sa08-20177 - geomorfologia geográfica: o complexo araxá

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
4ª Semana do Servidor e 5ª Semana Acadêmica
2008 – UFU 30 anos
GEOMORFOLOGIA GEOGRÁFICA: O COMPLEXO ARAXÁ-IBIÁ NA
BACIA SEDIMENTAR DO PARANÁ
José Hermano Almeida Pina1
Universidade Federal de Uberlândia – Avenida João Naves de Ávila, 2121, 38408-100, Uberlândia – MG
[email protected]
Danúbia Mamede Pires2
[email protected]
Wendel Rodrigues de Oliveira3
[email protected]
Resumo: O objetivo desse trabalho é apresentar uma caracterização geomorfológica do complexo
Araxá-Ibiá, localizado na mesorregião Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, na porção oeste de
Minas Gerais. Para tanto, usa-se a Geografia como base analítica no sentido de entender os
principais processos antrópicos que influenciam direta e indiretamente na formação do relevo.
Além disso, torna-se importante também o contexto geológico, destacando-se aspectos como
alteração da rocha basáltica, formação da paisagem bem como a fragilidade do relevo devido à
presença do regolito através da influência significativa da ação antrópica através do afogamento
de vale. Cita-se também a relação entre a construção do reservatório e afogamento dos vales, além
do resultado da dinâmica dos processos erosivos. Como conclusão, percebe-se a importância da
análise geográfica dentro do contexto geomorfológico, principalmente quando se trata da
formação do relevo acompanhada das intervenções humanas no meio físico.
Palavras-chave: geografia, relevo, ação antrópica.
1. INTRODUÇÃO
Dentro do contexto da Geomorfologia enquanto um ramo da Geografia é extremamente
importante entender os vários processos referentes à relação sociedade-natureza, contribuindo assim
para as próprias questões epistemológicas geográficas. No caso da natureza, a Geomorfologia
conseguiu, dentro da Geografia Física, uma visibilidade no sentido de repercutir os vários estudos
relacionados à análise da formas do relevo bem como os processos causadores deste (Neto;
Viadana, 2006).
Nesse sentido, o objetivo desse trabalho é apresentar alguns aspectos geomorfológicos
contidos na mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, situada na porção oeste de Minas
Gerais. É dada uma maior atenção aos compartimentos estruturais a exemplo da Bacia Sedimentar
do Paraná, além do Complexo Araxá-Ibiá, estando este último situado no Alto Paranaíba.
Além disso, toma-se como objetivo uma reflexão sobre a alteração da rocha basáltica, a
formação da paisagem e a fragilidade do relevo devido à presença do regolito, levando-se em
conta a influencia significativa da ação antrópica através do afogamento de vale. Destaca-se
também a relação entre a construção do reservatório e afogamento dos vales, além do resultado da
1
Acadêmico do curso de Geografia.
Acadêmica do curso de Geografia.
3
Acadêmico do curso de Geografia.
2
1
dinâmica dos processos erosivos. Por fim, analisa-se também a formação de microbacias e a
concavidade de vertentes, trabalhando-se de forma mais geral em relação aos compartimentos
anteriormente citados, e de forma mais detalhada em relação aos aspectos seguintes.
2. COMPARTIMENTO ESTRUTURAL: BACIA SEDIMENTAR DO PARANÁ
Segundo Nishiyama (1989, p. 9), “Quase totalidade do Triângulo Mineiro está inserida na
Bacia Sedimentar do Paraná que é representada pelas litologias de idade Mesozóica (...)”. Tais
litologias são os arenitos da Formação Botucatu, os basaltos da Formação Serra Geral, e as rochas
do Grupo Bauru. O mesmo autor afirma que “A base deposicional das rochas da Bacia Sedimentar
do Paraná, nas regiões do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, é constituída de rochas
metassedimentares dos Grupos Araxá, Canastra e Bambuí (...)” (Nishiyama, 1989, p. 10).
É possível observar que, em função de uma evolução tectônica tardia, a Bacia Sedimentar
do Paraná não abriga sedimentos antes do período Triássico. Nesse caso, os arenitos eólicos
pertencentes à Formação Botucatu, representam o início da deposição do período Triássico até o
Jurássico. “Em outras áreas do Triângulo Mineiro os arenitos eólicos possuem pequena expressão,
geralmente constituindo corpos lenticulares depositados diretamente sobre as rochas dos grupos
Araxá ou Canastra” (Nishiyama, 1989, p. 10).
No que tange à composição da Bacia Sedimentar propriamente dita, é relevante destacar as
seguintes formações:
• Complexo Goiano: possui os tipos litológicos mais antigos da região, destacando-se os
sedimentos que formaram as rochas metamórficas do Grupo Araxá, Grupo Canastra, e Grupo
Bambuí. Nesse complexo, predominam os migmatitos, gnaisses e granitos;
• Grupo Araxá: nesse grupo destaca-se a significativa área de exposição das rochas nos vales
dos rios Araguari e Uberabinha. É importante ressaltar a ação erosiva dos rios que entalham seus
vales, modificando assim as rochas do Grupo Araxá. Dentro desse contexto, as rochas encontram-se
plenamente modificadas, confirmado-se tal situação através dos xistos e gnaisses;
• Formação Botucatu: essa formação possui pouca expressão no município de Uberlândia de
uma forma geral. Seus arenitos estão situados sobre o embasamento cristalino do Grupo Araxá,
sendo também recobertos pelas rochas vulcânicas da Formação Geral ou do Grupo Bauru;
• Formação Serra Geral: caracteriza-se pela presença de rochas efusivas, sendo estas básicas.
Os basaltos pertencentes à Serra Geral estão presentes em extensas áreas da Região Sul (Rio Grande
do Sul, Santa Catarina e Paraná), Sudeste (São Paulo, Triângulo Mineiro) e Centro-Oeste (Sul de
Goiás e parte do Mato Grosso). No caso do Triângulo Mineiro, Nishiyama (1989, p. 12) destaca que
“(...) grande parte das rochas dessa formação encontra-se recobertas por sedimentos mais recentes
do Grupo Bauru e sedimentos cenozóicos (...)”. Porém, o mesmo autor destaca que as melhores
exposições acontecem nos vales dos grandes rios da região, a exemplo do rios Grande e Paranaíba;
• Formação Adamantina: é caracterizada principalmente pelos arenitos de granulação média e
grossa. Seus arenitos afloram em algumas áreas específicas do município de Uberlândia. Do ponto
de vista mais geomorfológico, “O nível do lençol freático observado nas voçorocas e nas vertentes
dos vales dos rios, de uma maneira geral, é bastante superficial” (Nishiyama, 1989, p. 13);
• Formação Marília: especificamente no Triângulo Mineiro, tal formação é caracterizada por
camadas espessas de arenitos além de conglomerados dispostos sob os níveis carbonáticos
(Nishiyama, 1989). Nishiyama ainda afirma que “A feição morfológica característica da formação
Marília é apresentar relevo de topo e bordas abruptas mantidos pela cimentação mais intensa da
rocha” (1989, p. 14). Segundo Barcelos (1984 apud Nishiyama, 1989), os depósitos presentes na
Formação Marília foram desenvolvidos em regimes torrenciais referentes aos leques aluviais de
clima semi-árido.
Ainda em ralação ao Grupo Araxá, Barbosa et al (1970, p. 21) explica:
Grupo de metamorfitos de fácies epidoto-afibolito, consistindo
essencialmente de micaxistos e quartzitos, com intercalações de anfibolitos. O
2
nome do grupo foi dado por Barbosa (1955) durante os estudos realizados no
Triângulo Mineiro, nos arredores de Araxá. Até que os estudos mais
detalhados sejam feitos inclusive com determinações de idade, vamos
considerar esses xistos como mais novos do que as rochas do complexo
granito-gnaíssico.
Nesse caso, o mesmo autor afirma a existência de xistos pertencentes a esse grupo,
constituindo-se de duas micas. “É comum, se encontrar faixas de xisto com grandes palhetas de
muscovita ou concentrações pegmatóides, como, por exemplo, na estrada Araxá-Ibiá” (Barbosa et
al, 1970, p. 21). Confirma-se ainda a ocorrência de quartzitos em duas situações distintas: a)
situados em leitos delgados próximo à formação de domo do Barreiro; b) localizados próximo a
serra da Pirapetinga, nesse caso em leitos decimétricos, bem como próximo ao rio Quebra-Anzol,
estes em leitos milonitizados4.
Portanto, é possível observar que a bacia sedimentar pode ser considerada como planícies
aluviais as quais se desenvolvem no interior do continente. Nesse tipo de formação, “Há uma
relação estrita entre a natureza e a estrutura das rochas e as formas de relevo” (Guerra; Guerra,
2005, p. 78). Com isso, fica bastante clara a relação entre geologia e geomorfologia, já que o
modelado terrestre presente na bacia sedimentar está diretamente ligado à formação litológica
ligada à geologia.
3. ALTERAÇÃO DA ROCHA
FRAGILIDADE DO RELEVO
BASÁLTICA,
FORMAÇÃO
DA
PAISAGEM
E
Segundo Barbosa et al (1970), existem áreas chamadas de chaminés alcalinas que abrangem
uma parte do Triângulo Mineiro e o sudoeste de Goiás. Estas áreas possuem duas regiões
diferenciadas:
• Planalto Central brasileiro: nessa região podem ser encontrados restos de uma superfície de
aplainamento. Tal superfície possui um pendor5 com cerca de 3 m/km na direção norte e sudoeste;
• Bacia do rio São Francisco: a partir da bacia, sobe-se para o planalto no sentido oeste, onde
está localizada a encosta conhecida como Serra da Mata da Corda. A borda oriental (oeste) do
planalto é, por sua vez, o divisor de águas Paraná-São Francisco.
A partir das divisões geológicas, é possível observar que a superfície de aplainamento
secciona os maciços quartzíticos localizados na região além das rochas pertencentes ao Cretáceo
Superior. “Por isso, é, no mínimo, dessa última idade ou terciária inferior. Foi apelidada de
‘Canastra’ por Barbosa (1955), pós-Gonduana por King (1956) e ‘Pratinha’ por Almeida
(1956)” (Barbosa et al, 1970, p. 19, destaque nosso).
Com relação à formação da paisagem, o mesmo autor considera que foi a partir da superfície
pós-Gonduana que aconteceu a dissecação da região, ao passo que o cráton6 central brasileiro se
elevou de forma gradativa. Dentro de tal perspectiva, são formadas também outras superfícies
aplainadas, classificadas como pediplanos, estes no período Terciário.
No tocante à fragilidade do relevo, destaca-se a questão dos movimentos massa, sendo este
um processo natural podendo ser intensificado pela ação antrópica. No caso das regiões úmidas, o
movimento de massa se dá em formação plástica, através do movimento de material vertente
abaixo, e a instabilidade do material está diretamente ligado com a declividade da vertente. Nesse
contexto, é importante ressaltar que a declividade da vertente relaciona-se com alguns aspectos
importantes, tais como:
4
Destaca-se a presença de milonitos, que de acordo com Guerra e Guerra (2005, p. 427) consiste em uma “Rocha
finamente triturada que aparece comumente junto às linhas de falha”. Portanto, podem ser entendidas como rochas que
são esmagadas ao longo das fraturas e falhas existentes.
5
“Inclinação dos estratos geológicos em relação com o plano horizontal dado pelo nível dos mesmos” (Guerra; Guerra,
2005, p. 419). Com isso, a direção perpendicular ao mergulho é vista como a inclinação.
6
Segundo Guerra e Guerra (op. cit.), são áreas continentais que sofreram pouca (ou nenhuma) alteração ou deformação
desde o período Pré-Cambriano (cerca de 570 milhões de anos atrás).
3
• Geologia: ocorrência de diáclases, fraturas, falhamentos, entre outros. Nesse caso, acontece
uma alteração química da rocha através da sua composição e estrutura, tendo como causa a
penetração da água em aberturas das rochas;
• Solo: nesse caso específico, o fato significativo é a mudança de tamanho de partícula e de
estrutura, além a sua composição. Entre as camadas passam a ocorrer mudanças através de
variações hidrodinâmicas, percebendo-se uma mudança de drenagem. Em função de uma
porosidade fina, na superfície (argila, areia, silte pedaços de rocha) acontece uma percolação fina, já
no regolito (núcleos de rocha e materiais finos) a percolação é maior, em virtude de sua maior
porosidade. A partir daí, o contato do regolito com a rocha faz com que haja um bloqueio da
percolação da água, resultado numa espécie de “escoamento interno horizontal”, resultando em um
processo de afloramento através da saturação do material e escoamento lateral tendo como canal
uma porosidade tubular, também conhecida como piping7.
• Declividade: a questão da declividade e da topografia podem influenciar diretamente na no
movimento de massa das vertentes. Nesse sentido, caso não haja uma concavidade significativa na
vertente (parte intermediária até a inferior), a tendência é ocorrer a descida de blocos, não havendo
assim movimento de massa;
• Vegetação: nos casos em que há vegetação nas partes da vertente (superior, intermediária e
inferior), a chuva é interceptada, diminuindo assim o impacto da água na superfície do solo. Além
disso, a presença da serra pilheira (restos orgânicos no solo) serve como uma proteção da erosão
superficial e torna a percolação da água mais lenta;
• Atividade antrópica: levando-se em conta que o movimento de massa é processo natural, as
ações humanas podem torná-lo mais intenso, modificando de forma não natural várias
características do relevo, aumentando assim sua fragilidade. Dentre essas ações, destacam-se o
desflorestamento, as obras de engenharia (construção de estradas, túneis, atividades de mineração),
entre outras.
4. CONSTRUÇÃO DO RESERVATÓRIO, AFOGAMENTO DOS VALES E PROCESSOS
EROSIVOS
Conforme Baccaro (2001), a maior parte do Triângulo Mineiro está inserida na
morfoestrutura Bacia Sedimentar do Paraná, apresentando como litologias as rochas do Grupo
Bauru (Cretáceo), como as formações Uberaba, Marília e Adiamantina, sotopostas às rochas
basálticas da Formação Serra Geral do Grupo São Bento (Mesozóico). Os Sedimentos Cenozóicos
inconsolidados encontram-se acima das rochas do Grupo Bauru, formando os terrenos de maiores
altitudes. Todo esse pacote sedimentar da Bacia do Paraná na região do Triângulo Mineiro
encontra-se assentado sobre as rochas Pré-Cambrianas do Grupo Araxá, ocorrendo ainda áreas de
afloramento do Complexo Basal ou Granito-gnáissico. Essa estrutura geológica regional e os
processos morfoclimáticos pretéritos e atuais são responsáveis por toda a organização do relevo na
região, resultando na formação de distintos compartimentos geomorfológicos na área.
Cabe ressaltar que as formas de relevo da superfície terrestre são produtos do antagonismo
dos processos endógenos (ligados à dinâmica estrutural da crosta terrestre) e exógenos (processos
ligados à dinâmica interna). Com efeito, o relevo é mantido por uma morfoestrutura (estrutura
geológica) e apresenta características esculturais (morfoescultura), produto da ação climática atual e
pretérita.
Considerando-se as características geológicas, as formas e os níveis de dissecação do relevo
no Triângulo Mineiro, ressalta-se que na área de relevo intensamente dissecado, denominada por
Baccaro (1991), que corresponde à borda da extensa chapada Araguari-Uberlândia, estendendo-se
até os rios Parnaíba e Grande, vem sendo intensamente dissecada, entalhada pelos seus afluentes,
mostrando vertentes abruptas, corredeiras e cachoeiras. Apresenta uma porção mais elevada entre
7
Processo de formação de dutos (Guerra; Guerra, 2005).
4
700 m e 800 m, com topos aplainados e alongados, prolongando-se em forma de espigão entre as
sub-bacias afluentes dos rios Paranaíba, Araguari, Uberabinha e outros; e outra porção mais
rebaixada e voltada para os rios Araguari e Paranaíba entre 640 m e 700 m, separada do nível de
cimeira a 800m por rupturas de declives mantidas por derrames basálticos. As feições morfológicas
desse compartimento estão relacionadas à litologia: o basalto e, predominantemente, as rochas do
Grupo Araxá. Nas porções de ruptura das vertentes estão situadas as maiores declividades, por volta
de 25 a 40°, relacionadas, geralmente, ao afloramento de basalto, atenuadas por algumas rampas
coluviais. Nelas há solos férteis originários de material detrítico da alteração do basalto e que estão
sofrendo intensos processos erosionais, com muitos canais pluviais e ravinas.
Um fator importante no condicionamento dos processos erosivos de ravinamento é a maior
inclinação das vertentes, onde as culturas ligadas a pastagens não se apresentam em curvas de nível;
ficando bastante alta a intensidade do ravinamento. Ademais, ao longo do Rio Araguari, aparece o
relevo do tipo Denudacional Convexo o qual chamamos de Canyon do Araguari em função de seu
arranjo morfológico muito inclinado com intervalos de curvas de nível variando entre 50 m e 150
m. Nesta unidade, as variações do grau de entalhamento dos vales são fortes e as dimensões
interfluviais são médias, ou seja, o relevo apresenta-se bem encaixado com ramificações de
drenagem bem próximas umas das outras caracterizando o relevo como um modelado do tipo
Canyon. As rupturas de declive e os rebordos erosivos estão associados principalmente à mudança
litológica da superfície, ou seja, nos patamares onde os afloramentos basálticos da Formação Serra
Geral estão bem nítidos. Os processos erosivos de ravinamento apresentam-se com pouca
intensidade e de forma bem isolada, estabelecendo quase na totalidade em áreas de vertentes do tipo
côncava.
Na porção nordeste, o relevo do tipo Denudacional Aguçado delimitado por uma linha de
rebordo erosivo, sobressaltando-se em meio ao Canyon do Araguari, indica uma superfície bem
inclinada, com algumas cristas e topos residuais em sua parte mais alta. Apesar de não ser em
grande escala, as veredas estão presentes nas cabeceiras de drenagens e, em menor intensidade, as
planícies fluviais ao longo do leito de alguns afluentes secundários do rio Araguari.
Devemos destacar também que os ravinamentos e as voçorocas, tipos de processos erosivos,
ocorrem preferencialmente nos morros e colinas da Faixa de Dobramento e dos Planaltos Tabulares,
onde a vegetação natural foi substituída por pastagem e atividades agrícolas. As erosões lineares são
uma das mais impressionantes feições de relevo da região. Mudanças no escoamento superficial, na
infiltração e no nível do lençol freático acabam por acelerar os processos erosivos que são naturais
na região, criando grandes cicatrizes, especialmente na área com embasamento sedimentar.
Em vertentes elaboradas sobre rochas metamórficas com fina camada intemperizada e onde
os horizontes orgânicos superficiais foram removidos, a água de chuva geram intenso escoamento
superficial e em seguida concentrado criando incisões nas vertentes. Estas incisões transformam-se
em ravinas e pequenas voçorocas, afetando principalmente as cabeceiras de drenagem. Um
inventário feito pela CEMIG8 em 1995 quando da construção da Represa de Nova Ponte encontrou
325 voçorocas na área de influência (aproximadamente 500 km2) com 134 voçorocas no interior da
área afetada pelo lago e 191 na área de entorno imediato.
Estudos realizados no município de Uberlândia por Baccaro (1991) indicam um atrelamento
entre a ocorrência de voçorocas e as vertentes com declividades entre 5% e 10%, geralmente
associadas à presença de rupturas de declive em afloramentos de crostas lateríticas. Ademais, as
práticas agrícolas têm mudado nos últimos anos e o plantio direto tem sido adotado na maioria das
fazendas, diminuindo sensivelmente a erosão laminar. Esta técnica que consiste na manutenção da
palha, folhas e galhos na própria superfície, protegendo o solo a nova safra é preparada. Outra
prática adotada em áreas propensas a erosão laminar é a construção de terraços seguindo as curvas
de nível do terreno, impedindo a propagação da erosão laminar vertente abaixo.
A irrigação e o consumo urbano são os principais tipos de uso da água dentro da bacia do
Rio Araguari, cada uma trazendo diferentes impactos ambientais sobre os recursos hídricos. Nas
áreas urbanas os principais problemas são a locação e distribuição dos poços, sendo que muitas
8
Companhia Energética de Minas Gerais.
5
vezes existe uma concentração de poços em pequenas áreas. A água bombeada é usada para
consumo humana ou atividades industriais. Na área urbana de Araguari a depressão do lençol
freático foi monitorada em 111 poços entre setembro de 1998 e outubro de 1999, os resultados
mostram que na estação seca o nível da água diminui aproximadamente devido ao bombeamento.
Não existe levantamento com longa data a respeito deste fenômeno, mas com o crescimento da
demanda e conseqüente aumento da perfuração de novos poços a situação tende a piorar em um
futuro próximo.
Nas superfícies tabulares recobertas por latossolos a irrigação é extensivamente utilizada
para aumentar a produção e a cada ano são necessárias mais fontes de água. Em muitas fazendas a
solução utilizada para o abastecimento de água é a perfuração de poços e bombeamento da água
para a irrigação. O principal sistema de irrigação utilizado é o pivô central com aspersão de água
sobre as culturas. Este sistema ao lançar o spray de água sobre as plantas permite uma forte
evaporação, e conseqüentemente uma parcela da água bombeada do subsolo é perdida para a
atmosfera. A solução utilizada para evitar este problema é a substituição do sistema pela irrigação
por gotejamento, que é um sistema que trabalha com baixa pressão, onde as perdas de água são
mínimas. Em muitas áreas a localização dos poços não é controlada e acabam interferindo
mutuamente um nos outros, causando aprofundamento do nível do lençol freático local e em casos
não raros a perda dos poços.
O aumento das áreas irrigadas criou uma superexploração dos recursos hídricos em toda a
bacia hidrográfica. Um dos maiores problemas é o excessivo bombeamento de água dos canais
fluviais a partir de pequenas barragens construídas nas fazendas. Estas pequenas barragens formam
lagos de onde a água é captada e bombeada para as áreas de cultivo. Estas operações acabam por
diminuir o fluxo de água a jusante e causa também alterações na umidade do solo próximo aos
lagos e das áreas irrigadas. Nos maiores rios da bacia, como o Araguari e Quebra Anzol os efeitos
desta prática não são sentidos, porém nos tributários menores e nas nascentes chega-se ao final da
estação seca a ocorrer o total desaparecimento dos fluxos hídricos. A jusante de pequenos
barramentos os canais de primeira ordem chegam a desaparecer.
As áreas urbanas localizadas na bacia hidrográfica do rio Araguari tiveram um crescimento
rápido especialmente após a década de 60 e apoiadas nos planos governamentais de
desenvolvimento e ocupação do cerrado. Seguindo a explosão demográfica ocorrida em todo o
Brasil, o ambiente urbano também teve um crescimento acentuado. Os principais impactos que
afetam as áreas urbanas estão associadas ao planejamento deficiente do escoamento de águas
pluviais e alterações nos canais fluviais.
Nas áreas urbanas os dois principais impactos ambientais são as inundações e o surgimento
de voçorocas. As inundações ocorrem porque os canais fluviais não suportam as altas vazões
propiciadas pela intensa impermeabilização do solo urbano e conseqüente geração de fluxos rápidos
dos topos e vertentes para o fundo de vale. A ocupação dos fundos de vale e planícies por ruas e
avenidas e conseqüente construção de galerias subterrâneas acaba por impedir o espalhamento da
água das chuvas pelas áreas onde ela anteriormente aconteceria em condições naturais.
Por outro lado, os canais fluviais que ainda se encontram em condições naturais, também
sofrem um processo de aprofundamento de seu fundo e erosão das margens em função do aumento
da intensidade das vazões nas cheias. A erosão das margens dos canais com exposição dos
depósitos Holocênicos e Pleistocênicos marginais. As soluções de engenharia mais simples, como a
construção de galerias e murros de arrimo, não resolvem os problemas, pois atacam apenas os
efeitos e não as causas. Uma abordagem geomorfológica é necessária para o entendimento da
fragilidade do ambiente e sua dinâmica, tentando resolver os problemas em função de suas causas.
Estudos indicam que a partir de chuvas de 40 mm/h o aumento do escoamento é
extremamente forte e o escoamento extravasa das galerias para ruas e avenidas, que passam a
funcionar como canal de escoamento em direção aos fundos de vale. Estas inundações acabam por
gerar problemas aos moradores, como a quebra de murros e destruição da pavimentação alfáltica,
bem como danos a veículos.
6
As voçorocas urbanas são geradas a partir das cabeceiras de drenagem onde são alocadas
águas pluviais escoadas de áreas impermeabilizadas. Sua evolução é condicionada também a
mudanças no nível do lençol freático, fato devido ao aprofundamento dos canais e mudanças do
nível de base local. Associado a isto, em algumas áreas, como no caso do Córrego Lagoinha
localizado na Cidade de Uberlândia, observa-se que cortes e desaterros acabam por contribuir para a
formação de ravinas e voçorocas.
Além disso, o vale do Rio Araguari possui uma morfologia muito favorável à construção de
barragens. É profundo e estreito, com perfil longitudinal apresentando diversas rupturas de declive,
conformando corredeiras e cachoeiras. Aproveitando esta situação foram construídas as Usinas
Hidrelétricas de Nova Ponte e Miranda, e duas outras se encontram em fase de estudo, sendo sua
construção prevista para esta década.
A Usina de Nova Ponte foi construída entre 1987 e 1993. A barragem possui 141 metros de
altura e criou um lago com 443 km2 e acumula um volume de 12,8 bilhões de m3. Os impactos nos
meios sociais e biológicos ocorreram, mas ainda geram efeitos presentemente. A população da
cidade de Nova Ponte teve que ser transferida, pois a área urbana encontrava-se abaixo do nível de
inundação. Uma nova cidade foi construída a aproximadamente 3 km de distancia e mais de 4500
pessoas tiveram que ser removidas. Muitas cachoeiras e corredeiras foram alagadas e áreas
turísticas e de lazer foram substituídas pelo lago e novas áreas atrativas foram criadas.
A fauna aquática do rio foi totalmente modificada com a introdução de espécies adaptadas
ao ambiente lêntico. Com a grande variação do nível de água do lago, chegando nas estações secas
a uma depleção de mais de 20 metros, uma faixa situada na área de flutuação está sujeita a erosão,
gerando muitas ravinas. A Usina de Miranda foi construída entre 1994 e 1996 e enchida em 1997.
Possui 79 metros de altura e criou um lago de 51,25 km2 e volume de água de 1,12 bilhão de m3.
Esta usina criou os mesmo impactos da Usina de Nova Ponte, com exceção a remoção urbana e
ainda apresenta como diferencial a criação de loteamento de lazer em seu entorno.
Com a construção de duas novas usinas, Capim Branco I e II, o fundo de vale do rio
Araguari será totalmente transformado em lagos artificiais por mais de 150 km, com total
transformação do fluxo da água, alterações no nível do lençol freático, características climáticas
locais e fauna aquática. Outros impactos devidos à construção de barragens são os abalos sísmicos
devido à acomodação de camadas rochosas em função da pressão exercida pela massa de água
acumulada em superfície.
Nas proximidades da represa de Miranda foram medidos abalos de 3,0 pontos na Escala
Richter, causando danos a construções e pavimentos. Com a variação do nível de água do
reservatório alguns problemas são observados na área rural, especialmente em relação ao
rebaixamento de lençol freático, com conseqüente ressecamento de nascente e poços. A ação de
marolas causa danos a construções, como piers e murros construídos na proximidade do lago.
5. FORMAÇÃO DE MICROBACIAS E CONCAVIDADE DE VERTENTES
A forma de uma paisagem depende diretamente da interação das estruturas que compõem o
relevo, a analise e estudo das vertentes e dos fluxos hídricos, é de grande importância para entender
o modelado.
Segundo Christofoletti (1974), vertente é uma forma tridimensional que foi modelada pelos
processos de denudação, sendo estes atuantes no presente ou no passado, e representando a conexão
dinâmica entre o interflúvio e o fundo do vale. O mesmo autor ainda afirma que existem dois tipos
de vertentes: as endogenéticas e as exogenéticas. A primeira se origina de processos do interior da
Terra (orogênese, epirogênese e vulcanismo). Já a segunda, são resultados de processos que
ocorrem na superfície terrestre, ou próximo dela (meteorização, movimentos de massa, ablação,
transporte, deposição), esses dois processos se interagem para produzir as formas da superfície
terrestre (Christofoletti, 1974).
As formas da vertente são os resultados dos processos sofridos tanto no passado como no
presente, o que possibilita através desta, estudos das condições ambientais, nas quais foram
7
formadas. Pelo estudo das várias formas topográficas e dos seus depósitos colúvio-aluvionares é
possível deduzir quais as condições ambientais prevalecente durante sua elaboração e, também até
certo ponto, concluir quais foram os processos que atuaram no seu desenvolvimento (Bigarella,
1965).
Como já citado, a vertente é dinâmica, portanto possui variadas formas oriundas de
processos morfogenéticos, dentre esses modelos, encontra-se a vertente côncava que “(...) consiste
no conjunto de todas as partes de um perfil de vertente no qual não há aumento dos ângulos em
direção a jusante” (Christofoletti, 1974, p. 34) e essa concavidade nas vertentes caracteriza-se pela
ação erosiva do escoamento concentrado que formam diferentes configurações de vales.
Quando se pensa em microbacias, é imprescindível que se façam considerações a propósito
de sua relação com a vertente, pois é nesta parte do relevo que as cabeceiras de drenagem se
formam dando origem aos rios. As vertentes abrangem a maior parte da paisagem, fornecendo água
e sedimentos para os cursos de água que drenam as bacias hidrográficas.
A bacia hidrográfica é um sistema geomorfológico aberto que recebe energia através de
agentes climáticos e perde através do deflúvio. A bacia hidrográfica como sistema aberto pode ser
descrita em termos de variáveis interdependentes, que oscilam em torno de um padrão e desta
forma, uma bacia mesmo quando não perturbada por ações antrópicas, encontra-se em equilíbrio
dinâmico (Lima, 1994). Vários fatores influenciam esse equilíbrio dinâmico, a exemplo do teor de
umidade do fundo dos vales e do transporte de sedimentos e assoreamento causados pelos
desmatamentos, além da erosão das encostas. Essas perturbações influem no comportamento dos
diversos tipos de canais de drenagem, modificando temporariamente sua extensão relativa.
Contudo, segundo Lima (1994) o conceito de microbacia é um tanto vago, já que não existe
um limite de tamanho para a sua caracterização. Ainda de acordo com a autora, do ponto de vista
hidrológico as bacias hidrográficas são classificadas em grandes e pequenas não com base em sua
superfície total, mas nos efeitos de certos fatores dominantes na geração do deflúvio. Define-se
então microbacia como sendo aquela cuja área é tão pequena que a sensibilidade a chuvas de alta
intensidade e às diferenças de uso do solo não seja suprimida pelas características da rede de
drenagem.
Os processos físicos que moldam continuamente os leitos dos cursos d’água, que vão desde
intervalos de recorrência curtos das cheias anuais, até fenômenos mais intensos das enchentes
decenais e seculares, impõem, também, a necessidade de se considerar um padrão temporal de
variação da zona ripária” (Gregory et al, 1992).
Com relação ao processo de formação, aumento e recuo da microbacia
[...] durante uma chuva, a área da microbacia que contribui para a formação
do deflúvio resume-se aos terrenos que margeiam a rede de drenagem, sendo
que nas porções mais altas da encosta a água da chuva tende principalmente
a infiltrar-se e escoar até o canal mais próximo através de processo subsuperficial.” (Lima, 1995, p.3).
Ainda segundo Lima (1995), com o prolongamento da chuva, estas áreas de origem tendem
a se expandir, não apenas em decorrência da expansão da rede de drenagem, como também pelo
fato de que áreas críticas da microbacia, tais como áreas saturadas, áreas de solo mais raso, etc.
participam da geração do escoamento direto.
A variação climática tem grande influência nos processos das microbacias, assim as
diferenças de clima dão características próprias à microbacia. Segundo Lima (1995), em clima
úmido, o escoamento superficial raramente ocorre, a não ser em partes isoladas da microbacia, onde
existem condições de baixa infiltração, ficando restrito. Nas demais partes da microbacia, água da
chuva tende antes a se infiltrar, alimentando o escoamento sub-superficial, que por ser rápido
participa também do escoamento direto da chuva.
Alguns fatores determinam a formação das microbacias nas vertentes, sendo eles:
falhamentos ou fissuras nas vertes que facilitam o escoamento e a erosão na área; solo nu,
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diminuindo assim o poder de infiltração da água no solo; o nível do lençol freático e o nível de base.
Estes são alguns dos fatores que têm maior importância para dar início ao processo de formação das
microbacias nas vertentes.
6. REFERÊNCIAS
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BACCARO, C. A. D. et al. Mapa geomorfológico do Triângulo Mineiro: uma abordagem
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Natureza. Uberlândia: IG/UFU, v. 3 n. 5 e 6, jan./dez., 1991, pp. 37-42.
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v. 3, 1965, 269-278.
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GUERRA, A. T.; GUERRA, A. J. T. Novo Dicionário geológico-geomorfológico. 4. ed. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
GREGORY, S.V. et al. An ecosystem perspective of riparian zones. In: BioScience, v. 8, n. 41,
1992, pp. 540-551.
LIMA, W.P. Função hidrológica da mata ciliar. In: Simpósio sobre Mata Ciliar. Fundação Cargill,
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NETO, R. M.; VIADANA, A. G. Abordagem biogeográfica sobre a fauna silvestre em áreas
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NISHIYAMA, L. Geologia do município de Uberlândia e áreas adjacentes. In: Sociedade &
Natureza. Uberlândia: IG/UFU, v. 1, n. 1, junho, 1989, pp. 9-16.
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