a gestante exposta ao ruído: efeitos auditivos para o feto

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CEFAC
CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA
AUDIOLOGIA CLÍNICA
A GESTANTE EXPOSTA AO RUÍDO:
EFEITOS AUDITIVOS PARA O FETO
Monografia de Conclusão
do Curso de Especialização
em Audiologia Clínica.
Orientadora:
Miriam Goldenberg
GIOVANA VERRI
PORTO ALEGRE
1999
CEFAC
CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA
AUDIOLOGIA CLÍNICA
A GESTANTE EXPOSTA AO RUÍDO:
EFEITOS AUDITIVOS PARA O FETO
GIOVANA VERRI
PORTO ALEGRE
1999
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
JUSTIFICATIVA .................................................................................. 3
2-DISCUSSÃO TEÓRICA
2.1- Efeitos da Exposição Fetal ao Ruído ............................................... 4
2.2- Perda Auditiva Induzida Pelo Ruído (PAIR) ................................... 15
2.3- Conceitos e Classificação dos Ruídos ........................................... 18
2.4- A Faixa de Audição Humana ........................................................... 19
2.5- A Relação Mãe x Bebê .................................................................... 20
3- CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................... 23
4- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
5- ANEXOS
INTRODUÇÃO
A audição é um dos sistemas mais elaborados e sensíveis do
organismo humano. Há muito tempo a ciência vêm investindo no estudo
desse sistema, de modo a possibilitar hoje o diagnóstico precoce de
muitas alterações auditivas, permitindo intervenções terapêuticas cada vez
mais eficazes.
Um estudo publicado durante a 1ª Semana Nacional de Prevenção
da Surdez comprovou que o brasileiro está perdendo a audição cada vez
mais cedo. Nas últimas décadas, os estudos sobre a perda induzida pelo
ruído (PAIR) foram ampliados, colaborando para descobertas em diversos
setores,
envolvendo
inclusive
análises
específicas,
como
a
de
trabalhadoras gestantes.
A participação da mulher no mercado de trabalho aumentou muito
nos últimos anos, elevando significativamente o número de mulheres
gestantes que trabalham fora do lar. O grande número de trabalhadoras
gestantes expostas ao ruído em suas atividades profissionais implicou em
um aumento do número de fetos expostos a riscos ambientais como o
estresse e o ruído.
Estes fatores ambientais, comprovadamente nocivos à saúde do
adulto, passaram então a ser investigados mais profundamente quanto
aos possíveis efeitos deletérios no bebê em gestação.
O desenvolvimento da audição inicia por volta do 5º mês de
gestação, mas o feto não parece estar preparado para os estímulos
sonoros externos ao corpo da mãe. Estudos recentes de Niemtzow (1993)
revelaram que ruídos de 60 db a 80 db produzem estresse no concepto, e
acima de 80 db são nocivos à saúde fetal.
Conscientes disso, os estudiosos da área empenharam-se em
analisar os efeitos da exposição do feto a ruído intenso, principalmente no
terceiro trimestre da gestação e no recém-nascido. Esses estudos
procuraram determinar o nível de exposição a ruído necessário para
alterar o desenvolvimento da audição e da linguagem bem como as
situações nas quais estes danos podem ocorrer, visando a prevenção e a
orientação das gestantes.
JUSTIFICATIVA
A gestação é um momento de muita expectativa para os pais, em
especial para a mãe, que durante nove meses prepara-se para receber
seu filho, imaginando-o com perfeita saúde.
No mundo atual, a gestante não permanece protegida e
resguardada, mas leva uma vida normal, com todas as implicações do
ritmo de vida da mulher contemporânea. Especialmente no seu ambiente
de trabalho, muitas vezes ela não encontra condições ideais, adequadas a
essa nova etapa do ciclo vital.
As trabalhadoras gestantes devem porém, estar conscientes sobre
a sua condição e sobre como zelar pelo bem-estar de seu filho, evitando
exercícios em excesso, não fumando, não ingerindo bebidas alcoólicas,
não se expondo a situações de risco como traumas físicos ou emocionais.
O ruído deve ser um dos aspectos a ser observado, tendo em vista os
riscos que ele pode oferecer ao sistema auditivo fetal.
Desta forma, justificam-se os estudos que analisam as condições
de trabalho da gestante, principalmente no que diz respeito ao ruído
ambiental a que está exposta, uma vez que este pode potencialmente
atingir o desenvolvimento do sistema auditivo fetal, pela importância que
terão no sentido do esclarecimento e da prevenção do problema.
DISCUSSÃO TEÓRICA
Efeitos da Exposição Fetal ao Ruído
A audição é um dos sentidos que traz informações importantes
para o desenvolvimento humano. O impacto das alterações auditivas dáse principalmente sobre os aspectos lingüístico e psicossocial do
indivíduo.
Russo e Santos (1994) definem a audição como um processo de
desenvolvimento
da
capacidade
de
recepção,
reconhecimento,
identificação e discriminação dos estímulos sensoriais auditivos. As
pesquisas do desenvolvimento auditivo mostram, segundo Northen e
Downs (1989), que a partir da vigésima semana de gestação o feto normal
já demonstra reações aos estímulos sonoros, percebidas através da
mudança da freqüência dos batimentos cardíacos fetais e associados
freqüentemente a movimento corporal do concepto.
Outras pesquisas demonstraram também que o feto pode detectar,
responder e diferenciar sons, assim como a sua intensidade e altura. O
feto tem a capacidade de ouvir e desenvolver memória dos sons intraútero.
Na década de 60 e 70, surgiram várias pesquisas utilizando
procedimentos com microfones de via aérea, passados através do colo
uterino da gestante durante o trabalho de parto. Bench (1968) e Grinwade
(1970) descobriram assim, que a média de atenuação sonora era de 25
db nas freqüências de 125 a 500 Hz, e maior que 70 db em 4 kHz. Desta
maneira, acreditou-se que o feto crescia em um ambiente praticamente
privado de sons externos aos do corpo da mãe.
Em 1982, Vince et al utilizou um hidrofone calibrado em uma ovelha
prenha e descobriu que para freqüências abaixo de 250 Hz a redução de
pressão sonora através dos fluídos e tecidos maternos era menor que 5
db. Nesse mesmo ano, Daniel e Laciack, através de um estudo de grupo,
provaram que 35 de 75 crianças cujas mães foram expostas durante a
gestação a níveis de ruído de 100 db SPL tiveram perda auditiva de 20 a
55 dbHL nas freqüências agudas.
Com base nos estudos anteriormente citados, Lalande et al (1986)
iniciaram suas pesquisas e sugeriram que crianças nascidas de mães
expostas a alto nível de ruído durante a gestação, tinham grandes chances
de apresentar perda auditiva, enquanto crianças nascidas de mães que
não foram expostas tinham menor risco.
Em seus estudos analisaram 131 crianças entre 6 e 10 anos, cujas
mães foram expostas por nove meses a variáveis níveis de ruído industrial,
divididas em três grupos: de 65 a 75 dbA, de 75 a 85 dbA e de 85 a 95
dbA. Foi considerada perda auditiva significativa quando as médias eram
maiores que 10 dbA para 1000 e 4000 Hz, 15 dbA em 500 e 6000 Hz e 20
dbA para 8000 Hz. Usando este critério, 31% das crianças testadas
apresentavam perda auditiva em um ou ambos ouvidos. A maior perda
encontrada estava no grupo de maior exposição. Concluiu-se, então que é
de 3 a 4 vezes maior a possibilidade de perda auditiva significativa em
crianças cujas mães foram expostas durante a gestação a níveis de ruído
maiores que 85 dbA, quando comparadas às crianças cujas mães foram
expostas a intensidades menores.
Baseado nesses estudos Lalande et al (1986) propôs o limiar de
85 dbA como limite máximo para as gestantes trabalharem, levando em
consideração a necessidade de excelente acuidade auditiva em crianças
para o desenvolvimento da linguagem e da fala.
Da mesma forma Smeja concluiu em seus estudos de 1979 que
gestantes trabalhando com intensidades abaixo de 90 dbA não estariam
expondo o desenvolvimento auditivo de seus bebês a riscos significativos.
Em outra pesquisa realizada em 1987, Ohel et al examinaram 40
neonatos, um ou dois dias após o nascimento, sendo 20 deles expostos a
estimulação sonora vibratória durante o trabalho de parto, e outros 20 sem
estimulação. Foi usado para este estudo clínico, o “ Eletrolarynx “, modelo
5 B, que analisa a freqüência de 750 e 1000 hz com intensidade de 110
db, e que, colocados sobre o abdômen materno, geravam três estímulos
de 5 segundos de duração cada, atingindo o feto no momento do parto.
As respostas obtidas foram acelerações da freqüência cardíaca
fetal depois de cada estimulação. Não houve diferença na primeira onda
de latência e na transmissão para o tronco cerebral quando comparados
os grupos. Ambos tinham limiares de respostas similares no nervo auditivo
e tronco cerebral, cujas respostas não passavam nunca de 50 db.
Esse estudo não demonstrou efeitos danosos quanto às respostas
de nervo auditivo e de tronco cerebral nos neonatos após as estimulações
sonoras intra-útero.
Em 1991, Arulkuman et al utilizaram o teste de estimulação
acústica fetal para avaliar a possibilidade de trauma acústico em crianças
com 4 anos de idade. Das 465 crianças que foram expostas a
estimulação, 31 apresentaram alterações conforme avaliação auditiva.
Depois de exames mais detalhados foram encontradas 12 crianças com
problemas de excesso de cerumem (tampão), 15 com infecções de vias
aéreas superiores e duas com otite de repetição. Essas crianças foram
reavaliadas depois do tratamento adequado e apresentaram audição
normal. Nas duas crianças restantes encontrou-se perda auditiva leve
bilateral em um caso (cuja mãe tinha perda auditiva similar), e em outro,
perda auditiva sensorioneural profunda bilateral sem causa esclarecida.
Os pesquisadores acreditam que o estudo não apresentou os
resultados esperados, ou seja, a perda auditiva fetal por trauma acústico é
atenuada, devido a proteção da parede abdominal e do líquido amniótico.
Também levou-se em consideração a possibilidade de duração
insuficiente da exposição aos estímulos acústicos.
Os autores acrescentam que a placenta e o líquido amniótico
ajudam na atenuação sonora desde o início do desenvolvimento
embrionário. No início da gestação, o feto encontra-se imerso em
aproximadamente 30 ml de líquido amniótico, o qual aumenta
progressivamente até atingir 600 a 700 ml na gestação a termo, para
permitir sua acomodação e desenvolvimento.
O Comitê de Audição, Bioacústica e Biomecânica (1993) realizou
pesquisas que possibilitaram descrever a atenuação da placenta e do
líquido amniótico no feto humano como sendo de 20-25 db para a
freqüência de 200 Hz, 25-30 db para 500 Hz, 40 db para 1 kHz, 50 db
para 2 kHz e 70 db para 4 kHz e as outra freqüências agudas. Fica
evidente assim que as freqüências graves são as menos atenuadas por
estas estruturas.
Relatou-se também que o nível de ruído de fundo aproximado na
cabeça do feto é de mais ou menos 85 db com picos de 95 db em
sincronia com o pulso cardiovascular da mãe.
Preoupados com este fato, mais pesquisas foram realizadas para
que pudessem afirmar que o feto humano tolera de 85 a 95 db para ruído
de fundo, analisado no útero materno. Os dados de atenuação permitem
extrapolação para o ambiente de níveis de exposição ao ruído para a
gestante que não excedam o nível de ruído de fundo para o feto: 105 db
para 200 Hz, 110 db para 500 Hz, 125 db para 1 kHz, 135 para 2 kHz e
155 db para as freqüências a partir de 4 kHz.
Em 1992 Gerhardt e col. utilizaram ovelhas para a realização de um
estudo para avaliar a eficiência do sistema auditivo fetal, mais
especificamente, para saber o quanto é possível isolar sons externos da
audição fetal. Foram colocados cirurgicamente eletrodos em contato com
a janela redonda do feto de uma ovelha com nove meses de gestação
para testar as freqüências de 125 Hz a 2 kHz. Através de microfones
inseridos na cóclea foi possível concluir que o isolamento sonoro é de 11
db para a freqüência de 125 Hz, 19.8db para 250 Hz, 35.3 db para 500
Hz, 38.2 db para 1000 Hz e 45 db para 2000 Hz.
O estudo de Gerhardt e col. é de grande importância, uma vez que
possibilita concluir que o sistema auditivo fetal quando imaturo é mais
suscetível a danos em seu desenvolvimento, e ainda classifica as
freqüências graves como mais frequentemente as causadoras de danos
nas células do ouvido interno.
As pesquisas realizadas por Griffiths (1994) utilizaram testes como
o BERA ou ABR (Auditory Brainstem Response). Foram colocados
eletrodos no útero de uma ovelha grávida e um oscilador ósseo no
pescoço do feto, utilizando uma intensidade de 120 db SPL por 16 horas,
para analisar as freqüências de 500 Hz a 4 kHz. Novamente, os resultados
deste estudo demonstraram que sons externos podem penetrar o útero
materno e resultar em alterações nas respostas do sistema auditivo fetal.
Huang e Gerhardt (1997) com um estudo comparativo ao de
Gerhardt (1992) obtiveram achados confirmando a facilitação de sons
graves através do útero materno, o que ocasiona danos nas células do
ouvido interno.
Richards (1992) pesquisou oito gestantes e procurou determinar o
nível de pressão sonora no qual alguns ruídos e vozes eram atenuados ou
aumentados conforme a sua passagem pelo útero e conseqüentemente
para o feto. O autor pôde constatar que as freqüências graves (125 Hz, por
exemplo) geradas por estimulação externas à mãe aumentaram em média
3.7 db. A máxima atenuação obtida foi de 10 db para a freqüência de 4
kHz, a qual aumentou gradativamente.
A atenuação sonora foi levemente através do ventre materno do
que pelo dorso. O nível sonoro intrauterino aumentou para a voz materna
em média 5.2 db. O pesquisador considerou estatisticamente importante
estes dados e alertou sobre os riscos para a audição fetal quando há
exposição da gestante a ruídos intensos.
Os achados de Nurmiten (1995) indicam a correlação entre ruído e
estresse como sendo importantes dados no ambiente de trabalho para a
gestante. Nurmiten afirma que o ruído ocupacional em um nível
aproximado de 85 dbA ou mais, por oito horas diárias, pode resultar em
bebês com baixo peso ao nascer,
e até mesmo em interrupção da
gestação. O autor não descarta a possibilidade de a exposição a altos
níveis de ruído ser um dos fatores envolvidos na etiologia da infertilidade
humana.
Existem inúmeros estudos com ovelhas, uma vez que são
excelentes cobaias e tem o sistema auditivo similar ao dos humanos. Em
um destes estudos, 30 ovelhas grávidas foram expostas a um ruído
intenso quatro horas por dia, cinco dias por semana durante várias
semanas. Depois do nascimento, os bezerros com 30 a 40 dias foram
testados através do exame ABR. Foram encontradas mudanças
morfológicas em um grupo de células ciliadas na cóclea dos bezerros
cujas mães foram expostas ao ruído, o que pode ser um indicativo de
possíveis causas de dano coclear.
Perda Auditiva Induzida Pelo Ruído (PAIR)
O desenvolvimento tecnológico nos encaminha aceleradamente
para um futuro muito próximo do que antes imaginávamos ser ficção
científica. Podemos citar como exemplo no nosso cotidiano, os
subprodutos da poluição, como o ruído, que pode agir como agente
irreversível no caso da PAIR (perda auditiva induzida pelo ruído).
O primeiro trabalho sobre PAIR no Brasil, data de 1938,
aparentemente relatado por Waldemir Salem, otorrinolaringologista do
Quadro de Oficiais Médicos da Armada, servindo então na Aviação Naval.
Já em 1942, Salem dispunha de uma cabine audiométrica construída na
Base Aérea do Galeão (RJ) e do audiômetro Brenco, provavelmente um
dos primeiros no país e na América do Sul.
A partir destes pioneiros da avaliação audiológica em oficiais da
aviação, realizaram-se inúmeros estudos com todas as outras áreas
profissionais que estariam expostos à poluição sonora.
A PAIR é considerada a enfermidade profissional irreversível de
maior ocorrência em todo o mundo, com alto índice de prevalência
masculina, e é a segunda maior causa de perda auditiva, superada
apenas pela presbiacusia em sociedades industrializadas. Em 1991 um
estudo do Public Health Service observou que a exposição ao ruído é
responsável por alterações auditivas em 10 milhões dos 21 milhões de
americanos com perda auditiva. Ainda foi possível concluir em 1990, que
mais de 20 milhões de americanos são expostos a níveis de ruído
prejudiciais que podem resultar em perda auditiva.
A PAIR é uma patologia cumulativa e insidiosa decorrente de
exposições repetidas a níveis elevados de pressão sonora durante um
longo período. Tem como características ser causada por qualquer
exposição que exerça uma média de 90 db SPL por oito horas diárias
regularmente. Pierson (1996) descreve a PAIR com característica
sensorioneural, atingindo freqüências agudas, inicialmente 4 e 6 kHz, e
piorando conforme o tempo de exposição. Após décadas de exposição,
perdas em 4 kHz se estabilizam e espalham-se até as freqüências graves
que também são importantes para a compreensão da fala.
A partir dessas características originam-se os sintomas da PAIR:
auditivos (zumbidos, dificuldade no entendimento da fala, algiacusia) e
não-auditivos (alterações do sono, transtornos neurológicos, digestivos e
comportamentais).
No feto, a PAIR também pode se apresentar como sensorioneural,
causando danos nas células ciliadas internas e externas. Entretanto alguns
estudos relatam diferenças entre o som externo ao qual o feto é exposto e
seu ruído ambiental próprio.
Gerhardt (1992) coloca que o ambiente fetal tem como “proteção” o
líquido amniótico que age com um filtro para sons graves e que há uma
diferença entre um ruído voltado diretamente para o feto e a exposição
natural oferecida pelo meio ambiente.
Pierson (1996) afirma que quanto maior exposição, maiores são as
chances de perda auditiva. A mesma exposição ao ruído que pode causar
perda temporária de audição para adultos, pode causar danos
permanentes em um sistema auditivo em desenvolvimento. Em uma
pesquisa com animais ficou comprovado que os jovens são mais
suscetíveis que os adultos, e que a suscetibilidade é maior em
determinados períodos do desenvolvimento auditivo.
Conceitos e Classificação dos Ruídos
Todos os sons podem ser potencialmente descritos como ruídos. O
termo som pode significar qualquer vibração mecânica em um meio
elástico. O termo Ruído é utilizado para descrever “ um sinal acústico
aperiódico, originado de superposição de vários movimentos de
vibração com diferentes freqüências, as quais não apresentam relação
entre si ”.
O Comitê de Saúde Ambiental (1997) especifica o ruído como um
som indesejável. E o som como uma vibração em um meio aéreo. O som
tem intensidade (loudness), freqüência (pitch) e duração.
A diferença entre o som e o ruído se depara quando analisamos
que o som pode estar associado para muitas pessoas à música,
sensação de prazer. Já o ruído, quase sempre associa-se a barulho, malestar, sensação desagradável.
O ruído afeta o bem-estar físico e mental das pessoas, dia ou noite,
em casa ou no local de trabalho. A exposição excessiva a ruídos produz
eestressee, interfere no trabalho, atividades de lazer, no sono e ainda
altera nossa habilidade de comunicação, além da possibilidade de
produzir alterações auditivas importantes.
Faixa de Audição Humana
A orelha humana é sensível somente a sons cujas freqüências
estão entre 20 hz e 2000 hz, determinada faixa de audição, conforme Russ
(1997). Determinado o nível de audição em 0 db NA, registrou-se, então o
limiar de desconforto e de dor para o ser humano em respectivamente 120
db e 140 db.
Sendo assim, a Portaria n 3.214/78 da Legislação Brasileira
estabeleceu níveis permitidos de exposição ao ruído e seus respectivos
níveis médios de intensidade em db(A), como pode observar-se em
anexo.
A Relação Mãe x Bebê
O desenvolvimento auditivo infantil, seu comportamento e reações
ao som
são fundamentais na definição da audição. Russo e Santos
(1994) acreditam que a audição é um processo de desenvolvimento da
capacidade de recepção, reconhecimento, identificação e discriminação
dos estímulos sensoriais auditivos.
Conforme Brezinca et al (1997), entre a 23ª e 28ª semana
gestacional, o feto saudável, é capaz de reagir a estímulação sonora. Os
autores ainda colocam que o ambiente sonoro intrauterino é repleto do
sons maternos como, o batimento cardíaco, a respiração, a voz da mãe e
sons causados por movimentos corporais.
Através de medidas intra-uterinas, comprovou-se que o feto pode
ouvir e diferenciar vozes, distinguir tipos de sons, intensidade e altura,
sons familiares e estranhos e podem até determinar a direção do som.
Pesquisas revelam que o bebê reconhece a voz da mãe dentre
outras femininas desde o primeiro dia de vida, tanto por ser a mais ouvida
desde a maturação das vias auditivas, como por ser mais aguda, já que
estas são mais fáceis de serem absorvidas pelas paredes intra-uterinas.
Estudos realizados por Klaus e Klaus (1989) comprovaram que os
bebês sugam em um ritmo mais rápido para vozes femininas. Para
comprovar que este fato não estava associado a preferência por um ritmo
de sucção mais rápido, a voz feminina foi colocada quando o bebê sugava
lentamente. Este ao perceber a mudança alterou o ritmo de sucção para
ouvir a voz feminina. Os autores colocam que através deste estudo
descobriu-se que as freqüências graves tendem a ter um efeito calmante
ou inibidor no bebê, já as freqüências agudas ocasionam mais agitação
do que inibição.
No que se refere a sons ambientais, o recém-nascido também irá
apresentar respostas a estímulos sonoros. Klaus e Klaus (1989)
constataram que os bebês respondem a sons inanimados, como por
exemplo quando toca uma sineta os bebês se orientam para o som
primeiro virando os olhos, e, então, a cabeça em direção ao som.
Russo e Santos (1994) concluíram que as respostas a sons
sugerem um padrão de maturação onde a partir da 20ª semana de
gestação, a cóclea humana já possui função adulta normal, sendo que o
feto reage a estímulos sonoros intensos.
Em outra pesquisa, Klaus e Klaus (1989) ressaltaram a importância
do som, já que os bebês são geralmente receptores passivos de sons e
não podem escapar dos estímulos sonoros ambientais, como podem fazer
aos estímulos visuais ( fechando os olhos, por exemplo).
Portanto, pode-se constatar a importância do conhecimento da
capacidade auditiva fetal, assim como suas respostas e reações a sons,
para ressaltar e conscientizar às mães que o bebê pode e deve ser
estimulado desde a vida intra-uterina.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento da Medicina nas últimas décadas trouxe
consigo progressos científicos e avanços tecnológicos nas várias áreas
do conhecimento humano. Esse desenvolvimento possibilitou transformar
a Audiologia em uma ciência importante e precisa no auxílio e diagnóstico
de patologias até então pouco ou nada conhecidas.
Durante toda a vida o homem recebe uma carga de informações
sonoras captadas por suas orelhas, que vão desde o batimento cardíaco
no peito de suas mães até a desagradável buzina de um carro. A orelha
humana está sempre captando sons de todas as direções e distâncias.
Atualmente a poluição sonora vem se constituindo em um dos
maiores males do século e o ruído é caracterizado como uma ameaça ao
habitat humano.
A exposição ocupacional ao ruído se tornou um tema em evidência
nos últimos tempos, pois afeta o organismo do ser humano como um todo,
apresentando características auditivas, como por exemplo o zumbido, e
não-auditivas, como transtornos cardiovasculares. Embora o ruído não
afete apenas a audição é neste sentido que seus efeitos são mais
percebidos.
O ruído ocupacional ainda é pouco questionado quanto às
trabalhadoras gestantes. Embora saibamos que as gestantes estão
expostas a riscos em seu ambiente de trabalho, ainda são complexos o
reconhecimento
e
os
estudos
sobre
os
potenciais
riscos
ao
desenvolvimento auditivo fetal.
Estudos mais recentes conseguiram obter dados para confirmar a
maior atenuação de sons agudos e a facilitação de sons graves através
do útero de uma ovelha prenha, o que comprovadamente ocasiona danos
nas células do ouvido interno, ou seja, provoca alterações no sistema
auditivo fetal.
Entretanto, para se obter evidências conclusivas sobre os efeitos
do ruído na audição fetal seriam necessários estudos epidemiológicos em
seres humanos.
Porém, isto acarreta um impasse, já que há limitações nas
possibilidades de investigação relacionadas a problemas éticos em
submeter propositalmente um feto normal a níveis elevados de ruído.
Mesmo assim, reiteramos a importância de novas pesquisas para
se possa, após conclusões mais objetivas, alertar e conscientizar as
gestantes sobre os riscos da exposição a ruídos para o desenvolvimento
auditivo fetal, prevenindo desta forma alterações auditivas para o futuro
bebê.
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RESUMO
A audição é um dos sistemas mais complexos e sensíveis do
organismo humano, e por isso há muito tempo vêm sendo investigado pela
ciência na perspectiva de possibilitar o diagnóstico precoce de muitas
alterações auditivas.
Este trabalho tem como objetivo apresentar uma revisão
bibliográfica das investigações que vêm sendo feitas desde a década de
sessenta até nossos dias, a respeito da exposição de trabalhadoras
gestantes a ruídos que possam afetar a audição do feto.
Pesquisas realizadas com ovelhas mostraram evidências que nos
permitem concluir que a exposição a ruídos são potencialmente
prejudiciais ao sistema auditivo fetal.
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