Comentário/debate sobre o caso J

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Comentário/Debate
Caso de J
Carlos Farate
SPP
Comentário/debate sobre o caso J
Intróito
O trabalho analítico com J parece sustentado por um estado de empatia entre
ambos os elementos do par analítico, “santo-e-senha” da “aliança terapêutica” laborada
pelo psicanalista na 1.ª fase do trabalho psicoterapêutico (referida no 3.º parágrafo do
texto que foi enviado para consulta) e condição necessária para o “working-through”
psíquico que é identificável no material enviado.
Ainda à guisa de intróito, duas outras notas me parecem justas e necessárias.
Em primeiro lugar, a pertinência clínica da proposta efectuada inicialmente de
uma psicoterapia psicanalítica (em face a face) bissemanal, seguida por análise pessoal
(na fase sujeita a apreciação clínica, à razão de 4 sessões/semana), em particular para
um paciente (de difícil acesso) que apresenta o quadro tímico depressivo e a (grave)
inibição sexual (vertida nas relações sociais mais íntimas e envolventes, como o é,
seguramente, a ligação ao psicanalista) que nos são descritos (particularmente, nas
secções “evolução da análise” e “semana analítica”)
Depois, o modo de apresentação escorreito da vinheta clínica alargada, tanto do
ponto de vista metodológico (como se de uma “memória descritiva abreviadíssima” se
tratasse) como do ponto de vista da escrita que (intencionalmente, assim o entendo)
evita o/ prescinde do panegírico de elucidações teóricas/ referências técnicas, aptas a
“obviar” à qualidade e abertura de campo da reflexão clínica proposta nesta interessante
fórmula de debate/discussão de caso.
Como adenda a esta nota, importa referir como achei curiosa a opção pela
fórmula da “semana analítica” para apresentar o material propriamente psicanalítico
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(semana esta que, em minha opinião, deverá reportar-se a uma fase avançada do
trabalho com J) e o modo eficaz, tecnicamente rigoroso e eticamente cuidado como
utiliza a sua “teoria privada” no tratamento deste paciente.
Após estas notas introdutórias, passo a comentar o material apresentado, e, como
me foi pedido que “debata” a vinheta clínica alargada de J, tomarei a liberdade
académica” de sistematizar o meu contributo em 3 secções temáticas:

Impressão clínica global (a partir sobretudo das secções do texto sobre as
“razões do processo de análise”, “história do paciente” e “evolução da análise”);

Diagnóstico estrutural e funcionamento psíquico (tipo de angústia, mecanismos
de defesa predominantes e modo de funcionamento mental)

Processo psicanalítico (neste caso, focalizarei o meu comentário no binómio
CT/T, já que entendo que a gestão analítica da CT, neste tipo de pacientes, é
decisiva para o sucesso terapêutico
Impressão clínica global
A problemática de J é apresentada de um modo escorreito, e a descrição
efectuada permite identificar um homem jovem, com uma vida social em que o
movimento é apenas superficial (à superfície do Self) e parece ser a contrapartida da
ausência de mobilidade das relações de objecto (sobretudo aquelas que implicam maior
proximidade e em que os laços de dependência são mais significativos)
J parece, ainda, ser atormentado por uma angústia de castração importante e por
sentimentos de desvalorização narcísica atávicos e persistentes, e cujo enraizamento
numa inibição sexual arrastada, e assente numa inversão edípica geradora da incerteza
acerca da sua identidade sexual adulta começa a ser desvelada na história familiar
(sobretudo nos antecedentes psíquicos familiares) embora a referência mais explícita às
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“dúvidas quanto à sua orientação sexual” seja feita para o final desta secção, mais
precisamente no parágrafo que se inicia por “Quanto à identidade….”. Esta conjunção
psíquica particular parece encontrar o seu exutório preferencial em episódios recorrentes
de ansiedade paroxística e em sintomas da série depressiva (internamento anterior por
provável quadro de depressão major, ideação suicidária ocasional e sintomas somatofuncionais persistentes, podendo a grave situação gastrointestinal de que padece desde a
adolescência e diagnosticada medicamente como Doença de Crohn, ser entendida,
igualmente, como uma somatose depressiva espectacular), “coroados” por uma
sexualidade precária, de tonalidade baça e orientação objectal indiferente).
Finalmente, o arranjo residencial actual, bem como o comportamento académico
parecem participar do mesmo esforço de indiferenciação volitiva das relações de
(quase) amizade e da superficialidade defensiva da sua (não) vida amorosa. Refira-se,
em particular, pelo seu duplo significado psicopatológico e intrapsíquico, o facto de J
residir numa localidade diferente tanto do pai (ou melhor do duo, pelo menos
fantasmático, pai/irmão mais velho), como da mãe, aqui também do duo fantasmático
mãe/irmão do meio. Esta tentativa de equidistância relativamente a ambos os
“acasalamentos” parece estar ao serviço da negação, não tanto da separação
relativamente às imagos edípicas da infância (já que o cenário edípico é negado pelo Eu
infantil de J), mas antes do estatuto de 3.º excluído (do qual foge, no fantasma, pelo
recurso a este estratagema “omni-impotente”e dos benefícios secundários que, sob a
“capa” do sofrimento depressivo/somático, este arranjo residencial/académico lhe
proporciona!..).
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Diagnóstico estrutural e funcionamento psíquico
De acordo com a vinheta clínica e cruzando os dados da anamnese (doença
actual e história pregressa) com o material das sessões submetidas a escrutínio reflexivo
é possível avançar com o diagnóstico de uma entidade clínica situada no “espectro das
doenças afectivas”, mais precisamente a uma depressão falo-narcísica, que se manifesta
sob a forma da ansiedade fobo-depressiva sobre um fundo de inibição sexual assente,
este último, na inversão das identificações edípicas e a consequente confusão/perda de
coerência no sentimento de identidade.
Interessa, agora, proceder à análise sucinta dos aspectos dinâmicos e estruturais
do funcionamento mental de J.
A) Tipo de angústia
A angústia falo-narcísica de J parece ter uma natureza neurótica determinante,
não só pela configuração semiológica do seu sofrimento (de facto, não recorre à
perversão sexual agida quer sob o modo da relação fetichista a objectos fálicos
desvitalizados, quer sob a forma de práticas eróticas sadomasoquistas, e apesar da
grave somatose de que padece não se observa em J uma “deriva” defensiva para a
despersonalização, como “placa giratória” da evolução para a psicose, que, neste
caso, teria uma “coloratura” esquizofreniforme predominante, por identificação
projectiva à retirada esquizóide do aspecto idealizado da imago paterna), mas
também, e sobretudo, porque mantém a nitidez dos limites externos e internos do
Self (i.e., entre si e o outro, e entre as agências do aparelho psíquico), e a tendência
para o juízo reflexivo dos sentimentos de culpa e de frustração pela incapacidade de
captar o amor do objecto rejeitante/frustrador, embora a elaboração secundária da
culpa edípica se revele ineficaz pelo seu carácter, simultaneamente, introspectivo e
anancástico (neste caso, J parece recusar a “solução branca” da imago materna
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gravemente atingida no seu narcisismo, e limita a pressão da parte do Self
identificado a este objecto interno narcisicamente deprimido para o recurso
“adictivo” seja à redução do objecto externo a “duplo narcísico”, seja à sua troca por
um sucedâneo funcional, desprovido de verdadeiro investimento afectivo, droga,
amante fetiche, performance sexual ou intelectual, que colocaria o seu sofrimento
psíquico no “espectro borderline”)
De facto, mesmo se algum do material apresentado parece ser revelador de uma
“pressão adictiva” para a conversão pré-genital da angústia narcísica (por exemplo,
a utilização fetichista dos sites homossexuais com recurso à descarga “virtual”
amorfa, mais auto-erótica que propriamente masturbatória, da raiva pelo estado de
frustração amorosa/solidão em que o lado desvitalizado do Self o “incrusta”, ou,
numa
mesma
linha
de
“acting”
pré-genital,
a
pulsão
escóptica,
voyeurista/exibicionista e de significado transferencial não negligenciável, que
acompanha este “acting”, e que, por exemplo, são descritas no material da sessão de
25/6/03), J não parece “ceder” excessivamente a esta tentação, já que se mantém
“acordado”/disponível para a elaboração reflexiva, com o seu psicanalista, da
“estranheza” identitária que o habita (ainda na mesma sessão, a referência a esta luta
interior, na análise de conteúdo de um trecho do discurso apresentado, no qual J, ao
referir-se às dificuldades em avançar com o “projecto”/análise, que será tema
dominante do par analítico na sessão seguinte, diz, a certo passo, o seguinte “Mas
não consigo acordar, se não tomo remédio não consigo dormir”, o que traduz, em
minha opinião de um modo escorreito, o conflito em J, a saber, não consegue
dormir/sonhar na sessão, porque quem dorme vai ter de acordar, que o mesmo é
dizer, seguindo a metáfora, vai ter de acordar/pensar o material do sonho, e é,
precisamente, a elaboração psíquica secundária do imbróglio narcísico contido no
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material onírico que, ainda, o assusta, pelo medo do “insight” secundário sobre as
partes desconhecidas do Self)
B) Mecanismos de defesa predominantes
Em linha com a natureza neurótica determinante da angústia falo-narcísica que
subjaz ao seu sofrimento depressivo, o mecanismos de defesa do Eu, apesar do largo
“comprimento de onda” psíquico em que são “audíveis”, mesmo em momentos
diferentes da mesma sessão, reportam-se a um funcionamento mental mediado pela
utilização preferencial dos processos secundários, i.e., pela alternância do princípio
do prazer e do princípio da realidade.
Entre as defesas da “linha neurótica” que são mais utilizadas por J, é claro que
ao serviço da repressão do material proto-onírico pré-genital que ameaça,
persistentemente, “manchar” a “linha de água” do seu quotidiano, podem referir-se
o par deslocamento e condensação, e a transformação no contrário das pulsões
eróticas
e
agressivas
e
das
emoções
negativas
dirigidas
às
partes
frustradoras/excitantes do objecto interno (e às partes do Self que com elas estão
identificadas). Refiram-se ainda as “clássicas” racionalização defensiva (e.g., a
explicação para as queixas somato-funcionais, e em particular as dificuldades de
sono) e a intelectualização (quando utiliza o excurso, secundariamente metaforizado
na sessão analítica, sobre a distribuição de planos/espaços nos seus difíceis, como
seria de esperar, projectos de arquitectura de interiores, sendo, neste particular,
muito interessante a referência às linhas de corte horizontais e verticais do espaço no
material da última sessão apresentada, a fazer lembrar os planos de clivagem
vertical e horizontal do Self infantil).
Contudo, e também como seria de esperar, as defesas da “linha narcísica”, entre
o “primitivo” e o “arcaico”, também são muito utilizadas por J.
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A panóplia de mecanismos de defesa narcísicos a que J recorre vai desde a
negação defensiva da diferenciação objectal dos impulsos eróticos e agressivos (e
das fantasias que os alimentam), à idealização fálica do pénis (agida na experiência
de “felácio” em experiência homoerótica anterior, ou, sobretudo, no funcionamento
psíquico como um pénis paterno nostálgico da potência fálica que a retirada
esquizóide/omnipotente inviabilizou, e que aparece em trechos diversos das sessões
apresentadas: “fichinha perto do pai”, identificação, não ambivalente, ao primo
“putanheiro” que, segundo ele, “faz terapia aqui perto”, referência à relação com
professores, em que parece “lateralizar” a idealização fálica do psicanalista, “chats”
erotizados com escritores supostamente mais velhos…), passando pela projecção
evacuativa (anal) dos conteúdos eróticos/agressivos rejeitados, sobretudo agida
como somatose nos episódios recorrentes de diarreia “convulsiva” ligados à sua
doença gastrointestinal, mas também presente no material de algumas sessões (p.ex.,
na sessão de 23/6/2003, após referir a saída de fim de semana com a Júlia e os
amigos, diz “Mas eu nem fiquei excitado com a Júlia, com ninguém. Aliás eu nunca
fico excitado. Eu só queria me livrar da minha família. Eles que se fodam”).
Mesmo se a utilização dos mecanismos projectivos é predominante em J (com
realce para a utilização regressiva da identificação projectiva, com significado
transferencial não negligenciável no material das três primeiras sessões, sobretudo
quando faz referência à procura, simultaneamente excitante e frustrante, do
objecto/parte do Self idealizada nos sites eróticos da net) não deixa de ser
importante referir o esboço de identificação introjectiva (homossexual) estruturante
evidenciada na última sessão da semana analítica (e que parece destinar-se a
preservar o amor/interesse do psicanalista, sendo interessante reflectir, por isso
mesmo, no significado contratransferencial da sonolência “incontrolável” deste
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último, que, em minha opinião poderá estar associada tanto à “ressaca” do labor
semanal cansativo (de ambos) com as partes regressivas/confusionais da mente de J,
como à dificuldade do confronto do par analítico com a separação de fim de semana.
Um último comentário para referir, em linha com o “fio condutor” da leitura do
material clínico de J que adoptei no debate do seu funcionamento psíquico, o modo
como quer a experiência homoerótica do “felácio”, como a compulsão à repetição
dos episódios de evacuação fecal, podem ser interpretados como resultado da
incorporação fantasmática do objecto morto (neste caso a sexualidade masculina de
J). Assim, no primeiro “acting”, estaria em causa a incorporação fantasmática do
falo paterno morto enquanto que, no segundo, a incorporação de um pénis anal
fortemente erotizado “força” a identificação sexual a uma imago materna, também
deprimida e “morta” para a satisfação de um verdadeiro desejo amoroso/sexual, e
impõe a J a morte de toda a veleidade de uma sexualidade masculina.
C) Modo de funcionamento mental
Em suma, o funcionamento mental de J parece marcado pela importância da
inversão identificatória às imagos edípicas, e induz à utilização regressiva de
mecanismos de defesa narcísicos, situados na intersecção dos registos primitivo e
“arcaicos” dos processos mentais primários, (referidos no dois pontos anteriores)
para fazer face à angústia falo-narcísica que o atinge.
Esta inversão edípica, de importância marcante na inibição sexual que, segundo
o eixo de abordagem que privilegio no meu contributo para o debate do processo
analítico de J, funciona como “santo-e-senha” da incerteza acerca da sua identidade
sexual (de J poderá dizer-se, de facto, segundo uma asserção conhecida, “nem
homem nem mulher, falo materno “falhado””), influencia particularmente o binómio
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CT/T que, no caso deste paciente, como de outros pacientes, sobretudo do “espectro
borderline”; é determinante para o sucesso da terapia analítica. Sobretudo na sua
perspectiva maiêutica, que o mesmo é dizer na perspectiva do alargamento da
consciência de si, ou se quisermos do auto-conhecimento, do sujeito psíquico.
Importa, contudo, referir aquele que me parece ser o eixo tripartido que organiza
o funcionamento da parte narcisicamente “frouxa” e castrada na capacidade de
afirmação fálica do Self infantil de J (e que tanto influi no seu sofrimento
subjectivo). Trata-se de um eixo tripartido, e não tridimensional já que tem uma
natureza linear e biunívoca, e funciona segundo uma lógica processual inconsciente.
Este eixo hipotético pode ser representado do seguinte modo:
Frustração (objectal) ↔ Solidão (narcísica) ↔ Excitação (auto-erótica amorfa)
E pode ser explicado, sucintamente, da seguinte forma:
Quando o Self infantil de J está perante situações de frustração objectal (por não
conseguir obter, por parte do objecto amado/idealizado, o reconhecimento das suas
qualidades de desempenho fálico/amoroso) fica preso à identificação nostálgica com
a imago materna, i.e., a parte do objecto interno que foi incapaz de captar o amor do
falo paterno idealizado, e regride a um sentimento (depressivo) de solidão narcísica,
já que a frustração sofrida instaura a “falha” da integridade falo-narcísica do Self
infantil (que só poderia progredir por identificação homossexual introjectiva à
imago paterna, que sente como inviável) e que o força à procura regressiva (e
antecipadamente frustrada) da completude fálica originária, através da incorporação
fantasmática, sob um modo entre o sádico-oral e o sádico-anal, de um falo materno
deprimido, que acentua a inibição sexual (pelo seu carácter amorfo e impotente) e o
conduz à inibição defensiva (incessante) de toda a relação objectal potencialmente
desejável, bem como da relação com as partes do Self que estão em contacto com
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esse desejo objectal (sob o modo predominante da excitação auto-erótica amorfa e
esvaziada de qualquer fantasma de desejo sexual e amoroso (”o fichinha do pai”,
que “só fica em fantasias”!...)
Processo Psicanalítico
Como referi antes, apenas comentarei nesta secção as dificuldades do manejo da
posição contratransferencial do psicanalista em face de um paciente com uma
problemática edípica de tão difícil abordagem interpretativa e indutora de “efeitos
colaterais” pré-edípicos tão persistentes e que, pelo menos assim me parece, o paciente
procura, quase todo o tempo, integrar ao carácter depressivo que lhe tolhe a existência.
Aliás, um outro aspecto importante num paciente que acedeu, mas não
confirmou, uma identidade sexual estável e bem definida (entenda-se aqui, em relação a
S, ou a qualquer outro paciente com uma mesma problemática de incerteza identitária,
que a primazia do tratamento psicanalítico destes pacientes se mantém qualquer que seja
a orientação sexual que cada um venha a escolher na fase resolutiva do seu processo
terapêutico).
Ora, pelo menos a partir da reflexão secundária sobre o material verbal dos
trechos das sessões da semana analítica que pude consultar, parece-me que, nesta fase
da análise de J, o psicanalista privilegia uma posição contratransferencial paterna
predominante (com todos os riscos que isso implica, até pelo carácter potencialmente
voyeur que, a partir da análise de conteúdo do material das sessões e do cruzamento da
leitura deste material com os dados clínicos avançados na secção “história do paciente”,
pode ser atribuída à imago paterna, que “paga para ver” a mulher exibicionista/ mãe de J
ter relações sexuais com o amante, à imagem do irmão “paterno”/identificado ao pai que
pagou a única experiência heterossexual de J, ou do Ψ a quem ele conta as suas “anti-
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aventuras” auto-eróticas/quase masturbatórias e mais ou menos virtuais durante as
sessões)
É certo que existe a preocupação empática pelo Ego infantil de J em sofrimento
e que apela, todo o tempo, por atenção, laço afectivo e, sobretudo, por reconhecimento,
por parte de um Superego que lhe possibilite estruturar, enfim, uma arquitectura de
interiores segundo os planos sólidos de um Ideal do Ego estruturante, e que o Ψ
responde adequadamente a esta solicitação.
Não é menos certo, contudo, que me parece ser preferencialmente materna a
transferência “pedida” pelo Ego infantil inibido (já que castrado pela “escolha” fálica,
de recurso, errada!..) e que só através da libertação do “encantamento” da identificação
fálica defensiva/depressiva de uma imago materna omni-impotente (já que não foi capaz
de interessar o objecto de amor sexual verdadeiro) que, à imagem de J, “alterna” de
fracasso amoroso em frustração sexual, e vice-versa, até à desvitalização narcísica total
(de que J tem insight parcial, e tanto teme).
Enfim, parece que é (ou terá, ou, antes, teria sido, de acordo, mais uma vez com
a minha leitura desta excelente “vinheta clínica psicanalítica”) a possibilidade de
interpretar a partir da posição CT materna, pelo menos nesta fase do processo
psicanalítico deste paciente, que, poderá ajudá-lo a resolver o problema que ele formula
bem, embora projectivamente, quando se refere à dificuldade à relação (frustrada) com
Júlia e que, segundo ele (J recorre aqui à identificação ao pai), é devida à dificuldade em
“chegar perto dela” (aqui, pareceu-me estar condensada Júlia e a mãe interna íntegra,
bonita e, ainda, inteligente, sedutora e sexualmente viva) …Ora, eu aqui, arriscarei a
seguinte “interpretação post-facto”, “Como quer chegar junto dela, se fica todo o tempo
bancando ela?!...”.
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