Economia e Mercado Profª Eni Pina 2º BIMESTRE CONTABILIDADE NACIONAL 1. RENDA E PRODUTO O objetivo fundamental da macroeconomia é determinar os fatores que influenciam o nível total da renda e do produto do sistema econômico. Mas por que os economistas, sobretudo no século XX, se preocupam em medir a produção realizada pelo sistema econômico? A resposta pode ser dividida em duas partes. Primeiramente, devemos nos lembrar de que o problema fundamental da economia é a escassez de recursos. Por essa razão, eles devem ser empregados de forma adequada, para que se consiga a maior quantidade possível de bens e de serviços, o que nos remete à questão da eficiência do sistema produtivo. Essa eficiência, que consiste na maior produção possível a partir de uma certa quantidade de fatores de produção, precisa ser constantemente avaliada. Daí a necessidade de se ter registros da atividade econômica, considerada em seu conjunto, que permitam esse tipo de análise. A segunda parte da resposta nos remete a um fato histórico. Quase todas as pessoas já ouviram falar da grande crise econômica de 1929, que consistiu na redução das atividades econômicas, ocasionando, entre outros problemas, o desemprego. Tivemos também, as duas grandes guerras mundiais, que envolveram diversos países e tiveram grande repercussão na economia. A partir dessa época, e com a presença mais acentuada do Estado como regulador das atividades econômicas, os economistas passaram a sentir a necessidade de criar meios que lhes permitissem medir e avaliar as atividades econômicas desenvolvidas pela sociedade. Surgiu, então, a contabilidade social ou nacional que nos dá, em termos quantitativos, o desempenho global de uma economia. A contabilidade nacional se insere na moderna macroeconomia, que nos fornece os meios para a análise do conjunto da economia de uma sociedade. Entretanto, outra pergunta poderia ser feita: como medir a produção realizada pelo sistema econômico? Observe que a produção é contínua no tempo e os bens e serviços são produzidos e consumidos, sendo necessário produzi-los novamente, pois grande parte das necessidades humanas exige 1 um consumo contínuo, como é o caso da alimentação, que precisa ser satisfeita diariamente. Em primeiro lugar, foi preciso estabelecer um período para que se medisse o total de bens e de serviços produzidos. Atualmente, esse período é de um ano e corresponde ao ano civil, que vai de janeiro a dezembro. Em seguida, foi preciso estabelecer uma unidade de medida comum, pois os bens e serviços têm unidades de medida diferentes: o petróleo é medido em barris; a carne, em arrobas; a energia elétrica, em quilowats, e assim por diante. A maneira encontrada para que se pudesse somar, ou agregar, a totalidade de bens e de serviços produzidos foi medi-los em termos monetários, ou seja, pelo seu preço. Isto porque todos os bens e serviços podem ser expressos em dinheiro, que é o preço que alcançam no mercado multiplicado pela quantidade produzida. Uma vez estabelecido o período que servirá de base para medir a produção, bem como a unidade de medida em que será expressa essa grandeza, resta o último problema, referente à ótica segundo a qual será medida a produção econômica. Basicamente, há três óticas a partir das quais a atividade econômica pode ser examinada e medida. A primeira é a ótica do produto, que para ser entendida, no entanto, é necessário antes de mais nada explorar o conceito de produto. O produto de uma economia é a soma dos valores monetários dos bens e dos serviços voltados para o consumo final e produzidos em um determinado período. Assim, ao se medir a atividade econômica a partir da ótica do produto, considera-se o preço e a quantidade produzida dos bens e dos serviços, mas apenas daqueles voltados para o consumo final, num automóvel, por exemplo, são empregados inúmeros bens e serviços, como chapas de aço, pneus, serviços de pinturas etc. Entretanto, eles não são computados no cálculo do produto da economia, pois são bens e serviços intermediários. Apenas o número de automóveis produzidos multiplicados pelo seu preço é que vai entrar nesse cálculo, para evitar o problema da dupla contagem, pois o preço dos bens e serviços intermediários já está incluído no preço final do automóvel. A segunda ótica a partir da qual se pode medir a atividade econômica é a da renda. Conforme vimos na primeira parte, a renda de uma economia é a soma da remuneração paga aos fatores da produção durante o processo produtivo. Assim, para se obter a renda de um país num determinado período soma-se os salários, os aluguéis, os juros e os lucros, que são os pagamentos feitos aos fatores produtivos durante o período considerado. Finalmente, temos a ótica da despesa, que consiste na análise do uso que os agentes fazem de sua renda. Os agentes podem gastar sua renda na 2 aquisição de bens de consumo duráveis e não-duráveis, bens de capital, títulos do governo e moeda. Como foi visto acima, o produto de uma economia é expresso em termos monetários, multiplicando-se a quantidade de bens e de serviços pelos respectivos preços. A partir daí, podemos considerar o produto como sendo o total das vendas num determinado período mais os estoques avaliados a preço de mercado. Ora, as vendas correspondem à receita dos empresários – agentes econômicos do país que organizam os fatores de produção. Com a receita obtida por meio da venda de seus produtos, os empresários remuneram os fatores da produção empregados: salários para os trabalhadores, juros para o capital, aluguéis para os proprietários e lucro para eles próprios, pois o lucro é a remuneração do empresário. Assim, podemos dizer que as receitas, ou o produto da economia, se esgotam na remuneração dos fatores produtivos. Chamando o total de pagamentos feitos aos fatores de produção de renda, chegamos a uma identidade fundamental na teoria macroeconômica: a renda é igual ao produto. Da mesma forma, em nosso sistema simples, os agentes gastam toda a sua renda na aquisição de bens. Dessa forma, temos a igualdade entre renda e despesa e, portanto, entre produto e despesa. Observe-se, entretanto, que estamos considerando um sistema econômico bastante simples, constituído apenas de empresas e consumidores. Não existe, aqui, o setor público, ou seja, o governo, que recolhe impostos e taxas, nem o resto do mundo, de onde importamos e para onde exportamos bens e serviços. Portanto, a identidade renda igual a produto só é válida para um sistema econômico simples, constituído de empresas e consumidores. Além disso, há a condição de que as pessoas gastem toda sua renda na aquisição de bens e de serviços, ou seja, não façam poupança. Vamos considerar outro sistema econômico simples, formado por empresas e famílias. Suponhamos que a quantidade de bens e de serviços produzidos pelas empresas, multiplicados pelos seus respectivos preços, seja igual a 10 bilhões de reais. Esse valor é o produto desse sistema econômico. Entretanto, para obter esse produto, os empresários gastaram 5 bilhões de reais em salários e ordenados pagos ao fator trabalho, 3 bilhões de reais em aluguel, 1 bilhão de reais pagos sob a forma de juros aos donos do capital, que o emprestaram aos empresários cobrando esses juros, e, finalmente, 1 bilhão de reais de lucro, que é a remuneração dos empresários, o pagamento pelo seu trabalho. Com esse exemplo simples, podemos demonstrar que o produto de uma economia – o valor monetário dos bens e serviços produzidos – é igual à remuneração dos fatores de produção, ou seja, à renda: 3 - produto: alimentos, vestuário, habitação, educação, transportes, etc = 10bilhões; renda: salários, ordenados, aluguéis, juros, lucros = 10 bilhões. Renda = produto Portanto, daqui por diante, podemos empregar os dois termos (produto ou renda) para designar o resultado da atividade econômica de uma sociedade. Agora, já podemos estabelecer o conceito e o objetivo da contabilidade nacional. A contabilidade nacional é um método de mensuração e interpretação da atividade econômica que tem como objetivo medir a produção que se realiza num sistema econômico num determinado período. 2. OS PRINCIPAIS AGREGADOS MACROECONÔMICOS A contabilidade nacional mede a atividade econômica a partir de sua expressão mais genérica – o produto da economia -, para, em seguida, e a partir dele, introduzir novos conceitos e assim observar a atividade econômica. Esses conceitos são chamados de agregados e recebem essa denominação pelo fato de não serem simplesmente uma soma de parcelas que se expressam da mesma forma e na mesma unidade de medida, mas sim uma soma de coisas diferentes (bens e serviços) cujo volume físico, conforme vimos são expressos nas mais diferentes unidades de medida. No entanto, esses bens e serviços podem ser adicionados quando são traduzidos numa unidade comum de medida, ou seja, a moeda. Para que se possa definir convenientemente os agregados, é preciso relaxar as hipóteses feitas sobre o sistema econômico no item 3 do capítulo 4, pois desse modo poderemos falar de uma economia que tem correspondência no mundo real. Portanto, o sistema econômico de que trataremos mantém relações com outros sistemas, isto é, com o resto do mundo, por meio da exportação e da importação de bens e de serviços. Além disso, nesse sistema, a presença do setor público, o governo, é bastante importante. Com relação às empresas e aos proprietários dos fatores de produção, não é mais necessário que eles gastem toda sua renda em bens e serviços de consumo (essa parte da renda que não é consumida recebe o nome de poupança).Conseqüentemente, se toda a renda não é consumida, uma parte da produção das empresas não será vendida, o que possibilitará a formação de estoques nessa economia. 4 Produto Interno Bruto (PIB) O primeiro agregado é o Produto Interno Bruto (PIB), que corresponde ao conceito de produto da economia, ou seja, à soma dos valores monetários dos bens e dos serviços finais, produzidos a partir dos fatores de produção que estão dentro das fronteiras geográficas do país. É importante considerar, aqui, a interferência do Estado na economia. O Estado participa de um sistema econômico por meio dos governos federal, estadual e municipal, desempenhando o papel de dois agentes econômicos: o de consumidor e o de produtor. Como consumidor de bens e de serviços, o Estado adquire tudo aquilo que é necessário ao funcionamento das repartições públicas, como material de escritório e veículos, contratando empresas para construções de edifícios, estradas etc. Como produtor, ele fornece á população os chamados serviços públicos, como transporte, correios e telégrafos, assistência médica através da previdência social, educação etc. Para desempenhar o papel de produtor, o Estado necessita de dinheiro, que é obtido mediante a tributação – os impostos – que incide sobre determinadas atividades econômicas. Alguns impostos, apesar de incidirem sobre a produção, são pagos pelos consumidores, pois são adicionados ao preço final do produto pelos fabricantes. Esse tipo de imposto, que é transferido do produtor para o consumidor, denomina-se imposto indireto. Por outro lado, o setor público muitas vezes tem interesse em que determinados produtos tenham um preço mais baixo para o consumidor final e concede às empresas que os produzem os chamados subsídios, que são estímulos que visam diminuir o custo de produção de um bem ou de um serviço. Considerando a presença do Estado nas atividades econômicas, há duas maneiras de medir o Produto Interno Bruto de uma economia: - - Produto Interno Bruto a preços de mercado: é a soma dos valores monetários dos bens e serviços produzidos, computando-se os impostos indiretos e subtraindo-se os subsídios. Produto Interno Bruto a custo de fatores: é a soma dos valores monetários dos bens e serviços produzidos, subtraindo-se os impostos indiretos e somando-se os subsídios. Como vimos, a presença do governo num sistema econômico tem a possibilidade de modificá-lo, através do seu efeito sobre o preço dos bens e dos serviços e sobre a remuneração dos fatores de produção. Portanto, os conceitos de produto bruto a preços de mercado e de produto bruto a custo de fatores são úteis na medida em que é necessário avaliar quantitativamente a presença do governo no sistema econômico. 5 Como exemplo, imaginemos um país onde haja as quatro entidades: os consumidores, as empresas, o governo e o resto do mundo. Consideremos que no período de 1 ano esse país tenha apresentado um Produto Interno bruto a preços de mercado (PIB p.m.) de 250 bilhões. Os impostos indiretos, no mesmo período, somaram 50 bilhões e os subsídios, 40 bilhões. A partir desses dados, podemos obter o Produto Interno Bruto a custo de fatores (PIB c.f.) que é igual a 240 bilhões. Em resumo: 250 bilhões (Produto Interno Bruto a preços de mercado) - 50 bilhões (impostos indiretos) + 40 bilhões (subsídios) . 240 bilhões (Produto Interno Bruto a custo de fatores) Produto Interno Líquido (PIL) Durante o processo produtivo, as máquinas, os equipamentos e as instalações vão se desgastando, se depreciando, e precisam ser reparados ou substituídos com certa regularidade, para não diminuir a capacidade produtiva de um sistema econômico. A parcela do produto que se destina à reposição ou reparos dos equipamentos denomina-se depreciação. Se subtrairmos do Produto Interno Bruto a custo de fatores a parcela correspondente à depreciação, obteremos o Produto Interno Líquido (PIL) a custo de fatores, ou Renda Líquida. Continuando com o exemplo anterior, se as máquinas e os equipamentos do país apresentar uma depreciação de 50 bilhões, o Produto Interno Líquido a custo de fatores (PIL c.f.) será de 190 bilhões. Assim: 240 bilhões (Produto Interno Bruto a custo de fatores) - 50 bilhões (depreciação) . 190 bilhões (Produto Interno Líquido a custo de fatores ou renda Líquida) Produto Nacional Líquido (PNL) Atualmente, existe uma grande integração entre os diversos países. Do ponto de vista econômico, essa integração se dá através do deslocamento de fatores de produção de um país para outro. O caso mais significativo é o do fator capital. Quando uma grande empresa abre uma filial em outro país, ela desloca parte de seu capital para esse país, pois está adquirindo instalações, equipamentos etc. No entanto, a renda gerada por esse investimento em outro país acaba retornando, pelo menos em parte ao país de origem, onde estão os proprietários do capital de produção. O saldo líquido dessa entrada e saída de recursos é chamado de renda líquida recebida do exterior (RLRE). Em última análise, e do ponto de vista que 6 interessa à contabilidade nacional, a integração econômica entre os países se dá através da transferência de renda de um país para outro. Voltando ao estudo dos nossos agregados econômicos, se subtrairmos do Produto Interno Líquido a custo de fatores a renda enviada ao exterior e somarmos a renda recebida do exterior, teremos o Produto Nacional Líquido a custo de fatores (PNL c.f.) ou Renda Nacional Líquida a custo de fatores (RNL c.f.), também denomina Renda Nacional (RN), ou seja, PNLcf = PILcf – RLRE. Considerando, ainda, o exemplo anterior, suponhamos que o país tenha enviado para o exterior a quantia de 20 bilhões, a título de remuneração dos fatores de produção estrangeiros, e recebido 15 bilhões como remuneração de fatores de produção que se encontram no exterior, mas são propriedades de seus cidadãos. Com esse envio e recebimento de renda, o Produto Nacional Líquido a custo de fatores (PNL c.f.) é de 185 bilhões. Assim: 190 bilhões (Produto Interno Líquido a custo de fatores) - 20 bilhões (renda enviada ao exterior) + 15 bilhões (renda recebida do exterior) . 185 bilhões (produto Nacional Líquido a custo de fatores, ou Renda Nacional Líquida a custo de fatores, ou, simplesmente, Renda Nacional (RN)) ou, ainda, como a RLRE é – 5 bilhões, podemos escrever: 190 bilhões (Produto Interno Líquido a custo de fatores) - 5 bilhões (renda enviada ao exterior) . 185 bilhões (produto Nacional Líquido a custo de fatores), ou Renda Nacional Líquida a custo de fatores, ou, simplesmente, Renda Nacional (RN)) Renda Pessoal (RP)* Consideremos, mais uma vez, a intervenção do Estado na economia. Se subtrairmos da Renda Nacional os lucros retidos pelas empresas, os impostos diretos das empresas (imposto de renda) e as contribuições feitas à previdência social e somarmos as transferências do governo, ou seja, as despesas do governo com inativos, pensionistas, salário-família e outros benefícios pagos pela previdência social mais os juros pagos, termos a Renda Pessoal (RP). A Renda Pessoal é o agregado macroeconômico destinado aos consumidores residentes no país. Considerando, mais uma vez, o país do exemplo anterior suponha que o governo arrecade 70 bilhões como impostos de renda das empresas e 7 contribuições feitas à previdência social e transfira, para as pessoas, 50 bilhões de juros. Teremos, então, uma Renda Pessoal de 170 bilhões. Assim: 185 bilhões (Produto Nacional Líquido a custo de fatores) - 70 bilhões (Imposto de renda das empresas e contribuições à previdência social) + 50 bilhões (benefícios pagos pela previdência social) + 5 bilhões (juros pagos pelo governo) . 170 bilhões (Renda Pessoal) * Até o momento, os agregados foram chamados de produto. Entretanto, quando se determina o Produto Nacional Líquido a custo de fatores, que é, em última instância, a parcela do produto líquido que permanece em território nacional, os agregados são mais comumente chamados de “Renda”. Isso não significa que a denominação produto implique erro conceitual, pois a garantia da identidade renda-produto nos afasta desse risco. Renda Pessoal Disponível (RDP) Se subtrairmos da renda pessoal os impostos diretos pagos pelas pessoas, ou seja, o imposto de renda, chegaremos ao conceito de Renda Pessoal Disponível (RDP), que é a quantia que permanece em poder das pessoas para ser consumida ou poupada. Finalizando o exemplo, imaginemos que as pessoas tenham pago o equivalente a 30 bilhões de imposto de renda. Teríamos, então, nesse país, uma Renda Pessoal Disponível de 140 bilhões, obtida da seguinte maneira: 170 bilhões (Renda Pessoal) - 30 bilhões (imposto de renda pago pelas pessoas) 140 bilhões (Renda Pessoal Disponível) Vimos que a produção realizada por um sistema econômico é destinada à satisfação das necessidades das pessoas. Esse sistema econômico não permanece estável no decorrer do tempo. Ele se modifica, cresce e atravessa crises, tudo isso com conseqüências sobre as pessoas que o integram. Um dos campos de interesse dos economistas, e também do governo, é o nível de bem-estar dos habitantes de um país. Esse nível de bem8 estar, apesar de ser um conceito subjetivo, pode ser aproximado através da quantidade de bens e de serviços disponíveis, por período de tempo, para as pessoas. Se a quantidade de bens e serviços disponíveis tiver aumentado, de um ano para outro, mais do que a população, pode-se dizer que aumentou o bem-estar das pessoas desse país. Isso aconteceria se o aumento do produto tivesse sido distribuído igualmente entre as pessoas. Essas observações nos permitem estabelecer algumas das virtudes e limitações dos agregados macroeconômicos. Os agregados servem para o estudo e acompanhamento da evolução do sistema econômico no decorrer do tempo. Através dos seus vários conceitos, é possível avaliar o papel do governo, do setor externo e das empresas na economia. Pode-se, ainda, ter uma idéia, aproximada do progresso do país, ao se observarem taxas de crescimento do produto. Dissemos idéia aproximada, e aqui está uma limitação da contabilidade nacional como instrumento de análise. Ela não nos diz que forma o produto é distribuído entre os habitantes do país. Assim, uma economia pode apresentar taxas de crescimento substanciais de seu produto, o que não quer dizer que o crescimento seja igualmente distribuído entre as pessoas. Nesse caso, fica difícil afirmar alguma coisa a respeito do nível de bem-estar, pois o bem-estar de algumas pessoas terá aumentado, mas o de outras não. De qualquer forma, a contabilidade nacional tem se mostrado útil para analisar o funcionamento do sistema econômico como um todo, pois fornece ao governo elementos que permitem dirigir as medidas de política econômica para os objetivos estabelecidos. 3. DISTRIBUIÇÃO DE RENDA O sistema econômico, como foi visto, produz os bens e os serviços que irão satisfazer às necessidades das pessoas. Para que isso ocorra, essas pessoas precisam ter acesso ao produto ou à renda, que é a mesma coisa. Portanto, a renda precisa ser distribuída entre as pessoas, e o processo pelo qual isso é feito é chamado de distribuição de renda. Entretanto, a distribuição de renda envolve muitos problemas, como veremos a seguir. Os fatores de produção que compõem o sistema econômico de um país estão dispersos pela sua superfície geográfica, e essa dispersão não se dá necessariamente de forma homogênea. Com isso, queremos dizer que os fatores de produção podem estar mais concentrados em uma ou 9 mais regiões de um país, enquanto em outras regiões há escassez desses fatores. Essa observação se aplica a todos os fatores de produção. Os recursos naturais, como terra em boas condições de ser cultivada, por exemplo, não são encontrados com a mesmo facilidade em todos os recantos de um país. O mesmo pode ser dito a respeito do trabalho e do capital. A população não está distribuída de maneira uniforme pelo território de um país. Assim, há regiões mais densamente povoadas e outras eu carecem de habitantes. Quanto ao capital, uma boa maneira de se observar sua distribuição é através dos grandes centros urbanos, onde se concentram as atividades industriais e financeiras. Mais uma vez, é evidente que não há grandes concentrações industriais espalhadas por todo o país. Pelo contrário, elas tendem a se situar em determinadas regiões, enquanto outras apresentam atividades mais voltadas para o setor primário. Essa constatação nos leva a um aspecto interessante quanto à distribuição de renda. Com a renda é a remuneração dos fatores de produção, e esses fatores estão concentrados em algumas regiões do país, a renda também estará concentrada nessas regiões. Esse é o primeiro aspecto a ser considerado quando se trata da distribuição de renda: a renda não é distribuída igualmente entre as regiões do país, mas se concentra naquelas onde se situa a maior parte dos fatores de produção. A forma como a renda se distribui entre as regiões é chamada de distribuição inter-regional de renda. Um segundo aspecto que pode ser considerado, ao se tratar da distribuição de renda, é saber como ela se distribui entre as pessoas, entre os habitantes do país. O padrão de distribuição da renda entre as pessoas é chamado de renda per capita, que é o resultado da divisão da renda nacional do país, num determinado ano, pelo número de habitantes do país naquele mesmo ano. A renda per capita é um indicador de quanto caberia a cada pessoa do total da renda gerada pelo sistema econômico num período. Como a renda é igual ao produto, a renda per capita significa a quantidade de bens e de serviços produzidos num período que caberia a cada pessoa, se essa renda fosse distribuída igualmente entre os habitantes do país. Mas a renda não é igualmente distribuída entre as pessoas. A distribuição pessoal da renda é o padrão de distribuição da renda entre os agentes. Um terceiro aspecto importante a respeito do tema distribuição de renda é verificar como a renda é distribuída entre os fatores de produção capital e trabalho. O fator de produção recursos naturais é excluído, dadas às dificuldades em se estabelecer sua remuneração. A 10 forma segundo a qual a renda é distribuída entre os fatores de produção capital e trabalho é chamado de distribuição funcional da renda. Como foi visto, a distribuição de renda envolve diferentes aspectos, que dificultam conclusões a respeito do bem-estar de um país a partir da observação do seu produto, de sua renda. A forma mais comum usada para se tentar estabelecer o bem-estar dos habitantes de um país é por meio da renda per capita. Entretanto, esse conceito tem limitações que decorrem dos padrões da distribuição inter-regional e da distribuição funcional da renda. Se os fatores de produção estiverem concentrados numa região, é de se esperar que a renda per capita dos habitantes dessa região seja superior à dos outros habitantes das outras regiões. Logo, a renda per capita, ao tomar a renda total do país e dividi-la pelo número de seus habitantes, não leva em consideração a sua concentração em determinadas regiões, em detrimento de outras. Mais ainda, a distribuição funcional da renda também contribui para tornar a renda per capita um indicador pouco confiável. A remuneração do capital vai para o seu proprietário, o capitalista, que é uma pessoa, um habitante do país. Portanto, essa pessoa, o proprietário do capital, terá uma renda muito maior do que aquela que lhe seria atribuída pelo conceito de renda per capita. 4 – AS CONTAS NACIONAIS DO BRASIL Apesar de a Contabilidade Nacional ser um elemento de fundamental importância para o diagnóstico e a elaboração das políticas econômicas, o seu uso pelos países só se deu após a Segunda Guerra Mundial, basicamente por dois motivos: A primeira razão é que os trabalhos dos primeiros economistas se preocupavam mais com os aspectos qualitativos da economia, como, por exemplo, “como” a renda é gerada, “como” é distribuída etc. As preocupações de natureza quantitativa eram esparsas, podendo-se destacar o Tableau Économique, de Quesnay, e a avaliação da Renda Nacional Francesa, elaborada por Lavoisier em 1791, A segunda razão é a dificuldade de levantamento dos dados estatísticos necessários à elaboração das contas nacionais, dificuldade que começou a ser superada no início do século XX. É a partir dessa época que surgem, de maneira sistematizada, os primeiros estudos e pesquisas com vistas à mensuração da Renda Nacional. 11 Em 1920, iniciam-se dois trabalhos históricos no campo da contabilidade nacional. Nos Estados Unidos, o economista Simon Kuznets passa a realizar o levantamento sistemático da renda nacional do seu país, enquanto o governo soviético passa a divulgar continuamente os dados econômicos oficiais da economia da URSS. Nas duas décadas seguintes, aconteceram fatos de repercussão mundial que reforçaram a idéia da necessidade de os países terem um registro sistematizado e contínuo dos números de sua economia. O primeiro fato foi a Grande Depressão de 1929, que significou crise econômica para os principais países industrializados do mundo, com redução das atividades econômicas e desemprego. No ano de 1936, tivemos a publicação do trabalho Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, de Lord Keynes – um importante economista inglês -, possivelmente o mais importante livro publicado no século XX, para o entendimento do funcionamento do sistema econômico. Logo em seguida, tivemos a Segunda Guerra Mundial, quando se tornou ainda mais evidente a necessidade da intervenção do governo na economia, para regular o funcionamento, preconizada por Keynes. È a partir de 1945 – final da Segunda Guerra, portanto – que se elaboram os chamados Sistemas de Contas Nacionais, nos quais os agregados econômicos são apresentados sob a forma contábil e lançados num sistema de contas associado às transações que os originam. Dessa forma, os agregados econômicos apresentam-se num esquema em que aparecem reunidos os aspectos quantitativo e qualitativo. Em 1953, um grupo de especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU), chefiado por Richard Stone, elabora “Um Sistema de Contas Nacionais e Correspondentes Quadros Estatísticos”, que serviu de orientação para a construção de sistemas de contabilidade nacional em diversos países. A renda nacional do Brasil vem sendo levantada desde 1947 pela Fundação Getúlio Vargas, que assimilou, a partir de 1953, a metodologia proposta pela ONU. Isso resultou no Sistema de Contas Nacionais do Brasil, que é uma adaptação do esquema da ONU em razão de deficiências de dados estatísticos, de resto, uma característica geral dos países latino-americanos. 5 – A EVOLUÇÃO DA ECONOMIA BRASILEIRA Se calcularmos as taxas de crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro (PIB) a partir da data em que as contas nacionais começaram a ser estimadas, poderemos observar que o crescimento desse agregado 12 não foi uniforme em todos esses anos. A primeira coisa que nos chama a atenção é que até 1981 a renda nacional brasileira apresentou uma evolução positiva, crescimento, mesmo que de maneira instável. Em 1980, pela primeira vez no período observado, o PIB brasileiro evoluiu a uma taxa negativa, aproximadamente –4%. Esse fato se repetiu em 1983 e em 1990. Em 1980, a renda brasileira permaneceu estagnada, com crescimento nulo. Alguns subperíodos merecem destaque. De 1957 até 1961 o Brasil apresentou um razoável ritmo de crescimento de sua atividade econômica. Esse período correspondeu ao Plano de Metas do presidente Juscelino Kubitschek, que investiu bastante em infraestrutura. Construindo estradas, por exemplo, estimulou a implantação da indústria automobilística no Brasil e transferiu a capital federal do Rio de Janeiro para Brasília. Nos anos seguintes, o ritmo das atividades econômicas foi bastante reduzido, em parte devido à instabilidade política. De 1968 até 1973, tivemos o período em que a economia brasileira mais cresceu em sua história. A taxa média de crescimento naqueles anos foi da ordem de 10% ao ano. Esse período ficou conhecido como o milagre brasileiro. Entre 1980 e 1983 a economia brasileira viveu uma de suas mais graves crises econômicas. O Brasil precisou reduzir o ritmo de suas atividades para se ajustar às necessidades de sua dívida externa. Nos meados dessa década, o país ainda cresceu a taxas razoáveis, como em 1985 e 1986, 8% em média. A partir daí, entramos em nova crise, com estagnação em 1988 e recessão em 1990. A primeira metade da década de 90 é um período de baixo crescimento. Após a implantação do Plano Real em 1994 a economia mostra claros sinais de aquecimento. Essa tendência é rapidamente revertida pela ameaça de desequilíbrio no setor externo e a taxa de crescimento do produto volta a reduzir-se. De qualquer maneira, se olharmos o crescimento acumulado do Brasil a partir de 1953, vamos notar que o saldo é positivo. De um produto de ordem de 83 bilhões naquele ano, chegamos a uma renda de aproximadamente 915 bilhões, em reais de 1998. 13