A FORMA URBANA MEDIEVAL Teoria e História do Urbanismo 1 Noemi Yolan Nagy Fritsch PERIODIZAÇÃO A Idade Média (ou Idade Medieval) foi delimitada tradicionalmente com ênfase em eventos políticos. Iniciou-se com a desintegração do Império Romano do Ocidente, no século V (476), e terminou com o fim do Império Romano do Oriente (Queda de Constantinopla, atual Istambul, na Turquia), no século XV (1453). Pintura de uma cidade na Toscana – Itália. Representação da cidade medieval, 1340. A Era Medieval pode também ser subdividida em períodos menores: - Alta Idade Média – séc. V ao X; - Baixa Idade Média – séc. XI ao XV. CRISE Após a queda do Império Romano: diminuição do ritmo do crescimento demográfico. Vida urbana substancialmente reduzida. Efeito mais evidente da crise econômica e política (nos primeiros 500 anos): ruína das cidades e dispersão dos habitantes pelos campos, de onde podem extrair da terra seu sustento. Sociedade rural (base da organização feudal): cidades não funcionam mais como centros administrativos e muito pouco como centros de produção e de troca. Braga – Portugal, em 1594. FORMAÇÃO DAS CIDADES MEDIEVAIS: DIVERSAS ORIGENS Antigas cidades romanas que permaneceram ou que, tendo sido abandonadas, são posteriormente reocupadas. Burgos, aldeias rurais ou antigos santuários que se desenvolveram até formar cidades. Antigos santuários cristãos instalados fora Cidades que se formam pelo crescimento de das cidades romanas e aldeias rurais. que, no período medieval, vão formar novos núcleos Novas cidades fundadas como bases urbanos. comerciais e militares a partir de um plano geométrico pré-determinado. Ex: Bastides (exceção). Dois tipos de traçado urbano básico: 1. Forma orgânica, em geral radiocêntrica (cidades novas) 2. Sobreposição sobre traçado ortogonal romano préexistente. 1. Planta atual de Serpa – Portugal. Núcleo medieval tracejado (muralhas e traçado mais irregular adaptado à topografia). 2. Aosta - Itália – antiga cidade romana (cidade medieval sobreposta ao traçado romano). Cidade medieval plano regulador Cidades novas: forma orgânica, pelo desenvolvimento de antigas estruturas romanas (pedras de templos e edifícios). 2 Óbidos – Portugal Com o núcleo medieval e a expansão posterior. Vista a partir das muralhas em direção ao castelo. Planta da praça da igreja e mercado com o muro de suporte. 1 3 Razões da forma orgânica: - escassez dos meios - escassez de técnicos especializados - falta de cultura artística organizada - urgência das necessidades de defesa e de sobrevivência - novo espírito de liberdade e de confiança. Sienna - Itália. Planta da cidade no séc. XVI. Planta da Praça do Campo. Vista aérea. Sobreposição do traçado radioconcêntrico ao traçado ortogonal romano. Motivos: - crescimento e instalação de novas funções (ordens militares e religiosas). - falta de espaço dentro do perímetro amuralhado. -dificuldade na obtenção dos materiais de construção (utilização dos restos das antigas cidades romanas: pedras e templos e edifícios). Planos de 8 Bastides francesas, 1250-1300. A sobreposição de traçados e construções realiza-se sem ordem pré-definida e com pontos de apoio nos eixos que ligam as cidades. Aspecto final de aparente desordem, muitas vezes favorecida pela topografia do terreno, que desaconselhava traçados geométricos e marcava as linhas gerais dos dorsos montanhosos, das enseadas, dos cursos de água. O loteamento vai se sobrepor às ruínas dos assentamentos anteriores. Gordes– França. CARACTERÍSTICAS: - Abandona-se a escala monumental. - Morfologia mais intimista, culminando na forma e na escala das pequenas cidades medievais, cujo desenvolvimento se apoia em classes sociais: o artesão e o comerciante, que se agrupam em sistemas de corporação. Cidade provençal de Avignon – França (ex-sede do Papado) - Espaço público tem uma estrutura complexa, porque deve dar lugar a diversos poderes: o episcopado, o governo municipal, as ordens religiosas, as corporações. Toledo, Espanha - Assim uma cidade grande nunca tem um único centro: tem um centro religioso (com a catedral e o palácio episcopal), um centro civil (com o palácio municipal), um ou mais centros comerciais com lojas e os palácios das associações mercantis. MURALHAS: - Defesa (muros, torres, fossos, muralhas). - Clara separação campo x cidade. - Delimita a cidade e caracteriza sua forma e imagem. - Crescimento da cidade se dá através de anéis sucessivos de construções e de sistemas defensivos. - A construção de um novo cinturão (obra pública mais cara) é adiada até que no velho não haja espaço disponível. - Bairros medievais são compactos e as casas se desenvolvem em altura. - Grandes muros construídos em fins do séc. XIII e início do XIV em Florença, Siena, Bolonha, Pádua, Gand, etc. se revelaram demasiado grandes quando a população, no séc. XIV, deixou de crescer ou diminuiu. Em seu interior ficaram grandes espaços verdes, que foram ocupados somente no séc. XIX. Castelo de Carcassone – França. Palácio dos Cavaleiros em Rodes – Grécia. Castelo medieval em Navarra – Espanha. RUAS: - Servem à circulação e acesso aos edifícios. - Ruas não são todas iguais, com gradação contínua de artérias principais e secundárias. Somente as secundárias são simples passagens. Todas as outras se prestam a vários usos: tráfego, parada, comércio, reuniões. - Ligados às ruas estão os edifícios com suas fachadas de grande valor comercial, já que os pisos térreos são ocupados por lojas. - Também são extensão do mercado e nelas se negocia, compra e vende. - Traçado em função do percurso de pedestres e animais de carga. - Ruas estreitas compensadas pela existência de hortas, jardins e espaços livres no interior dos quarteirões. - Edifícios habitacionais regulares e uniformes, formando pano de fundo da estrutura urbana. ESPAÇOS PÚBLICOS: Mercado - Principal razão da cidade: lugar de trocas e serviços. - Espaço aberto e público. - Sua posição varia desde o adro da igreja ao centro da cidade, ou junto a uma de suas portas. San Gimignano – Itália. Praça - Geralmente irregular. - É um largo ligado estritamente à rua, que para ela converge. -Possui funções importantes de comércio e reunião social. - Divide-se geralmente na praça do mercado e na praça de igreja (adro). - Resulta mais de um vazio aberto na estrutura urbano do que de um desenho prévio. Edifícios singulares o Igreja ou catedral: religiosidade; o Castelo: defesa e poder; o Palácio, torres senhoriais ou Câmara Municipal : poder. - Se sobressaem na forma urbana em contraponto à forma modesta das habitações. - São elementos física e ritualmente dominantes, embora não estruturem traçados. - Muitas vezes estão associados ao espaço público coletivo – a praça e o mercado. Assis – Itália. Palácio de Teodorico em Ravenna – Itália. Interior da torre de Londres (séc. XI) QUARTEIRÃO: - Modificações em relação ao quarteirão romano quanto à forma, posição dos edifícios e função. -Edifícios se concentram na periferia ou no perímetro do quarteirão em contato direto com a rua deixando livre a zona posterior de cada lote, que é utilizada para hortas ou jardins privados e constitui uma área de reserva e salubridade urbana. - Forma do quarteirão determinada pelos traçados viários. Casas, quase sempre de muitos andares, se abrem para o espaço público e têm uma fachada que contribui para formar o ambiente da rua ou da praça. JARDIM MEDIEVAL • Com o fim da antiguidade, a arte dos jardins passou por um longo período de obscuridade na Europa Ocidental pois a doutrina cristã nunca permitiu este luxo secular. • A arte dos jardins adquiriu nos mosteiros valores materiais e espirituais. • Privado de toda significação religiosa na cultura ocidental o jardim não podia conservar sua eminência. Sua expansão só aconteceu com a evolução cultural e espiritual do renascimento. • Haviam na idade média três tipos de jardins - O jardim dos prazeres - A horta utilitária - O jardim das plantas ornamentais • Os jardins tinham como característica marcante a simplicidade, retraimento. • Com o Jardim Medieval, assiste-se à mistura do papel utilitário do jardim, no qual se destaca o jardim farmacêutico, com a função estética proporcionada pelas plantas, e no qual a horticultura é vista como uma forma de arte. As plantas assumem igualmente um papel simbólico. • O Jardim da Idade Média caracteriza-se pelo cultivo de pomares (pereiras, limoeiros, etc.), plantas medicinais, aromáticas e gastronômicas. Decresceu o uso de plantas ornamentais, limitando-se o elemento flor a servir de ornamentação dos altares. No entanto, a topiária de buxo, teixo e murta continuaram a proliferar, formando muros de verdura. Localizava-se geralmente fora das muralhas dos castelos ou em pátios interiores e abadias. - Esta é a essência do Jardim Medieval: • • • • • • Hortus conclusus” - Jardim Secreto - Mosteiros e castelos . Cultivavam: - plantas úteis para alimentação; - plantas medicinais; - flores para ornamentação dos altares. Os próprios religiosos cultivavam seus jardins pois o trabalho com a terra purificava e alimentava a alma. “Hortus deliciarum” • Jardins imaginários descritos pela literatura e pintura medievais. Os príncipes e poetas se apropriaram deste jardim paradisíaco. • Os jardins literários eram lugares ideais, oníricos e alegóricos mistura da imaginação e da realidade, onde os símbolos cristãos se transformavam em alegorias do prazer. • Romance de Tristão e Romance da Rosa. • Surgem também na Idade Média o labirinto (inspirado na tradição clássica cretense da lenda do minotauro e os primeiros jardins botânicos, criados a partir da influência islâmica que serviram de inspiração para os jardins do renascimento. Renascimento econômico na Europa - Séculos X e XI (Baixa Idade Média): estabilidade política e ressurgimento do comércio voltaram a dinamizar as estruturas urbanas. - Aumento da população (de 22 milhões em 950 para 55 milhões em 1350) e da produção agrícola e a indústria e o comércio adquirem nova importância. Motivos do renascimento econômico: - Inovações técnicas na agricultura: rotação trienal de culturas, novos sistemas de encangar o cavalo e o boi, difusão dos moinhos de água. - Influência das cidades marinhas (Veneza, Gênova, Pisa, Amalfi), que mantiveram contato com o comércio internacional do Mediterrâneo e incentivam o renascimento das outras cidades como centros comerciais. Bibliografia • BENEVOLO, Leonardo – A história da cidade – São Paulo, Perspectiva, 2 • Google Imagens