VIOLENCE AND THE IMAGINARY IN BRAZILIAN AND COLOMBIAN

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VIOLENCE AND THE IMAGINARY IN BRAZILIAN AND COLOMBIAN
NARRATIVE FICTION AND FILMS
Aileen El-Kadi
University of Texas at El Paso
“Ustedes no necesitan, por supuesto, que les explique qué es un sicario. Mi abuelo sí,
necesitaría – diz o narrador do romance de Fernando Vallejo La Virgen de los Sicarios (1994) –
(…) pero mi abuelo murió hace años (…) te voy a decir que es un sicario: un muchachito, a
veces un niño, que mata por encargo.” (10)
La Virgen de los Sicarios, traduzido em mais de dez línguas e levado ao cinema por
Barbet Schroeder, é talvez o romance que popularizou a figura do sicário, do mesmo modo que o
filme Cidade de Deus de Fernando Meirelles internacionalizou a do favelado do Rio de Janeiro
como um criminal pop. Porém, existe uma grande quantidade de textos antes e depois destes que
tratam sobre este tipo de criminoso urbano e sobre o narcotráfico no Brasil e na Colômbia.
É inegável que tanto o favelado como o sicário foram já incorporados pela literatura e
pela cultura de massas e convertidos em personagens chaves da construção do imaginário urbano
atual sobre a violência na America Latina. Sobre isto comenta Mario Vargas Llosa (no jornal El
Pais, Madrid. Outubro 04 de 1999):
Además de formar parte de la vida social y política de Colombia, los sicarios
constituyen también, como los cowboys del Oeste norteamericano o los samuráis
japoneses, una mitología fraguada por la literatura, el cine, la música, el periodismo y la
fantasía popular, de modo que, cuando se habla de ellos, conviene advertir que se pisa
ese delicioso y resbaladizo territorio, el preferido de los novelistas, donde se confunden
ficción y realidad.
Através do mapeamento das ficções urbanas colombianas e brasileiras das últimas décadas,
especialmente a partir dos anos noventa, que abordam o tema da violência criminal, podemos
dizer que as máfias do narcotráfico e os agentes dessa violência, caracterizam os paradigmas de
representação da narrativa realista contemporânea nestes países. Esta línea estética apresenta
características particulares e diferenciadas de correntes anteriores como os romances sociais de
denuncia ou a narrativa do Boom latino-americano, e em geral da tradição literária latinoamericana. Esta marca distintiva desta línea estética levou a crítica a falar de subgêneros
literários como o romance sicaresco (Colômbia), o narco-romance (Colômbia e México), e
romances e filmes sobre favelados (Brasil).
Em relação ao Brasil, se desenvolveu uma narrativa urbana da violência que tem suas
origens na estética e tipos urbanos dos anos 60 em autores como João Antônio, Dalton Trevisan
e Rubem Fonseca. O crítico Antonio Cândido descreveu esta estética como “realismo feroz” e de
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maneira similar Alfedo Bosi a definiu como “brutalista”, rasgo que se continua em escritores
como Marçal Aquino, Paulo Lins, Patricia Melo, Bruno Zeni e Luiz Ruffato.
No caso colombiano, o romance sicarescoi que surgiu nos anos 90 é produto de um
contexto histórico particular: o surgimento de importantes redes de tráfico de armas e drogas,
onde se destacam os cartéis de Medellín e Cali. As atividades delitivas destes grupos dentro de
um contexto de instabilidade econômica, política e social, permitiram o aparecimento de um tipo
de criminoso assalariado: o jovem de classe baixa que assassina para determinadas máfias a troco
de uma paga. A partir deste tipo urbano aparece uma serie de ficções centradas na figura do
sicário. Por um lado pode-se falar de uma primeira vertente de caráter testemunhal, mas também
existe outra línea, mais afastada do documentário e da intenção de denuncia social, que incluiria
romances como La Virgen de los sicarios (1994) de Fernando Vallejo, Morir con Papá (1997) y
Batallas en el Monte de Venus (2003), de Oscar Collazos, Rosario Tijeras (2004) de Jorge
Franco Ramos, Sangre ajena (2004) de Arturo Alape, Satanás de Mario Mendoza e El Eskimal y
la mariposa (2004) de Naum Montt.
No Brasil existem dois tipos urbanos predominantes: o primeiro corresponde a um
personagem cuja particularidade não é a de representar um setor social especifico, mas a de ser
um cidadão que deambula pelas ruas das grandes cidades registrando a cotidianidade citadina. A
violência aparece como resposta a uma sensação de exclusão, alienação e perturbação no meio
urbano. São estes os personagens presentes nos textos de João Gilberto Noll, Rubem Fonseca,
João Ubaldo Ribeiro, Dalton Trevisan, Bernardo Carvalho, Marcelino Freire, Luiz Ruffato, entre
outros.
O segundo tipo urbano literário e da cinematografia brasileira dos últimos anos é o
morador das favelasii, e assim como no caso colombiano, é apresentado em base a uma redução
sinecdótica através a figura do favelado que escolhe o crime como modo de enriquecimento e
famaiii. Nas narrativas do século XIX sobre bandidos, a ação criminal tinha um caráter políticosocial e durante os anos quarenta aos oitenta as ficções contextualizadas nos espaços citadinos
representavam o elemento popular urbano definido pela pobreza e vítimização.
O crime cometido pelo personagem marginal era conseqüência da própria marginalidade
e opressão do sistema oficial sobre os carentes ou necessitados. Não há uma visão paternalista
nem se vitimiza o elemento popular nos textos contemporâneos, e sim uma condena: eles
representam a agência e recorrência da violência urbana na sociedade representada.
Aparentemente isolados da sociedade civil, estes marginais formam pequenas comunidades ou
gangs; como comenta Toby Weisslitziv, estes grupos se organizam de tal maneira que muitas
vezes tomam posições de poder que corresponderiam ao Estado.
A pergunta que fazemos é a seguinte: onde está agora o centro e a periferia? A ação
acontece nas comunas e favelas, a periferia se transforma na totalidade do espaço urbano, o
centro se traslada as margens e é desde ali onde se questionam as relações de poder e seus
significados. Estes espaços representam as zonas excluídas da modernidade, ou mais exatamente,
as áreas que condensam os aspectos negativos da modernidade e do capitalismo neoliberal.
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A relação entre cidade-campo durante o século vinte é um produto especifico da
modernidade, por isso a oposição binária destes termos sob a concepção do intelectual letrado,
representava a civilização oposta à barbárie. Nas ficções contemporâneas, esta dicotomia se acha
trasladada a cidade e definida em termos sociais de classe: a classe baixa representa a prémodernidade (e o fracasso do sistema capitalista) e as classes altas encarnam uma modernidade
permanentemente ameaçada pela barbárie inculta. Diversos sociólogos falam sobre a cidade
dupla (Manuel Castells), cidade dividida (Michael Bounds), e cidade partida (Zuenir Ventura),
ao se referir as imagens fragmentarias e excludentes que se constroem da cidade pós-moderna,
porém, considero que nestes casos nos confrontamos a impossibilidade de delimitar
geograficamente estas zonas, pois nestes textos o que existe é um constante contato entre o
espaço do popular (subúrbios) e o da elite, e uma sensação de que as classes baixas ‘invadiram’ o
centro (que são as zonas do centro das cidades e os bairros privilegiados). Por isso, é o contato
entre “ambas as cidades” o que dilui a dicotomia absoluta.
Em Rosario Tijeras, por exemplo, a sensual mestiça “descida das comunas” e convertida
em sicário, não só freqüenta as melhores discotecas da cidade, mas estabelece uma relação
amorosa triangular com dois jovens universitários da creme de Medellín. Situação muito
parecida acontece no romance Satanás (2002) de Mario Mendoza, onde a personagem de classe
baixa Maria socializa com personagens da classe alta. A mesma lógica social se vê em Cidade de
Deus (2002), Cidade Baixa (2005), La Virgen de los sicarios entre outros (note-se que estou
falando aqui de contato e interação e não de incorporação). Os lugares de encontro dos
personagens, seus circuitos, sua dinâmica esta deslocada sem uma delimitação excludente.
Sobre estes temas se geram, na critica e também nos escritores, diretores e no público –
grupos estes que pertencem às classes médias e altas – um duplo interesse: o primeiro é um
interesse pela representação de uma violência descrita minuciosamente, enfatizando seu lado
atroz e escatológico. Estou me referindo a uma fascinação intimamente ligada as políticas de
mercado e a grande importância que adquiriram os meios massivos e tecnológicos de
comunicação na cultura mundial hoje em dia, dando a violência um lugar de protagonismo.
Neste modo de representação da violência, prevalece o elemento espetacular, gerado pela
indústria da cultura, especialmente pelos meios audiovisuais. Falamos então da violência como
excesso, que por meio da sua estetização se converte num espetáculo.
Apoiando esta afirmação sobre a importância central dos meios de comunicação para a
representação da violência, conferimos que, efetivamente, diversas disciplinas têm refletido
sobre o modo em que esta representação tem contribuído a criar um imaginário da violência que
afeta a percepção que os cidadãos têm da urbe nas suas experiências cotidianas.
Trata-se então de uma sensibilidade coletiva conectada com uma rede de informação
sustentada em e pelos mass media. A imprensa sensacionalista, o cinema, a televisão, as crônicas
e lendas urbanas, fortalecem a composição desse imaginário da violência que estamos referindonos. Porém, é importante esclarecer que a pesar de compartilhar a mesma matéria, as ficções
literárias e fílmicas apresentam estas imagens da violência através de um filtro, que tem como
finalidade criar um regime de representação que difere dos meios de comunicação massivos na
sua valorização da violência, do crime e da figura do criminoso. Por isso é um dato central para
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esta aproximação critica às ficções contemporâneas, a constatação de que este imaginário que da
forma a uma sensibilidade urbana, subministra elementos que serão objetos de incorporação e
reelaborarão por estes textos.
Neste ponto é significativo notar que estes autores e diretores não só pertencerem à
intelligentsia dos seus respectivos países de origem, mas que também reproduzem nos seus
textos uma visão da violência urbana que é própria do seu estamento. Este posicionamento do
autor é coerente com uma segunda comprovação: a de que o público ideal construído por estas
ficções é também membro das classes medias e altas, razão pela qual existe uma transmissão
circular de imagens e estereótipos que circulam no interior de um mesmo grupo social e que
provêem do mesmo imaginário.
Por outro lado, um segundo aspecto interessante para os leitores, autores e críticos, é não
só a figura do marginal, mas também o seu ambiente. Pela extração social dos indivíduos que
intervém na produção e recepção dos textos, o olhar que projetam sobre as classes baixas e
marginais possui ao mesmo tempo um componente de fascinação e outro de repulsão frente ao
desconhecido, sentido como “outredade”, nos termos de Edward Said.
Falamos então de textos culturais produzidos e consumidos por pessoas que definem a
marginalidade como uma alteridade. Dentro deste modo de compreender a marginalidade, o
criminoso é um sujeito que não pode ser redimido nem incorporado ao sistema social burguês.
Ele é, efetivamente, uma margem que habita uma dimensão alheia na qual instaura um ordem
paralelo ao oficial, que é ilegal, pois está baseado nas máfias, e desde onde exerce uma ameaça
constante sobre a cidade e seus cidadãos.
O olhar do escritor sobre a cidade nos permite comprovar que, claramente, estamos frente
ao fim do letrado e de sua cidade ideal. Também não se trata aqui do flaneur, sua experiência
urbana não ocorre através do passeio desinteressado pela cidade, este novo espectador da urbe
pos-moderna recria a cidade como um espaço doente, em crise, desmembrado, que perverte seus
habitantes e leva a uma progressiva decadência. Esta cidade latino-americana, produto da
imaginação destes artistas se encontra mudada, ou mais ainda, deformada.
Este seria, em minha opinião, o novo modelo do espaço urbano e da experiência urbana
vivida por seus personagens nas ficções contemporâneas da Colômbia e do Brasil. Este novo
modelo está baseado nos meios de comunicação massivos, no imaginário popular e, sobretudo,
na aceitação da violência urbana caracterizada como espetáculo e performance. A violência
sistemática e caótica em mãos de criminosos é apresentada como chave para entender a
experiência nacional e, ao mesmo tempo, é construída como uma sinédoque da débâcle do
capitalismo moderno na America Latina.
A ‘sicaresca’ se relaciona com o Bildungsroman, o romance sentimental e o da picaresca.
As origens deste tipo poderiam achar-se na figura do malandro, presente no folclore lusitano
(como o personagem Pedro Malasartes, por exemplo) o ladrão de Farsa do clérigo da Beira
(1529) de Gil Vicente. No Brasil se acredita que o primeiro texto que incorpora o malandro é
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Memórias de um Sargento de milícias (1890) de Manuel Antonio de Almeida. Porém a primeira
descrição da favela acha-se na crônica “A cidade do morro de Santo Antonio” de João do Rio,
publicada no jornal Gazeta de Notícias em 1908. O morador da favela como representante do
lumpemproletarido aparece no cinema a partir do popular filme de Humberto Mauro Favela dos
meus amores (1935); este tipo de representação idealizada e paternalista repete-se em Orfeu
Negro (1959), filme francês de Marcel Camus. Somente a partir de filmes como os de Nelson
Pereira dos Santos - Rio 40º (1956) e Rio Zona Norte (1957) - é que o contexto da favela e seu
morador são mais complexos na sua representação ficcional ao mesmo tempo em que o favelado
vai, paulatinamente, se convertido em um criminoso. Isto se observa na representação que
Assalto ao trem pagador (1962) de Roberto Farias oferece do favelado marginal como ladrão,
assassino y alcoólatra; ‘meninos de rua’ cada vez mais jovens, desde Pixote, a lei do mais fraco
(1981) de Hector Babenco até o filme Cidade de Deus de Fernando Meirelles.
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Por exemplo, Inferno (2000) e O matador (1998) de Patricia Melo, Cidade de Deus e Cidade
dos homens (2002-2005) do Diretor Fernando Meirelles, Tropa de elite (2007), dirigida por Jose
Padilha, Cidade Baixa (2005) do diretor Sergio Machado, Capão Pecado (2000) de Ferrez, e
Cenas da Favela (2007), texto organizado por Nelson de Oliveira.
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Criminal kinships and coming of age: the portrayal of lower-class youths in contemporary
Brazilian and Colombian works of fiction. University of North Carolina at Chapel Hill. MA
thesis. 2006.
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