ASPECTOS JURÍDICOS DO COMPARTILHAMENTO DE ARQUIVOS MP3 P2P VIA INTERNET: A EXPERIÊNCIA DO NAPSTER E AS NOVAS TENDÊNCIAS DA LEGISLAÇÃO DE COPYRIGHT DOS ESTADOS UNIDOS Sílvia Simões Soares Graduada em Direito pela Universidade de São Paulo Advogada em São Paulo Sumário Introdução. 1. O Formato MP3. 2. Histórico do Copyright nos EUA. 2.1. O Audio Home Recording Act e os Avanços da Música Digital. 2.2. Sonny Bono Copyright Term Extension Act. 2.3. Digital Millennium Copyright Act. 2.3.1. WIPO Copyright and Performances and Phonograms Treaties Implementation Act. 2.3.2. Online Copyright Infringement Liability Limitation Act. 2.4. Projeto Balance Act. 3. Conceitos. 3.1. Limitações dos Direitos Exclusivos de Autor. 3.1.1. Fair Use. 3.1.2. First Sale Doctrine. 3.2. Responsabilidade Secundária por Infração. 3.2.1. Responsabilidade Contributiva, Contributory Liability. 3.2.2. Responsabilidade Vicária, Vicarious Liability. 3.2.3. Inducement. 4. O Caso Betamax. 4.1. Análise do Caso. 4.2. A Argumentação da Indústria Cinematográfica. 4.3. A Argumentação da Sony Corporation. 4.4. A Decisão da Corte do Distrito Central da California. 4.5. A Decisão da Corte de Apelações do Nono Circuito. 4.6. A Decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos. 4.7. Conclusão do Caso Betamax. 5. O Caso A&M Records v. Napster. 5.1. Análise do Caso. 5.2. Argumentação da Indústria Fonográfica. 5.3. A Argumentação do Napster. 5.4. As Decisões da Corte do Distrito Norte da Califórnia e da Corte de Apelações do Nono Circuito. 5.5. Conclusão do Caso Napster. 6. Conclusão. 6.1. Reação Social Inversa. 6.2. Em Busca do Equilíbrio. 6.3. Idéias Conciliadoras. 7. Bibliografia. Observações. INTRODUÇÃO “Se nos interessarmos sobretudo por seu significado para os homens, parece que (...) o digital, fluido, em constante mutação, seja desprovido de qualquer essência estável. Mas, justamente, a velocidade de transformação é em si mesma uma constante – paradoxal – da cibercultura. Ela explica parcialmente a sensação de impacto, de exterioridade, de estranheza que nos toma sempre que tentamos apreender o movimento contemporâneo das técnicas.”1 Dado o vertiginoso avanço tecnológico experimentado pelo setor de informática com o advento da Internet, uma nova sociedade foi criada: uma sociedade digital, sem fronteiras territoriais, nacionais ou jurídicas, formada a partir de uma nova concepção de interação social, em que a proximidade física dos indivíduos não é mais necessária para o relacionamento e em que o contato entre as pessoas pode se dar pela mera transcrição de e­mails ou mensagens instantâneas através de programas de computador. Contudo, essa nova sociedade digital, sem fronteiras, tornou­se também uma “terra sem lei”, em que pessoas mal intencionadas não respeitam valores e normas, tampouco encontram limites ou sanções. O aumento tanto das operações financeiras quanto das comunicações de forma geral via Internet estimula, entretanto, o crescimento dessa nova sociedade. A marcha acelerada imposta pela tecnologia e pelas demandas cada vez mais exigentes do mercado digital fazem da informatização um imperativo, não mais uma escolha. É ponto pacífico que não existe forma de reverter esta “revolução digital”. Há, contudo, a necessidade premente de se trazer a segurança do Direito para o plano virtual. Muito há que se discutir antes que correntes doutrinárias venham a ser solidificadas nesse campo, tão recente e tão desafiador. Nos Estados Unidos a questão é flagrante. Tendo produzido nos últimos anos uma infinidade de leis para aumentar a proteção do copyright e ampliar a responsabilidade de quem participa mesmo que 1 Lévy, Pierre. Cibercultura. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo, Ed. 34, 1999. pág 27 indiretamente de infrações, o país é pioneiro não apenas no tocante ao desenvolvimento tecnológico, mas também no que diz respeito à normatização do meio eletrônico frente às novas tecnologias. Tais tentativas de normatização são por vezes uma esperança, mas outras uma grave ameaça a direitos fundamentais. Assustados com os inúmeros problemas trazidos de súbito pela informatização, legisladores pressionados por interesses divergentes e fortes lobbies empresariais procuram encontrar saídas através de novas legislações rígidas, que suprimem direitos fundamentais na tentativa de inibir ou punir abusos na rede. A sensação de que a impunidade na internet exige medidas enérgicas já levou diversos países a restringir a privacidade dos usuários na rede, estender a responsabilização por delitos a terceiros e estabelecer sanções penais para a quebra de sistemas de controle de cópias. Tais medidas, contudo, vêm mostrando­se ineficazes contra os problemas que se dispuseram a resolver, sem por isso deixar de significar grandes perdas em termos de liberdades individuais ou econômicas. Normas como o DADVSI2, o EUCD3 e o DMCA4 tornam­se cada vez mais comuns, sem que a pirataria eletrônica tenha cedido. Nesse contexto, as polêmicas redes de troca de arquivos peer­to­peer despertam interesse e receio pelo seu poder de transformação social. Ainda que anteriores à revolução da música digital, as redes p2p tornaram­se conhecidas no compartilhamento de arquivos MP3 com o aparecimento do programa Napster,5 que inaugurou a questão das violações eletrônicas massivas de copyright nas cortes norte­ americanas. Mesmo tendo sido responsabilizado por infrações e fechado pelas autoridades estadunidenses há alguns anos, o Napster criou uma tendência de compartilhamento e rejeição popular a direitos autorais que se observa ainda hoje, através do grande sucesso de seus sucessores, protagonistas de grandes batalhas judiciais nos Estados Unidos. Batalhas estas que abrem precedentes importantes para o direito autoral naquele país e exercem grande influência sobre o pensamento jurídico da propriedade intelectual no mundo todo, tendo instigado tanto a produção de normas mais rígidas de direitos autorais em diversos países quanto movimentos organizados pela reforma e flexibilização dos mesmos direitos em várias partes do mundo6. Assim, é papel do jurista do século XXI analisar estas questões com muito cuidado, uma vez que o futuro do copyright e da propriedade intelectual dependem de como tais questões são hoje abordadas e resolvidas. Como o verdadeiro foco da polêmica do compartilhamento de música via internet são indubitavelmente os Estados Unidos, não se poderia deixar de analisar a evolução da proteção do copyright naquele país, os conceitos e precedentes judiciais mais importantes e as questões técnicas relacionadas à música digital. Parte­se, assim, de uma explanação sobre formato MP3 (Item 1) e de um breve histórico do copyright nos EUA (Item 2), passando por explicações dos conceitos (Item 3) e do principal precedente 2 DADVSI ­ Loi relative au droit d'auteur et aux droits voisins dans la société de l'information, LOI n° 2006­961 3 EUCD ­ Directive 2001/29/EC of the European Parliament and of the Council of 22 May 2001 on the harmonization of certain aspects of copyright and related rights in the information society. 4 Digital Millennium Copyright Act of 1998, Pub. L. No. 105­304, 112 Stat. 2860, 2887. 5 O primeiro dentre os mais famosos programas de computador para compartilhamento de arquivos MP3 que se utilizava de protocolo P2P, peer­to­peer, para a transferência dos arquivos. Deu projeções mundiais ao fenômeno do compartilhamento de música via Internet no formato MP3, causando forte reação da indústria fonográfica, que culminou em seu fechamento após longo período de discussões nos Estados Unidos. 6 O exemplo mais emblemático talvez seja o Piratpartiet, o Partido Pirata sueco, abertamente contra as instituições do copyright e das patentes e a favor da privacidade das comunicações e da propriedade http://www2.piratpartiet.se/ (acessado em 11/12/06). Candidatos do Partido Pirata concorreram nas eleições suecas de 17 de setembro de 2006 e poderiam ter vindo a compor o parlamento daquele país caso houvessem logrado êxito nas urnas. O Piratpartiet inspirou o surgimento de partidos equivalentes na Alemanha, França, Austrália, Itália, Áustria, África do Sul, Espanha, Estados Unidos e outros. Veja o website da rede internacional do partido http://www.pp­international.net/ (acessado em 11/12/06). relacionado (Item 4) para finalmente chegar à análise do Caso Napster (Item 5) e às conclusões (Item 6). 1. O FORMATO MP3 “A movimentação regular de música gravada em pedaços de plástico, assim como o lento manuseio humano da maior parte das informações, sob forma de livros, revistas, jornais e videocassetes, está em vias de se transformar na transferência instantânea e barata de dados eletrônicos movendo­se à velocidade da luz. Sob tal forma, a informação pode se tornar acessível para todos. Thomas Jefferson nos legou o conceito de bibliotecas públicas e o direito de consultar um livro de graça. Mas esse nosso grande antepassado jamais considerou a possibilidade de 20 milhões de pessoas terem acesso eletrônico a uma biblioteca digital, podendo retirar dela o material desejado sem nenhum custo. A mudança dos átomos para os bits é irrevogável e não há como detê­la.”7 O MP3 (MPEG Audio Layer 3) é o formato de arquivo de áudio mais popular no mundo digital atualmente, não só em virtude de sua grande fidelidade em relação ao áudio original ­ sua reconhecida qualidade de reprodução ­, mas especialmente devido ao alto grau de compactação utilizado. É esta grande compactação que permite a milhares de pessoas no mundo todo armazenar centenas de músicas tanto em seus computadores pessoais quanto em equipamentos conhecidos como mp3 players, semelhantes aos antigos walkmans. Este alto grau de compactação na codificação dos sons é obtido através de métodos de compressão com perda de dados (lossy data compression), ou seja, o arquivo resultante é diferente da matriz, porque durante a compactação alguma quantidade de dados é eliminada ou perdida. Como conseguir então obter um bom grau de compactação sem prejudicar a qualidade do arquivo? A resposta foi encontrada na Alemanha, na primeira metade da década de noventa. A técnica utilizada consiste em retirar do arquivo de áudio toda a parcela de dados que, tanto pelas limitações naturais da audição humana quanto pelo mascaramento de sons não é normalmente percebida pelo homem. Dessa forma, os algoritmos utilizados na codificação do MP3 retiram principalmente as freqüências sonoras não­audíveis (lembrando que a audição humana capta apenas a faixa de freqüências compreendida entre 20 e 20kHz) ou não perceptíveis, proporcionando uma redução de 90% (dez para um) no espaço ocupado pelo arquivo para a bitrate 128Kb/s (128 kilobits por segundo), taxa de bits padrão que denota um grau de qualidade em que eventuais discrepâncias sejam praticamente imperceptíveis. O MP3, assim, é diferente do original sob o ponto de vista do código binário (a linguagem entendida pela máquina) que representa o som, dos bits, mas conserva uma grande fidelidade para com o som audível da matriz ou mesmo do som de música executada ao vivo. É possível obter taxas maiores (maior qualidade e menor compactação) ou menores (menor qualidade e maior compactação), dependendo da intenção e da utilização que se vá fazer do arquivo. Esta versatilidade, qualidade e compactação é que dão ao formato MP3 popularidade sem precedentes entre os internautas de todo o mundo. Apesar da existência de inúmeros softwares capazes de criar e reproduzir arquivos MP3, o formato é protegido por patente e os detentores, a empresa Thomson Consumer Electronics e o Instituto Fraunhofer cobram royalties pelo seu licenciamento, necessário para produzir e distribuir codificadores e decodificadores do formato MP3 (geradores e “tocadores” dos arquivos). Muitos desses programas estão, por conseqüência, em desacordo com a lei por não possuírem licença e não pagarem royalties. 7 Negroponte, Nicholas. A Vida Digital. Tradução: Sergio Tellaroli. São Paulo, Companhia das Letras, 1995. pg. 10. citado por Gandelman, Henrique. De Gutenberg À Internet: direitos autorais na era digital. 4a edição. Rio de Janeiro: Record, 2001, pg. 135 Nesse contexto, muitos desenvolvedores procuraram criar formatos alternativos com as mesmas características, como o WMA, Windows Media Audio, criado pela Microsoft, o Ogg Vorbis, desenvolvido pela comunidade do software­livre e isento de patentes, o AAC, Advanced Audio Coding, utilizado pela Apple Computer e muitos outros. Entretanto, o formato MP3 é de tal forma popular que a infiltração social desses formatos alternativos é ainda muito pequena, apesar dos graves problemas relativos à patente e de sua incompatibilidade legal com as licenças de software­livre. Dessa forma, as disputas jurídicas que envolvem os programas de compartilhamento de arquivos MP3 já começam pela patente do próprio formato, antes mesmo das polêmicas infrações copyright. O enfoque deste trabalho, no entanto, é a análise jurídica do compartilhamento dos arquivos, seu impacto no mercado de entretenimento e nos próprios institutos jurídicos afrontados, tendo­se consciência de que tanto ao referido mercado quanto aos aludidos institutos jurídicos impõe­se urgentes modificações capazes de evitar o colapso de ambas as estruturas obsoletas frente à irreversível revolução tecnológica e social provocada pela internet. 2. HISTÓRICO DO COPYRIGHT NOS EUA A proteção do copyright nos EUA não é questão recente, ainda que a maior parte da legislação vigente não tenha mais de trinta anos. Já no texto constitucional expressou­se clara intenção de se oferecer a autores e inventores garantia de proteção a seus trabalhos, para o progresso da ciência e das artes. “The Congress shall have power (...) to promote the progress of science and useful arts by securing for limited times to authors and inventors the exclusive rights to their respective writings and discoveries.”8 Esta é verdadeiramente a raiz da proteção do copyright e das patentes nos EUA, a partir da qual passa­se a uma análise dos principais diplomas legais relacionados, numa cronologia simplificada. No ano de 1790 foi promulgada a primeira lei federal para disciplinar a matéria, inspirada pela lei inglesa Statute of Anne9, de 1710. O Copyright Act of 1790, “An Act for the encouragement of learning”10 , oferecia uma proteção relativamente curta, mesmo em relação ao Statute of Anne: apenas 14 anos de proteção, renováveis por outros 14 (total de 28 anos), somente aplicável a livros, mapas e gráficos. Em 1831 e 1870 revisões foram feitas ao estatuto: em 1831 a extensão do período inicial da proteção para 28 anos, renováveis por mais 14 (total de 42 anos) e a adição a música ao hall de obras protegidas; e em 1870 a centralização da competência de depósitos e registros na Biblioteca do Congresso11. Já no século vinte, foi promulgado o Copyright Act of 190912, a terceira revisão geral da lei autoral estadunidense, que estendia o período de renovação para mais 28 anos (num total de 56 anos). Embora não mais em vigor, este estatuto surtiu efeitos mesmo após 1976 para obras criadas e registradas antes da vigência da nova lei. Em 1947, as leis de copyright dos Estados Unidos foram compiladas no U.S. Code13, codificação que procura abranger a maior parte das leis federais, agrupadas por títulos relacionados 8 Constitution of The United States, 1787. Artigo 1, seção 8. O Congresso deverá ter poder (...) de promover o progresso da ciência e das artes úteis por assegurar por tempo limitado aos autores e inventores os direitos exclusivos a seus respectivos escritos e descobertas. [tradução nossa] 9 Statute of Anne, 1710, disponível em http://www.copyrighthistory.com/anne.html (acessado em 30/06/06). Oferecia proteção de 28 anos renováveis por outros 14, num total de 42 anos de privilégio de autor. 10 Copyright Act of 1790, disponível em http://www.copyright.gov/history/1790act.pdf (acessado em 30/06/06) Um estatuto para encorajar o aprendizado [tradução nossa] 11 Library of Congress. U.S. Govt. http://www.loc.gov/ 12 Copyright Act of 1909, disponível em http://www.copyright.gov/history/1909act.pdf (acessado em 30/06/06) 13 United States Code, disponível em http://www.access.gpo.gov/uscode/uscmain.html (acessado em 29/06/06) às matérias de que tratam. Seu Título 17 corresponde à legislação de direitos autorais, e hoje abriga o Copyright Act of 197614, a atual lei vigente. Em 1955 ocorreu a adesão dos Estados Unidos à UCC, Universal Copyright Convention15 de 1952, proposta pela UNESCO16 como alternativa aos países que, apesar de não concordarem com todos os termos da Convenção de Berna17, desejavam a instituição de normas comuns de proteção a direitos autorais. Participar da UCC foi a forma de os Estados Unidos resguardarem sua produção artística e intelectual perante outros países sem arcar com o ônus de reformular sua legislação naquele momento, correspondendo a uma fase de transição em que reformas seriam necessárias para adaptar o país aos padrões de Berna. Em 1971, os Estados Unidos assinaram a Convenção para a Proteção dos Produtores de Fonogramas Contra a Duplicação Não Autorizada de seus Fonogramas18, cuja implementação deu­se em 1974, e constituiu mais uma forma de aproximação do país ao contexto internacional de proteção aos direitos autorais. Também em 1974, aderiu à revisão da UCC realizada em Paris no ano de 197119. Num esforço de preparação para adesão à Convenção de Berna, veio a quarta grande revisão da legislação de copyright: Copyright Act de 1976, com importantes inovações. O período de proteção foi estendido para a vida do autor mais 50 anos e apareceram pela primeira vez disposições expressas acerca de Fair Use20, First Sale Doctrine21 e da reprodução de obras por bibliotecas para finalidades específicas22. Seguiram­se reformas como o Piracy and Counterfeiting Amendments Act of 198223, estabelecendo que quem intencionalmente infrinja copyright com intuito de obter vantagens financeiras seja punido criminalmente, e o Record Rental Amendment of 198424, que permitiu aos detentores de direitos autorais sobre gravações de áudio e fonogramas proibir a locação ou empréstimo de suas obras para fins diretamente ou indiretamente comerciais. Trata­se de importante alteração na First Sale Doctrine. Em 1988 ocorreu finalmente a adesão à Convenção de Berna. Novidades importantes desta convenção em relação à legislação estadunidense foram a proteção de direitos morais de autor (como autoria, integridade da obra) e o reconhecimento do direito autoral independentemente da existência de registro ou notícia de copyright. As alterações que esta adesão ensejou nas normas estadunidenses foram introduzidas pelo Berne Convention Implementation Act of 198825. 14 Copyright Act of 1976, Pub. L. No. 94­553, 90 Stat. 2541. Codificado no Título 17 do Código dos Estados Unidos. 15 Universal Copyright Convention, texto de 1952, disponível em http://portal.unesco.org/en/ev.php­ URL_ID=15381&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html (acessado em 01/07/06) 16 United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization http://portal.unesco.org/ 17 Berne Convention for the Protection of Literary and Artistic Works, disponível em http://www.wipo.int/treaties/en/ip/berne/trtdocs_wo001.html (acessado em 01/07/06). Estabelece um período de proteção correspondente à vida toda do autor mais 50 anos. 18 Convention for the Protection of Producers of Phonograms Against Unauthorized Duplication of Their Phonograms, 1971, disponível em http://www.wipo.int/treaties/en/ip/phonograms/trtdocs_wo023.html (acessado em 01/07/06) 19 Universal Copyright Convention, texto de 1971, disponível em http://portal.unesco.org/fr/ev.php­ URL_ID=15241&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html (acessado em 02/07/06) 20 17 U.S.C. §107. Limitations on Exclusive Rights: Fair Use. 21 17 U.S.C. §109 (a) Limitations on exclusive rights: Effect of transfer of particular copy or phonorecord. 22 17 U.S.C. § 108. Limitations on exclusive rights: Reproduction by libraries and archives. 23 Piracy and Counterfeiting Amendments Act of 1982, Pub. L. No. 97­180, 96 Stat. 91, 93. Modificou a seção 506 (a) do Título 17 do Código dos Estados Unidos. 24 Record Rental Amendment of 1984, Pub. L. No. 98­450, 98 Stat. 1727. Codificado no Título 17, § 109. Limitations on exclusive rights: Effect of transfer of particular copy or phonorecord, e § 115. Scope of exclusive rights in nondramatic musical works: Compulsory license for making and distributing phonorecords 25 Berne Convention Implementation Act of 1988, Pub. L. No. 100­568, 102 Stat. 2853. 2.1. O AUDIO HOME RECORDING ACT E OS AVANÇOS DA MÚSICA DIGITAL Em 1992, a tecnologia de gravação digital (e.g. digital audio tape, DAT) às portas do mercado norte­americano provocou em muitos detentores de direitos autorais o receio de que as gravações caseiras feitas em dispositivos com qualidade digital pudessem prejudicar o mercado do entretenimento, especialmente o da música. Por este motivo o Audio Home Recording Act26 foi concebido para estabelecer medidas como a fixação de um quantum devido a título de royalties por cada dispositivo de gravação digital27 e suas fitas ou discos virgens28 vendidos, além de determinar que tais dispositivos devem utilizar um sistema de controle de cópias, Serial Copy Management System29. Embora o AHRA tenha permitido um certo equilíbrio entre os interesses dos detentores de copyrights, o avanço da tecnologia e o interesse público na distribuição dos dispositivos de gravação digital, ainda se questiona tanto o fato de terem sido tolhidas algumas liberdades dos consumidores quanto a legitimidade da taxação dos dispositivos e mídias virgens e da distribuição do dinheiro arrecadado entre os artistas. Isto porque a cobrança de royalties por cada um destes objetos assume que seriam usados exclusivamente para produzir cópias digitais de obras protegidas, de forma que há um aumento do preço final para o consumidor, quer os produtos sejam usados para tais fins ou não. A forma de distribuição dos royalties também enseja discussão, uma vez que é feita a partir de estimativa dos artistas potencialmente mais atingidos. Questiona­se a precisão destas estimativas, que normalmente beneficiam mais justamente os artistas de maior sucesso, argumentavelmente os “menos necessitados” de tais recursos. Ainda que o Audio Home Recording Act tenha justamente procurado estabelecer a concórdia entre produtores de gravadores digitais e a indústria fonográfica ­ evitando por exemplo situações como a do Caso Betamax30 ­ algumas polêmicas envolvendo o AHRA chegaram mesmo a ir para o Judiciário, como foi o caso da disputa envolvendo a RIAA, Recording Industry Association of America e o produtor de um dos primeiros MP3 players portáteis, Diamond Multimedia31. A discórdia neste caso reside justamente na definição de dispositivo digital de gravação de áudio trazida pelo estatuto, já que a pretensão da RIAA era então que fosse incluído no MP3 player Rio da Diamond um sistema de controle de cópias e que fossem recolhidos royalties pela venda do aparelho, nos moldes do AHRA. Contudo, tanto na Corte do Distrito da Califórnia, onde foi julgado em primeira instância, quanto na Corte de Apelações do Nono Circuito, a Associação não obteve sucesso. Prevaleceu o entendimento de que o MP3 player Rio não se enquadrava na definição de digital audio recording device do AHRA, uma vez que copiava músicas diretamente de discos rígidos de computador e não a partir de gravações musicais. Para ser considerado um dispositivo sujeito às previsões do AHRA, o Rio teria que gravar músicas nas formas previstas pelo Audio Home Recording Act: “In sum, to be a digital audio recording device, the Rio must be able to reproduce, either 'directly' or 'from a transmission', a 'digital music recording'”32, e os HDs dos computadores estão expressamente excluídos deste conceito. 26 Audio Home Recording Act, 1992, Pub. L. No. 102­563, 106 Stat. 4237. Codificado no capítulo 10 do Título 17 do US Code. 27 17 U.S.C. § 1004. Royalty payments (a) Digital Audio Recording Devices. 28 17 U.S.C. § 1004. Royalty payments (b) Digital Audio Recording Media. 29 17 U.S.C. § 1002. Incorporation of copying controls (a) (1) the Serial Copy Management System. Tais dispositivos de controle de cópias atuam de modo a não permitir a produção de mais de uma geração de cópias digitais. 30 Sony Corp. v. Universal City Studios, Inc., 464 U.S. 417 (1984) 31 Recording Industry Association of America v. Diamond Multimedia, 180 F. 3d 1072 (9th Cir. 1999) 32 RIAA v. Diamond, veja nota supra. “(...) because computers are not digital audio recording devices, they are not required to comply with the SCMS requirement and thus need not send, receive, or act upon information regarding copyright and generation status. See 17 U.S.C S 1002(a)(2). And, as the district court found, MP3 files generally do not even carry the codes providing information regarding copyright and generation status.”33 Este precedente tornou relativamente seguro aos fabricantes produzir MP3 players sem sistemas de controle de cópias ou necessidade do pagamento de royalties, e permitiu a grande difusão desses aparelhos observada atualmente. Por sua redação, é possível que também seja lembrado futuramente em questões relativas à necessidade de sistemas de controle de cópias e de gerenciamento de diretos autorais aplicados a computadores, seus programas e arquivos, uma vez há defensores de tal prática. Após o AHRA sobrevieram outros diplomas que guardam relação com o fenômeno do compartilhamento p2p. Em 1995 o Digital Performance Right in Sound Recordings Act34 permitiu que os detentores de direitos autorais de gravações musicais autorizassem transmissões digitais de seus trabalhos, suscitando o surgimento de serviços como canais de música digital via cabo, serviços de música digital via satélite ou internet, serviços interativos e outras formas eletrônicas de distribuição de música. Em seqüência, foi promulgado em 1997 o No Electronic Theft (NET) Act35, estabelecendo penas para infrações intencionais de copyright que se caracterizem tanto como comerciais quanto se configurem uso privado com vantagens financeiras, e para a reprodução e distribuição não autorizada de música por meio eletrônico. 2.2. SONNY BONO COPYRIGHT TERM EXTENSION ACT “If copyright is perpetual and there are perpetual copyright controls, the creative process dramatically decreases”36 Lawrence Lessig 37 Em 1998 foi aprovado o Sonny Bono Copyright Term Extension Act , que estendeu o período de privilégio dos herdeiros do autor sobre sua obra por mais 20 anos, ou seja, 70 anos após a morte do autor ou 95 anos para obras de corporações, como a Walt Disney. Esta lei curiosamente ficou, não sem motivos, conhecida como “Mickey Mouse Protection Act”, porque sua aprovação envolveu um forte lobby da Disney, em suma, para ser um dispositivo digital de gravação de áudio, o Rio precisa ser capaz de reproduzir, tanto 'diretamente' ou 'a partir de uma transmissão', uma 'gravação digital de música' [tradução nossa] 33 RIAA v. Diamond, veja nota supra. (...) porque computadores não são dispositivos digitais de gravação de áudio, não lhes é exigido concordar com o requisito do SCMS [sistema de controle de cópias] e assim não precisam enviar, receber, ou agir a respeito de informação relativa a direitos autorais e status de geração. Ver 17 U.S.C. S 1002(a)(2). E, como a corte distrital descobriu, arquivos MP3 geralmente nem mesmo carregam códigos que forneçam informações relativas a direitos autorais e status de geração. [tradução nossa] 34 Digital Performance Right in Sound Recordings Act of 1995, Pub. L. No. 104­39, 109 Stat. 336. Modificou as seções 114 e 115 do Título 17 do Código dos Estados Unidos. 35 No Electronic Theft Act of 1997, Pub. L. No. 105­147, 111 Stat. 2678. 36 Bedell, Doug. Professor says Disney, others typify copyright problems, in The Dallas Morning News, 14 de março de 2002, disponível em http://nl.newsbank.com/nl­ search/we/Archives?p_action=search&s_dispstring=%22Professor%20says%20Disney,%20other%20firms%20typify%20w hat%27s%20wrong%20with%20copyrights%22&p_field_advanced­0=&p_text_advanced­ 0=(%22Professor%20says%20Disney,%20other%20firms%20typify%20what%27s%20wrong%22%20with%20%22copyri ghts%22) [arquivo virtual do jornal, protegido por senha] e em http://www.dougbedell.com/lessig.html [acesso livre] (acessados em 10/07/06) Se o copyright é perpétuo e há controles de copyright perpétuos, o processo criativo decresce dramaticamente [tradução nossa] 37 Sonny Bono Copyright Term Extension Act, Título I da Pub. L. No. 105­298, 112 Stat. 2827. que detém os direitos sobre o personagem Mickey Mouse. Tais direitos, além de outros em situação semelhante, teriam expirado em 2003, caso não tivesse havido o Sonny Bono Copyright Extension Act. Nesse sentido, houve muitas discussões acerca da própria constitucionalidade da extensão do copyright e da sobreposição do interesse privado das corporações sobre o interesse público na limitação do período de proteção, que inegavelmente fomenta a inovação e a produção artística, tendo sido determinante para o sucesso da própria Walt Disney ­ não se deve deixar de observar que a referida empresa obteve grande êxito produzindo animações a partir de contos escritos pelos irmãos Grimm, que à época já estavam em domínio público, e que existe um forte interesse social na produção de obras derivadas como estas. Um dos maiores desafios envolvendo o Sonny Bono Copyright Act foi o caso Eldred v. Ashcroft, iniciado em 1999, que tornou­se um marco no direito estadunidense por sua relevância. Versando exatamente sobre o problema da constitucionalidade do referido estatuto, o caso Eldred v. Ashcroft tornou­ se célebre por conta dos argumentos dos requerentes de que repetidas extensões do período de proteção do copyright com efeitos retroativos iriam contra a disposição constitucional expressa de que a proteção dada a esses direitos seria por tempo limitado. Isto porque extensões retroativas, em última análise, tornariam o privilégio infinito, já que sempre que o copyright estivesse perto de expirar novas extensões repetidamente poderiam criar um ciclo vicioso em que o direito dos herdeiros do autor (ou de outros detentores, como pessoas jurídicas) não terminaria nunca. Nesse contexto, criam­se grandes monopólios fundados da exploração das obras protegidas em detrimento dos interesses sociais pela produção de obras derivadas e utilização das originais. Esta com toda a certeza não foi a intenção do constituinte estadunidense ao dispor sobre proteção do direito de autor. “Petitioners do not challenge the CTEA's 'life­plus­70­years' time span itself. They maintain that Congress went awry not with respect to newly created works, but in enlarging the term for published works with existing copyrights. The 'limited Time' in effect when a copyright is secured, petitioners urge, becomes the constitutional boundary, a clear line beyond the power of Congress to extend”38 Contudo, os requerentes do caso Eldred v. Ashcroft não lograram êxito na Suprema Corte dos Estados Unidos, que em janeiro de 2003 reafirmou o referido termo de extensão de copyrights, rejeitando a argumentação de que o dispositivo seria inconstitucional. 2.3. DIGITAL MILLENNIUM COPYRIGHT ACT “Something is going terribly wrong with copyright law in America”39 Lawrence Lessig Ainda em 1998, surge outro marco na história legal dos direitos autorais nos Estados Unidos, o Digital Millennium Copyright Act40, muito semelhante ao EUCD41 europeu (European Union Copyright 38 Eldred v. Ashcroft, 537 U.S. 186 (2003) (No 01­618) Os peticionários não desafiam a disposição do CTEA 'vida­mais­70­anos' como medida de tempo por si. Eles sustentam que o Congresso tornou­se errôneo não com relação aos trabalhos recém criados, mas por alargar o termo para trabalhos publicados com copyrights existentes. O 'Tempo limitado' em vigor quando um copyright é assegurado, os peticionários argumentam, torna­se o limite constitucional, uma linha clara além do poder de extensão do Congresso. 39 Lessig, Lawrence. Jail Time in the Digital Age, in New York Times, edição de 30 de julho de 2001, disponível em http://select.nytimes.com/gst/abstract.html?res=F70C11F839590C738FDDAE0894D9404482 [arquivo virtual do jornal protegido por senha gratuitamente fornecida no site] (acessado em 03/09/06) Algo está dando terrivelmente errado com o copyright na América [tradução nossa] 40 Digital Millennium Copyright Act of 1998, Pub. L. No. 105­304, 112 Stat. 2860, 2887. 41 EUCD ­ Directive 2001/29/EC of the European Parliament and of the Council of 22 May 2001 on the harmonization of certain aspects of copyright and related rights in the information society. Directive). Como algumas de suas antecessoras, a lei foi amplamente apoiada pela indústria de software e especialmente pela indústria de entretenimento, com oposição firme de cientistas, bibliotecários, acadêmicos e intelectuais. Seu texto continha no corpo outras quatro leis relacionadas e independentes, a saber: WIPO Copyright and Performances and Phonograms Treaties Implementation Act, Online Copyright Infringement Liability Limitation Act, Computer Maintenance Competition Assurance Act e Vessel Hull Design Protection Act, respectivamente nos Títulos I, II, III e V do DMCA42. Os dois primeiros, por sua relevância para os objetivos deste estudo, serão analisados detalhadamente a seguir. Já o Título IV do DMCA emenda as seções 108, 112, 114, capítulos sete e oito do Título 17 do US Code. Contém algumas disposições acerca das exceções na legislação de copyright para bibliotecas e para gravações efêmeras, educação à distância, funções do Escritório de Copyright dos Estados Unidos, transmissões de música pela internet – webcasting, as populares rádios virtuais – e outros. As críticas suscitadas pelo Digital Millennium Copyright Act não são poucas. Acusações como as de não ter trazido medidas que efetivamente parassem a “pirataria eletrônica”, mas apenas restrições a liberdades individuais dos consumidores ­ como o fair use43 e a liberdade de expressão44 ­ não são nem incomuns, nem infundadas. Há críticas ainda mais graves45, como a de que o DMCA e os dispositivos de “gerenciamento de direitos digitais” – DRM, Digital Rights Management – possuem o efeito desastroso de obstar a inovação e a produção artística. 2.3.1. WIPO COPYRIGHT AND PERFORMANCES AND PHONOGRAMS TREATIES IMPLEMENTATION ACT O Título I do DMCA, WIPO Copyright and Performances and Phonograms Treaties Implementation Act, corresponde à implementação das disposições do WCT, WIPO Copyright Treaty46 e do WPPT, WIPO Performances and Phonograms Treaty47, ambos de 1996, na legislação doméstica dos Estados Unidos. Suas disposições, que também alteram o Título 17 do Código daquele país, adicionando­lhe um novo capítulo 12, dividem­se em dois blocos: o primeiro procura incluir diversas obras protegidas pelos referidos tratados dentre as submetidas ao copyright das leis estadunidenses, e o segundo traz um conjunto de normas conhecido como anti­circumvention provisions – medidas anti­circunvenção –, numa tentativa de frear a quebra dos sistemas de proteção de direitos autorais. O primeiro bloco assegura proteção a obras estrangeiras protegidas nos países membros dos referidos tratados (incluindo as preexistentes que não tenham caído em domínio público em seus países de origem, ainda que isso já tenha ocorrido nos EUA), emendando, para tanto, a seção 104 A do Título 17. Já o segundo bloco contém proibições expressas de produção e circulação de meios para evitar os sistemas de gerenciamento de direitos autorais ­ e do ato em si de burlar estes sistemas. Por meio destas normas contornar quaisquer mecanismos de proteção contra cópias tornou­se crime, independente de haver o agente efetivamente desrespeitado direitos autorais. Isto se entendeu necessário porque os referidos sistemas são 42 Digital Millennium Copyright Act of 1998, explicativo do US Copyright Office, disponível em http://www.copyright.gov/legislation/dmca.pdf (acessado em 01/07/06) 43 Ver as críticas da Electronic Frontier Foundation, disponíveis em http://www.eff.org/IP/DMCA/ (acessado em 30/07/06) 44 Ver Hudson Jr, David L. Copyright and the First Amendment. Artigo publicado em maio de 2004 pelo First Amendment Center, disponível em http://www.firstamendmentcenter.org/analysis.aspx?id=13828&SearchString=dmca (acessado em 12/07/06) 45 Anti­DMCA Website http://anti­dmca.org/ (acessado em 30/07/06). 46 WIPO Copyright Treaty, disponível em http://www.wipo.int/treaties/en/ip/wct/trtdocs_wo033.html (acessado em 12/07/06) 47 WIPO Performances and Phonograms Treaty. disponível em http://www.wipo.int/treaties/en/ip/wppt/trtdocs_wo034.html (acessado em 12/07/06) rotineiramente contornados, seja através de programas desenvolvidos para esse fim, seja por meio de dispositivos capazes de burlar suas proteções. É fato notório que nenhum sistema de proteção contra cópias mostrou­se, até hoje, à prova de hackers determinados a quebrá­los. Muita polêmica surgiu a partir deste dispositivo legal. Apesar dos apelos das indústrias do entretenimento e de software, muitas pessoas divergem veementemente da opinião de que é necessária (ou eficiente) a criminalização dessas condutas para acabar com a “pirataria eletrônica”. Muita comoção48 gerou o caso do programador russo Dmitry Sklyarov, preso em 2001 por ter desenvolvido na empresa em que trabalhava, a Elcomsoft, um programa capaz de quebrar as proteções do software Adobe Ebooks Reader: “Dmitry Sklyarov, of Moscow, Russia, made an initial appearance yesterday in Las Vegas, Nevada, on a complaint from the Northern District of California charging a single count of trafficking in a product designed to circumvent copyright protection measures in violation of Title 17, United States Code, Section 1201(b)(1)(A). This is one of the first prosecutions in the United States under this statute, the Digital Millennium Copyright Act ("DMCA")49 Por ocasião do caso Sklyarov também manifestou­se o respeitado Prof. Lawrence Lessig, criador das licenças “copyleft50” creative commons51, em artigo que escreveu para o jornal New York Times acerca deste mesmo dispositivo legal: “The trouble, however, is that technologies that protect copyrighted material are never as subtle as the law of copyright. Copyright law permits fair use of copyrighted material; technologies that protect copyrighted material need not. Copyright law protects for a limited time; technologies have no such limit. Thus when the DMCA protects technology that in turn protects copyrighted material, it often protects much more broadly than copyright law does. It makes criminal what copyright law would forgive.”52 O Prof. Lessig afirma ainda que a referida lei e as tecnologias de controle de copyright não 48 Free Dmitry Sklyarov Website, http://www.freesklyarov.org/ (acessado em 23/06/06). 49 Russian Man Charged in California under Digital Millennium Copyright Act with Circumventing Adobe eBook Reader, notícia publicada em 17 de julho de 2001 no site Computer Crime & Intellectual Property Section do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, disponível em http://www.cybercrime.gov/Sklyarov.htm (acessado em 15/07/06) Dmitry Sklyarov, de Moscou, Russia, compareceu pela primeira vez ontem em Las Vegas, Nevada, [para responder a] uma denúncia do Distrito do Norte da Califórnia que o acusava de contrabandear para dentro [do país] um produto desenvolvido para contornar medidas de proteção de copyright, violando a Seção 1201(b)(1)(A) do Título 17 do Código dos Estados Unidos. Este é um dos primeiros processos nos Estados Unidos sob este estatuto, o Digital Millenium Copyright Act (“DMCA”). [tradução nossa] 50 Diz­se das licenças que estabelecem que a distribuição e modificação do trabalho criativo sejam livres e que os trabalhos derivados sejam livres da mesma forma. Trata­se, pois, de uma oposição ao modelo tradicional do copyright. Isto traduz­se pelo fato de que a expressão inglesa “right” pode significar “direita” (direção) além de “direito” e a palavra “left” por sua vez “esquerda”, de modo que copyleft denota, informalmente, oposição a copyright. Veja What is Copyleft? disponível no site do GNU Project da Free Software Foundation http://www.gnu.org/copyleft/ (acessado em 15/08/06) 51 Conjunto de licenças idealizadas para oferecer aos autores a faculdade de imprimir o caráter “copyleft” a suas obras, para que sejam livremente distribuídas e alteradas. Em contraste com as licenças tradicionais, que trazem a expressão “all rigths reserved” ­ todos os direitos reservados ­ os creative commons normalmente trazem os dizeres “some rights reserved” ­ alguns direitos reservados. Veja http://creativecommons.org/ (acessado em 07/07/06). 52 Lessig, Lawrence. Jail Time in the Digital Age, in New York Times, edição de 30 de julho de 2001, disponível em http://select.nytimes.com/gst/abstract.html?res=F70C11F839590C738FDDAE0894D9404482 [arquivo virtual do jornal protegido por senha gratuitamente fornecida no site] (acessado em 03/09/06) O problema, no entanto, é que as tecnologias que protegem material com copyright nunca são tão sutis como a lei de copyright. A lei de copyright permite “fair use“ [uso legítimo] do material protegido; tecnologias que protegem material com copyright não precisam fazê­lo. A lei de copyright protege por um tempo limitado; tecnologias não têm tal limite. Portanto quando o DMCA protege a tecnologia que por sua vez protege material com copyright, ocasionalmente protege muito mais amplamente que a lei de copyright. Ele [DMCA] torna criminoso o que a lei de copyright perdoaria. [tradução nossa] apenas interferem com os usos lícitos do material protegido, como também prejudicam a segurança dos próprios dispositivos, já que a pesquisa na área de segurança digital e encriptação depende da possibilidade de se testar as fraquezas dos sistemas em questão ­ “crack and report”, quebrar e avisar o fabricante. Dessa forma, muito ainda deve ser avaliado e discutido a respeito do custo­benefício de tais dispositivos legais, que não parecem oferecer uma solução suficientemente eficaz contra a chamada “pirataria eletrônica”, e acabam por dificultar e restringir justamente usuários legítimos, pesquisadores e pessoas de boa fé. 2.3.2. ONLINE COPYRIGHT INFRINGEMENT LIABILITY LIMITATION ACT O Título II do DMCA, Online Copyright Infringement Liability Limitation Act, declara algumas limitações de responsabilidade dos provedores de acesso à internet (ISPs, Internet Service Providers ou ainda OSPs, Online Services Providers) por infrações de copyright de seus clientes, nas situações em que simplesmente transmitem informações entre indivíduos. Já aos provedores que oferecem hospedagem de páginas ou serviços similares (provedores de hospedagem, conteúdo ou serviços), entretanto, caberá a incumbência de retirar do ar qualquer material que apresentar infração, para não serem responsabilizados. A maior polêmica acerca do Online Copyright Infringement Liability Limitation Act é uma disposição acerca da obrigação de os provedores de acesso fornecerem informações sobre os usuários que permitam sua localização, em eventual requisição dos detentores de copyright. Certamente cabem algumas críticas a estas determinações, que suscitam a questão da privacidade do usuário. “(3) CONTENTS OF SUBPOENA­ The subpoena shall authorize and order the service provider receiving the notification and the subpoena to expeditiously disclose to the copyright owner or person authorized by the copyright owner information sufficient to identify the alleged infringer of the material described in the notification to the extent such information is available to the service provider.”53 Neste sentido, desde a entrada em vigor do DMCA já houve casos importantes na Justiça estadunidense versando exatamente sobre este problema, como o caso Verizon Internet Services versus RIAA, Recording Association Industry of America. Neste caso, a Verizon negou apresentar informações sobre usuários do programa de troca de arquivos peer­to­peer Kazaa, ao que a RIAA buscou na Justiça meios de obrigar a empresa a ceder as informações baseando­se exatamente nesta disposição. Os argumentos da Verizon versavam basicamente sobre três problemas do referido dispositivo legal. Primeiro: se provedores de acesso que apenas propiciam a troca de informações entre usuários sem ter participação em suas condutas podem ser alvos de tais intimações; segundo: a legitimidade da expedição de intimação sem que haja um processo em curso na corte que a expediu; por último o problema da privacidade do usuário, necessária para o exercício pleno de sua liberdade de expressão. Embora a Corte Distrital de Columbia tenha determinado que a Verizon fornecesse as informações requisitadas pela RIAA, na Corte de Apelações o entendimento foi diverso. “§ 512(h) violates the First Amendment because it lacks sufficient safeguards to protect an internet user's ability to speak and to associate anonymously. Because we agree with Verizon's interpretation of the statute, we reverse the orders of the district court enforcing the subpoenas”54 53 Sec. 512. Limitations on liability relating to material online, (h) SUBPOENA TO IDENTIFY INFRINGER, Online Copyright Infringement Liability Limitation Act. (3) CONTEÚDO DA INTIMAÇÃO JUDICIAL ­ A intimação judicial deve autorizar e ordenar o provedor de serviços que receber a notificação e a intimação a prontamente fornecer ao detentor do copyright ou pessoa autorizada pelo detentor do copyright informação suficiente para identificar o alegado infrator do material descrito na notificação na extensão que tal informação estiver disponível ao provedor de serviços [tradução nossa] 54 Verizon Internet Services v. RIAA, Recording Association Industry of America, No. 03­7015 (D.C. Cir., December 19, 2.4. PROJETO BALANCE ACT Recentemente, foi proposto um projeto de lei que merece atenção, se não pela possibilidade de ser futuramente aprovado e convertido em lei, por guardar relação com os objetos deste estudo. O projeto conhecido como Benefit Authors without Limiting Advancement or Net Consumer Expectations (BALANCE) Act55, de 2003, foi apresentado na Câmara dos Representantes naquele ano e reintroduzido em dezembro de 2005. O BALANCE Act tem o intuito de reequilibrar a legislação de copyright pós­DMCA, já que muitos problemas surgiram a partir das disposições daquele estatuto. Em seu texto aparece o reconhecimento de que as tecnologias de proteção de direitos autorais – e a disposição do DMCA de proibição de alteração desses sistemas – realmente restringem alguns usos legítimos que se pode fazer da obra protegida, além da intenção do legislador ­ presumindo­se que sua intenção seja apenas a de proteger os direitos autorais. “Copyright laws in the digital age must prevent and punish digital pirates without treating every consumer as one”56. Nesse sentido, o projeto procura modificar o Título 17 do Código dos Estados Unidos para assegurar que o uso digital legítimo de material obtido por meios lícitos (e aqui também poderiam ser entendidas transmissões digitais lícitas) não seja considerado como infração de direitos autorais: “`(a) Use of Lawfully Obtained Digital Works­ Notwithstanding the provisions of section 106, it is not an infringement of copyright for a person who lawfully obtains a copy or phonorecord of a digital work, or who lawfully receives a transmission of a digital work, to reproduce, store, adapt, or access the digital work”57 Contudo, essas faculdades só seriam permitidas dentro de alguns requisitos: para arquivamento, desde que estas cópias sejam destruídas caso não seja mais lícito possuí­las, e para a exibição do trabalho em dispositivo digital, se isto não se configurar exibição pública. Existe, ainda, a previsão da First Sale Doctrine, segundo a qual não representa infração o ato de dispor da obra digital, desde que não se mantenha cópia da referida obra após a venda. Na verdade, a previsão mais importante do BALANCE Act talvez seja a emenda à seção 1201 do Título 17 do US Code, para permitir que as tecnologias de proteção de direitos autorais sejam contornadas, desde que essa seja a única forma de se ter acesso aos usos lícitos que possam estar limitados pelas tecnologias de proteção ao copyright. Da mesma forma, o projeto traria autorização para que fossem fabricadas, importadas ou desenvolvidas ferramentas para possibilitar a quebra das referidas tecnologias e tornar possíveis os usos lícitos mencionados de obras protegidas por esses sistemas, desde que o fabricante não tenha disponibilizado meios de fazê­lo, e que tais ferramentas sejam produzidas para possibilitar apenas os referidos usos lícitos. 2003) § 512(h) viola a Primeira Emenda porque não tem garantias suficientes para proteger a capacidade de um usuário da internet de falar e se associar anonimamente. Porque concordamos com a interpretação da Verizon do estatuto, nós revertemos as ordens da corte distrital que forçou a intimação [tradução nossa]. Vide nota supra acerca da seção 512 (h). 55 Benefit Authors without Limiting Advancement or Net Consumer Expectations (BALANCE) Act of 2005, H.R. 4536. 56 Excerto do BALANCE Act, nota supra. As leis de copyright na era digital deve prevenir e punir os piratas digitais sem tratar cada consumidor como um [tradução nossa] 57 Sec. 123. Limitations on exclusive rights; permissible uses of digital works, BALANCE Act, idem. `(a) Uso de Trabalhos Digitais Obtidos Licitamente ­ Apesar das previsões da seção 106, não é infração de copyright o ato de alguém que obtém licitamente uma cópia ou uma gravação de áudio de um trabalho digital, ou licitamente recebe uma transmissão de um trabalho digital, reproduzir, armazenar, adaptar, ou acessar o trabalho digital [tradução nossa] 3. CONCEITOS Passa­se à elucidação dos conceitos relacionados ao copyright, verdadeiro cerne de todas as batalhas judiciais contra o peer­to­peer nos EUA. É preciso ressalvar, contudo, que a despeito da conotação brasileira de direito autoral ­ um direito misto, conjunto de prerrogativas do autor ou detentor que abrange tanto o caráter patrimonial quanto o moral, levando em conta os direitos da personalidade ­ nos EUA o viés econômico é o que fala mais alto. O foco dos litígios é o caráter patrimonial, ainda que existam alguns direitos morais de autor garantidos por lei. Nesse sentido, a palavra copyright expressa bem o enfoque estadunidense da matéria: direitos autorais naquele país referem­se principalmente ao direito de cópia, de reprodução, distribuição, de obtenção de lucro a partir da obra. Os direitos autorais nos EUA traduzem­se então pela proteção por tempo limitado dada a trabalhos originais de autoria definida, fixados em meio de expressão tangível conhecido ou por ser inventado, através do qual podem tais trabalhos ser percebidos ou reproduzidos, comunicados. A proteção ou privilégio do copyright é concedida a trabalhos literários, musicais, dramáticos, gráficos, cinematográficos, de escultura, arquitetura, coreografia e gravações musicais.58 Por meio do copyright, é assegurado aos autores (ou a quem estes autorizem) o monopólio da reprodução, preparação de trabalhos derivados, distribuição, venda ou locação de cópias ou fonogramas, performance pública e exibição pública (no caso por exemplo de trabalhos literários, musicais, dramáticos, audiovisuais), e no caso de fonogramas, performance pública por meio de transmissões.59Alguns autores – apenas os criadores de artes visuais – possuem também alguns direitos morais de integridade da obra, atribuição de autoria e prevenção de destruição, mutilação ou distorção da obra, com duração limitada à vida do autor. Estes direitos são inalienáveis, mas pode­se abdicar deles através de documento por escrito.60 Infração61 de copyright constitui então toda reprodução, distribuição, venda, exibição pública ou performance pública ­ onde couber –, produção de trabalhos derivados ou utilização não autorizada que não esteja dentre as limitações dos direitos exclusivos do autor. 3.1. LIMITAÇÕES DOS DIREITOS EXCLUSIVOS DE AUTOR Em algumas situações específicas, a legislação de copyright estabelece limites ao monopólio de autor, autorizando que determinados usos sejam feitos de sua obra independente de consentimento ou qualquer compensação financeira. Estas limitações existem em virtude do propósito maior dos direitos autorais: servir à sociedade. O privilégio de autor nos Estados Unidos existe em função do interesse social pela inovação e pela produção de trabalhos artísticos, literários e musicais, de forma que o privilégio que a legislação oferece ao autor não decorre apenas de intenção de puramente recompensá­lo por seu trabalho, mas da intenção maior de incentivar a produção de obras úteis à sociedade. Afirmando exatamente isto, em 1909, quando da reforma da legislação de direitos autorais que resultou no Copyright Act de 1909, a Câmara dos Representantes produziu um relatório sobre a nova lei, que continha estas palavras: “The enactment of copyright legislation by Congress under the terms of the Constitution is not based upon any natural right that the author has in his writings, for the Supreme Court has held that such rights as he has are purely statutory rights, but upon the ground that the welfare of the public will be served and 58 59 60 61 17 U.S.C. § 102. Subject matter of copyright: In general 17 U.S.C. § 106. Exclusive rights in copyrighted works 17 U.S.C. § 106A. Rights of certain authors to attribution and integrity 17 U.S.C. § 501. Infringement of copyright progress of science and useful arts will promoted by securing to authors for limited periods the exclusive rights to their writings. The Constitution does not establish copyrights, but provides that Congress shall have the power to grant such rights if it thinks best. Not primarily for the benefit of the author, but primarily for the benefit of the public, such rights are given. Not that any particular class of citizens, however worthy, may benefit, but because the policy is believed to be for the benefit of the great body of people, in that it will stimulate writing and invention, to give some bonus to authors and inventors.” 62 [grifos nossos] Da mesma forma, em 1984 a Suprema Corte dos Estados Unidos, em opinião relativa ao Caso Betamax, proferiu estas afirmações esclarecedoras, dignas de serem lembradas: “The monopoly privileges that Congress may authorize are neither unlimited nor primarily designed to provide a special private benefit. Rather, the limited grant is a mean by which an important public purpose may be achieved. It is intended to motivate the creative activity of authors and inventors by the provision of a special reward, and to allow the public access to the products of their genius after the limited period of exclusive control has expired.”63 [grifos nossos] Em virtude disto, são asseguradas expressamente pela lei de copyright algumas limitações ao monopólio de autor, nas seções 107 a 112 do capítulo primeiro do Título 17 do Código dos Estados Unidos. As mais relevantes dentre estas serão analisados detalhadamente a seguir. 3.1.1. FAIR USE64 Uma das mais importantes limitações dos direitos autorais nos Estados Unidos é o instituto do fair use (ou uso legítimo), adicionado pela última grande revisão na legislação, o Copyright Act de 1976. Embora não estivesse anteriormente expresso no texto da legislação de copyright, a doutrina do fair use já vinha sendo aplicada em diversas decisões judiciais, tendo sido desenvolvida justamente a partir da experiência das Cortes. A seção 107 do primeiro capítulo do Título 17 do Código dos Estados Unidos é inteiramente dedicada ao fair use, e prevê a possibilidade de utilização e mesmo da produção de cópias de obras protegidas independente de autorização do autor ou detentor de direitos, desde que para finalidades como crítica, produção de notícias, estudo, pesquisa ou ensino (incluindo a distribuição de cópias para alunos em sala de aula), se observadas algumas condições. 62 The House of Representatives Report on The Copyright Act of 1909, H.R. Rep. No. 2222, 60th Cong., 2nd Sess. (1909), pág. 05. A adoção da legislação de copyright pelo Congresso nos termos da Constituição não é baseada em nenhum direito natural que o autor tenha sobre seus escritos, pois a Suprema corte sustentou que tais direitos que ele [autor] tem são direitos puramente estatutários, mas sobre o pressuposto de que o bem estar público será servido e o progresso da ciência e das artes úteis promovido por se assegurar aos autores por períodos limitados os direitos exclusivos a seus escritos. A Constituição não estabelece copyrights, mas prevê que o Congresso terá poder para garantir tais direitos se achar melhor. Não primeiramente pelo benefício do autor, mas primeiramente pelo benefício do público, tais direitos são dados. Não que alguma classe particular de cidadãos, por mais digna que seja, deva se beneficiar, mas porque é esperado que a política seja para o benefício do grande corpo social, e nisso estimulará a escrita e a invenção, dar algum bonus a autores e inventores [grifos nossos, tradução nossa] 63 Sony Corp. v. Universal City Studios Inc.,464 U.S. 417 (1984) O privilégio de monopólio que o Congresso pode autorizar não é nem ilimitado nem primariamente designado para prover um benefício privado especial. Antes, a garantia limitada é um meio pelo qual um importante propósito público pode ser alcançado. É intenção motivar a atividade criativa dos autores e inventores pela provisão de uma recompensa especial, e permitir o acesso público aos produtos de seus gênios após o período limitado de controle exclusivo ter expirado [grifos nossos, tradução nossa] 64 17 U.S.C. § 107. Limitations on exclusive rights: Fair use Os referidos usos serão considerados legítimos se não envolverem finalidade de obtenção de lucro e não afetarem o mercado da obra protegida, observando­se sempre para a constatação de fair use o propósito e as características do uso feito, a natureza da obra utilizada e a porção do trabalho protegido que foi efetivamente usada ou copiada. Assim, leva­se bastante em conta a boa­fé, o caráter pessoal e não comercial do uso para a aplicação em cada caso dessa doutrina, sendo certo, no entanto, que a distinção entre o uso legítimo e a infração não é taxativa, não havendo previsão oficial de limite de quantidade da obra utilizada que corresponda a uso legítimo ou forma – além da obtenção de licensa – de assegurar que o uso feito não irá gerar conflitos com o detentor do copyright. 3.1.2. FIRST SALE DOCTRINE65 First Sale Doctrine é um instituto da common law que garante ao comprador de cópias de obras protegidas o direito de dispor da cópia adquirida como julgar conveniente, desde que não viole a legislação de copyright. A doutrina é fundada no fato de que o detentor do copyright tem o direito exclusivo de distribuir toda cópia de suas obras protegidas até o momento da primeira venda, ou seja, a partir do momento da venda a cópia pertence ao comprador, que pode dispor dela como quiser, revendendo, alugando, emprestando ou doando sua cópia a quem entender melhor. Não é permito ao possuidor da cópia, contudo, reproduzir o material e distribuir: seus direitos extendem­se apenas em relação à cópia legalmente obtida, e não à obra protegida como um todo. Existem contudo algumas exceções à First Sale Doctrine, modificações posteriores no intuito de evitar que determinadas obras fossem copiadas de forma ilícita a partir da locação, ou de oferecer aos detentores de copyright uma parcela dos rendimentos obtidos a partir da locação de seus trabalhos por terceiros. Estas alterações destruíram a aplicabilidade da First Sale Doctrine para a indústria da música e de softwares, e permitem que o detentor de copyright controle o uso comercial de cópias vendidas de seus trabalhos protegidos, que são objetos alheios, extrapolando bastante a proteção inicial oferecida pela lei e em visível discrepância com o restante da legislação que versa sobre artigos do comércio. Tal discrepância representa muitas vezes um entrave à livre iniciativa e a adição de custos de licenciamento à atividade de locação ou empréstimo comercial destas obras. A primeira dessas alterações foi feita pelo Record Rental Amendment of 198466, que alterou as seções 109 e 115 do Título 17, permitindo aos detentores de direitos autorais sobre gravações de áudio e fonogramas proibir a locação ou empréstimo de suas obras para fins diretamente ou indiretamente comerciais. Da mesma forma, o Computer Software Rental Amendments Act67 de 1990 alterou Título 17 do US Code para oferecer aos fabricantes de softwares controle semelhante sobre as cópias de seus produtos, sendo­lhes atualmente facultado proibir a utilização comercial de seus trabalhos. A respeito do Computer Software Rental Amendments Act manifestou­se o Escritório de Copyright dos Estados Unidos com estas palavras: “By granting copyright owners of computer programs a newly created "rental right," Congress created an exception to the "first sale doctrine." This traditional copyright doctrine, which is codified in section 109 of the Copyright Code, limits the copyright owner's exclusive right of distribution by allowing the owner of a particular lawfully made copy of a work, or any person authorized by that owner, to sell or 65 17 U.S.C. § 109. Limitations on exclusive rights: Effect of transfer of particular copy or phonorecord 66 Record Rental Amendment of 1984, Pub. L. No. 98­450, 98 Stat. 1727. Codificado no Título 17, § 109 e 115 do U.S. Code. 67 Computer Software Rental Amendments Act of 1990, título VIII do Judicial Improvements Act of 1990, Pub. L. No. 101­ 650, 104 Stat 5089, 5134 otherwise dispose of possession of that copy without authority of the copyright owner.”68 [grifos nossos] Por meio então desse novo “direito de locação” os detentores de copyright da indústria fonográfica e de software ficam excluídos das limitações impostas pela First Sale Doctrine, que não se aplica, assim, a programas de computador e gravações musicais, sendo vedada a locação ou empréstimo de cópias de programas de computador ou de álbuns musicais, para fins direta ou indiretamente comerciais. 3.2. RESPONSABILIDADE SECUNDÁRIA POR INFRAÇÃO “Copyright law, however, can sometimes reach beyond the direct infringer to those who only indirectly involved in the infringing activity. (...) copyright law will sometimes hold one individual accountable for the actions of another.”69 A legislação de copyright prevê, para casos em que terceiros possibilitam, incentivam ou lucram com infrações de direitos autorais realizadas por outras pessoas uma responsabilização secundária, ainda que os agentes em questão não tenham violado por si nenhum direito autoral. As sanções pela infração direta podem, assim, atingir pessoas indiretamente responsáveis, numa tentativa de coibir o auxílio às infrações. Existem dois tipos de responsabilidade secundária tradicionalmente aplicados nas ditas “infrações indiretas” de copyright, a responsabilidade contributiva e a responsabilidade vicária, que serão analisadas de forma detalhada mais a frente. Além desses dois tipos, existe um terceiro, recentemente criado, conhecido como Inducement. 3.2.1. RESPONSABILIDADE CONTRIBUTIVA, CONTRIBUTORY LIABILITY A responsabilidade contributiva, contributory liability, é um instituto jurídico originário da legislação de patentes dos Estados Unidos, e que embora sem previsão expressa no Copyright Act of 1976, aplica­se por analogia a casos de infração de direitos autorais dada a proximidade e semelhança dessas duas áreas da Propriedade Intelectual. “(c) Whoever offers to sell or sells within the United States or imports into the United States a component of a patented machine, manufacture, combination, or composition, or a material or apparatus for use in practicing a patented process, constituting a material part of the invention, knowing the same to be especially made or especially adapted for use in an infringement of such patent, and not a staple article or commodity of commerce suitable for substantial non infringing use, shall be liable as a contributory infringer.”70[grifo nosso] 68 Report on Computer Software Rental Amendments Act, US Copyright Office, 15/08/94, disponível em http://www.copyright.gov/reports/software_ren.html (acessado em 23/07/06) Garantindo aos detentores de copyright de programas de computador um recém criado “direito de locação”, o Congresso criou uma exceção à “first sale doctrine”. Esta tradicional doutrina do copyright, codificada na seção 109 do Código de Copyright, limita o direito exclusivo de distribuição do detentor de copyright permitindo ao proprietário de uma cópia legalmente feita de um trabalho, ou qualquer pessoa autorizada por este proprietário, a vender ou dispor de outra forma da posse dessa cópia sem autorização do detentor do copyright [grifos nossos, tradução nossa] 69 Von Lohmann, Fred. IAAL: What Peer­to­Peer Developers Need to Know about Copyright Law. Janeiro de 2006, disponível na Electronic Frontier Foundation, http://www.eff.org/IP/P2P/p2p_copyright_wp_v5.pdf (acessado em 20/07/06) A lei de copyright, no entanto, pode por vezes alcançar além do infrator direto aqueles apenas indiretamente envolvidos na atividade infratora. (...) A lei de copyright irá por vezes responsabilizar um indivíduo pelas atitudes de outro [tradução nossa] 70 35 U.S.C. § 271 (c) Infringement of patent, contributory liability (c) Quem põe à venda ou vende nos Estados Unidos ou importa para os Estados Unidos componente de máquina patenteada, produto, combinação ou composição [patenteadas], ou material ou aparato para uso na prática de processo patenteado, constituindo o material parte da invenção, com consciência de ser este feito especialmente ou especialmente A responsabilidade contributiva aplica­se então a quem conscientemente contribui para a infração de outrem – quem tendo conhecimento da infração, ajuda, fornece meios, facilita ou contribui para a atividade infratora. A fundamentação para se pleitear a responsabilidade contributiva exige a presença de três fatores essenciais71: existência de infração direta, conhecimento e contribuição material. Isto significa que, para que exista efetivamente responsabilidade contributiva, devem estar presentes os três pré­requisitos: precisa ter havido necessariamente uma infração direta por terceiros, o infrator indireto (contributivo) precisa ter tido conhecimento – ou deveria ter tido, por sua função ou conduta – da infração direta e precisa ter contribuído materialmente para a infração, provendo os meios para que ela ocorresse. O conhecimento pode ser verdadeiro ou construtivo. Conhecimento verdadeiro ou real prescinde de definição: trata­se da ciência de que as infrações diretas estão ocorrendo, e pode ser provado por documentos e eventualmente pela conduta do acusado. Notificação enviada pelo detentor do copyright informando acerca da infração também é prova de conhecimento verdadeiro, para fim de aplicação da responsabilidade contributiva. Já o conhecimento construtivo, por outro lado, é o que se presume que alguém tenha ou possa ter em razão da disponibilidade da informação, do seu acesso à informação ou em virtude de sua conduta, entre outros fatores. Este conceito é o mesmo aplicado na legislação estadunidense relativa a marcas, e aparece expressamente naquela norma através da expressão “constructive notice”72, pela qual se admite o conhecimento presumido de terceiros com relação a marcas previamente registradas. Assim, para demonstrar o conhecimento de um infrator contributivo, tanto é possível a um detentor de copyrights enviar uma notificação de infração, informando qual o conteúdo protegido que está sendo objeto da infração – pelo que o acusado torna­se verdadeiramente ciente do fato –, provar conhecimento real por outros meios – por exemplo, informes publicitários do acusado contendo material protegido – ou argumentar acerca de conhecimento construtivo em virtude de acesso do acusado à informação. A conduta de evitar claramente o acesso à informação que denotaria ciência de infração (willful blindness – cegueira intencional) também pode configurar conhecimento construtivo.73 Nesse sentido, a decisão do Caso Aimster, que também versava sobre troca de arquivos peer­to­ peer, solidificou a aplicação da doutrina do conhecimento construtivo para questões de copyright, opondo­ se diretamente ao afirmado no Caso Betamax – conhecimento construtivo apenas não seria suficiente para a aplicação da responsabilidade contributiva . “...the encryption feature of Aimster's service prevented Deep from knowing what songs were being copied by the users of his system, he lacked the knowledge of infringing uses that liability for contributory infringement requires. Willful blindness is knowledge, in copyright law (where indeed it may be enough that the defendant should have known of the direct infringement, Casella v. Morris, 820 F.2d 362, 365 (11th Cir.1987); 2 Goldstein, supra, § 6.1, p. 6:6), as it is in the law generally. See, e.g., Louis Vuitton S.A. v. Lee, 875 F.2d 584, 590 (7th Cir.1989) (contributory trademark infringement). One who, knowing or strongly suspecting that he is involved in shady dealings, takes steps to make sure that he does not acquire full or exact knowledge of the nature and extent of those dealings is held to have a criminal intent, United States v. Giovannetti, 919 F.2d 1223, 1228 (7th Cir.1990), because a deliberate effort to avoid guilty knowledge is all that the law requires to establish a guilty state of mind. United States v. Josefik, 753 F.2d 585, 589 (7th adaptado para uso em infração dessa patente, e não um artigo comum ou mercadoria do comércio apropriada para uso lícito substancial, será responsável como infrator contributivo [grifos nossos, tradução nossa] 71 Von Lohmann, nota supra. 72 15 U.S.C. § 1072 Registration as constructive notice of claim of ownership 73 Carson, David O. “Peer­to­Peer File Transmission and Copyright Law” in Peer­to­Peer File­Sharing Technology: Consumer Protection and Competition Issues, workshop organizado pela Federal Trade Commission em Washington DC, 16 de dezembro de 2004. Cir.1985)”74 Por outro lado, a contribuição material entende­se pelo fornecimento de meios pelos quais é praticada a infração direta ­ “site and facilities”. Isto pode significar tanto a comercialização de produtos, distribuição de materiais ou mesmo de softwares pelos quais seja possível praticar a infração. Sob este aspecto, o Caso Betamax havia garantido aos fabricantes de produtos sujeitos à eventual utilização ilícita pelos consumidores alguma segurança. Contudo, algumas decisões divergentes chegaram a considerar posteriormente que simplesmente “providing the site and facilities for known infringing activity is sufficient to establish contributory liability”.75 Dessa forma, estando presentes os três elementos – infração direta, conhecimento e contribuição material –, pode o acusado ser responsabilizado como infrator contributivo, de forma análoga a que se pratica segundo as previsões da legislação de patentes dos EUA. 3.2.2. RESPONSABILIDADE VICÁRIA, VICARIOUS LIABILITY A responsabilidade vicária é um instituto que, embora sem previsão explícita na legislação de copyright, compõe tradicionalmente as regras da common law. Aplicada largamente para casos de responsabilização do empregador pelos atos de empregados, também pode ser aplicada aos casos de infração de copyright em que o acusado tiver “right and ability to supervise the infringing activity and also has a direct financial interest in such activities”.76 Assim como a responsabilidade contributiva, em sua aplicação são então levados em consideração três elementos77: existência de infração direta, possibilidade de controle da infração e obtenção de vantagens financeiras como resultado. A referida possibilidade de controle, também conhecida no direito estadunidense como right and ability to control, diz respeito ao fato de o infrator vicário ter condições de vigiar, controlar a atividade dos infratores diretos, de forma a ter a chance de impedir que as infrações ocorram sob sua responsabilidade. Esta questão suscita muitos problemas envolvendo informática e internet. Administradores de redes, por exemplo, têm amplos poderes dentro das redes que administram tanto para verificar a ocorrência de ilícitos nas atividades dos usuários quanto para, por meio da exclusão do usuário ou do material protegido do sistema, evitar que as infrações ocorram. 74 In re Aimster, 334 F.3d 643 (7th Cir. 2003) ... a capacidade de encriptação do serviço do Aimster impediu Deep de saber quais músicas estavam sendo copiadas pelos usuários do seu sistema, ele não possuía o conhecimento de usuários infratores que a responsabilidade por infração contributiva requer. Cegueira intencional é conhecimento, na lei de copyright (onde de fato pode ser suficiente que o requerido deveria ter tido conhecimento da infração direta, Casella v. Morris, 820 F.2d 362, 365 (11th Cir.1987); 2 Goldstein, supra, § 6.1, p. 6:6), como está geralmente na lei. Veja, por exemplo, Louis Vuitton S.A. v. Lee, 875 F.2d 584, 590 (7th Cir.1989) (infração contributiva de marca registrada). Aquele que, de conhecimento ou forte suspeita de que está envolvido em negócios escusos, toma medidas para se assegurar de que não adquira conhecimento completo ou exato da natureza e extensão de tais negócios, é considerado como tendo intenção criminosa, United States v. Giovannetti, 919 F.2d 1223, 1228 (7th Cir.1990), pois um esforço deliberado para evitar conhecimento com culpa é tudo o que a lei requer para estabelecer um estado mental culpado. United States v. Josefik, 753 F.2d 585, 589 (7th Cir.1985) [grifos nossos, tradução nossa] 75 Columbia Pictures Industries, Inc. v. Aveco, Inc., 800 F.2d 59 (3rd Cir. 1986) Prover o ambiente e facilidades para atividade reconhecidamente infratora é suficiente para estabelecer responsabilidade contributiva [tradução nossa] 76 Gershwin Publishing Corp. v. Columbia Artists Management, Inc., 443 F.2d 1162 (2d Cir. 1921) direito e habilidade de supervisionar a atividade infratora e também um interesse financeiro direto nessas atividades [tradução nossa] 77 Von Lohmann, nota supra. Da mesma forma, moderadores de grupos de discussão, fóruns e comunidades possuem também poderes para retirar material impróprio ou “pirateado” e remover os usuários responsáveis desses sistemas. Contudo, dada a quantidade de informações que circulam nestas redes e comunidades, a quantidade de usuários que podem ter e o fato de funcionarem em muitos casos por 24h ao dia tornam a fiscalização do comportamento dos usuários quanto à violação de copyrights uma tarefa hercúlea. Com relação ao elemento obtenção de vantagens financeiras, existe uma gama de possibilidades aceita como motivação para a imposição de responsabilidade vicária. As referidas vantagens podem ser desde comercialização direta do material protegido78 como a distribuição gratuita e muitas vezes não intencional. Isto porque considera­se vantagem financeira o fato de o mercado do infrator vicário estar fundado sobre a possibilidade de infração, ou seja, boa parte dos usuários ou consumidores procuram o serviço ou produto em virtude da possibilidade de se obter através dele material protegido sem custo. Nessa situação, o fabricante do produto ou explorador do serviço recebe mais clientes quanto maior ou mais fácil for a possibilidade de infração, razão porque se observa vantagem financeira clara mesmo que nada seja cobrado pelo material ilicitamente distribuído. 3.2.3. INDUCEMENT Recentemente, a Suprema Corte dos Estados Unidos criou uma nova forma de responsabilização que aplicou aos representantes legais do programa de compartilhamento de arquivos Grokster79, em decisão proferida em 2005. Esta nova forma de responsabilidade secundária ficou conhecida como Inducement, e baseia­se na constatação de que o infrator indireto fez esforços concretos para encorajar a infração e que tinha o intuito de promovê­la. “One who distributes a device with the object of promoting its use to infringe copyright, as shown by clear expression or other affirmative steps taken to foster infringement, is liable for the resulting acts of infringement by third parties.”80 Entendem­se como atitudes concretas do acusado para a atribuição de responsabilidade por indução tanto afirmações e propaganda quanto auxílio técnico para a operação de dispositivo na infração. No exemplo do Caso Grokster, considerou­se que as propagandas do programa que mostravam nomes de músicas protegidas somadas aos esforços da equipe para atrair os antigos usuários do Napster demonstrava ação concreta dos responsáveis pelo software para incentivar a troca de material com copyright. Outro requisito para a indução é o intuito do infrator indireto de promover a violação de copyright. O problema maior (e as maiores críticas) é justamente como fazer prova do intuito de alguém. Tanto podem ser utilizados documentos ou testemunhos quanto podem surgir acusações baseadas em argumentos abstratos. Como não se pode efetivamente provar qual o real intuito de uma pessoa física – calcule­se o de pessoas jurídicas –, este requisito pode dar margem a argumentações desprovidas de evidências e acusações pouco amparadas por fatos. 78 Veja Fonovisa, Inc. v. Cherry Auction, Inc., 76 F.3d 259 (9th Cir. 1996) 79 MGM v. Grokster, 545 U. S. 125 S. Ct. 2764 (2005) 80 MGM v. Grokster, nota supra. Alguém que distribui um dispositivo com o desígnio de promover seu uso para infringir copyright, como demonstrado por expressão clara ou outros passos afirmativos dados para encorajar a infração, é responsável pelos atos infratores resultantes de terceiros [tradução nossa] 4. O CASO BETAMAX “E à mente apavora o que não é mesmo velho” Caetano Veloso 81 O Caso Betamax é o mais famoso precedente da common law nos EUA relacionado a infrações de copyright por meio de inovações tecnológicas. Dizia respeito, quando do período de adaptação da sociedade e da indústria estadunidenses à comercialização do hoje popular videocassete – VCR, video cassete recorder ou VTR, video tape recorder, que então utilizava a tecnologia Betamax da Sony, precursora do VHS, video home system – à possibilidade de se produzirem cópias domésticas de programas completos, especialmente dos filmes protegidos por copyright veiculados na televisão. Em 1976 os estúdios cinematográficos Universal City Studios e Walt Disney Productions, na qualidade de potenciais vítimas das possíveis infrações praticadas pelos consumidores de videocassetes, procuram a via judicial para tentar evitar que tais aparelhos fossem fabricados e vendidos, uma vez que facilitavam a realização de cópias não autorizadas de seus filmes. Ainda que tenha sido decidido em definitivo há 22 anos, em janeiro de 1984, o Caso Betamax é ainda um importante precedente no direito estadunidense, mostrando­se bastante atual exatamente por tratar do polêmico conflito dos direitos autorais versus avanço tecnológico ­ não apenas uma questão jurídica ou tecnológica, mas um complexo dilema que envolve mudanças sociais e econômicas profundas, tanto no volume quanto na forma do consumo e da dinâmica do mercado da cultura e do entretenimento. O Caso Betamax modificou a forma como filmes e outras obras audiovisuais viriam a ser distribuídas no futuro, foi determinante para o grande progresso experimentado por ambas as indústrias envolvidas e, por estabelecer de forma sensata o equilíbrio entre copyright e inovação tecnológica, garantiu a otimização dos benefícios sociais destas duas ferramentas essenciais ao desenvolvimento humano. Dessa forma, as duas indústrias­partes certamente saíram beneficiadas pelo desfecho do Caso Betamax: a de eletro­eletrônicos ganhou a segurança necessária para poder evoluir e proporcionar à sociedade uma enorme variedade de produtos e a indústria cinematográfica, por sua vez, foi obrigada a encontrar e preencher um novo ramo do mercado, que ironicamente viria a ser a sua maior fonte de recursos nas décadas seguintes82. Mas a sociedade ganhou ainda mais. Tanto no aumento da oferta de produtos eletrônicos, que muitas vezes desempenham papel decisivo na melhoria da qualidade de vida, diminuição de custos e ampliação do horizonte criativo, quanto no aumento da variedade de filmes e obras audiovisuais disponíveis, estimulado pelo crescimento da indústria do entretenimento. Melhorou também o acesso às obras cinematográficas e intensificou muito o intercâmbio cultural em virtude da adoção de aparelho de reprodução portátil e com preços populares – os então polêmicos videocassetes. 4.1. ANÁLISE DO CASO “Respondents brought an action against petitioners in Federal District Court, alleging that VTR consumers had been recording some of respondents' copy­righted works that had been exhibited on commercially sponsored television and thereby infringed respondents' copyrights, and further that 81 Sony Corp. v. Universal City Studios, Inc., 464 U.S. 417 (1984) 82 Em 2004, 72% dos rendimentos domésticos da indústria do cinema vieram da venda ou da locação de fitas VHS, utilizadas pelos videocassetes, e de seu sucessor, o DVD. Estatísticas da Motion Picture Association of America, 2005, apud Oberholzer­Gee, Felix e Strumpf, Koleman. The Effect of File Sharing on Record Sales: An Empirical Analysis, disponível em http://www.ftc.gov/bcp/workshops/filesharing/presentations/strumpf.pdf (acessado em 27/07/06) petitioners were liable for such copyright infringement because of their marketing of the VTR's”83 Tendo iniciado em novembro de 1976 na Corte do Distrito Central da California84, cuja jurisdição compreende Hollywood, o Caso Betamax desenrolou­se ao longo de oito anos na justiça e tramitou pelas três instâncias do direito estadunidense. Em primeira instância, na Corte do Distrito Central da California, prevaleceu o entendimento de que o uso doméstico e não comercial que era feito dos videocassetes (majoritariamente para a prática que ficou conhecida como time­shifting85 constituía fair use86, uso legítimo do material protegido dentro das limitações do copyright. Contudo, na Corte de Apelações87, a decisão de primeira instância foi reformada em outubro de 1981. Além de considerar que havia verdadeiramente infração dentre as atividades dos usuários dos videocassetes, a Corte de Apelações do Nono Circuito entendeu que aplicava­se à Sony responsabilidade contributiva, contributory liability88, pelas infrações de seus consumidores e que a Corte Distrital deveria conceder a injunção89 (ordem de proibição) pedida pela Universal. Tal decisão não teria sido factível, contudo, uma vez que já havia milhares de videocassetes em circulação no mercado na época, pois o crescimento da venda desses aparelhos foi muito grande nos cinco anos que compreenderam do início do processo até a referida decisão. Estima­se que as vendas de VTRs cresceram de 30.000 unidades por ano em 1976 para 1.400.000 unidades por ano em 1981 90, de forma que teria sido praticamente irrelevante para a questão das possíveis infrações de copyright proibir a venda de um item já tão disseminado. Em seqüência, tendo subido para a Suprema Corte dos Estados Unidos91, o Caso Betamax foi julgado favoravelmente à Sony Corporation em 17 de janeiro de 198492, tendo sido afastada a teoria da responsabilidade contributiva para produtos que pudessem eventualmente ser usados por seus compradores para infração de copyright, mas que possuíssem usos lícitos. Este entendimento da Suprema Corte estadunidense no Caso Betamax tornou­se então um precedente fundamental para assegurar o desenvolvimento tecnológico e deixar a salvo de processos por responsabilidade contributiva em infrações de copyright os fabricantes de produtos como máquinas reprográficas, scanners, gravadores de CDs e até mesmo mp3 players, tendo sido evocado constantemente em processos posteriores envolvendo o conflito entre copyright e tecnologia, como o caso Diamond Multimedia (fabricante de um dos primeiros mp3 players portáteis comercializados) versus RIAA, Recording Industry Association of America93. 83 Veja Sony v. Universal, nota supra. Os requeridos entraram com uma ação contra os requerentes em Corte de Distrito Federal, alegando que os consumidores de VTR têm gravado alguns dos seus trabalhos protegidos por copyright que têm sido exibidos na televisão patrocinada comercialmente e desse modo infringido os direitos autorais dos requeridos, e ainda que os requerentes eram responsáveis por essa infração por causa da comercialização dos VTRs [tradução nossa] 84 United States District Court for the Central District of California, http://www.cacd.uscourts.gov/ 85 Time­shifting, mudança de horário, prática que consiste em gravar programas da televisão para assistir em horário diverso. 86 17 U.S.C. §107. Limitations on Exclusive Rights: Fair Use. 87 United States Court of Appeals for The Ninth Circuit http://www.ca9.uscourts.gov/ 88 35 U.S.C. § 271 (c) Infringement of patent, contributory liability. 89 17 U.S.C. § 502. Remedies for infringement: Injunctions. 90 The Betamax Case in The Museum of Broadcast Communications http://www.museum.tv/archives/etv/B/htmlB/betamaxcase/betamaxcase.htm (acessado em 04/07/06) 91 Supreme Court of The United States http://www.supremecourtus.gov/ 92 Veja Sony v. Universal, nota supra. 93 Recording Industry Association of America v. Diamond Multimedia Systems, 180 F.3d 1072, 1079 (9th Cir. 1999) (No. 98­ 56727) 4.2. A ARGUMENTAÇÃO DA INDÚSTRIA CINEMATOGRÁFICA A argumentação da indústria cinematográfica neste caso, iniciado há mais de trinta anos, ironicamente em muito se assemelha à professada atualmente pela indústria fonográfica contra as redes de troca de arquivos peer­to­peer: o fabricante de produto capaz de ou ainda criado com a finalidade de possibilitar a confecção de cópias não autorizadas de material protegido deve ser responsabilizado pelas infrações de seus consumidores, e tal produto não deve ser comercializado porque poria em risco a própria existência da indústria do entretenimento. Outra grande semelhança entre as alegações da indústria do entretenimento da época e suas afirmações atuais é se basearem em pesquisas realizadas entre os usuários para determinar o quanto e o quê é copiado, e assim calcular supostos prejuízos. Já no período em que o caso esteve na Corte Distrital, tanto a Universal quanto a Sony realizaram pesquisas similares de hábitos entre usuários, chegando a resultados semelhantes, mas conclusões bem diversas. O que a Universal concluiu foi que os usuários de VCRs costumavam sim gravar diversos programas de televisão protegidos por copyright, de forma que restariam provadas suas infrações e demonstrado o dano patrimonial experimentado pela violação de direitos autorais. É importante lembrar que à época do Caso Betamax, diferentemente do modelo atual, a indústria cinematográfica recebia pagamento por praticamente todas as exibições de seus filmes, cobrando porcentagens pelas execuções públicas nos cinemas e taxas pelas transmissões na televisão. Antes do aparecimento dos videocassetes, não se negociavam cópias para consumo doméstico das obras protegidas, mas licenças para exibições. Com o advento dos VCRs, no entanto, além de prever fortes danos patrimoniais pela violação de direitos sobre seus filmes copiados nestes aparelhos em milhares de residências, a indústria cinematográfica tinha também outros temores em relação aos videocassetes, embora não os tenha posto como principais argumentos no processo que moveu contra a Sony. Ocorre que boa parte das exibições de filmes fugiria ao controle dos estúdios de cinema, porque uma vez postas no mercado fitas gravadas contendo estas obras, ainda que originais, a indústria cinematográfica nada receberia pelo aluguel ou mesmo comércio destas fitas, práticas protegidas pela First Sale Doctrine94, que garantia ao primeiro comprador, ou atual proprietário, de obra protegida o direito de vender, alugar ou fazer qualquer outro uso da obra que não constitua infração de direitos autorais, sem necessidade de autorização do detentor do copyright. Com certeza, foi é também uma forte razão para que a indústria cinematográfica não visse com bons olhos as novas tecnologias à época. Não podendo fundamentar em lei seu descontentamento com a First Sale Doctrine, a Universal argumentou que a reprodução não autorizada viola os direitos autorais (lembrando que nos Estados Unidos se protege especialmente o caráter patrimonial desses direitos) dos estúdios de cinema, que não receberiam qualquer pagamento pelas muitas cópias produzidas de seus filmes. Além disso, argumentou que de posse de cópias em fita cassete desses filmes, as pessoas não precisariam ir sempre aos cinemas, e as bilheterias (principal fonte de recursos da indústria cinematográfica da época) sofreriam impacto direto. Haveria assim grandes prejuízos para o setor, que inviabilizariam a produção de novos filmes e a obtenção de lucro necessária à viabilidade econômica da sétima arte, lucro este especialmente imprescindível para que houvesse recompensa justa aos produtores, atores, roteiristas e todas as pessoas que trabalhavam com esforço e dedicação na produção dos filmes. Haveria desemprego, retrocesso, ruína. 94 17 U.S.C. §109 (a) Limitations on exclusive rights: Effect of transfer of particular copy or phonorecord. Esta forte argumentação é muito bem ilustrada pelos dizeres do então presidente da MPAA, Motion Picture Association of America95, Jack Valenti: “the VCR is to the American film producer and the American public as the Boston strangler is to the woman home alone”96, e “while the Japanese are unable to duplicate the American films by a flank assault, they can destroy it by this video cassette recorder”97. A Universal, assim como a MPAA, argumentava então que a popularidade do videocassete poria fim à indústria do cinema, que o ato de gravar programas ou filmes exibidos na televisão excedia o fair use, configurando violação de copyright, e que o fabricante dos aparelhos deveria ser responsabilizado subsidiariamente pelas infrações dos consumidores, por oferecer­lhes os meios de praticar o ilícito (contributory liability). Entendia também que o VCR tinha por finalidade única a cópia não autorizada de conteúdo protegido por copyright, já que a maior parte dos programas exibidos na televisão pertenciam a esta categoria: “these machines are advertised for one purpose in life. Their only single mission, their primary mission is to copy copyrighted material that belongs to other people”.98 Além disso, a indústria cinematográfica defendia ainda que a grande aceitação do videocassete pelo mercado devia­se justamente ao fato de o produto poder ser usado para a infração: “how many people would want to buy these machines if you said you couldn't use any copyrighted material on it. The machine would be useless”99. Dessa forma, caberia também à Sony Corporation, que estaria auferindo vantagens econômicas com as infrações dos usuários, responsabilidade vicária (vicarious liability). Assim, apoiada na argumentação de que havia infração de direitos autorais nas práticas dos usuários de videocassetes, mesmo no que tange o time­shifting, que a referida infração reverteria em danos patrimoniais graves em virtude de acentuada queda de arrecadação, que sua obras protegidas enfrentariam perda significativa de valor frente ao mercado e que haveria prejuízos sociais profundos decorrentes da inviabilização econômica do setor do cinema, traduzidos tanto na diminuição dos filmes disponíveis para o público quanto na perda de empregos e desaquecimento da indústria cinematográfica, a Universal City Studios e a Walt Disney Productions pediam a responsabilização contributiva e vicária da Sony Corporation pelas infrações de copyright de seus consumidores, uma injunção contra a venda dos videocassetes, reparação de danos pecuniários e e adjudicação de lucros cessantes (equitable accounting of profits). Estes argumentos, no entanto, foram acolhidos apenas pela Corte de Apelações do Nono Circuito, tendo sido rejeitados tanto pela Corte Distrital quanto pela Suprema Corte dos Estados Unidos. Quando acolhidos, entendeu­se apropriado que houvesse a instituição de taxas compulsórias para a venda dos videocassetes e fitas virgens a ser revertida para a compensação de danos experimentados pelos estúdios 95 A Motion Picture Association of America, MPAA, é uma instituição coletiva de proteção dos interesses da indústria cinematográfica, semelhante à RIAA, Recording Industry Association of America para a indústria da música. 96 Depoimento de Jack Valenti em audiência no Congresso, Home Recording of Copyrighted Works Hearings on H.R. 4783, H.R. 4794, H.R. 4808, H.R. 5250, H.R. 5488, and H.R. 5705 before Subcommittee on Courts, Civil Liberties, and the Administration of Justice of the House of Representatives Committee on Judiciary, 97th Cong. 2nd session (1982) O VCR é para o produtor de filmes americano e o público americano como o estrangulador de Boston é para a mulher sozinha em casa [tradução nossa] 97 Veja depoimento de Jack Valenti, nota supra Ao mesmo tempo em que os japoneses são incapazes de duplicar os filmes americanos num assalto pelos flancos, eles podem destruí­los com esse gravador videocassete [tradução nossa] 98 Veja depoimento de Jack Valenti, nota supra Estas máquinas são anunciadas com um propósito na vida. Sua única missão, sua missão primária é copiar material protegido por copyright que pertence a outras pessoas [tradução nossa] 99 Veja depoimento de Jack Valenti, nota supra Quantas pessoas iriam querer comprar estas máquinas se você dissesse que não pode usar nenhum material protegido por copyright nelas. A máquina seria inútil [tradução nossa] de cinema vitimados pela comercialização dos VCRs: “a continuing royalty pursuant to a judicially created compulsory license may very well be an acceptable resolution of the relief issue”.100 4.3. A ARGUMENTAÇÃO DA SONY CORPORATION Em contrapartida aos argumentos da indústria cinematográfica, a Sony sustentava na época que a utilização doméstica majoritária do seu produto não constituía infração de direitos autorais e que as pesquisas de hábitos dos usuários realizadas por ambas as empresas indicavam que a maioria das pessoas gravava programas exibidos em momentos em que não se podia assisti­los (porque havia conflito com horário de trabalho ou outros compromissos) para serem vistos em momentos mais convenientes, apagando as cópias em seguida para a gravação de outros programas pelo mesmo método101. Argumentava que o time­shifting não constitui infração de direitos autorais, seja porque o indivíduo que o pratica teria de toda forma acesso gratuito ao conteúdo dos programas da televisão aberta, porque o uso feito é doméstico e não­comercial, porque as cópias produzidas são apagadas logo após o uso ou porque a finalidade da gravação é apenas assistir ao programa em hora diversa de sua transmissão, prática que por si não desrespeita nenhuma lei. A Sony trouxe também à justiça declarações de responsáveis por programas educativos, religiosos e de esportes, afirmando não se oporem à gravação de seus conteúdos, tanto para time­shifting quanto para a confecção de cópias propriamente ditas. Desse modo, a Sony procurou demonstrar que tanto o time­shifting de programas protegidos por copyright quanto a gravação de programas religiosos, educativos e esportivos representavam usos lícitos substanciais e que a proibição da comercialização do VCR implicaria restrição da faculdade das pessoas de o utilizarem para estas finalidades lícitas. No tocante à responsabilidade subsidiária, a Sony Corporation defendeu­se demonstrando que ainda que o time­shifting fosse efetivamente considerado infração de copyright, não poderia ser condenada por responsabilidade contributiva ou vicária, uma vez que sua relação com o consumidor limitava­se à venda do produto, de forma que o usuário infrator não era assistido pela empresa nem tampouco poderia esta exercer qualquer controle sobre as atividades do consumidor. O uso feito dos VCRs era de inteira responsabilidade do comprador, não podendo a Sony impedir que eventuais abusos fossem praticados. Ademais, como ficou demonstrado que o aparelho, além de possuir vários usos lícitos, era utilizado majoritariamente para a prática do time­shifting, seu valor de mercado não era fruto das violações de copyright. Não havia, pois, vantagem financeira para a empresa pela atividade infratora, requisito essencial para a aplicação da responsabilidade vicária. De fato, se para cada objeto que pode ser usado de forma a infringir leis fosse adotada uma postura restritiva como a que desejou ver aplicada a Universal Studios no Caso Betamax, a sociedade se veria privada de muitas ferramentas úteis ao seu desenvolvimento artístico, cultural, econômico e humano. Nesse sentido, a Corte do Distrito da California proferiu as seguintes palavras, através das quais o conceito proveniente da legislação de patentes “staple article of commerce”, artigo comum no comércio, seria incorporado por analogia ao Caso Betamax e dessa forma ganharia força de precedente também no 100 Veja Sony v. Universal, nota supra Royalty contínuo em conseqüência de uma licença compulsória judicialmente criada pode bem ser uma resolução aceitável em matéria de reparação [tradução nossa] 101 Tal prática ficou conhecida como time­shifting (mudança de horário) e não era recriminada pelas emissoras de televisão, detentoras do copyright da maior parte dos programas gravados, porque propiciava um desejável aumento de audiência, traduzindo­se em lucro e não em prejuízos. direito autoral estadunidense. Por sua relevância, as mesmas palavras foram citadas na decisão da Suprema Corte em sua fundamentação: “Selling a staple article of commerce – e. g., a typewriter, a camera, a photocopying machine – technically contributes to any infringing use subsequently made thereof, but this kind of 'contribution', if deemed sufficient as a basis for liability, would expand the theory beyond precedent and arguably beyond judicial management. (...) “...Commerce would indeed be hampered if manufacturers of staple items were held liable as contributory infringers whenever they 'constructively' knew that some purchasers on some occasions would use their product for a purpose which a court later deemed, as matter of first impression, to be an infringement.”102 4.4. A DECISÃO DA CORTE DO DISTRITO CENTRAL DA CALIFORNIA Em primeira instância o Caso Betamax teve decisão favorável à Sony, tendo entendido a Corte do Distrito da California que tanto a prática do time­shifting quanto as gravações caseiras sem fim comercial não consistiam infração a direitos autorais, mas fair use. Estas práticas foram até mesmo consideradas benéficas, por ampliarem o acesso à programação da televisão aberta, gratuita, e à informação. “The District Court concluded that noncommercial home use recording of material broadcast over the public airwaves was a fair use of copyrighted works and did not constitute copyright infringement. (...) Moreover, the court found that the purpose of this use served the public interest in increasing access to television programming, and interest that “is consistent with First Amendment policy of providing the fullest possible access to information through the public airwaves. Columbia Broadcasting System, Inc. v. Democratic National Committee, 412 U.S. 94, 102.” Even when an entire copyrighted work was recorded, [464 U.S. 417, 426] the District Court regarded the copying as fair use “because there is no accompanying reduction in the market for 'plaintiff's original work'”103 Entendeu ainda que, mesmo que tal procedimento fosse considerado infração, não poderia ser atribuída à Sony Corporation responsabilidade contributiva ou vicária, já que sua relação com os usuários de VCRs limitava­se à venda do aparelho, de modo que não poderia a empresa exercer qualquer controle 102Veja Sony v. Universal, nota supra Vender um artigo comum no comércio – por exemplo, uma máquina de escrever, uma câmera, uma máquina reprográfica – tecnicamente contribui para qualquer uso infrator feito dele, mas esse tipo de 'contribuição', se considerado base suficiente para responsabilidade, expandiria a teoria para além de precedentes e argumentavelmente para além das possibilidades de ser administrada judicialmente. (...) O comércio seria de fato prejudicado se os fabricantes de itens comuns fossem responsabilizados como infratores contributivos sempre que 'construtivamente' tivessem ciência que alguns compradores em algumas ocasiões usariam seu produto para um propósito que uma corte posteriormente considerasse, em virtude de primeira impressão, ser uma infração [tradução nossa] 103Veja Sony v. Universal, nota supra A Corte Distrital concluiu que o uso doméstico não comercial de gravação de material transmitido pelas ondas aéreas públicas era fair use dos trabalhos protegidos e não constituía infração de copyright. (...) Além disso, a corte considerou que o propósito deste uso servia o interesse público ao aumentar o acesso aos programas de televisão, interesse que “é consistente com a política da Primeira Emenda de prover o maior acesso possível a informação pelas ondas aéreas públicas. Columbia Broadcasting System, Inc. v. Democratic National Committee, 412 U.S. 94,102” Mesmo quando um trabalho protegido inteiro é gravado, [464 U.S. 417, 426] a Corte Distrital julgou a cópia como fair use “porque não há acompanhamento de redução de mercado para os 'trabalhos originais do requerente'” [notas de rodapé suprimidas, tradução nossa] sobre as atividades dos usuários. Além disso, não os encorajava ao descumprimento da lei de nenhuma forma, tendo sido apurado que, embora seus comerciais nada dissessem acerca da possibilidade de serem os programas passíveis de cópia protegidos por copyright, no manual do aparelho havia um alerta: “Television programs, films, videotapes and other materials may be copyrighted. Unauthorized recording of such material may be contrary to the provisions of the United States laws.”104 Observou também que a Universal Studios não conseguiu provar ter experimentado dano material ou que os videocassetes tivessem efetivamente causado diminuição de seu mercado, de forma que não lhe seria concedida reparação de danos ou indenização, e que um injunção contra a venda dos aparelhos privaria o público da possibilidade de usar o VCR para fins lícitos, razão pela qual a medida seria “wholly inappropriate”, de todo inapropriada. 4.5. A DECISÃO DA CORTE DE APELAÇÕES DO NONO CIRCUITO Contudo, na Corte de Apelações do Nono Circuito o entendimento foi tão oposto quanto seria possível. A Corte concluiu que o uso doméstico dos videocassetes não era fair use e rejeitou a teoria dos staple articles of commerce, entendendo que estes utensílios, como fotocopiadoras, tinham usos benéficos e “do not even remotely raise copyright problems”, “nem de longe levantam problemas de copyright”. Por outro lado, os videocassetes eram vendidos com o propósito de copiar programas de televisão, quase todos protegidos por copyright, de modo que sua finalidade era justamente copiar material protegido e não haveria uso lícito substancial mesmo que alguns detentores de direitos optassem por não exigi­los. Tais argumentos parecem contudo bastante insuficientes. Já era fato notório na época que alguns itens comumente vendidos poderiam gerar sim problemas de copyright, e afirmar “nem de longe” criavam essas questões soa bastante como hipocrisia. Ignorar os usos lícitos dos VCRs e a faculdade dos detentores de direitos de autorizar a reprodução de seus trabalhos, como alguns haviam expressamente feito durante a tramitação do processo, também não se configura como a visão imparcial que se espera de membros do Judiciário, seja em que país for. A Corte de Apelações afirmou ainda, acerca do possível dano experimentado pela indústria cinematográfica e possíveis conseqüências para seu mercado, que não havia necessidade de provar sua alegação de prejuízo: “It...held that it was unnecessary for plaintiffs to prove any harm to the potencial market for the copyrighted works”105. Acerca da responsabilidade contributiva, rejeitou a defesa da Sony Corporation e arrazoou que a Corte Distrital deveria reconsiderar sua decisão sobre a negativa de injunção, que considerou como medida apropriada para o caso, tendo sustentado também que a cobrança de royalties pela venda dos videocassetes para compensar as infrações seria uma medida apropriada. 4.6. A DECISÃO DA SUPREMA CORTE DOS ESTADOS UNIDOS Tendo ido o caso à Suprema Corte, novamente a decisão da instância inferior foi bastante 104Alerta constante dos manuais de videocassetes da época. Constante das decisões da Corte Distrital e da Suprema Corte. Veja Sony v. Universal, nota supra Programas de televisão, filmes, fitas de vídeo e outros materiais podem ter copyright. Gravações não autorizadas desse material podem ser contrárias às previsões das leis dos Estados Unidos [tradução nossa] 105Veja Sony v. Universal, nota supra Sustentou que era desnecessário aos requerentes provar qualquer ameaça ao mercado potencial de seus trabalhos protegidos por copyright [tradução nossa] modificada. Seu entendimento, contrariando bastante a opinião da Corte de Apelações, assemelha­se muito ao que alcançou a Corte do Distrito Central da Califórnia. Prevaleceu na Suprema Corte a opinião da maioria como redigida pelo Juiz John Paul Stevens106, mas existiu uma opinião divergente107 sustentada pelo Juiz Harry Andrew Blackmun, que guardava semelhanças com a opinião da Court of Appeals. A opinião da Corte liberou a Sony tanto da responsabilidade contributiva quanto da vicária, afirmando que a prática dos usuários de VTRs conhecida como time­shifting constitui fair use de material protegido, e que uma porção significativa dos programas de televisão pode ser gravada sem objeção dos detentores de direitos autorais. Afirmou ainda que a cobrança de royalties pela venda dos aparelhos como proposta pela Corte de Apelações era descabida e que, se praticada “would enlarge the scope of respondents' statutory monopolies to encompass control over an article of commerce that is not the subject of copyright protection. Such an expansion of the copyright privilege is beyond the limits of the grants authorized by Congress.”108 Ou seja, expandiria o monopólio de autor muito além dos direitos sobre seu trabalho, atingindo proporções maiores que as asseguradas em lei, o que seria extremamente deletério para o desenvolvimento econômico, tecnológico e cultural. Restaria invertido o propósito primeiro do direito autoral: a proteção à criação do autor tendo em vista seus benefícios sociais. A Suprema Corte procurou taxativamente lembrar que o direito de privilégio do autor, assim com a patente, existe com a finalidade de incentivar a inovação exatamente porque a inovação beneficia a sociedade. É no interesse da sociedade como um todo que foi criado o monopólio do autor, de forma que na aplicação da lei isto não pode ser ignorado sobrepondo­se o interesse privado ao interesse coletivo sem razões muito fortes. Neste sentido, a opinião da Corte citou a decisão de primeira instância, afirmando que na análise dos aspectos ambíguos da lei, é preciso proceder com cautela, tendo consciência dos propósitos constitucionais para que se estabeleça o equilíbrio entre os interesses conflitantes, sem que se esqueça, contudo, de que o objetivo do copyright é o benefício social e não individual: “The limited scope of the copyright holder's statutory monopoly, like the limited copyright duration required by the Constitution, reflects a balance of competing claims upon the public interest: Creative work is to be [464 U.S. 417, 432] encouraged and rewarded, but private motivation must ultimately serve the cause of promoting broad public availability of literature, music, and the other arts. The immediate effect of our copyright law is to secure a fair return for an `author's' creative labor. But the ultimate aim is, by this incentive, to stimulate artistic creativity for the general public good. `The sole interest of the United States and the primary object in conferring the monopoly,' this Court has said, `lie in the general benefits derived by the public from the labors of authors.' Fox Film Corp. v. Doyal, 286 U.S. 123, 127 . See Kendall v. Winsor, 21 How. 322, 327­328; Grant v. Raymond, 6 Pet. 218, 241­242. When technological change has rendered its literal terms ambiguous, the Copyright Act must be construed in light of this basic purpose." Twentieth Century Music Corp. v. Aiken, 422 U.S. 151, 156 (1975)”109 [grifos nossos] 106 Apoiada também pelos juízes Warren Earl Burger, William Joseph Brennan, Byron White e Sandra Day O'Connor. 107 Apoiada, além do subscritor, pelos juízes Thurgood Marshall, Lewis Franklin Powell Jr. e William Hubbs Rehnquist. 108Veja Sony v. Universal, nota supra Alargaria o escopo do monopólio estatutário dos requeridos para englobar controle sobre um artigo do comércio que não é sujeito à proteção do copyright. Tal expansão do privilégio de copyright está além dos limites das garantias autorizadas pelo Congresso [tradução nossa] 109Veja Sony v. Universal, nota supra O escopo limitado do monopólio estatutário do detentor de copyright, como a duração limitada do copyright requerida pela Constituição, reflete um equilíbrio de reivindicações concorrentes sobre o interesse público: Trabalhos criativos devem ser [464 U.S. 417, 432] encorajados e recompensados, mas a motivação privada deve definitivamente servir a causa de promover grande disponibilidade pública de literatura, música, e outras artes. O efeito imediato da nossa lei de Sobre a responsabilidade secundária, embora se tenha reconhecido que a Sony teria conhecimento construtivo de que os consumidores poderiam usar o VTR para infração, isto isoladamente não configura elemento suficiente para a responsabilização. Observou­se que a empresa não contribuía materialmente para as possíveis infrações nem dispunha de meios de controlar as atividades dos usuários, uma vez que seu único contato com os consumidores dava­se no momento da venda do produto. Ficou demonstrado igualmente que a Sony não obtinha vantagens financeiras com as infrações como argumentavam os estúdios de cinema, já que a maior parte dos usuários dos VCRs utilizava o aparelho para time­shifting de programas de televisão, prática considerada lícita. Assim, o mercado dos videocassetes não dependia da infração para existir ou crescer. Com relação à alegação de prejuízos, entendeu­se que a Universal não conseguiu provar danos materiais ou redução de mercado e que as cópias de suas obras feitas por usuários de VCRs representavam apenas uma pequena porção do uso total dos aparelhos. Dessa forma, a Suprema Corte dos Estados Unidos não atendeu à Universal em nenhum de seus pedidos, criando um precedente a favor da inovação tecnológica que beneficiou a sociedade de uma forma geral, já que o VCR, ainda que possa ser usado para a produção de cópias ilegais de obras audiovisuais, também pode ser utilizado para as mais variadas atividades legítimas, incluindo a edição de filmagens amadoras e produções do cinema independente, ou seja, fomento de novas criações artísticas. Cumpre ressaltar que na redação original da opinião da Suprema Corte, ainda que se mencione também como condição a ampla utilização legítima, é dito expressamente que a mera capacidade de o produto em questão poder ser usado para usos lícitos já exclui a responsabilidade contributiva do fabricante, como se observa claramente em excerto da opinião escrita por Stevens: “The sale of copying equipment, like the sale of other articles of commerce, does not constitute contributory infringement if the product is widely used for legitimate, unobjectionable purposes, or, indeed, is merely capable of substantial noninfringing uses”110 [grifos nossos] É imprescindível a ênfase a este excerto, âmago do precedente do Caso Betamax: o afastamento de responsabilidade contributiva pela existência – frise­se, mera capacidade – de uso lícito. Justamente nesse ponto existem fortes divergências entre os juristas estadunidenses, que não chegam a concordar se a condição fundamental para não haver responsabilização é a mera existência ou potencial uso lícito ou se há necessidade de os usos lícitos constituírem maioria dentre os observados, superando os considerados infração de copyright. No entanto, a leitura deste excerto parece sinalizar que a capacidade de utilização lícita por si já é razão suficiente para o afastamento de responsabilidade contributiva. 4.7. CONCLUSÃO DO CASO BETAMAX Muitos utensílios comercializados atualmente são capazes de usos que eventualmente violam copyright é assegurar uma recompensa justa para o trabalho criativo de um 'autor'. Mas o objetivo final é, por esse incentivo, estimular a criatividade artística para o bem do público geral. 'O único interesse dos Estados Unidos e o objeto primário em se conferir o monopólio, 'esta Corte afirmou, 'estão nos benefícios gerais obtidos pelo público a partir dos trabalhos dos autores.' Fox Film Corp. v. Doyal, 286 U.S. 123, 127. Ver Kendall v. Winsor, 21 How. 322, 327­328; Grant v. Raymond, 6 Pet. 218, 241­242. Quando a mudança tecnológica tornou seus termos ambíguos, o Copyright Act deve ser interpretado à luz desta proposta básica.' Twentieth Century Music Corp. v. Aiken, 422 U.S. 151, 156 (1975) [notas de rodapé suprimidas, grifos nossos, tradução nossa] 110Veja Sony v. Universal, nota supra A venda de equipamento para cópia, como a venda de outros artigos do comércio, não constitui infração contributiva se o produto é amplamente usado para propósitos incontestavelmente legítimos, ou, de fato, é meramente capaz de usos lícitos substanciais. [grifos nossos, tradução nossa] não apenas leis de direitos autorais, mas muitas outras. Entretanto, a sociedade teria enormes prejuízos se todos esses produtos tivessem venda proibida em virtude da possibilidade do mau uso. A doutrina da responsabilidade secundária é muito importante para prevenir (ou atribuir sanção) a infratores indiretos, que podem obter vantagens possibilitando a terceiros meios de infringir copyright. Contudo, sua aplicação deve ser sempre ponderada pela avaliação dos usos legítimos ou potencial de uso legítimo, sem o que poderiam ocorrer excessos indesejados e perigosos. É evidente que a cópia integral de filmes e obras audiovisuais para a formação de videotecas caseiras constitui infração direta, mas não se pode em virtude disto cercear a liberdade de utilização legítima do VCR ou de qualquer outro produto, sob pena de transformar a proteção à criatividade que os direitos autorais procuram oferecer em barreiras intransponíveis à inovação tecnológica, artística e cultural. 5. O CASO A&M RECORDS V. NAPSTER No final da década de noventa, um garoto chamado Shawn Fanning criou um programa de computador revolucionário. Baseadas em arquiteturas ultrapassadas da internet, as redes de troca de arquivos peer­to­peer pareceram a Fanning o instrumento perfeito para o compartilhamento de música digital, favorecido pela recém popularização do formato MP3. O programa criado por Fanning chamava­se Napster. Não era uma rede peer­to­peer pura, nem foi o primeiro software de troca de arquivos com suas características. No entanto, o Napster foi sem dúvida aquele que alcançou maior sucesso na época e o responsável por uma transformação comportamental em milhares de adolescentes pelo mundo todo. Nascia a febre do compartilhamento de música pela internet. O sucesso do Napster foi tão estrondoso que não tardou para chamar a atenção da indústria fonográfica, surpreendida por uma nova forma de “pirataria” em larga escala, praticada não por comerciantes ou traficantes, mas por jovens de classe média e alta, seu maior público alvo. A indústria fonográfica entendeu então como sua maior ameaça um punhado de garotos aficcionados por computador, que contagiariam toda uma geração com todas possibilidades de comunicação, aprendizado e relacionamento da nova sociedade da informação, sem fronteiras e engajada na pirataria. A ameaça do Napster (assim como ainda hoje de muitos programas p2p de troca de músicas online) era que, para cada novo usuário conquistado, o volume do acervo virtual de músicas de sua rede aumentava. Para cada download realizado, este número aumentava também. A genialidade do Napster e de seus sucessores era que para cada grupo de novos usuários que entravam na rede procurando músicas, mais fácil seria encontrá­las, e quanto mais arquivos fossem baixados, mais arquivos disponíveis haveria. Assim, o Napster compartilhava arquivos como se fossem idéias111. Quando um usuário permitia que outra pessoa baixasse um de seus arquivos, não perdia nada, embora alguém, em algum outro canto do planeta, tivesse obtido um arquivo de música sem nenhum custo. Por conseqüência, na análise inocente do público de usuários, o Napster não faria mal a ninguém, e daria acesso gratuito a uma infinidade de arquivos de música de praticamente todos os gêneros existentes. Sempre que um download era feito, o arquivo resultante era gravado justamente na pasta 111 “He who receives an idea from me, receives instruction himself without lessening mine; as he who lights his taper at mine, receives light without darkening me”. Jefferson, Thomas. Carta a Isaac McPherson, 13 de agosto de 1813, disponível em http://press­pubs.uchicago.edu/founders/documents/a1_8_8s12.html (acessado em 31/08/06) Aquele que recebe de mim uma idéia, recebe instrução sem diminuir a minha; como aquele que acende sua vela na minha, recebe luz sem me escurecer [tradução nossa] compartilhada do usuário, aquela cujos arquivos ficariam disponíveis para que outros usuários pudessem acessar e baixar. Quanto mais músicas alguém obtivesse, mais arquivos poderia disponibilizar a outras pessoas, a não ser que fosse modificada a configuração do software. Por conseqüência, a tendência dessa poderosa rede era sempre crescer, tornar­se maior e mais eficiente quanto mais adeptos conquistasse. Talvez uma outra razão porque o Napster se tornou tão popular foi o fato de que por meio dele alguém poderia obter suas músicas prediletas sem a necessidade de comprar álbuns completos, contendo diversas músicas pelas quais não se interessaria em comprar. O Napster permitia então adquirir apenas as músicas desejadas, sem ter que pagar caro por álbuns inteiros cheios de músicas ruins. Além disso, o programa representava uma das poucas formas de obter obras raras, que não seriam facilmente encontradas à venda nas prateleiras das lojas, trabalhos que já não eram mais distribuídos comercialmente ou que não estavam disponíveis no mercado de determinados países. Muitas bandas e artistas tornaram­se conhecidos em países onde nunca havia sido feita divulgação de seus trabalhos, graças ao compartilhamento de suas músicas via internet. Em última análise, como recurso de compartilhamento de informação, cultura e conhecimento, uma ferramenta maravilhosa, revolucionária. Como meio de espalhar de forma ilícita conteúdo protegido ou impróprio, por outro lado, uma forte ameaça. Pela facilidade da disseminação de qualquer tipo informação posta nessas redes, tanto poderiam ser compartilhadas licitamente gravações caseiras de bandas de garagem quanto obras com copyright, tanto trabalhos em domínio público quanto os últimos hits de artistas famosos. Alguns artistas já estavam em conflito com os responsáveis pelo programa exatamente por conta da distribuição não autorizada de suas obras – muitas vezes disponibilizadas no Napster antes mesmo do lançamento comercial – como a banda Metallica, o rapper Dr. Dre e até mesmo a cantora Madonna, quando um grupo de gravadoras lideradas pela A&M Records processou o Napster. Contudo, internautas pelo mundo inteiro já haviam se engajado na prática do compartilhamento e não abririam mão desta nova ferramenta. Surgiram outros programas equivalentes, que sofreriam perseguições semelhantes, sendo ciclicamente descobertos pelo público, depois pela indústria fonográfica e então caçados e fechados enquanto apareceriam já outros similares na net que logo seriam também descobertos pelo público. No entanto, nenhum desses programas teve o mesmo impacto que o Napster, que modificou o comportamento e a mentalidade das pessoas, a forma como música, filmes e outros conteúdos podem ser distribuídos e, por que não, abriu uma nova perspectiva de mercado para a música, ainda não totalmente aproveitada pela indústria fonográfica, que prefere envolver­se em custosas guerras sem chances de vitória a encontrar alternativas lucrativas para lidar com o fato112. Ironicamente, assim foi também há quase trinta anos a batalha dos estúdios de cinema contra a “terrível ameaça tecnológica” dos videocassetes no Caso Betamax. Contudo, graças à sensatez da Suprema Corte dos Estados Unidos na época, o referido conflito converteu­se num precedente histórico sinônimo de equilíbrio, necessário à convivência harmoniosa entre copyright e tecnologia, o que infelizmente não aconteceu com o Caso Napster e seus sucessores, que ainda geram insegurança dentre as novas tecnologias. Porque o Caso Betamax proporcionou equilíbrio, a indústria cinematográfica pôde encontrar no comércio dos novos meios físicos de armazenamento – fitas de vídeo e posteriormente DVDs – um mercado próspero, atualmente responsável boa parte do seu faturamento113, precedente este que se revelou terreno 112 Iniciativas como por exemplo o iTunes Music Store, da Apple http://www.apple.com/itunes, uma loja virtual de música digital que faz bastante sucesso apesar da concorrência com milhares de músicas protegidas ilegalmente disponíveis para download gratuito na internet. 113 Estatísticas da Motion Picture Association of America, 2005, apud Oberholzer­Gee, Felix e Strumpf, Koleman. The Effect muito fértil para a feliz aliança entre o desenvolvimento tecnológico e a indústria do entretenimento, até o dia em que um jovem chamado Shawn Fanning criou um programa de computador revolucionário... 5.1. ANÁLISE DO CASO “Plaintiffs are engaged in commercial recording, distribution and sale of copyrighted musical compositions and sound recordings. The complaint alleges that Napster, Inc. (“Napster”) is a contributory and vicarious copyright infringer.”114 O primeiro grande caso envolvendo copyright e compartilhamento de MP3 peer­to­peer iniciou em dezembro de 1999, quando as gravadoras A&M Records Inc., Geffen Records Inc., Interscope Records, Sony Music Entertainment Inc., MCA Records Inc., Atlantic Recording Corp., Island Records Inc., Motown Record Co., Capitol Records Inc., La Face Records, BMG Music, Universal Records Inc., Elektra Entertainment Group Inc., Arista Records Inc., Sire Records Group Inc., Polygram Records Inc., Virgin Records America Inc. e Warner Bros. Records Inc. entraram com um processo contra os responsáveis pelo Napster na Corte do Distrito Norte da Califórnia, alegando que o programa permitia e encorajava o compartilhamento de milhões de suas músicas protegidas por copyright. Em primeira instância, prevaleceram quase integralmente os argumentos das requerentes, tendo sido decidido que a atividade de compartilhar músicas protegidas pela internet constituía verdadeiramente infração de copyright e que era aplicável ao Napster, conforme pleiteado, tanto responsabilidade contributiva quanto vicária, tendo o caso merecido uma injunção preliminar, da qual o requerido apelou. Na Corte de Apelações do Nono Circuito, não obteve mais sucesso o Napster, pois pouco diferiu a opinião de segunda instância da proferida na Corte Distrital, ainda que a decisão apelada tenha sido revertida em parte. Considerando igualmente que o compartilhamento de arquivos correspondentes à obras protegidas constitui violação de direitos autorais, que o Napster era responsável vicária e contributivamente por estas infrações e que o prejuízo para o mercado das obras das requerentes seria muito grande, a Corte de Apelações do Nono Circuito manteve a concessão de injunção, com algumas modificações. Sem condições de operar de forma economicamente viável e após ter fechado completamente sua rede para cumprir a injunção, o Napster faliu em 2002 e foi comprado pela empresa Roxio, que transformou­o num serviço lícito de distribuição de música digital por meio de subscrições115. 5.2. ARGUMENTAÇÃO DA INDÚSTRIA FONOGRÁFICA As gravadoras que compunham o pólo ativo do processo, lideradas pela A&M Records, argumentavam que havia no sistema do Napster milhares de suas músicas protegidas sendo distribuídas sem autorização, a despeito de seus direitos exclusivos de reprodução e distribuição sobre estas obras. Havia casos de músicas que sequer foram lançadas no mercado e já circulavam pela rede, incluindo álbuns inteiros liberados apenas para crítica pré­lançamento. of File Sharing on Record Sales: An Empirical Analysis, disponível em http://www.ftc.gov/bcp/workshops/filesharing/presentations/strumpf.pdf (acessado em 27/07/06) 114 A&M Records v. Napster, Inc., 239 F.3d 1004 (9th Cir. 2001) (No. 00­16401/403) Os requerentes são engajados na gravação comercial, distribuição e venda de composições musicais e fonogramas protegidos por copyright. A denúncia alega que Napster, Inc. (“Napster”) é um infrator de copyright contributivo e vicário. [tradução nossa] 115 “Novo” Napster http://www.napster.com/ “According to statistical analyses filed with the Court, essentially every single Napster user sampled was engaged in some copyright infringement while using the Napster service and the overwhelming majority of songs actually copied and downloaded on Napster, over 87% (and likely much more) are infringing.”116 Alegavam que o Napster, por facilitar e encorajar as infrações de seus usuários, deveria ser responsabilizado vicária e contributivamente e reivindicavam também uma injunção preliminar para fazer cessarem tais infrações. Argumentavam que essas violações massivas de copyright prejudicavam o mercado de suas obras e trariam enormes prejuízos para si e para os artistas que representavam, que a pirataria eletrônica deveria ser parada antes que finalmente destruísse a indústria fonográfica. Declarações de representantes da RIAA atribuíam ao compartilhamento de MP3 todas quedas de vendas de CDs experimentadas à época, já que o maior público alvo destes produtos eram justamente adolescentes, estudantes de classe média e alta: os próprios usuários do Napster engajados na pirataria. As gravadoras também se utilizavam de pesquisas feitas entre usuários do Napster para tentar comprovar que o hábito de baixar arquivos de música pela internet faria as pessoas comprarem menos CDs, demonstrando que as quedas de vendas teriam sido causadas pela substituição da compra pelo download, e que isso representava prejuízos de tal monta que ameaçavam a viabilidade econômica da atividade. As pesquisas mencionadas foram conduzidas por diferentes especialistas. O Jay Report baseou­ se na pesquisa realizada pela especialista E. Deborah Jay, presidente da Field Research Corporation, com uma amostra de 2.555 estudantes universitários com acesso à internet, para descobrir porque utilizavam o Napster e qual o impacto de sua utilização nas vendas de CDs. Concluiu que havia uma correlação entre os downloads de arquivos MP3 e as quedas de vendas: "The more songs Napster users have downloaded, the more apt they are to say explicitly or suggest that Napster has reduced their music purchases”.117 Outra das pesquisas apresentadas, o Fine Report, conduzida por Michel Fine da Soundscan e também realizada entre universitários, verificou uma queda de vendas de CDs em locais próximos às universidades, que atribuiu à utilização do programa pelos estudantes: “Data strongly suggests that on­line file sharing has resulted in a loss of album sales within the college markets…sales at stores near colleges and universities have declined significantly," said Fine through a statement issued to the court. "Music file sharing and Napster usage appear to have created a significant and detrimental impact on retail music sales."118 Uma terceira pesquisa realizada por David J. Teece, professor da Berkeley University, conhecida como Teece Report, verificou principalmente se as atividades do Napster prejudicavam os negócios das requerentes, concluindo que o programa prejudicaria até mesmo negócios futuros das gravadoras 116 Music Industry Files Motion for Preliminary Injunction Against Napster, Study Finds Napster a Haven for Music Piracy and Hurts CD Sales. Recording Industry Association of America Press Room, 12 de junho de 2000. disponível em http://www.riaa.com/news/newsletter/press2000/061200.asp (acessado em 31/07/06) De acordo com análises estatísticas apresentadas à Corte, essencialmente cada um dos usuários do Napster da amostra estava engajado em alguma infração de copyright enquanto usando o serviço do Napster e a maioria esmagadora das músicas realmente copiadas e baixadas no Napster, mais de 87% (e provavelmente muito mais) são ilícitas. [tradução nossa] 117 Veja Music Industry Files Motion for Preliminary Injunction Against Napster, nota supra. Quanto mais músicas os usuários do Napster baixam, mais aptos eles estão para dizer explicitamente ou sugerir que o Napster reduziu suas compras de música [tradução nossa] 118 Veja Music Industry Files Motion for Preliminary Injunction Against Napster, nota supra. “Os dados sugerem fortemente que o compartilhamento de arquivos on­line resultou numa queda na venda de álbuns nos mercados universitários...vendas em lojas próximas a faculdades e universidades caíram significativamente,” disse Fine em uma declaração para a corte. “O compartilhamento de música e o uso do Napster parece ter criado um impacto significante e prejudicial nas vendas de varejo de música”. [tradução nossa] (distribuição de música em meio eletrônico). “The district court cited the Teece Report to show the harm Napster use caused in raising barriers to plaintiffs' entry into the market for digital downloading of music”.119 Estes relatórios pesaram bastante para a concessão de injunção preliminar120, porque demonstravam prejuízo real, presente e futuro para a indústria fonográfica em virtude do uso do Napster, e reforçavam os argumentos das requerentes. Quanto à imposição de responsabilidade contributiva, a argumentação era de que o Napster tinha conhecimento das infrações – se não pelas características de seu sistema, que baseava­se numa lista de músicas disponíveis armazenada em servidores centrais, ao menos através das notificações apresentadas pela RIAA, com alguns milhares de títulos das obras protegidas compartilhadas – e contribuía materialmente para que ocorressem, porque ciente de que seu sistema permitia infração de copyright e de que as infrações efetivamente estavam ocorrendo, não procurou impedir que arquivos protegidos fossem compartilhados. As gravadoras afirmavam também que demonstraria conhecimento real uma declaração de Sean Parker, colega de Fanning e co­fundador do Napster, que expressava a necessidade de não se conhecer os nomes reais e números IP dos usuários, uma vez que estariam compartilhando música “pirateada”, e um screenshot121 disponibilizado pela equipe do Napster que continha nomes de músicas com copyright. Já a responsabilização vicária, seria cabível uma vez que o Napster detinha o poder de impedir que as infrações ocorressem, right and ability to control – tanto pelo cancelamento das contas de acesso ao sistema pertencentes aos usuários infratores quanto pela filtragem dos arquivos protegidos de suas listas nos servidores centrais – e sobretudo porque percebia vantagens financeiras pelas infrações. Ainda que se não cobrasse pela distribuição das músicas, a “vantagem financeira” é verificada também se o mercado para o serviço em questão está fundado sobre a possibilidade de infração, ou seja, o serviço atrai usuários interessados em obter conteúdos protegidos por copyright. Considerando que quanto mais usuários houvesse no sistema melhor seria o seu desempenho e maior o acervo musical disponível, argumentavam as gravadoras, seria fácil concluir que o Napster obtinha vantagem pelo compartilhamento ilícito de músicas protegidas, de forma que restava demonstrada a responsabilidade vicária do requerido. 5.3. A ARGUMENTAÇÃO DO NAPSTER Respondendo as acusações em juízo, o Napster alegou principalmente que, primeiro, seus usuários não estavam infringindo a legislação de copyright, mas fazendo uso legítimo de material protegido – fair use –, dentro das limitações do copyright. Afirmou também, contudo, que caso isso fosse considerado infração, não poderia ser responsabilizado secundariamente porque não tinha nem conhecimento do que era efetivamente trocado em sua rede nem meios de impedir ou controlar as infrações. Alegou também que estaria protegido de responsabilidade secundária por alguns dispositivos do Digital Millennium Copyright Act, e apresentou uma pesquisa, à semelhança do que fizeram as requerentes, a respeito do impacto dos downloads de MP3 no mercado da música, concluindo haver efeito positivo para as vendas, ao contrário do resultado das outras pesquisas apresentadas. 119 Veja A&M Records v. Napster, Inc., nota supra. A corte distrital citou o Teece Report para mostrar o prejuízo que o uso do Napster causou criando barreiras para a entrada das requerentes no mercado de download digital de música [tradução nossa]. 120 Para a concessão de injunção preliminar, é preciso demonstrar grande possibilidade de que as acusações prevalecerão. 121 Imagem correspondente a uma “foto” do monitor, mostrando telas dos programas em execução. A argumentação de fair use do Napster estava fundada sobre a idéia de que os três principais usos do programa seriam legítimos. Tais usos eram seriam o sampling, space­shifting e permissive distribution. O sampling, ou amostragem, era a prática de baixar músicas usando o Napster antes de comprar os discos correspondentes. Os usuários engajados na prática do sampling faziam o download de músicas para conhecê­las e descobrir se realmente estavam dispostos a comprar os CDs. Os downloads funcionariam então como amostras grátis da músicas que os usuários comprariam mais tarde. Já o space­shifting (mudança ou troca de espaço) fazia alusão ao Caso Diamond122 e ao Caso Betamax. O primeiro utilizou­se da mesma expressão para definir o uso dos arquivos de música digital no MP3 player portátil Rio, uma vez que as cópias feitas no aparelho tinham o objetivo único de tornar portáteis os arquivos de música que o usuário do Rio já possuía. Nesse caso, numa analogia com o time­ shifting do Caso Betamax, o usuário tinha acesso de forma diferente a algo que já teria acesso normalmente. Para o Napster, o argumento do space­shifting poderia ser empregado porque dentre os hábitos de seus usuários estaria também fazer downloads de arquivos correspondentes à músicas que já possuíssem em CD. O último argumento de fair use do Napster, permissive distribution, refere­se aos downloads de trabalhos que os artistas desejavam realmente compartilhar pela internet, de forma que não haveria disputas de copyright. Permissive distribution aplicava­se a músicas de bandas novas ou independentes ou mesmo de artistas já estabelecidos que desejavam disponibilizar algumas de suas músicas dessa forma. No tocante à responsabilidade secundária, se consideradas como infração as atitudes de seus usuários, o Napster argumentava que as transferências de arquivos davam­se diretamente entre os usuários, de forma que os responsáveis pelo programa não tinham acesso ao conteúdo dos arquivos trocados. A única participação do programa no compartilhamento dos MP3 era prover as buscas. Dessa forma, o Napster invocou o precedente do Caso Betamax, em que não foi aplicada a teoria da responsabilidade contributiva à Sony porque, ainda que não tivesse sido reconhecido fair use nas atividades dos consumidores, o VCR possuía usos lícitos substanciais, encaixando­se no conceito de staple article of commerce e o conhecimento construtivo (presumido) de que o aparelho poderia ser usado para infração de copyright não era suficiente para aplicação da responsabilidade contributiva por si. Assim, alegando ter o programa usos lícitos (já que nem todos os MP3 trocados eram protegidos por copyright) e que os responsáveis por sua operação não tinham conhecimento do que era trocado entre os usuários, o Napster esperava defender­se da aplicação de responsabilidade secundária. A referida pesquisa de comportamento apresentada em juízo pelo Napster, o Fader Report, realizada pelo especialista Peter S. Fader, constatou haver benefício para o mercado de música pela utilização do programa, que estimularia as vendas de CDs ao contrário de prejudicar. Com relação as pesquisas apresentadas pelas gravadoras, fez objeção ao Teece Report, que não tinha sido submetido a peer review, e ao Fine Report, que apresentava problemas de metodologia reconhecidos mesmo pela Corte Distrital, que contudo não excluiu as pesquisas do processo. O Napster apresentou também dois argumentos que poderiam ter impedido a concessão de injunção, alegando que dois estatutos afastariam sua responsabilidade. O primeiro foi que as atividades de seus usuários estariam protegidas por um dispositivo do Audio Home Recording Act, a saber: “No action may be brought under this title alleging infringement of copyright based on the manufacture, importation, or distribution of a digital audio recording device, a digital audio recording medium, an analog recording device, or an analog recording medium, or based on the noncommercial use 122 Recording Industry Association of America v. Diamond Multimedia, 180 F. 3d 1072 (9th Cir. 1999) by a consumer of such a device or medium for making digital musical recordings or analog musical recordings”123 [grifos nossos] A partir do referido excerto do AHRA, o Napster alegava que o compartilhamento de MP3 seria uma forma de uso não comercial de dispositivo de gravação digital e que as cópias obtidas estariam protegidas pelo Audio Home Recording Act. O segundo estatuto invocado foi o DMCA, mais especificamente o Online Copyright Infringement Liability Limitation Act, que limita a responsabilidade de provedores de internet pelas infrações de seus usuários. Como o estatuto menciona Internet Services Providers (ISPs), o Napster alegava estar protegido por esse dispositivo, considerando­se, assim, um provedor de serviços segundo o DMCA. Continuou sua defesa alegando que mesmo se fosse considerado responsável secundariamente por infrações de copyright, restariam mais três argumentos a seu favor: renúncia de direitos (waiver), licença implícita, e copyright misuse (abuso de copyright). Waiver é uma renúncia a direitos de copyright, que pode ser feita expressamente pelo detentor de direitos. O Napster alegou que ao liberar arquivos MP3 de suas obras protegidas, a indústria fonográfica teria renunciado a seus direitos sobre tais arquivos. O argumento da licença implícita, em sobreposição ao dito acima, foi usado para afirmar que ao liberar arquivos MP3 de suas obras, a indústria fonográfica estaria oferecendo uma licença implícita para a utilização desses arquivos. Contudo, “licenças implícitas” são restritas a casos muito específicos, e dificilmente este argumento alcança sucesso nas cortes. O misuse, por outro lado, diz respeito a possíveis excessos cometidos pelo detentor do copyright. O Napster argumentou então que a distribuição de obras online não estaria expressamente assegurada pelo copyright, e seria excesso estabelecer um privilégio de distribuição não garantido pela legislação ou pelo Copyright Office124. Por último, o Napster pediu que, caso todos esse argumentos fossem desconsiderados, que fosse estabelecida uma licença compulsória para sua atividade, paga para manter o serviço de troca de arquivos funcionando e provendo justa compensação aos detentores de copyrights. Dessa forma, não haveria mais nem o problema da ilicitude nem a falta de recompensa aos artistas pelo seu trabalho. 5.4. AS DECISÕES DA CORTE DO DISTRITO NORTE DA CALIFÓRNIA E DA CORTE DE APELAÇÕES DO NONO CIRCUITO Como ambas as decisões – a da Corte Distrital e a da Corte de Apelações – foram muito semelhantes, serão analisadas em conjunto, sem o que este estudo tornar­se­ia demasiado repetitivo. A decisão de primeira instância foi quase que totalmente desfavorável ao Napster, tendo reforçado os argumentos das gravadoras requerentes. Afirmou que os usuários do programa desrespeitavam pelo menos duas prerrogativas garantidas por lei aos detentores de copyright: monopólio de reprodução125 e de distribuição126 das obras protegidas, com o que a Corte de Apelações concordou sem objeção. Isto porque 123 17 U.S.C. § 1008. Prohibition on certain infringement actions Nenhuma ação será proposta sob este título alegando infração de copyright baseada na fabricação, importação, ou distribuição de um dispositivo de gravação digital, um meio de gravação digital, um dispositivo de gravação analógico, ou um meio de gravação analógico, ou baseado no uso não comercial de um consumidor de tal dispositivo ou meio para a confecção de gravações musicais digitais ou gravações musicais analógicas [grifos nossos, tradução nossa] 124 Veja Lasercomb, Am., Inc. v. Reynolds, 911 F. 2d 970, 977­79 (4th Circ. 1990) 125 17 U.S.C. § 106(1). Exclusive rights in copyrighted works, reproduction 126 17 U.S.C. § 106(3). Exclusive rights in copyrighted works, distribution pelo download eram obtidas cópias ilícitas das músicas e pelo upload colocadas à disposição do público, sem autorização, obras protegidas por copyright. As duas cortes rejeitaram todos os argumentos do Napster quanto à possibilidade de os três usos explicados em sua defesa constituírem fair use, exceto o argumento da distribuição consentida (permissive distribution) de trabalhos de artistas novos ou independentes, sobre o qual nem as gravadoras nem os dois juízos se manifestaram. Sobre a prática do sampling, a Corte do Distrito norte da Califórnia observou que tal hábito não constitui uso legítimo, uma vez que as gravadoras costumam receber royalties mesmo pelos samples disponíveis gratuitamente em alguns websites e que os downloads gratuitos oferecidos normalmente são pequenos trechos de músicas, de trinta a sessenta segundos ou trabalhos completos com programação para se auto apagarem num dado tempo. Nesta questão, entendeu­se que “sampling remains a commercial use even if some users eventually purchase the music”.127 Sobre space­shifting, por outro lado, ficou reconhecido que nem o Caso Diamond nem o Caso Betamax seriam auxílio para o Napster, já que em nenhum dos dois havia compartilhamento de obras protegidas. A questão do space­shifting até poderia ter sido aceita, caso a transferência das músicas para a base de dados do programa não implicasse compartilhamento: “Both Diamond and Sony are inapposite because the methods in these cases did not also simultaneously involve distribution of the copyrighted material to the general public; the time or space­ shifting of copyrighted material exposed the material only to the original user”128 Ambas as cortes procederam a uma análise cuidadosa dos quatro requisitos para o reconhecimento de uso legítimo: propósito da utilização, natureza da obra, porção utilizada e efeitos no mercado. Quanto ao propósito ou caráter da utilização, chegou­se à conclusão de que o uso feito das músicas era comercial, observando­se que não é preciso haver benefício econômico direto que isto ocorra e que os usuários do Napster obtinham de graça algo pelo que deveriam pagar: “commercial use is demonstrated by showing that repeated and exploitative unauthorized copies of copyrighted works were made to save the expense of purchasing authorized copies”.129 Como seria razoável supor, o uso comercial dos trabalhos protegidos não contribui para a constatação de fair use. Quanto à natureza da obra, a Corte Distrital observou que, por serem as obras utilizadas de natureza artística, e portanto mais intimamente ligadas à proteção do copyright, este elemento também não favorece o argumento de fair use, ao que a Corte de Apelações não discordou. A porção utilizada das obras em questão também não indicou uma tendência de uso legítimo, já que os arquivos copiados a partir do Napster normalmente correspondiam a músicas inteiras. Embora seja possível demonstrar uso legítimo de obras completas, essa circunstância é bastante negativa neste caso. Por fim, a análise de impacto do uso no mercado, um dos elementos mais importantes para a configuração de uso legítimo. Nisto, pesaram bastante as pesquisas apresentadas pelas partes, especialmente o Jay Report e o Teece Report, que concluíram que a atividade do Napster prejudicava as vendas de CDs e 127 A&M Records v. Napster, Inc., 114 F. Supp. 2d 896 (ND Cal. 2000) Sampling continua um uso comercial mesmo que alguns usuários eventualmente comprem a música [tradução nossa] 128 Veja A&M Records v. Napster, Inc., nota supra. Ambos Diamond e Sony são inapropriados porque os métodos de mudança nesses casos não envolvem também distribuição simultaneamente do material com copyright para o público geral; a mudança de tempo ou espaço do material protegido expõe o material apenas ao usuário original [tradução nossa] 129 Veja A&M Records v. Napster, Inc., nota supra; e Worldwide Church of God v. Philadelphia Church of God, 227 F. 3d 1110 (9th Cir. 2000) O uso comercial é demonstrado mostrando­se que repetidas e exploratórias cópias de trabalhos com copyright foram feitas para economizar o gasto com a compra de cópias autorizadas [tradução nossa] obstava um futuro mercado de música digital pela internet. Em conseqüência destes fatores, ambas as cortes rejeitaram integralmente os argumentos de fair use apresentados pelo Napster, ficando certo que o compartilhamento de MP3 através de seu sistema constituía infração pela qual poderia ser responsabilizado. Acerca da responsabilização secundária, ambas as cortes condenaram o Napster como infrator contributivo e vicário. Na questão da responsabilidade contributiva, embora tenham concordado no resultado, houve divergência sobretudo na apreciação da defesa relativa ao Caso Betamax e sobre o grau de conhecimento que os responsáveis pelo programa teriam das infrações em seu sistema. A Corte do Distrito Norte da Califórnia considerou que o Napster tinha tanto conhecimento construtivo quanto real das infrações. Conhecimento real porque veio à juízo um documento em que Sean Parker afirmava que os usuários estariam trocando material protegido e porque a RIAA enviou anteriormente notícias de que havia mais de 12 mil trabalhos protegidos sendo trocados através do programa. O conhecimento construtivo, por outro lado, poderia ser presumido porque os executivos do Napster possuíam experiência na indústria fonográfica e na aplicação de direitos da propriedade intelectual, porque estes mesmo executivos chegaram a obter pelo sistema obras protegidas e porque havia no site do programa um screenshot em que apareciam nomes de músicas com copyright. Quanto à defesa pelo precedente do Caso Betamax, a Corte Distrital não encontrou evidências de usos lícitos para o Napster, no que a Corte de Apelações discordou completamente. “We depart from the reasoning of the district court that Napster failed to demonstrate that its system is capable of commercially significant noninfringing uses (...) The district court improperly confined the use analysis to current uses, ignoring the system capabilities (...) Consequently, the district court placed undue weight on the proportion of current infringing use as compared to current and future noninfringing use”130 [grifos nossos] Ainda discordando da Corte Distrital, a Corte de Apelações entendeu que o conhecimento construtivo apenas, quando se lida com situações envolvendo a internet, não é suficiente para a aplicação de responsabilidade contributiva: “in an online context, evidence of actual knowledge of specific acts of infringement is required to hold a computer system operator liable for contributory copyright infringement”.131 Sob este ponto de vista, somente o conhecimento real de infrações específicas poderia condenar o Napster à responsabilidade contributiva. Contudo, as notificações da RIAA acerca do conteúdo protegido disponível através do programa foram suficientes para se comprovar conhecimento real de que havia conteúdo ilegal (e qual seria) sendo trocado pelo sistema, não sendo aplicável, então, o precedente do Caso Betamax, ainda que houvesse usos lícitos para o programa. Concordando com a Corte Distrital, a Corte de Apelações concluiu também que o Napster contribuiu materialmente para as violações de copyright, porque seu sistema efetivamente provê meios (site 130 Veja A&M Records v. Napster, Inc., nota supra; e Vault Corp. v. Quaid Software Ltd., 847 F. 2d 255, 264­67 (5th Cir. 1997) – “single noninfringing use implicated Sony”, um único uso lícito implicou Sony [tradução nossa] Nós divergimos do raciocínio da corte distrital de que o Napster falhou em demonstrar que seu sistema é capaz de usos lícitos comercialmente significantes (...) A corte distrital confinou impropriamente a análise de usos aos usos atuais, ignorando as capacidades do sistema (...) Conseqüentemente, a corte distrital colocou peso inadequado na proporção de usos ilícitos atuais como comparados a usos lícitos atuais e futuros [notas de rodapé suprimidas, grifos e tradução nossos] 131 Veja A&M Records v. Napster, Inc., nota supra; e Religious Technology Center v. Netcom On­Line Communication Services, Inc, 907 F. Supp at 1371 em um contexto online, evidência de conhecimento real de atos específicos de infração é necessária para considerar um operador de sistema responsável por infração contributiva de copyright [tradução nossa] and facilities) para a prática das infrações e, tendo conhecimento real do conteúdo ilegal distribuído em sua rede, os responsáveis pelo programa não obtiveram sucesso em filtrar de sua lista central os nomes de arquivos “piratas”, na medida em que tinha conhecimento real desses arquivos. Concluiu­se assim que o Napster era contributivamente responsável pelas infrações de copyright de seus usuários. Sobre a responsabilidade vicária, ambas as cortes concordaram no fato de aplicá­la ao Napster, por dois motivos. Primeiro porque o programa tinha possibilidade de controlar as atividades dos usuários (right and ability to control) através do cancelamento de contas – como se poderia verificar nas advertências feitas em seu website de reserva do direito de cancelar contas de usuários cuja conduta violasse a legislação aplicável – e da filtragem de arquivos ilegais das listas de seus servidores centrais. “To escape imposition of vicarious liability, the reserved right to police must be exercised to its fullest extent. Turning a blind eye to detectable acts of infringement for the sake of profit gives rise to liability”132 Segundo porque o Napster obtinha benefícios financeiros a partir das infrações, segundo a visão de que atraía adeptos pela possibilidade da obtenção ilícita de material protegido. Sua clientela estava baseada então justamente na facilidade de infração. Além disso, quanto mais usuários disponibilizassem trabalhos protegidos por seu sistema, mais eficiente ficariam as buscas de outros usuários e maior o acervo de músicas disponíveis. Por isso, ambas as cortes entenderam que o programa se beneficiava diretamente da infração de seus usuários. Reunidos os requisitos para a imposição de responsabilidade vicária, as duas cortes concordaram na responsabilização do programa. Passando em seguida à alegação de que o download de arquivos estaria protegido pelo Audio Home Recording Act, as duas cortes concordam também em rejeitar este argumento em virtude de os computadores estarem expressamente excluídos do conceito de digital audio recording device do estatuto. O AHRA não protege, portanto, downloads para os HDs dos computadores, de forma a não excluir a ilicitude do procedimento nem eximir o Napster de responsabilidade. A respeito da afirmação de que o Digital Millennium Copyright Act oferece proteção aos provedores de internet contra responsabilidade secundária, a Corte do Distrito Norte da Califórnia entende que o dispositivo em questão não se aplica a infratores contributivos. Entendendo o contrário, a Corte de Apelações do Nono Circuito reconhece que o DMCA pode ser aplicado a infratores contributivos, mas não oferece ajuda ao Napster, que não era verdadeiramente um provedor de internet de acordo com o DMCA133. Ambas as cortes também concordaram em rejeitar os últimos argumentos do Napster, waiver, licença implícita e misuse of copyright, descartando estas alegações inteiramente, sem dar­lhes crédito. Waiver, sendo uma renúncia consciente a direitos autorais, não poderia ter se dado da forma como o Napster afirmou, tampouco poderia ter havido a licença implícita alegada, dados os fortes interesses da indústria fonográfica na contenção da distribuição de seus trabalhos protegidos. Misuse também não se aplicaria, já que a proteção oferecida pelo copyright compreende todos os meio tangíveis conhecidos ou por serem inventados, o que certamente abrange a música digital e o formato MP3. Rejeitou­se, por fim, o pedido do Napster de estabelecimento de uma licença compulsória, 132 Veja A&M Records v. Napster, Inc., nota supra. Para escapar da imposição de responsabilidade vicária, o direito reservado de policiar deve ser exercido até sua extensão máxima. Fazer vista grossa para atos de infração detectáveis por causa de lucro dá margem à responsabilidade [tradução nossa] 133 O termo utilizado no DMCA, ISP – Internet Service Provider –, traduzido como Provedor de Serviço de Internet, refere­se aos provedores de acesso à rede, não aos provedores de serviços, categoria a que o Napster poderia pertencer. considerada pela Corte de Apelações como uma “saída fácil” para o Napster, que não deveria ter escolha se continuava a operar sob licença ou encerrava o serviço, ao passo que as gravadoras também não deveriam ser obrigadas a contratar com o Napster por meio de licença compulsória. Não apenas a licença pretendida não foi concedida, como o foi uma injunção para cessarem as atividades infratoras em seu sistema. 5.5. CONCLUSÃO DO CASO NAPSTER Como precedente, o Caso Napster demonstrou principalmente que o Caso Betamax não poderá garantir o desenvolvimento tecnológico com a mesma segurança frente a novas tecnologias, capazes de ameaças muito maiores que a que um dia foram os videocassetes. Pelo contrário, tornou­se nos anos seguintes um precedente importante a favor do recrudescimento cada vez maior dos monopólios de autor. O caso deve ser tomado, entretanto, não como a lembrança ruim de uma ameaça ou de um problema, mas como uma experiência sobre a qual muito ainda se deve refletir para que se encontre a melhor forma de conciliar os interesses sociais de uso livre das obras protegidas e acesso à cultura aos interesses privados dos autores na justa recompensa por seus trabalhos, sem a qual ficaria prejudicada a produção artística e literária, em detrimento da sociedade inteira. Caso a Corte de Apelações do Nono Circuito tivesse considerado, por outro lado, a aplicação de licença compulsória como pretendida pelo Napster, talvez a situação desse modelo de troca de arquivos – popular e ilegal – pudesse ter se transformado numa forma lícita de distribuição de música, capaz de prover os artistas e detentores de direitos com justa recompensa sem deixar de oferecer ao público acesso à cultura. Espera­se que futuramente este equilíbrio possa ser alcançado. 6. CONCLUSÃO Ainda que seja bastante difícil defender a licitude do compartilhamento de música digital pela Internet, as argumentações normalmente utilizadas socorrem­se do conceito de fair use na tentativa. Em que pese a incerteza relacionada às aplicações desse conceito e a flexibilidade dos critérios para seu reconhecimento, parece inútil, entretanto, desenvolver qualquer raciocínio pela legalidade dessa prática, que fere diretamente o privilégio de reprodução e distribuição garantido pelas leis de copyright. A responsabilização secundária dos programas de compartilhamento – os clientes das redes p2p – muitas vezes soa bastante correta em relação à legislação vigente e aos precedentes analisados, contudo, há circunstâncias em que se configura excesso reconhecido mesmo pelas cortes norte­americanas. Em recente decisão da Corte de Apelações do Nono Circuito para o Caso Grokster134, que também versava sobre a responsabilidade secundária de um cliente p2p para troca de MP3, entendeu­se, em consonância com a decisão de primeira instância, não ser o programa responsável pelas infrações dos usuários, já que não possuía nem right and ability to control nem conhecimento real das infrações específicas, situação que aproxima sobremaneira a nova geração de clientes p2p da defesa oferecida pelo Caso Betamax. Isto se deve à tecnologia dessas novas redes, que já não dependem de servidores centrais passíveis de fechamento ou proibição. As novas redes são puramente p2p: de arquitetura descentralizada e sem administração, razão pela qual é verdadeiramente impossível aos fabricantes dos novos softwares tanto saber qual material será trocado quanto interferir na atividade dos usuários. 134 MGM v. Grokster, 545 U. S. 125 S. Ct. 2764 (2005) A Suprema Corte, contudo, reverteu essa polêmica decisão da Corte de Apelações através da criação de uma nova forma de responsabilidade secundária, o inducement, para abranger casos em que as características do sistema ofereçam­lhe certa imunidade à responsabilização segundo as doutrinas tradicionais, que já não correspondem à nova realidade do fenômeno da pirataria eletrônica. 6.1. REAÇÃO SOCIAL INVERSA Algumas observações devem ser feitas, no entanto, a respeito do problema da responsabilização dos clientes p2p pelas infrações de usuários e das reformas da legislação relacionada. É preciso que se perceba que a criação de novas formas de responsabilização, intensificação das leis de proteção ao copyright, criminalização de condutas ou novos mecanismos de controle possuem o efeito indesejado de aprimorar as habilidades dos infratores, cercear direitos dos consumidores honestos de cópias lícitas e atingir a livre iniciativa sem produzir o efeito desejado de redução dos crimes digitais. Isto porque os infratores diretos não enxergam quaisquer obstáculos nessas medidas. A terceira geração de redes p2p, em resposta a essas normas rígidas e preceitos excessivamente abertos, poderá contar com formas eficientes de anonimização de acesso, clientes open source135 e outras inovações decisivas, razão pela qual será extremamente difícil impedir seu funcionamento ou alcançar diretamente usuários e programadores. As várias restrições de direitos recentemente promulgadas ou ainda em projeto não serão capazes de conter a pirataria eletrônica, pois a rapidez e o dinamismo da informática transpõem sem dificuldades qualquer legislação estática. Da mesma forma, quanto mais a lei ou os precedentes pressionarem os desenvolvedores de software, administradores de redes e moderadores de grupos, mais forte é a tendência de que se busque diminuir a possibilidade de controle de conteúdo nesses meios, em virtude da crescente insegurança que é administrar serviços quando, por haver algum poder de controle, surjam de súbito grandes responsabilidades sobre o comportamento alheio. Dessa forma, quanto mais se busca aumentar a responsabilização indireta por infração de copyright, menos controle será intencionalmente exercido no meio virtual. Ademais, o modelo corrente de administração de copyrights é muito criticado em virtude da concentração dos direitos não na esfera jurídica dos autores, artistas e compositores, mas da retenção por intermediários, como editoras e gravadoras. No tocante à indústria fonográfica, a maioria dos copyrights encontra­se detida por apenas cinco grandes gravadoras que exploram a atividade em âmbito global. Reformas que ampliam indefinidamente o privilégio de autor paradoxalmente tendem a distanciar ainda mais a proteção oferecida do criador da obra, super­alimentando grandes organizações detentoras e monopólios setoriais em detrimento dos próprios autores e das pequenas empresas. Nesse sentido, audiências realizadas na Câmara dos Representantes, quando da aprovação do Copyright Act de 1909, revelaram a preocupação do congressistas com o referido desvio de função do copyright para a proteção de interesses de grandes corporações, ao contrário da proteção dos artistas: “It was at first thought by the committee that the copyright proprietors of musical compositions should be given the exclusive right to do what they pleased with the rights it was proposed to give them to control and dispose of all rights of mechanical reproduction, but the hearings disclosed that the probable 135 Diz­se de programas de código fonte aberto, cuja licença permite livre utilização, modificação e redistribuição. Em razão da contribuição de vários programadores diferentes, nem sempre identificados, torna­se difícil determinar um responsável por esses programas na hipótese de não haver mantenedor. Como são de livre adaptação e distribuição, impedir sua disseminação é também muito difícil, já que dezenas de versões podem ser disponibilizadas por muitas fontes diferentes e em países distintos, de forma que “fechar” todas elas é improvável. effect of this would be the establishment of a mechanical­music trust. It became evident that there would be serious danger that if the grant of right was made too broad, the progress of science and useful arts would not be promoted, but rather hindered, and that powerful and dangerous monopolies might be fostered which would be prejudicial to the public interests. This danger lies in the possibility that some one company might secure, by purchase or otherwise, a large number of copyrights of the most popular music, and by controlling these copyrights monopolize the business of manufacturing the selling music producing machines, otherwise free to the world.”136 É por estes motivos que ampliar a proteção do copyright ou tornar a legislação mais dura para com a infração pode não trazer os resultados positivos esperados, mas eventualmente agravar os problemas existentes. É preciso, então, perseverar na busca de alternativas. 6.2. EM BUSCA DO EQUILÍBRIO O Direito Autoral, como outros ramos do Direito, faz parte de uma Ciência Humana. Existe, pois, em função da própria existência da sociedade e a ela inteiramente dedicado, na busca do melhor interesse coletivo. De modo a garantir a convivência o mais harmoniosa possível entre as pessoas, o Direito existe para disciplinar as relações humanas, e não pode ser entendido sem esse objetivo primordial, sob pena de legitimar o autoritarismo, a segregação e os privilégios. Os direitos autorais, dessa forma, existem para incentivar a inovação artística e literária, com o intuito primeiro de oferecer à sociedade acesso às obras de arte, literatura e ciência, assim como dispõe o texto constitucional estadunidense. Separar­se de tal objetivo poderia conduzir o Direito Autoral por caminhos que só levam à instituição de monopólios, poderosos mas vazios de significado. Nesse sentido, as supra citadas audiências na Câmara dos Representantes traziam também a preocupação com o alcance e equilíbrio entre interesses, capaz de assegurar benefícios sociais ou provocar grandes prejuízos: “In enacting a copyright law Congress must consider, as has been already stated, two questions: First, how much will the legislation stimulate the producer and so benefit the public; and, second, how much will the monopoly granted be detrimental to the public. The granting of such exclusive rights, under the proper terms and conditions, confers a benefit upon the public that outweighs the evils of the temporary monopoly. ”137 Tendo isto em mente e de volta à difícil tarefa de buscar o delicado equilíbrio entre interesses diversos sem perder de vista o objetivo fundamental da instituição dos direitos autorais, chega­se ao verdadeiro impasse da questão do compartilhamento de arquivos: como garantir o florescimento das artes 136The House of Representatives Report on The Copyright Act of 1909, H.R. Rep. No. 2222, 60th Cong., 2nd Sess. (1909), pág. 05. Foi primeiramente entendido pelo comitê que aos detentores do copyright de composições musicais deveria ser dado o direito exclusivo de fazer o que quer que quisessem com os direitos para dar a eles o controle e disposição de todos os direitos de reprodução mecânica, mas as audiências revelaram que o efeito provável disso seria o estabelecimento de um trust mecânico­musical. Tornou­se evidente que haveria um sério risco de que, se a garantia de direito fosse feita ampla demais, o progresso da ciência e artes úteis não seria promovido, mas sim impedido, e que monopólios poderosos e perigosos poderiam ser alimentados, o que seria prejudicial aos interesses públicos. Este perigo repousa na possibilidade de que alguma companhia poderia segurar, por compra ou outra forma, um grande número de copyrights da música mais popular, e controlando esses copyrights monopolizar o negócio de produzir a venda de máquinas que produzem música, de outra forma livres para o mundo. [tradução nossa] 137 Veja The House of Representatives Report (1909), nota supra, pág. 05. Ao decretar uma lei de copyright o Congresso deve considerar, como já foi afirmado, duas questões: Primeiro, o quanto a legislação estimulará o produtor, e com isso beneficiará o público; e, segundo, o quanto o monopólio garantido será prejudicial ao público. A concessão de tais direitos exclusivos, sob os termos e condições apropriados, confere um benefício em relação ao público que compense os males do monopólio temporário. [tradução nossa] por meio de justa recompensa aos autores oferecendo à sociedade, ao mesmo tempo, fácil acesso cultura? “1. Toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do processo científico e de seus benefícios. 2. Toda pessoa tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica, literária ou artística da qual seja autor.”138 Se todos têm direito de acesso à cultura e de fruir das artes mas os autores têm igualmente direito à proteção de interesses materiais envolvendo o seu trabalho, o equilíbrio entre interesses torna­se bastante difícil de ser obtido. É certo que, para se estabelecer a harmonia, tanto o público deve aceitar algumas restrições ao seu direito de livre acesso à cultura quando os autores deveriam também aceitar algumas restrições em seus monopólios de reprodução, distribuição e confecção de trabalhos derivados. Obviamente, todas estas restrições devem ser as mais amenas possíveis, sob pena de haver novamente desequilíbrio entre incentivo à produção artística e acesso a suas obras. 6.3. IDÉIAS CONCILIADORAS No intuito de alcançar o equilíbrio de interesses mencionado, William Fisher, professor de Propriedade Intelectual de Harvard, imaginou algumas soluções139 para o problema da distribuição gratuita de música digital pelas redes p2p, tentando conciliar a justa recompensa aos artistas com o interesse social na distribuição eletrônica de música. Suas idéias soam muito promissoras e infinitamente mais eficazes que o recrudescimento da legislação autoral. A primeira idéia seria atrelar a distribuição de música digital à compra de CDs. Dessa forma, para realizar downloads de suas músicas preferidas, os internautas deveriam comprar os discos originais desses trabalhos. Embora não resolva problemas como adequação da quantidade de produção e impossibilidade de compra de faixas isoladas, esta idéia ainda é melhor que o modelo atual de gerenciamento de copyright e o hábito do compartilhamento ilegal de arquivos. A segunda seria um sistema de pagamento de royalties semelhante ao praticado dentro das disposições do AHRA, em que os responsáveis pela distribuição de música online, assim como o comércio de artigos usados para a gravação de cópias de trabalhos musicais, proveriam aos artistas pagamento por seu trabalho através de royalties. Ainda que não seja um modelo livre de falhas, a instituição do pagamento de royalties – como a licensa compulsória pleiteada pelo Napster na Justiça – traria mais benefícios para todos que a pirataria eletrônica ou a associação do download com a compra. Outra solução seria a distribuição de música digital em formatos seguros, através da utilização de sistemas de controle de cópias como os protegidos pelo DMCA. Dessa forma, a música poderia ser distribuída na Internet sem que fosse possível a circulação de milhares de cópias idênticas a partir de cada arquivo. Contudo, esta solução traz consigo todos os problemas já mencionados relacionados aos DRMs – cerceamento de direitos, possibilidade de quebra, entre outros. Existe também a idéia da distribuição de música por meio de subscrição, registro em sites ou outros serviços para aquisição das músicas desejadas. Possuindo uma conta associada às músicas adquiridas, os usuários podem ouvi­las a partir de computadores diferentes, o que não é possível com a utilização de formatos seguros. Esse sistema já dá bons resultados na loja virtual iTunes da Apple140. 138 Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo XXVII. 139 Fisher III, William. Digital Music: Problems and Possibilities. 10 de outubro de 2000, disponível em http://www.law.harvard.edu/faculty/tfisher/Music.html (acessado em 20/07/06) 140 iTunes Music Store http://www.apple.com/itunes A última solução apresentada pelo Prof. Fisher é a de distribuição de música digital gratuita, num modelo baseado no pagamento dos artistas através de recursos obtidos com publicidade. Este modelo já provou viabilidade com alguns dos clientes p2p atuais, que obtém recursos através da veiculação de anúncios, como o Kazaa. Caso tais recursos pudessem ser utilizados para a obtenção de licenças ou mesmo para repasses a órgãos representativos de cantores e compositores, o conflito entre detentores de copyrights e internautas poderia terminar de forma muito proveitosa. Talvez a associação dessas e de outras idéias possa produzir um sistema capaz de prover o público com as músicas desejadas, sem deixar de recompensar os artistas e detentores de copyright. É preciso que estas idéias amadureçam, e que eventualmente surjam outras para que esta utopia possa tornar­ se realidade. Apesar das dificuldades, propostas existem, e se efetivamente postas em prática, é possível que se atinja o tão desejado equilíbrio entre o acesso à cultura e justa recompensa pelo trabalho dos autores, tão necessários à sociedade. Tudo dependerá de com que olhos os juristas de hoje enxergarem o problema: se com passional superficialidade ou aprofundamento racional. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS141 LEGISLAÇÃO E TRATADOS ________. 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Licença ­ “Some Rights Reserved” Esta obra é disponibilizada de acordo com os termos da licença pública Creative Commo ns Atribuição ­ Uso não­Comercial ­ Vedadas Obras Derivadas 2.5 .142 Se você deseja fazer qualquer uso que não seja permitido pelos termos da licença, por favor me peça autorização ([email protected]). 142 Resumo da licença http://creativecommons.org/licenses/by­nc­nd/2.5/br/ e texto completo disponível em http://creativecommons.org/licenses/by­nc­nd/2.5/br/legalcode