Capítulo 7

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Estudos específicos
Capítulo 7
A. Importância dos unit linked no ramo Vida
1. Enquadramento
Para além da vocação tradicional de cobertura de riscos específicos de
seguros, as empresas de seguros têm-se assumido cada vez mais, ao longo dos
últimos anos, como instituições financeiras especializadas na captação de
poupança. Esta “nova função” tem sido impulsionada pela inovação financeira e
pela consequente crescente competição entre as empresas de seguros, bem como
pelas sinergias intragrupo estrategicamente aproveitadas. Tudo isso em muito tem
contribuído para que, no seu conjunto, as empresas de seguros sejam
reconhecidas como um dos mais importantes investidores institucionais.
Ainda que nos produtos típicos acima mencionados a função financeira
possa, por vezes, ser primordial, é nos produtos ligados a fundos de
investimento – daqui em diante designados apenas de unit linked – que a
tradicional função de cobertura de riscos seguros quase se esvazia. Nos produtos
do tipo unit linked coexiste frequentemente uma componente de risco suportada
pela seguradora – designadamente um determinado montante garantido de
capital em caso de morte do tomador do seguro – e uma componente financeira
cujo risco de investimento é suportado, pelo menos parcialmente, pelo tomador,
característica que tem impulsionado fortemente o êxito desses produtos na
generalidade dos países. Contudo, apesar dessa coexistência de riscos assumidos
pelas empresas de seguros e pelos tomadores de seguros, os riscos das primeiras
representam, no conjunto, um valor pouco relevante.
Acrescente-se ainda que, ao mencionar-se os unit linked, está-se a fazer
alusão a um conjunto muito variado de produtos, que congregam diferentes tipos
de garantias assumidas pelas empresas de seguros e, consequentemente,
diferentes riscos assumidos pelos tomadores de seguros. Por se tratar de produtos
relativamente recentes, não é de estranhar que, durante os últimos anos, a sua
produção tenha registado crescimentos incomparavelmente superiores aos
verificados nos tradicionais produtos do ramo Vida mesmo naqueles que contêm
uma forte componente financeira. Tal tem ocorrido em todos os países do
mercado europeu de unit linked 9 desde meados da década de 90, altura que
coincidiu com a expansão dos mercados financeiros.
Como se pode notar pelo gráfico seguinte, em Portugal tem-se assistido a
uma evolução crescente da importância dos unit linked. Em 2002, a produção
anual afecta a esses produtos representou cerca de 1/3 do total dos prémios do
9
Considera-se, para esse efeito, o mercado que integra os Quinze da União Europeia, a Noruega e a Suíça.
167.
Estudos específicos - Importância dos unit linked no ramo Vida
A função financeira – em complemento à tradicional função de gestão de
riscos específicos de seguros – assume grande destaque no ramo Vida. De facto,
no seio da gestão de várias empresas de seguros que exploram o ramo Vida,
alguns produtos marcadamente financeiros têm recolhido especial predominância
face aos produtos típicos relacionados com a cobertura de riscos associados à vida
das pessoas seguras.
ramo Vida (líquidos de resseguro), o que equivalia a 1,1% do PIBpm português. A
produção relativa aos produtos não ligados a fundos de investimento – seguros de
vida e operações de capitalização não ligadas – correspondeu a 2,3% do nosso
Produto.
Gráfico 69 . Produção dos unit linked e dos produtos não ligados face ao PIBpm
Estudos específicos - Importância dos unit linked no ramo Vida
168.
2. Evolução
Pode-se afirmar que, nos últimos três anos, o crescimento do ramo Vida em
Portugal tem sido concretizado essencialmente graças à contribuição dos unit
linked. Com efeito, apenas em 1999 a taxa de crescimento dos produtos não
ligados a fundos de investimento superou a correspondente taxa para os produtos
ligados. Como se poderá verificar posteriormente, tal situação deveu-se sobretudo
à conjugação da natureza dos unit linked portugueses com o facto de, em 1999,
a taxa de juro de referência para os depósitos a prazo ter registado o valor mais
baixo face aos restantes anos considerados na análise e, ao mesmo tempo, o
índice PSI 20 ter atingido um valor máximo durante esses mesmos anos.
Tal como tinha acontecido em 2000, em 2002 foi a taxa de crescimento dos
unit linked que permitiu assegurar um crescimento positivo do ramo Vida, como
se pode constatar pelo gráfico seguinte. As taxas de crescimento aí apresentadas
foram calculadas com base nos valores dos prémios anuais líquidos de resseguro.
Gráfico 70 . Taxas de crescimento dos unit linked e dos produtos não ligados
Relatório anual sobre o sector segurador e fundos de pensões
Relativamente aos produtos não ligados, acrescente-se que, em 2002, a taxa
de crescimento de -2,2% se deveu ao decréscimo registado na produção das
operações não ligadas, porquanto a produção dos seguros de vida propriamente
ditos obteve um acréscimo de 2,7%.
Importa também referir que o êxito comercial dos unit linked tem sido em
parte explicado pela bancassurance. Em Portugal, e à semelhança do verificado
em vários países europeus – tais como Espanha, Itália, França e Bélgica –, o canal
bancário tem sido o dominante na distribuição desses produtos.
3. Natureza
Através do gráfico seguinte é possível visualizar a composição, em Portugal e
no Reino Unido, da carteira global dos unit linked e da carteira dos produtos não
ligados, relativamente ao ano de 2001. Saliente-se que, nesse ano, o Reino Unido
detinha uma quota de 56,7% do mercado europeu de unit linked.
Gráfico 71 . Composição das carteiras de unit linked e de produtos não ligados em Portugal
e no Reino Unido
2001
Fonte: Swiss Re, no que se refere ao Reino Unido
Dele, conclui-se que as carteiras dos unit linked e dos produtos não ligados
portugueses tinham uma composição totalmente diferente do que acontecia no
Reino Unido. No caso concreto do mercado português, os unit linked têm sido
vistos como uma alternativa aos contratos com taxa de rendimento garantido ou
169.
Estudos específicos - Importância dos unit linked no ramo Vida
No nosso país, os produtos do tipo unit linked têm sido criados com o
objectivo de tentar atingir determinadas rendibilidades, pelo que as políticas de
investimento que lhes estão subjacentes são estabelecidas de modo a privilegiar a
concentração de valores obrigacionistas, designadamente títulos de dívida pública
e obrigações. Note-se que essa situação não é única à escala europeia. Com
efeito, em França, Itália e Espanha, a promoção das apólices de unit linked
deveu-se à política de investimentos conservadora, traduzida na elevada exposição
em títulos obrigacionistas.
com participação nos resultados. Enquanto que em Portugal a esmagadora
maioria dos investimentos das carteiras de unit linked era feita em valores
obrigacionistas, no Reino Unido essas aplicações representavam só cerca de 15%.
Contrariamente, as aplicações em valores accionistas representavam, em 2001,
70% do total os investimentos no Reino Unido, contra apenas 6% em Portugal.
Para além disso, enquanto que em Portugal não existiam alterações
significativas entre os unit linked e os produtos não ligados, no Reino Unido tal
não se verificava. De facto, neste País, em termos da componente accionista, os
unit linked apresentavam quase o dobro da exposição face aos produtos não
ligados, enquanto que na rubrica de empréstimos os produtos não ligados
apresentavam uma exposição de cerca de 20% acima da correspondente
exposição nos produtos ligados (devido essencialmente à figura dos
mortgage-backed securities, classificados nesse País como empréstimos10).
Estudos específicos - Importância dos unit linked no ramo Vida
170.
Posto o que anteriormente foi referido, não é de estranhar que, em Portugal,
não haja uma relação positiva entre a evolução dos unit linked e a variação dos
mercados accionistas, como sucede nos países onde as carteiras desses produtos
são fortemente constituídos por valores accionistas. Ao invés, no nosso país,
tem-se assistido a uma relação perfeitamente negativa entre o peso dos unit
linked face aos produtos não ligados do ramo Vida e a variação do índice
português de acções PSI 20, tal como se pode notar pelo gráfico seguinte.
Gráfico 72 . Relação entre o peso dos unit linked nos produtos não ligados e o andamento do PSI 20
Como se vê, o mercado português dos unit linked tem evoluído em
contraciclo com os mercados accionistas, o que é justificado pelo carácter
conservador das políticas de investimento definidas para esses produtos. De facto,
tendo sido 2002 o pior ano para o índice PSI 20 – culminando com uma
depreciação de 51% em três anos –, deve ser salientado que, de 1999 a 2002, o
peso dos prémios dos unit linked face aos prémios dos produtos não ligados do
ramo Vida aumentou 3,6 vezes, ou seja, passou de cerca de 14% em 1999 para
quase 50% em 2002.
10
Tratam-se de letras ou garantias hipotecárias que assumem a forma de títulos de securitização. Numa primeira fase, os
tomadores de seguros entregam às empresas de seguros a propriedade dos seus imóveis como forma de pagamento de
prémios, geralmente de rendas vitalícias, e posteriormente as empresas de seguros transferem esses imóveis para o
mercado de capitais através da securitização por via da emissão dos referidos títulos de securitização. Dessa forma, as
empresas de seguros conseguem obter instrumentos de renda fixa a longo prazo e, simultaneamente, permite-se criar
liquidez no mercado imobiliário através da ligação entre este e o mercado de capitais.
Relatório anual sobre o sector segurador e fundos de pensões
4. Taxa de rendimento
Os untit linked têm merecido a confiança dos tomadores de seguros
portugueses por vários motivos, entre os quais a credibilidade do mercado
segurador, a facilidade de alteração da alocação dos investimentos em função do
perfil de risco dos tomadores e o aproveitamento de benefícios fiscais 11. No
entanto, cremos que o principal motivo que tem fomentado esses produtos é o
bom desempenho da gestão financeira.
Efectivamente, as taxas líquidas de rendimento alcançadas têm
sistematicamente ultrapassado as taxas de juro dos depósitos a prazo, como se
pode observar no gráfico seguinte. As taxas de rendimento obtidas correspondem
ao quociente entre os resultados anuais financeiros (ou de investimentos), líquidos
de todos os custos de exploração, e os activos representativos das provisões
técnicas dos unit linked existentes em cada ano.
Gráfico 73 . Taxa de rendimento dos unit linked versus taxas de juro dos depósitos a prazo
Há ainda a salientar que, pelo facto dos unit linked serem produtos onde o
risco de investimento é suportado pelo tomador do seguro, as exigências de
capital para as empresas de seguros são bastante menores que nos produtos
tradicionais com taxa garantida.
No entanto, a prática tem demonstrado que as empresas de seguros têm
adoptado políticas de investimento cujo objectivo é a protecção do capital
investido ou até a obtenção de rendibilidades atractivas para os tomadores,
recorrendo por isso muitas vezes à utilização de operações de cobertura de risco
através de produtos derivados.
Assim sendo, através da exploração dos unit linked, as empresas de seguros
conseguem implementar uma gestão eficiente de capital, traduzida no
incremento do nível de rendibilidade dos capitais próprios.
11
Refira-se que os benefícios fiscais, quando existentes, dependem do tipo de seguro de base ao unit linked.
Estudos específicos - Importância dos unit linked no ramo Vida
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