por NATHALIE GUTIERRES [email protected] Empresa mineira faz análise no DNA dos alimentos e confere vantagem competitiva à indústria e aos supermercados Autenticidade fotos: divulgação CASE MYLEUS garantida T er a certeza de que tal produto comprado é exatamente o mesmo que consta na etiqueta é algo que muitas pessoas gostariam de saber. Várias são as fraudes identificadas nesse sentido, não só no Brasil como no mundo, a exemplo do escândalo ocorrido no Reino Unido em 2013, quando foi descoberta a presença de carne de cavalo em produtos comercializados como 100% bovinos. De olho nessa vulnerabilidade existente no segmento de alimentos, nascia a Myleus, empresa mineira de biotecnologia que tem em seu know-how a identificação de espécies em produtos de origem animal e vegetal a partir de técnicas de análise, como o exame de DNA. Por meio desses processos laboratoriais, a empresa identifica e atesta se os alimentos são realmente aqueles que constam na embalagem. “A Myleus é pioneira no país. Sua área de atuação foi sendo desenhada em função da maturidade dos mercados nos quais atua, como o de pescados e o de produtos lácteos de búfala”, conta a diretora de novos negócios da companhia, Mariana de Queiroz Bertelli. A concepção da empresa se deu a partir de um projeto de tese de doutorado em meados de 2010, na Universidade Federal de Minas Gerais, quando um de seus fundadores utilizou a técnica de Barcode de DNA pela primeira vez para peixes no Brasil e teve a ideia de aplicar a tecnologia de forma comercial. Assim, a proposta da companhia surgiu da demanda de se combater a fraude por troca de espécies. Com o passar do tempo, a empresa desenvolveu diferentes tecnologias em conjunto com universidades e instituições de pesquisa, todas focadas na identificação ou na detecção de espécies em produtos de origem animal e 82 SUPERVAREJO outubro 2016 Esta é umas das técnicas utilizadas pela Myleus, por meio da qual é possível identificar a espécie presente em uma amostra. Ela se baseia no fato de que existe um código de DNA específico para cada espécie vegetal. E, no ano de 2014, a empresa finalmente entrou em fase comercial no país. Diferencial no mercado Localizada em Belo Horizonte, mas atendendo a todas as regiões do país, a empresa conta com uma equipe qualificada nas áreas genéticas e de biologia molecular, sendo liderada por biólogos oriundos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A Myleus atende a diversos segmentos de empresas, como indústrias de alimentos, importadores e supermercados. “A empresa auxilia a lidar com a questão da fraude por troca de espécies e, por conseguinte, com a certeza da qualidade final do seu produto”, diz Mariana. Ela explica que, ao ter o produto analisado e aprovado por meio dos testes da Myleus, as empresas ganham atratividade frente aos concorrentes. “Entregamos valor para o nosso cliente de maneira que ele possa se diferenciar no mercado, tenha capacidade de atender às normas de fiscalização e de certificação, bem como atender a requisitos de clientes mais exigentes.” Dessa forma, Mariana afirma que os testes de DNA que a Myleus vem desenvolvendo – e que podem ser aplicados para diversas finalidades, tais como programas de autocontrole, análises de risco ou em certificações de qualidade de produtos adquiridos ou fornecidos – têm se destacado no mercado como importantes ferramentas de controle. ANÁLISES LABORATORIAIS IDENTIFICAM se alimentos são mesmo aqueles que constam na embalagem Importância de um teste laboratorial Submeter os produtos a um teste, como as avaliações feitas pela Myleus, não costuma ser prática das indústrias e do varejo, e as companhias geralmente não têm a real dimensão da vulnerabilidade à qual estão sujeitas na possível troca de espécies de produtos. “As crescentes exigências quanto à transparência nas relações de consumo, bem como uma rigidez cada vez maior outubro 2016 SUPERVAREJO 83 CASE TÓPICOS: Qualidade • Fraude em Alimentos • Certificação CASE MYLEUS com relação à segurança em alimentos, fazem com que os diversos players se atentem para a questão e sigam cobrando qualidade e autenticidade de seus fornecedores, de uma forma mais consistente”, diz a porta-voz da Myleus. Há uma tendência mundial de crescimento nos incidentes de fraudes de alimentos, em decorrência principalmente da globalização das cadeias de fornecimento, como aponta Mariana. “No Brasil, alguns estudos publicados por parceiros da Myleus e pela nossa equipe demonstram que há, por exemplo, em torno de 24% de troca de espécies em pescados. Quando falamos em produtos vegetais, um estudo conduzido por nossa equipe já demonstrou que há aproximadamente 70% de troca de espécies em drogas vegetais, aquelas que dão origem aos fitoterápicos.” Vários pontos podem motivar a existência da fraude, mas a maior incidência é a questão econômica. “Hoje, as cadeias de fornecimento são muito complexas e a fraude normalmente ocorre em um ponto desconhecido pelos outros pontos da cadeia, culminando na lesão ao consumidor final.” Apesar da existência de leis de proteção ao direito do consumidor, que exigem que a rotulagem dos alimentos deva estar de acordo com o item comercializado, Mariana diz que não há leis que exijam o uso de ferramentas, como é o caso do teste de DNA. O que é o teste de DNA O teste de DNA, segundo informações da Myleus, é uma ferramenta precisa e confiável, sendo possível utilizá-la tanto para identificar e confirmar qual é a espécie presente em produto quanto para detectar se há a presença de alguma espécie não esperada em um alimento. A informação sobre as espécies presentes no produto possibilitada pela identificação por DNA pode ser então confrontada com as informações presentes na rotulagem. Mariana conta que, pela experiência da empresa, produtos processados tendem a ser mais fraudados. Além disso, produtos de maior valor agregado, cuja troca de espécies se torna mais lucrativa, também são alvos frequentes de fraude fotos: divulgação COMUNICAÇÃO DA EMPRESA ilustra fraudes que ocorrem no mercado 84 SUPERVAREJO outubro 2016 “É papel dos órgãos de fiscalização (como, por exemplo, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa) realizar a fiscalização de tais produtos. Algumas vezes, os próprios órgãos de inspeção e fiscalização não possuem acesso a ferramentas tecnológicas para detectar a fraude, e a indústria da fraude costuma estar ‘à frente’ desses órgãos em termos de capacidade de criar mecanismos para burlar a fiscalização e a detecção”, discorre Mariana. A maior parte dos clientes da Myleus é da indústria, mas os supermercados podem também usufruir dos diferenciais gerados pela companhia. Para o varejo, a diretora de novos negócios da Myleus explica que a utilização de ferramentas como os testes de DNA trazem mais transparência e confiabilidade aos produtos comercializados. Isso acontece de duas formas, ajudando o varejista a qualificar o fornecedor, garantindo que os itens vendidos sejam autênticos, como também comprovando a autenticidade de produtos de marca própria. Mariana chama a atenção para os cuidados que os supermercados devem ter para os itens de marca própria, CASE COMO OS TESTES SÃO FEITOS AS EMPRESAS ENVIAM AS AMOSTRAS ACOMPANHADAS DO FORMULÁRIO DE COLETA NO LABORATÓRIO, AS AMOSTRAS SÃO IDENTIFICADAS COM UM CÓDIGO, DE FORMA A PRESERVAR AS INFORMAÇÕES AO LONGO DO PROCESSO OS RESULTADOS DO TESTE DE DNA SÃO LIBERADOS ATÉ 15 DIAS APÓS O RECEBIMENTO DA AMOSTRA NO LABORATÓRIO DA MYLEUS CADA AMOSTRA ENVIADA GERA UM LAUDO DE RESULTADO ASSINADO POR UM RESPONSÁVEL TÉCNICO considerando que a reputação de uma rede pode estar em xeque ao trabalhar com produtos sem qualidade atestada. “Em 2013, quando houve o escândalo da carne de cavalo em produtos bovinos processados na Europa, a rede verejista britânica Tesco foi uma das empresas mais afetadas, perdendo cerca de 300 milhões de libras (aproximadamente R$ 1,5 bilhão) em valor de mercado em apenas dois dias”, alerta a executiva. Selo Está no DNA Em parceria com o instituto certificador Totum, a Myleus desenvolveu o selo Está no DNA, uma iniciativa para comprovar a composição da matéria-prima, em termos de espécie, utilizada em produtos para o consumo humano, a exemplo de itens como o pescado e a carne. MARIANA: Produtos processados tendem a ser mais fraudados “Os principais benefícios do selo são a garantia da qualidade das matérias-primas adquiridas de fornecedores, salvaguarda de concorrência desleal dentro dos setores econômicos e a diferenciação de produtos, gerando valor para as empresas de alimentos, que podem utilizar o selo como um poderoso diferencial para a sua marca”, detalha Mariana. Ela explica que o selo pode ser utilizado pelas indústrias e associações para certificar os itens que estão à venda no mercado e é uma importante ferramenta para a qualificação dos fornecedores dos supermercados. Só poderão utilizar a marca as indústrias cujos produtos sejam avaliados de forma recorrente pelo teste de DNA. Além disso, tais alimentos precisam que os rótulos correspondam aos itens contidos nas embalagens. “Nesse cenário, ganham as indústrias certificadas, que agregam maior valor ao seu produto e fortalecem sua reputação, e também o comprador (seja o importador, o varejo ou o consumidor final), pelo aumento da transparência na cadeia. O bacalhau é um exemplo clássico em que o selo poderia ser utilizado, pois é frequente encontrar espécies de menor valor e qualidade sendo vendidas em substituição ao Gadus morhua e Gadus macrocephalus”, finaliza Mariana. outubro 2016 SUPERVAREJO 85