Associação Brasileira de Ensino Odontológico Revista da Associação Brasileira de Ensino Odontológico - volume 6 - número 1 - janeiro/junho - 2006 ABENO ISSN 1679-5954 REVISTA DA REVISTA DA ABENO Associação Brasileira de Ensino Odontológico ABENO volume 6 número 1 janeiro/junho 2006 Associação Brasileira de Ensino Odontológico ABENO Associação Brasileira de Ensino Odontológico Copyright © Associação Brasileira de Ensino Odontológico, 2005 Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução no todo ou em parte, por qualquer meio, sem autorização da ABENO. Catalogação-na-publicação Serviço de Documentação Odontológica Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo Revista da ABENO/Associação Brasileira de Ensino Odontológico – vol. 1, n. 1, (2001). – São Paulo : ABENO, 2001Semestral ISSN# 1679-5954 A partir de 2005, vol. 5, n. 1 a publicação passa a ser semestral. 1. Odontologia – Periódicos I. Associação Brasileira de Ensino Superior (São Paulo) II. ABENO CDD 617.6 BLACK D05 ABENO Associação Brasileira de Ensino Odontológico Presidente Antonio Cesar Perri de Carvalho Universidade Católica de Brasília - Curso de Odontologia Nova Sede QS 07 Lote 01 - CEP 72030-170 Águas Claras - Brasília - DF Tel.: (61) 356-9611 E-mail: [email protected] Editor Científico José Luiz Lage-Marques Produção editorial Ricardo Borges Costa ImC - Image maker Comunicações Rua Alice Macuco Alves, 148, cj. 2 - CEP 05453-010 São Paulo - SP Tel.: (11) 3021-0163 Fax: (11) 3023-3165 Apoio para esta edição: Centro de Pesquisas Odontológicas São Leopoldo Mandic Editorial A Revista da ABENO é uma publicação oficial da Associação Brasileira de Ensino Odontológico Presidente de Honra: Edrízio Barbosa Pinto (PE) Presidente: Antonio Cesar Perri de Carvalho (DF) Vice-presidente: Eduardo Gomes Seabra (RN) Editor Científico: José Luiz Lage-Marques (FO-USP) ([email protected]) Editores Adjuntos: Cléo Nunes de Souza (UFSC) Luísa Isabel Taveira Rocha (UFG) Nelson Rubens Mendes Loretto (UPE) Vera Lúcia Silva Resende (UFMG) Conselho Editorial: Álvaro Della Bona (UPFundo) Antonio Carlos Bombana (FO-USP) Carlos de Paula Eduardo (FO-USP) Carlos Eduardo Francischone (FOB-USP) Carlos Estrela (FO-UFG) Célia Marisa Rizzatti Barbosa (UNICAMP) Cinthia Pereira M. Tabchoury (UNICAMP) Cláudio Luiz Sendyk (FO-USP) Denise Tostes Oliveira (FOB-USP) Eduardo Batista Franco (FOB-USP) Esther Goldenberg Birman (FO-USP) Eduardo Dias de Andrade (FOP-UNICAMP) Eduardo Saba Chujfi (UNICASTELO) Elaine Bauer Veeck (PUC-RS) Élito Araújo (UFSC) Euloir Passanezi (FOB-USP) Fernando Ricardo Xavier da Silveira (FO-USP) Francisco José de Souza Filho (FOP-UNICAMP) Izabel Cristina Froner (FORP-USP) Jaime Aparecido Cury (FOP-UNICAMP) Jesus Djalma Pécora (FORP-USP) João Humberto Antoniazzi (FO-USP) Jorge Abrão (FO-USP) José Eduardo de Oliveira Lima (FOB-USP) José Ranali (FOP-UNICAMP) Liliane Soares Yurgel (PUC-RS) Luiz Carlos Pardini (FORP-USP) Luiz Clovis Cardoso Vieira (UFSC) Manuel Damião de Sousa Neto (UNAERP) Márcia Martins Marques (FO-USP) Marcio Fernando de Moraes Grisi (FORP-USP) Marco Antonio Bottino (FOSJC-UNESP) Marco Antonio Campagnoni (FOAR) Maria Aparecida de A. M. Machado (FOB-USP) Maria Celeste Morita (UEL) Maria da Graça Kfouri Lopes (UNICENP) Maria José de Carvalho Rocha (UFSC) Maria Regina Sposto (FOA-UNESP) Neusa de Lima Moro (UFPar) Nilza Pereira da Costa (PUC-RS) Roberto Brandão Garcia (FOB-USP) Roberto Miranda Esberard (FOAR-UNESP) Rodney Garcia Rocha (FO-USP) Rosemary Sadami Arai Shinkai Simone Tetu Moysés (UFPar) Sylvio Monteiro Júnior (UFSC) Vania Ditzel Westphallen (PUC-PR) A Conquista da Revista N o ano de jubileu de ouro da ABENO, o volume 6 da Revista vem a lume consolidando a periodicidade semestral, com a conquista do conceito Qualis e prestes a ingressar no portal da Capes. Isso foi possível pela crescente produção de conhecimento sobre o ensino de Odontologia. Indubitavelmente, a ABENO é responsável pelos estímulos continuados ensejados por suas reuniões anuais e, nos últimos anos, pela presente publicação, que adota linha editorial voltada exclusivamente aos temas sobre ensino de Odontologia. Essas conquistas assinalam a maturidade do corpo docente na Odontologia Brasileira, com inequívoca demonstração do seu potencial para pensar, discutir e avaliar o ensino. Antonio Cesar Perri de Carvalho Presidente da ABENO Indexação A Revista da ABENO - Associação Brasileira de Ensino Odontológico está indexada na seguinte base de dados: BBO - Bibliografia Brasileira de Odontologia. Revista da ABENO • 6(1):3 Associação Brasileira de Ensino Odontológico DIRETORIA (2002 a 2006) Comissão de Ensino Antonio Cesar Perri de Carvalho (DF) Léo Kriger (UTP e PUC-PR) Cresus Vinícius Depes de Gouveia (UFF-RJ) Elaine Bauer Veeck (PUC-RS) Ellen Marise de Oliveira Oleto (UFMG-MG) Maria Celeste Morita (UNOPAR-PR) Miguel Carlos Madeira (UMESP-SP) Omar Zina (UNIVAG-MT) Vice-Presidente Comissão de Especialização Presidente de Honra Edrízio Barbosa Pinto (PE) Presidente Eduardo Gomes Seabra (RN) Secretária Geral Luciane de Moura Brito (DF) 1ª Secretária Ana Cristina Barreto Bezerra (DF) Sigmar de Mello Rode (UNIB-SP) Célio Percinoto (FOA-UNESP-SP) Hilda Maria Montes R. de Souza (UERJ-RJ) José Thadeu Pinheiro (UFPE-PE) Kátia Regina Hostilho Cervantes Dias (UFRJ-RJ) Luís Fernando Pegoraro (FOB-USP-SP) Comissão de Pós-Graduação Lílian Marly de Paula (DF) Isabela Almeida Pordeus (UFMG-MG) Adair Luiz Stefanello Busato (ULBRA-RS) José Carlos Pereira (FOB-USP-SP) Lino João da Costa (UFPB-PB) Nicolau Tortamano (UNIP-SP) Nilza Pereira da Costa (PUC-RS) Conselho Fiscal Comissão de Comunicação Tesoureiro Geral Sérgio de Freitas Pedrosa (DF) 1ª Tesoureira José Galba de Meneses Gomes (CE) Geza Nemeth (DF) José Aparecido Jam de Melo (SP) Nelson José Fernandes Graça (RJ) Reinaldo Brito e Dias (SP) Assessores do Presidente Alfredo Júlio Fernandes Neto (UFU-MG) Bruno Frederico Muniz (Fundação Odontológica Presidente Castello Branco-PE) Carlos Alberto Conrado (UEM-PR) José Dilson Vasconcelos de Menezes (UECE-CE) Orlando Airton de Toledo (UnB-DF) Roberto Schimer Wilhelm (UNESA-RJ) José Luiz Lage-Marques (USP-SP) - Editor da Revista da ABENO Vera Lúcia Silva Resende (UFMG-MG) - Responsável pela home page da ABENO Cléo Nunes de Souza (UFSC-SC) Daniel Rey de Carvalho (UCB-DF) Luísa Isabel Taveira Rocha (UFG-GO) Nelson Rubens Mendes Loretto (UPE-PE) Sumário v. 6, n. 1, janeiro/junho - 2006 Associação Brasileira de Ensino Odontológico Editorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 Artigos O papel das universidades na formação de profissionais na área de saúde Cléa Adas Saliba Garbin, Nemre Adas Saliba, Suzely Adas Saliba Moimaz, Karina Tonini dos Santos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente Daniela Sens Nunes, Fernando Fernandes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção Jurema Nogueira Mendes Rangel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná Christian Mendez Alcantara, Adriana Roseli Wünsch Takahashi. . . . . . . . . 28 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS Daniela dos Santos Cardoso, Evilin Sanches Morais, Ricardo de Oliveira Bozzo, Viviane Maia Barreto de Oliveira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde Arsenio S. Peres, José Roberto de M. Bastos, José Roberto de P. Lauris, Ricardo P. Rodrigues da Silva, Henrique Mendes Silva, César Lopes Junior. . . . . . . 42 Projeto “Odontologia Hospitalar” Guilhermo Manfio Doro, Lucas Meneghello Fialho, Maximiliano Losekann, Dênis Nestor Pfeiff. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia Rodrigo Otávio Moretti Pires, Sonia Maria Villela Bueno . . . . . . . . . . . . 54 Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para formação humanística, social e integrada Regina F. Mendes, Marcoeli S. de Moura, Raimundo R. Prado Jr., Lucia de Fatima A. de Deus Moura, Gilberto P. Lages, Maricel P. R. Gonçalves. . . . . . 61 Atividades extramuros como estratégia viável no processo ensino-aprendizagem Marlei A. S. Galassi, Eduardo Luis Barbin, Júlio César E. Spanó, José A. Jam de Melo, Nicolau Tortamano, Antonio Cesar Perri de Carvalho . . . . . . 66 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil Jacson Brustolin, Juliana Brustolin, Ramona F. C. Toassi, Mirian Kuhnen. . . . 70 Trabalho de Conclusão de Curso: construção ao longo do curso ou tarefa para finalizá-lo? Elisabete Rabaldo Bottan, Mario Uriarte Neto, Nivaldo Murilo Diegoli, Shirlei Imianowski, Henri Stuker. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil Renata P. C. B. Rodrigues, Nemre A. Saliba, Suzely A. S. Moimaz . . . . . . . . 81 Anais da 40ª reunião anual - 2005 Relatório da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia. . . . . . . 89 apêndice Normas para apresentação de originais . . . . . . . . . . . . . . . . 96 O papel das universidades na formação de profissionais na área de saúde A formação universitária deve ter como objeto principal a transformação social buscando sempre melhorar os índices de saúde do país. Cléa Adas Saliba Garbin*, Nemre Adas Saliba**, Suzely Adas Saliba Moimaz***, Karina Tonini dos Santos**** *Professora Adjunta da Disciplina de Odontologia Legal e Bioética do Departamento de Odontologia Infantil e Social da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. **Professora Titular da Disciplina de Odontologia Preventiva e Social do Departamento de Odontologia Infantil e Social da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. ***Professora Adjunta da Disciplina de Odontologia Preventiva e Social do Departamento de Odontologia Infantil e Social da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. ****Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Odontologia Preventiva e Social da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. E-mail: [email protected]. Resumo Apesar de terem ocorrido nítidas mudanças na educação superior, nos últimos anos, ainda há muito o que ser mudado. Este artigo tem como finalidade propor uma reflexão sobre o real papel da universidade na formação de profissionais na área de saúde, mais especificamente na odontologia. A função da universidade seria o de identificar corretamente os problemas de saúde de cada município ou região e dizer como pode resolvê-los, ou seja, o ensino e a pesquisa devem ser direcionados para ações de impactos sociais que possibilitem melhores condições de vida para a população. As propostas de mudanças devem deixar de existir somente na teoria e serem postas em prática, em que dirigentes, docentes e discentes estejam cientes de seus papéis dentro desse contexto. Descritores Educação em Odontologia. Ensino Superior. Currículo. D e acordo com Pinto12 (2000), na teoria, um curso universitário, em especial uma escola de ciên- cias médicas, existe para: captar os conhecimentos empíricos da população; analisá-los, identificando o que é correto e lhes conferir conteúdo científico; reunir esse material com as técnicas e os princípios já estudados externamente, formando um novo e mais evoluído conhecimento; devolver a cultura a toda a população, fazendo com que seus problemas se resolvam melhor e mais rápido. Contudo, não é isso que tem acontecido, principalmente em países extremamente capitalistas, em que os profissionais monopolizam o saber e somente prestam seus serviços para quem possa remunerá-los. No Brasil, a maioria das universidades eram, e muitas delas ainda são, alheias às reais necessidades da população e reproduzem em salas de aula, laboratórios e ambulatórios realidades distantes das quais o país se encontra. Este artigo, portanto, tem por finalidade propor uma reflexão sobre o real papel da universidade na formação de profissionais na área de saúde, mais especificamente na odontologia. Revista da ABENO • 6(1):6-10 O papel das universidades na formação de profissionais na área de saúde • Garbin CAS, Saliba NA, Moimaz SAS, Santos KT Revisão de literatura O ensino superior no Brasil possui uma história relativamente recente, em comparação com o da América Espanhola, onde as primeiras universidades foram fundadas por volta do ano de 1530. A primeira universidade brasileira somente foi fundada quase quatrocentos anos depois, sendo que os primeiros cursos médicos foram estabelecidos em 1808, nas cidades do Rio de Janeiro e da Bahia. Nessa época, os cursos de farmácia e enfermagem estavam anexados às escolas médicas e o ensino da odontologia teve início no ano de 1884, nessas mesmas universidades, por decreto do Imperador9. Pouco tempo depois, a formação profissional de recursos humanos na área de saúde sofreu uma profunda influência com a descoberta da transmissibilidade da doença, através dos microorganismos, o que norteou, por décadas, o ensino nas escolas médicas. Essa concepção de medicina científica sempre buscou privilegiar os laboratórios e os hospitais como cenário de aprendizagem, a “fragmentação” do indivíduo de acordo com a doença acometida, as técnicas, os equipamentos, os medicamentos e o ensino autoritário centrado na figura do professor como possuidor do saber6. Na Odontologia não aconteceu diferente: o modelo de formação sempre foi voltado para a prática liberal, em que o preconizado era, e ainda é, a necessidade de aperfeiçoamento e especialização em áreas exclusivamente técnicas17. O enfoque do ensino sempre privilegiou o tratamento das doenças com base no arsenal tecnológico mais recente. O currículo dos cursos de Odontologia sempre privilegiou o paradigma curativo, sendo essa a filosofia norteadora das universidades, cujo ensino não se orienta pela situação epidemiológica, social, cultural e econômica da população18. Um estudo realizado por Almeida, Padilha3 (2001) veio confirmar esses dados ao concluir que a ação odontológica desenvolvida pela clínica integrada da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) não foi capaz de produzir impacto sobre a saúde bucal dos usuários. As profissões de saúde devem ser medidas primeiro pelo nível de saúde da população que depende de seus serviços e não pela complexidade da preparação científica e tecnológica dos seus profissionais12. Assim, o que se observou no ensino superior das profissões de saúde, ao longo dos anos, foi uma profunda dissociação entre sua dinâmica e as necessidades da maioria da população, um verdadeiro divórcio entre o que se ensina e o que a comunidade necessita16. Buscando-se articular os dois contextos aparentemente desconectados – universidade e serviços –, foram surgindo ao longo do tempo iniciativas de reforma comprometidas com a relevância social da escola e dos processos de formação no campo da saúde. Na década de 50, foram criados os departamentos de medicina preventiva nas escolas, com perspectiva de aliar saúde pública com medicina liberal2. Dois outros movimentos importantes na mudança da educação na área da saúde, nas décadas de 70 e 80, foram a medicina comunitária e integração docenteassistencial (IDA). A medicina comunitária retornou com os princípios da medicina simplificada e tinha como principal aliado a participação comunitária e voluntariada na prestação de serviços15. Foi nesse contexto que surgiu a idéia da Odon­ tologia Simplificada, que buscou a diminuição dos passos odontológicos e a eliminação do supérfluo. Contudo, esse modelo não questionou a prática hegemônica da odontologia científica, e foi tido como uma odontologia destinada a classes sociais marginalizadas4. O objetivo da integração docente-assistencial era o de quebrar a resistência dos estudantes à abordagem epidemiológica e social mediante sua exposição precoce e oportuna à realidade sanitária: atividades de extensão, como visitas em áreas economicamente deprimidas, atuação em centros de saúde experimentais, geralmente localizados em áreas periféricas ou rurais, vinculados às instituições acadêmicas1. Movimentos como esses tiveram muito a ver com os sucessivos movimentos internacionais: Relatório Lalonde, Reunião de Alma Ata, a proposta de saúde para todos, o movimento de Promoção de Saúde. O próprio Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil, resultou, em boa medida, da acumulação política e técnica propiciada pelas experiências da medicina comunitária e IDA. Em 1996, o Ministério da Educação4 estabeleceu as orientações para diretrizes curriculares propostas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e propôs que o currículo das universidades deveria abranger objetivos, seleção de conteúdos, métodos e processos de avaliação coerentes com aspectos filosóficos, científicos, tecnológicos, sociológicos e políticos nos quais se processa a informação. As alternativas de inovação do ensino com base nessa legislação devem incluir a organização institu- Revista da ABENO • 6(1):6-10 O papel das universidades na formação de profissionais na área de saúde • Garbin CAS, Saliba NA, Moimaz SAS, Santos KT cional, a autonomia acadêmica, o compromisso social do ensino e a flexibilidade curricular. A autonomia acadêmica deve levar em conta o reconhecimento das obrigações da universidade com a sociedade e formar profissionais comprometidos com a relevância, a qualidade, o custo-efetividade e a eqüidade da atenção à saúde. Para a área odontológica, as novas diretrizes curriculares aprovadas pela Resolução CNE/CES 3/2002 de 19/02/2002 propõem que: “Curso de Graduação em Odontologia tem como perfil do formando egresso/profissional o Cirurgião-Dentista, com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, para atuar em todos os níveis de atenção à saúde, com base no rigor técnico e científico. Capacitado ao exercício de atividades referentes à saúde bucal da população, pautado em princípios éticos, legais e na compreensão da realidade social, cultural e econômica do seu meio, dirigindo sua atuação para a transformação da realidade em benefício da sociedade”5. Portanto, para formar profissionais com esse perfil, o papel do professor ocupa lugar de destaque13. O Art. 9º dessa resolução propõe que o “Curso de Graduação em Odontologia deve ter um projeto pedagógico, construído coletivamente, centrado no aluno como sujeito da aprendizagem e apoiado no professor como facilitador e mediador do processo ensino-aprendizagem. Este projeto pedagógico deverá buscar a formação integral e adequada do estudante através de uma articulação entre o ensino, a pesquisa e a extensão/assistência”. De acordo com Carvalho7 (2004), o projeto pedagógico constitui-se de uma proposta conjunta de trabalho que visa o engajamento dos segmentos docente, discente e administrativo, a eficiência do processo e a qualidade da formação plena do aluno em termos científico-culturais, profissionais e de cidadania. É preocupação também das Diretrizes Curriculares a questão da metodologia de ensino-aprendizagem, que deve sempre propiciar aos alunos uma ativa participação nesse processo4. Uma das metodologias que contempla essas características é o método PBL – Aprendizado Baseado em Problemas (“Problem-Based Learning” – PBL) – o qual destaca o uso de um contexto clínico para o aprendizado, promove o desenvolvimento da habilidade de trabalhar em grupo e também estimula o estudo individual, de acordo com os interesses e o ritmo de cada estudante. O aprendizado passa a ser centrado no aluno, que sai do papel de receptor passivo para o de agente e principal responsável pelo seu aprendizado. Os professores que atuam como tutores (ou facilitadores) nos grupos têm a oportunidade de conhecer bem os estudantes e de manter contato com eles durante todo o curso8. Para que todas essas mudanças propostas pelas diretrizes curriculares tornem-se realidade nos cursos da área de saúde no país, mudanças nos currículos e, conseqüentemente, nos projetos pedagógicos devem ser viabilizadas para que as instituições de ensino superior cumpram o seu papel na formação de um profissional para a atualidade14. Discussão É nítida a mudança que vem ocorrendo no ensino superior no Brasil, onde a rigidez dos currículos mínimos deixou de existir, dando espaço aos currículos flexíveis, ajustados à realidade15. A promulgação das novas diretrizes para o curso de Odontologia foi, sem dúvida, um avanço inquestionável, e veio ao encontro dos anseios de professores, alunos e dirigentes, pois a última reforma curricular no curso de Odontologia aconteceu em 1982 e estabeleceu as propostas do currículo mínimo para o curso10. Hoje é consensual que a mudança deva incluir a interdisciplinaridade, a mudança de cenários nos quais se realizam as ações educativas para locais mais representativos da realidade sanitária e social, a integração ensino-serviço-pesquisa, a abordagem problematizadora, o compromisso ético, humanístico e social com o trabalho multiprofissional6. A dimensão epidemiológica e social do processo de viver e adoecer, bem como as perspectivas de prevenção de risco e da promoção de saúde, devem deixar de ser objeto quase que exclusivamente dos departamentos de medicina e odontologia preventiva e social e integrar todas as disciplinas. O que é preocupante, todavia, é ver que os profissionais disponíveis são ainda preparados dentro de uma concepção que privilegia a abordagem individual e curativa e são, portanto, incapazes de transcender o espaço do consultório e propor um diagnóstico sobre o coletivo e suas intervenções, em uma abordagem integralizadora, sendo que o “ensino odontológico flexneriano” é ainda praticado na grande maioria dos cursos de graduação do país. Segundo Narvai11 (2004) em entrevista ao Jornal da Federação Interestadual dos Odontologistas (FIO) em maio de 2004, a formação em Odontologia ainda deixa muito a desejar em se tratando da saúde bucal coletiva, uma vez que a abordagem preventiva ainda Revista da ABENO • 6(1):6-10 O papel das universidades na formação de profissionais na área de saúde • Garbin CAS, Saliba NA, Moimaz SAS, Santos KT é restrita à dimensão biológica e clínica da prevenção e os currículos ainda continuam fragmentados, com funcionamento isolado das disciplinas. Uma das principais críticas aos modelos tradicionais de ensino se deve à expansão e consolidação do SUS, mais especificamente o Programa de Saúde da Família, pois é um programa de extrema importância na área de saúde bucal, e por isso as instituições de ensino superior devem reformular seus currículos, para formar profissionais com perfil adequado para trabalhar na área, cuja prática deve pautar-se pela realidade econômica e social do país14. A formação do cirurgião-dentista deve contemplar o sistema de saúde vigente no Brasil, o trabalho em equipe e a ação integral em saúde. O número de egressos dos cursos de odontologia não é pequeno, pelo contrário, por isso a Universidade deve ter como meta principal a melhoria dos índices em saúde. Outro ponto a se discutir seria a formação dos docentes, peças fundamentais para o ensino. Muitos cursos de pós-graduação – mestrado e doutorado – privilegiam a formação centrada nas técnicas e especialização, colaborando com a perpetuação desse paradigma nas instituições de ensino superior. Mais do que nunca, é preciso estar atento ao fato de que grande parte dos conhecimentos e das técnicas recomendáveis hoje estará em desuso dentro de algum tempo e que, portanto, mais importante que transmitir conhecimento é criar hábitos e métodos que valorizem o auto-aprendizado, a abordagem crítica dos conhecimentos e a permanente inquietação. O real papel da universidade seria o de identificar corretamente os problemas de saúde de cada município ou região e dizer como pode resolvê-los, ou seja, o ensino e a pesquisa devem ser direcionados para ações de impactos sociais que possibilitem melhores condições de vida para a população. Assim os egressos estarão preparados para o mercado de trabalho e ao mesmo tempo cientes do seu compromisso de devolver à sociedade tudo que lhes foi ensinado. Conclusão Já está mais que na hora de os projetos pedagógicos e as reformulações das diretrizes curriculares saírem da teoria e do papel para mudarem a realidade do ensino e conseqüentemente do País. Abstract The role of universities in the training of health professionals Although clear changes have taken place in higher education in recent years, there is still much to change. This study aimed to propose a reflection about the role of the university in the training of health professionals, particularly in the training of dentists. The university’s objective should be to identify the health problems faced by each city or region and provide ways of solving them. In other words, teaching and research activities should be directed to actions of social impact that may improve the living standards of the population. Change proposals should cease to exist only in theory and should be put into practice, so as to make leaders, teachers and students fully aware of their roles in this context. Descriptors Education, dental. Education, higher. Curriculum. § Referências Bibliográficas 1. Almeida ECS, Vendúscolo DM, Mestriner Jr WA. A conformação da Odontologia enquanto profissão – uma revisão bibliográfica. Rev Bras Odontol 2002;59(6):370-3. 2. Almeida M, Feuerwerker L, Llanos M. A educação dos profissionais de saúde na América Latina: teoria e prática de um movimento de mudança. Interface - Comunic, Saúde, Educ [periódico on-line] 2000 [citado 2005 abril 04];7:139-42. Disponível em: URL: http://www.interface.org.br/revista7/livro1.pdf. 3. Almeida RVD, Padilha WWN. Clínica Integrada: É Possível Promover Saúde Bucal numa Clínica de Ensino Odontológico? Pesq Bras Odontoped Clin Integr 2001;1(3):23-30. 4. Brasil. Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 23 dez 1996 [citado 2005 ago 10]. Disponível em: URL: http://www.mec.gov.br/legis/ default.shtmpdf/LDB.pdf. 5. Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CES 3/2002. Diário Oficial da União, Brasília, 04 mar 2002 [citado 2005 ago 10]. Dispo­nível em: URL: http://www.mec.gov.br/sesu/ftp/resolucao/03020 odontologia.doc. 6. Campos FE, Belisário AS. O programa da Saúde da Família e os desafios para a formação profissional e a educação continuada. Interface - Comunic, Saúde, Educ [periódico online] 2001 [citado 2005 abr 19];9:133-42. Disponível em: URL: http://www. interface.org.br/revista9/debates1.pdf. 7. Carvalho ACP. Planejamento do curso de graduação de odontologia. Revista da ABENO 2004;4(1):7-13. 8. Chiaratto ARA. A utilização da metodologia PBL na odontolo- Revista da ABENO • 6(1):6-10 O papel das universidades na formação de profissionais na área de saúde • Garbin CAS, Saliba NA, Moimaz SAS, Santos KT gia: descortinando novas possibilidades ao processo ensino aprendizagem [Tese de Doutorado]. Araçatuba: Faculdade de Odontologia de Araçatuba da UNESP; 2002. ção de Mestrado]. Araçatuba: Faculdade de Odontologia de Araçatuba da UNESP; 2005. 15. Santana JP, Campos FE, Sena RR. Formação profissional em 9. Fernandes Neto AJA. A evolução dos cursos de odontologia no Brasil. Revista da ABENO 2002;2(1):55-6. saúde: desafios para a universidade. Texto de apoio elaborado especialmente para o curso de especialização em Desenvolvi- 10. Lemos CLS. A implantação das diretrizes curriculares dos cur- mento de Recursos Humanos de Saúde – CADRHU 1999 [ci- sos de graduação em odontologia no Brasil: algumas reflexões. tado 2005 abril 04]. Disponível em: URL: http://www.opas.org. Revista da ABENO 2005;5(1):80-5. br/rh/publicacoes/textos_apoio/ACF2114.pdf. 11. Narvai PC. A formação em Odontologia, no Brasil, não está adequada às necessidades da população. Órgão oficial de informação da Federação Interestadual dos Odontologistas; abril/maio 2004. 16. Tortamano N. O papel da Universidade. Rev ABO Nac 1994; 2(4):219. 17. Volschan BCG, Soares EL, Corvino M. Perfil do profissional de Saúde da Família. Rev Bras Odontol 2002;59(5):314-6. 12. Pinto VG. Saúde bucal coletiva. 4ª ed. São Paulo: Santos; 2000. 18. Weyne SCAA. Construção do paradigma de promoção de saúde – um desafio para as novas gerações. In: Kriger L, coorde- 13. Pizzato E, Garbin CAS, Garbin AJI, Saliba NA. O papel do professor no ensino odontológico. Rev Saúde em Debate nador. Promoção de Saúde Bucal – ABOPREV. 3ª ed. São Paulo: Artes Médicas; 2003. p. 1-26. 2004;28(66):52-7. 14. Rodrigues RPCB. Análise da área da saúde coletiva nas estrutu- Aceito para publicação em 10/2005 ras curriculares dos cursos de odontologia do Brasil [Disserta- Visite o site da ABENO e submeta seu artigo “on-line”. É mais rápido e fácil. www.abeno.org.br 10 Revista da ABENO • 6(1):6-10 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente A informação em linguagem compreensível ao paciente e a consideração à sua autonomia expressam o comprometimento docente para com os referenciais deontológicos e constituem instrumentos de defesa de profissionais e instituições. Daniela Sens Nunes*, Fernando Fernandes** *Acadêmica do Curso de Odontologia da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Bolsista PIBIC. **Professor Assistente do Departamento de Odontologia da Universidade Estadual de Ponta Grossa. E-mail: [email protected]. RESUMO Um problema fundamental na relação profissional-paciente é a tomada de decisão, principalmente no que se refere aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos a serem adotados. O consentimento do paciente, antes do início de qualquer procedimento, é uma condição a ser respeitada. Observando-se o Princípio da Autonomia, toda pessoa tem o direito de decidir o que deseja ou não para si própria. A ausência do termo de consentimento pode significar um desrespeito a esse direito básico. Analisar o conhecimento, a conscientização e a atitude do docente em relação ao emprego do termo de consentimento informado e à autonomia do paciente nas disciplinas clínicas do Curso de Graduação em Odontologia fazse imperioso. Para tal desiderato, um questionário com 12 questões fechadas, do tipo “sim” ou “não”, foi entregue a cada um dos 42 docentes do curso; 24 responderam. A análise percentual das respostas obtidas demonstrou que 95,8% sabem o que é termo de consentimento informado e têm conhecimento da importância de sua utilização. Diante da indagação “Saberia elaborar um termo de consentimento informado?”, 58,3% responderam sim. Apurou-se ainda que 67% dos sujeitos da amostra têm consciência das implicações ético-legais da não-utilização do consentimento informado. No entanto, apenas 25% responderam conhecer o Princípio da Autonomia, e tão-somente a metade desses (12,5%) colocava em prática tal princípio. O docente do curso demonstra conhecimento e conscientização no que respeita ao termo de consentimento informado, embora sua atitude o comprometa ao demonstrar que não coloca em prática o Princípio da Autonomia. DESCRITORES Autonomia pessoal. Bioética. Consentimento esclarecido. Ética odontológica. Responsabilidade legal. M uitos são os pacientes que procuram as clínicas do Curso de Odontologia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), com diferentes tipos de alterações bucais. Os docentes do Curso de Odontologia da UEPG, ao receberem esses pacientes, teriam conhecimento, conscientização e atitude própria no que tange ao emprego do consentimento informado e à autonomia do paciente nas disciplinas clínicas do curso de graduação? O cirurgião-dentista professor universitário, ao abdicar o uso do consentimento informado num tratamento odontológico, estaria tolhendo a autonomia Revista da ABENO • 6(1):11-9 11 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F do paciente. Destarte, estaria desrespeitando o ser humano. Ora, pois: como, quando e onde estaria configurada a aliança terapêutica indispensável ao bom desenvolvimento do tratamento proposto, nas suas diversas modalidades? Ademais, como espelho acadêmico, não seria esse o momento de se demonstrar ao discente que aquele mestre embasa sua proposta de terapêutica clínica expondo, argumentando e, antes de tudo, educando um paciente carente que procura as clínicas da Instituição. Estaria esse mesmo mestre cônscio das implicações ético-legais da não-utilização do consentimento informado? Na área odontológica houve um extraordinário avanço técnico-científico nos últimos anos que, infelizmente, não foi acompanhado por um fundamental embasamento ético suficiente para sustentar as novas técnicas e/ou o uso de novos materiais incorporados ao exercício profissional. Ademais, dúvidas que fossem apresentadas pelos pacientes eram consideradas subjetivas quando comparadas ao benefício e à verdade objetiva, ou seja, o conhecimento científico a ele proporcionado pelo médico, o único que dominava técnica e legalmente os conhecimentos sobre as doenças. Com a Odontologia, que surgiu formalmente apenas em 1841, as coisas aconteceram da mesma maneira9. Dessa forma, surgiram questões a respeito da autonomia do paciente que, até então, eram praticamente desconsideradas. A cidadania não é prerrogativa do indivíduo saudável. No dia-a-dia avulta o reconhecimento de que numa instituição de saúde o paciente não tem mais o papel de mero coadjuvante, o que significa a sua emancipação. A relação entre o profissional de saúde e o usuário está sendo repensada, pois o doente, com a matiz de usuário dos serviços de saúde, insurgiu-se não só contra os erros profissionais, aqueles afetos à técnica (erro de diagnóstico e erro terapêutico), mas também contra o descumprimento dos deveres de humanidade, tais como: o desrespeito à autonomia, à privacidade, ao sigilo, a ausência de prontuário e registros sobre sua assistência, a falta de informação clara e acessível e até a letra indecifrável15. Farah, Ferraro7 (2000) comentaram que o consentimento do paciente, antes do início de qualquer procedimento realizado pelo cirurgião-dentista, é uma condição a ser respeitada, observando-se o princípio da autonomia, pelo qual todos têm o direito de ser autor de seu próprio destino e decidir o que deseja ou não em sua vida. Dessa forma, portanto, a autonomia indica a capa12 cidade de autodeterminação, condição indispensável para a verdadeira vida moral18. O ser humano não nasce autônomo, torna-se autônomo, e para isto contribuem variáveis estruturais biológicas, psíquicas e socioculturais. Uma pessoa autônoma pode agir não-autonomamente em determinadas circunstâncias. Por isso, a avaliação de sua livre manifestação decisória é uma das mais complexas questões éticas impostas aos profissionais de saúde16. Um problema fundamental na relação médicopaciente é o da tomada de decisão, principalmente no que se refere aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos a serem adotados. O dilema que geralmente se impõe nas várias situações é: a decisão deve ser do médico, preparado para a arte de curar e aquele que sabe mais, ou do paciente, porque é o dono do seu próprio destino e, portanto, deve decidir o que quer para si? O profissional da área de saúde, diante de uma pessoa autônoma, deverá evitar decidir, fundamentado em seus próprios valores, o que é bom para ela, o que deverá ser seu bem-estar, sua qualidade de vida. É preciso não esquecer que, muitas vezes, médicos e pacientes provêm de classes sociais distintas, com distintos valores socioculturais, valores esses que podem entrar em choque nas relações estabelecidas entre as duas partes16. Em bioética, a relação médico-paciente pode reduzir-se a três tipos de agentes: o médico, o paciente e a sociedade. Cada um com um significado moral específico: o médico com o da beneficência, o paciente guiado pelo princípio da autonomia e a sociedade, pelo da justiça16. A noção do consentimento na atividade médica é fruto de posições filosóficas relativas à autonomia do ser humano quando de decisões tomadas em tribunais. Segundo o princípio de autonomia, a pessoa autônoma tem o direito de consentir ou recusar propostas de caráter preventivo, diagnóstico ou terapêutico que afetem ou venham a afetar sua integridade físico-psíquica ou social. A respeito disso, Junges13 (2000) afirma que ser autônomo significa ter uma vontade autolegisladora. Agente autônomo é autodirigido, não agindo por influência de mandatos externos. Ser autônomo e escolher autonomamente não são a mesma coisa do que ser respeitado como agente autônomo. Ser respeitado significa ter reconhecido seu direito de autogoverno; é afirmar que o sujeito está autorizado a se determinar autonomamente, livre de limitações e interferências. O princípio da autonomia expressa esse respeito defendendo que ações au- Revista da ABENO • 6(1):11-9 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F tônomas e escolhas não devem ser constringidas pelas de outros, mesmo que estas fossem objetivamente para o bem do sujeito. O princípio diz, nada mais nada menos, que existe o direito de o sujeito não sofrer interferência e, correlativamente, a obrigação de não se constringir uma ação autônoma. O princípio da autonomia tem a sua expressão no assim chamado “consentimento informado”. O direito ao consentimento informado quer proteger e promover a autonomia. O princípio da autonomia é uma das características importantes do consentimento informado. O ato de consentir deve ser genuinamente voluntário e basear-se na revelação adequada das informações13. Estamos num momento histórico de mudança na “cultura ética”, diferente, porém, do que ocorreu no final do século XX, quando as sociedades foram invadidas por um modismo ético. Hoje, a ética é preocupação de todos os setores; entretanto, a preocupação é ainda maior quando falamos dos usos e abusos da ética. Daí a importância da existência de leis e resoluções que oficializem essa preocupação e orientem a aplicação da ética17, a exemplo da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde6. A Carta Magna Brasileira reavivou os direitos fundamentais do homem. Também se resgataram os direitos de personalidade, aqueles relacionados ao respeito e à preservação moral da pessoa humana: direito à honra, ao nome, à imagem, ao sigilo, à liberdade de consciência e culto. Assegurou o direito à autonomia a todos os cidadãos ao incluir a determinação de que ninguém pode ser obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei2. Já o Código Penal Brasileiro exige o respeito a esse direito ao punir, em seu artigo 146, aquele que constranger outrem a fazer o que a lei não manda ou a deixar de fazer o que a lei manda1. Vislumbram-se no Brasil, desde a década de 80, códigos de ética profissional que vêm tentando estabelecer uma relação dos profissionais com seus pacientes, na qual o princípio da autonomia tenda a ser ampliado. Crescem, portanto, a discussão e a elaboração de normas deontológicas sobre as questões que envolvem as relações da assistência à saúde contendo os direitos fundamentais que devem reger a vida do ser humano16. Tal compreensão é encontrada no sétimo artigo do Código de Ética Odontológica, que veda ao cirurgião-dentista “iniciar qualquer procedimento ou tratamento odontológico sem o consentimento prévio do paciente ou do seu responsável legal, exceto em casos de urgência ou emergência”5. O consentimento informado tem sido um dos te- mas mais debatidos na Bioética. Mas essa questão também vem sendo, muitas vezes, restringida simplesmente ao seu lado legal, tornando o que poderia ser observado em diferentes aspectos em algo limitado a acatamento de regras. Segundo Clotet4 (2000), o consentimento informado vai além de uma doutrina legal, sendo um direito moral dos pacientes que faz surgir, assim, uma série de obrigações morais por parte dos profissionais envolvidos na assistência e na pesquisa. O consentimento é realmente esclarecido dependendo do que o profissional de saúde explica ao paciente. Depende também de se a pessoa entendeu a situação e do seu grau de vulnerabilidade à circunstância17. Segundo a Sociedade Catarinense de Direitos Humanos, o paciente tem o direito a consentir ou recusar procedimentos, diagnósticos ou terapêuticas a serem realizados. Deve consentir de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação. Quando ocorrerem alterações significantes do estado de saúde inicial ou da causa pelo qual o consentimento foi dado, esse deverá ser renovado19. Para abordar de forma abrangente o processo de consentimento informado, este deve ser dividido em três etapas: as condições prévias da pessoa que irá consentir, os elementos de informação e o consentimento propriamente dito. A pessoa que será submetida a um procedimento assistencial ou de pesquisa deverá consentir de acordo com duas condições prévias: a capacidade para entender e decidir, que não tem uma dependência direta com a idade, e a voluntariedade. Esta última é a possibilidade que a pessoa tem de tomar decisões sem ser constrangida ou até mesmo coagida para que decida por uma das alternativas10. O consentimento deve ser dado livremente e não mediante práticas de coação física, psíquica ou moral, ou através de simulação ou práticas enganosas. Deve ser livre de restrições internas, causadas por distúrbios psicológicos, e livre de coações externas, por pressão de familiares, amigos e dos profissionais de saúde. A persuasão é aceita, porém não são admitidas a coação ou a manipulação de dados ou fatos. Todavia, essa persuasão deve ser feita como uma tentativa de induzir a decisão de outra pessoa através de apelos à razão, o que é aceito eticamente16. Além disso, o consentimento não é algo imutável, mas pode ser mudado ou revogado a qualquer momento por decisão livre e esclarecida da pessoa assistida, sem que esta sofra objeções e sanções morais ou administrativas7. O sujeito tem que ser informado e esclarecido sobre o que vai ser feito com ele, quais os riscos que Revista da ABENO • 6(1):11-9 13 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F podem ocorrer e quais os benefícios que podem advir. Além disso, a pessoa tem todo direito de se recusar a aceitar o que lhe está sendo proposto, sem que isso resulte em nenhuma sanção, em nenhuma limitação de sua liberdade de decisão11. O consentimento esclarecido precisa conter informações adequadas e que possam ser compreendidas pelo paciente. Dessa forma o paciente não fica apenas informado, mas também é esclarecido através de informações que estejam adaptadas às suas circunstâncias culturais e psicológicas. Não é necessário que os profissionais de saúde apresentem as informações utilizando linguajar técnico-científico, mas sim palavras mais simples, aproximativas, inteligíveis e respeitosas, e de forma organizada16. A forma com que a informação é fornecida poderá influenciar o entendimento por parte do paciente. Para que ocorra esse entendimento, os profissionais de saúde deverão utilizar terminologia adequada, encorajar questionamentos e se certificar de que os seus pacientes estão realmente entendendo as informações14. O consentimento livre e esclarecido às vezes não traz informações suficientes para a decisão consciente do sujeito da pesquisa. Em outras situações, apresenta uma linguagem complexa demais, pouco acessível, não levando em conta o nível de conhecimento do paciente. Há ainda os consentimentos que parecem induzir à participação. Uma das soluções para evitar textos muito complexos, longos e frios, resultantes de traduções que não se adequam à realidade brasileira, é, além de uma linguagem mais esclarecedora, a capacitação de pesquisadores para informarem adequadamente, possibilitando assim um maior diálogo com a sociedade12. O consentimento propriamente dito ocorre quando o participante ou paciente toma a decisão por uma das alternativas apresentadas. A assinatura do termo de consentimento é a última etapa do processo, quando a pessoa documenta a sua autorização para a realização dos procedimentos propostos10. Em todas as situações, salvo as emergenciais, o consentimento informado é inerente ao próprio ato de assistir10. Se ocorrer risco iminente de morte, a própria lei desobriga a obtenção do consentimento até que o paciente não mais se encontre em tal situação de risco7. A obtenção do consentimento nas situações de atendimento de emergência nem sempre é possível e, algumas vezes, é até danosa ao próprio paciente, pois pode acarretar perda de tempo na realização de procedimentos necessários à preservação da sua vida. Após o atendimento emergencial o médico assistente 14 deverá informar e justificar ao paciente, à sua família ou a outros terceiros que sejam responsáveis por ele todas as ações e os procedimentos que a equipe realizou durante a vigência dessa situação10. Polemiza Sousa20 (2004) ao inferir que as informações podem legalmente ser sonegadas, de acordo com o Código de Ética Médica, quando: “a) a informação possa prejudicar o paciente, ou, de forma mais grave: b) o paciente corre risco de vida”. Finaliza o autor que, ainda de acordo com o Código de Ética Médica, Artigo 46, é vedado ao médico “efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo em iminente perigo de vida”20. Para tais circunstâncias, do novo Código Civil Brasileiro se extrai: “Artigo 188 – Não constituem atos ilícitos: [...] II - a deteriorização da coisa alheia, ou a lesão da pessoa, a fim de remover perigo iminente. § único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo”3. O valor da vida humana, nesses casos, se sobrepõe à necessidade de um consentimento e do esclarecimento do paciente, de acordo com a compreensão jurídica prevalente e com as normas de ética profissional da área de saúde. Outro importante aspecto a ser incluído no processo de obtenção do consentimento informado é a privacidade do paciente, já que ela garante que os dados, sejam de assistência ou de pesquisa, não serão identificados ou revelados a quem não os necessita saber8. “In fine”, privacidade é limitação do acesso às informações de uma dada pessoa, bem como do acesso à própria pessoa e à sua intimidade. Esses aspectos também estão presentes nas publicações científicas, nas quais não deverá ser possível identificar os pacientes a partir de imagens e fotografias. Em caso de necessidade imperiosa, isso será permitido apenas com o consentimento, por escrito, dos mesmos8 – o que tem amparo na própria Constituição Federal, em seu Artigo 5º, item X2. É importante esclarecer a diferença entre o consentimento informado, que consiste em um processo para o auxílio na tomada de decisão pelo paciente, e o termo de consentimento, que é um documento legal assinado pelo paciente ou por seus representantes legais com o objetivo de respaldar juridicamente as ações dos profissionais. Se o termo de consentimento não respeitar a manifestação autônoma dos pacientes ele terá pouca ou nenhuma validade ética16. Revista da ABENO • 6(1):11-9 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F São motivos centrais para o uso de um termo de consentimento informado: defesa do paciente, prova do Médico/Dentista e parte de um sistema de investigação Médica/Odontológica. O termo de consentimento informado defende o paciente por garantir o conhecimento dos riscos e das conseqüências do tratamento, respeitando o princípio de autonomia. O termo serve de prova de que o Médico/Dentista forneceu as informações necessárias ao paciente. Assim, mesmo sendo necessária a autorização do paciente, ela não elimina o risco de responsabilização. Isso porque o paciente normalmente é leigo, já que não cursou uma faculdade de Medicina ou Odontologia, o que não permite que ele julgue tecnicamente os procedimentos sugeridos7. MATERIAL E MÉTODOS Após aprovação do protocolo de pesquisa (Parecer nº 02/2004 exarado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Ponta Grossa), um questionário contendo doze questões fechadas do tipo “sim” ou “não” foi entregue a cada um dos 42 (quarenta e dois) docentes lotados no Departamento de Odontologia da UEPG. O retorno desses questionários fez-se através envelope lacrado depositado o mais breve possível na pasta do pesquisador; pasta essa disposta no arquivo dos professores junto ao Departamento de Odontologia da referida Instituição. Um documento por escrito em que constavam as orientações para o retorno dos questionários foi entregue a cada um dos sujeitos da pesquisa. Tal metodologia visou a confidencialidade dos respondentes, os quais perfizeram 24 (vinte e quatro) questionários respondidos (57,14% do total da amostra). Por pertencer ao mesmo Departamento, desconsiderou-se o professor orientador do trabalho. Destaque-se que 17 (dezessete) docentes não responderam (40,47%) ao questionário. Adotou-se o estudo quantitativo na análise dos dados coletados, os quais receberam tratamento estatístico de forma descritiva e inferencial. Na análise descritiva se utilizaram gráficos e na análise inferencial se usaram porcentagens numéricas de ocorrência dos fenômenos colhidos. RESULTADOS A amostra foi composta por 13 docentes do gênero masculino (54%) e 11 do gênero feminino (46%). Na distribuição por idade, observou-se uma concentração nos intervalos dos 30 aos 39 anos e dos 40 aos 49 anos (29,1% e 41,6%, respectivamente). Esses mesmos intervalos juntos representaram 70,7% da amos- tra. No que respeita à formação acadêmica dos do­ centes, 50% são doutores, 42%, mestres e 8%, especialistas; destarte, há um predomínio da formação stricto sensu (92%) sobre a formação lato sensu (8%). Quanto ao tempo que esses mesmos docentes lecionavam na Instituição ocorreram as seguintes distribuições por períodos: de 0 a 05 anos (1 profissional ou 4,1%), de 06 a 10 anos (6 profissionais ou 25%), de 11 a 15 anos (4 profissionais ou 16,6%), de 16 a 20 anos (11 profissionais ou 45,8%), de 21 a 25 anos (nenhum profissional ou 0%) e de 26 a 30 anos (2 profissionais ou 8,3%). Também foi questionado ao docente se era responsável por disciplina e 14 responderam serem responsáveis por disciplina (58,3% do total da amostra). Os resultados obtidos com a pergunta “Quais itens compõem o prontuário odontológico empregado na disciplina?” (Gráfico 1) foram: 83,3% dos docentes assinalaram o item anamnese; 79,1%, o item plano de tratamento; 75%, histórico clínico; 70,8%, qualificação do paciente; 50%, orientação sobre higienização; 45,8%, receitas e atestados; 45,8%, registro do quadro clínico-odontológico com que o paciente deixou o consultório; 29,1%, orientação para o pós-operatório imediato e mediato; apenas 29,1% assinalaram consentimento livre e esclarecido do paciente ou responsável, e 12,5%, abandono de tratamento pelo paciente. Indagados sobre o que respeita propriamente ao consentimento informado, a Abandono de tratamento pelo paciente 3 (12,5%) Orientação para pós-operatório imediato e mediato 7 (29,1%) Consentimento livre e esclarecido do paciente ou responsável 7 (29,1%) Registro do quadro clínico-odontológico com que o paciente deixou o consultório 11 (45,8%) Receitas e atestados 11 (45,8%) Orientação sobre higienização Qualificação do paciente Histórico clínico 12 (50%) 17 (70,8%) 18 (75%) Plano de tratamento 19 (79,1%) Anamnese 20 (83,3%) Número de respostas Gráfico 1 - Itens que compunham o prontuário odontoló- gico empregado nas disciplinas. Revista da ABENO • 6(1):11-9 15 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F 75% 33% 67% 25% sim não sim não Gráfico 2 - Distribuição dos profissionais (%) quanto à Gráfico 3 - Distribuição dos profissionais (%) quanto ao consciência das implicações ético-legais da não-utilização do consentimento informado. conhecimento do Princípio da Autonomia. 25% 62,5% 12,5% não responderam não sim Gráfico 4 - Distribuição dos profissionais (%) quanto à aplicação do Princípio da Autonomia. grande maioria dos docentes respondeu que sabe o que é termo de consentimento informado (95,8%). A partir da pergunta “Saberia elaborar um termo de consentimento informado?”, quatorze profissionais disseram que sim (58,3%) e dez, que não saberiam (41,7%). Sobre ter conhecimento da importância da utilização do termo de consentimento informado, 23 sujeitos da amostra (95,8%) responderam que sim. Questionou-se ainda sobre as implicações ético-legais da não-utilização do consentimento informado (Gráfico 2). Observou-se que 16 profissionais (67%) disseram ter consciência de tais implicações, enquanto 8 deles (33%) disseram não ter. Abordando-se a questão do Princípio da Autonomia do Paciente como um dos três grandes referenciais da Deontologia, foi perguntado se isso era de seu conhecimento. Foram 6 as respostas positivas a essa questão, ou seja, 25% da amos16 tra conhece o Princípio da Autonomia; houve 18 respostas negativas, representando 75% da amostra (Gráfico 3). E, ainda com relação ao Principio da Autonomia do Paciente, constatou-se que somente 3 sujeitos (correspondendo a 12,5%) conhecem o Princípio da Autonomia e o colocam em prática, enquanto 6 sujeitos da pesquisa (25%) não o colocam em prática. A grande maioria dos sujeitos da pesquisa (15 profissionais) simplesmente não assinalou nem positiva ou negativamente, deixando a questão em branco (62,5%) (Gráfico 4). DISCUSSÃO A relação entre o profissional de saúde e o usuário está sendo repensada, pois se exige daquele um aprimoramento condizente com a práxis e deste uma compreensão do que pode vir a ser alterado em seu fisiologismo15. Há o entendimento de que a informação precisa, em linguagem compreensível ao interlocutor, e a consideração à autonomia são os principais instrumentos de defesa dos profissionais7 e das instituições de saúde. Assim, o primeiro aspecto a ser analisado refere-se ao retorno dos 24 (vinte e quatro) questionários respondidos num universo de quarenta e dois docentes lotados no Departamento de Odontologia da UEPG. Frise-se que 17 (dezessete) docentes não responderam (40,47%) ao questionário. Em conformidade com nosso índice de respostas aos questionários, ousamos declinar a idéia de que os elementos típicos selecionados não demonstraram, na sua totalidade, interesse pela temática exposta, muito embora essa afete a todos os docentes; docentes esses na faixa etária entre 30 e 49 anos (70,7% da amostra), com Revista da ABENO • 6(1):11-9 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F discreta predominância do gênero masculino (54%), a maioria lecionando há 11-20 anos na Instituição (62,4%), responsáveis por disciplina (58,3%) e com formação acadêmica em nível stricto sensu (92%). Ainda no que respeita à formação acadêmica do docente verificou-se uma eqüidade entre mestres e doutores. A literatura compulsada aponta a importância do conhecimento e da utilização do consentimento livre e esclarecido do paciente no exercício da prática clínica Médica e Odontológica2,4,5,6,7,9,10,12,14,16,17,20, importância essa asseverada por 95,8% dos docentes que compuseram a amostra. No entanto, pôde-se observar que esses mesmos docentes, de forma contraditória, pouco assinalaram o item “consentimento livre e esclarecido do paciente ou responsável” como elemento componente do prontuário odontológico empregado na disciplina. Constituindo a documentação odontológica o meio de prova para a comprovação do cumprimento da obrigação pelo cirurgião-dentista, e, sendo essa o espelho dos procedimentos realizados, nossos resultados sobre os itens que comporiam o prontuário odontológico empregado na disciplina revelaram a contradição, pois esses mesmos docentes demonstraram atenção a anamnese (83,3%), ao plano de tratamento (79,1%), ao histórico clínico (75%) e à qualificação do paciente (70,8%), dentre outros, enquanto tão-somente 29,1% do universo respondente assinalou “consentimento livre e esclarecido do paciente ou responsável”. Procedimentos clínicos devem ser previamente consentidos7,10,16. Antes de estabelecermos outros paralelos com a literatura, gostaríamos de tecer alguns comentários sobre os resultados provenientes dos questionamentos: “Sabe o que é termo de consentimento informado?” e “Sabe elaborar um termo de consentimento informado?”. Inicialmente, pudemos observar que 95,8% do total da amostra sabe o que é termo de consentimento informado. No entanto, quanto a saber elaborar um termo de consentimento informado, 58,3% responderam sim. Desse resultado extrai-se que 41,7% dos docentes não saberiam elaborar tal termo. Nesse aspecto, parte dos profissionais da nossa amostra poderia estar exposta a situações extremamente desfavoráveis7,10,16. Isso também poderia acarretar sérias conseqüências para um profissional, pois esse documento é de fundamental importância, tanto por constituir defesa do paciente e prova do médico/cirurgião-dentista, bem como por constituir parte de um sistema de investigação médica/odontológica7. Ademais, em vista dessa questão, como ficaria a prática docente? Não bastaria tão-somente saber o que é termo de consentimento informado, mas também saber elaborar um termo de consentimento informado. Além dos dados já apontados, 33% dos docentes responderam não ter consciência das implicações ético-legais da não-utilização do consentimento informado. Isso poderia vir a ser um indicador da necessária reciclagem docente, pois este ao desconhecer tais implicações poderá comprometer a prática docente. Ainda tendo por escopo tais implicações, a literatura compulsada é vigorosa1,3,5,7,19. Ademais, projetos de pesquisa são enviados à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) sem atenderem às exigências da Resolução 196/966,12. Deve-se também atentar seriamente para o problema do desconhecimento que envolve o Princípio da Autonomia do Paciente e a sua importância como característica expressiva no Consentimento Informado13. Do conjunto de respostas às indagações sobre conhecer e colocar em prática o Princípio da Autonomia resultou que, apenas seis (25%) dos profissionais questionados conheciam esse princípio e, desses seis, somente três (12,5%) o colocariam em prática. Sendo o Princípio da Autonomia uma das características importantes do consentimento informado13, indicador da capacidade de autodeterminação18 e de manifestação decisória (complexa questão ética imposta ao profissional de saúde16), esses resultados revelaram um desconhecimento que evidencia, infelizmente, ausência do comprometimento docente para com os referenciais deontológicos. Como repercussão, espera-se que esse mesmo docente desperte para o conhecimento, a conscientização e atitude própria em relação ao emprego do consentimento informado, respeitando a autonomia do paciente, não somente nas disciplinas clínicas, mas também na vida profissional. CONCLUSÕES Analisando e discutindo os resultados, ousamos declinar: • O docente que compôs a amostra apresenta o seguinte perfil: 70,7% está nas faixas etárias entre 30-39 anos e 40-49 anos; é do gênero masculino (54%); é doutor (50%), mestre (42%) ou especialista (8%); leciona na Instituição há 11-20 anos (62,4%) e é responsável por disciplina (58,3%). • Dos itens a compor o prontuário odontológico empregado na disciplina destacam-se: anamnese (83,3%); plano de tratamento (79,1%); histórico clínico (75%) e qualificação do paciente (70,8%). Revista da ABENO • 6(1):11-9 17 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F Apenas 29,1% empregariam o consentimento livre e esclarecido do paciente ou responsável. • Da amostra, 95,8% dos respondentes sabem o que é termo de consentimento informado e têm conhecimento da importância da sua utilização. • Contrariamente, 41,7% responderam que não saberiam elaborar um termo de consentimento informado. • Somente 25% dos docentes conhecem o Princípio da Autonomia. Desses, apenas 12,5% colocam em prática tal Princípio. • O desconhecimento do Princípio Ético da Autonomia por parte do docente poderá comprometer os referenciais deontológicos, além de constituir uma ausência no incentivo e na demonstração ao discente quando do não embasamento da proposta de terapêutica clínica em diálogo franco, argumentos sólidos e respeito ao ser humano. knowledge and understanding regarding the Informed Consent Term, though his/her attitude was compromised as the Principle of Autonomy was not fully put into practice. DESCRIPTORS Personal autonomy. Bioethics. Informed consent. Ethics, dental. Liability, legal. § REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Brasil. Código Penal Brasileiro. São Paulo: Saraiva; 1986. 2. Brasil. Constituição Federal. 5a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais; 2000. 3. Brasil. Novo Código Civil Brasileiro, Lei no 10.406. Brasília: Editora Nacional; 2002. 4. Clotet J. Direitos Humanos e Biomedicina. Cadernos de Ética em Pesquisa 2000;3(4):28. 5. Conselho Federal de Odontologia. Código de ética odontológica. Resolução nº 42, de 20 de maio de 2003. Rio de Janeiro: ABSTRACT Knowledge, understanding and attitude of the professor in relation to the informed consent and autonomy of the patient One fundamental problem in the relationship between professional and patient is the decision-making process, principally when it comes to the diagnostic and therapeutic procedures that will be applied. Obtaining the patient’s informed consent before any procedure is carried out is a requirement that should be observed. In accordance with the principle of autonomy, every person is entitled to choose what he/ she wants or does not want for himself/herself. The absence of the informed consent term can mean disrespect to this basic right. It is therefore madatory to analyse the knowledge, understanding, and attitude of the professor regarding the use of the informed consent term and the patient’s autonomy in the clinical disciplines of the Dentistry Course. A questionnaire with 12 closed questions, type “yes” or “no”, was given to each of the 42 professors of the course; 24 of them answered it. The percentile analysis of the answers demonstrated that 95.8% knew what the informed consent term is and were aware of the importance of its use. To the question “Would you know how to write an informed consent term?”, 58.3% of the sample answered yes. The answers also showed that 67% of the interviewees were aware of the ethical-legal implications of not using the informed consent term. However, only 25% of the them knew the Principle of Autonomy, and only half of these (12.5%) practiced it. The average professor of the course demonstrated 18 CFO; 2003. 6. Conselho Nacional de Saúde. Resolução 196/96, de 10 de outubro de 1996. DOU; 1996. p. 21082-5. 7. Farah EE, Ferraro L. Como prevenir problemas com os pacientes - responsabilidade civil: para dentistas, médicos e profissionais da saúde. 3a ed. São Paulo: Quest; 2000. 8. Francisconi CF, Goldim JR. Aspectos Bioéticos da Confidencialidade e Privacidade. In: Costa SIF, Oselka G, Garrafa V, coordenadores. Iniciação à bioética. Brasília: Conselho Federal de Medicina; 1998; p. 269-84. 9. Garrafa V. Manipulação da Vida. Cadernos de Ética em Pesquisa. 1998;1(2):24-5. 10. Goldim JR. O Processo de Consentimento Informado numa Perspectiva além da Autonomia. In: Universidade do Vale do Itajaí. Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura. Comissão de Ética em Pesquisa. II Seminário sobre Ética em Pesquisa; 2004. p. 19-36. 11. Hossne WS. A Dignidade como Meta. Cadernos de Ética em Pesquisa 1998;1(1):12-3. 12. Hossne WS. Consentimento: Livre e Esclarecido. Cadernos de Ética em Pesquisa 2002;5(10):3. 13. Junges JR. Ética e Consentimento Informado. Cadernos de Ética em Pesquisa 2000;3(4):22-5. 14. Lovisi GM, Lima LA, Morgado AF. Limitação do consentimento informado em psiquiatria. Informação Psiquiátrica 1997;16(3):98-101. 15. Marchi MM, Sztajn R. Autonomia e heteronomia na relação entre profissional de saúde e usuário dos serviços de saúde. Bioética 1998;6(1):39-45. 16. Munhoz DR, Fortes PAC. O princípio da autonomia e o consentimento livre e esclarecido. In: Costa SIF, Oselka G, Garrafa V, coordenadores. Iniciação à bioética. Brasília: Conselho Fe- Revista da ABENO • 6(1):11-9 Conhecimento, conscientização e atitude do docente no que respeita ao consentimento informado e à autonomia do paciente • Nunes DS, Fernandes F deral de Medicina; 1998. p. 53-70. ciente 2002 [acesso em 24 out 2002]. Disponível em: URL: 17. Sawaia BB. Ética nas Ciências Humanas. Cadernos de Ética em Pesquisa 2000;3(4):14-6. http://www.dhnet.org.br. 20. Sousa LCS. Direito à Verdade e o Código de Ética Médica. O 18. Schramm FR. Respeito à autonomia. Cadernos de Ética em Mundo da Saúde 2004;28(3):266-76. Pesquisa; 1999;2(3):16-9. 19. Sociedade Catarinense de Direitos Humanos. Direitos do Pa- Aceito para publicação em 11/2005 Proponha, discuta, participe! A Associação Filie-se à Brasileira de Ensino Odontológico ABENO tem como OBJETIVOS: Congregar todas as instituições de ensino odontológico no Brasil Atuar objetivando a melhoria do ensino odontológico no País Adotar medidas que objetivem a formação e o aperfeiçoamento do pessoal docente e dos profissionais de Odontologia Estimular as atividades de pesquisa na ciência odontológica Incentivar as atividades de extensão e de educação em Saúde junto às comunidades Defender os interesses das instituições de ensino que a integram Constituir-se fator de integração entre o ensino e a cultura nacional Manter relações com as entidades representativas da categoria odontológica Manter intercâmbio com entidades estrangeiras representativas da docência odontológica Filiação e mais informações no site: www.abeno.org.br/novo_socio.html Revista da ABENO • 6(1):11-9 1 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção† A leitura atua como um eixo interdisciplinar, devido à sua natureza integradora de saberes e constitutiva da construção de novos conhecimentos. Jurema Nogueira Mendes Rangel* *Mestre em Educação. E-mail: [email protected]. Resumo Este artigo tem como objetivo traçar os percursos dos estudantes do 1º período do curso de odontologia em relação à leitura, focalizando os atos de leitura presentes na vida universitária que podem colaborar para a formação humanística do odontólogo. Considerando as contribuições da história cultural, buscouse entender: “Como esses alunos estabelecem os primeiros contatos com os objetos de leitura que o ensino superior coloca em circulação?”. É um estudo exploratório, produto de uma pesquisa-ação, junto a 70 alunos da Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro. Para a coleta de dados, aplicou-se um questionário com 12 perguntas, sendo 3 abertas. Os resultados apontam diferentes trajetórias de leitura em formação. Conclui-se que a formação do leitor crítico deve ser um compromisso do docente universitário. Descritores Educação em odontologia. Leitura. Compreensão de leitura. E ste estudo tem como objetivo traçar os percursos dos estudantes de odontologia em relação à leitura, focalizando os atos de leitura presentes na sua vida universitária. Há muito defendo que a leitura é fundamental para a formação de qualquer universitário14,15, pois favorece o entendimento do mundo numa perspectiva crítica e interdisciplinar, como propõe a abordagem interativa de leitura9. Ao ler qualquer tipo de texto, o leitor coloca em ação um sistema de valores, crenças e atitudes constituídos em diálogo com o grupo social, instituindo práticas de leitura que conformam e contrastam as formas de ler. Assim, eventos como o Congresso de Leitura do Brasil (COLE) e o Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE) têm sido palco da apresentação de pesquisas sobre as práticas de leituras adotadas pelos estudantes. Porém, a maioria está voltada para o ensino básico, principalmente o ensino fundamental. Poucos são os estudos sobre como se processa a leitura empreendida pelos alunos do ensino superior. Quando realizados, há forte interesse na área de humanas, em especial pelos cursos de letras13 e pedagogia4,5,8,11, visto que os profissionais provenientes desses cursos deverão atuar como formadores de outros leitores. Os estudos apontam a necessidade de se criar uma pedagogia de leitura na universidade por meio de uma orientação teórico-metodológica que favoreça aos estudantes uma leitura proveitosa e reflexiva. Mas como isso se dá junto aos alunos das demais áreas, cuja preocupação com essa formação não é tão evidente? Como são constituídos esses alunos-leitores? Quais são as práticas de leitura dos estudantes de odontologia favorecedoras da leitura de mundo, tendo em vista a formação de um profissional engajado em problemáticas sociais e culturais, atuando no sentido de buscar soluções para elas? †Este artigo é baseado no trabalho “A leitura do estudante de odontologia: trajetórias em formação”, apresentado no 15º COLE, no IV Seminário sobre Leitura e Produção no Ensino Superior, realizado na Universidade Estadual de Campinas (SP), de 5 a 8 de julho de 2005. 20 Revista da ABENO • 6(1):20-7 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM O estudo aqui apresentado está organizado em três seções: a primeira refere-se ao papel da leitura na universidade e, em particular, no curso de odontologia. Para tanto, faz-se uso, principalmente, das contribuições da história cultural que destaca o modo como os estudantes interagem e convivem com os objetos da cultura letrada que alinhavam os contornos do leitor. A segunda apresenta os resultados do levantamento de uma pesquisa-ação realizada no curso de odontologia da Universidade Estácio de Sá, junto aos alunos do 1º Período (2004.1), sobre seus percursos de leitura. E, em seguida, apresentam-se as considerações finais sobre os processos de leitura apontados pelos estudantes que podem contribuir para a formação humanística do odontólogo. O lugar da leitura no curso de odontologia Desde a promulgação da LDB 9.394/96, reforça-se a universidade como um espaço para a formação profissional que deve reunir o desenvolvimento de ações educativas relativas à busca de informações, ao aprimoramento e uso das tecnologias, à construção e comunicação do conhecimento. Na esteira das propostas feitas no documento, os cursos de odontologia vêm sofrendo mudanças significativas em seu projeto pedagógico introduzidas pelas Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação da Saúde2. Entre os vários aspectos destacados pela Lei, o compromisso com a saúde, com a ética e com a atuação filiada à transformação social é fundamental para responder a uma proposta humanizadora de educação odontológica12. Evidenciam-se, nesses documentos, não apenas a intenção de cuidar da doença, mas a busca por uma direção da formação do cirurgião-dentista que contemple a promoção da saúde bucal, o que requer uma mudança substancial nos currículos vigentes. A ênfase tecnicista, ancorada no paradigma racionalista, que perdurou durante muito tempo na formação dos odontólogos é, hoje, acompanhada pela preocupação de inserir esse profissional na perspectiva de uma ação para a transformação social, atendendo às demandas do Sistema Único de Saúde (SUS). Um dos caminhos propostos para atingir essa meta está indicado nas Diretrizes, em seu art. 4º, inciso III, que destaca a habilidade da leitura e escrita em relação à competência da comunicação. Cada vez mais, a contemporaneidade exige que o sujeito saiba resolver problemas e apresente uma capacidade de abstração que lhe permita desvendar as situações que emergem do cotidiano. Assim, a formação crítica e humanizadora supõe um sujeito que pense por conta própria, ou melhor, seja autor de suas idéias. O pensar exige o repensar, o rever, o indagar, o transgredir o conhecimento já construído para que se possa propor, reafirmar, inovar, transformar a realidade. Nessa ótica, tem-se como princípio que ler é pensar, pois coloca em jogo a imaginação e a realidade, as interdependências, as relações entre os sujeitos, moldadas pelo poder, o possível e a utopia. A leitura requer um processo de construção de sentidos cuja dimensão abrange as formas de representação, a prática e a apropriação, configuradas historicamente7,9. Ler um texto ou decifrar um sistema de pensamento consiste em considerar, ao mesmo tempo, a linha diacrônica em que se estabelece a relação do texto ou de um sistema de pensamento com as manifestações já existentes, e a linha sincrônica, que permite relações do conteúdo em pauta com os de outras áreas de uma cultura7. Entendida dessa forma, a leitura atua como um eixo interdisciplinar, devido à sua natureza integradora de saberes e constitutiva da construção de novos conhecimentos. Logo, cabe à universidade aprimorar as competências de leitura que o aluno traz ao ingressar na instituição, com vistas a possibilitar outras leituras de mundo4,14. Nas palavras de Almeida Filho1 (2005), a experiência de linguagem fortalece os sentidos de humanização, da cultura brasileira e da cidadania planetária ética e consciente dos graduandos. Nessa linha, os aportes de Chartier7 (1991) sobre o livro, o texto e as práticas de leitura anunciam a existência de diferentes formas de se apropriar do texto. Não se lê um texto da mesma forma, nem igual à leitura feita por outro como pensava o estruturalismo que influenciou e ainda influencia o ensino da leitura. Nela, o texto é considerado um instrumento de comunicação, em que a subjetividade não encontra espaço. Porém, Kleiman9 (1993) e Chartier7 (1991) têm mostrado que as experiências individuais, em diálogo com as representações dos diferentes grupos sociais, formam um todo que impulsiona, determina, desenha as práticas de leitura valorizadas pela sociedade em detrimento de outras consideradas como menores pelos grupos hegemônicos. Ler um livro tido como um clássico é mais valorizado que ler, regularmente, as revistas semanais que fazem circular as notícias econômicas e políticas, por exemplo. As tensões existentes, permeadas pelos interesses dominantes, estabelecem formas de apropriação de textos, gestos Revista da ABENO • 6(1):20-7 21 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM e modos de ler que alimentam as trajetórias de leitura do sujeito e acabam confluindo para que o leitor estabeleça um certo capital cultural. Os estudos ligados à história cultural, desenvolvidos por Chartier7 (1991), ajudam a entender que a leitura está submetida às mesmas regras de outras práticas culturais e, por estar vinculada primordialmente à sistematização escolar, age como um diferencial entre os sujeitos. As experiências individuais de leitura estão inscritas no interior de modelos e de normas socialmente compartilhadas. Esses pensamentos devem ser considerados ao se refletir como se dá o processo de leitura na universidade, se se quer colocar em prática o que é proposto nas Diretrizes com vistas à formação do profissional em odontologia que, entre outras competências, deve ser capaz de pensar criticamente, aprender continuamente, planejar estratégias para mudanças significativas, como explicitado no artigo 4º. No entanto, acredito que essas competências se fazem ao longo de um percurso acadêmico que envolve, também, o desenvolvimento da leitura e escrita na universidade e que, na maioria das vezes, nos cursos ligados à área de saúde, é tratado com descaso. Daí, instala-se um paradoxo, pois, ao mesmo tempo que se quer um aluno que compreenda os textos acadêmicos, não há uma preocupação com os processos de leitura que os alunos adotam. Por isso é comum ouvir, em reuniões e na sala dos professores, que os alunos apresentam dificuldades em compreender os textos. Atribui-se ao estudante “a falta” de habilidades frente às diferentes leituras. Os professores não levam em conta as várias formas de apropriação do texto, os tipos de textos colocados em circulação, os diferentes protocolos de leitura que se relacionam diretamente “às oportunidades objetivas da escrita que tiveram os diferentes grupos de estudantes que chegam à universidade, isto é, o tipo de letramento, aí incluídos os vínculos sociais e as disponibilidades culturais”7. Assim, a pesquisa de Leite, Oliveira11 (2004) é esclarecedora, quando se refere aos eventos de leitura planejados dentro das disciplinas pelos professores universitários do curso de pedagogia, intra ou extraclasse, e às experiências vividas pelos estudantes. A leitura científica tem na figura docente o mediador necessário para estruturar e orientar a discussão de textos, promovendo o envolvimento do aluno. O estudo demonstra que essa mediação é transpassada pelo entendimento do professor sobre leitura, e as ações que este desencadeia em sala de aula constituirão os eventos de letramento vividos pelos estudan22 tes. Da mesma forma, Carvalho et al.5 (2004) revelam que as alunas do 5º período do Curso de Pedagogia têm uma história de leitura que permeia as práticas de ler das quais fazem uso na graduação. Durante o curso, as alunas demonstram ter adquirido uma certa autonomia, aprendendo a lidar com as múltiplas e fragmentadas leituras que lhes são propostas, desenvolvendo uma didática da leitura própria. Distinguem a leitura que pode ser feita de uma forma superficial daquela para fins de estudo. Sem dúvida, o universo referencial próprio da academia3,4 mostra o quanto ainda é necessário se caminhar para que a leitura, na universidade, seja encarada como uma atividade intelectual importante na formação profissional. O aluno que entra na universidade precisa submeter-se a eventos de letramento característicos desse espaço de formação, visto que precisará ultrapassar a reprodução de conhecimentos, os comentários dos autores e mesmo a seleção de trechos copiados para constituir um pensamento próprio sobre a inserção da ciência odontológica na sociedade em que vive. Assim, formar o cirurgião-dentista, na perspectiva humanista, implica entender, antes, os processos que envolvem a construção do conhecimento e, dentre eles, a leitura, pois é fundamental compreender “[...] o modo como os estudantes interagem e convivem com os objetos da cultura letrada, em particular com as formas de produção do conhecimento formal”, como destaca Britto3 (2003). A leitura dos estudantes de odontologia: processos em formação O estudo tem caráter exploratório, com contornos de uma pesquisa-ação e circunscrito a 70 estudantes calouros do curso de odontologia, sendo 45 freqüentadores do campus localizado na zona oeste e 25 matriculados no campus da zona norte da cidade do Rio de Janeiro; os estudantes eram, em sua maioria, provenientes de um grupo social privilegiado, com idade entre 18 e 23 anos, em média. Para a coleta de dados, aplicou-se um questionário com 12 perguntas, sendo 3 abertas. Usou-se o horário da aula da disciplina de metodologia científica lecionada por mim para o preenchimento do questionário, para o qual não foi solicitada a identificação, visando deixar o aluno à vontade para responder. No entanto, dos 70 respondentes, 45 se identificaram. Os dados quanti-qualitativos foram organizados Revista da ABENO • 6(1):20-7 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM em categorias e apresentados nas partes que seguem. Nessa linha, pretende-se não apenas traçar um panorama descritivo de aspectos importantes para o entendimento do problema, como propõem Richardson et al.16 (1985), mas também buscar compreender a natureza do fenômeno, diante da complexidade que o processo de ler assume nos diferentes grupos sociais, possibilitando o entendimento de particularidades do comportamento dos estudantes. Para a análise dos dados quantitativos, utilizou-se o programa Microsoft Excel 2002. Os aspectos qualitativos retratam os microprocessos instituídos nas interfaces dos sujeitos com seus pares. A leitura fora da universidade A preocupação inicial do estudo está vinculada às ações de ler das quais os alunos fazem uso no seu cotidiano. Embora o estudo não tenha se detido sobre a formação inicial do leitor, anterior à entrada na universidade, sabe-se que essa fase é fundamental para compreender os modos de ler incorporados pelo alunado, o que será abordado em outra etapa da pesquisa. Carvalho4 (2002) e Carvalho et al.5 (2004), ao analisarem a leitura dos textos acadêmicos pelas alunas do curso de pedagogia de uma universidade pública, mostram que a leitura na universidade é um campo de tensões entre o ponto de vista do aluno e o dos docentes: estes esperam que os estudantes possuam certa capacidade de interpretação dos gêneros textuais próprios do ensino superior e aqueles apresentam preferências literárias específicas, nem sempre reconhecidas como válidas pela academia. Se se pensar que a experiência de leitura, nas palavras de Larossa10 (2001), quando envolve o ensinar e aprender, implica a relação de cada um consigo mesmo e com os outros, vê-se que a leitura coloca em jogo uma série de movimentos que vão além da simples decodificação das informações que um texto contém. Nesse sentido, 80% dos alunos parecem considerar essas experiências para se reconhecerem leitores. Os alunos demonstram ser leitores de uma gama ampla de impressos como: livros de auto-ajuda (14), autobiografia (4), ficção científica (8), história em quadrinhos (10), jornais (42), livros religiosos (8), poesias (9), policial (8), revistas semanais (34), romance (18), entre outros que não se restringem às solicitações acadêmicas, à semelhança dos dados encontrados por Carvalho4 (2002), Carvalho et al.5 (2004), Correa8 (1999) e Ramires13 (2002). Esses autores mostram que há uma “leitura paralela”, não obrigatória, que atende aos interesses pessoais e caminha junto com a leitura acadêmica, a leitura de estudo. Considera-se que algumas práticas de leitura possivelmente estejam interiorizadas pelos estudantes, pois, por pertencerem a um grupo social que tem acesso a livrarias, bibliotecas, que possui condições de adquirir livros e formar o seu próprio acervo, o livro ocupa lugar de destaque nas leituras de preferência. Embora haja um interesse maior por romance e autoajuda, vê-se uma pulverização dos demais gêneros. O panorama encontrado revela que a experiência de leitura se faz alicerçada na diversidade de objetos impressos, se considerada a presença significativa de periódicos. Embora o livro seja um dos suportes de leitura dos estudantes, quando solicitado que identificassem o último livro lido e seu autor, 41 alunos não responderam. Apenas 30 nomearam a última leitura realizada, sendo que alguns mencionaram apenas o título da obra ou o autor. A proliferação das leituras devido ao fomento das atividades gráficas e a profusão de textos que assolam os dias atuais, tão bem estampados nas bancas de jornais e nas prateleiras das livrarias e que chegam às mãos dos alunos6, podem contribuir para uma asfixia de leituras, pouco ficando na memória. A não lembrança desses dados pode também estar atrelada ao sentido atribuído às leituras realizadas. Dentre as obras mencionadas, estão “Harry Potter”, “O senhor dos anéis”, “Carandiru”, sucessos de vendas no mercado, conjugadas ao lançamento de filmes das produtoras cinematográficas. Outras, como “Dom Casmurro”, “Senhora”, “Iracema”, “O santo e a porca” e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, podem estar relacionadas às leituras realizadas nas escolas de ensino médio, onde é comum o uso de obras literárias que alimentam as provas do vestibular. No conjunto, há forte predominância de jornais e revistas semanais. Ambos instituem uma forma de ler diferente daquela promovida pela leitura dos livros. Os alunos dizem ler os jornais de grande circulação na cidade, sendo os de maior preferência “O Globo” e “Jornal do Brasil”, seguidos de “O Dia” e “Extra”. Apenas 2 alunos mencionaram fazer a leitura de jornal “on-line”, uma modalidade de leitura que permite o acesso imediato à informação em tempo real, sinalizando a inserção do texto eletrônico como uma prática de leitura do mundo contemporâneo que inaugura um novo protocolo de leitura6. As revistas semanais desenham um repertório diversificado, abrangendo revistas como “Veja”, “Isto é”, Revista da ABENO • 6(1):20-7 23 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM tes. Outros espaços são apontados: praia, varanda, biblioteca ou “qualquer lugar cômodo e com luz boa”, demonstrando que os espaços socializados e/ou públicos inventam maneiras de ler, mudam gestos e objetos lidos. A leitura é menos atenta, mais rápida e descompromissada, mistura-se com a diversão e o lazer. Pode ser uma leitura descontínua, salteada, que não se incomoda com possíveis interrupções. “Época”, seguidas por “Caras”, “Superinteressante”, “Boa Forma”, “Criativa”, “Capricho”, “Contigo”, “4 Rodas”, “Playboy”, entre outras. Estas últimas apresentam temas de interesse da faixa etária dos estudantes: notícias de artistas, cuidados com o corpo, roteiro de viagens, moda, esportes radicais, etc. De modo geral, são textos leves, de leitura rápida e linguagem direta e fácil, diferentemente das primeiras que fazem circular reportagens vinculadas aos aspectos políticos e econômicos, por exemplo. Essa diversificação dos objetos de leitura reforça a idéia de que o estudante lança mão de um tipo de leitura que não corresponde ao cânone escolar que comumente define a leitura legítima. O problema não está nesse tipo de leitura em si, diz Chartier6 (1999), pois cabe ao professor reconhecer a força dessas leituras que apontam “[...] práticas incontroladas e disseminadas a fim de que possa conduzir esses leitores, pela escola, [e orientar], sem dúvida, por múltiplas outras vias, a encontrar outras leituras”. A Tabela 1 ilustra a freqüência de leitura desses materiais. Vê-se a predominância dos periódicos em comparação com a leitura de literatura em geral (que engloba contos, ficção, romances, poesias etc.) e de livros acadêmicos, que objetivam proporcionar conhecimentos científicos ou técnicos. De modo geral, a leitura dia a dia não é comum, independentemente do tipo de texto. A leitura de livros acadêmicos também é esporádica. A motivação, a leitura em voz alta ou silenciosa, a leitura socializada são indicativos de que a apropriação da leitura se dá por práticas diferenciadas. Ler em casa é a preferência de 40 alunos, que elegem o quarto (20 alunos) como o local de leitura mais usual, indicando que o isolamento e a privacidade são características presentes, incorporadas historicamente pela prática da leitura extensiva7. A sala e o ônibus são os locais escolhidos para ler, igualmente, por 8 estudan- A leitura na universidade Os alunos, ao ingressarem na universidade, começam a ter contato com leituras mais densas que constituem o corpo teórico de cada disciplina. A leitura científica passa a ocupar um lugar importante visto ser encarada como a leitura de estudo, específica da área de formação escolhida. A qualidade dos textos, as exigências e cobranças dos docentes, a leitura como tarefa5 modificam a aproximação do estudante com o texto escrito, inaugurando experiências diferentes das que realiza usualmente. Além de mobilizar estratégias de leitura específicas para compreender o texto5,9, espera-se que o aluno faça uso da bibliografia para complementar as anotações de sala de aula, para estudar e rever conceitos debatidos em sala, para buscar o diálogo com outros textos e autores sobre um determinado assunto, o que foi confirmado apenas por 17 alunos. A maioria parece não ter o hábito de consultar as fontes indicadas pelo professor, fazendo desse tipo de leitura um ato esporádico (39 alunos) ou mesmo inexistente (4 alunos) (Tabela 1). Esse procedimento contribui para que o aluno diminua a possibilidade de dialogar com o autor, pois, como alerta Larossa10 (2001): “[...] o importante não é o que nós saibamos do texto, o que nós pensemos sobre o texto, mas o que – com o texto ou contra o texto ou a partir do texto – nós sejamos capazes de pensar”. Os dados revelam que, ao serem convocados a identificar um livro acadêmico lido recentemente e a Tabela 1- Frequência de leitura/número de alunos. Jornais Revistas Literatura Livros acadêmicos Todos os dias Freqüência 36 1 4 2 1 vez/semana 21 24 3 6 Mais de 1 vez/semana 21 19 7 17 Às vezes 13 20 25 23 Raramente 9 4 22 16 Nunca - 2 6 4 Em branco - - 3 2 24 Revista da ABENO • 6(1):20-7 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM autoria da obra, no período letivo em curso, o comportamento visto em relação às leituras de livre escolha se repete. Apenas 8 alunos conseguiram fornecer a informação completa, indicando apenas uma fonte. Vinte e oito alunos citaram o título da obra ou o autor e, muitas vezes, o nome da disciplina que solicitou a leitura e não a obra. A maioria (34 alunos) não conseguiu indicar um livro acadêmico lido recentemente e seu respectivo autor. Para confrontar as respostas dos estudantes, foi feito um levantamento junto à bibliotecária do campus que confirmou a existência de informações trocadas, títulos de livros incompletos e pequenos equívocos sobre a identificação da autoria. Das indicações fornecidas, mesmo incompletas, a área de Biologia Molecular se destaca. Quanto à leitura de textos indicados no programa das disciplinas, necessária para acompanhar o conteúdo discutido em sala e colaborar para a ampliação dos debates, 49% dos estudantes não mantêm uma sistemática regular de leitura. Apenas 29% da turma costuma realizar as leituras solicitadas; 19%, raramente; e 3% nunca lê os textos solicitados. Entendo que, sem o preparo prévio necessário, os alunos comprometem o nível de participação nas aulas e acabam se colocando no lugar de espectador do tema abordado pelo professor, deixando pouco espaço para uma postura interativa. Na maioria das vezes, as aulas expositivas tomam o espaço da problematização provocada pela leitura, propiciando um afastamento da perspectiva de aprendizagem que pressupõe um aluno ativo. Ao que parece, há a promoção de atos mínimos de leitura suficientes para um grupo significativo de alunos que acabam não contemplando a apropriação* progressiva do discurso acadêmico sob a forma específica de textos científicos, propiciado pelas diferentes leituras. As leituras fundadoras necessárias para a formação da visão crítica ainda não são privilegiadas pelos estudantes. No intuito de investigar se a pulverização da leitura poderia estar relacionada ao volume dos textos solicitados, gerando uma sobrecarga, percebeu-se que mais da metade dos alunos (45) afirma ter um volume pequeno de leituras por semana (1 a 2 textos). Do total, 18 estudantes apontam ter de 3 a 4 textos para ler e 7 alunos indicaram ler 5 textos por semana. Levando em conta que os alunos do 1º período cursam 4 disciplinas, o volume de leitura deveria correspon- der a essa demanda, posto que é possível que cada disciplina solicite leituras a cada aula. Mesmo assim, apenas 29% dos alunos costumam fazer a leitura dos textos solicitados pelo professor. Tendo em vista que a maioria dos alunos não exerce atividade remunerada, depreende-se que há dis­ ponibilidade de tempo para a execução das leituras solicitadas, o que sugere uma investigação mais cuidadosa sobre o não cumprimento dessa tarefa. No andamento do curso, supõe-se que o estudante inicie a formação de um acervo pessoal sobre odontologia e outras áreas que se interligam para sua profissionalização. Embora recém-ingressados, 21 alunos dizem que costumam adquirir os livros indicados pelo professor no programa da disciplina. Tendo em vista que as obras acadêmicas da área da odontologia têm custo elevado, devido à inclusão de muitas imagens ilustrativas, esse dado é significativo. Por outro lado, 32 alunos dizem que, às vezes, adotam esse procedimento e o restante, raramente ou nunca, costuma adquirir algum livro, à semelhança dos resultados encontrados por Carvalho4 (2002), que confirma ser privilégio de poucos a compra de livros para a formação de uma biblioteca mínima. Em relação ao uso da biblioteca, dos 70 alunos investigados, apenas 7 dizem que raramente ou nunca utilizam o acervo da biblioteca do campus. Vinte e nove alunos freqüentam sempre o espaço e 34, às vezes. A possibilidade de encontrar a informação desejada na biblioteca é atestada por 17 alunos e 26 dizem nem sempre encontrar o que procuram. Poucos alunos dizem nunca ou raramente encontrar o material desejado na biblioteca, o que revela o atendimento satisfatório à demanda do curso, o que foi confirmado junto à bibliotecária do campus. No entanto, levanta-se a hipótese sobre o pouco domínio dos estudantes das formas de busca do material: uso de palavras-chave, indicação da autoria etc., ainda não interiorizadas. Paralelo ao uso da biblioteca, o acesso à internet como recurso para estudo ou pesquisa é uma prática incorporada pela maioria (70%), seguida por 27% de alunos que fazem uso desse recurso às vezes. Apenas 3% dos estudantes dizem raramente utilizar a internet para esse fim. O acesso à informação pelos meios eletrônicos parece estar favorecido pela situação econômica e social dos estudantes e pela facilidade de utilização da *A noção de apropriação é aqui entendida como forma de acesso a bens, textos, idéias caracterizada por práticas que se apropriam de modos diferentes dos materiais colocados em circulação7. Revista da ABENO • 6(1):20-7 25 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM sala de informática disponível no campus. Lá, os alunos podem agendar horários de sua conveniência para fazer uso do laboratório e acessar a base de dados disponível. Embora os ganhos dessa forma de coleta de informações sejam inquestionáveis, é evidente que esse suporte de leitura insere novas formas de ler, pois ler um artigo em um banco de dados eletrônico, sem saber nada da revista na qual foi publicado, nem dos artigos que o acompanham, e ler o “mesmo” artigo no número da revista na qual apareceu não são a mesma experiência6. A “leitura eletrônica” possibilita recursos diferentes para explorar o texto. A leitura em cascata, favorecida pelo clicar do mouse em uma palavra, é um exemplo de outra maneira de ler, inicia o leitor na leitura hipertextual, demandando sua participação de maneira diferente daquela da relação que estabelece com o livro. Diante da inserção maciça da busca de informações nos meios eletrônicos, cabe ressaltar que é responsabilidade do docente sugerir aos estudantes sites de bibliotecas eletrônicas e instituições de pesquisa relativas à área para que as informações obtidas possam ter a referência científica, o que não invalida a iniciativa de os estudantes organizarem buscas de livre escolha. Do total, 64 estudantes apontam fazer uso da biblioteca do campus, mesmo que seja para efetuarem a consulta eletrônica. Por outro lado, os alunos não têm o hábito de freqüentar outras bibliotecas públicas ou privadas ou universitárias, nem a Biblioteca Nacional, apresentada a eles na disciplina de metodologia científica, como atividade extramuros15. Embora o contato com a Biblioteca Nacional, na ocasião, tenha causado impacto ao se depararem com a grandeza e variedade do acervo e sua organização, 18 alunos não pretendem lá realizar consulta alguma, pois alegam a distância como elemento dificultoso. Um número significativo de alunos (38) afirma não ter conhecido a Biblioteca Nacional antes da visita. Alguns (13 alunos) conheciam o exterior do prédio, mas não o seu interior e 14 alunos conheciam o interior do prédio, mas sem ter realizado uma consulta. Apenas 5 alunos dizem ter consultado o acervo dessa instituição, porém, antes de ingressarem na universidade. Mesmo assim, 50 alunos demonstram a intenção de retornar à Biblioteca Nacional para a realização de consultas, justificando que o espaço proporciona “uma pesquisa mais detalhada”, “acervo variado e completo”, mas, apenas, se “a internet não for sufi26 ciente” e “não encontrar o que procuro na biblioteca do campus”. CONSIDERAÇÕES FINAIS A universidade, hoje, não pode se eximir da responsabilidade de continuar o processo de formação de leitor, iniciado nas séries anteriores. A formação de um profissional humanista requer que a leitura faça parte desse processo, visto que amplia a visão da realidade vivida. A universidade é um espaço privilegiado para o exercício da crítica, possibilitando que o estudante, por meio de leituras diversificadas, ressignifique as suas ações como cidadão e futuro profissional. Os resultados encontrados espelham que a formação do aluno crítico, delineada nas Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação da Saúde, tendo a leitura como um caminho para uma postura reflexiva, encontra alguns percalços materializados em práticas que distanciam o estudante calouro de um olhar mais investigativo sobre a realidade, privilegiando o lugar do aluno como receptor da visão do professor sobre os temas debatidos em sala, visto que as leituras prévias, importantes para acompanhar as aulas e estabelecer um diálogo com o professor, acontecem de forma precária. Os alunos parecem se contentar com a exposição do professor, ficando este encarregado de destacar aquilo que é fundamental para o assunto em pauta. Corre-se o risco de que, se esse processo não for revertido, os estudantes não se capacitem para um estudo aprofundado e complexo das questões que envolvem a odontologia, motivado pelas leituras fundamentais da área. Além disso, o uso de fontes complementares, sugeridas ou não pelo docente com vistas à ampliação do conhecimento tratado em sala, é uma estratégia que precisa ser incentivada. A intertextualidade implícita nas leituras propostas precisa ser ampliada para que se abra o leque para novas compreensões. Ler é fundamental para produzir conhecimento. Da mesma forma, a leitura de livre escolha apresenta contornos fluidos que precisam ser fortalecidos. A entrada desse tipo de leitura na sala de aula seria um caminho possível, se o professor, mediador da leitura, buscasse pontos de conexão entre os temas discutidos em sala e as matérias veiculadas nos periódicos e na literatura. Os processos de leitura aí possibilitados poderiam desencadear leituras significativas, visto que questionariam o cotidiano no qual o estudante está inserido, em diálogo com as leituras reconhecidas como científicas. Revista da ABENO • 6(1):20-7 A leitura e a formação humanística do estudante de odontologia: processos em construção • Rangel JNM A prática do acesso a textos eletrônicos para fins de estudo é uma realidade que deve ser problematizada e incorporada sob o viés da cientificidade, ou seja, deve-se possibilitar que o aluno possa acessar as informações com critérios científicos, forma necessária para qualquer pesquisa de informações. Conclui-se que os estudantes calouros deram os primeiros passos para a sua formação como leitores, pois começam a integrar o uso da biblioteca e a organizar um acervo pessoal. No entanto, vê-se a importância da ação mediadora do professor na construção dos movimentos formadores desses leitores que se pretendem disponíveis e sensíveis para olhar a odontologia na perspectiva da promoção da saúde. Abstract The reading and humanistic education of the dental student: processes under construction The aim of this article was to assess the behavior of students of the first period of a dental course in relation to reading, by focusing on the reading acts inherent to the university life that may add to the humanistic education of the dentist. Taking into account the contributions of cultural history, an explanation to the following question was sought: How do these students make their first contacts with the reading objects presented to them by higher education? It is an exploratory study, the result of a research-action conducted with 70 students of the Estácio de Sá University, Rio de Janeiro, Brazil. For the collection of data, a questionnaire with 12 questions (including 3 open ones) was applied. The results reveal different reading paths under formation. It was concluded that the trainning of a critical reader must be a commitment of the university professor. Descriptors Education, dental. Reading. Comprehension. § Curso de Graduação em Odontologia. Brasília; 2002 [citado 2005 fev 10]. Disponível em: URL: http://www.portal.mec.gov. br/cne/arquivos/pdf. 3. Britto LPL. Leitura e escrita de estudantes universitários. In: Britto LPL. Contra o consenso: cultura escrita, educação e participação. Campinas: Mercado Aberto; 2003. p. 175-94. 4. Carvalho M. A leitura dos futuros professores: por uma pedagogia da leitura no ensino superior. 5ª ed. Rio de Janeiro: Teias; 2002. 5. Carvalho M, Rangel JNM, Sancas R. Didática da leitura no curso de pedagogia: tornar-se leitor de textos acadêmicos [CDROM]. In: XII ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino; 2004 ago 29 - set 01; Curitiba. 6. Chartier R. A aventura do livro: do leitor ao navegador. 1ª reimpressão. São Paulo: EdUnesp/Imprensa Oficial do Estado; 1999. 7. Chartier R. História cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel; 1991. 8. Correa CHA. Entre práticas e representações: uma incursão em alguns aspectos da leitura na universidade. In: XX Reunião da Associação Nacional de Pesquisa em Educação (ANPED);1999; Caxambu. 9. Kleiman AB. Oficina de leitura. Campinas: Pontes; 1993. 10. Larossa J. Sobre a lição. In: Larossa J. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. 4ª ed. Belo Horizonte: Autêntica; 2001. p. 139-48. 11. Leite SAS, Oliveira LR. Constituição do leitor: análise dos eventos de leitura no curso de pedagogia da Unicamp. Leitura: teoria e prática 2004;22(42):19-32. 12. Moysés ST, Moysés SJ, Kriger L. Humanizando a educação em Odontologia. Revista da ABENO [periódico on-line] 2003 [citado 2005 fev 8]. Disponível em: URL: http://www.abeno.org. br/revista/arquivos_pdf/2--3/Moys.pdf. 13. Ramires V. Leitura e produção escrita de universitários. Leitura: teoria e prática 2002;20(38):37-51. 14. Rangel JNM. A leitura na universidade: uma visão interdisciplinar. Rio de Janeiro; 2005 (mimeo). 15. Rangel JNM. O currículo e a formação do universitário para a pesquisa: conhecendo o acervo da Biblioteca Nacional [CDROM]. In: VI Colóquio sobre Questões Curriculares, II Coló- Referências Bibliográficas quio Luso-Brasileiro sobre Questões Curriculares - Currículo: 1. Almeida Filho JCP. A diferença que faz uma formação universitária aos alunos de graduação. In: Lima RCCP, organizador. Leituras: múltiplos olhares. Campinas: Mercado de Letras/São João da Boa Vista: Unifeob; 2005. p. 97-102. Pensar, inventar, diferir, 2004 ago 16-9; Rio de Janeiro. Anais. Rio de Janeiro: UERJ; 2004. 16. Richardson R, Peres JAS, Wanderlet JCV, Correia LM, Peres MH. Métodos quantitativos e qualitativos. In: Richardson R, 2. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara da Educação Superior. Resolução CNE/CES 3, de Peres JAS, Wanderlet JCV, Correia LM, Peres MH. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas; 1985. p. 29-48. 19 de fevereiro de 2002. Diretrizes Curriculares Nacionais do Aceito para publicação em 10/2005 Revista da ABENO • 6(1):20-7 27 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná A formação de estratégias auxilia a obtenção do sucesso no gerenciamento não só de cursos, mas também de serviços de saúde públicos ou privados, assegurando o desenvolvimento e o impacto destes no meio em que se inserem. Christian Mendez Alcantara*, Adriana Roseli Wünsch Takahashi** *Coordenador Estadual de Saúde Bucal do Paraná. E-mail: [email protected]. **Economista, Professora do Curso de Técnico em Administração da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná. RESUMO Este artigo relata a experiência de construção do planejamento estratégico nos Cursos de Auxiliar de Consultório Dental (ACD) e de Técnico em Higiene Dental (THD) da Escola Técnica (ET) da Universidade Federal do Paraná (UFPR). O planejamento demonstrou ser muito útil na elaboração e implementação de estratégias e na melhoria dos Cursos de ACD e THD. Pode também auxiliar outros cursos auxiliares, técnicos e de graduação em Odontologia, além de orientar o Cirurgião-Dentista, que tem formação escassa ou inexistente na área, para o gerenciamento de serviços de saúde bucal públicos e/ou privados. DESCRITORES Conselhos de planejamento em saúde. Higiene bucal/recursos humanos. Educação. O Curso de Técnico em Higiene Dental da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná iniciou sua atividade no ano de 1991. O Curso se desenvolvia com dificuldades, não havia laboratórios e clínicas, as aulas práticas e estágios funcionavam de forma insatisfatória, faltavam professores, o enfrentamento das dificuldades se dava de forma pontual e reacional e não havia sistematização das dificuldades 28 ou elaboração de estratégias. A partir principalmente de 1996, intuitivamente, o Colegiado do Curso adotou algumas ações para consolidação do mesmo. As principais foram o incremento da parceria com o Curso de Odontologia da mesma Universidade, a implementação de estágio supervisionado em conjunto com organizações públicas e privadas, a criação do curso regular de Auxiliar de Consultório Dental (ACD) e do curso de aperfeiçoamento para ACDs. A dificuldade de integração entre os Cursos de THD e de Odontologia, apesar de estes pertencerem à mesma instituição, a UFPR, era causada, entre outros motivos, pelo fato de integrarem setores distintos da universidade: o de THD integrava a Escola Técnica e o de Odontologia, o setor de saúde. A situação era agravada, pois os cursos funcionavam em sedes físicas distintas. A implementação do Estágio, supervisionado por cirurgiões-dentistas, deu-se nas Unidades Básicas de Saúde das Prefeituras de Curitiba, São José dos Pinhais e Almirante Tamandaré, no Hospital Militar e em consultórios e clínicas particulares. O estágio contribui com a vivência prática e real da futura profissão e, anteriormente, funcionava efetivamente como aula prática supervisionada por professores da institui- Revista da ABENO • 6(1):28-34 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná • Alcantara CM, Takahashi ARW ção. O Curso Regular de ACD foi criado em 1997 pela grande necessidade do mercado de trabalho, de clínicas particulares e públicas, evidenciada pelo trabalho de Queiroz6 (1997). O Curso de Aperfeiçoamento foi implementado no ano de 2000, tendo como objetivo propiciar aprimoramento para profissionais da área já inseridos no mercado de trabalho, bem como possibilitar certa autonomia financeira ao Colegiado do Curso. O curso de aperfeiçoamento era pago a fim de que o Colegiado pudesse adquirir materiais e equipamentos para os cursos regulares de ACD e THD (gratuitos). Atualmente o Colegiado oferece os Cursos de ACD (qualificação, com duração de um ano e meio) e THD (habilitação, com duração de dois anos) no turno noturno2. As aulas práticas desenvolvem-se nos Laboratórios do Curso de Odontologia e os estágios são realizados nas dependências dos Hospitais Militar e da Polícia Militar (atenção especializada), bem como nas Unidades de Saúde das Prefeituras de Curitiba e São José dos Pinhais (atenção básica). Há também alunos realizando seus estágios em consultórios e clínicas particulares. O PROCESSO DE ELABORAÇÃO O coordenador do curso de ACD/THD buscou o apoio da então coordenadora do curso Técnico em Administração de Empresas da Escola Técnica da UFPR para a elaboração do planejamento estratégico. Esse trabalho se iniciou em novembro de 2001 e foi concluído em maio de 2002, com reuniões quinzenais envolvendo todo o colegiado, sendo interrompido nos períodos de férias e recesso escolar. As primeiras reuniões realizadas, de caráter marcadamente teórico, serviram para a aproximação dos membros do grupo com os conceitos de estratégia e de planejamento estratégico, pois esses não possuíam conhecimentos dessa área. O projeto seguiu um roteiro iniciado pela elaboração da missão e dos objetivos do curso – imediato, a médio prazo e a longo prazo. A seguir foram discutidos os valores comuns aos membros do colegiado que norteariam a elaboração do código de ética do colegiado. Vencida essa etapa, procedeu-se à análise dos pontos fortes e fracos do curso, considerando sua inserção na organização e na sociedade, identificando as oportunidades e as ameaças/restrições existentes. Essa análise se deu no âmbito do macro-ambiente e em nível setorial, bem como nos âmbitos externo e interno da organização. Tendo realizada essa análise, procedeu-se à formulação de estratégias que teve como roteiro os itens anteriormente definidos: missão, objetivos, valores, código de ética e análise do ambiente. Para atender à estratégia de crescimento pela diferenciação de qualidade, foram elaboradas quatro grandes metas, sendo elas: qualidade de ensino, in­ tegração, organização curricular e divulgação. Em função destas, definiram-se as ações necessárias para cada uma delas, as necessidades para efetivar tais ações, o prazo, a responsabilidade de cada necessidade e como este trabalho seria avaliado e mensurado. Para realizar essa análise, indicadores foram escolhidos a fim de viabilizar a eficiência e a eficácia da operacionalização do Planejamento Estratégico do Curso de ACD/THD. Na condução desse trabalho, utilizou-se referencial teórico sobre estratégia e planejamento estratégico. Previamente à discussão de cada passo do trabalho, discutiram-se os conceitos e suas funções. Assim, antes da elaboração da missão e dos objetivos, por exemplo, analisou-se o que isso significava e qual a sua utilidade, tendo sido analisados também exemplos de outras organizações. Para isso, utilizou-se um referencial teórico, cuja breve descrição será apresentada a seguir, tendo o mesmo sido elaborado principalmente com base na obra “Administração estratégica: conceitos” dos autores Wright et al.7 (2000). ESTRATÉGIA E PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO Para Wright et al.7 (2000, p. 24), a “administração estratégica consiste em decisões e ações administrativas que auxiliam a assegurar que a organização formule e mantenha adaptações benéficas com seu ambiente”. A definição de estratégias oferece uma linha, uma conduta a ser seguida pelas organizações e, tanto por sua presença quanto por sua ausência, pode ser vital. Para os mesmos autores, a formação de estratégias existe em três níveis organizacionais: o empresarial, cuja questão básica é determinar o setor em que a empresa deve operar; o nível de unidade de negócio, que busca saber como a empresa deve atuar para ser competitiva em cada um de seus negócios ou setores; e o funcional, referente às estratégias de marketing, finanças, produção e outros. É importante destacar que a estratégia é conceito e processo cognitivo; está baseada na mente do estrategista, emergindo como reflexos da maneira como ele lida com as informações a que tem acesso. As in- Revista da ABENO • 6(1):28-34 29 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná • Alcantara CM, Takahashi ARW formações extraídas da realidade objetiva são interpretadas da forma como são percebidas, levando o sujeito a agir sobre esta realidade, ao mesmo tempo em que é influenciado por ela, visando a obter legitimidade social1,4,5. Para Wright et al.7 (2000, p. 45), “estratégia referese a planos da alta administração para alcançar resultados consistentes com as missões e os objetivos gerais da organização”. Assim, a missão deve consistir na razão de existir da organização, um rumo a ser seguido, enquanto os objetivos gerais consistem em fins gerais desejados para os quais são dirigidos os esforços; esses podem ser definidos a curto, médio e longo prazos. O Código de Ética refere-se a padrões de conduta e julgamento moral (saber se as decisões e os comportamentos dos membros do grupo estão certos ou errados). Há diversas perspectivas do comportamento ético, tema polêmico e diferentemente conceituado na literatura. Independentemente de qual comportamento ético é considerado, existem evidências de que as operações éticas podem ser relacionadas ao sucesso das organizações. A sociedade atual exige que as organizações operem de modo socialmente responsável e que os administradores demonstrem um comportamento ético7. Toda organização existe dentro de uma complexa rede de forças ambientais e é afetada por fatores legais, políticos, sociais, econômicos e tecnológicos. Como o objetivo da Administração Estratégica é criar condições para que a empresa opere com eficácia diante de ameaças ou restrições ambientais e possa também capitalizar as oportunidades oferecidas pelo ambiente, é necessário identificar e analisar essas forças macroambientais. Embora essas forças influenciem as operações de todas as empresas de uma forma geral, um conjunto de forças mais específicas dentro de um setor afeta de forma significativa, direta ou indiretamente, as atividades estratégicas das empresas desse setor. O potencial de ganho de um setor (retorno a longo prazo) depende de forças competitivas como: a ameaça de novos concorrentes que ingressam no setor; a intensidade da rivalidade entre os concorrentes existentes; a ameaça de produtos ou serviços substitutos; o poder de barganha dos compradores; e o poder de barganha dos fornecedores. A contraposição das informações sobre o ambiente ao conhecimento das capacidades da empresa permite à administração formular estratégias realistas para que seus objetivos sejam atingidos. 30 Os pontos fortes e fracos internos podem ser relacionados a: recursos humanos (experiência, capacidades, conhecimentos, habilidades e julgamento de todos os funcionários da empresa); recursos organizacionais (sistemas e processos da empresa, inclusive estratégias, estrutura, cultura, administração de compras/materiais, produção/operações, base financeira, pesquisa e desenvolvimento, marketing, sistemas de informação e sistemas de controle); e recursos físicos (instalações e equipamentos, localização geográfica, acesso a matérias-primas, rede de distribuição e tecnologia). RESULTADOS O colegiado do curso de ACD/THD, baseado em seus princípios, definiu como missão para orientar suas metas: • Formar o ACD e o THD, capacitando-os para um bom desempenho profissional, que prime pela competência técnica e pelos valores éticos; que sejam profissionais críticos, criativos e flexíveis, adaptando-os à dinâmica do mercado de trabalho. Após as reuniões, chegou-se à elaboração dos objetivos do curso, que representam finalidades genéricas na direção à qual os esforços são orientados. • Objetivo atual: Formar os alunos no curso de ACD/THD com qualidade de ensino, de acordo com a reestruturação curricular proposta pelo Ministério da Educação. • Objetivo a médio prazo (2 anos): Tornar o curso de ACD/THD um centro de excelência e de referência no Estado do Paraná. • Objetivo a longo prazo (5 anos): Tornar o curso de ACD/THD um centro de excelência e de referência no Brasil. As oportunidades e as ameaças do macroambiente identificadas podem ser observadas no Quadro 1. Quanto ao ambiente setorial, essas podem ser observadas no Quadro 2. A análise dos pontos fortes e fracos internos do colegiado resultou no Quadro 3. Quanto ao Código de Ética do Colegiado de ACD/ THD, estabeleceu-se que as atividades docentes serão norteadas pelos seguintes princípios: • conhecer e respeitar o Código de Ética Odontológico; • conhecer e respeitar o Regimento Interno da Escola Técnica da UFPR; • cumprir o horário de aula e a carga horária do curso; • ter uma prática docente transparente entre os do- Revista da ABENO • 6(1):28-34 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná • Alcantara CM, Takahashi ARW Quadro 1 - Análise das oportunidades e das ameaças/restrições do macroambiente. Político-Legais Forças Oportunidades Ameaças/Restrições • LDB e novos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ministério da Educação • Ausência de legislação profissional do THD e ACD • Regulamentação do Conselho Federal de Odontologia (CFO) • Portaria do CFO que aceita declaração do CD para inscrição de ACD Econômicas • ACD – alta empregabilidade • Empregabilidade baixa do THD no setor privado • Recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) • Programa de Saúde da Família (PSF) para ACD e THD • Curso de Aperfeiçoamento do ACD: fornece recursos para cursos regulares Tecnológicas • Parcerias e Convênios • Material produzido e comprado via cursos particulares • Falta da sala de prevenção • Parceria com o Curso de Odontologia da UFPR • Formação do ACD e THD em áreas de gestão/ secretariado • Noções de especialidades odontológicas Sociais • Busca pela qualidade de vida • População rejeita a idéia do profissional THD atuar na cavidade bucal (cultural) • Aumento da expectativa de vida • Valorização atual do corpo, da aparência, saúde, estética • Valorização da biossegurança Fonte: Planejamento Estratégico do Curso de ACD/THD3 (ET/UFPR, 2002b, p. 9). Quadro 2 - Análise das oportunidades e ameaças/restrições do ambiente setorial. Forças Competitivas Ameaça de novos concorrentes que ingressam no setor Oportunidades Ameaças/Restrições • Sociedade de Pesquisa e Ensino de Odontologia (SPEO) e Associação Brasileira de Odontologia (ABO) oferecem cursos pagos • Curso do Centro Formador Caetano M. da Rocha • Cursos pagos de carga horária menor • Curso de THD da Escola Técnica é gratuito e vinculado à UFPR Ameaça de produtos ou serviços substitutos • Cursos públicos de ACD/THD são similares no Brasil • Declaração do dentista para registro do ACD no CRO • Cursos particulares como da SPEO e ABO podem, a médio ou longo prazo, crescer em qualificação Fonte: Planejamento Estratégico do Curso de ACD/THD3 (ET/UFPR, 2002b, p. 10). centes do colegiado; • respeitar a hierarquia na resolução de problemas envolvendo alunos, professores e funcionários, sendo o colegiado a instância adequada para tal; • orientar eticamente o debate com base nas questões técnicas de forma sensata, evitando difamação de profissionais da classe, mas que, ao mesmo tempo, gere uma consciência crítica e uma consciência profissional; • não haver discriminação no atendimento à pacien- tes de classes sociais diferentes; • promover a formação ética dos alunos previamente às atividades práticas e de estágio, difundindo esses princípios durante todo o curso; • desenvolver a solidariedade entre os alunos na difusão do conhecimento, bem como com colegas de trabalho, minimizando os conflitos da diferença dos diferentes saberes; • desenvolver o espírito de trabalho em equipe com os alunos e o colegiado, privilegiando a troca de Revista da ABENO • 6(1):28-34 31 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná • Alcantara CM, Takahashi ARW Quadro 3 - Análise dos pontos fortes e fracos do ambiente interno. Recursos Humanos Recursos Internos Pontos Fortes Pontos Fracos Coordenação: Coordenação: • Flexibilidade para os docentes • Formação profissional • Dificuldade de comunicação com professores com regime de 20 horas semanais • Freqüência de reuniões • Conflito no grupo • Visão global da universidade • Ausência no início e no final de curso • Informes constantes e gerais • Afastamento dos alunos e da área técnica • Disponibilidade de tempo • Delegação de funções • Perfil para o cargo • Presença do coordenador nas reuniões e nos eventos junto ao grupo docente Docentes: Docentes: • Estabilidade do quadro docente • Desconhecimento das funções dos coordenadores da área pedagógica • Comprometimento e responsabilidade (ensino, entrega de notas, freqüência) • Desconhecimento do regimento interno da ET • Estrutura do colegiado para dar suporte a docentes em cursos de mestrado/doutorado • Diferença no trabalho realizado nos turnos manhã e noite (autonomia dos docentes) e nos materiais utilizados • Alta qualificação técnica • Falta de comunicação e de integração entre os docentes Recursos Organizacionais • Contatos externos para obter informações nas diversas esferas (pública e privada) • Formação do aluno • Controle acadêmico • Foco em educação e saúde e em biossegurança • Falta de direcionamento aos alunos no início do curso • Valores dos docentes do colegiado (coesão) • Falta de assessoramento pedagógico • Histórico do curso (melhorias e superação de dificuldades nos últimos anos) • Cultura organizacional diferente da cultura do grupo • Visitas em indústrias de materiais odontológicos (contatos permanentes) • Cursos com conteúdos e ênfases diferentes nos turnos • Estágio externo de alunas menores de idade • Administração de materiais • Possibilidade de cursos de curta duração • Administração de compras • Administração financeira Recursos Físicos • Impacto da administração geral no colegiado • Acesso dos alunos a outras instalações da UFPR • Materiais particulares e do curso não são compartilhados • Acesso dos alunos a outros cursos da UFPR • Falta de materiais e de equipamentos • Laboratório da Odontologia • Manutenção dos materiais • Verba das parcerias para aquisição de materiais didáticos • Dificuldade de acesso ao laboratório da Odontologia, principalmente pela manhã • Insuficiência de materiais de divulgação • Salas de aula inadequadas Fonte: Planejamento Estratégico do Curso de ACD/THD3 (ET/UFPR, 2002b, p. 13). informações e de conhecimento; • primar pela higiene dos locais de trabalho e estudo em laboratórios e salas de aula; • ser responsável no acompanhamento de todas as atividades dos alunos, teóricas e práticas, nos diversos locais de aprendizagem; • ter respeito e sigilo profissional entre os docentes do colegiado nas questões que os requerem. 32 A Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná conta com diversos cursos técnico-profissionalizantes, de ensino médio e tecnológico. O curso de ACD/THD é um dos cursos ofertados que, de acordo com o Plano Estratégico, é um subsistema organizacional que tem um mercado, um conjunto de concorrentes e uma missão específica, diferentemente de outros subsistemas organizacionais. Portanto, ele deve Revista da ABENO • 6(1):28-34 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná • Alcantara CM, Takahashi ARW Quadro 4 - Metas do planejamento estratégico e ações. Metas Ações 1 – Qualidade de Ensino 1 -Aprimoramento técnico-pedagógico do curso 2 -Introdução de conhecimentos específicos nas áreas não-contempladas: implantodontia, estética, ortodontia, pacientes especiais e odontogeriatria 3 -Manutenção do curso de Aperfeiçoamento de ACD 4 -Divulgação e internalização do Código de Ética do colegiado 5 -Avaliação de alunos, dos docentes e do curso 2 – Integração 1 -Intensificação da integração entre os docentes do colegiado e entre a coordenação do curso 3 – Organização Curricular 1 -Estudo da legislação em vigor 4 – Divulgação 6 -Planejamento Estratégico: operacionalização, manutenção e avaliação 1 -Informar atuação do curso na sociedade 2 -Manutenção e intensificação da parceria com o Curso de Odontologia da UFPR 3 -Promoção de vínculo com as indústrias de materiais do setor odontológico 4 -Conhecimento do Centro Formador e do Centro de Educação e Saúde da Prefeitura de Curitiba 2 -Reformulação curricular 2 -Mídia e publicidade 3 -Uso de uniforme pelos docentes Fonte: elaborado com base no Planejamento Estratégico do Curso de ACD/THD3 (ET/UFPR, 2002b). operar com missão, objetivos gerais e estratégias próprias. Como estratégia genérica para pequenas unidades de negócios, optou-se pela de nicho-custos baixos/diferenciação, ou seja, o propósito consiste em prestar serviços altamente diferenciados que supram as necessidades especializadas de um determinado nicho de mercado, uma área profissional, ao mesmo tempo que se mantêm custos baixos. Por constituir o colegiado parte de uma organização pública, entende-se por custos baixos a utilização de materiais por docentes e alunos, uma vez que não há cobrança formal pela organização sobre os serviços prestados aos discentes. Para atingir tal estratégia, genérica, o colegiado buscou elaborar metas que pudessem simultaneamente diferenciar seus serviços e reduzir o custo por meio de: dedicação à qualidade, inovação do processo, inovação do produto e alavancagem por meio da perícia e da imagem da organização. Para atender à estratégia de crescimento pela diferenciação de qualidade, foram elaboradas quatro grandes metas, sendo elas: qualidade de ensino (aprimorar a qualidade do ensino do curso de ACD/ THD da Escola Técnica da UFPR), integração (promover a integração interna do colegiado de ACD/ THD, bem como deste com a Escola Técnica, os demais setores da UFPR e a sociedade), organização curricular [reformular, implantar e adequar continuamente o projeto curricular do curso, conforme a legislação em vigor (LDB, PDN e Diretrizes da Saúde)] e divulgação (criar uma política de divulgação na sociedade de forma contínua, permitindo assim que o curso de ACD/THD possa ser conhecido como um centro de referência nacional). O Quadro 4 apresenta essas metas e as ações elencadas para cada uma delas. Revista da ABENO • 6(1):28-34 33 Planejamento estratégico de Cursos de ACD/THD – a experiência da Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná • Alcantara CM, Takahashi ARW CONSIDERAçÕES FINAIS As atividades no decorrer do planejamento proporcionaram um claro diagnóstico das dificuldades a serem superadas pelo colegiado, tanto dentro de seu próprio subsistema quanto em relação à Escola, à Universidade e à sociedade. Da mesma forma, proporcionaram a evidenciação de oportunidades e vantagens que podem ser exploradas e fortificadas no grupo. O planejamento estratégico também evidenciou a necessidade de o Cirurgião-Dentista, de formação predominante técnica, adquirir e dominar conceitos de administração e de gestão, que também poderão ser úteis no gerenciamento de clínicas e consultórios, públicos e/ou privados. ate courses on Dentistry, as well as to guide the dentist, who generally has scant, if any, training in those fields, in managing public and/or private dental health services. ABSTRACT Strategic planning applied to the training of Dental Assistants and Dental Hygienists: the experience of the Technical School, Federal University of Paraná, Brazil The present article reports the experience of elaborating strategic planning for the courses of Dental Assistant and Dental Hygienist at the Technical School, Federal University of Paraná (UFPR), Brazil. The planning proved to be of great usefulness in the elaboration and implementation of strategies, as well as in the improvement of the courses. It can also be of help to other auxiliary, technical and undergradu- 4. Meyer JW, Rowan B. Institutionalized organizations: formal DESCRIPTORS Health planning councils. Oral hygiene/manpower. Education. § REFERêNCIAS BIBlIOGRáFICAS 1. Berger PL, Luckmann T. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes; 1996. 2. Escola Técnica, Universidade Federal do Paraná. Currículo do Curso Técnico em Higiene Dental; 2002a. 3. Escola Técnica, Universidade Federal do Paraná. Planejamento Estratégico do Curso de THD; 2002b. structure as myth and cerimony. Am J Sociol 1977;83(2):34063. 5. Mintzberg H, Ahlstrand B, Lampel J. Safari da estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman; 1998. 6. Queiroz SMPL. Estudo sobre o mercado de trabalho e necessidade de cursos nas profissões auxiliares em Odontologia. Curitiba; 1997 (mimeo). 7. Wright P, Kroll M, Parnell J. Administração estratégica: conceitos. São Paulo: Atlas; 2000. Filie-se à ABENO! Você poderá receber a Revista ou acessá-la “on-line” para conhecer os artigos mais importantes da área de ensino odontológico. 4 Revista da ABENO • 6(1):28-34 Aceito para publicação em 10/2005 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS A integração das disciplinas representa a metodologia mais adequada para que o aluno desenvolva a capacidade de conectar e unificar os conhecimentos adquiridos nas diversas especialidades. Daniela dos Santos Cardoso*, Evilin Sanches Morais*, Ricardo de Oliveira Bozzo**, Viviane Maia Barreto de Oliveira*** *Cirurgiãs-Dentistas pelo Centro Universitário Hermínio Ometto – UNIARARAS. E-mail: [email protected], [email protected]. **Coordenador do Curso de Odontologia do Centro Universitário Hermínio Ometto – UNIARARAS. E-mail: [email protected]. ***Professora Titular das Disciplinas de Prótese Parcial Removível, Prótese Total e Odontogeriatria do Centro Universitário Hermínio Ometto – UNIARARAS. E-mail: [email protected]. RESUMO O objetivo deste trabalho foi realizar uma análise comparativa dos anos 1998-1999, em que a Clínica Odontológica era realizada em Blocos, e 2001-2002, quando foi instaurada a filosofia da Clínica Integrada no Centro Universitário Hermínio Ometto – UNIARARAS. Foi executado um levantamento quanto ao número de tratamentos concluídos, através da análise quantitativa desses tratamentos para cada disciplina, utilizando-se 200 prontuários, 50 para cada ano analisado. Os dados foram posteriormente tabulados e submetidos a uma análise exploratória, com o objetivo de traçar um panorama do atendimento odontológico prestado na UNIARARAS. Na Clínica em Blocos, 33% dos tratamentos foram concluídos, sendo a porcentagem de tratamentos concluídos para cada disciplina de: 9% para Prótese Parcial Removível, 20% para Prótese Total, 12% para Prótese Fixa, 64% para Cirurgia, 93% para Periodontia, 47% para Dentística e 66% para Endodontia. Na Clínica Integrada, a porcentagem de tratamentos concluídos foi de 20%, levando-se em conta que são atribuídas altas parciais para a maioria dos pacientes; as porcentagens dos tratamentos concluídos para as disciplinas avaliadas foram de: 35% para Prótese Parcial Removível, 67% para Prótese Total, 46% para Prótese Fixa, 78% para Cirurgia, 89% para Periodontia, 54% para Dentística e 51% para Endodontia. A Clínica Integrada superou a Clínica em Blocos em quase todos os âmbitos avaliados. Este trabalho demonstrou que a Clínica Integrada se instalou para resgatar a condição de totalidade e unicidade da prática odontológica, formando um profissional generalista, com sólida formação técnica, científica, humanística e ética, orientado para a promoção de saúde, com ênfase na prevenção. Descritores Clínicas odontológicas. Ensino/tendências. Educação em Odontologia/métodos. O sistema de atendimento em Clínica Odontológica Integrada foi oficialmente introduzido no currículo brasileiro na forma de estágio em 1970, a partir do exemplo da Universidade de Antioquia, na Colômbia, que o implantou pela primeira vez em 1954, sendo o mesmo transformado em disciplina obrigatória no Revista da ABENO • 6(1):35-41 35 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS • Cardoso DS, Morais ES, Bozzo RO, Oliveira VMB Brasil, com duração mínima de seis meses, em 1982, pelo Conselho Federal de Educação4. O modelo inicial do ensino odontológico, precedente à Clínica Integrada, definiu uma prática denominada Odontologia Científica ou Flexneriana, orientada para a cura ou o alívio das doenças ou para restauração das lesões, cujo objeto de atenção é o indivíduo entendido numa concepção mecanicista, em que domina a tendência à especialização, à seletividade da clientela e à exclusão de formas alternativas de práticas9. Nesse sistema de ensino, ainda hoje utilizado em algumas faculdades, pode-se observar o tratamento adicional conhecido como Clínica de Blocos. Entretanto, essa sistemática gerou a formação de profissionais pouco preparados para diagnósticos e planos de tratamento que resultassem na conclusão dos casos clínicos, criando um número elevado de pacientes em disciplinas isoladas. Complementando esse modelo de ensino, viria a Clínica Integrada, para resgatar a condição de totalidade e unicidade da prática odontológica15. Assim, a Clínica Integrada originou-se da tentativa de reversão da especialização precoce nos cursos de Odontologia através do ensino integrado de especialidades, buscando a formação de um clínico geral, desenvolvendo no aluno a habilidade de realizar diagnósticos e tratamentos clínicos de forma global, objetivando preservar a integridade da saúde bucal, ao mesmo tempo em que procura estabelecer a responsabilidade pela formação social dos futuros profissionais da Odontologia14. Com base na Resolução nº 04, de 03 de setembro de 1982, do Conselho Federal de Educação7 e nas recentes definições de perfil, objetivos e habilidades efetivadas pela comissão do Exame Nacional de Cursos para Odontologia8 (2002), foram definidas habilidades e conteúdos para a formação de um perfil que atenda aos objetivos do curso1, que consiste em: profissional generalista, com sólida formação técnica, científica, humanística e ética, orientado para a promoção de saúde, com ênfase na prevenção de doenças bucais prevalentes. Dessa forma, a Clínica Integrada torna-se um eixo, no qual interagem docência-serviçopesquisa6,10,15. A disciplina de Clínica Integrada tem objetivos bastante amplos, dentro do processo ensino-aprendizagem. Deve também integrar os conhecimentos, as habilidades e os valores adquiridos ao longo do curso, de modo a proporcionar ao paciente o atendimento integral das necessidades evidenciadas12,13. Padilha et al.11 (1995) afirmam que essa integração 36 de conhecimentos objetiva preservar a integridade da saúde bucal, estabelecida por meio de uma ordem de procedimentos operatórios definida pelas prioridades da terapêutica, permitindo, ainda, discussões inerentes à prática odontológica: prática especializada versus prática da odontologia geral e odontologia preventiva versus odontologia curativa. Assim, a integração de clínicas é algo que resulta em benefício tanto para o paciente como para o estudante. Este melhora sensivelmente sua aprendizagem, já que se habitua a observar o paciente de forma global, planificando e executando os procedimentos clínicos necessários, tendo controle permanente da evolução do tratamento, podendo, ocasionalmente, se necessário, modificá-lo. Por outro lado, o paciente também se beneficia, pois o aluno que efetua o exame clínico e o plano de tratamento executa-o, evitando, desta maneira, que o paciente aguarde distintos estudantes para que sejam atendidas as suas necessidades odontológicas5. Por esse motivo, análises constantes do desenvolvimento das clínicas odontológicas devem ser realizadas com o objetivo de apontar a sua qualidade e a sua efetividade, tanto para os estudantes, quanto para o paciente que recebe tratamento. A Clínica Odontológica Integrada do Curso de Odontologia da UNIARARAS tem por proposição educacional exercitar o aluno, levando-se em consideração os conhecimentos teóricos e práticos, adquiridos nas diversas disciplinas, com enfoque no planejamento e na execução do tratamento integrado3. Portanto, o objetivo deste trabalho foi analisar o número de tratamentos que tiveram início e o número de tratamentos que foram concluídos no Curso de Odontologia do Centro Universitário Hermínio Ometto – UNIARARAS, fazendo uma análise comparativa entre os anos de 1998 e 1999, nos quais a clínica era realizada em blocos, e 2001 e 2002, quando foi instaurada a filosofia da Clínica Integrada. MATERIAL E MÉTODOS O método de abordagem escolhido foi o indutivo, por meio de sorteio randomizado do número de prontuário, realizando-se um levantamento de 200 fichas de prontuário, dentre as quais 100 fichas eram referentes à Clínica em Blocos (50 pertenciam ao ano de 1998 e o restante ao ano de 1999) e 100 fichas, à Clínica Integrada (50 eram do ano de 2001 e as outras 50 do ano de 2002, sendo que, para ambos os anos, 25 fichas pertenciam ao atendimento realizado pela clínica do 3º ano e as outras 25, ao do 4º ano). Revista da ABENO • 6(1):35-41 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS • Cardoso DS, Morais ES, Bozzo RO, Oliveira VMB A partir do levantamento dessas fichas foi realizada uma análise de diferentes campos de dados, utilizando-se para tanto um formulário especialmente desenvolvido, contendo: • Dados Pessoais - Nome. - Sexo. - Idade. - Município. - Prontuário. • Saúde Geral - História médica preenchida (sim ou não). - Doenças infecto-contagiosas (presentes ou não). - Hábitos Nocivos (existentes ou não). - Escovação (se realizava ou não). - Pressão arterial aferida (sim ou não). • Exames Complementares - Radiografias (boca toda ou panorâmica). - Exames Laboratoriais. Caso algum desses campos relacionados acima não se encontrasse preenchido, era considerado como valor insuficiente. • Odontograma - Dentes presentes. - Restaurações presentes. - Endodontia. - Cirurgia – em tecido mole ou duro. - Periodontia – número de sessões e tratamento. - Prótese Fixa. - Prótese Total. - Prótese Parcial Removível. Para cada item do Odontograma foram considerados: presença ou ausência, quantidade presente, estado – satisfatório ou insatisfatório, necessidade de tratamento ou retratamento, tratamento inacabado ou tratamento concluído. • Centro de Diagnóstico Bucal (CDO) - Ficha preenchida ou não. - Patologia presente. - Localização. - Causa. - Biópsia (realizada ou não). - Resultado (existente ou não). • Tratamento Executado - Conclusão ou não. - Data de início. - Data final. - Número de sessões. - Faltas do Paciente. • Planejamento - Geral. - Específico. Para cada item do Planejamento foi analisado se os planejamentos geral e/ou específico continham ou não continham visto dos professores. Após a coleta dos dados, os valores obtidos foram organizados em forma de tabulação, o que permitiu primeiramente a análise dos desempenhos das diferentes filosofias de clínicas por meio dos tratamentos executados e não-executados; e, numa segunda etapa, foram comparados os desempenhos da Clínica em Blocos e da Clínica Integrada, analisando-se os valores obtidos das seguintes disciplinas: Prótese Parcial Removível, Prótese Total, Prótese Fixa, Cirurgia, Periodontia, Dentística Restauradora e Endodontia, considerou-se a quantidade de tratamentos planejados e verificou-se se os mesmos foram concluídos. Caso o plano de tratamento tivesse sido cumprido parcialmente, considerou-se o tratamento como não-concluído. Após tabulação dos dados em planilha eletrônica Excel, foi realizada uma análise exploratória dos dados com o objetivo de traçar um panorama do atendimento odontológico prestado na Clínica em Blocos e na Clínica Integrada. Este estudo, por envolver fichas de prontuários de pacientes, que contêm informações pessoais e confidenciais, foi submetido ao julgamento do Comitê de Ética em Pesquisa, pelo qual foi devidamente avaliado e aprovado, sob protocolo número 032/02. RESULTADOS Nos Gráficos 1 a 8 são apresentados os resultados obtidos por este levantamento e uma comparação analítica entre as duas filosofias de ensino-aprendizagem clínico. DISCUSSÃO A Clínica Integrada apresentou melhor rendimento e desenvolvimento do que a Clínica em Blocos na maioria das áreas utilizadas para o levantamento. No que diz respeito à execução dos planos de tratamento, a Clínica em Blocos apresentou mais tratamentos concluídos do que a Clínica Integrada. Esse dado poderia ser contraditório já que a Clínica Integrada se destaca na maioria dos tratamentos concluídos nas diferentes áreas. No entanto, deve-se levar em consideração que a Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS tem como metodologia atribuir a Alta Parcial para qualquer paciente que tenha o seu tratamento concluído, pois este fará parte de um programa de prevenção e de manutenção de saúde bucal. Somente então, quando passar por esse programa, será atribuída a Alta Geral e o tratamento estará realmente concluído. Revista da ABENO • 6(1):35-41 37 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS • Cardoso DS, Morais ES, Bozzo RO, Oliveira VMB (%) 40 (%) 35 35 33 30 35 30 25 25 20 20 20 15 15 10 10 5 9 5 0 0 Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 1 - Desempenho das Clínicas quanto aos planos de tratamento concluídos. Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 2 - Comparação dos tratamentos concluídos em Prótese Parcial Removível. (%) 70 (%) 50 67 60 45 46 40 50 35 30 40 25 30 20 15 20 20 10 10 0 Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 3 - Comparação dos tratamentos concluídos em Prótese Total. 0 Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 4 - Comparação dos tratamentos concluídos em Prótese Fixa. Outro fator importante a ser analisado é que para se ter um tratamento concluído na Clínica Integrada, deve-se ter concluído todo o tratamento planejado, ou seja, a dentística restauradora, a endodontia, a cirurgia, entre outros. Já na Clínica em Blocos, quando era concluído um único plano de tratamento específico, considerava-se tratamento concluído, mesmo que o paciente ainda necessitasse de outros procedimentos. Pode-se perceber no Gráfico 2 que a Clínica Integrada, no que diz respeito à conclusão de tratamentos em Prótese Parcial Removível, superou a Clínica em Blocos. É importante ressaltar que, no sistema de Clínica Integrada, a Prótese Removível é disciplina clínica pertencente ao currículo do 4º ano. Por esse motivo, vários dos planejamentos eram realizados quando o paciente era atendido por um aluno do 3º ano, mas este, por sua vez, não poderia confeccionar a prótese. Mesmo havendo essa variável para a Clínica Integrada, 38 12 5 a mesma ainda possui um índice de tratamentos concluídos maior que o obtido na Clínica em Blocos. Já para a Prótese Total, das 100 fichas analisadas na Clínica em Blocos, houve somente 05 planejamentos, dos quais menos da metade foi concluída (20%). Por outro lado, na Clínica Integrada, das 100 fichas analisadas, foi planejada a execução de 06 Próteses Totais, das quais 4 foram concluídas (67%), resultado que superou o da Clínica em Blocos (Gráfico 3). Assim como ocorre com a Prótese Parcial Removível, a Prótese Total é uma disciplina clínica do 3º ano; e, mesmo existindo essa variável, a Clínica Integrada concluiu mais tratamentos que a Clínica em Blocos. Na Prótese Fixa, dos 50 planejamentos realizados na Clínica em Blocos, somente 06 foram concluídos (12%), enquanto na Clínica Integrada, dos 37 planejamentos, foram concluídos 17, o que corresponde a 46% (Gráfico 4). Nesse item, apresentou-se a mesma Revista da ABENO • 6(1):35-41 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS • Cardoso DS, Morais ES, Bozzo RO, Oliveira VMB (%) 80 (%) 100 78 70 60 90 93 80 64 89 70 50 60 40 50 40 30 30 20 20 10 10 0 0 Clínica em Blocos Clínica Integrada Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 5 - Comparação dos tratamentos concluídos em Gráfico 6 - Comparação dos tratamentos concluídos em Cirurgia. Periodontia. variável ocorrida para a Prótese Parcial Removível e Prótese Total, já que a Prótese Fixa corresponde à Clínica do 4º ano. A disciplina de cirurgia, representada pelas exodontias planejadas e concluídas, apresentou, para a Clínica em Blocos, 64% de tratamentos concluídos, enquanto para a Clínica Integrada apresentou 78% (Gráfico 5). Com relação à disciplina de Periodontia, na Clínica em Blocos foram concluídos 93% dos tratamentos, enquanto na Clínica Integrada foram concluídos 89%. No entanto, deve-se levar em conta que o número de planejamentos realizados na Clínica em Blocos é quase o dobro do de planejamentos na Clínica Integrada, alterando-se as porcentagens alcançadas. No que diz respeito à Dentística Restauradora, tem-se que a Clínica Integrada superou a Clínica em Blocos, sendo que a primeira obteve uma porcentagem de 54%, enquanto a segunda obteve 47% (Gráfico 6). No entanto, pode-se considerar que as duas Clínicas apresentaram um número relativamente baixo de tratamentos concluídos, em relação à quantidade de planejamentos realizados. Por esse motivo, devese esclarecer que, para o levantamento realizado pelo presente estudo, foi considerado tratamento concluído quando todas as restaurações planejadas tinham sido realizadas. Essa variável encontra respaldo no trabalho realizado por Arruda2 (1997), que afirma que, após a elaboração de um plano de tratamento, diversas variáveis surgem no transcurso do tratamento, obrigando o estudante a repensá-lo e, muitas vezes – para não dizer freqüentemente –, realizar modificações, o que, ao final do curso, representa uma diminuição na quan- tidade dos trabalhos realizados, ou seja, queda de produtividade clínica. Para a disciplina de Endodontia, a Clínica em Blocos apresentou 66% de tratamentos concluídos e a Clínica Integrada, 51% (Gráfico 7). Os valores obtidos para a Endodontia da Clínica Integrada coincidem com os do estudo realizado por Arruda2 (1997), que, ao analisar as variáveis intercorrentes que influenciam a produtividade na Clínica Integrada, encontrou que os tratamentos mais afetados foram os relacionados à Endodontia, sendo que de 200 planos de tratamento avaliados, 186 apresentaram alguma intercorrência, o que representa 90% de todos os planos de tratamento, concluindo que os alunos avaliados apresentaram maiores dificuldades em relação à execução dos procedimentos de Endodontia. Delgado, Villa4 (1998) fizeram acompanhamento e levantamento da Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia da Universidade de Antioquia (Medelim, Colômbia) a partir do estudo de 102 fichas clínicas, obtiveram os seguintes resultados: • Dos 84 planejamentos em Periodontia, 13 foram concluídos (15,5%); enquanto na Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS alcançou-se um valor de 89% de tratamentos concluídos. • Dos 15 tratamentos planejados em Endodontia, 06 foram concluídos, correspondendo a 40%. Para o mesmo estudo realizado na UNIARARAS, obtevese uma porcentagem de 51%. • Dos 64 tratamentos planejados para Prótese Parcial Removível, 11 foram concluídos (17,2%); enquanto na UNIARARAS alcançou-se um valor de 35%. • Dos 137 planos de tratamento em Dentística Res- Revista da ABENO • 6(1):35-41 39 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS • Cardoso DS, Morais ES, Bozzo RO, Oliveira VMB (%) 70 (%) 60 40 66 60 54 50 50 47 51 40 30 30 20 20 10 10 0 0 Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 7 - Comparação dos tratamentos concluídos em Dentística Restauradora. tauradora, 15 foram concluídos (11%). O valor alcançado na UNIARARAS foi de 54%. CONCLUSÕES A Clínica Integrada foi implantada como uma nova filosofia de ensino-aprendizagem, com um enfoque humanista, priorizando a globalização dos aspectos cognitivos, afetivos e de habilidades para formar um cirurgião-dentista generalista que, considerando o aspecto holístico, busca a promoção de saúde, com ênfase na prevenção de doenças bucais prevalentes. Dessa forma, conclui-se que a Clínica Integrada apresentou melhor rendimento e desenvolvimento do que a Clínica em Blocos na maioria das áreas utilizadas para o levantamento. Portanto, pode-se concluir também que a Integração das disciplinas em uma única clínica representa a metodologia mais adequada para que o aluno desenvolva a capacidade de conectar e unificar os conhecimentos já adquiridos nas diversas disciplinas básicas e clínicas do currículo. Assim, a Clínica Integrada demonstrou ser melhor que a Clínica em Blocos para: • Os pacientes em atendimento, pois apresentou um índice maior de tratamentos concluídos, sendo estes os beneficiados. • O alunos, que desenvolveram mais planos de tratamento, aplicando a filosofia generalista, beneficiando-se o fator ensino-aprendizagem, e alcançando-se um maior índice de tratamentos concluídos, em quase todas as áreas. ABSTRACT Comparative analysis of clinical treatment given in a segmented or integrated manner, at the Hermínio 40 Clínica em Blocos Clínica Integrada Gráfico 8 - Comparação dos tratamentos concluídos em Endodontia. Ometto University Center – UNIARARAS, Brazil The goal of this study was to comparatively analyse the clinical treatment given between the years 19981999, in which each specialty had its own, separated, clinical activities, and that given in the years 20012002, when the philosophy of an integrated clinic was established at the Hermínio Ometto University Center – UNIARARAS, Brazil. The number of finalized treatments in a sample of 200 files (50 for each of the studied years) was assessed. The data were tabulated and submitted to an exploratory analysis aiming at producing an outlook of the dental care given by UNIARARAS. In the segmented clinics, 33% of the treatments were finalized, being the percentages of finalized treatments for each discipline as follows: 9% for Removable Partial Prosthesis, 20% for Total Prosthesis, 12% for Fixed Partial Prosthesis, 64% for Surgery, 93% for Periodontology, 47% for Restorative Dentistry, and 66% for Endodontics. In the integrated clinic, the percentage of concluded treatments was 20%, taking into account that a partial discharge was attributed to the majority of patients. The percentages of finalized treatments for each discipline were as follows: 35% for Removable Partial Prosthesis, 67% for Total Prosthesis, 46% for Fixed Partial Prosthesis, 78% for Surgery, 89% for Periodontology, 54% for Restorative Dentistry, and 51% for Endodontics. In conclusion, the integrated clinic produced better results than the segmented clinics regarding almost all of the studied aspects. This study demonstrated that the integrated clinic has restored the totality condition and global vision of the dental practice, contributing for the training of a generalist professional, with solid technical, scientific, humanistic and ethical training, oriented for the promotion of health with Revista da ABENO • 6(1):35-41 Análise comparativa do desenvolvimento da Clínica em Blocos com o da Clínica Odontológica Integrada da UNIARARAS • Cardoso DS, Morais ES, Bozzo RO, Oliveira VMB an emphasis on prevention. 8. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Exame Nacional de Cur- Descriptors Dental clinics. Teaching/trends. Education, dental/methods. § sos. Diretrizes do Provão. Provão 2002 Odontologia: Portaria nº 290 de 30/01/2002. Brasília (DF); 2002 [acesso 2003 jun]. Disponível em: URL: http://www.inep.gov.br/superior/provao/diretrizes/2002/odontologia.htm. 9. Moysés SJ. Odontologia comunitária (1996) apud Padilha REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Araújo IC, Araújo MVA, Melo CB, Barroso RFF. O Ensino Odontológico e sua trajetória nacional e internacional e a disciplina de Clínica Integrada nos Cursos de Odontologia. Rev Inst Cienc Saúde 2002;20(1)69-73. 2. Arruda WB. Variáveis Intercorrentes que Influenciam a Produtividade Clínica no Curso de Graduação na Disciplina da Clínica Integrada (Terapêutica Clínica) da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Contribuição ao Estudo [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual de São Paulo; 1997. 98 p. 3. Bozzo RO, Troia Jr MG, Oliveira VMB, Hofling RTB, Simões W, Elias J et al. Protocolo da Clínica Odontológica Integrada do Curso de Odontologia do Centro Universitário Hermínio Ometto. Araras; 2003. 72 p. 4. Delgado FLY, Villa RM. Veintesiete años de seguimiento de las clínicas integrales de la Facultad de Odontología de la Universidad de Antioquia (1970-1996) – Parte III – Evaluación del período 1990-1996. Revista de la Facultad de Odontología, Universidad de Antioquia 1998;9(2):94-102. WWN. [Tese de Doutorado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo; 1998. 209 p. 10. Padilha WWN. Análise da Situação do Ensino (Evolução, Modelo Pedagógico, Enfoque Curricular) da Disciplina de Clínica Integrada nos Cursos de Graduação em Odontologia [Tese de Doutorado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo; 1998. 209 p. 11. Padilha WWN, Medeiros EPG, Tortamano N, Rocha RG. O desenvolvimento da disciplina de clínica integrada nas instituições de ensino odontológico no Brasil. RPG Rev Pós Grad 1995;2(4):193-9. 12. Perez FEG. Avaliação da média de tempo despendida na execução de atividade clínica, por alunos de graduação da Disciplina de Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (1993) apud Araújo IC, Araújo MVA, Melo CB, Barroso RFF. Rev Inst Cienc Saúde 2002;20(1):6973. 13. Piedade EF. Avaliação Quantitativa das Atividades Clínicas dos Alunos de Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas [Tese de 5. Fernandez LAA. Evaluacion clinica em la facultad de Odontologia de la Universidad Central de Venezuela (1980) apud Arruda WB. [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual Paulista; 1997. 98 p. Livre-Docência] Piracicaba: Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual de Campinas; 1977. 51 p. 14. Tortamano N, Padilha WWN, Medeiros EPG, Rocha RG. O desenvolvimento da disciplina de Clínica Integrada nas insti- 6. Marcos BA. Clínica Integrada nos Cursos de Odontologia Como tuições de ensino odontológico no Brasil (1995) apud Araújo Sistema de Atenção. Considerações. Arq Cent Estud Curso IC, Araújo MVA, Melo CB, Barroso RFF. Rev Inst Cienc Saúde Odontol 1991;28(1/2):9-15. 2002;20(1):69-73. 7. Ministério da Educação. Conselho Federal de Educação. Insti- 15. Vargas AMD, Vasconcelos MA. Construção da Clínica Integra- tuto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Tei- da de atenção primária da Faculdade de Odontologia da Uni- xeira. Programa de Legislação Educacional Integrada: Resolu- versidade Federal de Minas Gerais: A experiência da Clínica ção CFE nº 0004, de 03 de setembro de 1982. Brasília (DF); Integrada I. Arq Odontol 1998;34(2):71-81. 1982 [acesso 2003 jun]. Disponível em: URL: http://www.prolei. Aceito para publicação em 10/2005 inep.gov.br/prolei/. Revista da ABENO • 6(1):35-41 41 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde O gestor de saúde deve socorrer os anseios populacionais por uma melhora de sua saúde com a disciplina de um bom financista. Essa missão não encontra respaldo formativo no atual modelo curricular. Arsenio Sales Peres*, José Roberto de Magalhães Bastos*, José Roberto de Pereira Lauris*, Ricardo Pianta Rodrigues da Silva**, Henrique Mendes Silva**, César Lopes Junior*** *Professores Doutores do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo. E-mail: [email protected]. **Mestrandos em Saúde Coletiva da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo. E-mail: henriqmendes@yahoo. com.br. ***Aluno Especial da Disciplina de Ética e Legislação da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo. Resumo Os profissionais de saúde em geral, entre eles o cirurgião-dentista, podem atuar em suas profissões de diversas maneiras. Dentre elas como administradores de saúde, área esta que ultimamente vem ganhando destaque no cenário político nacional por sua relevância ao atuar frente às necessidades da população. Esse campo de atuação exige vários conhecimentos que geralmente não são obtidos pelo atual modelo curricular das universidades. O presente trabalho tem por objetivo elencar as principais responsabilidades e obrigações do gestor em saúde frente ao Estado, por meio dos princípios de Direito Administrativo e das normas legais vigentes. Realizou-se uma revista da literatura sobre os principais temas do Direito Administrativo, bem como sobre os Princípios da Administração, a Improbidade Administrativa e a Lei de Licitação e Responsabilidade Fiscal. Pôde-se perceber que a atuação do gestor de saúde no cenário administrativo é cercada de responsabilidades e deveres frente ao Estado, o que deixa o gestor vulnerável pela falta de conhecimento de suas atribuições. Descritores Administração pública. Administração em saúde pública. Saúde pública. 42 O s profissionais de saúde em geral, entre eles o cirurgião-dentista, podem atuar em suas profissões de diversas maneiras, dentre elas como administradores de saúde, área que ultimamente vem ganhando destaque no cenário político nacional dada sua relevância frente às necessidades da população. Tal incumbência ainda não encontra respaldo formativo no atual modelo curricular das universidades brasileiras, que não propiciam ao graduando conhecimento administrativo, jurídico, financeiro e humanitário, necessários ao exercício dessa função. A fim de que o gestor de saúde atue de maneira eficiente frente aos problemas relacionados à Saúde Pública, mantendo conduta ética, de acordo com a legislação vigente, e com observância aos princípios administrativos, esse deve possuir bom conhecimento de princípios do direito administrativo e da própria administração pública; deve ainda conhecer profundamente suas responsabilidades frente ao usuário do Sistema Único de Saúde e perante o Estado. Para tanto, faz-se necessário o domínio material e interpretativo do Direito Administrativo, formado de normas concernentes a administração pública direta ou indireta, funções, cargos, agentes administrativos, licitações, enfim, trata da gestão do Estado, de como colocá-lo em bom funcionamento. Revista da ABENO • 6(1):42-8 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde • Peres AS, Bastos JRM, Lauris JRP, Silva RPR, Mendes Silva H, Lopes Junior C Objetivo O presente ensaio tem por objetivo primordial elencar as principais responsabilidades e obrigações do gestor em saúde frente ao Estado e ao interesse da coletividade, confrontando-as com os princípios de Direito Administrativo e as normas administrativas vigentes, explicitando as incongruências, as dificuldades e os eventuais dilemas enfrentados pelo gestor de saúde no Brasil. Princípios da Administração Como já dito, dilemas podem pautar a atuação do gestor da saúde pública na atualidade legislativa brasileira, uma vez que esse encontra-se obrigado a prestar seus serviços em consonância com a legislação administrativa, priorizando determinados princípios administrativos muitas vezes conflitantes com o referido conjunto normativo, e o que é pior, sem deixar de lado o fato de estar, com seus atos, influindo na saúde, na vida de seres humanos, de estar prestando serviço público essencial, de utilidade pública, indispensável à existência social. É necessário, contudo, reconhecer a importância de tais princípios, pois estes, apesar da difícil constatação do seu descumprimento, resguardam a essência do ato administrativo, lembrando ao gestor a que veio e a importância fundamental do interesse coletivo em seu labor. Certamente, dentre os princípios que norteiam a administração, em se tratando de saúde pública, merecem prioridade o da supremacia do interesse público, o da eficiência, o da continuidade, o da razoabilidade, o da proporcionalidade, o da legalidade e o da moralidade. Assim, tem-se que o gestor de saúde, em conformidade com o princípio da supremacia do interesse público, deverá sempre sobrepor o interesse da coletividade em detrimento dos interesses privados, particulares. Deve-se observar que a legalidade impede que direitos particulares sejam desrespeitados, oferecendo um limite à supremacia mencionada. Ensina Mello13 (1979) sobre a supremacia do interesse público: “trata-se de verdadeiro axioma reconhecível no moderno Direito Público”. Proclama a superioridade do interesse da coletividade, firmando a prevalência dele sobre o particular, como condição, até mesmo, da sobrevivência e do asseguramento deste último. Quanto ao princípio da eficiência, garantido constitucionalmente no caput do artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB)1, pode-se dizer que tanto o gestor quanto a própria sistemática administrativa devem buscar a melhor forma de atuar, modernizar-se, atualizar-se, buscando sempre a consecução de melhores resultados, tendo em vista questões qualitativas e quantitativas na prestação do serviço de saúde. O princípio da continuidade se descumprido coloca o gestor de saúde diante de um dos maiores problemas imagináveis por aqueles que são usuários dos serviços de saúde, isto é, sua paralisação. Na verdade se faz necessária a consciência por parte do gestor de que como serviço de utilidade pública, essencial, a prestação de assistência à saúde populacional não pode sofrer interrupções, pois representaria risco tanto àqueles que se encontram em assistência, como àqueles que eventualmente necessitarão utilizar-se do serviço. Deve ainda o gestor de saúde pautar seus atos de acordo com valores comuns à coletividade, nunca por valores pessoais muitas vezes destoantes dos reais interesses sociais. Objetivamente o administrador de serviço de saúde não pode atuar de acordo com o que julga ser importante, mas sim deve fazê-lo de acordo com o que realmente tem relevância face à coletividade, guardando sempre uma relação lógica entre fatos e decisões administrativas, conforme o princípio da razoabilidade. Para Rocha14 (1994), a razoabilidade pode ser chamada de princípio da proibição de excesso, evitando abusos por parte da Administração Pública; o autor segue relacionando a razoabilidade com a proporcionalidade. No que tange a proporcionalidade, cabe ao gestor conseguir um máximo de benefícios ao usuário do serviço de saúde, exigindo um mínimo de sacrifício de direitos, estabelecendo uma adequação favorável entre os fins pretendidos e meios de obtenção. Sobre moralidade e legalidade é importante salientar que devem ser complementares, nunca exclusivos, de modo a tornar legítimos os atos administrativos. Sobre a moralidade, nos aclara Meirelles12 (2002) citando Hariou10 (1926): “... constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput1). Não se trata – diz Hariou, o sistematizador de tal conceito – da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como ‘o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração’. Desenvolvendo sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar deve, Revista da ABENO • 6(1):42-8 43 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde • Peres AS, Bastos JRM, Lauris JRP, Silva RPR, Mendes Silva H, Lopes Junior C necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto”. No referente ao princípio da legalidade, é necessário salientar que o administrador dos serviços de saúde deve ater-se ao que lhe é permitido por lei, uma vez que tal princípio determina ao administrador que somente poderá atuar naquilo que lhe for permitido por lei, o que difere do âmbito privado em que se pode fazer não somente o que é permitido, mas também o que não é proibido por lei. A legalidade exalta a submissão do Estado à lei, consagrando a idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida conforme o permitido por lei. Nesse sentido, vislumbra-se a maior dificuldade do administrador de saúde em equilibrar a eficiência, a moralidade, e os outros princípios que o obrigam a fornecer o melhor atendimento possível, composto dos melhores profissionais, terapias e equipamentos, diante de legislações que se preocupam em minimizar os gastos públicos à exata medida da arrecadação. Devem também orientar o atuar do administrador de saúde o princípio da impessoalidade, segundo o qual a atividade administrativa é própria do cargo ou função ocupada pelo administrador, que não deve se confundir quanto a isso; o princípio da publicidade, que exige do administrador clareza, transparência nos seus atos; da indisponibilidade, pois a atividade administrativa não faculta ao gestor de saúde atuar; e da autotutela ou autocontrole, que permite ao administrador revisar, anular e revogar seus próprios atos em conformidade com o interesse coletivo. Improbidade Administrativa O gestor de saúde, assim como qualquer outro agente público, pode ser sujeito ativo da improbidade administrativa. Segundo Rosa15 (2004), essa improbidade pode ser definida como o ato que afronta os princípios norteadores da atuação administrativa, ou seja, a administração ímproba significa, portanto, administração de má qualidade. A Lei nº 8.429/925 trata como atos que configuram a improbidade aqueles que importam enriquecimento ilícito, os que acarretam prejuízo ao erário e por fim os atos contrários aos princípios da administração pública. É amplo o universo de pessoas cujos atos podem 44 ser apontados como ímprobos, bastando que, em sendo servidores ou terceiros, incidam nas situações apontadas pela lei. Bastante abrangente é também o número de entidades cujo patrimônio se acha protegido pelas disposições legais em referência. Os gestores de saúde podem, portanto, ser indiciados por seus atos quando estes forem classificados como improbidade administrativa. Mas deve-se salientar que um ato ímprobo não necessariamente é um ato imoral. O ato de imoralidade afronta a honestidade, a boafé, o respeito à igualdade, as normas de conduta aceitas pelos administrados, o dever de lealdade, a dignidade humana e outros postulados éticos e morais. A improbidade, por sua vez, significa a má qualidade de uma Administração. Pode-se dizer que atos administrativos contrários à moralidade de forma exacerbada, qualificada, configuram improbidade. Porém, nem todo ato de improbidade administrativa representa violação à moralidade administrativa. Ou seja, mesmo que o Gestor em Saúde não aja de má fé, mas pratique um ato que seja contra os princípios da administração pública, tal fato irá caracterizar improbidade administrativa. A configuração da improbidade sujeita o gestor às sanções elencadas no art. 12 da Lei nº 8.429/925, aplicadas de acordo com a gravidade do ato e as suas conseqüências. Tem-se para os atos que importam enriquecimento ilícito: a)perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio; b)ressarcimento integral do dano, quando houver; c) perda da função pública; d)suspensão dos direitos políticos por oito a dez anos; e)pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial; f) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos. Já para os atos que acarretam prejuízo ao erário, tem-se: a)ressarcimento integral do dano, se houver; b)perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância; c)perda da função pública, suspensão dos direitos políticos por cinco a oito anos; d)pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano; e)proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditício, Revista da ABENO • 6(1):42-8 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde • Peres AS, Bastos JRM, Lauris JRP, Silva RPR, Mendes Silva H, Lopes Junior C direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos. E para os atos violadores dos princípios da Administração Pública: a)ressarcimento integral do dano; b)perda da função pública, suspensão dos direitos políticos por três a cinco anos; c)pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente; d)proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefício ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos. Visando a possibilidade de se realizar uma fiscalização efetiva e um acompanhamento da evolução patrimonial dos agentes públicos, a Lei n. 8.429/925 prevê a obrigação da declaração dos bens e valores que compõem o patrimônio particular do agente público no dia da posse para qualquer cargo. Sendo assim, é possível ao Tribunal de Contas verificar se houve ou não enriquecimento ilícito por parte do agente público (neste caso, o gestor de saúde). Apesar de o dano ao Erário ser imprescindível, o ato de improbidade está sujeito a prescrição de acordo com o art. 23 da Lei5, referida da seguinte forma: a)até cinco anos após o término do mandato, nos casos de cargo de comissão ou função de confiança; b)dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego. Licitação O gestor de saúde deve ter um grande conhecimento sobre direito administrativo. Dentro desse assunto se encontra um tema de extrema importância, que é a licitação. Em suma, licitação é o procedimento administrativo destinado à seleção mais vantajosa para a contratação almejada pela Administração e que atenda ao interesse público, ou seja, com a finalidade de permitir a melhor contratação possível (seleção da proposta mais vantajosa) e possibilitar que qualquer interessado, desde que atenda os requisitos legais, possa participar da disputa pelas contratações. Ela garante a observância do princípio constitucional da isonomia e será julgada e processada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório e com os que lhes são correlatos. O dever de licitar decorre do art. 37, XXI, da Constituição Federal1, que foi regulamentado através da Lei nº 8.666/936 (Estatuto das Licitações para a Administração Federal e Lei de Licitações para o Distrito Federal, Estados e Municípios). São necessariamente precedidas de Licitação: as obras, os serviços, inclusive de publicidade, as compras, as alienações, as concessões, as permissões e as locações da Administração Pública. Ou seja, o gestor de saúde freqüentemente se encontra na necessidade de realizar uma licitação, seja para realizar compras de produtos médicos ou para adquirir ou locar qualquer outro bem que seja necessário para o Serviço de Saúde do Município. As modalidades de licitação previstas na Lei nº 8.666/936 são: concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão. A Lei nº 10.5208, de 17 de julho de 2002, incluiu a modalidade denominada “pregão” para aquisição de bens e de serviços comuns no âmbito de todos os entes federados. A seguir são apresentadas as modalidades de licitação: • Concorrência: é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto. • Tomada de preços: é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação. • Convite: é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas. • Concurso: é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias. Revista da ABENO • 6(1):42-8 45 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde • Peres AS, Bastos JRM, Lauris JRP, Silva RPR, Mendes Silva H, Lopes Junior C • Leilão: é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis inservíveis para a Administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis prevista no art. 19 da Lei nº 8.666/936, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação. • Pregão: é a modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns, promovida exclusivamente no âmbito da União, qualquer que seja o valor estimado da contratação, em que a disputa pelo fornecimento é feita por meio de propostas e lances em sessão pública. Além das modalidades de licitação, existem também os tipos de licitação, que estão ligados ao critério de julgamento das propostas e devem estar estabelecidos no edital ou convite. Os tipos de licitação são: menor preço (usual); melhor técnica (o material mais eficiente, mais rentável, melhor); técnica e preço (preço mais vantajoso e melhor técnica) e maior oferta ou lance (oferta em leilão)15. Os prazos mínimos até o recebimento das propostas ou da realização do evento serão: • 45 dias: concurso; concorrência (quando a licitação contemplar o regime de empreitada integral, ou o tipo melhor técnica ou técnica e preço); • 30 dias: concorrência (nos casos não contemplados anteriormente); tomada de preços (quando a licitação for do tipo melhor técnica ou técnica e preço); • 15 dias: tomada de preços (nos casos não contemplados anteriormente); leilão; • 5 dias: convite. Limites de valores para licitações (Limites fixados pela Lei 9.648 de 27/05/1998)7: • Obras: - Convite: até R$ 150.000. - Tomada de Preços: até R$ 1.500.000. - Concorrência: acima de R$ 1.500.000. • Compras e Serviços: - Convite: até R$ 80.000. - Tomada de Preços: até R$ 650.000. - Concorrência: acima de R$ 650.000. Responsabilidade Fiscal A Lei complementar nº 1013, de 4 de maio de 2000, intitulada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), é apresentada como um código de conduta para os administradores públicos, compreendendo os três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal), 46 além de fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes11. A busca pelo equilíbrio das contas públicas é fator primordial e decisivo na redefinição do modelo econômico brasileiro, em que a estabilidade da moeda, o crescimento sustentado, os ganhos de produtividade e a melhoria progressiva das condições de vida da população são objetivos básicos do Plano Real alicerçados no equilíbrio fiscal, que é uma das prioridades do processo de reformas pelo qual o País vem passando. Esse novo padrão fiscal (LRF) fixa limites para despesas com pessoal, para a dívida pública, e ainda determina que sejam criadas metas para controlar receitas e despesas, o que faz com que o administrador sempre consiga pagar despesas sem comprometer o orçamento ou os orçamentos futuros. Em seu artigo 113, a LRF propõe estimular as esferas governamentais a instituir e cobrar tributos a ela devidos, para aumentar a receita própria e a previsão efetiva de referida arrecadação tributária até 30 dias antes do prazo final para o encaminhamento de seus propostos. O poder Legislativo só poderá fazer alterações na receita estimada se comprovado erro ou omissão de ordem técnica ou legal9. Tal prática não era corrente para a maioria dos administradores, que prioritariamente efetuavam os gastos e constituíam as despesas para posteriormente encontrar as receitas. Tal realidade foi modificada com a LRF, que tratou de inverter as ações, proporcionando uma nova realidade fiscal à esfera administrativa, exigindo de administradores maior eficiência, congruência e proporção na gestão dos gastos públicos. Um dos pontos mais delicados da LRF encontra-se nos artigos 18, 19 e 203, os quais abordam o tema de despesa total com pessoal, que é o somatório dos gastos com ativos, inativos pensionistas, relativos, e mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e membros dos Poderes, com vencimentos e vantagens fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como com encargos sociais e contribuições recolhidas pela prefeitura à entidade de previdência9,11. A despesa total com pessoal, em cada período de apuração (mês em referência com as despesas dos 11 meses imediatamente anteriores), não poderá exceder 60% da receita corrente líquida para os Estados e Municípios e 50% para a União. Revista da ABENO • 6(1):42-8 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde • Peres AS, Bastos JRM, Lauris JRP, Silva RPR, Mendes Silva H, Lopes Junior C Outros itens, referentes à dívida pública, apontam questões de relevância ao administrador, nas quais meios e parâmetros são colocados a fim de controlar as despesas em proporção à receita, além de adequar o tempo de execução das mesmas, que deve ficar dentro do mandato do administrador, evitando que se acarrete ônus à próxima administração. Em caso de descumprimento da LRF, as punições encontram-se definidas no Código Penal; na Lei nº 1.0794, de 10 de abril de 1950 (que define os crimes de responsabilidade e regula processo de julgamento); no Decreto-Lei nº 2012, de 27 de fevereiro de 1967 (que dispõe sobre a responsabilidade dos prefeitos e vereadores); e na Lei nº 8.4295, de 2 de junho de 1992 (que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito)9. Discussão A administração pública, principalmente no que diz respeito ao gestor de saúde, é pautada por inúmeras intempéries. Trata-se de uma área em que a necessidade está, vez por outra, diretamente ligada à vida do usuário, determinando inclusive o mantenimento de sua vida; portanto, é fundamental que cada usuário desse sistema estabelecido esteja protegido por direitos indisponíveis. Nesse cenário surge o gestor, a quem cabe cumprir seus deveres perante tal população, sem ferir citados direitos, e ainda limitando-se ao permitido pela legislação. O gestor de saúde deve principalmente atuar baseado nos princípios da moralidade administrativa e da legalidade, evitando assim, que seus atos sejam inseridos no contexto da improbidade administrativa, o que acarreta sanções em cada caso específico. As regras de Licitação devem ser respeitadas e, para isso, o gestor deve conhecer as suas modalidades e tipos, obedecendo aos princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório e aos que lhes são correlatos. A inconstitucionalidade de alguns temas, como a LRF, é abordada por Figueiredo et al.9 (2001) como: “...esta lei não pode suprimir a competência estadual e municipal, em matéria de finanças públicas, vez que ela é inerente a autonomia federativa e que, por isso, apenas as normas gerais são de obrigatória observância pelos Estados, Municípios e Distrito Federal...” “A opção entre cumprir a Constituição e desrespeitá-la para dar cumprimento à lei inconstitucional é concedida ao particular para defesa de seu interesse privado. Não será ao Chefe de um dos Poderes para a defesa, não de seu interesse particular, mas da supremacia da constituição que estrutura o próprio estado.” A limitação do acesso à saúde por parte de um gestor fere o direito à saúde do cidadão [Constituição Federal (CF), artigo 196, caput1]; contudo, a LRF impõe limites ao cumprimento constitucional desse direito do cidadão. Nesse contexto, vislumbra-se talvez a maior das dificuldades enfrentadas pelo gestor de saúde em seu labor, vez que este se vê obrigado a ser eficiente, a socorrer os anseios populacionais por uma melhora de sua saúde, mas deve fazê-lo com a disciplina de um bom financista observando a disponibilidade dos recursos que lhe são repassados. A terceirização, na área da saúde, só é possível para a realização de serviços acessórios e/ou de apoio, tais como os de radiologia, tomografia, laboratórios, e para aqueles relacionados a atividade-meio, cujas funções terceirizadas não existem no quadro de pessoal permanente do órgão, tais como serviços de limpeza, manutenção e vigilância. A contratação de serviços relacionados à execução do próprio serviço público de saúde (atividade-fim) somente pode ocorrer por meio de concurso público, daí a vedação à contratação de médicos por meio de cooperativas. Também não é lícita a terceirização para realização de programas como os de Saúde da Família, combate à dengue, agente comunitário etc. Trata-se de programas realizados pelos municípios, com a utilização de verbas transferidas pela União. Para a realização desses programas de grande cunho social, pode-se recorrer a contratações por prazo determinado (art. 37, inciso IX, da CF1). Outra alternativa é constituir um quadro de pessoal vinculado ao prazo de duração dos programas para o preenchimento de empregos por servidores celetistas concursados especificamente para esse fim. Ao término da transferência de recursos para a realização dos programas, o profissional seria dispensado, já que teria sido contratado para um fim específico. Conclusões Conclui-se que a atuação do gestor de saúde no cenário administrativo é cercada de responsabilidades e deveres frente ao Estado; responsabilidades estas que não fazem parte do currículo de formação de um profissional de saúde, o que deixa o mesmo vulnerável, à mercê de uma legislação volátil, muitas vezes Revista da ABENO • 6(1):42-8 47 Responsabilidade administrativa do Gestor de Saúde • Peres AS, Bastos JRM, Lauris JRP, Silva RPR, Mendes Silva H, Lopes Junior C desconectada das muitas realidades apresentadas por nosso país. O gestor de saúde quando profissional da área de saúde carece de conhecimento jurídico, quando não pertencente à área, carece de conhecimento humanitário, assim, ambos ao enfrentarem o dilema necessidade populacional versus possibilidade estatal demonstram dificuldade em face do conhecimento parcial que possuem. A situação do gestor é deveras complexa, pois este não pode argumentar sequer a pressuposta inconstitucionalidade de algumas leis ou alguns atos limitadores de sua atuação, sob pena de responder pela inobservância. Em contrapartida, não pode ser negligente com a saúde da população, tendo sempre como norteadores os princípios administrativos e a constituição federal. Sem dúvida o equilíbrio entre leis, princípios constitucionais e administrativos e principalmente o respeito ao usuário são importantes guias do gestor de saúde, as quais tendem a evitar sua responsabilização ou, pelo menos, servem como justificadores legítimos de seus atos. Referências Bibliográficas 1. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 [citado 2004 mar]. Disponível em URL: http:// dtr2001.saude.gov.br/bvs/legislação/decretos.htm. 2. Brasil. Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967 [citado 2005 jun]. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0201.htm. 3. Brasil. Lei complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 [citado 2005 jun]. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/Lcp/Lcp101.htm. 4. Brasil. Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950 [citado 2005 jun]. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ L1079.htm. 5. Brasil. Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992 [citado 2005 jun]. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ L8429.htm. 6. Brasil. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 [citado 2005 jun]. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ L8666cons.htm. 7. Brasil. Lei nº 9.648, de 27 de maio de 1998 [citado 2005 jun]. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ L9648cons.htm. 8. Brasil. Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002 [citado 2005 jun]. Abstract The health manager’s administrative responsability Health professionals in general, including dentists, may act in their professions in different ways. These include the activity of the health manager, whose importance in the national political outlook has increased lately due to its essential role in addressing the population’s needs. Acting in this field requires knowledge that is usually not provided by the normal curriculum of universities. The present paper aims at presenting the main responsibilities and obligations of the health manager towards the State, based on principles of administrative law and on the current legislation. A literature review was conducted on the main issues of administrative law, administration principles, administrative misconduct, the invitation to bid statute and fiscal responsibility. It was noticed that the work of a health manager in the administrative outlook is restricted by responsibilities and duties towards the State, rendering that professional vulnerable due to the lack of knowledge on his/her functions. Disponível em URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/2002/L10520.htm. 9. Figueiredo CM, Ferreira C, Raposo F, Braga H, Nóbrega M. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais; 2001. 10. Hauriou M. Précis Élémentaires de Droit Administratif (1926) apud Meirelles HL. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. São Paulo: Malheiros; 2002. 11. Khair AA. Lei de Responsabilidade Fiscal: guia de orientação para as prefeituras. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, BNDS, Brasília; 2000. 12. Meirelles HL. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. São Paulo: Malheiros; 2002. 13. Mello OAB. Princípios Gerais de Direito Administrativo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense; 1979. 14. Rocha CLA. Princípios Constitucionais da Administração Pública (1994) apud Meirelles HL. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. São Paulo: Malheiros; 2002. 15. Rosa MFE. Direito Administrativo - Vol 19. 6ª ed. São Paulo: Saraiva; 2004. Aceito para publicação em 10/2005 Descriptors Public administration. Public health administration. Public health. § 48 Revista da ABENO • 6(1):42-8 Projeto “Odontologia Hospitalar” Aperfeiçoamento do conhecimento técnico necessário em situações de risco à vida do paciente e levantamento das condições de saúde bucal de pacientes hospitalizados. Guilhermo Manfio Doro*, Lucas Meneghello Fialho*, Maximiliano Losekann**, Dênis Nestor Pfeiff*** *Acadêmicos de Odontologia da Universidade Luterana do Brasil, Campus Cachoeira do Sul. E-mail: [email protected], [email protected]. **Acadêmico de Odontologia da Universidade de Santa Cruz. E-mail: [email protected]. ***Professor Adjunto do Curso de Odontologia da Universidade Luterana do Brasil, Campus Cachoeira do Sul. E-mail: [email protected]. Resumo Durante a formação acadêmica, o estudante de odontologia aprende diversos procedimentos invasivos com potencial para provocar reações adversas em seus pacientes; entretanto, encontra-se despreparado para solucionar qualquer eventualidade. Este artigo relata um projeto executado no Hospital de Caridade e Beneficência de Cachoeira do Sul, que teve por objetivo proporcionar um aperfeiçoamento dos conhecimentos teóricos e práticos sobre os procedimentos de primeiros socorros em situações de emergência, além de passar noções a respeito da administração de medicamentos por vias invasivas e da verificação dos sinais vitais. Concomitantemente, realizou-se uma avaliação sobre as condições da saúde bucal dos pacientes hospitalizados e sobre as condições que a instituição possui para promover corretamente a higiene oral de seus pacientes. Pretende-se através deste trabalho conscientizar os profissionais da Odontologia sobre a importância do conhecimento técnico diante uma situação de risco à vida de seu paciente, a qual se encontra presente diariamente em ambiente hospitalar. Com relação às condições hospitalares, foi constatada carência na realização da higiene oral dos internos, tanto a equipe de enfermagem como os próprios acompanhantes não se importavam com a saúde bucal dos mesmos. Alguns pacientes foram submetidos a exames clínicos, nos quais se observou uma grande prevalência de usuários de próteses, a maioria delas com deformidades, bem como de pacientes com candidíase ou outros tipos de patologias relacionadas à falta de higiene. As conclusões mostram a necessidade de haver um trabalho a longo prazo, envolvendo orientações diárias aos pacientes hospitalizados, ou até mesmo a inclusão de um dentista na equipe clínica da instituição. Descritores Prestação de cuidados odontológicos. Primeiros socorros. Tratamento de emergência. Unidade hospitalar de Odontologia. Higiene bucal. O projeto “Odontologia Hospitalar”, realizado no primeiro bimestre do ano de 2004 com carga horária de 120 horas, teve o objetivo de proporcionar um aperfeiçoamento dos conhecimentos teóricos e práticos em relação aos primeiros socorros e às situações emergenciais. Esses conhecimentos englobam a administração de medicação pelas vias intramuscular (IM), intravenosa (IV) e subcutânea (SC) e a verificação dos sinais vitais. Os profissionais formados em odontologia estão aptos a administrar várias técnicas anestésicas, bem como a realizar procedimentos cirúrgicos; porém, muitas vezes não se encontram preparados para realizar manobras de primeiros socorros em situações emergenciais e administrar medicamentos pelas vias IM, IV e SC, o que pode ser necessário em algumas dessas situações. Concomitantemente ao aperfeiçoamento de conhecimentos, viabilizou-se aos Revista da ABENO • 6(1):49-53 49 Projeto “Odontologia Hospitalar” • Doro GM, Fialho LM, Losekann M, Pfeiff DN estagiários do curso de Odontologia a avaliação das condições de saúde bucal dos pacientes internados através de um exame clínico detalhado; também foram realizados o controle de higiene bucal e a orientação de higiene oral, transmitida aos pacientes e aos acompanhantes. A equipe de enfermagem também recebeu instruções e orientações de higiene oral, a fim de proporcionar uma melhora na qualidade dos serviços prestados e uma adequada manutenção da saúde bucal dos pacientes internos. Material e Métodos Apresentaram-se como voluntários três acadêmicos de odontologia, os quais, na primeira semana, conheceram o ambiente hospitalar e a equipe médica e receberam treinamento teórico e prático na verificação dos sinais vitais, como pressão arterial, pulso, freqüência respiratória e temperatura. Os alunos realizaram treinamento prático em um boneco simulando paradas respiratórias e cardíacas. As atividades de prestação de serviço odontológico aos pacientes eram realizadas em períodos intercalados, com os ensinamentos proporcionados pela enfermeira Janine ­Koepp e pelo professor médico Dênis Pfeiff. Também se permitiu que os estagiários avaliassem as condições de saúde bucal dos pacientes internados através de um exame clínico detalhado e realizassem o controle de higiene bucal e a orientação de higiene oral aos pacientes e aos acompanhantes. As instruções e orientações de higiene oral também foram passadas para enfermeiros e técnicos em enfermagem, a fim de se conseguir uma melhora na qualidade dos serviços prestados, para uma boa manutenção da saúde bucal dos internos. Procedimentos de primeiros socorros As situações que levam a uma parada respiratória são muitas, como por exemplo afogamento, respiração excessiva de gases, choque elétrico, parada cardíaca, bem como obstrução das vias aéreas por corpos estranhos. Durante o estágio, os acadêmicos aprenderam que, quando houver uma situação de parada respiratória, deve-se procurar socorro hospitalar imediato. Porém, enquanto a vítima não chega ao hospital, algumas manobras podem ser realizadas conforme descritas a seguir. A vítima deve ser posicionada deitada, se estiver sentada; o profissional deve aproximar o ouvido próximo ao nariz ou à boca da vítima, para escutar se ainda há respiração. Nesse momento, de­ve-se conferir se as vias aéreas não se encontram obs50 truídas por algum corpo estranho, como próteses, coágulo, objetos etc. A seguir, deve-se realizar o le­ vantamento e a anteriorização da mandíbula, para facilitar a respiração do paciente em casos de politraumatizados; essa manobra deve ser feita após a colocação de um colete cervical, evitando assim possíveis agravamentos de lesões cervicais e lombares. Deve-se, na seqüência, expor o tórax e verificar se há expansão; isso indicará ao profissional que o mesmo está respirando. Se o paciente não apresentar movimentos e a papila estiver dilatada, o profissional deve iniciar imediatamente a massagem cardíaca e a respiração artificial. O profissional deve realizar os seguintes procedimentos: com uma mão apoiada sobre o dorso da outra e os braços esticados, usando somente o peso do corpo, massagear o paciente na região do osso esterno4. A respiração artificial deve ser realizada de forma que uma mão consiga segurar o queixo e a outra feche o nariz para que o ar não saia por ele. A reabilitação dos sinais vitais do paciente deve ser alternada de forma que sejam feitas 15 massagens a cada 2 respirações se o socorrista estiver sozinho; caso haja alguém que possa ajudar, devem ser feitas 5 massagens para cada respiração4. A massagem cardíaca e a respiração artificial devem ser mantidas o máximo de tempo possível, até o paciente chegar à unidade hospitalar4. Considerações importantes quanto À saúde bucal do paciente hospitalar Sabe-se que certas condições sistêmicas podem ser influenciadas pela doença periodontal, e a doença periodontal pode estar sendo influenciada por certa condição sistêmica. Influência das condições sistêmicas sobre as doenças periodontais Em geral, pacientes diabéticos têm alta prevalência de problemas odontológicos, perceptíveis pela ocorrência de candidíase, secura bucal, cárie e doença periodontal1. Os pacientes que sofrem de diabetes mellitus e estão descompensados, quando possuem doença periodontal, esta se dá de forma mais severa devido a fatores microbianos, metabólicos e ao prejuízo funcional dos neutrófilos. Portanto, pacientes com diabetes e que estão hospitalizados devem ter cuidados especiais com a saúde bucal, para evitar o surgimento de doenças bucais, que ocorrem quando há falha na remoção mecânica da placa bacteriana2. Os pacientes com SIDA/AIDS, por deficiência do Revista da ABENO • 6(1):49-53 Projeto “Odontologia Hospitalar” • Doro GM, Fialho LM, Losekann M, Pfeiff DN sistema imunológico, podem apresentar manifestações clínicas características da doença, incluindo inúmeras infecções por fungos, vírus, bactérias e até mesmo o desenvolvimento de neoplasias, como o sarcoma de Kaposi. A cavidade bucal representa o principal meio de comunicação do ambiente interno com o externo, sendo colonizada por mais de 500 diferentes espécies de microrganismos. Com o imunocomprometimento severo, muitos microrganismos têm seu potencial patogênico ampliado, deixando o paciente mais propenso ao surgimento de doenças periodontais severas e de candidíase. Pacientes imunocomprometidos também devem ter cuidados especiais com a saúde bucal2. Estudos têm mostrado que pacientes com distúrbios psicossociais, quando apresentam doença periodontal, esta ocorre de forma mais severa que em pacientes sem alteração psiquiátrica. Há muito tempo tem-se verificado o surgimento de gengivite ulcerativa necrotizante em pacientes psiquiátricos. Essa gengivite é uma manifestação severa da doença periodontal, que causa dor, odor e dificuldades na alimentação e higienização bucal. Portanto, o controle da higiene bucal nesses pacientes deve ser rigoroso, para se prevenir o surgimento da doença. Durante o estágio assistimos um paciente psiquiátrico com a doença já instalada; através de realização de controle do meio bucal, pôde ser observada uma melhora nas condições desse paciente. Orientações aos familiares e responsáveis quanto à necessidade rigorosa no controle de higiene bucal ajudam muito na preservação da saúde bucal desses pacientes2. Alguns medicamentos utilizados também podem constituir fatores de risco para a doença periodontal, como anticonvulsivantes, antidepressivos e vários fármacos associados à redução do fluxo salivar. Em casos de pacientes com xerostomia, pode-se utilizar, como coadjuvante à higiene bucal, a aplicação tópica de saliva artificial em períodos alternados, para mais conforto do paciente2. Influência das doenças periodontais nas condições sistêmicas Estudos epidemiológicos têm fornecido fortes evidências do papel da doença periodontal moderada a severa como fator de risco à saúde geral do indivíduo, incluindo alterações cardiovasculares, acidentes vasculares cerebrais (AVC), descontrole metabólico do diabetes, infecções pulmonares e parto prematuro2. Quanto aos efeitos cardiovasculares, a infecção periodontal pode estimular as células do sistema mo- nocítico-fagocitário a secretarem citocinas inflamatórias em maior quantidade, que podem se somar àquelas secretadas localmente no periodonto e ganhar acesso à circulação. Esses eventos podem iniciar outros, como agregação e adesão plaquetária, acúmulo de células gordurosas e deposição de colesterol na parede dos vasos2. As infecções pulmonares também podem estar influenciadas pela doença periodontal. As possíveis vias de infecção do trato respiratório são: aspiração de microrganismos da orofaringe, inalação de aerossóis infectantes, disseminação de áreas adjacentes e contaminação hematogênica. A cavidade bucal pode abrigar patógenos causadores de doenças pulmonares, principalmente em indivíduos com má higiene bucal e imunocomprometidos e em indiví­duos idosos institucionalizados. Ainda, pode-se associar esses fatores à ventilação mecânica artificial e à colocação de tubos ou sondas endotraqueais nos indivíduos hospitalizados. Alguns autores têm estudado o papel do controle de placa bacteriana na prevenção das alterações pulmonares. A clorexidina, antisséptico bucal, pode ser usada na prevenção de pneumonias em indivíduos hospitalizados2. Estima-se que pacientes grávidas com doença periodontal possuam 7,5 vezes mais chances de ter parto prematuro. Os mecanismos biológicos envolvem a ativação bacteriana da imunidade celular, com aumento da produção e secreção de citocinas inflamatórias, as quais podem desencadear o trabalho de parto prematuramente2. Estipulação do uso da clorexidina como substância adjuvante no controle de placa bateriana no ambiente hospitalar O digluconato de clorexidina é uma guanida com efeitos antiplaca maiores que os de outros agentes antimicrobianos, devido à sua acentuada capacidade de adsorção aos dentes e às superfícies mucosas, com posterior liberação na cavidade oral em níveis terapêuticos, sendo liberada durante 24 horas2. Durante o estágio, verificamos que o hospital possuía um antisséptico bucal, porém o frasco não continha identificação do produto. De qualquer forma, enfatizamos a importância da aquisição do antisséptico pela unidade hospitalar. Pesquisas demonstram que o bochecho durante 1 minuto 2 vezes ao dia, com 10 ml de solução a 0,12%, previne o desenvolvimento da gengivite. O seu uso está indicado em pacientes hospitalizados por um lon- Revista da ABENO • 6(1):49-53 51 Projeto “Odontologia Hospitalar” • Doro GM, Fialho LM, Losekann M, Pfeiff DN go tempo; porém, é importante esclarecer que ela está recomendada em pacientes que não conseguem realizar a higiene oral, previamente a procedimentos como entubação e sondagem e em pacientes imunocomprometidos. Alguns efeitos colaterais têm sido verificados, como pigmentação de dentes, descamação do dorso da língua, sensibilidade oral e alteração da gustação após algumas horas. A clorexidina, como qualquer outro agente antimicrobiano potente, deve ser administrada somente sob supervisão profissional2. Discussão Tendo em vista que a maioria das complicações odontológicas são infecções brandas, os sinais vitais do paciente são uma importante ferramenta de investigação para se registrar o estado fisiológico atual do paciente. É rápida, simples de ser executada e de baixo custo. Quando falamos em sinais vitais estamos nos referindo a temperatura, pressão sangüínea, pulso e freqüência respiratória3. Segundo Peterson5 (2000), os pacientes com envolvimento sistêmico terão temperaturas elevadas. Em infecções graves, a temperatura pode subir a 38°C ou 39°C. O pulso do paciente aumentará com a elevação da temperatura; isso é outro sinal clínico de que o profissional está diante de uma infecção grave (pulso acima de 100 batimentos por minuto). A pressão sangüínea é o sinal vital que menos pode variar com infecções; isso ocorre somente quando o paciente apresentar ansiedade e dor intensa5,6. A freqüência respiratória é um dos sinais vitais mais importantes devido à possibilidade de obstrução das vias aéreas, o que pode levar o paciente à morte. Toda infecção tem como características: dor, calor, rubor, edema e perda da função, e muitas vezes, pacientes com infecções brandas e moderadas apresentam freqüência respiratória elevada (de 18 a 20 respirações por minuto)5. É óbvia a necessidade do conhecimento prévio dos sinais vitais do paciente antes de qualquer procedimento clínico; porém, muitas vezes alguns colegas não realizam esses procedimentos em seus consultórios devido à falha de ênfase na importância desses procedimentos durante sua graduação. Atualmente, nota-se que muitos cirurgiões-dentistas apresentam-se despreparados para realizar procedimentos de primeiros socorros. Isso é devido à falha no ensino das escolas de graduação, as quais apenas enfatizam o conhecimento teórico de técnicas que os alunos muitas vezes nunca utilizaram. Por isso a importância de as escolas de graduação incluírem em 52 seu currículo uma disciplina que simule situações de emergência em bonecos, como foi feito nesse estágio, para que os acadêmicos tenham oportunidade de colocar em prática seus conhecimentos teóricos. Quando essas situações ocorrerem em seus consultórios, os mesmos saberão como proceder, proporcionando um atendimento com tranqüilidade e qualidade. Tendo em vista que a maioria das emergências necessitam de atendimento imediato, com administração de medicamentos pelas vias IM, IV e/ou SC, muitos cirurgiões-dentistas não se encontram aptos a realizar esses procedimentos. É interessante lembrar que todo cirurgião-dentista encontra-se apto a realizar bloqueios regionais durante as várias técnicas anestésicas e cirurgias, embora muitos não estejam aptos a realizar os procedimentos citados anteriormente. Atualmente, estamos vivenciando uma era de mudanças na odontologia, na qual devemos olhar o paciente como um todo, avaliando não apenas a boca e os dentes, mas seu estado de saúde geral. Esta muitas vezes pode estar em risco pela falta de preparo de alguns profissionais para lidar com uma situação de emergência, expondo-se a vida de seus pacientes durante qualquer procedimento rotineiro. Conclusão O contato com vários pacientes possibilitou-nos um controle da saúde bucal. Criou-se um formulário para orientação e realização do exame clínico voltado à saúde bucal dos mesmos. Pôde-se verificar que a maioria dos pacientes estão deficientes no controle de saúde bucal; muitos pacientes internados possuíam próteses e as mesmas estavam deficientes quanto ao controle de higiene por deficiência do hospitalizado, por carência de motivação dos acompanhantes, por falta de material de higiene oral e por estrutura deficiente do hospital, como por exemplo a falta de um espelho no banheiro para possibilitar a visualização da completa remoção da placa bacteriana. A falta de higienização das próteses estava freqüentemente relacionada ao surgimento de candidíase. Esses pacientes foram orientados a uma higienização correta, a fim de controlar e reverter o quadro de candidíase; porém, outros não possuíam coordenação motora, nem mesmo um acompanhante capaz de manter a higiene bucal diária, o que complica o quadro clínico oral. Proporcionou-se toda assistência odontológica permitida possível, porém o tempo que tínhamos não era suficiente para um controle ideal de todos os pacientes das unidades trabalhadas. Existiam os pacientes que eram controlados e recebiam cuidados ideais dos Revista da ABENO • 6(1):49-53 Projeto “Odontologia Hospitalar” • Doro GM, Fialho LM, Losekann M, Pfeiff DN acompanhantes ou realizavam a sua higiene oral em padrões aceitáveis, porém esses faziam parte da minoria. O controle da placa bacteriana é muito importante nos pacientes internos do hospital, principalmente nos que possuem afecções sistêmicas. O uso da clorexidina tem sido recomendado em pacientes hospitalares na prevenção da doença periodontal quando, por algum motivo, a remoção mecânica da placa não pode ser realizada. O hospital carece de serviços odontológicos, principalmente para atuar na prevenção de doenças bucais e no controle das mesmas. O trabalho realizado durante o primeiro bimestre do ano de 2004 foi de grande valia para os acadêmicos de Odontologia, pois alcançou as expectativas esperadas pelos mesmos. O projeto permitiu, ainda, uma convivência direta durante 120 horas intercaladas com o Sistema Único de Saúde e com o ambiente hospitalar, proporcionando experiência no contato com pessoas sofredoras de doenças crônicas e muitas vezes terminais. Também não se deve esquecer da alegria proporcionada pelos acadêmicos a muitos pacientes e, por estes aos estudantes de Odontologia, não somente pelo serviço prestado, mas, muitas vezes, pelo simples fato de estarem lá convivendo. drugs and check vital signs. Concurrently, an assessment of the oral health of patients was carried out, as well as of how the hospital promoted oral hygiene among patients. The purpose of this study was to make dental practitioners aware of the importance of knowing first aid procedures, which are of fundamental importance for the life of patients. With regard to the hospital’s assessment, we observed that oral hygiene of the patients was not adequately practiced. Some patients were submitted to clinical examination, and it was observed that many of them wore prostheses, most of them inadequate ones. Some patients also presented candidiasis or other pathoses related to poor oral hygiene. The conclusions showed the need to give daily recommendations to hospitalized patients or even to hire a dentist to become part of the hospital’s staff. Descriptors Delivery of health care. First aid. Emergency treat­ ment. Dental service, hospital. Oral hygiene. § Referências bibliográficas 1. Brunetti RF, Montenegro FLB, Manetta CE. Interações entre a Medicina e a Odontologia. In: Brunetti RF, Montenegro FLB. Odontogeriatria - noções de interesse clínico. São Paulo: Artes Agradecimentos Agradecemos à direção do Hospital de Caridade e Beneficência de Cachoeira do Sul, aos pacientes e à toda equipe médica que acompanhou e colaborou para o andamento do projeto. Agradecemos também à 8ª Coordenadoria Regional de Saúde, pela doação de 50 escovas dentais, e a orientação prestada pelo Professor Dênis Pfeiff e pela enfermeira Janine ­Koepp. Médicas; 2002. p. 101-14. 2. Egbert B, Toledo C, Junior CR. Influências das condições sistêmicas sobre as doenças periodontais e das doenças periodontais sobre as condições sistêmicas. In: Tunes UR, Rapp GE. Atualização em periodontia e implantodontia. São Paulo: Artes Médicas; 1999. p. 31-55. 3. Genovese WJ, Junior JG. Sinais vitais. In: Genovese WJ.­ Metodologia do exame clínico em odontologia. 2ª ed. São Paulo: Pancast; 1992. p. 117-32. 4. Mussi NM. Técnicas fundamentais de enfermagem. São Paulo: Abstract The “Hospital Dentistry” Project During higher education, dental students learn various invasive procedures which may cause adverse reactions in patients. However, these students are not prepared to face these situations properly. This study reports a project carried out at the Hospital de Caridade e Beneficência de Cachoeira do Sul, whose purpose was to provide dental students with further theoretical knowledge and practice on first aid procedures. The project also taught students how to administer Atheneu; 1995. p. 29-35 e 123-37. 5. Peterson JL. Princípios da abordagem e prevenção das infecções odontogênicas. In: Peterson JL. Cirurgia oral e maxilofacial contemporânea. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000. p. 389-411. 6. Sonis ST, Fazio RC, Fang L. Hipertensão. In: Sonis ST, Fazio RC, Fang L. Princípios e prática de medicina oral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1996. p. 37-45. Revista da ABENO • 6(1):49-53 Aceito para publicação em 06/2005 53 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia Há exigüidade de modelos de ensino que tragam os discentes à compreensão da realidade de seus pacientes. O uso da problematização permitiu aos discentes ver a pessoa que tratam, com seus componentes socioculturais. Rodrigo Otávio Moretti Pires*, Sonia Maria Villela Bueno** *Doutorando da Universidade de São Paulo. E-mail: [email protected]. **Professora Livre-Docente/Associada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. RESUMO No presente trabalho os autores investigam resumidamente o desenvolvimento da odontologia e de seu ensino. Discorrem sobre o perfil do cirurgião-dentista atual e a ineficácia de sua atuação frente às demandas populacionais. Como experiência pedagógica, promoveu-se, em 5 dias e utilizando três períodos em cada, um curso intensivo de capacitação em Saúde da Família a alunos do terceiro e quarto anos de uma Faculdade de Odontologia particular do interior do Estado de São Paulo. Ao final do curso, os alunos responderam a um questionário semi-estruturado e avaliaram as diferenças, vantagens e desvantagens do uso no ensino de Odontologia do modelo tradicional e do modelo da problematização preconizado por Freire6 (1996). Descritores Educação em Odontologia. Aprendizagem baseada em problemas. A odontologia caracterizou-se ao longo de sua história por um modelo de ensino técnico, desenvolvido a partir de 1919, e que falha na busca de alternativas7. A partir da criação e consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS), este modelo de ensino eviden54 ciou-se como não-resolutivo em relação às demandas populacionais, já que imbui a atuação dos cirurgiõesdentistas em uma prática curativista e focada no momento do atendimento clínico, e não no atendimento do paciente integrado em seu todo12. Em contraparte, a própria categoria dos cirurgiões-dentistas não despertou para essas questões das demandas populacionais e para o largo campo de atuação que mostra a saúde pública, a qual necessita não apenas da prática, mas também de reflexões sobre novos modelos de aplicação da Odontologia que se mostrem efetivos. Esse contexto vem ao encontro de considerações teóricas que conceituam a Odontologia em crise atualmente. Esse panorama é amplamente apontado na literatura, com perda das características que garantiam a identificação dos CDs como genuínos profissionais liberais de saúde, acrescida à referida ineficácia em relação à população e à ausência de reflexões sobre o contexto que permeia atualmente a categoria11. As considerações sobre a inadequação da proposta da odontologia como prática social atingem diretamente outros campos do conhecimento como sua participação em pesquisa científica e a bioética. Nesse pensamento, Susin, Rösing14 (1999) afirmam que a odontologia, em seu modelo tradicional, “por muitos Revista da ABENO • 6(1):54-60 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia • Pires ROM, Bueno SMV anos, relegou a base científica por ela produzida a um segundo plano”. Amorim1 (2002), ao pensar sobre a questão da bioética na formação do odontólogo, afirma que a categoria “(...) precisa parar e refletir para melhor delimitar qual o seu papel como ciência da saúde, dentro do conceito amplo de saúde”. Freitas7 (2001) afirma que na Odontologia brasileira até os dias atuais predominou a prática empírica em detrimento da ciência, sendo reflexo do individualismo vinculado ao exercício com ausência de enfoque para a atenção coletiva. Esse enfoque individualista e centrado no cirurgião-dentista traduz-se na prática clínica dos consultórios particulares, com um caráter prático emergencial e curativo; com características que primam pelas especialidades ao invés de objetivar o caráter generalista do ser humano. Tais características são corroboradas por Zanetti16 (1999), que aponta a origem na história da Odontologia brasileira e, como conseqüência, no próprio modelo de ensino utilizado no corpo de disciplinas das Faculdades de Odontologia do país, que não lega aos acadêmicos a visão das questões societárias e de valores humanísticos, tornando-os despreparados para o enfrentamento destes que permearão seu dia-a-dia após a graduação. A inserção do cirurgião-dentista no mercado de trabalho atual foi o tema de investigação de Moretti Pires11 (2005). Nessa pesquisa, o autor se deparou com inúmeros dados qualitativos que apontaram para a não capacitação desses profissionais para lidar com questões sociais e coletivas ligadas também à humanização do atendimento em saúde. Ao final do trabalho ficava o questionamento de como ter um cirurgiãodentista em um modelo enfocado na prática coletiva na sociedade capitalista atual, porque, antes de serem profissionais, trata-se de cidadãos modulados e moduladores da sociedade em que vivem11. Para Mello10 (2004), o acadêmico em odontologia demonstra não ter maturidade ou visão social, considerando que os problemas de caráter sanitário e sócioeconômico não lhe competem e não se identifica com os problemas dos estratos sociais menos favorecidos economicamente, mesmo que os pacientes que atenda no ambiente universitário sejam oriundos predominantemente desses estratos. O Ministério da Saúde tem preconizado a adoção do Programa Saúde da Família como estratégia de remodelação da assistência básica no que se refere ao talhe de atendimento tradicional. O presente trabalho pretende debater a experiência da utilização da problematização como modelo alternativo para o ensino dos princípios do Programa Saúde da Família aos alunos do curso de odontologia. Considerações sobre o uso da problematização Em 1975, Freire6 aponta na primeira edição de seu trabalho “A pedagogia do Oprimido” para a necessidade de revisão dos modelos pedagógicos empregados no Brasil, na direção da humanização da educação. Segundo Freire6 (1996), a tomada da pedagogia humanizadora como caminho é a única forma de se cumprirem os reais papéis da educação, já que essa se traduz numa prática pedagógica em que o método deixa de ser instrumento educador e deixa de manipular os educandos para os fins de quem planeja o ato educativo, com o objetivo de despertar nos alunos a própria consciência sobre os assuntos com os quais trabalhará, respeitando-se inclusive os conhecimentos e as vivências pregressas dos mesmos. Sobre o modelo tradicional de ensino, chamado por Freire6 (1996) de concepção “bancária” da educação, o autor declara que o educador tem um papel exclusivo de narrador/dissertador da verdade e dos fatos que deseja transmitir aos educandos. Segundo Freire6 (1996), o diálogo e a problematização são fundamentos da educação, e o trabalho do educador sobre o conteúdo programático não se pauta em uma “doação ou uma imposição – um conjunto de informes a ser depositado nos educandos –, mas na devolução organizada, sistematizada e acrescentada ao povo, daqueles elementos que este lhe entregou de forma inestruturada”. Pelo discutido na revisão da literatura, depreendese que a formação puramente técnica em Odontologia, tal como instituída nas Instituições de Ensino Superior, focaliza o ensino de maneira divergente, na medida em que o objetivo final, a formação profissional, modula o processo até o educando; Freire6 (1996) apresenta que o processo deve ser o inverso, ou seja, parte-se de quem está aprendendo, de seus conhecimentos pregressos para então se chegar à finalidade da formação educacional. O importante, do ponto de vista de uma educação libertadora, e não “bancária”, é que “os homens se sintam sujeitos de seu pensar, discutindo o seu pensar, a sua própria visão do mundo, manifestada implícita ou explicitamente, nas suas sugestões e nas de seus companheiros”. Em seu trabalho “A pedagogia da autonomia”, Freire5 (1996) aponta que “a ampliação e a diversificação das fontes legítimas de saberes é o saber-serpedagógico”, primando pela valorização dos conteú- Revista da ABENO • 6(1):54-60 55 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia • Pires ROM, Bueno SMV dos e das realidades trazidas no processo de educação pelos educandos, e buscando colocar professores e alunos em pé de igualdade no processo mencionado. Freire5 (1996) vê assim constituída uma “prática docente enquanto dimensão social da formação humana” e não como um simples transmitir de técnica e idéias. METODOLOGIA A procura pelos autores por uma Faculdade de Odontologia particular do interior do Estado de São Paulo para a realização de um curso de capacitação de uma semana em Programa Saúde da Família despertou a idéia do uso da problematização nesse processo de ensino, na medida em que esta estratégia do Ministério da Saúde visa a modificação de paradigmas implicados nos serviços públicos de saúde, como referido anteriormente na introdução. Aos discentes da referida Faculdade foi oferecida a possibilidade de participação no curso, devendo voluntariamente inscrever-se para o mesmo. Esses discentes tiveram que se deslocar cerca de 250 km para a cidade em que se ministrou o curso. Foram 10 alunos (8 mulheres e 2 homens), com idade variando entre 20 e 27 anos, cujas origens culturais os dividem entre os seguintes estados: duas alunas de Goiás, uma do Mato Grosso e os demais do estado de São Paulo. O curso foi estruturado em cinco dias, compreendendo atividades intensivas nos três períodos, ou seja, manhã, tarde e noite, conforme a necessidade de serem trabalhados todos os aspectos do Programa Saúde da Família. Atividades de capacitação teórica e vivência prática se alternaram ao longo do curso. Quanto a capacitação teórica, os temas desenvolvidos foram os seguintes: 1.Determinantes e condicionantes da saúde. 2.Aspectos epidemiológicos em Saúde na Comunidade. 3.Documentos de referência em promoção de saúde – Conferência de Alma Ata, Carta de Ottawa, Declaração de Jacarta. 4.Processo saúde-doença. 5-Conceitos de saúde e doença. 6.Aspectos sociológicos do indivíduo, da família e da saúde. 7.Aspectos antropológicos do indivíduo, da família e da saúde. 8.Mudança do foco da doença para a saúde. 9.Histórico da saúde pública no Brasil. 10. Construção do Sistema Único de Saúde. 11. A estratégia da Saúde da Família. 12. As determinantes econômicas e políticas em saú56 de. Essa capacitação teórica se deu na forma de debate sobre todos os temas, incluindo o uso de dinâmicas de grupo (baseados na metodologia da pesquisa-ação de Kurt Lewin), a programação de situações hipotéticas que levavam ao exercício dos princípios trabalhados e a confecção de questionários para investigação pormenorizada por parte dos alunos da realidade da vivência prática em PSF. No que se refere à vivência prática, deu-se de duas formas: 1.A aplicação dos questionários de entrevistas aos usuários do PSF, às Agentes Comunitárias de Saúde, ao Gestor Municipal, ao Presidente da Câmara e a um Vereador (Legisladores) e a um líder religioso. 2.Visita a Unidades de Saúde da Família para perceber o cotidiano das mesmas. As respostas dos questionários foram organizadas de forma que cada dupla de alunos confeccionou um trabalho de conclusão do curso, discorrendo e analisando com base na literatura científica atual as falas e os entendimentos dos entrevistados sobre o processo saúde-doença e seus determinantes, apresentando esse trabalho para todo o grupo. O momento final do curso resgatou as idéias trabalhadas através de um debate, e os alunos responderam de maneira escrita e sem identificação a um instrumento, que lhes propunha as seguintes questões: 1.Compare as diferenças entre o modelo tradicional de ensino e o modelo da problematização, empregado neste curso. 2.O que você absorveu deste curso? 3.O que faltou neste curso? Foi explicado que poderiam deixar de responder a uma ou mais questões, se assim desejassem. As respostas foram lidas em profundidade e categorizadas pelos autores, posteriormente analisadas conforme a literatura científica vigente. Os achados Quando comparados o modelo de ensino tradicional e o problematizador, a satisfação em aprender e a concentração durante as atividades de ensino foram apontadas pelos alunos como fatores implicados com certa vantagem do modelo problematizador sobre o tradicional. “O modelo tradicional dá sono, não prende a atenção dos alunos. Concentração é um dos principais fatores que fazem da problematização ser um modelo de ensino infinitamente mais válido que o modelo tradicional.” (aluno 2) Revista da ABENO • 6(1):54-60 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia • Pires ROM, Bueno SMV “No (modelo) que foi utilizado no curso, por ser na forma deixou tudo mais fácil na discussão, porque se fosse o con- de debates, o aluno presta mais atenção e também faz co- trário, alguém autoritário, não resolveria o problema, não mentários. O modelo tradicional é cansativo, tendo muita seria interessante. A falta de discussão impede o professor dispersão dos alunos e raramente participação durante as (do modelo tradicional) de saber se o aluno está ou não aulas (ensino).” (aluno 3) prestando atenção. A problematização é completamente o contrário.” (aluno 2) “Na faculdade, nossa atenção às vezes fica muito dispersa. As aulas são cansativas e na maioria das vezes só prestamos “No modelo tradicional nós temos menos liberdade de atenção mesmo nos 30 minutos iniciais. Neste curso foi expressão.” (aluno 6) melhor, pois todo mundo expressava suas opiniões e se interessava mais no assunto e em saber cada vez mais, e não “O método utilizado neste curso, para mim, foi de grande foi cansativo.” (aluno 4) importância. Acredito que eu absorvi bastantes informações sem ter que ficar ouvindo um professor dar uma aula “Este método de aplicação nos faz realmente entender o assunto abordado. No método da faculdade muitas vezes nós apenas lemos e decoramos e no outro dia já esquecemos todo o conteúdo. Na minha opinião, este método do curso nos faz realmente aprender, nos faz ler, nos faz debater e interagir, assim nos chamando a atenção para o assunto e assim realmente entendemos o tema.” (aluno 7) “O modelo tradicional tem uma metodologia às vezes cansativa.” (aluno 8) Ainda sobre a diferença entre os modelos, é apresentado que a problematização possibilita a inserção do aluno no tema trabalhado e do tema entre os alunos, o que é fundamental no processo educativo. “A problematização possibilita maior compreensão, devido à forma de como discutir o trabalho, aprender a trabalhar em grupo.” (aluno 5) seqüencial sem interação com os alunos.” (aluno 7) “Você (referindo-se ao docente) foi um grande amigo. Você me fez ver outra realidade. Aprendi mais do que em um ano de aulas.” (aluno 9) A importância de se tomar prática real como referência no processo de ensino se tratou de um achado importante no âmbito desta experiência pedagógica. “Acredito que absorvi a maioria dos conceitos sobre PSF, UBS, Saúde Pública, Paciente, Profissional, Equipe. Entendi e vi de perto tudo isso e como se aplica mudando quase que drasticamente todos os meus conceitos sobre saúde pública.” (aluno 2) “Absorvi como é o PSF, como os profissionais devem agir, o que a população necessita, o que falta no atendimento nas UBS e no PSF.” (aluno 3) “Normalmente não temos o costume de interagir com os outros colegas, às vezes ficando em dúvida sobre algum assunto. Neste modelo é muito mais fácil, pois possibilita a “Ah, muita coisa e não caberia aqui.” (aluno 4) todos ter mais expressão e ser ajudado pelos outros como “Aprendi como interagir em grupo, a realidade da Saúde uma equipe.” (aluno 6) Pública e como podemos ser mais humanos.” (aluno 6) A democracia no ensino, possibilitando ao aluno a interação com o processo também foi ressaltada como fator importante nesse processo de educação problematizadora. Inclusive o fato de o educador e os educandos estarem no mesmo nível no processo foi apresentado como facilitador e como uma das grandes vantagens da problematização. “O conceito sobre humanização, a coletividade, o aprendizado, e o mais importante, que, na minha opinião, é a interação entre as pessoas, saber respeitar a individualidade do outro. Realmente absorver o que é necessário.” (aluno 7) “Com este curso eu descobri meu interesse na saúde pública, aprendi muita coisa em relação à população, ao funcio- “Outro ponto que me agradou bastante foi o direito de namento das UBS e do PSF, mudei meu conceito a respei- falar, dar minha opinião em todos os momentos do curso. to dos profissionais do serviço público. Enfim, este curso Trabalhar com um professor que pensa como nós, alunos, foi essencial para minha formação.” (aluno 8) Revista da ABENO • 6(1):54-60 57 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia • Pires ROM, Bueno SMV “Nem tudo é igual ao que eu imaginava, às vezes ficamos no 8) presos apenas no que escutamos, no que achamos, mas na realidade é muito diferente e eu pude perceber que eu “O modelo tradicional procura tratar doença ou até mesmo adoro a odontologia, as pessoas. Eu vi que a realidade do prevenir, em um indivíduo, visando o lucro.” (aluno 10) Brasil é muito diferente.” (aluno 9) “Acho que estou saindo conhecendo mais a realidade do que é de verdade o PSF.” (aluno 10) Apesar da carga horária intensiva, através de atividades em cinco dias e três períodos para cada um destes, o prazer e a satisfação dos alunos nesta experiência de ensino fica evidente conforme os depoimentos abaixo relatados, os quais são respostas ao questionamento sobre o que faltou no curso. Segundo os depoimentos, o uso da metodologia empregada no curso mudou a compreensão de saúde e dos pacientes, na medida em que enfoca a visão do ser humano integral, não apenas a relação profissional-paciente, mas também a relação docente-discente. “O curso tem a idéia mais de prevenção, de saber o todo do indivíduo, para assim agir para uma saúde adequada.” (aluno 1) “Possibilita poder ver melhor a realidade, conhecer as pes- “Para mim, não faltou nada.” (aluno 1) soas de uma maneira geral. Uma visão maior de como “Mais tempo para este curso. Adorei.” (aluno 2) acontece a saúde pública.” (aluno 5) “Nada.” (aluno 3) “Esse tipo de aprendizagem é ótimo e poderia ser implantado em nossa faculdade.” (aluno 9) “Difícil dizer, pois adorei.” (aluno 4) “O modelo utilizado no curso visa tratar um indivíduo como “Na minha opinião não faltou quase nada, apenas um pou- um todo, ouvir suas reclamações e saber resolver seus pro- co mais de tempo, pois é muito bom falar sobre saúde pú- blemas mesmo que estes não sejam propriamente ditos de blica ainda mais desta maneira, que não é cansativa.” (alu- nossa área.” (aluno 10) no 6) “É um método com prazer, ‘aprender com prazer’.” (aluno 7) “O modelo da problematização para mim não tem defeitos, O modelo de odontologia trabalhado na Faculdade foi questionado pelos alunos, ficando evidente assim sua percepção da necessidade de um modelo realmente resolutivo e voltado à população brasileira. porque aprendemos de maneira dinâmica e há interação “Na faculdade agimos com uma ação curativa, muito me- em grupo.” (aluno 8) cânica, clínica, não envolvendo o emocional. Para ter uma Em diversas composições, os participantes desta pesquisa apontaram que o modelo tradicional de ensino em odontologia enfoca o atendimento ao paciente de modo reducionista, implicando um atendimento parcializado e sem o entendimento do ser humano como algo além do tratamento dentário. “Na faculdade somos ensinados a apenas atender o paciente, não sabendo o motivo que realmente o faz estar lá, o psicológico dele, a família, o ambiente social em que vive.” (aluno 1) “O modelo tradicional de ensino, como defeito, nos ensina apenas como tratar o paciente-doença, não a pessoa. Conseguimos aprender apenas o mínimo necessário.” (alu- 58 saúde adequada necessitamos prevenir e não tratar o paciente como uma parte, e sim como um todo. Assim vamos ajudar a saúde do país e a melhorar a situação e condição do modo de vida do país.” (aluno 1) DISCUSSÃO A literatura existente sobre o modelo de ensino em odontologia é de certa maneira escassa. Ao investigar sobre os motivos que levam os Cirurgiões-Dentistas a optarem pela profissão, Marcelino8 (2000) verificou que o fato de o CD ser encarado como um profissional liberal é preponderante na categoria. No entanto, a mesma autora afirma que a prática liberal na odontologia está gradativamente se tornando “prática assalariada, na qual a liberdade de atuação Revista da ABENO • 6(1):54-60 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia • Pires ROM, Bueno SMV profissional é limitada, uma vez que (...) passa a ser regida por uma lógica de produção”8. O estudo de Mello10 (2004) sugere que no processo de aprendizado em odontologia há maior ênfase na técnica em si do que propriamente no paciente que está sendo atendido. Neste tocante, Valença15 (1998) comenta que os cirurgiões-dentistas abordados em seu trabalho demonstraram dificuldade em se relacionar com o paciente e preocupação com a deficiência de capacitação em psicologia enfocada nesse tema. Figueiredo4 (2002) aponta que na formação do cirurgião-dentista o paciente não é percebido em sua individualidade e “muito menos em sua subjetividade”, por se enfocarem aspectos puramente biológicos, deixando-se de lado os aspectos socioculturais e antropológicos. Segundo Mello10 (2004), a formação acadêmica em odontologia é deficitária na medida em que “não aconteceu, até então, interação entre alunos, professores e coordenadores de curso para que reflitam juntos sobre os problemas que acreditam que estejam ocorrendo na formação em odontologia”. Em relação à Odontologia, o Ministério da Saúde estabelece que a inserção da Equipe de Saúde Bucal no Programa Saúde da Família tem como finalidade maior colocar em prática: “caráter substitutivo das práticas tradicionais exercidas nas unidades básicas de saúde” (Brasil, 2001, anexo I, item C, subitem I); “definição da família como núcleo central de abordagem” (Brasil, 2001, anexo I, item C, subitem V); “humanização do atendimento” (Brasil, 2001, anexo I, item C, subitem VI); “educação permanente dos profissionais” (Brasil, 2001, anexo I, item C, subitem IX); “ações de promoção e prevenção no âmbito da saúde bucal planejadas e desenvolvidas de forma interdisciplinar” (Brasil, 2001, anexo I, item D, subitem 8)2. No entanto, todas as atribuições estabelecidas por esse documento à equipe de saúde bucal, ou seja, cirurgião-dentista, técnico de higiene dental e auxiliar de consultório dentário, em nada diferem das atribuições que lhes são competentes na prática clínica tradicional, comparando-se as mesmas ao que é estabelecido pela legislação vigente3. Nessa linha de pensamento, Sobrinho, Sousa13 (2002) afirmam que a formação profissional brasileira da atualidade, mesmo quando objetivando estratégias como o Programa Saúde da Família, promove uma visão descontextualizada da realidade brasileira. Segundo os autores, há contradições entre as instituições de ensino superior, os serviços de saúde e as co- munidades, ainda sendo mantido o enfoque de atenção curativa, individual, com centralidade na doença, havendo certo desconhecimento da realidade e do contexto social das famílias por parte dos profissionais de saúde. Essas disparidades também são apontadas pelo estudo de Markman Neto9 (2004), que investigou o processo de trabalho no Programa Saúde da Família. O autor questiona “a legitimidade que um modelo de atenção pode ter, quando não proporciona soluções adequadas à garantia da oferta de serviços, (...) como rezam os princípios de integralidade e hierarquização preconizados pelo PSF”. Esse autor pontua que “uma coisa é a idealização de um determinado projeto de saúde, outra coisa, não obstante, é a sua prática cotidiana”, ressaltando que “a equipe vive o seu cotidiano entre um modelo ainda hegemônico e uma tentativa de modificá-lo, construindo na prática um apanhado entre o que se tem e o que se pretende”9. A problematização como modelo para o ensino odontológico não tem referencial na literatura pesquisada. Conforme os achados da presente pesquisa, o tema do Programa Saúde da Família é aplicável a essa forma pedagógica. Conforme Freire5 (1996), apesar da facilidade e da “tentação” de se enveredar o ensino pelos caminhos mais empregados, há ganhos reais na problematização, na medida em que lidamos com “mulheres e homens, seres histórico-sociais, nos tornamos capazes de comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de romper”. Isso possibilita a apropriação do tema para si mesmo, conforme ocorreu com os alunos da presente experiência pedagógica. O equilíbrio entre a teoria e a prática, assim como o cuidado em não torná-los radicais, é discutido por Freire5 (1996), que afirma que a “reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação Teoria/ Prática sem a qual a teoria pode ir virando blábláblá e a prática, ativismo”. Nesse pensamento, a experiência pedagógica presente apresentou a possibilidade de interação assim como a interdependência entre a carga teórica e a carga prática. Não obstante, a maneira de se trabalhar ambas deve aproximar a teoria da vivência real e a prática da confirmação/negação da primeira. Como diz Freire5 (1996) “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”. CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo do presente trabalho foi em certa medida ampliar a visão do processo ensino-aprendizado Revista da ABENO • 6(1):54-60 59 A problematização como modelo para ensino universitário: uma experiência piloto com alunos do 3º e 4º anos do curso de odontologia • Pires ROM, Bueno SMV tradicional. Como tal, a revisão da literatura denunciou prática distanciada da necessidade das populações. Em contrapartida, a experiência pedagógica com o uso da problematização apropriou-se de uma dimensão em que os discentes terminaram seu curso afirmando ver a pessoa que tratam, com seus componentes socioculturais. A literatura aponta que há exigüidade de modelos de ensino que tragam os discentes à compreensão da realidade de seus pacientes. Em certa medida, a problematização cumpre essa função. Os autores acreditam ser possível a utilização desse modelo em todas as disciplinas dos diversos cursos de saúde, apesar de haver necessidade de maiores investigações acerca dessa possibilidade e da aplicabilidade da mesma. ABSTRACT Problem analysis as a model for higher education: a pilot experience with students of the 3rd and 4th years of dental school In the present work the authors carry out a brief investigation of the development of dentistry and of dental education. They discuss the profile of today’s dentists and their ineffectiveness to meet the population demands. As a pedagogic experience, an intensive course on family health was given to train students of the third and fourth years of the dental course of a private school in a countryside town of the State of São Paulo, Brazil. The course was given during 5 days, in three dayly periods. At the end of the course, the students answered a semi-structured questionnaire and evaluated the differences, advantages and disadvantages of the use of a traditional model versus the problem-analysis model proposed by Freire6 (1996) in the teaching of Dentistry. de saúde bucal e formação profissional: o que pensam estudantes de odontologia [Dissertação de Mestrado]. Rio de Janeiro: Núcleo de Tecnologia Educacional para Saúde da UFRJ; 2004. 5. Freire P. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra; 1996. 6. Freire P. Pedagogia do oprimido. 2ª ed. São Paulo: Paz e Terra; 1996. 7. Freitas SFT. História social da cárie dentária. Bauru: EDUSC; 2001. 8. Marcelino G. Avaliação do perfil profissional e percepção social de cirurgiões-dentistas do município de Araçatuba – SP frente aos avanços ocorridos na odontologia às vésperas do século XXI [Dissertação de Mestrado]. Araçatuba: Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho”; 2000. 9. Markman Neto L. Políticas de Saúde, Sistema Único de Saúde e a prática do Programa de Saúde da Família num núcleo específico: limites e desafios [Dissertação de Mestrado]. Ribeirão Preto: Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP; 2004. 10. Mello ACF. Mercado de trabalho, política de saúde bucal e formação profissional: o que pensam estudantes de odontologia [Dissertação de Mestrado]. Rio de Janeiro: Núcleo de Tecnologia Educacional para Saúde da UFRJ; 2004. 11. Moretti Pires RO. A Mercantilização da Saúde: o trabalho de cirurgiões-dentistas em um contexto de mudanças – estudo com cirurgiões-dentistas assalariados do município de Ribeirão Preto (SP) [Dissertação de Mestrado]. Ribeirão Preto: Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP; 2005. 12. Portillo JAC. A inserção da odontologia no S.U.S. – avanços e dificuldades [Tese de Doutorado]. Brasília: Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília; 1998. 13. Sobrinho A, Sousa MF. A tarefa: apagar os sinais vermelhos do PSF. In: Sousa MF (org.). Os sinais vermelhos do PSF. São Paulo: Hucitec; 2002. p. 155-70. Descriptors Education, dental. Problem-based learning. § 14. Susin C, Rösing CK. Praticando odontologia baseada em evi- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 15. Valença AMG. A educação em saúde na formação do cirurgião- dências. Canoas: Ulbra; 1999. 1. Amorim KPC. Nos Labirintos da Vida - a (bio)ética na formação dentista (1998) apud Mello ACF. Mercado de trabalho, políti- de odontólogos (a visão de docentes) [Dissertação de Mestra- ca de saúde bucal e formação profissional: o que pensam estu- do]. Natal: Centro de Ciências da Saúde da Universidade Fe- dantes de odontologia [Dissertação de Mestrado]. Rio de deral do Rio Grande do Norte; 2002. Janeiro: Núcleo de Tecnologia Educacional para Saúde da 2. Brasil. Portaria nº 267, de 06 de março de 2001. Diário Oficial UFRJ; 2004. 16. Zanetti CHG. A crise da Odontologia brasileira: as mudanças da União, Brasília, 2001. 3. Conselho Federal de Odontologia. Consolidação das normas estruturais do mercado de serviços e o esgotamento do modo para procedimentos nos conselhos de odontologia. Rio de Ja- de regulação Curativo de Massa. Ação Coletiva 1999;2(3):11- neiro: Conselho Federal de Odontologia; 1997. 24. 4. Figueiredo GO. Do fetichismo odontológico à utopia da saúde bucal (2002) apud Mello ACF. Mercado de trabalho, política 60 Revista da ABENO • 6(1):54-60 Aceito para publicação em 10/2005 Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para formação humanística, social e integrada As atividades extramuros abrem à convivência e à interação das universidades com as comunidades, e familiarizam e capacitam os estudantes a trabalhar na realidade que enfrentarão no mercado de trabalho. Regina Ferraz Mendes*, Marcoeli Silva de Moura**, Raimundo Rosendo Prado Júnior***, Lucia de Fatima Almeida de Deus Moura****, Gilberto Pires Lages*****, Maricel Pires Ribeiro Gonçalves***** *Coordenadora do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Piauí. E-mail: [email protected]. **Professora do Estágio Supervisionado em Odontologia da Universidade Federal do Piauí. ***Coordenador do Estágio Supervisionado em Odontologia da Universidade Federal do Piauí. ****Professora da Clínica Infantil da Universidade Federal do Piauí. *****Professores do Estágio Supervisionado em Odontologia da Universidade Federal do Piauí. Resumo As Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Odontologia e a incorporação do cirurgião-dentista (CD) no Programa de Saúde da Família (PSF) tornaram imprescindíveis mudanças e/ou adequações do ensino da Odontologia para adaptar o currículo do curso ao perfil do profissional exigido pelo mercado de trabalho. Muita ênfase tem-se dado à formação do CD com base social, econômica, política e cultural do Brasil, valorizando-se novamente o clínico geral. Dessa forma, estando a Universidade Federal do Piauí em um dos estados mais carentes do Brasil, durante o curso de Odontologia, tem-se buscado mostrar ao acadêmico as carências e as necessidades da população que será por ele assistida. As especialidades inseridas no Estágio Supervisionado (ES) se integram, na medida do possível, para que o paciente seja atendido como um todo, não individualizando cada uma das suas necessidades. Nesse contexto, os alunos do último período do curso são envolvidos em atividades intra e extramuros, para que tenham oportunidade de presenciar e vivenciar a realidade das comunidades. Descritores Estágio clínico. Ensino superior. Educação em Odontologia. Odontologia geral. Odontologia em Saúde Pública. A partir da publicação das Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Odontologia2 e da incorporação do Cirurgião-Dentista (CD) no Programa Saúde da Família5 (PSF), criando uma grande alternativa no mercado de trabalho, fortaleceram-se as necessidades de novas estratégias de atuação nos currículos dos cursos de Odontologia. Em resposta às exigências das Diretrizes acima referenciadas, os estudos para a implementação do novo Currículo na Universidade Federal do Piauí (UFPI) estão adiantados. Entretanto, os processos de elaboração, aprovação e implementação são demorados e, Revista da ABENO • 6(1):61-5 61 Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para formação humanística, social e integrada • Mendes RF, Moura MS, Prado Júnior RR, Moura LFAD, Lages GP, Gonçalves MPR para que os atuais alunos se familiarizem com esse novo perfil, está sendo realizada uma adequação do atual currículo. Dessa forma, com o objetivo de oferecer uma formação acadêmica voltada para a solução dos reais problemas de saúde bucal da comunidade, os alunos do último período do curso estão sendo envolvidos em atividades intra e extramuros, através do Estágio Supervisionado (ES) em Odontologia e de um projeto de extensão universitária de atenção materno-infantil. A extensão universitária é a via de comunicação da universidade com seu meio. Ela visa levar, por um lado, às comunidades carentes, o desenvolvimento e a aplicação da pesquisa e do ensino realizados em seus departamentos acadêmicos, buscando modificar realidades e melhorar a qualidade de vida das populações assistidas. Por outro lado, ao se deslocar, abre-se à convivência e à interação com essas comunidades e se constrói um conhecimento que muitas vezes lhe é estranho, por não ser produzido nos moldes acadêmicos, mas que, com toda certeza, dará maior pluralidade e flexibilidade à pesquisa e ao ensino que ali se constróem4. Assim é que, além da qualificação técnica e profissional, pretende-se que o aluno seja capaz de enfrentar situações muitas vezes insípidas de trabalho, de maneira otimista e consciente de que ele pode ser o diferencial entre o atendimento odontológico humanizado e voltado para a Promoção da Saúde e aquele meramente restaurador e, às vezes, mutilador. É fundamental que se tenha consciência também da chance de ser um agente de transformação das atitudes de profissionais mais experientes e, muitas vezes, com menor possibilidade de atualização técnico-científica. Metodologia de ensino e atuação clínica O principal objetivo do Estágio Supervisionado é a qualificação prática dos graduandos do curso de Odontologia, dando oportunidade ao aluno de ter visão real de seu futuro ambiente de trabalho. Neste ele poderá pôr em prática os conhecimentos adquiridos nas disciplinas anteriormente cursadas e desenvolver sua capacidade de diagnóstico, planejamento de tratamento e execução de trabalhos, através de uma visão integralizada, a fim de atender todas as necessidades do paciente; além disso, não esquece que o planejamento deve estar dentro da realidade socioeconômica e cultural de cada indivíduo. O Estágio Supervisionado do curso de Odontologia da UFPI envolve alunos em atividades cognitivas, 62 afetivas e de domínio psicomotor, todas realizadas sob a supervisão de professores; também possibilita a integralização e implementação do conhecimento adquirido nas disciplinas da grade curricular, permitindo ao aluno uma visão holística de seu futuro campo de atuação. Além das atividades desenvolvidas dentro das clínicas da Universidade, foram implementadas duas atividades extramuros, visando aproximar o estudante dos problemas bucais enfrentados pelas comunidades, através de convênios entre a UFPI e o Governo do Estado e a UFPI e a Prefeitura Municipal. Atividades intramuros Dentro da Universidade, os alunos do estágio supervisionado, no último período do curso, fazem atendimentos nas clínicas integradas adulto e infantil, não sendo permitida a matrícula em outras disciplinas. Atividades desenvolvidas na Clínica Integrada de Adultos Os pacientes atendidos na Clínica de Diagnóstico Bucal são encaminhados para a clínica integrada segundo a necessidade de tratamento. Para os alunos do último período, procura-se selecionar aqueles que apresentem necessidades múltiplas e complexas, com o objetivo principal de consolidar a necessidade, a importância e a execução de um plano de tratamento integrado e seqüencial para a resolução das necessidades do paciente. Para tanto, os alunos são orien­ tados em todos os níveis de atenção à saúde bucal, desde a promoção da saúde até a realização de pro­ cedimentos de diagnóstico, periodontais, restauradores, endodônticos e cirúrgicos. Ênfase especial sempre é dada para o aspecto humanístico, pois a comunidade atendida é extremamente carente. Dessa forma, o aluno atua como um clínico geral. Atividades desenvolvidas na Clínica Integrada Infantil O objetivo geral é transmitir aos alunos conhecimentos sobre os aspectos físicos, psíquicos e biológicos da criança, bem como orientá-los na execução de atividades clínicas odontológicas relacionadas ao atendimento integral da mesma, buscando otimizar o nível de saúde bucal. As crianças atendidas na Clínica Integrada Infantil são aquelas que, no momento dos exames de triagem, apresentam maior grau de complexidade nas necessidades de tratamento. Os pacientes são classificados de acordo com o risco e/ou a atividade de cárie; posteriormente são agendados e atendidos seguindo-se Revista da ABENO • 6(1):61-5 Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para formação humanística, social e integrada • Mendes RF, Moura MS, Prado Júnior RR, Moura LFAD, Lages GP, Gonçalves MPR protocolos embasados na recuperação, promoção e educação em saúde, considerando-se a integralidade das ações e a integração entre as diversas áreas do conhecimento. Atividades extramuros Atendimento de gestantes Através de convênio firmado entre a UFPI e o Governo do Estado do Piauí, foi implantado, no Instituto de Perinatologia Social do Piauí (IPSP), o programa de extensão universitária – Programa Preventivo para Gestantes e Bebês (PPGB). O aluno faz diariamente orientações sobre a saúde bucal da gestante e do bebê e atendimento clínico a gestantes (Figura 1), sob supervisão de um docente. No PPGB, proporcionam-se condições para que alunos do estágio supervisionado planejem e executem atendimento clínico integral às gestantes atendidas no IPSP, vislumbrando, com os procedimentos, a adequação do meio bucal e possibilitando à clientela atendida o desenvolvimento da função mastigatória e a minimização das chances de contaminação precoce da boca do bebê, tendo em vista que a transmissão da microbiota cariogênica é feita de forma vertical1. Após anamnese e exame clínico, determina-se risco/atividade de cárie das pacientes gestantes, e o plano de tratamento é traçado segundo as necessidades detectadas e a indicação dos procedimentos em função do estado gestacional. Esse “pré-natal odontológico” incrementa o conhecimento sobre as atitudes e os tipos de tratamentos restauradores, periodontais, cirúrgicos e endodônticos aos quais as pacientes gestantes podem ser submetidas e as formas de fazê-los. Desmistifica-se, assim, a premissa de que “os dentes de mulheres grávidas são mais fracos” e também de que há impedimentos à realização de procedimentos odontológicos durante a gestação. No consultório odontológico instalado dentro do IPSP, são executados procedimentos educativos, restauradores, periodontais e endodônticos. Quando há necessidade e possibilidade de intervenções cirúrgicas, estas são agendadas para serem realizadas na clínica de cirurgia odontológica instalada dentro do Hospital Universitário, local onde as pacientes serão atendidas também por alunos do Estágio Supervisionado. As Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal7 orientam o encaminhamento da gestante, ao iniciar o pré-natal médico, para uma consulta odontológica, por considerar que a mãe tem um papel fundamental nos padrões de comportamento apreendidos durante a primeira infância. Assim sendo, ações educativo- Figura 1 - Atendimento clínico à gestante no Instituto de Perinatologia da Maternidade D. Evangelina Rosa. preventivas com gestantes qualificam sua saúde e tornam-se fundamentais para introduzir bons hábitos desde o início da vida da criança. Quando não é possível resolver todos as necessidades odontológicas durante a gestação, as mulheres são encaminhadas para concluir o tratamento na Clínica Odontológica do ES do campus da UFPI. Atendimento junto às equipes do PSF O Programa Saúde da Família (PSF) foi criado pelo Ministério da Saúde em 1994, com a finalidade principal de reorganizar a prática da atenção à saúde em novas bases e substituir o modelo tradicional, levando a saúde para mais perto da família e, com isso, melhorando a qualidade de vida dos brasileiros. A estratégia do PSF incorpora e reafirma os princípios básicos do Sistema Único de Saúde (SUS), que são a universalização, a descentralização, a integralidade e a participação da comunidade8, e está estruturada a partir da Unidade Básica de Saúde da Família. A estratégia Saúde da Família (Odontologia)5,6 surgiu pela necessidade crescente de expandir as ações odontológicas, numa perspectiva que contemplasse a integralidade, articulando as ações promocionais, preventivas e de recuperação da saúde bucal, com o objetivo de melhorar os índices epidemiológicos no país. Essa mudança de mentalidade contempla também a abertura de um novo mercado de trabalho, no qual os alunos dos cursos de Odontologia deverão ser capacitados a planejar e executar as ações de saúde de acordo com as necessidades inerentes a cada campo de atuação. Pelo convênio firmado entre a UFPI e a Prefeitura Municipal de Teresina, foi oportunizada aos estudantes do estágio supervisionado a inserção em atividades Revista da ABENO • 6(1):61-5 63 Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para formação humanística, social e integrada • Mendes RF, Moura MS, Prado Júnior RR, Moura LFAD, Lages GP, Gonçalves MPR desenvolvidas por equipes de saúde bucal do PSF. Os alunos são escalados e acompanhados por professores orientadores do Estágio Supervisionado aos locais de atendimento, onde acompanham e também realizam procedimentos de atenção básica, incluindo visitas domiciliares, palestras de promoção de saúde e tratamentos restauradores. A inclusão dos alunos da área de saúde no atendimento extramuro das equipes de PSF está sendo sempre discutida e é também motivo de reflexões nos encontros e conferências sobre saúde bucal e SUS. O convívio entre os profissionais do PSF e o binômio aluno/professor universitário são salutares em virtude de poderem possibilitar a abertura de novos campos para o desenvolvimento de pesquisas aplicadas que possam auxiliar nas soluções da problemática persistente de saúde bucal. Se por um lado isso traz benefícios ao aprendizado, simultaneamente se percebe ocorrer uma troca de experiências e conhecimentos mútuos. A convivência com profissionais de outras áreas e a presença dos estudantes nas equipes funcionam, para a maioria dos profissionais que trabalham no PSF (segundo os próprios relatos), como um estímulo e uma forma de atualização sobre os novos conceitos, técnicas e também quanto às maneiras de abordagem às pessoas atendidas, já que os estudantes podem empregar os meios desenvolvidos dentro da Universidade para as palestras educativas. Os fatos abordados corroboram as afirmações feitas por Steck, Batista9 (2003), que argumentam sobre a importância da parceria que deve ser firmada entre Universidades e entidades de classe odontológica, bem como da busca crescente pela participação da sociedade civil nos Conselhos Estaduais e Municipais de saúde e instâncias gestoras do SUS. Dificuldades a serem vencidas Uma das principais dificuldades encontradas é a falta de continuidade dos atendimentos odontológicos intra e extramuros nos períodos de férias escolares. Para isso, tem-se estimulado os acadêmicos do período anterior ao Estágio a assumir essas atividades durante as férias. Dessa forma, os serviços odontológicos oferecidos pelas diversas clínicas poderiam ser referência em todas as especialidades e áreas de conhecimento, contanto que seu funcionamento fosse realizado em caráter permanente e contínuo. Percebe-se que alguns alunos relutam em assumir o perfil necessário para trabalhar em comunidades carentes e sob condições muitas vezes adversas para o bom desempenho da técnica apresentada e executada 64 dentro da Universidade, pois em alguns postos de saúde os recursos materiais são muito limitados. Além disso, nota-se também a resistência por parte de alguns docentes em assimilar o trabalho inter e multidisciplinar como instrumento mais adequado de formação acadêmica. Isso também foi ressaltado por Cristino3 (2005), ao afirmar que “a integração (...) implica, dentre outras necessidades, o desenvolvimento de habilidades e competências — inclusive do próprio professor — para lidar com o todo, sem pretender o tudo das especialidades”. A autora enfatiza que esse processo exige imenso desdobramento para focalizar o essencial, o possível e o desejável, sendo que nem todos possuem sensibilidade necessária para desenvolver essa competência. Conclusões 1. As atividades extramuros abrem à convivência e à interação das universidades com as comunidades, e familiarizam e capacitam os estudantes a trabalhar na realidade que enfrentarão no mercado de trabalho. 2. Os atendimentos extramuros dão maior pluralidade e flexibilidade à pesquisa e ao ensino que ali se constroem, através de trocas de abordagens e experiências entre os profissionais que atuam no serviço público e os alunos que trazem os conhecimentos nos moldes acadêmicos. Agradecimentos Ao Magnífico Reitor da Universidade Federal do Piauí, Luiz de Sousa Santos Júnior, pelo efetivo apoio que tem dado à produção técnica e científica dos docentes dessa instituição. A todos os profissionais das equipes do PSF, que muito têm contribuído para a formação dos graduandos da UFPI. Aos gestores públicos das entidades municipal e estadual conveniadas com a UFPI, por permitirem e incentivarem a participação dos estudantes nas atividades desenvolvidas. Abstract Contribution of Supervised Internship of the Federal University of Piauí to an interdisciplinary, social and humanistic education Changes in how Dentistry is taught are essential in light of the Curricular Guidelines for Undergraduate Dental Courses (approved by the National Council of Education) and the participation of dental surgeons in the Family Health Program. These changes are necessary in order to make dental students have the right professional profile demanded by the labour market. There is now more emphasis on raising students’ Revista da ABENO • 6(1):61-5 Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para formação humanística, social e integrada • Mendes RF, Moura MS, Prado Júnior RR, Moura LFAD, Lages GP, Gonçalves MPR awareness of Brazilian economics, politics, sociology and culture. The Federal University of Piauí is located in one of the poorest Brazilian states; and the undergraduate dental course has tried to make students aware of the needs of the population that they will treat. Patients who are treated at the Supervised Internship discipline of the Dental School are treated holistically, not just considering specific symptoms. In this context, students become involved in intra- and extramural activities during their last term to witness the realities of different communities. tologia. Diário Oficial da União, Brasília (DF) [citado 2002 mar 4]. Sec. 1:10. Disponível em: URL: http://www.mec.gov.br/. 3. Cristino PS. Clínicas integradas antecipadas: limites e possibilidades. Revista da ABENO 2005;5(1):12-8. 4. Moura LFAD, Lira DMMP, Moura MS, Barros SSLV, Lopes TSP, Leopoldino VD et al. Apresentação do programa preventivo para gestantes e bebês. J Bras Odontopediatr Odontol Bebê 2001;4(17):10-4. 5. Ministério da Saúde. Informe da atenção básica – saúde bucal 2001 (7). Disponível em: URL: http://www.saude.gov.br/ 6. Ministério da Saúde. Portaria nº 267. Diário Oficial da União, República Federativa do Brasil, Brasília, 07 mar 2001. DESCRIPTORS Clinical clerkship. Education, higher. Education, dental. General practice, dental. Public Health Dentistry. § 7. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de atenção básica. Coordenação Nacional de Saúde Bucal. Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal, Brasília (DF); 2004. Disponível em: URL: http://portal.saude.gov.br/. 8. Sistema Único de Saúde. Princípios e conquistas. Ministério da REFERêNCIAS BIBlIOGRáFICAS Saúde, Secretaria Executiva, Brasília (DF); 2000. 1. Caufield PW, Cutter GR, Dasanayake AP. Initial acquisition of 9. Steck M, Batista MCV. Odontologia no Programa Saúde da mutans streptococci by infants: evidence for a discrete window Família: sinônimo de cidadania. Faculdades Unificadas da Fun- of infectivity. J Dent Res 1993;72(1):37-45. dação Educacional de Barretos, Barretos (SP); 2003. Disponível 2. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Supe- em: URL: http://www.sinog.com.br. rior. Resolução CNE/CES 3/2002, de 19 de fevereiro de 2002. Aceito para publicação em 06/2005 Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Odon- Revista Brazilian Oral Research Para maior comodidade aos autores e agilidade no recebimento, logo será possível fazer a submissão de artigos “on-line”. Aguarde mais informações em breve! Revista da ABENO • 6(1):61-5 65 Atividades extramuros como estratégia viável no processo ensino-aprendizagem Uma variação do ambiente ensino/aprendizagem valiosa tanto pelo contato do aluno com a comunidade, quanto pela grande interação entre professor e aluno. Marlei Aparecida Seccani Galassi*, Eduardo Luis Barbin*, Júlio César Emboava Spanó*, José A. Jam de Melo**, Nicolau Tortamano**, Antonio Cesar Perri de Carvalho*** *Professores do Curso de Odontologia da Universidade Paulista, Campus Vargas de Ribeirão Preto. E-mail: [email protected]. ** Professores do Curso de Odontologia da Universidade Paulista, Campus Indianópolis de São Paulo. *** Presidente da ABENO, Brasília, DF. Resumo A sala de aula não se limita a um espaço físico dentro da universidade. O aluno precisa ser inserido no contexto profissional, saindo de práticas realizadas exclusivamente dentro do espaço físico formal para atividades extramuros. As atividades extramuros têm sido utilizadas com sucesso entre os graduandos dos cursos da saúde (Odontologia, Nutrição, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia) da Universidade Pau­ lista, Campus Vargas de Ribeirão Preto, através do exercício de práticas educativas e preventivas na comunidade, em parcerias públicas e privadas. É uma variação do ambiente ensino/aprendizagem valiosa tanto pelo contato do aluno com a comunidade, quanto pela grande interação entre professor e aluno. Os cursos de saúde devem proporcionar a aquisição de conhecimentos, habilidades e atitudes na vivência de um mundo real, conhecida através da integração da universidade com a comunidade. O aluno em contato com comunidades carentes, além do aprendizado, exerce cidadania, tornando-se um profissional mais humano. As instituições envolvidas neste estudo, considerando esses aspectos, incentivaram e apoiaram as atividades extramuros de ensino/aprendizagem, motivando professores e alunos e proporcionando troca de informações e de experiências através da integração dos graduandos dos diferentes cursos oferecidos. Nessas atividades externas, foram observados entusias66 mo, participação e grande satisfação entre os alunos, bem como um desejo de realizá-las novamente. Descritores Ensino. Educação em Odontologia. Educação em saúde. Aprendizagem. A Odontologia vive na atualidade um importante momento no qual as Diretrizes Curriculares Nacionais induzem uma mudança paradigmática na formação do cirurgião-dentista como profissional da saúde, enfatizando estratégias para a integração no ensino de Odontologia10. Observa-se um problemático mercado de trabalho odontológico; os profissionais que nele atuam sentem-se em grande parte insatisfeitos. Galassi et al.4 (2004), em um estudo realizado com cirurgiões-dentistas que freqüentaram o 20º Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo, encontraram que 34% dos entrevistados não indicariam a Odontologia para os seus filhos, em função de alta competitividade do mercado, baixa remuneração e progressão dos convênios odontológicos. Secco, Pereira11 (2003), através de um levantamento realizado entre coordenadores de graduação das Faculdades de Odontologia das redes privada e pública do estado de São Paulo, demonstraram que os cursos oferecidos pelas universidades não têm preenchido totalmente o número de vagas oferecidas; apenas 61% delas são Revista da ABENO • 6(1):66-9 Atividades extramuros como estratégia viável no processo ensino-aprendizagem • Galassi MAS, Barbin EL, Spanó JCE, Melo JAJ, Tortamano N, Perri de Carvalho AC ocupadas para o 1º ano, sinalizando um período crítico para as Faculdades de Odontologia. Levando-se em conta que as Diretrizes Curriculares Nacionais propõem formar profissionais com caráter generalista, com sólida formação técnico-científica, humanística e ética, orientada para a promoção da saúde, com ênfase na prevenção de doenças bucais prevalentes2, salvo algumas exceções, observa-se que a maioria das faculdades lança egressos totalmente voltados à prática privada, que não atendem a essas recomendações e agravam ainda mais os problemas do mercado de trabalho9. A educação no sentido amplo é um processo complexo e trabalhoso e, por outro lado, muito gratificante àqueles que a praticam. O professor deve estar consciente da sua importância na aprendizagem do aluno, procurando utilizar, para isso, todos os recursos e meios que atinjam seus objetivos12. No tocante à diversificação do cenário ensinoaprendizagem, Perri de Carvalho10 (2004) destaca a importância da clínica extramuros, na qual o aluno é colocado diretamente em contato com a realidade social da população, conhecendo os problemas regionais e individuais de cada um. A sala de aula não pode ser entendida como um espaço físico, uma formalidade burocrática, que separa o professor que ensina do aluno que “aprende”9. A aprendizagem deve evoluir, não podendo mais ser considerada como simples transmissão de práticas rotineiras3. O professor não é mais aquele sujeito que repassa uma grande quantidade de conhecimentos, os quais os alunos copiam, memorizam e demonstram o “aprender” através de acertos nas provas. O professor é um orientador, um facilitador da aprendizagem, é um aglutinador dos conhecimentos adquiridos pelos alunos, dando-lhes segurança para enfrentar dificuldades e, acima de tudo, superá-las5. Isso nos faz refletir sobre as estratégias que têm sido utilizadas na formação dos novos profissionais, e nos propomos a apresentar atividades extramuros, nas quais os cursos da saúde (Odontologia, Nutrição, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia) da Universidade Paulista, Campus Vargas de Ribeirão Preto, levam seus alunos e professores até a comunidade em parcerias públicas e privadas, participando de projetos como: ­Governo no Bairro, Pit-Stop (atendimento e encaminhamento de motoristas nas rodovias brasileiras), Prevenção do Câncer Bucal e ônibus itinerante (a Universidade na comunidade). Métodos Os alunos de todos os períodos letivos (do primei- ro ao último) dos cursos da saúde (Odontologia, Nutrição, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia) da Universidade Paulista - Campus Vargas de Ribeirão Preto participaram de atividades extramuros na comunidade. Fizeram-se parcerias com a prefeitura e empresas privadas. As práticas realizadas foram educativas, preventivas, diagnóstico de patologias e encaminhamentos para as clínicas de tratamento dos cursos. Antes de saírem a campo, os alunos foram preparados, conscientizados e motivados para que participassem com entusiasmo e desejo de sucesso. Algumas atividades extramuros, como o Governo no Bairro, foram realizadas dentro de escolas; o PitStop funcionou em “stands” montados pelas concessionárias das rodovias nas praças de pedágio; a Prevenção do Câncer Bucal foi realizada em praças públicas com barracas fornecidas pelo exército; e o ônibus itinerante, a Universidade na comunidade, utilizou-se de um ônibus que a Universidade Paulista dispõe para atendimentos comunitários, equipado com consultório dentário e escovódromo composto por quatro pias. Essas atividades ocorreram durante o ano letivo de 2004. Os graduandos de Odontologia, por exemplo, dentro da parte educativa/preventiva, realizaram instrução de higiene oral através de demonstração em manequins, uso de evidenciadores do biofilme bacteriano e escovação dental supervisionada (escovódromo); os de Nutrição fizeram avaliação de peso, estatura e cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC) e avaliaram estado nutricional e condição de sobrepeso ou obesidade; a Enfermagem foi um dos setores mais visitados, pelo desejo de aferir a pressão arterial e realizar testes sangüíneos; a Fisioterapia participou fazendo avaliação e orientação da postura; e a Farmácia abordou muitos aspectos, sobretudo o perigo da automedicação. A avaliação do trabalho realizado deu-se através da satisfação ou não dos alunos e do desejo de retornar ou não às atividades. Resultados e Discussão Na experiência aqui relatada, observou-se nos alunos um grande entrosamento, uma sincronia entre as etapas do trabalho, em que um respeitava e se interessava pelo trabalho do outro. Os alunos de Farmácia queriam aprender a melhor técnica para escovar os dentes; os alunos da Enfermagem queriam uma tabela de calorias; os estudantes de Odontologia estavam preocupados com a postura. No tocante à parte social, os acadêmicos dos diferentes cursos da saúde mostraram-se profundamente sensibilizados com os problemas relatados pelos visi- Revista da ABENO • 6(1):66-9 67 Atividades extramuros como estratégia viável no processo ensino-aprendizagem • Galassi MAS, Barbin EL, Spanó JCE, Melo JAJ, Tortamano N, Perri de Carvalho AC tantes da “Universidade Extramuros”. Queriam resolver os problemas, ajudar, colaborar, encaminhar rapidamente para atendimento e tratamento das necessidades; até mesmo visitas aos finais-de-semana foram realizadas voluntariamente, sem a presença do professor, desvinculadas do trabalho proposto pela Universidade. Esperavam-se sensibilização e envolvimento, pois sabe-se que os alunos, desde que sensi­ bilizados, conscientizados e preparados para uma atuação participativa, entusiasmam-se muito por campanhas educativas junto à comunidade9. A totalidade dos alunos que participaram das atividades extramuros demonstrou satisfação e desejo de retornar a esse tipo de atividade. O Programa de Integração Assistencial, produto da Assembléia Mundial da Saúde, recomenda a integração das disciplinas dos cursos de saúde, resultando em um currículo que proporcione conhecimentos, habilidades e atitudes adquiridos na vivência do mundo real, através de um processo de ensino-aprendizagem desenvolvido simultaneamente na escola e na comunidade1. Dessa forma, os alunos de hoje e profissionais do amanhã que, durante a graduação, participam de atividades extramuros, estarão, com certeza, melhor preparados para atuar na comunidade, sobretudo em serviços de saúde, por terem a oportunidade do convívio e da concepção de uma consciência social comunitária, conhecendo as diferenças econômicas e culturais que existem e a diversidade (diferenças e semelhanças) da espécie humana3. Tornam-se cada vez mais importantes no mercado de trabalho qualidades como a capacidade de comunicação, de trabalhar com os outros (trabalho em equipe), de gerir e de resolver conflitos3. A universidade não pode manter-se isolada, não pode impedir seus alunos de participarem ativamente de trabalhos na comunidade, interagindo com profissionais e estudantes de outras áreas de saúde. Lombardo5 (2001) relata que as experiências de aprendizagem podem ser orientadas pelas necessidades dos próprios estudantes ou pelas necessidades sociais da comunidade. A nova definição política do Ministério da Saúde visa diminuir a distância entre a formação dos recursos humanos e as necessidades do SUS (Sistema Único de Saúde).Também é preciso aproximar a Odontologia das demais áreas de saúde8. Quando essas atividades extramuros são realizadas, contando com a participação de estudantes de outros cursos da saúde, o espírito de equipe e a capacidade de troca de informações com diferentes indivíduos reforçam e estimulam o que sinalizam as Diretrizes Curriculares Nacionais: o profissional tem que ser ca68 paz de trabalhar em equipe, prestando atenção integral mais humanizada, levando-se em conta e compreendendo a realidade social em que vive a população2. Morita, Kriger8 (2004), partindo da compreensão de que os problemas de saúde são sempre interdisciplinares, definem “atuar multiprofissionalmente” como um rompimento do modelo centrado no trabalho individual, capacitando para o trabalho em equipe, no qual se propõe compartilhar o planejamento, dividir tarefas, aprender, cooperar e colaborar. A importância das atividades junto às comunidades carentes se fortalece quando se lembra o fato de que os universitários pertencem, na grande maioria, a uma classe econômica e social privilegiada. Em um levantamento realizado por Martinez et al.7 (2004), foi detectada, em 60% dos estudantes da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo, uma renda familiar superior a 15 salários mínimos, concluindo que a Odontologia é um curso elitista. Os achados dos autores corroboraram os de Junqueira et al.6 (2002), que definiram que os estudantes de Odontologia da UNESP, Campus de São José dos Campos, eram de nível socioeconômico alto e que a maioria havia cursado o ensino médio em escolas particulares. Alunos de todos os períodos participaram das atividades extramuros, pois é importante que eles sejam precocemente inseridos no contexto profissional, saindo de práticas profissionalizantes realizadas em clínicas de ensino de especialidades para as práticas profissionalizantes em clínicas integradas e atividades extramuros8. Além da estratégia de ensino pela diversificação e mudança do cenário onde se ministra a aula, com espírito de cidadania e cooperação, as atividades exercidas pelos alunos baseiam-se basicamente em educação buscando prevenção, motivando e conscientizando o indivíduo para que mude atitudes e encontre o caminho da saúde. Vale ressaltar que o segredo do bom ensino é o entusiasmo pessoal do professor, ator desse cenário que, muitas vezes, depende das condições propiciadas pela própria instituição de ensino, a qual igualmente deve estar ciente da importância do professor no processo de ensino-aprendizagem dos alunos do ensino superior12. Conclusões Com base nas observações realizadas, é lícito concluir que: • Atividades extramuros, como estratégia de ensino/aprendizagem, têm sido utilizadas com sucesso entre os graduandos dos cursos da saúde (Odon- Revista da ABENO • 6(1):66-9 Atividades extramuros como estratégia viável no processo ensino-aprendizagem • Galassi MAS, Barbin EL, Spanó JCE, Melo JAJ, Tortamano N, Perri de Carvalho AC tologia, Nutrição, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia) da Universidade Paulista, Campus Vargas de Ribeirão Preto, através do exercício de práticas educativas e preventivas na comunidade, em parcerias públicas e privadas. • O aluno em contato com comunidades carentes exerce cidadania, tornando-se um profissional mais humano. • As atividades extramuros motivam professores e alunos, proporcionando troca de informações e de experiências através da integração dos graduandos de diferentes áreas do conhecimento. • Observou-se que, nas atividades extramuros, houve entusiasmo e dedicação dos participantes. • O entusiasmo do professor parece ser imprescindível para o aprendizado. Ele depende tanto da intenção e dos valores do professor como também das condições proporcionadas pela instituição de ensino (neste estudo, esses fatores foram extremamente favoráveis). have fostered and supported these extramural activities, stimulating teachers and students and making possible the exchange of information and experience through the integration of undergraduate students of several courses. During these extramural activities, enthusiasm, participation and great satisfaction among the students could be observed, as well as the whish to perform these activities again. Descriptors Teaching. Education, dental. Health education. Learning. § Referências bibliográficas 1. Brasil. Programa de integração docente-assistencial. Brasília (DF); 1981. [Série Cadernos de Ciências da Saúde, 3]. 2. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Odontologia. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 04 mar 2002, seção 1, p. 10. 3. Delors J. Educação: um tesouro a descobrir. 8ª ed. São Paulo: Agradecimentos À Diretoria do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Paulista (UNIP), por ter cedido o Ônibus Multidisciplinar de Saúde Itinerante. Cortez ; 2003. 288 p. 4. Galassi MAS, Santos-Pinto LM, Scannavino FLP. Expectativas do cirurgião-dentista em relação ao mercado de trabalho. Rev Assoc Paul Cir Dent 2004;58(1):67-70. 5. Lombardo I. Reflexões sobre o planejamento do ensino em Abstract Extramural activities as a viable strategy in the teaching/learning process The classroom cannot be limited to the university’s physical space. The student needs to be inserted in the professional reality, not being limited exclusively to activities inside the university. Activities performed outside the university are being successfully used among undergraduate students of health courses (Dentistry, Nutrition, Nursing, Pharmacy, and Physiotherapy) of the Paulista University, Campus of Ribeirão Preto, by the application of educative and preventive practices to serve the community, in association with public and private initiatives. This is a valuable variation of the teaching/learning environment and also a valuable opportunity to improve the contact between students and the community and also between students and teachers. The health courses must give students the opportunity to acquire knowledge and develop skills that help them to develop a better attitude towards the real world; and this may be experienced through the integration of the university with the community. The student is put in contact with poor communities, learning and also performing the duties of citizenship, becoming a more humanist professional. The organizations involved in this research Odontologia. Revista da ABENO 2001;1(1):17-24. 6. Junqueira C, Colombo CED, Tavares PG, Rocha RF, Carvalho YR, Rodrigues JR. Quem é e o que pensa o graduando de odontologia. Rev Odontol UNESP 2002;31(2):269-84. 7. Martinez CS, Andrade FB, Miotto MHMB. Perfil socioeconômico dos estudantes de odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo. UFES Rev Odontol 2004;6(2):51-8. 8. Morita MC, Kriger L. Mudanças nos cursos de Odontologia e a interação com o SUS. Revista da ABENO 2004;4(1):17-21. 9. Perri de Carvalho AC. Educação e saúde em Odontologia - ensino da prática e prática do ensino. São Paulo: Santos; 1995. 93 p. 10. Perri de Carvalho AC. Planejamento do curso de graduação de Odontologia. Revista da ABENO 2004;4(1):7-13. 11. Secco LG, Pereira MLT. A profissionalização docente e os ­desafios político-estruturais dos formadores em Odontologia – um estudo com coordenadores de graduação. Revista da ­ABENO 2003;4(1):22-8. 12. Raldi DP, Malheiros CF, Fróis IM, Lage-Marques JL. O papel do professor no contexto educacional sob o ponto de vista dos alunos. Revista da ABENO 2003;3(1):15-23. Revista da ABENO • 6(1):66-9 Aceito para publicação em 06/2005 69 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil A formação de cirurgiões-dentistas deveria ser adequada à realidade socioepidemiológica do Brasil e mais próxima das exigências do Sistema Único de Saúde, no qual reside uma das maiores possibilidades de emprego. Jacson Brustolin*, Juliana Brustolin*, Ramona Fernanda Ceriotti Toassi**, Mirian Kuhnen*** *Acadêmicos do Curso de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense. **Mestre em Saúde Coletiva pela Faculdade de Odontologia, Departamento de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade do Planalto Catarinense. E-mail: [email protected]. ***Especialista em Odontologia em Saúde Coletiva do Departamento de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade do Planalto Catarinense. Resumo Esta pesquisa objetivou traçar o perfil do graduando da Faculdade de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense/UNIPLAC, principalmente quanto às suas razões para escolha do curso e suas expectativas em relação à futura profissão. Todos os acadêmicos do primeiro ao décimo período do curso responderam a um questionário elaborado a partir dos objetivos do estudo (n = 214). A coleta de dados aconteceu no primeiro semestre de 2004. Dentre os principais resultados, pôde ser observado que 53,3% dos estudantes eram do sexo feminino, a maioria do estado de Santa Catarina, solteiros, sem filhos, com faixa etária baixa, alto nível socioeconômico e de escolaridade dos pais, forte tendência à especialização e opção direcionada para o serviço público e privado, com boa expectativa de rendimentos. A escolha pelo curso foi motivada principalmente por realização pessoal e profissional. Consideraram como principal finalidade da Odontologia a prevenção e a manutenção da saúde bucal. Os resultados deste estudo permitiram identificar mudanças e tendências que estão ocorrendo nas relações entre o exercício profissional e o en70 sino da Odontologia e contribuíram para subsidiar a caracterização das qualificações do profissional a ser formado pela UNIPLAC. Descritores Estudantes de Odontologia. Educação em Odontologia. Ensino. H á poucos anos, a Odontologia era uma das práticas de saúde mais elitizadas do Brasil. Sua inserção no setor público se limitava a precários serviços escolares e abomináveis rotinas de extração dos dentes da população mais pobre. As lutas pela democracia e pela extensão da cidadania, as Conferências de Saúde e a construção do Sistema Único de Saúde (SUS) previsto na Constituição Federal de 1988 impulsionaram mudanças nessas práticas e nas concepções sobre o que deve e como deve fazer a Odontologia brasileira9. O SUS estabeleceu como princípios a integralidade da atenção à saúde, com ênfase nos aspectos preventivos, e uma atuação profissional dirigida à realidade socioepidemiológica da população do País. O Revista da ABENO • 6(1):70-6 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil • Brustolin J, Brustolin J, Toassi RFC, Kuhnen M modelo tradicional de formação de recursos humanos não tem conseguido cumprir tal diretriz por ainda centrar sua ação no paradigma cirúrgico-restaurador, sofisticação tecnológica, tecnicismo e biologicismo, sendo o contexto social da determinação da doença secundarizado13. Pode-se dizer que a prática odontológica atual tem se desenvolvido de forma desvinculada da realidade social do País, resultando um padrão de saúde bucal caótico, apesar da grande quantidade de mão-de-obra odontológica disponível no mercado de trabalho. Vários têm sido os fatores que contribuem para a manutenção dessa situação desfavorável. Dentre eles, destacam-se a estrutura social do País, o modelo de prática odontológica, os aspectos econômicos de oferta e procura de serviços, os sistemas de financiamento, as questões político-ideológicas e os diversos agentes envolvidos nesse processo6. A crise no mercado de trabalho odontológico, provocada pelo excesso de mão-de-obra, tem levado à necessidade de se desenvolverem estudos sobre a estruturação dos recursos humanos dentro da prática atual. No início da década de 80, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) e a Associação Brasileira de Ensino Odontológico (ABENO), no sentido de estabelecer uma diretriz para a formação profissional do cirurgião-dentista, delinearam o seguinte perfil para o recurso humano necessário no País: “ser um clínico geral, com sensibilidade social e bem capacitado teoricamente”. Em 1982, esse perfil foi adotado pelo currículo mínimo dos cursos de graduação em Odontologia1,6,11. Estudos posteriores de Freire et al.6 (1995) e Freitas, Nakayama7 (1995) constataram que a formação do acadêmico do curso de graduação em Odontologia caracteriza-se pelo individualismo com ânsia de lucros, alienamento da realidade, tendência curativista e desprezo ao serviço público odontológico. Muitas razões foram apontadas para esse perfil, mas a principal foi a deficiência dos currículos da maioria das faculdades de Odontologia. Tais currículos têm, na verdade, reproduzido o modelo de prática dominante, formando recursos humanos inadequados à realidade socioepidemiológica de nosso país. Ciente dessa realidade, o curso de graduação em Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense (UNIPLAC), ao iniciar suas atividades na segundo semestre de 1999, apresentou um projeto almejando gestar novas relações sociais comprometidas com a solidariedade, a cidadania e a vida14. De acordo com o projeto político-pedagógico, o curso de graduação em Odontologia pretende formar cirurgiões-dentistas técnica e cientificamente capazes de desenvolver e executar ações de saúde em Odontologia integral. Tal formação implica a capacitação do profissional para intervir na sociedade, adotando medidas preventivas, educativas e curativas adequadas e necessárias, que provoquem transformações no comportamento e nas práticas em saúde bucal da população, melhorando a sua qualidade de vida14. Desse modo, o perfil prevê: “um profissional generalista com sólida formação técnico-científica e ética orientada para promoção da saúde, com ênfase na prevenção de doenças bucais prevalentes”14. Estabeleceu como objetivo principal o desenvol­ vimento de um conjunto de hábitos e atitudes pro­ fissionais nos acadêmicos que os caracterizará per­ manentemente no exercício de suas funções no contexto social e preventivo. Como estratégia de ensino, reservaram-se inicialmente 240 horas-aula para a disciplina de Odontologia Social e Preventiva, distribuídas ao longo de oito fases de sua grade curricular. Resta, agora, saber qual a complexidade realística do teórico-prático das Universidades, em uma perspectiva futura, ou seja, até que ponto o perfil do acadêmico irá condizer com o perfil proposto pelo curso. Diante desse quadro, tornou-se essencial o desenvolvimento de um estudo que caracterizasse o acadêmico do curso de graduação em Odontologia da UNIPLAC, buscando conhecer seu perfil socioeconômico, cultural e comportamental. Métodos Este é um estudo descritivo observacional do tipo transversal conduzido na sede da UNIPLAC, localizada no município de Lages – SC. A população-alvo incluiu todos os 242 acadêmicos matriculados da primeira à décima fase do curso de graduação em Odontologia da UNIPLAC, de ambos os sexos, no início de 2004. Destes, concordaram em participar do estudo 214 acadêmicos, ou seja, 88,5% do total da população. O instrumento de pesquisa consistiu na aplicação de um questionário estruturado para os acadêmicos de todos os períodos do curso de Odontologia da UNIPLAC, tendo como base questões abertas, semi-abertas e fechadas, retiradas de vários questionários presentes na literatura2,3,6,7. O questionário foi dividido em 4 blocos: Bloco 1 – Identificação; Bloco 2 – Sobre o curso de Odontologia; Bloco 3 – Atuação profissional após o término Revista da ABENO • 6(1):70-6 71 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil • Brustolin J, Brustolin J, Toassi RFC, Kuhnen M da graduação; e Bloco 4 – Pós-graduação. Com o propósito de testar a estrutura do questionário elaborado e verificar a clareza da linguagem utilizada, foi realizado um estudo-piloto com acadêmicos do primeiro ao último semestre de outro curso de graduação em Odontologia do estado de Santa Catarina, o qual antecedeu a aplicação do questionário definitivo deste estudo. Os dados foram processados e analisados pelo programa estatístico SPSS-10.0. O estudo foi avaliado e aprovado por um comitê de ética em pesquisa envolvendo seres humanos. Resultados Dos 214 acadêmicos pesquisados, 53,3% eram do sexo feminino e 46,7% eram do sexo masculino. A faixa etária dos acadêmicos variou de 16 a 43 anos e a média de idade da população ficou entre 20 e 21 anos. A grande maioria era do estado de Santa Catarina (71,5%), solteira (90,7%), não tinha filhos (86,9%) e, quando tinha, apenas um (77,7%). Seus pais geralmente trabalhavam (pais: 81,3%; mães: 65%), sendo que 40,7% dos pais e 37,4% das mães haviam cursado o ensino superior completo. O maior responsável pelo ganho da família dos acadêmicos foi o pai (66,8%); para quase metade dos acadêmicos, a renda familiar foi maior que 10 saláriosmínimos e, para 24,3%, a renda foi maior do que 20 salários-mínimos. Mais da metade dos acadêmicos (57,5%) relatou morar em casa de tijolos e 23,4%, em edifícios. Os acadêmicos afirmaram ter realizado o ensino fundamental e médio em escola privada (45,8% e 64,5%, respectivamente). Fizeram curso pré-vestibular (66,4%) por até seis meses (36%), nunca trabalharam (59,3%), não tinham começado outro curso superior (75,2%) e tinham sido aprovados no primeiro vestibular (77,5%). Em caso de necessitarem de tratamento odontológico, 87,9% procuravam dentista particular e apenas 2,3%, o atendimento pelo Sistema Único de Saúde. O dentista particular foi mais procurado por apresentar melhor atendimento (57,5%), por parentesco ou amizade (19,6%) e por tradição familiar (12,6%). A presença de cirurgiões-dentistas na família foi observada em 36,9% dos acadêmicos investigados. Destes, 51,9% tinham esse parentesco em primeiro grau. Finalizando o bloco de identificação, foi perguntado aos acadêmicos quais eram, sob o ponto-de-vista deles, os cursos de graduação que possuíam melhor prestígio social e melhor retorno econômico para a 72 cidade que pretendiam trabalhar. Os resultados mostraram que, para 63,1% dos acadêmicos, o curso de Medicina seria o de melhor prestígio social; em segundo lugar ficou a Odontologia (57,5%) e, em terceiro, Propaganda e Marketing (50,5%). Em relação ao retorno econômico, também o curso de Medicina ficou em primeiro lugar (55,1%), Propaganda e Marketing, em segundo (42,5%) e a Odontologia, em terceiro (42,1%). Quando da opção pela Odontologia, 55,2% dos acadêmicos estavam absolutamente decididos sobre a escolha do curso, embora um número significativo tenha manifestado alguma dúvida (38,3%) e até indecisão completa (5,6%). Quase metade dos acadêmicos (45,4%) optou pela Odontologia pela realização profissional e pessoal, 20,9%, pelo conforto financeiro e 18,8%, pelo interesse em atuar na comunidade. Em todos os semestres, a realização pessoal e profissional foi o motivo mais observado. Quando questionados sobre qual a principal finalidade da Odontologia, 28,2% destacaram a prevenção e a manutenção da saúde bucal, 19,6%, a prevenção e o tratamento e 19%, a promoção de higiene e estética. A questão sobre a expectativa atual ou passada dos acadêmicos com o curso de Odontologia da UNIPLAC mostrou que os alunos esperavam ou haviam esperado principalmente obter melhores salários (19,6%), uma formação profissional voltada para o trabalho (15,6%), conhecimento para melhorar o grau de instrução (12,7%) e aquisição de cultura geral ampla (13,5%). Apenas 6,2% dos acadêmicos relataram um interesse pela pesquisa. Com exceção do quinto, nono e décimo semestres, todos os demais priorizaram a opção de obter melhores salários com a profissão escolhida. Com relação ao grau de satisfação com o curso, 50,9% afirmaram que a Odontologia é o único curso capaz de satisfazê-los, porém, 46,3% disseram que a Odontologia é um dentre outros cursos que poderiam satisfazê-los. Apenas 1,9% respondeu que o curso dificilmente irá satisfazê-lo e nenhum acadêmico disse que o curso nunca iria satisfazê-lo. Para 60,7% dos acadêmicos, o curso está correspondendo totalmente às expectativas iniciais; para 36,5% está correspondendo em parte, e para 2,3% não está correspondendo. Além disso, os acadêmicos também opinaram sobre o tipo de formação recebida no curso de Odontologia da UNIPLAC. Dos 214 acadêmicos, 56,6% afirmaram que a UNIPLAC está proporcionando uma formação sólida para a atuação de cirurgiões-dentistas no Programa de Saúde da Família (PSF), 14% acredi- Revista da ABENO • 6(1):70-6 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil • Brustolin J, Brustolin J, Toassi RFC, Kuhnen M tam que não e 29,4% não responderam. Para a grande maioria dos acadêmicos pesquisados (86,4%), o serviço privado exclusivo já não é mais uma realidade; 49% afirmaram que pretendem trabalhar nos serviços público e privado e 33,6%, nos serviços público e privado e na universidade. Apenas 0,5% dos acadêmicos mostrou interesse unicamente pelo trabalho em universidade. Quando separados por período de formação, os resultados mostraram que, dos acadêmicos que ainda não tinham se decidido sobre o tipo de vínculo de trabalho que pretendiam ter depois de formados, 42,8% estavam no primeiro semestre do curso e 50%, ainda no início do curso de Odontologia (1º, 2º e 3º semestres). Os motivos que levariam os acadêmicos a trabalhar unicamente no serviço privado podem ser visualizados na Tabela 1, e a distribuição dos acadêmicos do curso de Odontologia da UNIPLAC segundo os motivos que os levariam a trabalhar tanto no setor privado quanto no público pode ser encontrada na Tabela 2. Quando questionados se dedicariam 40 horas semanais para trabalhar no serviço público, 63,6% dos acadêmicos do curso de Odontologia afirmaram que sim. A pretensão salarial logo após a conclusão da graduação foi, para 36% dos acadêmicos, de 6 a 10 salários-mínimos; para 18,7%, de 11 a 20 salários-mínimos e para 16,4%, de 2 a 5 salários-mínimos. Cerca de 20% dos acadêmicos disseram não saber quanto pretendiam ganhar após o término da graduação. Desses, 51,2% estavam no início do curso. Nenhum acadêmi- co do último semestre disse não saber quanto pretendia ganhar. Para finalizar o bloco de questões relacionadas à atuação profissional futura, foi perguntado aos acadêmicos se eles pretendiam voltar para a cidade de origem depois de formados. As respostas mostraram que 39,2% dos acadêmicos pesquisados têm a intenção de voltar para sua cidade, 37,8% não têm e 23% ainda não sabem. Sobre cursos de pós-graduação, 98,1% dos acadêmicos afirmaram que pretendem realizá-los até 6 meses depois de formados (43%). Mais da metade dos acadêmicos (59,8%) destacaram a intenção de fazer Mestrado ou Doutorado nas áreas de Ortodontia (21,5%), Cirurgia (19,6%), Prótese e/ou Implantodontia (11,2%) e Odontopediatria (10,2%). Cerca de 20% dos acadêmicos não definiram a área de interesse para a pós-graduação. Discussão O acadêmico do curso de graduação em Odontologia da UNIPLAC é, em sua maioria, um jovem catarinense solteiro, de 16 a 25 anos de idade, com discreto predomínio do sexo feminino, sem filhos e com nível socioeconômico privilegiado. O mesmo foi verificado por estudo sobre perfil profissional brasileiro realizado por Pinto, Fraga11 (2003). O discreto predomínio de acadêmicos do sexo feminino (53,3%) verificado na UNIPLAC confirma a tendência crescente de feminização das profissões no setor da saúde, encontrada por Arbenz et al.2 (1973), Botti, Santos3 (1986), Freire et al.6 (1995), Freitas, Nakayama7 (1995), Carvalho et al.4 (1997), Costa et al.5 (1999), Junqueira et al.8 (2002) e Nicodemo, Naressi10 Tabela 1 - Distribuição da população segundo os fatores considerados para a opção pelo serviço privado exclusivo. Acadêmicos do curso de Odontologia da UNIPLAC, Lages, SC, 2004/1. Fatores considerados Autonomia n % 107 26,5 Lucro e estabilidade 80 19,8 Má remuneração de público 35 8,6 Melhores condições de trabalho 79 Pretende especializar-se Já tem consultório montado do pai Ignorado Não informou Total Tabela 2 - Distribuição da população segundo os fatores considerados para a opção pelos serviços privado e público. Acadêmicos do curso de Odontologia da UNIPLAC, Lages, SC, 2004/1. Fatores considerados n % Estabilidade e auxílio à comunidade 111 28,5 19,5 Renda segura e experiência nos primeiros anos 124 31,8 79 19,5 Maior experiência profissional 110 28,2 30 7,7 1 0,2 14 3,6 1 0,2 Realização profissional e financeira 23 5,7 Servir toda a comunidade 1 0,2 Ignorado 405* 100,0 *O número de respostas foi maior que o número total de acadêmicos examinados porque a resposta admitia a escolha de mais de uma alternativa. Total 390* 100,0 *O número de respostas foi maior que o número total de acadêmicos examinados porque a resposta admitia a escolha de mais de uma alternativa. Revista da ABENO • 6(1):70-6 73 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil • Brustolin J, Brustolin J, Toassi RFC, Kuhnen M (2002). Quanto à idade, cerca de 90% dos acadêmicos tinham idade entre 16 e 25 anos, podendo esta ser considerada uma idade relativamente baixa. A pouca idade sugere baixa reprovação e rara evasão4. Para Botti, Santos3 (1986), de certa forma, essa baixa idade pode ser uma boa perspectiva em termos de vida útil produtiva que esses futuros profissionais terão; no entanto, leva à indagação de se, na época que realizaram o ingresso na Universidade, teriam maturidade suficiente para escolher uma profissão ou seriam conduzidos nessa escolha, o que, certamente, poderá influenciar no desempenho das atividades profissionais. Destaca-se, porém, neste estudo que, quando da opção pela Odontologia, mais da metade dos acadêmicos (55,2%) relataram estar absolutamente decididos sobre a escolha do curso. O nível socioeconômico dos acadêmicos pode ser considerado bastante privilegiado se considerada a renda familiar mensal, o tipo de moradia, o grau de escolaridade e tipo de ocupação dos pais e o acesso à assistência odontológica privada, contrastando com a situação da maior parte da população brasileira. Acrescenta-se a isso o alto valor da mensalidade vigente na instituição e do curso como um todo, bem como o período integral de dedicação ao curso, o que inviabilizaria um emprego paralelo formal para essa população (93,9% não trabalhavam). No que se referiu à formação no ensino fundamental e médio, a grande maioria dos acadêmicos é oriunda da escola particular. Esses dados são semelhantes aos encontrados por Junqueira et al.8 (2002) e Nicodemo, Naressi10 (2002). Sobre o número de dentistas na família, a média dos acadêmicos da UNIPLAC pode ser considerada relativamente baixa (1,36 dentistas) quando com­ parada com a encontrada por Freire et al.6 (1995) e Freitas, Nakayama7 (1995). De qualquer forma, essa presença é importante na definição da escolha profissional, sendo explicada pelo freqüente e constante contato com uma determinada profissão, facilitando a identificação e o despertar do interesse por esta, especialmente quando possui um alto prestígio social7. Quanto ao motivo da escolha do curso, a maioria dos acadêmicos de todos os semestres relatou ter escolhido a Odontologia principalmente pela realização profissional e pessoal, seguida por segurança e tranqüilidade no futuro, posição social e conforto financeiro e interesse em atuar na comunidade. Já Freire et al.6 (1995) verificaram, na Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), que 74 os acadêmicos têm buscado na Odontologia um meio para sobreviverem bem economicamente, serem especialistas e trabalharem por conta própria, atendendo a população de alta renda. Chamou a atenção o fato de que, no estudo da Universidade de Goiás, apenas 6% dos acadêmicos escolheram a Odontologia com interesse em atuar junto à comunidade, enquanto na UNIPLAC 18,8% dos acadêmicos mostraram interesse por atuar na comunidade. Um aspecto positivo mostrado no presente estudo foi o alto índice de acadêmicos que consideram como principal finalidade da Odontologia a prevenção e a manutenção da saúde bucal. O mesmo foi observado por Freire et al.6 (1995). Apesar disso, quando questionados sobre a expectativa atual ou passada com o curso de Odontologia da UNIPLAC, os acadêmicos afirmaram que esperavam ou haviam esperado principalmente obter melhores salários. Já o estudo de Freire et al.6 (1995) mostrou que apenas 1,7% dos acadêmicos da Universidade Federal de Goiás esperavam com a Odontologia obter melhores salários e formação teórica voltada para pesquisa. A resposta mais freqüente foi a formação profissional voltada para o trabalho (73,3%). O percentual de acadêmicos que consideraram a Odontologia como única carreira que podia satisfazêlos foi de 50,9% dos acadêmicos. Um percentual menor foi obtido no estudo de Freitas, Nakayama7 (1995) com estudantes de Odontologia do estado de São Paulo (29,7%). Para mais da metade dos acadêmicos, o curso está correspondendo às expectativas iniciais; os alunos acreditam que a UNIPLAC está proporcionando uma formação sólida para a atuação de cirurgiões-dentistas no PSF. O mesmo foi observado por Junqueira et al.8 (2002) na Faculdade de Odontologia de São José dos Campos/SP. Observou-se uma tendência de se diminuir a atuação de trabalho em consultório próprio. Apenas uma minoria pretendia dedicar-se exclusivamente ao consultório particular. Cerca de metade dos acadêmicos pesquisados tinha a intenção de se dedicar aos serviços público e privado e 33,6%, aos serviços público e privado e à universidade. As razões apontadas para a opção pelo serviço privado exclusivo foram principalmente autonomia, lucro e estabilidade. O mesmo foi observado em estudo de Botti, Santos3 (1986) nos cursos de Odontologia do Rio Grande do Sul. De acordo com estudo similar realizado na Universidade de Goiás6, 100% pretendiam trabalhar no próprio consultório, sendo que 41% de todos os pesquisados pretendiam dedicar-se somente à clínica privada e 30%, à Revista da ABENO • 6(1):70-6 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil • Brustolin J, Brustolin J, Toassi RFC, Kuhnen M clínica privada e ao serviço público ao mesmo tempo. Aqueles que visavam o consultório particular também buscavam principalmente autonomia, lucro e estabilidade. Ainda que neste estudo a atuação exclusiva no serviço privado tenha sido delegada a segundo plano e que os acadêmicos tenham demonstrado interesse em atuar na comunidade, manifestando-se favoráveis em atuar 40 horas semanais no serviço público, parece que o mesmo torna-se apenas um trampolim para o recém-graduado que, mesmo diante da atual crise no mercado de trabalho no setor privado, despreza o serviço público odontológico6. Junqueira et al.8 (2002) chamam a atenção para o fato de que há indícios de significativas alterações no mercado de trabalho para o cirurgião-dentista, tendo em vista a implantação de serviços odontológicos em órgãos governamentais, empresas, associações e sindicatos, com diminuição de sua atuação como profissional liberal. O alto percentual de acadêmicos que pretendem se especializar, assim como a definição prematura pela área verificada neste estudo, confirmou a tendência da expansão da especialização observada nos últimos anos no Brasil. Essa tendência também foi detectada entre os acadêmicos dos cursos de Odontologia do Rio Grande do Sul3, de Goiás6 e de São Paulo7. Já Slavutzky et al.12 (2002) verificaram, em acadêmicos da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no período de 1998 a 2001, que 76% pretendiam fazer especialização, mas ainda não tinham escolhido a área que desejavam se especializar. Segundo Costa et al.5 (1999), observa-se durante os cursos de graduação “um estímulo precoce à especialização, levando o aluno a perder a visão harmônica do indivíduo como um todo”. A Ortodontia, área preferida por 21,5% dos acadêmicos da Faculdade de Odontologia da UNIPLAC, também foi a mais popular em seis diferentes cursos de Odontologia do estado de São Paulo7 e na Universidade Federal de Goiás6. A Cirurgia representou a segunda área de atuação mais mencionada tanto na UNIPLAC quanto na UFG6. Já na Faculdade de Odontologia de São Paulo7, a Odontopediatria ficou em segundo lugar como área pretendida. tribuíram ainda para subsidiar a caracterização das qualificações do profissional a ser formado pela UNIPLAC e a conseqüente reestruturação curricular. Estudos e seminários deveriam ser estimulados nas faculdades e associações de classe. A formação de recursos humanos adequados à realidade socioepidemiológica do Brasil é, desse modo, o grande desafio para a consolidação do SUS. Abstract Personal characteristics of undergraduate dental students of the Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brazil The purpose of this study was to determine the personal characteristics of undergraduate students of the School of Dentistry, Universidade do Planalto Catarinense/UNIPLAC, to reveal the reasons they had for choosing this specific course and their expectancies about their future profession. All students of the first to the tenth term of the course answered a structured questionnaire prepared for this study (n = 214). Data were collected during the first semester of 2004. Among other findings, it was detected that 53.3% of the students are women, most of them are from the state of Santa Catarina, they are single and young, have no children, present high socioeconomic level and parental educational level. They expect to specialize in the future, to work with private and public health care, and to be well paid. Their choice for Dentistry was based mainly on personal and professional satisfaction. They believe that the objective of Dentistry is the prevention and maintenance of oral health. The results of this study showed changes that have been occurring in dentistry and in the teaching of dentistry. The results also contributed to help characterize the qualifications that a professional who graduates from UNIPLAC must have. Descriptors Students, dental. Education, dental. Teaching. § Referências bibliográficas 1. ABENO. Entrega do currículo ao Conselho Federal de Educação. ABENO Notícias 1978;1(1):4. 2. Arbenz GO, Abramowicz M, Abramowicz M, Silva M. Motivos conscientes na escolha da profissão odontológica. Rev Fac Conclusão Os resultados deste trabalho permitiram identificar mudanças e tendências que estão ocorrendo nas relações entre o exercício profissional e o ensino da Odontologia, comparando-se com os achados de outros estudos com os mesmos objetivos propostos. Con- Odontol Univ São Paulo 1973;1(11):101-9. 3. Botti MRV, Santos GMC. Perspectiva do exercício profissional na odontologia. RGO 1986;2(34):155-9. 4. Carvalho DR, Perri de Carvalho AC, Sampaio H. Motivações e expectativas para o curso e para o exercício da Odontologia. Rev Assoc Paul Cir Dent 1997;51(4):345-9. Revista da ABENO • 6(1):70-6 75 Perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade do Planalto Catarinense – Lages – SC, Brasil • Brustolin J, Brustolin J, Toassi RFC, Kuhnen M 5. Costa ICC, Marcelino G, Saliba NA. Perspectivas de um grupo de alunos de odontologia sobre a profissão no terceiro milênio. 17(36):135-9. 11. Pinto M, Fraga V. Novo perfil do CD. Jornal do CFO, jan/fev 2003, p. 6-7. Rev ABOPREV 1999;2(1):38-45. 6. Freire MCM, Souza CS, Pereira HR. O perfil do acadêmico de 12. Slavutzky SMB, Abbeg C, Gross RFE, Rosa MAC. Mercado de Odontologia da Universidade Federal de Goiás. Divulgação em trabalho: perfil do acadêmico de Odontologia da Universidade Saúde para Debate 1995;10:15-20. Federal do Rio Grande do Sul. Rev Fac Odontol Porto Alegre 7. Freitas SFT, Nakayama MH. Um perfil do estudante de Odontologia no estado de São Paulo. Divulgação em Saúde para 2002;43(2):3-6. 13. Traebert JL, Lacerda JT, Peres MAA, Lunardelli SE, Clavera WV. A formação de recursos humanos em Odontologia da Uni- Debate 1995;10:29-37. 8. Junqueira JC, Colombo CED, Tavares PG, Rocha RF, Carvalho YR, Rodrigues JR. Quem é e o que pensa o graduando de odon- versidade do Vale do Itajaí - Santa Catarina. Divulgação em Saúde para Debate 1995;10:80. 14. Universidade do Planalto Catarinense. Faculdade de Odonto- tologia. Rev Odontol UNESP 2002;31(2):269-84. 9. Narvai PC. Odontologia e Saúde Bucal Coletiva. 2ª ed. São logia. Projeto político pedagógico: Odontologia (elaborado em 1998). Paulo: Santos; 2002. 10. Nicodemo D, Naressi WG. O perfil do aluno de odontologia – do ingresso à sua graduação. Rev Odonto Ciência 2002; Aceito para publicação em 06/2005 Atenção, autores! 76 Revista da ABENO • 6(1):70-6 Trabalho de Conclusão de Curso: construção ao longo do curso ou tarefa para finalizá-lo?† Na UNIVALI pratica-se a atividade acadêmica do TCC adotando-se a concepção da pesquisa como princípio científico e educativo, como alternativa pedagógica para se fomentar, no acadêmico e no docente, o questionamento crítico e (re)construtivo. Elisabete Rabaldo Bottan*, Mario Uriarte Neto**, Nivaldo Murilo Diegoli***, Shirlei Imianowski****, Henri Stuker** *Mestre em Ensino de Ciências Naturais. E-mail: [email protected]. **Doutores em Engenharia de Produção. ***Mestre em Materiais Dentários. ****Mestre em Saúde Pública. RESUMO Desenvolvendo-se a face educativa da pesquisa, favorece-se o questionamento sobre a realidade e, também, não se restringe a pesquisa às etapas de coleta e acumulação de dados. Assim, pode-se conceituar pesquisa como uma atividade de inquirição da realidade, como uma atividade que permite (re)elaborar um conhecimento que auxilie na compreensão dessa realidade e oriente as ações dos profissionais. Este artigo enfoca a experiência do curso de Odontologia da Universidade do Vale do Itajaí em adotar a pesquisa como uma atividade integrada ao processo de ensino-aprendizagem, vinculando-a ao Trabalho de Conclusão de Curso. DESCRITORES Recursos humanos em odontologia. Educação em odontologia. Pesquisa em odontologia. Educação superior. A s Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Odontologia, aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação (Parecer CNE/CES 1300/01; Resolução CNE/CES 3/02), definem as linhas gerais para a organização do curso de Odontologia. Dentre as recomendações apontadas no documento, encontra-se a obrigatoriedade do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). No Curso de Odontologia da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), desde a sua implantação em 1990, o TCC já integra a estrutura curricular. O nosso entendimento de TCC é de que ele é uma atividade de exercício da investigação científica. Ele implica a produção de um projeto de pesquisa, a sua qualificação e a sua defesa escrita e verbal, perante banca examinadora. E envolve toda a comunidade acadêmica (alunos, docentes e funcionários) ao longo dos diferentes momentos da matriz curricular. Portanto, desde a sua implantação, o TCC não foi concebido como uma tarefa a mais, como um fardo a ser carregado no final do curso. Adotamos, apoiados nas argumentações de Demo4 (1991), a concepção da pesquisa como princípio científico e educativo, como alternativa pedagógica para se fomentar, no acadêmico e no docente, o questionamento crítico e (re)construtivo. A pesquisa como † Este artigo foi produzido com base nos trabalhos apresentados no Seminário “Ensinando e Aprendendo” das 36ª e 38ª Reuniões da Asso- ciação Brasileira de Ensino Odontológico. Revista da ABENO • 6(1):77-80 77 Trabalho de Conclusão de Curso: construção ao longo do curso ou tarefa para finalizá-lo? • Bottan ER, Uriarte Neto M, Diegoli NM, Imianowski S, Stuker H tal é uma estratégia para se saber fazer e refazer conhecimento. Assim, o objetivo claramente definido para o TCC não é o de se utilizar o termo pesquisa no sentido científico restrito, do ineditismo. Para nós, como destacou Demo3 (1996), a originalidade esperada não é aquela do absolutamente irrepetível, mas sim de se conhecer o que já se desenvolveu como conhecimento, permutando saberes, práticas e experimentos. Acreditamos e estamos praticando a atividade acadêmica do TCC como um quesito essencial à formação de recursos humanos para a área da saúde com perfil que atenda às demandas sociais. Este perfil requer sujeitos capazes de trabalhar em equipe, aprender a aprender, ter iniciativa e criatividade, comunicar-se7. Essas características não podem ser alcançadas com uma pedagogia tradicional, que está sustentada num processo de ensino-aprendizagem tipicamente bancário, em que o professor informa e o aluno recebe, passivamente, os conhecimentos. A alternativa, então, é um processo de educação problematizadora, em que educando e educador dialogam sobre um conteúdo que tem significado para ambos. Nesta dimensão, o TCC enquanto atividade investigativo-educativa é uma possibilidade concreta e possível. E, este, portanto, é o objeto deste artigo, que pretende socializar, através de um breve relato, os primeiros passos da trajetória da inclusão do TCC no projeto pedagógico do curso de Odontologia da UNIVALI, que hoje conta com quatorze anos de existência. O PROCESSO A cotidianização da pesquisa deu-se, prioritariamente, através do processo de aprender fazer fazendo. O primeiro passo dessa trajetória, denominado saber fazer, constituiu-se na instrumentação teórico-metodológica de professores e de alunos. O ponto de partida desta experiência foi a capacitação dos recursos humanos, em especial do professor, pois as interações ensino-pesquisa não fazem parte do nosso dia, elas dependem de um esforço de socialização de conhecimentos, de fazeres, de vivências pessoais. O discurso da articulação ensino-pesquisa, muitas vezes, acaba não sendo praticado, caindo no vazio, por dificuldades referentes a como se fazer. Daí nossa preocupação inicial em fornecer subsídios que potencializassem o trabalho dos professores-cirurgiões-dentistas. Há que se destacar o fato de que o grupo, à época, era constituído, na sua maioria, por jovens profissionais, especialistas, sem formação pedagógica e sem 78 vivência em pesquisa. E os que possuíam alguma experiência em pesquisa, esta era na dimensão estritamente científica, adquirida por um breve exercício, nos cursos de pós-graduação. Esta caracterização inicial do nosso corpo docente não é exclusividade nossa, pois, como afirmaram, recentemente, Péret, Lima9 (2005, p. 46), embasadas em Carvalho1 (2001), “poucos são os programas que incluem a pesquisa educativa (...), quando esta é incluída, muitas vezes, tem ficado restrita à disciplina de Didática de Ensino Superior”. Conscientes dessa limitação, organizamos periodicamente cursos teórico-práticos de metodologia da pesquisa para os professores, com o objetivo de auxiliá-los a tornar a pesquisa o ambiente didático cotidiano, a manejar a pesquisa como princípio científico educativo. Cumpre destacar que esses cursos não tinham por função transformar os professores em pesquisadores profissionais, mas desmitificar a idéia de que a pesquisa é uma atividade desvinculada do ensino e de que é praticada por alguns grupos especiais2,3,5,6,8,10. Para os alunos, o desenvolvimento das competências necessárias à produção e à comunicação de conhecimentos dá-se através da oferta de onze (11) créditos obrigatórios, distribuídos em três distintos momentos do curso. No segundo período, o aluno é orientado quanto ao processo de (re)elaboração do conhecimento, ou seja, a pesquisa bibliográfica e seus procedimentos, através da disciplina de Metodologia da Pesquisa. A partir desse momento, passa-se a instigar no aluno o hábito da consulta bibliográfica como uma estratégia complementar e necessária à sua formação. No trimestre intermediário do curso (terceiro a sexto períodos), acontece a capacitação quanto a organização e implementação de uma proposta de investigação. Sob a orientação de uma equipe de professores, os acadêmicos intensificam a habilidade de leitura e análise crítica sobre um determinado assunto, bem como de formular perguntas e hipóteses e de estabelecer um plano de coleta de dados que permita responder às questões levantadas. E, nos últimos semestres (oitavo e nono períodos), a ênfase é no processo de comunicação (escrita e verbal) do conhe­ cimento construído pela via da pesquisa, que é coordenado pelas disciplinas de Metodologia da Pesquisa e Bioestatística e com a supervisão direta dos professores-orientadores. O acesso ao suporte teórico-metodológico também ocorre pelo sistema de assessoria, através do Setor de Apoio à Pesquisa, que está à disposição da comu- Revista da ABENO • 6(1):77-80 Trabalho de Conclusão de Curso: construção ao longo do curso ou tarefa para finalizá-lo? • Bottan ER, Uriarte Neto M, Diegoli NM, Imianowski S, Stuker H nidade acadêmica, em regime de tempo integral ao longo de todos os dias da semana, com atendimento direto ou através de meio eletrônico. Para subsidiar os procedimentos de capacitação contínua, foram produzidos materiais, sob a forma de módulos impressos e disponibilizados em meio eletrônico, que auxiliam professores e acadêmicos nas diferentes etapas do processo da investigação científica. Os principais módulos instrucionais já produzidos são: • Como Elaborar uma Pesquisa Bibliográfica. • Manual de Referências Bibliográficas. • Manual de Bioestatística. • Como Elaborar o Projeto de Pesquisa. • Estrutura da Monografia. A outra etapa do processo de cotidianização da estratégia da pesquisa na graduação, que denominamos de processo de integração (ou saber fazer integrado), foi a de organização dos grupos de pesquisa. Esses grupos foram estruturados segundo a formação e o interesse dos professores dos, então, ciclos básico e profissionalizante e levando-se em conta a filosofia institucional. Num primeiro momento, foram definidas apenas duas grandes áreas: clínica e epidemiológica, pois a intenção é a de se promover o exercício da investigação de forma integrada e de se fortalecer a idéia de que a proposta enfoca o ensino com pesquisa e não a pesquisa pela pesquisa. As temáticas da área clínica, congregando investigações com o objetivo de testar, aprimorar e avaliar técnicas, tratamentos e/ou materiais odontológicos, através de estudos observacionais (casos clínicos) e de experimentos in vivo ou in vitro, envolvem disciplinas das ciências biológicas e clínicas odontológicas. Dessa forma, contribui-se para a aproximação do conhecimento básico com a sua aplicação clínica. Articulação esta enfatizada como necessária pelas Diretrizes Curriculares. Na área epidemiológica, através de estudos observacionais, busca-se fazer a leitura crítica da realidade, ou seja, das reais condições de saúde bucal e de assistência da população residente na área de abrangência da UNIVALI, com vistas ao planejamento de ações que favoreçam a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Os trabalhos investigativos dessa área retroalimentam a filosofia norteadora do curso e favorecem a integração do ensino com a extensão. À medida que o aluno vai se familiarizando com a estratégia da pesquisa, ele opta por uma temática de uma das duas grandes áreas e pelo respectivo orientador, com os quais vai passar a conviver até o final do curso. Todo o funcionamento da proposta ocorre em pequenos grupos. Os acadêmicos sempre trabalham em duplas. As propostas de pesquisa são discutidas e acompanhadas por uma equipe de docentes, e não apenas pelo orientador. O momento de definição dos alunos para se engajarem a uma proposta de pesquisa atende o ritmo de cada um. Desta forma, temos duplas que começam a integrar os grupos de investigação desde o terceiro semestre e outras que despertam seus interesses somente no sexto período, quando, então, por força de mecanismos legais, são obrigadas a apresentarem uma proposta de pesquisa para o seu Trabalho de Conclusão de Curso. AS AVALIAÇÕES SOBRE O PROCESSO Mediante sistemáticas observações, depoimentos de acadêmicos e docentes, análise de relatórios, podem-se evidenciar alguns indicadores positivos do processo de implantação da pesquisa na graduação. Uma análise quantitativa nos revela um significativo crescimento: • de participações de professores e de alunos em eventos científicos, na condição de colaboradores ativos, isto é, apresentando suas produções científicas; • da demanda por inscrições nos Programas de Bolsas de Iniciação Científica mantidos pela Instituição; • do número de publicações de artigos, em periódicos, sobre os resultados das pesquisas executadas; • da titulação qualificada por parte dos professores, isto é, a participação em Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu. E a observação de indicadores quali-quantitaivos evidencia que a pesquisa na graduação vem propiciando: • a constante revisão/revitalização do processo de ensino-aprendizagem no âmbito do curso; • o fortalecimento das atividades extensivas de educação em saúde, envolvendo alunos e docentes; • a aproximação e articulação entre as disciplinas que constituem a matriz curricular; • o delineamento e a consolidação das Linhas de Pesquisa do Curso; • a integração com as atividades de Pós-Graduação; • a criação e manutenção da estratégia de Estágio de Pesquisa para os egressos, como uma dimensão da educação continuada; • o desenvolvimento de atitudes positivas em relação Revista da ABENO • 6(1):77-80 79 Trabalho de Conclusão de Curso: construção ao longo do curso ou tarefa para finalizá-lo? • Bottan ER, Uriarte Neto M, Diegoli NM, Imianowski S, Stuker H à educação continuada, ao longo da graduação e após a conclusão do curso; • a formação de um profissional mais crítico e atuante em diferentes áreas profissionais: clínica, docência, gestão. CONSIDERAÇÕES FINAIS A palavra pesquisa vem do verbo latino perquiro que significa procurar; buscar com cuidado; procurar por toda parte; informar-se; inquirir; perguntar; indagar bem; aprofundar-se na busca. Essa é a conotação que estamos dando à atividade de TCC, no curso de Odontologia da UNIVALI, porque o consideramos um importante procedimento para capacitação de profissionais da área da saúde. De acordo com Valle11 (1997), a profissionalização (ou formação para o mercado de trabalho) deve ter como ponto de partida a capacitação do indivíduo para o desempenho de um trabalho não como um reprodutor de numerosas tarefas, mas como um sujeito que é capaz de exercitar seu potencial criador e aliar o pensar ao fazer. O processo de profissionalização é, portanto, um processo de formação de um trabalhador competente, capaz de criar e recriar o seu fazer e de comprometer-se socialmente. A competência desse profissional implica domínio de conhecimentos técnicos e científicos, e o comprometimento social está relacionado com a capacidade de agir e refletir sobre as possibilidades de transformação das condições de vida de uma determinada comunidade. Inegavelmente, para se promover a formação do profissional com tais características, é necessário que se adote uma prática pedagógica que articule ensinopesquisa. Nessa perspectiva, a pesquisa constitui-se como um processo de oxigenação do ensino, como um processo capaz de tornar o ensino mais criativo e instigador, como um processo pedagógico que integra a formação teórico-científica à realidade da sociedade. A prática pedagógica que adota a pesquisa como um “princípio educativo” estimula e capacita os sujeitos (professores e alunos) a produzirem (e não apenas reproduzirem) conhecimento; portanto, ela supera o modelo didático-metodológico do treinamento, que é centrado num fazer distanciado da reflexão sobre este fazer. Por isso, para nós, o TCC é tudo, exceto uma tarefa a mais para o acadêmico finalizar o curso. 80 ABSTRACT Course Conclusion Paper: should it be constructed during, or at the end of the course? When the educational side of research is developed, investigation of the reality is favored, and the research is not restricted to the study of the stages of collection and accumulation of data. Research can therefore be conceived as an activity of enquiring into the reality; as an activity which enables the (re)elaboration of knowledge that will assist in an understanding of this reality and provide orientation for the actions of professionals. This article focuses on the experience of the Dentistry Program at the University of Vale do Itajaí, of adopting research as an activity which is integrated with the teaching-learning process, linking it to the Course Conclusion Paper. DESCRIPTORS Dental staff. Education, dental. Dental research. Education, higher. § REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Carvalho ACP. Ensino de Odontologia em tempos de LDB. Canoas: ULBRA; 2001. 2. Celani MAA. A educação continuada do professor. Ciência e Cultura 1988;40(2):158-63. 3. Demo P. Educar pela pesquisa. Campinas: Autores Associados; 1996. 4. Demo P. Pesquisa: princípio científico e educativo. 2a ed. São Paulo: Cortez; 1991. 5. Lüdke M. A complexa relação entre o professor e a pesquisa. In: André M, editor. O papel da pesquisa na formação e na prática dos professores. Campinas: Papirus; 2001. p. 27-54. 6. Lüdke M, André M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU; 1986. 7. O movimento de mudança na formação de profissionais da saúde no Brasil. Divulgação em Saúde para Debate 2000;22:4-7. 8. Pereira JED. Formação de professores: pesquisas, representações e poder. Belo Horizonte: Autêntica; 2000. 9. Péret ACA, Lima MLR. A pesquisa nos critérios de avaliação da CAPES e a formação do professor de Odontologia numa dimensão crítica. Rev ABENO 2005;5(1):46-51. 10. Ponte JP. Pesquisar para compreender e transformar a nossa prática. Educar 2004;24:37-66. 11. Valle R. Mudanças tecnológicas na indústria e seus efeitos sobre o trabalho. In: Seminário Formação técnica em biotecnologia. Rio de Janeiro; 1997. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 1997. Revista da ABENO • 6(1):77-80 Aceito para publicação em 10/2005 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil A Saúde Coletiva tem um papel de grande importância na formação do futuro cirurgião-dentista com o perfil exigido pelas Diretrizes Curriculares e pela sociedade. Renata Prata Cunha Bernardes Rodrigues*, Nemre Adas Saliba**, Suzely Adas Saliba Moimaz*** *Mestre em Odontologia Preventiva e Social pela Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. E-mail: [email protected]. **Professora Titular da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. ***Professora Adjunta da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista. Resumo A área da Saúde Coletiva tem papel fundamental na formação do profissional com o perfil exigido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Odontologia, implementadas em 2002. O objetivo da pesquisa foi analisar as características das disciplinas da área da saúde coletiva nos currículos dos cursos de Odontologia do País, no que se refere a carga horária, duração em semestres, nomenclatura, formato, metodologia de ensino e formas de avaliação. Foram enviadas correspondências para 123 cursos que tinham formado pelo menos uma turma até o ano de 2003, solicitando a estrutura curricular do curso e os planos de ensino das disciplinas. Cinqüenta cursos enviaram o material (40,65%). A carga horária destinada à saúde coletiva variou de 75 a 699 horas, sendo que 44,18% está na faixa de 200 a 324 horas. Os cursos pesquisados destinam de 1 a 8 semestres para a área, destacando-se a concentração em 2 e 3 semestres (20,93% cada) e em 4 semestres (27,91%). Odontologia Social e Preventiva foi a nomenclatura mais citada (30%) para designar a área da Saúde Coletiva. Todas as disciplinas são de caráter teórico-prático. As metodologias de ensino mais citadas foram aulas expositivas (100%) e seminários (71,88%). As formas de avaliação mais uti- lizadas foram prova escrita (100%) e prova prática (80%). Conclui-se para a maioria dos cursos que a carga horária da área é de 75 a 324 horas, ministradas de 2 a 4 semestres; a nomenclatura mais utilizada foi Odontologia Social e Preventiva; todas são de caráter teórico-prático; as metodologias de ensino mais citadas foram aulas expositivas e seminários; e, como forma de avaliação, a prova escrita e a prova prática foram as mais citadas nos planos de ensino. Descritores Educação em Odontologia. Currículo. Odontologia. Educação. Odontologia em saúde pública. A Saúde Coletiva está presente em todos os cursos de Odontologia do Brasil e não pode ser considerada apenas uma “disciplina de caráter social, responsável pelos problemas de saúde da comunidade, mas considerada como uma atitude e uma filosofia de trabalho”9. O sentido social torna-se extremamente relevante no atual contexto da globalização, no qual as relações econômicas, sociais e políticas interagem e se entrecruzam e quando são explícitas as mudanças da base tecnológica e dos meios produtivos, colocando a edu- Revista da ABENO • 6(1):81-7 81 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil • Rodrigues RPCB, Saliba NA, Moimaz SAS cação não somente como elemento imprescindível para o desenvolvimento de todas as nações, mas essencial para atender “às necessidades sociais e promover a solidariedade e a igualdade”17. De acordo com a Resolução do Conselho Federal de Odontologia - 22/2001, a Saúde Coletiva “é a especialidade que tem como objetivo o estudo dos fenômenos que interferem na saúde coletiva, por meio de análise, organização, planejamento, execução e avaliação de sistemas de saúde, dirigidos a grupos populacionais, com ênfase na promoção de saúde”4. Essa disciplina está inserida nos conteúdos relativos às ciências humanas e sociais que incluem conteúdos referentes às diversas dimensões da relação indivíduo/sociedade, contribuindo para a compreensão dos determinantes sociais, culturais, comportamentais, psicológicos, ecológicos, éticos e legais nos níveis individual e coletivo do processo saúde-doença, conforme as Diretrizes Curriculares para os cursos de Odontologia5. Até 1996, ano da extinção do currículo mínimo, os conteúdos relativos à Saúde Coletiva estavam incluídos nas matérias consideradas profissionalizantes7. A Saúde Coletiva tem um papel de grande importância na formação do futuro cirurgião-dentista com o perfil exigido pelas Diretrizes Curriculares e pela sociedade, ou seja, com formação generalista, socialmente sensível e principalmente sempre disposto a aprender. A presente pesquisa tem como objetivo analisar as características das disciplinas da área da Saúde Coletiva nas estruturas curriculares e nos planos de ensino dos cursos de Odontologia do País, considerando: carga horária, duração, nomenclatura, formato, metodologias de ensino e formas de avaliação. Material e Método O projeto de pesquisa deste estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista e foi aprovado. Inicialmente foi realizada uma pesquisa, em abril de 2003, no site do Ministério da Educação, para o conhecimento do número de cursos de Odontologia no Brasil. A partir da constatação de que havia 172 cursos de Odontologia, determinou-se que somente fariam parte da pesquisa as Instituições de Ensino Superior (IES) que até 2003 tivessem pelo menos uma turma formada; foram listados, assim, 123 cursos de 82 Odontologia. Para obter as informações necessárias aos objetivos da pesquisa, foi enviado um ofício a essas 123 IES, expondo os objetivos da pesquisa e solicitando a estrutura curricular do curso de Odontologia e os planos de ensino das disciplinas da área da Saúde Coletiva. Um envelope selado e endereçado para o retorno do material foi enviado juntamente com o ofício, a fim de facilitar a devolução do material. Um segundo ofício solicitando novamente o material para a pesquisa foi encaminhado às IES que não enviaram o material na primeira solicitação, a fim de obter uma maior adesão à pesquisa por parte dos cursos. O material enviado pelos cursos recebeu tratamento estatístico descritivo, e os resultados foram apresentados em tabelas e gráficos. Resultados e Discussão Das 123 correspondências enviadas aos cursos de Odontologia do Brasil, obteve-se, em um primeiro momento, o retorno do material de 45 cursos de Odontologia. Foram enviadas novamente 78 correspondências para os cursos que não enviaram o material na primeira solicitação e somente 5 retornaram o material solicitado. Assim, esses 50 cursos de Odontologia (40,65% do total) constituem a amostra desta pesquisa. Em relação à natureza administrativa das IES, verificou-se que 60% são privadas, 24% são federais e 16% são estaduais; nenhum curso municipal participou da pesquisa, totalizando 40% de cursos públicos. O tempo mínimo para a integralização dos créditos, ou seja, a duração mínima do curso pode ser verificada no Gráfico 1. Antes da extinção do currículo mínimo, a carga horária mínima para o curso de Odontologia deveria ser de 3.600 horas, distribuídas em 4 anos7. Com a flexibilização curricular proporcionada pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação, atualmente, a maioria das escolas pesquisadas (54,5%) possui o curso em 4 anos, e 27,3%, em 5 anos. Em pesquisa realizada por Paula, Bezerra16 (2003), a porcentagem de escolas com duração mínima do curso de 5 anos que participaram do estudo foi de 45%, valor superior ao encontrado nesta pesquisa. A carga horária total do curso de Odontologia das IES pesquisadas está demonstrada no Gráfico 2. Revista da ABENO • 6(1):81-7 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil • Rodrigues RPCB, Saliba NA, Moimaz SAS O Parecer do Conselho Nacional da Educação/ Conselho de Educação Superior nº 329/2004, aprovado em 11/11/2004, estabelece a carga horária mínima dos cursos de graduação e bacharelados na modalidade presencial. Para o curso de Odontologia, ficou estabelecido um mínimo de 4.000 horas6. A grande maioria dos cursos de Odontologia pesquisados (79,55%) oferece a carga horária total de 4.000 a 5.199 horas; porém, 13,64% dos cursos terão de se adequar à nova proposta de carga horária mínima, pois oferecem uma carga horária inferior a 4.000 horas. A análise da área da Saúde Coletiva foi feita por meio dos planos de ensino enviados pelas IES, planos nos quais muitas vezes não constavam todas as informações necessárias. Dessa forma, a quantidade de cursos analisados para cada variável sofreu alteração. Convém ressaltar que os conteúdos de Orientação Profissional e Odontologia Legal, mesmo constituindo, às vezes, disciplinas separadas, estão relacionados à grande área da Saúde Coletiva. Mas, como a maior parte dos cursos pesquisados não enviou os planos de ensino dessas disciplinas, neste estudo só fazem parte as disciplinas relacionadas à Saúde Coletiva e os estágios extramuros. Dessa forma, nesta pesquisa, as referências feitas à área da Saúde Coletiva excluirão a área de Odontologia Legal e de Orientação Profissional e incluirão o estágio extramuros, quando este se constituir uma disciplina isolada. Assim, para a análise da carga horária e da quantidade de períodos destinados às disciplinas da Saúde Coletiva, foi analisado um total de 43 cursos. Observa-se uma grande heterogeneidade na distribuição da carga horária, o que pode ocorrer devido a maior ou menor importância que é dada a essas disciplinas pelo curso de cada IES. De acordo com o Gráfico 3, a maior parte das escolas oferece de 75 a 325 horas e, ainda, algumas escolas estão conscientes da importância da Saúde Coletiva como eixo norteador do processo de formação, oferecendo uma carga horária acima de 450 horas. Um fato que chamou a atenção foi o de um curso destinar somente 75 horas de aula para a Saúde Coletiva, o que é incompatível para formar um profissional com uma visão social da profissão. Na análise da carga horária destinada à Saúde Coletiva e da carga horária total do curso, observou-se que não houve correlação (r = 0,0271 e p = 0,8644), ou seja, os cursos que oferecem maior carga horária % 60 54,55 50 40 27,27 30 18,18 20 10 0 4 anos 4,5 anos 5 anos Gráfico 1 - Distribuição dos cursos de Odontologia pes- quisados quanto à duração mínima. Brasil, 2004. % 30 29,55 25 25 25 20 15 13,64 10 6,82 5 0 Carga horária (h) 4.000 4.800 4.400 5.200 4.800 3.600 4.000 4.400 5.200 5.600 Gráfico 2 - Distribuição dos cursos de Odontologia pes- quisados quanto à carga horária total, em horas. Brasil, 2004. % 45 44,18 Carga horária (h) 40 75 200 325 450 575 35 30 32,56 25 200 325 450 575 700 20 15 18,6 10 5 2,33 2,33 0 Gráfico 3 - Distribuição dos cursos de Odontologia quan- to à carga horária, em horas, destinada às disciplinas da Saúde Coletiva. Brasil, 2004. Revista da ABENO • 6(1):81-7 83 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil • Rodrigues RPCB, Saliba NA, Moimaz SAS 600 Carga horária em Saúde Coletiva 500 400 300 200 100 0 3.000 3.500 4.000 4.500 5.000 5.500 Carga horária total Gráfico 4 - Correlação entre a carga horária total e a de Odontologia em Saúde Coletiva, em horas, dos cursos pesquisados. Brasil, 2004. % 30 27,91 25 20,93 20,93 20 15 11,63 10 5 6,98 4,65 4,65 2,32 0 1 2 3 4 5 6 7 8 Semestres Gráfico 5 - Distribuição dos cursos de Odontologia se- gundo os semestres destinados às disciplinas de Saúde Coletiva. Brasil, 2004. não oferecem, necessária e proporcionalmente, o mesmo número de horas à Saúde Coletiva (Gráfico 4). Paula, Bezerra16 (2003) também não encontraram correlação entre a carga horária do curso e a da Saúde Coletiva e ainda constataram, em seu estudo, que a maioria dos cursos ainda não incorporou a Saúde Coletiva em seus currículos de maneira efetiva, o que denota o descaso com o papel e a real importância da saúde pública. A quantidade de semestres em que os conteúdos de Saúde Coletiva são ministrados apresentou uma grande variação, desde 1 até 8 semestres, mas, para a 84 maioria, a quantidade variou de 2 a 4 semestres (Gráfico 5). Foi verificado que todas as disciplinas são de caráter teórico-prático e que 95,35% mencionaram em seu plano de ensino a existência de atividades extramuros. É interessante observar o exemplo da disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de Odon­ tologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que, em 1973, era ministrada em um único período e somente com conteúdos teóricos, não existindo atividades de extensão e estágio discente em comunidades. Mas, a partir de 1976, atividades práticas foram desenvolvidas por meio de estágios que promoviam a integração com a comunidade18. Essa integração da universidade com a comunidade, de acordo com Medeiros13 (1991), foi proposta pelo MEC, em 1979, e foi denominada de Programa de Integração Docente-Assistencial (IDA), podendo ser resumida como sendo a união de esforços entre as escolas e os serviços de saúde, adequando-os às necessidades reais da comunidade, à produção de conhecimentos e à formação dos recursos humanos necessários em um determinado contexto da prática de serviços de saúde e de ensino. Posteriormente, um outro programa com o objetivo de também proporcionar uma maior articulação ensino-serviço-comunidade foi implementado. Esse programa recebeu o nome de “Uma Nova Iniciativa na Educação dos Profissionais de Saúde: União com a Comunidade (UNI)” e foi considerado uma evolução dos projetos IDA8. Somente dois cursos não mencionaram, no plano de ensino, a realização de atividades extramuros. Essas atividades são consideradas como atividade de extensão e são fundamentais para a formação do cirurgiãodentista comprometido com os problemas de saúde bucal da população, pois as atividades extramuros possibilitam ao aluno o conhecimento das dimensões estruturais dos serviços públicos de saúde, bem como a participação no atendimento à população1,14. Segundo Ayers et al.2 (2003), as atividades extramuros devem ser vistas como componentes importantes de qualquer currículo contemporâneo de Odontologia. A Tabela 1 demonstra a nomenclatura utilizada para designar a área da Saúde Coletiva citada nos planos. Dentre as denominações mais utilizadas pelas IES, encontram-se: Odontologia Social e Preventiva, Revista da ABENO • 6(1):81-7 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil • Rodrigues RPCB, Saliba NA, Moimaz SAS Tabela 1 - Nomenclatura utilizada pelas faculdades de Odontologia para a área da Saúde Coletiva. Brasil, 2004. Nomenclatura N % 10 20 4 8 Odontologia Social e Preventiva 15 30 Odontologia em Saúde Coletiva 12 24 Odontologia de Promoção da Saúde 1 Odontologia Coletiva Odontologia Social Saúde Bucal Coletiva Tabela 2 - Metodologias de ensino utilizadas pelas fa- culdades de Odontologia para a área da Saúde Coletiva. Brasil, 2004. Metodologia Citações nos planos de ensino Número Porcentagem Aulas expositivas 32 100,00 Seminários 23 71,88 2 Aulas práticas 19 59,38 1 2 Trabalho em grupo 13 40,63 Odontologia Preventiva 3 6 Estudo dirigido 11 34,38 Odontologia Preventiva e Sanitária 2 4 Trabalho de campo 8 25,00 Odontologia Sanitária 1 2 Dinâmicas de grupo 7 21,88 Saúde Coletiva 1 2 Discussão em grupo 7 21,88 50 100 Atividades clínicas 5 15,63 Visitas a serviços de saúde 4 12,50 Pesquisa bibliográfica 4 12,50 Problematização 3 9,38 Discussão de caso clínico 3 9,38 Discussão de artigos 3 9,38 Produção de material educativo 2 6,25 Redação de texto 2 6,25 Revisão crítica sistemática 1 3,13 Palestra com convidados 1 3,13 Total Odontologia em Saúde Coletiva e Odontologia Social. “Saúde Coletiva” é o termo que consta no Conselho Federal de Odontologia (CFO) como uma especialidade odontológica4; porém, a substituição de termos utilizados anteriormente, como “Odontologia Sanitária”, deverá ocorrer de forma gradual, à medida que os currículos forem sendo reestruturados. Segundo Narvai15 (1994), ao longo do tempo, as concepções de Odontologia foram mudando e várias adjetivações foram dadas, como sanitária, preventiva, social, simplificada, comunitária, integral, sistêmica e saúde bucal coletiva, de acordo com o contexto sociopolítico da época. De acordo com Gil12 (1991), para facilitar a aprendizagem dos alunos, o professor faz uso de estratégias, ou seja, da aplicação de meios disponíveis para o alcance de seus objetivos. O planejamento de métodos educacionais aplicáveis representa o elemento essencial na prática docente. Para a seleção do método de ensino, alguns critérios devem ser considerados, como: a análise dos objetivos educacionais previamente determinados, o conteúdo programático adotado, o nível dos educandos, o tempo disponível para o conteúdo e o domínio de métodos e técnicas pelo educador10. Somente 32 planos de ensino trouxeram informações em relação às metodologias de ensino. As metodologias ou estratégias de ensino utilizadas pelas ­escolas podem ser visualizadas na Tabela 2. É impor- tante ressaltar que um mesmo curso pode citar mais de uma estratégia para o ensino-aprendizagem. Dentre as várias estratégias de ensino citadas nos planos de ensino, as aulas expositivas, os seminários, as aulas práticas e os trabalhos em grupo foram as mais citadas. Essas estratégias são consideradas tradicionais, principalmente a aula expositiva. Para Gil12 (1991), a aula expositiva é a estratégia mais utilizada e mais controvertida, pois, enquanto alguns professores defendem seu uso, sobretudo pela praticidade, outros a criticam, chegando a conceituála como um processo em que os fatos são transmitidos das fichas do professor para o caderno do aluno sem passar pela mente de nenhum dos dois. No mundo atual, o professor como simples repassador de conteúdos está com os dias contados, pois o mercado hoje exige um docente que partilhe seus conhecimentos com os alunos e, mesmo, aprenda com eles, visto que novos conhecimentos surgem a Revista da ABENO • 6(1):81-7 85 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil • Rodrigues RPCB, Saliba NA, Moimaz SAS cada dia e, muitas vezes, o professor nem chega a tomar conhecimento dos fatos. Dessa forma, o professor deverá mudar o foco do ensinar para reproduzir conhecimento e passar a se preocupar com o aprender e, em especial, o “aprender a aprender”, abrindo caminhos coletivos em busca e investigação para a produção do seu próprio conhecimento e do seu aluno3. Em relação aos métodos de avaliação, verificou-se que 40 cursos fizeram referência à avaliação em seus planos de ensino. Os meios de avaliação mais citados foram as provas escritas, as provas práticas e a avaliação dos trabalhos (Tabela 3). No que se refere ao processo de avaliação, este deve auxiliar o educando a progredir na aprendizagem e o educador a aperfeiçoar sua prática pedagógica; portanto, a avaliação deve ser um processo contínuo e sistemático, funcional e integral. O processo de avaliação deve apresentar como objetivos: o conhecimento dos alunos; a identificação das dificuldades de aprendizagem; a determinação de se os objetivos propostos para o processo ensino-aprendizagem foram ou não atingidos; o aperfeiçoamento do processo de ensino-aprendizagem; a promoção dos educandos para um grau superior11. Conclusões De acordo com os resultados obtidos, e considerando a metodologia empregada neste estudo, é possível concluir, em relação às características estudadas das disciplinas de Saúde Coletiva, que: • a maioria dos cursos oferece a carga horária de 75 a 324 horas; • a maior parte utiliza 2 a 4 semestres para ministrar os conteúdos relacionados à Saúde Coletiva; Tabela 3 - Métodos de avaliação utilizados pelas discipli- nas de Saúde Coletiva dos cursos de Odontologia pesquisados. Brasil, 2004. Métodos de Avaliação Citações nos planos de ensino Número Porcentagem Prova escrita 40 100,00 Prova prática 32 80,00 Avaliação dos trabalhos 23 57,50 Avaliação dos seminários 21 52,50 Avaliação de relatórios 10 25,00 86 • a nomenclatura mais utilizada foi Odontologia Social e Preventiva; • todas as disciplinas são de caráter teórico-prático; • as metodologias de ensino mais citadas foram aulas expositivas, seminários e aulas práticas; • a prova escrita, a prova prática e a avaliação de trabalhos foram as formas de avaliação mais citadas nos planos de ensino. Agradecimentos À CAPES, pelo financiamento da bolsa de estudos, e aos cursos de Odontologia que disponibilizaram a documentação solicitada para a conclusão deste trabalho. Abstract Public Health Dentistry in the curricular structure of dental courses in Brazil The area of Public Health Dentistry plays a fundamental role in the formation of the professional as required by the National Curriculum Guidelines for undergraduate courses of Dentistry, implemented in 2002. This study analyzed the characteristics of the disciplines of the area of Public Health Dentistry in the curricula of dental courses in the country, considering the duration of classes, number of terms, name used, course format, teaching methodology, and evaluation. Letters were sent to 123 schools of Dentistry from which at least one class had graduated up to 2003, requesting their curricular structure and syllabus. Fifty colleges sent the material requested back (40.65% of those contacted). The duration of classes apportioned to Public Health Dentistry is heterogeneous, varying from 75 to 699 hours, and 44.18% of the dental schools assigned 200 to 324 hours to this course. In relation to the number of semesters required for Public Health Dentistry, it was found that the participating dental schools apportioned 1 to 8 semesters to this course, and most of them assigned 2 or 3 semesters (20.93% each) or 4 semesters (27.91%) to Public Health Dentistry. The name used by the schools to refer to the area of Public Health Dentistry varied, and Social and Preventive Dentistry was most commonly used (30%). It was observed that all courses had a theoretical-practical character. Teaching methodologies or strategies cited most often by the schools were expositive classes (100%) and seminars (71.88%). The evaluation was usually performed by means of written tests (100%) and practical tests (80%). It can be concluded that, in relation to the characteristics Revista da ABENO • 6(1):81-7 Saúde Coletiva nas estruturas curriculares dos cursos de Odontologia do Brasil • Rodrigues RPCB, Saliba NA, Moimaz SAS analyzed in the area of Public Health Dentistry, most colleges offer a class duration of 75 to 324 hours, have 2 to 4 semesters for teaching the class contents, the most used name to refer to this area is Social and Preventive Dentistry, all courses have a theoreticalpractical character; the most often cited teaching methodologies are expositive classes and seminars; and written tests and practical tests are the most commonly used methods for evaluation in the syllabi. Descriptors Education, dental. Curriculum. Dentistry. Education. Public health dentistry. § nº 329/2004. Carga horária mínima dos cursos de graduação, bacharelados, na modalidade presencial. [acesso em 2004 dez 01]. Disponível em: URL: http://www.abeno.org.br. 7. Brasil. Parecer nº 370, de 9 de julho de 1982. Proposta do novo currículo mínimo para o Curso de Graduação em Odontologia – CCC. Documenta 1982;260:46-54. 8. Chaves MM. A odontologia no componente acadêmico dos projetos UNI. [acesso em 2003 out 12]. Disponível em: URL: http://www.ibiblio.org/taft/cedros/portugues/newsletter/n4/dentacde.html. 9. Chaves MM. Odontologia social. 3ª ed. São Paulo: Artes Médicas; 1986. 448 p. 10. Estrela C. Projeto de ensino. In: Estrela C. Metodologia científica: ensino e pesquisa em odontologia. São Paulo: Artes Médi- Referências bibliográficas 1. Álvarez TB. La nueva formación odontológica y el compromiso social con las comunidades. Rev Bras Odontol Saúde Coletiva 2000;(nº esp):83-90. 2. Ayers CS, Abrams RA, McCunniff MD, Goldstein BR. A comparison of private and public dental students’ perceptions of extramural programming. J Dent Educ 2003;67(4):412-7. 3. Behrens MA. Projetos de aprendizagem colaborativa num paradigma emergente. In: Moran JM, Masetto MT, Behrens MA. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus; 2000. p. 67-132. 4. Brasil. Conselho Federal de Odontologia. Resolução CFO22/2001. Baixa Normas sobre anúncio e exercício das especialidades odontológicas e sobre cursos de especialização revogando as redações do Capítulo VIII, Título I; Capítulo I, II e III, Título III, das Normas aprovadas pela Resolução CFO-185/93, alterada pela Resolução CFO-198/95. [acesso em 2004 mar 20]. Disponível em: URL: http://www.cfo.org.br/default01.cfm. 5. Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CES 3/2002. Diário da União, 4 mar 2002. [acesso em 2003 jun 08]. Disponível em: URL: cas; 2001. p. 19-34. 11. Franco A. Metodologia de ensino: didática. Belo Horizonte: Lê; 1997. 88 p. 12. Gil AC. Métodos e técnicas de pesquisa social. 3ª ed. São Paulo: Atlas; 1991. 207 p. 13. Medeiros UV. Integração docente-assistencial em odontologia no Brasil. Educ Méd Salud 1991;25(2):126-37. 14. Moimaz SAS, Saliba NA, Garbin CAS, Zina LG, Furtado JF, Amorim JA. Serviço extramuro odontológico: impacto na formação profissional. Pesq Bras Odontoped Clin Integr 2004;4(1):53-7. 15. Narvai PC. Odontologia e saúde bucal coletiva. São Paulo: Hucitec; 1994. 113 p. 16. Paula LM, Bezerra ACB. A estrutura curricular dos cursos de odontologia no Brasil. Revista da ABENO 2003;3(1):7-14. 17. UNESCO. Declaração mundial sobre educação superior. Piracicaba: UNIMEP; 1998. 51 p. 18. Werneck MAF, Lucas SD. Estágio supervisionado em odontologia: uma experiência da integração ensino/serviço de saúde bucal. Arq Centro Estud Curso Odontol 1996;32(2):95-108. http://www.mec.gov.br/sesu/ftp/resolucao/03020odontologia.doc. 6. Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Parecer CNE/CES Revista da ABENO • 6(1):81-7 Aceito para publicação em 06/2005 87 Reunião da ABENO A 41ª Reunião da ABENO será realizada no Hotel Imirá - Natal, RN 2 a 5 de Agosto de 2006. O tema central para a próxima Reunião é: "Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais: da Teoria à Realidade". Em breve mais informações no site http://www.abeno.org.br. O ABEN 6 0 0 2 6 5 uro 9 1 Jubi O e d leu Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia Tema central: “Universidade promotora de conhecimentos, saúde e prestadora de serviços” Balneário Camboriú - SC - 17 a 20 de agosto de 2005 GRUPOS DE DISCUSSÃO Grande grupo – Grupos 01, 04 e 06 1)Como relacionar no projeto pedagógi- co os níveis de graduação e pós-graduação lato sensu e stricto sensu? O Projeto Político Pedagógico institucional deve primar pela obediência aos princípios vigentes nas Diretrizes Curriculares Nacionais, respeitando-se os limites de competência e complexidade das partes. 2)Como deverá ser feita para o financiamento das atividades de ensino, pesquisa e extensão pactuadas entre o SUS e as IES. 4)De que forma a academia pode influen- ciar na mudança dos modelos tradicionais para o minimamente invasivo? Deve fomentar a estruturação curricular que contemple as novas metodologias em Saúde Coletiva, estimulando as ações básicas em saúde no ensino de graduação, incorporando a filosofia/concepção do modelo minimamente invasivo como conceito fundamental para o ensino contemporâneo da Odontologia, em todas as deve suas disciplinas. a regulamentação dos A universidade cursos de especializacontribuir para a mudança ção? dos modelos tradicionais por Grupos 02 e 03 Para assessorar o MEC na remeio de uma reestruturação 1)C omo relacionar no gulamentação de cursos de póscurricular que contemple projeto pedagógico os graduação lato sensu, sugere-se a as novas metodologias em níveis de graduação e criação de uma comissão de reguSaúde Coletiva. pós-graduação lato senlamentação das especializações su e stricto sensu? odontológicas, com uma composição que contemple, ao menos, representações das • Pela participação dos alunos de pós-graduação instituições de ensino superior (IES) de Odontolonas atividades de graduação, por meio dos estágia. gios de docência e de projetos de extensão. • Pela participação dos alunos de graduação nas 3)Como deve ser o financiamento do SUS atividades de pós-graduação: nas atividades clípara as atividades de ensino, pesquinicas, em monitorias; na pesquisa, pela elaborasa e extensão das IES? ção de projetos integrados. Que seja normatizado o credenciamento das IES • Incluir, como atividades de graduação, os semie Clínicas de Odontologia à semelhança do que foi nários de pós-graduação, as defesas de monografeito com os hospitais de ensino, ou seja, o MEC e o fias, dissertações, teses, podendo se considerar MS juntos criariam normas, estabelecendo os critérios a carga horária e os créditos. mínimos, e as IES solicitariam o credenciamento na modalidade de clínica-escola, a qual presta o serviço 2)Como deverá ser feita a regulamentae promove o ensino. Haveria uma tabela diferencial ção dos cursos de especialização? Revista da ABENO • 6(1):89-95 89 Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia • O MEC deve estabelecer critérios buscando uma regulamentação que atenda às especificidades regionais e avalie os cursos de especialização, nos moldes do que é definido para graduação e pós-graduação. • Deve ser incentivada a consolidação da residência em Odontologia, como valor de especialização. • Não se chegou a um consenso sobre que entidades ou instituições poderiam ofertar cursos de especialização. As possibilidades levantadas foram: a)só as IES; b)também as associações de classe; c)as IES, podendo estabelecer parcerias. dos Estudantes (ENADE) no sentido de qualificar a formação acadêmica? Os resultados do ENADE ainda não atingiram a plenitude de sua utilização no processo de melhoria de formação acadêmica devido a: 1. Formação positivista do professor de Odontologia, a qual impede ou limita uma leitura qualitativa dos resultados, e se manifesta nas seguintes observações: 1.1. Ausência de contextualização nas aulas, nos planos histórico, político e econômico. 1.2. Ausência de discussão e elaboração coletiva dos planos de ensino, com detalhamento também dos planos de aula. 1.3. Necessidade de mudanças internas na filosofia 3)Como deve ser o financiamento do SUS de ensino através de seminários, oficinas etc. para as atividades de ensino, pesqui 1.4. Necessidade de mudanças e adequações, com sa e extensão das IES? conseqüente implementação do projeto político • Diferenciado em relação aos demais prestadores pedagógico. de serviços; o SUS não deve mais praticar a re 1.5. Necessidade de requalificação da formação domuneração por procedimentos, mas considerar cente (inicial e em serviço), os Cursos de Odontologia como centros de excelência, para lidar com o novo modelo É fundamental que o CD como hospitais-escola odonqualitativo de avaliação. atue em conssonância com a tológicos. 1.6. Necessidade de correção de União e enfatize a promoção • Devem-se definir linhas de fierros conceituais ou de elabode saúde não só em sua nanciamento para pesquisas ração do próprio instrumento acepção básica, mas que voltadas para o SUS. percebidos pela grande quanabranja também a atenção • Educação continuada. tidade da mesma resposta erespecializada. rada em determinada ques 4)De que forma a acadetão. mia pode influenciar na 1.7. O coordenador e o colegiado devem estar atenmudança dos modelos tradicionais tos ao perfil sociocultural dos alunos em função para o minimamente invasivo? das especificidades locais. • Provocando discussões para embasar uma supe 1.8. O bom resultado do curso pode dificultar as ração de conceitos já estabelecidos e, desta formudanças. ma, capacitar para a atuação e divulgação desta 2. Resultados contraditórios entre ingressantes e filosofia; formando assim promotores de saúconcluintes, sejam por semelhança de resultados de. ou por inadequação quanto ao grupo respon • Articulação entre ensino e serviços. dente. 3. Pouca aplicabilidade do exame pela influência SEMINÁRIO DO Instituto Nacional de dos seus aspectos quantitativos. Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) Conclusões e Respostas dos Grupos 02 e 03 90 Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) e dos SUS, solicitam-se: 1)Como o coordenador e o colegiado do curso podem aplicar os resultados do Exame Nacional de Desempenho 2)Com base nas concepções do Sistema 1.Definição do perfil do novo avaliador do INEP, cujas características são listadas a seguir: Revista da ABENO • 6(1):89-95 Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia Conhecimentos Competências Avaliação em geral Escuta, acolhimento e orientação Visão integrada da prática profissional Concepções do SUS Trabalho em equipe Distinção do Projeto PolíticoPedagógico do currículo oculto Realidade educacional Aceitação das mudanças como necessárias e irreversíveis Superação de preconceitos Legislação dos sistemas de educação e saúde Preparo de um protocolo de avaliação Capacidade de lidar com situações iguais em contextos diferentes Valor pedagógico da avaliação Experiência na área de gestão acadêmica e metodologias ativas Atuação com ética, responsabilidade e bom senso 2. Apresentação de propostas para capacitação de avaliadores (novos e antigos). O processo de capacitação deve atender ao perfil proposto. 3)Apresente críticas e sugestões ao pro- Habilidades cesso de construção coletiva coordenado pelo MEC, visando o aprimoramento dos protocolos e instrumentos de avaliação coordenados pelo INEP. 1. O ENADE não contemplou as vivências que o aluno terá no sistema de saúde, restringindo-se ao PSF e, portanto, não atingindo o objetivo. 2. O instrumento não foi contextualizado dentro do SUS e deveria contemplar mais a realidade socioeconômica do país. 3. Apesar de o ENADE representar apenas 20% do processo de avaliação, a divulgação inadequada dos resultados criou constrangimentos em virtude do aspecto classificatório. 4. O estilo de prova deve minimizar a excessiva valorização da capacidade técnica. 5. A dificuldade que o instrumento cria na interpretação dos resultados em que concluintes têm menor rendimento que os ingressantes. 6. O instrumento deve permitir que se avalie a formação para a cidadania do aluno. 7. O resultado da avaliação deve ser divulgado integralmente, ao invés de priorizar e valorizar somente o resultado do ENADE. 8. Os avaliadores devem ser selecionados mediante concurso. 9. As comissões avaliadoras e o treinamento dos avaliadores devem incluir profissionais com formação na área humanística. 10. Os critérios para seleção dos avaliadores devem ser claros e transparentes. 11. As diferenças entre durações de curso impedem que a avaliação seja feita com o mesmo grupo de alunos nos momentos de ingresso e conclusão. 12. O exame não tem uma proteção jurídica que garanta a sua exigibilidade para todos os alunos selecionados para o processo. MESA – “A UNIVERSIDADE COMO PRODUTORA DE SERVIÇOS SOB A ÓTICA DOS GESTORES ESTADUAIS E MUNICIPAIS DE SAÚDE” Síntese do pronunciamento do professor Gilberto Pucca – O papel do gestor federal • Apresentação do programa Brasil Sorridente, que faz parte da Política Nacional de Saúde Bucal. • No Sistema Único de Saúde independente do setor público ou privado, o perfil profissional deve ser adequado a cada população. • Apresentação de dados epidemiológicos de saúde bucal, mostrando a ineficácia de políticas anteriores (modelos não-condizentes com necessidades, existência de dificuldade de acesso ao serviço). • Comentários sobre planejamento e organização dos serviços de saúde bucal: “Há não-oferta de serviços especializados, só de básicos.” • Apresentação das características do Programa Brasil Sorridente: - Humanização do Atendimento, Universalização, Qualificação (sólida formação em clínica geral, planejamento, SUS, integralidade das ações, ações de cura e reabilitação). • O PSF é uma estratégia de atenção básica. • Horizontalização da Odontologia: pouca participação no setor público gera poucos recursos. “Há necessidade de financiamento federal para formação de rede de assistência básica nos municípios.” • Apresentação de novos dados do PSF comparativos com os dos anos anteriores. • Especialidades dando atenção às necessidades Revista da ABENO • 6(1):89-95 91 Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia de média complexidade, que são os serviços mais requisitados. Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs) Tipos 1 e 2 com recursos mensais e para implantação. • Distanciamento das universidades em relação ao SUS. CEOs também devem ser ofertados pelas universidades: é uma experiência inovadora com amplas perspectivas. Devem-se ofertar inclusive PPRs e próteses totais. • Comentários sobre promoção de saúde clássica: fluoretação em abastecimento público. • “Os alicerces foram lançados.” • Há necessidade de uma proposta coletiva com formação profissional adequada e participação efetiva do governo federal. • O desafio a superar é principalmente a criação de parcerias com as universidades, voltadas para uma nova visão, com ênfase em promoção de saúde. • Alertou sobre a necessidade de uma maior participação política do CD, para mudarmos a visão pequena de nossa classe, tornando-a mais forte e com maior destaque. Síntese do pronunciamento da professora Maria Celeste Morita – O papel da Universidade Relator: • Roberto Rogério Molleri - Professor da disciplina de OSC – 7º e 8º períodos do curso de Odontologia da UNIVALI, Itajaí - SC. Síntese do pronunciamento Os CDs não estão sozinhos • Comentários sobre o papel da do secretário estadual de na busca pela adequação universidade no desenvolvimensaúde de SC - Luiz Eduardo da Odontologia à situação to da sociedade: ela deve particiCherem – O papel do de saúde bucal atual do par para a construção de uma gestor estadual país; devem se despir de seus sociedade mais justa e fraterna. • Discorreu sobre visão pessoal, preconceitos e contar com a • Comentários sobre o binômio desde a época em que foi veajuda de THDs e ACDs. ensino-extensão e sua importânreador até ocupar o cargo de cia. deputado estadual, de como a Odontologia é fundamental para a inclusão • “O direito à saúde esbarra na estrutura dos governos, embora o SUS como instrumento instisocial. tucional tenha avançado como política de Esta • Para o início da descentralização da saúde bucal: do.” serviços e recursos, divisão em macrorregiões (mais carentes e menos carentes). • “Os cursos de Odontologia devem adequar os seus currículos para acordarem com o SUS a • Apresentação de dados sobre nº de municípios, construção de um sistema mais justo. É necessásecretarias regionais, gestão plena. ria uma articulação entre saúde e educação.” • Comentou sobre a legislação específica, instrumento de transformação social, com necessida • “O SUS que desejamos para a sociedade necesde de visão da sociedade como um todo. sita que a universidade forme profissionais comprometidos com o SUS.” • “O ensino deve ser voltado para a gestão igualitária, com participação comunitária.” • “Uma das necessidades básicas é que a universidade conheça o SUS, derrubando o preconceito • “A população como um todo é a maior benefide que a autonomia universitária seja derrubada ciada com essa prestação de serviço.” neste processo.” • Comentários sobre os dois pólos de educação: humanização no atendimento; integralização • Nesse relacionamento, há necessidade de discussão do papel do estudante na transformação dos diversos profissionais envolvidos no atendimento da população. da sociedade. • Apresentação de nº de equipes de PSF em SC. • Não podemos esquecer que a relação entre SUS e universidade se estabelece em nível munici • Discorreu sobre como é fundamental a participação das universidades na formação do CD pal. para atuar em parceria com a União. • “A relação ensino/serviço/comunidade é incipiente, há necessidade de liderança em todos os • Apresentou nº de CEOs com incentivo para a implantação nos municípios, e de CEOs em imsetores. Essa relação enfrenta grupos que são contra tudo.” plantação em 8 regiões, com 9 municípios. 92 Revista da ABENO • 6(1):89-95 Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia • Um dos obstáculos enfrentados é o financiamento, bem como a idéia de pagamento por procedimento. • Há uma imensa defasagem entre o custo e o pagamento, não há formação para administração de fundos, o planejamento nem sempre é o correto. • Os gestores não valorizam o serviço prestado pela universidade e vice-versa. • O modelo de atenção não prevê a integralidade, e os serviços prestados pela escola não têm espaço no SUS. • Deve-se mudar o modelo atual para um modelo conceitual de atenção integral, fortalecendo o papel do sujeito. Há sempre uma esperança de mudança. Síntese do pronunciamento do Secretário Municipal de Saúde de Curitiba - Michele Caputo – O papel do gestor municipal • Iniciou falando da importância estratégica da Odontologia no contexto de saúde pública em Curitiba. • Há necessidade de discussão para o diagnóstico e planejamento de um mercado em nítida expansão. • O uso da tecnologia deve ser em benefício do profissional e principalmente do paciente. • A parceria com a universidade aborda experiências e tradições, integralizando os trabalhos e desfazendo nós críticos e crônicos. • Os recursos devem chegar sem carimbos ou compartimentalizados, havendo sim uma fiscalização séria. • É importante investir na promoção de saúde, com discussão e procurando superar os limites, que nunca são alcançados. Para que isso ocorra, é necessário investir na formação do profissional, derrubando preconceitos do CD em relação a THDs e ACDs, pois as pessoas buscam dignidade no relacionamento paciente/profissional. • Comentou a necessidade de se discutir a formação continuada dos profissionais, com quali­ dade, e a criação das parcerias, para que o problema neste país não seja simplesmente um problema de financiamento, e que se possa fazer avançar a qualidade de vida das pessoas. • O município tem condições de gerenciar os financiamentos existentes, bastando para isso boa vontade, capacitação, profissionalismo e planos realizados diante da realidade de cada paciente. MESA – “A PÓS-GRADUAÇÃO COMO INDUTORA DA TRANSFORMAÇÃO DO PROCESSO INTERNO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR” Palestrantes: • Profa. Dra. Ana Estela Haddad (Coordenadora de Educação Superior em Saúde/MS) - Formação do cirurgião-dentista no contexto das atuais políticas públicas de educação em saúde. • Prof. Dr. Antonio Cesar Perri de Carvalho (Presidente da ABENO) - Pós-graduação lato sensu no sistema de educação superior. • Profa. Dra. Adriana de Castro Amédée Péret (UFMG/PUC-MG) - Políticas públicas em educação superior e saúde e a formação do professor de Odontologia. • Prof. Luiz Roberto Augusto Noro (UNINFOR) - A universidade e a formação docente. • Prof. Dr. Ney Soares de Araújo (Representante da Área de Odontologia/CAPES) - A CAPES e a política para os cursos de pósgraduação em Odontologia. Relatores: • Profa. Dra. Isabela Almeida Pordeus (UFMG) • Prof. Dr. Ricardo de Sousa Vieira (UFSC) Em decorrência da mudança do mercado de trabalho em Odontologia (seja no que tange ao seu novo perfil, ou à saturação do modelo existente), bem como das diretrizes curriculares para cursos da área da saúde, as políticas atuais vêm direcionando a formação do cirurgião-dentista para uma ação generalista, estimulando os projetos de ações voltadas para o atendimento no Sistema Único de Saúde – SUS. Esse aspecto decorre do fato de que 80% da população utiliza esse serviço e de que há conseqüente necessidade de dar cobertura à maioria da população brasileira. As Diretrizes Curriculares apontam para a premência de o egresso possuir uma inserção social com intuito de transformação da realidade em benefício da sociedade. Deve-se resgatar a missão da universidade no desenvolvimento do país, uma vez que ela é um bem público e para o público deve se voltar, possuin- Revista da ABENO • 6(1):89-95 93 Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia do relevância social. 1. Visão integrada da saúde. Na década de 90, houve uma expansão rápida 2. Aspectos preventivos e promocionais na especiado ensino superior, centrada essencialmente em inslidade. tituições particulares (88% dos cursos atualmente se 3. Conteúdos mais significativos de bioética, metoconcentram nas IES privadas), congregando 70% dos dologias da pesquisa e do ensino. alunos matriculados. Entretanto, até 2004, havia 40% 4. Melhor elaboração da monografia. de ociosidade nesse segmento privado e, portanto, 5. Atendimento a especificidades (CTBMF – resipolíticas de melhor utilização dessa infra-estrutura dência). devem ser propostas. 6. Preparo para a educação a distância, “on-line” e A pós-graduação forma recursos humanos que as atividades inovadoras no ambiente de ensinotambém atuarão na sociedade, sendo que os cursos aprendizagem. lato sensu, de acordo com o Parecer Sucupira, datado 7. Nova proposta de avaliação dos cursos de espede 1965, são aqueles destinados ao “treinamento nas cialização. No que se refere à pós-graduação stricto sensu, partes de que se compõe um ramo profissional ou observa-se ter ocorrido um nítido científico” ou “o domínio científico crescimento do número de prograe técnico de certa e limitada área A pós-graduação stricto mas e de alunos titulados. No triêdo saber ou da profissão, para forsensu deve agir como nio 2001/03, titularam-se, nos 82 mar o profissional especializado”. A indutora da transformação programas de pós-graduação em ABENO, ciente de seu papel no endo processo interno das Odontologia, 1.851 mestres, 428 sino da Odontologia brasileira, deinstituições de ensino mestres profissionais e 703 doutofine a especialização como o aprosuperior, formando res. Porém, parece não ter havido fundamento do conhecimento e professores e cidadãos uma mudança no perfil do docente das habilidades técnicas e científiconscientes. de Odontologia, que ainda é calcacas, visando à formação de recursos humanos no campo específico de do no modelo flexneriano. Três fatores são fundamentais na formação docente: o eixo sua atuação nas diversas sub-áreas da Odontologia, do conhecimento, o eixo político e o eixo pedagógico. buscando uma interdisciplinaridade. Por estarem inA abordagem social dada à pesquisa e à geração de seridos no contexto da educação superior, os cursos tecnologia pode contribuir para a formação crítica do de especialização são regidos pelos princípios estabedocente em Odontologia, conforme se pode observar lecidos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação – no princípio da autonomia estabelecido pela LDB e LDB (Lei 9.394/ de 20 de dezembro de 1996), que nas ações voltadas para o SUS, tendo em mente ainda estabelece ser função do Estado legislar, regular e avao controle social e a ética. liar o ensino superior brasileiro. Desse modo, é comNa pós-graduação stricto sensu, a responsabilidapetência do Ministério da Educação estabelecer as de por sua avaliação encontra-se na CAPES, que aprediretrizes para esse nível de educação superior, calcasenta um modelo produtivista de análise de resultadas nos seguintes documentos: Parecer CNE/CES nº dos, sendo que Sobrinho (2003) destaca que “a 908, de 02/12/1998, Resolução CNE/CES nº 1, de avaliação deve não só observar se a universidade é útil 03/04/2001, Parecer CNE/CES 0281/2002, Portaria ao desenvolvimento da indústria e da vida econômica, MEC nº 1.180/2004, Portaria MEC nº 4.361/2004. mas principalmente se a instituição pratica a justiça Em Odontologia, nota-se um forte desejo do social”. recém-egresso em se especializar, sendo observado Para o triênio 2004/06, a conceituação dos Proque nosso país possui o maior número de especialidagramas se pautará nos seguintes critérios: des do mundo. Essa tendência reflete o modelo flex 1. Conceito excelente (7): 80% ou mais dos doneriano ainda adotado, que se fundamenta no biolocentes permanentes deverão ter publicado, no gicismo, na fragmentação, no individualismo, na triênio, o mínimo de 06 artigos em Qualis Inexclusão de práticas alternativas, na atuação curativa ternacional A ou B, sendo que pelo menos 03 o e no tecnicismo. Esse fato deveria, portanto, gerar um sejam em Qualis Internacional A. amplo debate na academia sobre os seguintes aspectos: 2. Conceito excelente (6): 70% ou mais dos do94 Revista da ABENO • 6(1):89-95 Relatório com base nas atividades da 40ª Reunião Anual da ABENO e do 31º Encontro Nacional dos Dirigentes de Faculdades de Odontologia centes permanentes deverão ter publicado no triênio 04 artigos em Qualis Internacional A ou B, sendo que pelo menos 02 o sejam em Qualis Internacional A. 3. Conceito muito bom (5): 80% ou mais dos docentes permanentes deverão ter publicado no triênio pelo menos 3 artigos por docente em periódicos classificados como Qualis Internacional C ou superior, sendo pelo menos um desses Qualis Internacional A ou B, por docente. 4. Conceito bom (4): 80% ou mais dos docentes permanentes deverão ter publicado no triênio o mínimo de 03 artigos em Qualis Nacional A ou superior, sendo pelo menos um desses em Qualis Internacional C ou superior, por docente permanente. 5. Conceito regular (3): 80% ou mais dos docentes permanentes deverão ter publicado no triênio o mínimo de 03 artigos por docente em Qualis Nacional B ou superior. Sem excluir o critério anterior, 60 % dos docentes permanentes devem ter publicado um artigo em Qualis Internacional C ou superior. 6. Conceito fraco (2): 80% ou mais dos docentes permanentes deverão ter publicado no triênio pelo menos 02 artigos em Qualis Nacional B ou superior. 7. Conceito deficiente (1): as demais situações. Para a avaliação qualitativa, serão observados os seguintes aspectos: número de pesquisadores do CNPq, nucleação, montante de recursos obtidos para a pesquisa oriundos de agências de fomento e inserção internacional. Nos Programas de Pós-Graduação stricto sensu deve ainda haver a articulação entre ensino e pesquisa, o que contribuiria para a formação crítica do ­docente em Odontologia, calcada na finalidade da educação superior (LDB), na caracterização da universidade e na sua autonomia – sendo que a avaliação CAPES enfatiza a importância da formação científica e acadêmica – e, por fim, e não menos importante, na necessidade da aproximação da universidade com os serviços (SUS). A pós-graduação stricto sensu deve agir como indutora da transformação do processo interno das ins- tituições de ensino superior, formando cidadãos críticos (professores de Odontologia) que trabalhem por uma Odontologia que traga a saúde para todos. No Brasil, a pesquisa é essencialmente desenvolvida nos programas de pós-graduação stricto sensu. Quando compara-se o triênio 2001/03 com o triênio anterior, verifica-se que a Odontologia apresentou um grande crescimento em sua produção científica, sendo de 41% (de 4.036 para 6.846) para artigos publicados, de 31,4% (de 1.285 para 1.872) para dissertações e de 27,9% (de 517 para 717) para teses. A atividade de pesquisa, segundo Demo (1998), deve ser uma atitude cotidiana que permita estabelecer o questionamento reconstrutivo como propedêutica diária e da vida e uma habilidade de (re)construir conhecimento próprio para inovar (qualidade formal) e intervir (qualidade política). Além disto, Minayo (1994) enfatiza que a pesquisa é a ação básica da ciência na sua indagação e construção da realidade, e que, portanto, deve alimentar a atividade de ensino e atualizá-la frente à realidade do mundo, vinculando pensamento e ação. Prado Jr., por sua vez, destaca que não há conhecimento que se faça fora da prática do sujeito no mundo que o cerca e o qual é necessário compreender, pela criação de significados e sentidos. Para que essa transformação ocorra, deve-se ainda refletir sobre a relação docente-aluno, sendo que Paulo Freire, em seu livro “A Pedagogia da Autonomia”, destaca que para ser um bom professor devese: 1. Querer bem aos educandos. 2. Dar liberdade e ter autoridade. 3. Respeitar a autonomia do educando. 4. Ter humildade e tolerância. 5. Ter alegria e esperança. 6. Saber escutar. 7. Apresentar disponibilidade para o diálogo. Desse modo, o educador deve ensinar eficazmente, o educando deve aprender significativamente, a comunidade deve dispor de produtos do conhecimento e a universidade deve mediar a educação. § Revista da ABENO • 6(1):89-95 Balneário Camboriú, 19 de agosto de 2005. 95 Normas para apresentação de originais I. Originais - Os originais deverão ser redigidos em português ou inglês e digitados na fonte Arial tamanho 12, em página tamanho A4, com espaço 1,5 e margem de 3 cm de cada um dos lados, perfazendo o total de no máximo 17 páginas, incluindo quadros, tabelas e ilustrações (gráficos, desenhos, esquemas, fotografias etc.) ou no máximo 25.000 caracteres contando os espaços. II. Ilustrações - As ilustrações (gráficos, desenhos, esquemas, fotografias etc.) deverão ser limitadas ao mínimo indispensável, apresentadas em páginas separadas e numeradas consecutivamente em algarismos arábicos. As respectivas legendas deverão ser concisas e localizadas abaixo e precedidas da numeração correspondente. Nas tabelas e quadros a legenda deverá ser colocada na parte superior. As fotografias deverão ser fornecidas em mídia digital, em formato tif ou jpg, tamanho 10 x 15 cm, em no mínimo 300 dpi. Não serão aceitas fotografias em Word ou Power Point. Deverão ser indicados os locais no texto para inserção das ilustrações e de suas citações. III.Encaminhamento de originais - Solicitase o encaminhamento dos originais de acordo com as especificações descritas no item I para o endereço eletrônico www.abeno.org.br. A submissão “on-line” é simples e segura pelo padrão informatizado disponível no site, no ícone “Revista Online”. Somente opte pelo encaminhamento pelo correio diante da necessidade de publicação de ilustrações em formato tif/jpg e alta resolução (veja especificações no item II). Endereço: REVISTA DA ABENO - Associação Brasileira de Ensino Odontológico - Universidade Católica de Brasília - Curso de Odontologia - Nova Sede QS 07 Lote 01 - Bairro Águas Claras - CEP: 72030-170 – Brasília - DF. IV. A estrutura do original 1. Cabeçalho: Quando os artigos forem em português, colocar título e subtítulo em português e inglês; quando os artigos forem em inglês, colocar título e subtítulo em inglês e português. O título deve ser breve e indicativo da exata finalidade do trabalho e o subtítulo deve contemplar um aspecto importante do trabalho. 2. Autores: Indicação de apenas um título universitário e/ou uma vinculação à instituição de ensino ou pesquisa que indique a sua autoridade em relação ao assunto. 3. Resumo: Representa a condensação do conteúdo, expondo metodologia, resultados e conclusões, não excedendo 250 palavras e em um único parágrafo. 4. Descritores: Palavras ou expressões que identifiquem o conteúdo do artigo. Para sua determinação, consultar a lista de “Descritores em Ciências da Saúde - DeCS” (http://decs.bvs.br) (no máximo 5). 5. Texto: Deverá seguir, dentro do possível, a seguinte estrutura: a)Introdução: deve apresentar com clareza o objetivo do trabalho e sua relação com os outros trabalhos na mesma linha ou área. Extensas revisões de literatura devem ser evitadas e quando possível substituídas por referências aos trabalhos bibliográficos mais recentes, 96 onde certos aspectos e revisões já tenham sido apresentados. Lembre-se que trabalhos e resumos de teses devem sofrer modificações de forma a se apresentarem adequadamente para a publicação na Revista, seguindo-se rigorosamente as normas aqui publicadas. b)Material e métodos: a descrição dos métodos usados deve ser suficientemente clara para possibilitar a perfeita compreensão e repetição do trabalho, não sendo extensa. Técnicas já publicadas, a menos que tenham sido modificadas, devem ser apenas citadas (obrigatoriamente). c)Resultados: deverão ser apresentados com o mínimo possível de discussão ou interpretação pessoal, acompanhados de tabelas e/ou material ilustrativo adequado, quando necessário. Dados estatísticos devem ser submetidos a análises apropriadas. d)Discussão: deve ser restrita ao significado dos dados obtidos, resultados alcançados, relação do conhecimento já existente, sendo evitadas hipóteses não fundamentadas nos resultados. e)Conclusões: devem estar baseadas no próprio texto. f)Agradecimentos (quando houver). 6. Abstract: Resumo do texto em inglês. Sua redação deve ser paralela à do resumo em português. 7. Descriptors: Versão dos descritores para o inglês. Para sua determinação, consultar a lista de “Descritores em Ciências da Saúde - DeCS” (http://decs.bvs.br) (no máximo 5). 8. Referências bibliográficas: Devem ser ordenadas alfabeticamente, numeradas e normatizadas de acordo com o Estilo Vancouver, conforme orientações publicadas no site da “National Library of Medicine” (http://www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html). Para as citações no corpo do texto deve-se utilizar o sistema numérico, no qual são indicados no texto somente os números-índices na forma sobrescrita. A citação de nomes de autores só é permitida quando estritamente necessária e deve ser acompanhada de número-índice e ano de publicação entre parênteses. Todas as citações devem ser acompanhadas de sua referência bibliográfica completa e todas as referências devem estar citadas no corpo do texto. As abreviaturas dos títulos dos periódicos deverão estar de acordo com o “List of Journals Indexed in Index Medicus” (http://www. ncbi.nlm.nih.gov/entrez/query.fcgi?db=journals). A exatidão das referências bibliográficas é de responsabilidade dos autores. V. Endereço - E-mail, telefone e fax de todos os autores. Obs.: Qualquer alteração de endereço, telefone ou e-mail deve ser imediatamente comunicada à Revista. § Revista da ABENO • 6(1):96