeos,
com enorme variação de plumagens, tamanhos e formas de cauda. Espécies completamente negras de cauda curta contrastam com
outras de coloração brilhante, azul ou verde,
e cauda longuíssima, como algumas Gralhas
mexicanas e asiáticas (dos gêneros Calocita e
Urocissa, respectivamente).
50
Corvo-comum (Corvus corax): o corvídeo mais famoso e conhecido
Adaptabilidade
Parte do sucesso adaptativo dos Corvídeos tem origem na plasticidade alimentar (capacidade de se adaptar a diferentes alimentos), já que a maioria das espécies da família
é onívora, ou seja, come alimentos de origem
vegetal e de origem animal.
Boa parte dos Corvídeos é também pouco sensível a ambientes alterados. Há até
algumas espécies francamente dependentes
da presença humana, reproduzindo-se em
telhados e se alimentando em lixões, como
acontece com alguns Corvos e com a Pega
(Pica pica), uma das espécies de aves mais
populares da Europa.
No mundo
É provável que os Corvídeos tenham se
originado no Velho Mundo e que a colonização da América do Sul por essas aves seja
relativamente recente do ponto de vista geológico. Um indício disso é que, dos 56 gêneros e cerca de 300 espécies de Corvídeos
conhecidos no mundo, apenas dois gêneros
e 17 espécies estão na América do Sul, pouco
mais de 5% de toda a diversidade do grupo.
E, de todas essas espécies, apenas oito são
encontradas no Brasil.
CÃes & Cia • 407
Corvídeos brasileiros
mais alto das florestas, tem porte mais delgado,
olhos amarelos ou brancos e cauda relativamente mais longa com penas brancas. Participam
desse grupo a Gralha-de-Nuca-Azul (Cyanocorax heilprini), a Gralha-da-Guiana (Cyanocorax
cayanus), a Gralha-Picaça (Cyanocorax chrysops) e, finalmente,
a Gralha-Cancã (Cyanocorax
cyanopogon).
As espécies nacionais mais
conhecidas são as que habitam as áreas fora da Amazônia.
Dario Lins
Em nosso país, contamos com três espécies de Corvídeos na Bacia Amazônica, duas
na Mata Atlântica e mais uma em cada um dos
seguintes biomas: Cerrado, Pantanal e Caatinga. Parte delas tem conformação mais robusta,
olhos negros ou marrons e cauda relativamente
curta. É o caso da Gralha-Violácea (Cyanocorax
violaceus), da Gralha-do-Pantanal (Cyanocorax
cyanomelas), da Gralha-Azul (Cyanocorax caeruleus) e da Gralha-do-Campo (Cyanocorax
cristatellus). O outro grupo, que habita o estrato
Luiz Damasceno
Kun Chin Chung / IBC Lynxeds
Gralha-da-China (Urocissa): uma das espécies com cauda muito longa
A Gralha-Cancã, por exemplo, é uma das aves
mais populares da Caatinga e muito estimada
também como animal de estimação. Seu canto
típico, de cujo som vem o nome popular, é ouvido facilmente em qualquer área mais arborizada
do bioma, sempre em bandos que podem chegar a até 15 aves. No Pantanal, especialmente
na porção sul, a Gralha-do-Pantanal chega a
frequentar a beira de currais nas fazendas, em
bandos pequenos, porém ruidosos. Nos Cerrados, a única espécie encontrada é a estranha
Gralha-do-Campo, com topete “invertido” e
coloração única entre as Gralhas. A espécie é
representativa do caso clássico de ave que ampliou a distribuição geográfica graças ao elevado desmatamento da Mata Atlântica e da Amazônia. Muito tolerante às alterações ambientais,
a Gralha-do-Campo se torna cada vez mais comum, até mesmo nas proximidades de centros
urbanos, como São Paulo.
Por último, na Mata Atlântica ocorrem duas
espécies. Uma é a delgada Gralha-Picaça, que
se move agilmente entre os galhos de florestas,
nas mais variadas altitudes e em quase todo o
bioma, sempre em grupo e emitindo uma vocalização muito característica. A outra é a mais
emblemática de todas as Gralhas brasileiras: a
Gralha-Azul, a ave símbolo do Paraná, que ocorre desde o sul de São Paulo até o Rio Grande do
Sul. A espécie tem porte médio, é robusta, com
cauda curta e olhos negros. Pela forte ligação
com as Araucárias (Araucaria angustifolia), de
cujas sementes se alimenta, habita preferencialmente as matas que estão na área de distribuição dessa árvore. Mas, com o desmatamento,
as Araucárias e as Gralhas-Azuis já desapareceram de muitos locais.
Gralha-azul (Cyanocorax caeruleus): famosa por enterrar sementes de Araucária
Gralha-do-Campo (Cyanocorax cristatellus): está invadindo áreas
anteriormente ocupadas pela Mata Atlântica
Luís Fábio Silveira é doutor em Zoologia e curador das coleções ornitológicas Museu de Zoologia da USP; membro do Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO); pesquisador
associado da World Pheasant Association (UK); autor de doze livros sobre aves e de dezenas de artigos científicos publicados.
CÃes & Cia • 407
51
Download