CPV O cursinho que mais aprova na FGV FGV direito 1a Fase 13/novembro/2005 LÍNGUA PORTUGUESA Leia atentamente o poema abaixo. Ele será o texto-base para as questões A e B de Língua Portuguesa. A.b) Aponte outros três recursos expressivos utilizados e explique como auxiliam na montagem espacial e plástica do poema. (2) PENSÃO FAMILIAR Resolução: Podem-se citar, dentre outros recursos expressivos que auxiliam na montagem espacial e plástica do poema: a disposição gráfica dos versos, que permite visualizar o jardim da pensãozinha com os elementos que o compõem; a valorização dos objetos de ordem visual e, por fim, estes mesmos apresentados como sinédoques (“Gatos”, “dálias”, “girassóis”, “gatinho”). Pode-se acrescentar, ainda, o fato de, até o oitavo verso, privilegiar-se a descrição estática. Já nos últimos cinco versos, há um ser em movimento (“o gatinho”). Jardim da pensãozinha burguesa. Gatos espapaçados ao sol. A tiririca sitia canteiros chatos. O sol acaba de crestar as boninas que murcharam. Os girassóis amarelo! resistem. E as dálias, rechonchudas, plebéias, dominicais. Um gatinho faz pipi. Com gestos de garçon de restaurant-Palace Encobre cuidadosamente a mijadinha. Sai vibrando com elegância a patinha direita: — É a única criatura fina na pensãozinha burguesa. BANDEIRA, Manuel. Libertinagem. In: Estrela da vida inteira (Poesias reunidas e Poemas traduzidos). 11º edição, ilustrada, comemorativa do centenário do poeta. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1986. Página 95. Questão A O poema apresenta-se descritivo e parece fotografar, com recursos expressivos, a parte externa do “ambiente familiar” da pensão, ressaltando seu aspecto visual e sensorial. A.a) CPV Questão B B.a) O jogo contrastante de sentidos no uso dos diminutivos é um recurso determinante na composição do poema. Destaque ao menos duas palavras nas quais tal procedimento é empregado e relacione-as com o efeito irônico do texto. (3) Resolução: Os diminutivos utilizados que provocam efeito irônico no texto são “pensãozinha” e “mijadinha”. Em “pensãozinha”, o sufixo possui conotação pejorativa, enquanto em “mijadinha”, o diminutivo minimiza o sentido da palavra primitiva. Em ambos os casos, o sufixo provoca efeito de ironia. Identifique os tipos de orações e de períodos predominantes na composição do poema e o modo como interferem na construção “fotográfica” das imagens. (1) No poema, a palavra “amarelo” é visualmente destacada. Apesar de referir-se a “girassóis”, é usada no singular. Esse recurso poético interfere na classe gramatical da palavra bem como na sua função sintática. Analise tal procedimento e o efeito de sentido por ele gerado no contexto. (4) Resolução: Os aspectos visual e sensorial são expressos por meio de frases nominais e, fundamentalmente, por orações coordenadas assindéticas. O título espelha genericamente o objeto (“Pensão Familiar”) e o primeiro verso, uma parte que será minuciosamente descrita. Os diversos verbos demonstram os elementos que compõem o jardim da pensão com dados sensoriais, privilegiando o aspecto visual. Resolução: Amarelo, no caso, é formada por derivação imprópria (“translação de classe gramatical e de significado”). Essa palavra é normalmente utilizada como adjetivo; no poema, porém, está como advérbio, o que justifica seu uso no singular (Os girassóis “amarelamente” resistem). Expressivamente, intensifica o amarelo como cor, que “compõe” todo o cenário: “sol” (Gatos espapaçados ao sol / O sol acaba de crestar as boninas” / “Os Girassóis amarelo! resistem”). fgv051f2fnovdir B.b) 1 2 fgv - 13/11/2005 CPV o cursinho que mais aprova na FGV Questão C Leia o poema “Música” de Carlos Drummond de Andrade. Ele será o texto-base para a questão C. Música A Pedro Nava Uma coisa triste no fundo da sala. Me disseram que era Chopin. A mulher de braços redondos que nem coxas martelava na dentadura dura sob o lustre complacente. Eu considerei as contas que era preciso pagar, os passos que era preciso dar, as dificuldades... Enquadrei o Chopin na minha tristeza e na dentadura amarela e preta meus cuidados voaram como borboletas. ANDRADRE, Carlos Drummond de. Alguma Poesia. In: Poesia Completa e Prosa. RJ: Editora Nova Aguilar, 1977. p. 71. O poema é composto pelo processo de colagem. Por meio de várias figuras de linguagem, constrói a imagem de uma “ironia amarga”. C.a) Aponte três figuras de palavras que considerar relevantes para a composição do poema e ressalte o valor expressivo de cada uma delas. (5) Resolução: Podem-se apontar as seguintes figuras de palavra (ou tropos): metonímia (relação autor pela obra) em “Me disseram que era Chopin” e “Enquadrei o Chopin na minha tristeza”; compração ou símile em “A mulher de braços redondos que nem coxas” e metáfora, no verso “martelava a dentadura dura”. Na primeira, a figura intensifica a tristeza do autor; na segunda, conota uma pessoa extremamente obesa tocando piano de forma agressiva e, por fim, a metáfora exprime semelhança entre o teclado do piano e a “dentadura dura”. Tais figuras, no processo de colagem, consubstanciam a imagem de uma “ironia amarga” no poema como um todo. C.b) Nos versos “martelava na dentadura dura /sob o lustre complacente” podem-se assinalar, na expressão em itálico, quatro figuras de som. Identifique ao menos duas e relacione-as com a imagem da intérprete de Chopin construída no poema.(6) Resolução: Há vários recursos sonoros condensados nesse pequeno trecho. Poderia ser apontada, por exemplo, a aliteração em d e t (dentaduras duras), que sugere o impacto dos dedos da intérprete no teclado do piano, o que também poderia ser visto como onomatopéia. A assonância em u (dentaduras duras) faz lembrar notas graves e tristes da peça. A paranomásia (dentaduras duras) remete a uma seqüência de notas repetidas, como em sol, lá, dó, ré, dó, ré, por exemplo. De qualquer forma, todas elas se relacionam com a imagem taciturna da intérprete, que “martela” as teclas sob o “olhar complacente do lustre”. CPV fgv051f2fnovdir COMENTÁRIO DE LÍNGUA PORTUGUESA A prova de Língua Portuguesa para Direito FGV pautou-se em dois textos literários modernistas. A prova exigia que o candidato não apenas tivesse o domínio de fatos lingüísticos mas, principalmente, soubesse contextualizá-los. Com isso, não se pediram questões em que os candidatos ficassem meramente na superfície do texto. Exploraram-se muito bem assuntos como “elementos da descrição”, “formação de palavras” e “figuras de linguagem”. A prova requeria, enfim, conhecimento e habilidade de expressão escrita.