a abordagem clínica e hemoterápica na doença hemolítica do

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Academia de Ciência e Tecnologia de São José do Rio Preto
A ABORDAGEM CLÍNICA E HEMOTERÁPICA NA DOENÇA HEMOLÍTICA DO
RECÉM-NASCIDO Rh
Ferdinando de Paula Silva
Curso de Hematologia e Banco de Sangue
2011
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RESUMO
A doença hemolítica do recém nascido fator Rh é uma aloimunização á antígenos
eritrocitários, no qual, há passagem de anticorpos IgG (anti-D) da circulação materna através
da placenta para a circulação do feto, reagindo com os eritrócitos fetais, levando-os a
destruição pelo sistema reticulo-endotelial. O anticorpo anti-D é o responsável pela
gravidade da doença hemolítica. Com o resultado dessa hemólise dos eritrócitos fetais
causada pela transferência de anticorpos maternos, pode surgir no feto anemia, icterícia,
hepatoesplenomegalia e, em casos mais severos, anasarca e kernicterus. Embora anticorpos
relacionados ao sistema ABO são a causa mais freqüente de DHRN, a doença hemolítica
fator Rh é a mais grave. As várias formas de apresentação clínica e modos de prevenção da
doença, têm sido cada vez mais dialogados por todos. Assim, foi realizada uma revisão
bibliográfica sobre o tema, sendo relacionados artigos, aos quais aliou-se capítulos de livrostextos, abrangendo além e informações gerais a respeito da doença, mas também a
abordagem clínica, algumas formas de prevenção, tratamento e utilização da hemoterapia ou
medicina transfusional. O diagnóstico laboratorial é determinado, realizando a tipagem
ABO/Rh, pesquisa de anticorpos irregulares (Coombs direto e Coombs indireto), dentre
outros exames laboratoriais. A exsanguineotransfusão e a transfusão intra-uterina têm sido
também utilizadas para o tratamento da severidade da doença. Um nítido acompanhamento
pré-natal da gestante com o seu médico, é de muita importância para a prevenção dos
cuidados da doença.
Palavras-chave: doença hemolítica do recém-nascido, exsanguineotransfusão, hemoterapia,
imunoglobulina anti-D.
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ABSTRACT
The hemolytic disease of the newborn Rh is a alloimmunization red cell antigen in which the
passage of IgG antibodies (anti-D) from the maternal circulation through the placenta to the
fetus circulation reacting with fetal red blood cells cause their destruction by the
reticuloendothelial system. The anti-D antibody is responsible for the severity of hemolytic
disease. As result of hemolysis of fetal red blood cells caused by the transference of maternal
antibodies, it may occur the fetus anemia, jaundice, hepatosplenomegaly and, in severe
cases, anasarca and kernicterus. Although related ABO system antibodies is the most
common cause of DHRN, the Rh hemolytic disease is the most severe. The various forms of
clinical presentation and methods of disease preventions have been more spoken by
everyone. Thus, we performed a literature review on the subject, and related articles, which
teamed up with chapters of textbooks, covering further information about the disease, but the
clinical approach, some forms of prevention, treatment and use of hemotherapy or
transfusion medicine. The laboratory diagnosis is given, performing ABO/Rh irregular
antibodies (direct and indirect Coombs), among other laboratory tests. The exchange
transfusion and intrauterine transfusion have also been used for the treatment of disease
severity. A clear prenatal care of pregnant woman with her doctor is very important for the
prevention of disease care.
Key words: hemolytic disease of the newborn, exchange transfusion, hemotherapy, anti-D
immunoglobulin.
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1 INTRODUÇÃO
O sistema Rh (Rhesus) é o maior e mais complexo sistema de grupos sanguíneos,
compreendendo atualmente 48 antígenos. Descoberto em 1939, tornou-se o sistema de grupo
sanguíneo com maior grau de polimorfismo entre os marcadores conhecidos da membrana
eritrocitária. Os antígenos Rh são codificados por dois genes, altamente homólogos,
localizados no braço curto do cromossomo um: o gene Rh-D, produzindo o antígeno D e o
gene Rh CE, produzindo dois pares de antígenos antitéticos, C/c e E/e. Representa um dos
sistemas de maior interesse clínico, por seu desenvolvimento nas reações transfusionais
hemolíticas, anemias hemolíticas auto-imunes e na doença hemolítica do recém-nascido.
As hemácias humanas têm sido tradicionalmente classificadas como “Rh positivas” e
“Rh negativas”, dependendo da presença ou ausência do antígeno D. Diferentemente dos
antígenos ABO e Lewis, os antígenos Rh estão localizados somente nos eritrócitos e,
portanto, não são encontrados nos fluidos. Os anticorpos do sistema Rhesus (ex.: anti-D) são
geralmente IgG e, raramente, se é o que fazem, fixam complemento. Uma unidade de sangue
D positivo transfundido em um indivíduo negativo pode resultar em formação de anti-D em
70%-95% dos receptores e, por isso, deve ser evitado. Este fato é de particular importância
em mulheres em idade fértil, já que este anticorpo pode causar doença hemolítica do recémnascido grave.
A doença hemolítica do recém-nascido (DHRN) também conhecida por doença
hemolítica perinatal (DHPN) e eritroblastose fetal, se dá pela decorrência de aloimunização a
antígenos eritrocitários, na qual há passagem de anticorpos IgG da circulação materna
através da placenta para a circulação do feto, onde reagem com os eritrócitos fetais, levandoos á destruição pelo sistema reticuloendotelial. Quando uma mulher Rh-D negativa fica
grávida com um feto Rh-D positivo, eritrócitos fetais Rh-D positivos entram na circulação
materna (geralmente durante o parto ou no terceiro trimestre) e sensibilizam a mãe, que
forma anti-D. A mãe também pode ser sensibilizada por abortamento anterior, amniocentese
ou outro traumatismo placentar e transfusão de sangue. Se o pai for heterozigoto para o
antígeno D (D/d), há 50% de probabilidade de o feto ser Rh-D positivo. Anticorpo anti-D é o
responsável pela maioria dos casos graves de DHRN, embora anti-c, anti-E, anti-K e um
amplo espectro de anticorpos sejam encontrados em casos ocasionais. Os sistemas de grupos
sanguíneos clinicamente importantes podem ser vistos na tabela 1.
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Após a primeira exposição ao antígeno D, a produção materna de anticorpos anti-D
têm início. Nas gestações subseqüentes com feto Rh positivos, os aloanticorpos anti-D
maternos, por serem da classe IgG, atravessam a barreira placentária e se ligam aos
eritrócitos fetais, iniciando o processo hemolítico. A investigação laboratorial mostrará
anemia variável com alta contagem de reticulócitos, sendo o bebê Rh positivo, o teste de
antiglobulina (Coombs) positivo e a bilirrubina elevada. Em casos moderados e severos, são
vistos numerosos eritroblastos no sangue, por isto a denominação, eritroblastose fetal. A
anemia hemolítica aloimune está relacionada ao desenvolvimento de aloanticorpos que são
produzidos pelo organismo após exposição a antígenos eritrocitários estranhos. A formação
de aloanticorpos nesses casos depende da intensidade e freqüência da exposição, bem como
da imunogenicidade do antígeno eritrocitário.
Tabela 1 – Sistemas de grupos sanguíneos clinicamente importantes.
Sistemas
Freqüência de anticorpos
Causa de reação hemolítica transfusional
Causa de DHRN
ABO
Quase universal
Sim (comum)
Sim (leve)
Rh
Comum
Sim (comum)
Sim
Kell
Ocasional
Sim (ocasional)
Anemia, não hemólise
Duffy
Ocasional
Sim (ocasional)
Sim (ocasional)
Kidd
Ocasional
Sim (ocasional)
Sim (ocasional)
Lutheran
Raro
Sim (rara)
Não
Lewis
Ocasional
Sim (rara)
Não
P
Ocasional
Sim (rara)
Sim (rara)
MN
Raro
Sim (rara)
Sim (rara)
Li
Raro
Improvável
Não
Fonte: Hoffbrand, A. V.; 2008.
Entre nós, o antígeno Rh D está presente em torno de 85,0% dos indivíduos da raça
branca, em 90,0% á 95,0% dos negros e praticamente em 100,0% dos amarelos e índios.
Ocorrências semelhantes foram apontadas na população americana, relatando 9,2% de
uniões com incompatibilidade Rh entre brancos e 4,5% entre negros. O antígeno Rh D já
está bem desenvolvido e expresso nas hemácias a partir da sexta semana de gestação. A
isoimunização materno-fetal Rh é de grande importância em neonatologia e o conhecimento
da sua fisiopatologia, da terapêutica e da prevenção tem contribuído para uma menor
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incidência nos últimos anos. O conhecimento da transmissão genética constitui um aspecto
mais interessante, pois, em grande parte, explica os mecanismos de imunização. A
diversidade genética entre indivíduos está relacionada com o risco de aloimunização materna
contra antígenos paternos, que não são expressos nas hemácias da mãe. Os outros antígenos
do sistema Rh (C, c, E, e) são menos imunogênicos que o antígeno D, porém podem
sensibilizar a gestante através de mecanismo semelhante ao que ocorre na isoimunização Rh
pelo antígeno D, formando os respectivos anticorpos anti-c, anti-C, anti-E e anti-e. Nesta
situação, a sensibilização materna (aloimunização) poderá ocorrer em gestante Rh positiva
ou Rh negativa. A sinopse fisiopatológica da doença pode ser vista na tabela 2, como se
segue abaixo.
Tabela 2 – Sinopse fisiopatológica da DHRN.
Exposição a
eritrócitos estranhos
(gestações prévias)
Produção de
alo-anticorpos
Coombs
indireto positivo
(mãe)
Alo-anticorpos
maternos ligam-se
aos eritrócitos fetais
Anemia hemolítica
(p/p) extravascular
Coombs direto
positivo (recémnascido)
Fonte: Naoum, F. A.; 2010.
2 A DOENÇA HEMOLÍTICA DO RECÉM-NASCIDO Rh NA CLÍNICA
Em geral, o primeiro filho não é acometido pela aloimunização materna e apresenta
quadro leve de DHRN, reflexo de maior probabilidade de ocorrer hemorragia fetomaternal
tardia no terceiro trimestre ou no momento do parto, em combinação com o predomínio de
anticorpos IgM, além de atraso na produção de IgG na resposta imune primária. Dentre as
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características clinicas da doença hemolítica do recém-nascido, se enquadram as doenças
leve, moderada e grave. Na doença leve está presente a anemia leve com ou sem icterícia. Na
doença moderada, a criança nasce com anemia grave e icterícia podendo apresentar palidez,
edema e hepatoesplenomegalia. Durante a gestação, a bilirrubina não conjugada e outros
metabólicos são transportados através da placenta e eliminados pela mãe. Após o
nascimento, contudo, os recém-nascidos de termo (RNT) não são capazes de metabolizar a
bilirrubina de modo eficaz, em virtude da imaturidade funcional hepática, tornando-se
altamente suscetíveis ao desenvolvimento de encefalopatia bilirrubínica ou de kernicterus.
Quando o nível de bilirrubina não conjugada exceder 250µmol/L (20mg/dl), a deposição de
pigmento biliar nos gânglios da base pode causar kernicterus com espasticidade generalizada
e possibilidade subseqüente de deficiência mental, surdez e epilepsia. Por último na doença
grave, ocorre morte intra-uterina por hidropsia fetal e disfunção hepática. A destruição dos
eritrócitos fetais e anemia resultante estimulam a eritropoiese, no qual a medula óssea do
feto produz eritrócitos em velocidade acelerada, podendo ser observada a presença de células
nucleadas, os eritroblastos em sua circulação, como pode ser observada em um esfregaço na
figura 1, logo abaixo.
Figura 1 – Esfregaço sanguíneo com presença de eritroblastos na DHRN.
Fonte: www.ciencianews.com.br
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Quando a destruição dos eritrócitos é maior que sua produção, aumenta a eritropoiese
extra-medular. O desenvolvimento de doença hemolítica no feto pode ser avaliado pela
velocidade do fluxo sanguíneo na artéria cerebral média, feita por ultra-sonografia com
Doppler, pois a velocidade correlaciona-se com a baixa viscosidade sanguínea causada pela
anemia. Se for detectada anemia, deve ser coletado sangue fetal, pois o exame indicará a
necessidade de transfusão intra-uterina com hemácias Rh-D negativas irradiadas.
O diagnóstico da DHRN pode ser realizado tanto no período gestacional (pré-natal)
como após o nascimento (pós-natal). Testes sorológicos e clínicos, quando realizados nos
momentos adequados durante a gravidez, podem determinar, precisamente, o nível do
anticorpo na circulação materna, o potencial do anticorpo como causador da doença
hemolítica e a gravidade da destruição dos eritrócitos. Logo no início pré-natal, a gestante
deve ser avaliada quanto à história familiar de desordens hemorrágicas ou de transfusão
sanguínea. Testes de laboratório de rotina devem incluir a determinação da
hemoglobina/hematócrito, tipagem ABO e Rh (D), uma procura de anticorpos e
hemoglobinopatias em populações de alto risco. O PAI (Pesquisa de Anticorpos Irregulares)
ou Coombs indireto é realizado para detectar aloanticorpos, da classe IgG, que têm
importância clínica e reajam a 37ºC na fase de antiglobulina. Quando o resultado do PAI for
negativo, é recomendável que o teste seja repetido entre a 20ª e 24ª semana de gestação e,
novamente, por ocasião do parto. Para um resultado positivo, segue-se a identificação
(especificidade) do anticorpo irregular através do painel de hemácias. Muitas mulheres
grávidas Rh negativas possuem anti-D fracamente reativo, particularmente durante o terceiro
trimestre.
A concentração relativa de todos os anticorpos capazes de atravessar a placenta e
causar a DHRN é determinada pela titulação de anticorpos. É uma técnica onde o soro é
diluído seriado e testado contra eritrócitos apropriados para determinar a mais alta diluição
em que um anticorpo específico demonstra reatividade. Cada laboratório deve desenvolver
seus próprios níveis de títulos críticos mediante á revisão do resultado de determinado
número de gestações complicadas por DHRN. Em geral considera-se significativo um título
de 32. Se o título inicial for 32 ou superior, deve ser obtido um segundo título por volta da
18ª á 20ª semanas de gestação.
Desde o desenvolvimento da imunoglobulina anti-Rh, a obstetrícia passou a contar
com um método eficaz para a prevenção da isoimunização pelo fator Rh. Para que esse
recurso seja utilizado de forma eficiente, é essencial que o grupo sanguíneo e fator Rh da
gestante e do cônjuge sejam identificados durante a primeira visita ao serviço pré-natal.
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3 PREVENÇÃO E UTILIZAÇÃO DA HEMOTERAPIA NA DOENÇA
Com base na prevenção, a principal forma de manuseio é prevenir a formação de
anticorpo anti-D em mulheres Rh-D negativas. Isso pode ser obtido pela administração de
pequena quantidade de anticorpo anti-D (IgG), que remove e destrói os eritrócitos fetais
Rh-D positivos antes que eles possam sensibilizar o sistema imunológico da mãe para
produzir anti-D. Deve também ser usada para gestantes Rh-D negativo ou D-parcial, com
ausência de anticorpo anti-D. Além da profilaxia da aloimunização Rh D, a IgG anti-D
também pode ser usada no tratamento de pacientes Rh-D positivo portadores de PTI
(Púrpura Trombocitopênica Idiopática) com o objetivo de reduzir a captura pelo sistema
reticuloendotelial das plaquetas sensibilizadas. As gestantes Rh-D negativas não
sensibilizadas devem receber ao menos 500 unidades (100µg) de anti-D na 28ª e na 35ª
semanas, para reduzir o risco de sensibilização oriunda de hemorragias feto-maternas. Na
tabela 3, logo abaixo, mostra as seguintes utilizações da imunoglobulina IgG.
Tabela 3 – Uso de RhIgG para prevenção de aloimunização na gestante.
Gestação e parto
Antenatal: na 28° semana +
Pós parto: Após o nascimento de RN/D-positivo com doses adicionais, se necessário.
Para HFM (hemorragia feto-materna) maior que 300 ml (15 ml células D-positivo).
Abortamento
Aborto induzido
Aborto espontâneo
Ameaça de aborto
Sangramento antenatal no 2º/3° trimestre
Gestação Ectópica
Amniocentese
Cordocentese
Biópsia de vilo coriônico
Traumatismo abdominal
+ Exceto se o pai biológico for conhecido como D-negativo.
Fonte: Roseff, S. D.; 2006.
10
O termo hemorragia feto-materna excessiva vem sendo habitualmente empregado
para designar aqueles eventos nos quais o volume transferido de hemácias fetais para a
circulação materna supere a capacidade de neutralização conferida pela dose de anti-D
utilizada.
O sangue do cordão dos recém-nascidos de mães Rh-D negativas não sensibilizadas
serão tipificadas para ABO e Rh. Dentre as condutas de rotina, as mulheres Rh-D negativas
com 28 semanas de gestação, obter um teste de PAI/Coombs indireto (procura de anticorpo).
Se não forem detectados anticorpos Rh, administrar 300µg (uma dose) de imunoglobulina
Rh, o que confere proteção por 12 semanas. No parto realizar a determinação do tipo Rh e
teste de Coombs direto no sangue do cordão. Se o bebê é Rh positivo, são administradas
300µg de imunoglobulina Rh á mãe no período de 72 horas após o parto. Se há suspeita de
uma grande hemorragia transplacentária, o teste de Kleihauer-Betke é feito para quantificar o
total perdido, administrando-se 10µg de imunoglobulina Rh para cada volume (mL) de
hemácia fetal. O teste de Kleihauer-Betke estima por coloração diferencial da Hb F o
número de eritrócitos fetais na circulação materna oriundos de hemorragia feto-materna
durante o parto. A chance de sensibilização relaciona-se ao número de eritrócitos fetais
evidenciados. A dose de anti-D deve ser aumentada se o número corresponder à passagem
transplacentária de mais de 4 ml de sangue fetal, na proporção de 125 unidades de IgG antiD para cada volume (mL) excedente. Depois do parto, pode ser usada fototerapia com luz
ultra-violeta. Em bebês com hemólise leve a moderada, o uso da fototerapia pode evitar a
necessidade de exsanguineotransfusão (transfusão de troca), para o tratamento da
hiperbilirrubinemia.
A determinação da severidade da DHRN é possível realizando-se a amniocentese na
26ª a 28ª semanas de gestação quando é medida a bilirrubina no fluido amniótico. A tentativa
de avaliar a dinâmica do processo hemolítico através do estudo do fluido amniótico partiu da
observação de sua cor que, em gestantes normais, é incolor e em casos de DHRN grave,
amarelo vivo. Outra é a transfusão neonatal, com a exsanguíneotransfusão de grande
volume. Esta é efetuada pela reposição parcial do sangue total por hemácias reconstituídas
em plasma fresco congelado (PFC), com determinações do hematócrito a cada seis e 24
horas. As hemácias devem ser frescas (menos de cinco dias) ou lavadas por causa da
sobrecarga de potássio. Em geral, o procedimento deve durar menos de 60 minutos a fim de
reduzir o risco de infecção. Na transfusão neonatal de pequeno volume, o hemoderivado
mais comumente transfundido é o concentrado de hemácias (CH) de modo a tratar a anemia
devida á perda de sangue aguda ou crônica, intra-uterina. Hemácias do grupo O são
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aconselháveis para todos os neonatos, sendo que a dosagem do CH é de 10-15 ml/Kg. Logo,
a exsanguíneotransfusão/transfusão de troca são utilizadas principalmente para a remoção de
níveis elevados de bilirrubina não conjugada e, portanto, para evitar icterícia nuclear. Outras
vantagens da transfusão de troca são a remoção de parte de anticorpo materno circulante,
remoção de eritrócitos sensibilizados, substituição de eritrócitos incompatíveis por eritrócitos
compatíveis e supressão da eritropoiese. Historicamente, os critérios usados para
exsanguíneotransfusões precoce nas primeiras 12 horas de vida incluem a concentração de
bilirrubina no sangue do cordão umbilical excedendo de 3 a 5 mg/dl para recém-nascidos
pré-termo (RNPT), de 5 a 7 mg/dl para recém-nascidos de termo ou taxa de aumento maior
ou igual a 0,5 mg/dl/hora. Complicações de exsanguíneotransfusões são pouco comuns,
ocorrendo em 7% dos recém-nascidos. Como exemplos de possíveis complicações incluem a
hipovolemia e sobrecarga volêmica, as arritmias resultantes do citrato ou da hipercalcemia,
embolia gasosa, trombose da veia umbilical, sepsis bacteriana ou transmissão viral associada
á transfusão.
No entanto, para a prevenção e tratamento da hidropsia fetal, a transfusão intrauterina (TIU) de hemácias é indicada a anemia fetal secundária á aloimunização. Torna-se
necessária uma intervenção na forma de transfusão intra-uterina quando existe algumas
condições, como uma amostra de sangue por cordocentese ter um nível de hemoglobina
abaixo de 10g/d, e no exame por ultra-sonografia, onde é detectada hidropsia fetal. A
transfusão intra-uterina também é indicada quando o hematócrito do feto está abaixo de 25%
a 30%. O objetivo da transfusão é manter o hematócrito fetal acima de 25% a 40%, mas esse
ponto não deve ser excedido para evitar alterações indesejáveis na viscosidade sanguínea no
feto previamente anêmico. A transfusão pode ser feita por via intraperitoneal, mediante á
injeção dos eritrócitos na cavidade peritoneal do feto, onde os eritrócitos podem ser
absorvidos na circulação. Assim que tem início a transfusão intra-uterina, o procedimento é
repetido a cada 2-4 semanas até a 34ª a 36ª semanas de gestação, ou até que os pulmões
estejam maduros, quando poderá ser feito o parto precoce. Como se trata de um
procedimento de risco, recomenda-se a realização de um mínimo de procedimentos
invasivos. A amniocentese e cordocentese têm vários riscos, entre os quais traumatismo á
placenta, o que pode causar um aumento nos títulos de anticorpos devido á provocação
antigênica á mãe, promovida pela hemorragia fetomaterna. As preparações de hemácias para
transfusão intra-uterina devem ser do grupo O (com baixos títulos de hemolisina), Rh-D
negativo, ou negativa para o antígeno correspondente a eventual anticorpo materno.
12
4 OBJETIVO
A história das manifestações patológicas do recém-nascido ligadas á isoimunização
feto-materna teve início no decurso dos primeiros anos do século passado. Entre as doenças
hemolíticas do recém-nascido, destaca-se a do fator Rh, responsável pela gravidade da
doença. Sendo assim, o objetivo deste estudo é abordar o mecanismo da DHRN (fator Rh)
com base em sua clínica e hemoterapia.
5 CONCLUSÃO
A DHRN é uma aloimunização de anticorpos maternos IgG, dirigidos contra os
eritrócitos fetais, sendo uma doença hemolítica grave em comparação com outros antígenos
eritrocitários. Atualmente, a incompatibilidade por Rh D ainda é a mais comum, embora
outras incompatibilidades eritrocitárias venham aumentando em incidência nos centros de
referências. Tendo em vista que a incompatibilidade por Rh D foi a principal preocupação
durante muitos anos, a pesquisa enfatiza o diagnóstico e tratamento da DHRN causada por
anti-D, abordando os aspectos clínicos e hemoterápicos.
Os testes sorológicos e clínicos, como a tipagem ABO/Rh e o PAI realizado durante
o período de gestação, de forma apropriada, podem determinar com precisão o nível de
anticorpos na circulação materna, e também o potencial do anticorpo como o causador da
doença hemolítica e a gravidade da destruição dos eritrócitos. Se dados clínicos e
sorológicos indicam que o feto está ficando anêmico, pode-se lançar mão de intervenções
como a transfusão intra-uterina para tratamento da anemia e para evitar a ocorrência de
doença grave, bem como a exsanguineotransfusão. A gestante deve sempre fazer o
acompanhamento pré-natal com o seu médico, avaliando de modo eficaz, os aspectos
clínicos e quanto á história familiar de desordens hemorrágicas e de transfusão sanguínea. O
conhecimento fisiopatológico e terapêutico na imunização materno-fetal fator Rh é de
grande importância, atribuído á prevenção, faz com que contribua para uma menor
incidência no decorrer dos anos.
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