UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE

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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
ESPECIALIZAÇÃO EM: Educação Estética: Arte e as Perspectivas
Contemporâneas
NATHÁLIA NEVES AQUINO
O TEATRO MÁGICO: ARTE E CULTURA DE RESISTÊNCIA
CRICIUMA, FEVEREIRO DE 2011
NATHÁLIA NEVES AQUINO
O TEATRO MÁGICO: ARTE E CULTURA DE RESISTÊNCIA
Monografia apresentada à Diretoria de Pósgraduação da Universidade do Extremo Sul
Catarinense – UNESC, para a obtenção do
título de especialista em Educação Estética.
Orientador: Prof. Dr. Gladir da Silva Cabral
CRICIÚMA, FEVEREIRO DE 2011
Dedico este trabalho a meus pais:
Minha
mãe,
pessoa
que
sempre
me
incentivou e a quem amo muito. Meu pai,
meu amigo, que eu tanto amo e que ajudou
a tornar este sonho realidade.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos os que de certa forma contribuíram para a realização
deste trabalho.
Muito obrigada a Deus por nunca me deixar desistir. Aos meus pais
Augusto e Ereny, pela extrema paciência e amor dedicado.
O meu orientador, Prof. Gladir, pela paciência, e-mails e diálogos.
Aos meus amigos, por partilharem comigo os momentos bons, me
acolherem nos dias mais difíceis e por me ajudarem sempre que precisei: à Michele
pelo companheirismo durante esta e outras caminhadas, ao Tiago pelo incentivo,
paciência e positividade, à Belise pelos momentos de descontração, à Cíntia
simplesmente por existir e ser uma grande amiga, à Grazi, irmãzinha do coração que
sempre me dá os mais certos conselhos, ao Glaucus por me aguentar todos os dias
e me incentivar nos momentos mais difíceis, ao Georg por contribuir para a minha
bagagem musical ao me apresentar “O Teatro Mágico”, ao Juliano Gordo, por me
fazer “cair na real” mesmo nas horas mais irreais, e a todos os outros que aqui não
cito, mas que moram no meu coração e que fazem parte dessa grande maravilha
que é a minha vida.
“O Teatro Mágico é um lugar onde tudo é possível”
Fernando Anitelli
RESUMO
O que uma banda independente como “O Teatro Mágico” quer trazer a seu público?
Como esse público se compõe? Quais as linguagens artísticas presentes no
trabalho desse grupo? Como se dá a discussão sobre identidades nas canções da
trupe? E ainda, qual o lugar que o grupo ocupa na produção artística e cultural da
contemporaneidade? Essas e outras questões estiveram presentes neste trabalho
que teve como objetivo entender como o grupo “O teatro Mágico” se manifesta na
sociedade contemporânea como cultura de resistência, analisando as linguagens
artísticas usadas pelo grupo, assim como a forma de divulgação de seu trabalho.
Esta pesquisa foi realizada de forma bibliográfica, buscando sempre materiais
teóricos que subsidiem as questões aqui expressas. A internet foi uma importante
ferramenta de pesquisa e interação para a execução desta pesquisa, principalmente
o site oficial d‟O Teatro Mágico, que de forma aberta expõe pensamentos e materiais
sobre a trupe.
Palavras-chave: O teatro Mágico. Linguagens artísticas. Mídia. Identidade.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7
2. SOBRE “O TEATRO MÁGICO”: PEQUENO HISTÓRICO DO GRUPO ............... 9
3. O TEATRO MÁGICO E AS IDENTIDADES .......................................................... 15
4. O TEATRO MÁGICO E AS MÍDIAS ..................................................................... 23
5. LINGUAGENS ARTÍSTICAS ................................................................................ 29
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 37
7. ANEXOS ............................................................................................................... 39
8. REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 41
1. INTRODUÇÃO
Na arte, não vemos apenas as obras, mas a nós
mesmos e a sociedade em que vivemos. Ela
desacomoda as percepções, instiga, incomoda,
rejubila. Ela aciona toda sorte de sensações
positivas e/ou negativas, mas, sobretudo, faz-nos
estranhar o familiar e perceber as coisas de outros
ângulos, de outras formas. (Leite e Ostetto, 2004,
p. 11).
O presente trabalho busca entender e esclarecer como o grupo “O Teatro
Mágico” se manifesta na sociedade contemporânea como produtor de cultura e arte
de resistência. O grupo o Teatro Mágico age na cena musical nacional como um
grupo popular e independente. Eles se colocam contra o mercado da arte ao
disponibilizarem suas músicas gratuitamente na internet. Utilizam em suas
apresentações musicais diversas outras linguagens da arte, como performances
circenses, dança e teatro. Em suas músicas, trazem personagens da nossa cultura,
tratam do cotidiano e nos levam a pensar sobre diversos temas sociais discutidos na
atualidade, tais como o preconceito linguístico, o modo de vida contemporâneo e a
formação das identidades do povo brasileiro. Por sua postura enquanto “grupo
musical independente”, faz-nos refletir até mesmo sobre os artistas e suas obras na
atualidade globalizada e controlada pela força do mercado.
Diante dessas prévias observações sobre o grupo “O teatro Mágico”, sobre o
que é a arte e sobre a formação de identidades é que percebo a importância de
compreender como um grupo de “cultura de resistência” consegue ganhar voz na
cena atual, como a internet colabora para essa globalização cultural e ainda como o
sujeito é influenciado e receptivo diante dessa e das tantas formas de comunicação
e conhecimentos que constituem, assim, a sua identidade.
Pretendo, ainda, entender como uma banda independente “O teatro Mágico”
se manifesta e tem seu lugar reconhecido na sociedade contemporânea, como o
grupo constrói sua a sua identidade e a dos personagens citados em suas músicas,
como eles levam sua arte ao público e qual é esse público e como ele se constitui,
buscando entender ainda sobre as linguagens artísticas utilizadas pelo grupo e por
que dessas várias linguagens e a relação entre a música, o teatro e o circo nas
obras do grupo.
7
Para a realização desta pesquisa, trago Zamboni (2001, p. 43) quando afirma
que a “pesquisa é a busca sistemática de soluções, com o fim de descobrir ou
estabelecer fatos ou princípios relativos a qualquer área do conhecimento humano”.
Sendo assim, procurarei primeiramente textos e materiais teóricos que possam me
dar subsídio para esta pesquisa de caráter bibliográfico. O registro escrito é sem
dúvida algo indispensável nesta pesquisa. Também levantarei análises sobre
algumas obras do grupo “O Teatro Mágico”, assim como sobre textos teóricos que
discutam a formação de identidades, de sociedades, sobre a indústria cultural e
artística.
No primeiro capítulo deste trabalho será apresentado um breve histórico do
grupo “O Teatro Mágico”, como eles se constituem, quais são seus ideais como
artistas e como se dá a forma de trabalho dessa trupe tão diferenciada dentro da
cena artística musical da contemporaneidade. Busco trazer curiosidades e fatos que
influenciaram na criação da trupe e sua formação. Num segundo momento, estarei
discutindo sobre as produções musicais d‟Teatro Mágico juntamente com a
formação da identidade, analisando a formação da trupe, assim como a formação do
público que acompanha as suas canções e os personagens nelas citados, buscando
referenciais teóricos em Stuart Hall e outros representantes dos Estudos Culturasi.
No terceiro capítulo, intitulado “O Teatro Mágico e as Mídias”, busco compreender
como se dá a relação do grupo com as diversas mídias de comunicação,
principalmente a internet, já que é o principal veículo de divulgação do trabalho da
trupe, procurando ainda compreender por que a utilização desse meio, ao invés de
meios tradicionais da cultura massiva, ou seja, as gravadoras, tornam o trabalho da
trupe ainda mais questionador, contestador e independente dentro da cena atual. No
último capítulo deste trabalho, trago O Teatro Mágico e as linguagens artísticas por
ele utilizadas, tais como o teatro, o circo, a dança e a música, buscando esclarecer
um pouco sobre cada linguagem e sua importância dentro das apresentações da
trupe. Concluindo o trabalho, trago breves reflexões e busco sintetizar as
discussões.
8
2. SOBRE “O TEATRO MÁGICO”: PEQUENO HISTÓRICO DO GRUPO
O grupo “O Teatro Mágico” nasceu com o primeiro projeto de um CD
independente, no ano de 2003, idealizado por Fernando Anitelli, como seu primeiro
trabalho solo e inspirado na obra literária O Lobo da Estepe, do escritor alemão
Hermann Hesse, cuja personagem principal, Harry Haller, assume até certo ponto da
obra dois tipos de personalidades e, em determinado momento, percebe-se atraído
por diversas outras personalidades que estão no seu interior, ou seja, a pluralidade
de personalidades em um único ser, “ele descobre sua pluralidade e descobre que o
homem não é só homem ou lobo, ele é uma junção infinita de personagens que vai
escolher interpretar em diferentes dias” (Anitelli, 2009). Em outra entrevista, Anitelli
comenta sobre as origens do grupo, confirmando a ligação com o escritor alemão:
O Lobo da Estepe foi justamente o primeiro momento desse projeto todo.
Justamente quando eu estava lendo esse livro me deparei com aquele
momento em que o personagem se depara com aquela placa “hoje a noite
teatro mágico entrada para raros”. Ele acredita que aquilo não é para ele,
ele quer ir embora, quando olha “só para raros, só para loucos”, mas ele
entra e ali se descobre plural, o personagem descobre a própria
pluralidade. Isso é fabuloso porque a gente é assim. Diariamente nós não
somos somente um em um milhão, somos um milhão em um. As maneiras
como a gente resolve reagir às coisas do cotidiano são muito distintas,
então é buscar esse melhor personagem que vive em nós. E o palhaço
traduz isso. Então juntei essa ideia do Lobo da Estepe, essa inspiração –
porque a ideia não é traduzir o livro de maneira alguma, ele serviu como
inspiração. Eu peguei isso aí e misturei com a ideia do sarau, que é aquela
variedade de timbres, de cores, misturei numa coisa só e a gente foi
aprendendo a montar, a fazer isso aí esse tempo todo. (apud Vianna, 2010)
Pensando nessa pluralidade de personalidades e buscando juntar em um só
espetáculo diversas linguagens da arte, como a música, o teatro, a dança e, ainda,
linguagens
da arte circense, tais como os malabaristas, palhaços e bailarinas,
nasceu o primeiro álbum do “O Teatro Mágico” no ano de 2003, intitulado Entrada
para Raros. Nele, a trupe, formada por músicos e artistas, já veio com o objetivo de
discutir vários temas sociais, como o racismo, a discriminação e até mesmo os
personagens ou identidades que temos de assumir diariamente em várias situações
do cotidiano, “a trupe estava imersa num paralelo, num lugar onde tudo era possível,
falávamos de lutar pelos nossos ideais, pelos sonhos” (Teatro Mágico, 2009).
9
Para Anitelli, “O Teatro Mágico é um lugar onde tudo é possível”. Para o
criador da trupe, “essa é a grande brincadeira, ser o que se é, afinal todos somos
raros e temos que ter consciência disso” (Teatro Mágico, 2009). E é com roupas e
maquiagens de palhaços que os integrantes da trupe nos trazem a ideia de
“personagem interno, escondido em cada um de nós” (WIKIPÉDIA, 2011). O
primeiro disco inicialmente era para ser apenas com “voz e violão, algumas poesias
e a ideia era que a pessoa ouvisse o álbum e sentisse que o que ela estivesse
ouvindo poderia acontecer na sala da casa dela” (Anitelli, 2009). Por isso, passou a
ter também sons de utensílios domésticos como garfos, facas e panelas, era um
verdadeiro sarau de sons, poesias e espetáculos, dando espaço ainda aos
instrumentos tradicionais como contrabaixo, bateria e violino. Foi assim que os
participantes da produção do álbum subiram rapidamente para a soma de trinta
integrantes, e nas apresentações somavam quarenta colaboradores.
A trupe conta hoje com um grande elenco: são 16 integrantes, entre eles os
músicos Fernando Anitelli (voz, violão e guitarra), Fernando Rosa (contra-baixo),
Miguel Assis (bateria), Nene dos Santos (bateria), Willians Marques (percussão e
malabares), Galdino Octopus (violino e bandolim), DJ HP (pick-ups e sonoplastia),
Silvio Depieri (sax e flauta), Kleber Saraiva (teclado) e os artistas circenses Rober
Tosta, Gabriela Veiga, Deinha Lamego, Tum Aguiar, Andrea Baubour, Wallace
Alcantara e Ivan Parente (ator e cantor). Além das equipes técnicas e de produção,
que também somam um considerável número de colaboradores, a trupe conta ainda
com alguns apoios culturais e parcerias com empesas e instituições (O Teatro
Mágico, 2009).
É defendendo a “bandeira da música livre” e disponibilizando gratuitamente as
suas músicas na internet que “O Teatro Mágico passa, cada vez mais, a apresentar
um perfil questionador e contestador” (O Teatro Mágico, 2009). Os CDs e DVDs da
trupe também são vendidos, mas a preços populares, buscando atingir ainda mais o
público em geral (idem). Para a trupe, além de grandes incentivadores, o público é
parte de seu espetáculo, pois ele cria tal identificação com as produções musicais do
grupo e com as linguagens visuais por eles usadas que algumas pessoas chegam a
se caracterizar como os integrantes da trupe, o que realmente garante o alcance do
objetivo do grupo em relação à apropriação, por parte do grande público, da sua
obra.
10
Em uma de suas entrevistas, Anitelli afirma que o palhaço “é sempre disposto.
Ele é gatuno, malandro, mas é inocente, chora. Essa pluralidade de coisas, do
próprio bufão, o bobo da corte, sempre foi a lógica do palhaço” (Anitelli,2009), que
torna-se elemento essencial nos shows da trupe que assim se caracteriza, pois ele
simboliza o “personagem interno” que existe em cada um de nós. Para Anitelli, o
palhaço é o personagem que “seria capaz de traduzir essa instabilidade, esse caos
interior”. Segundo o site oficial do “Teatro Mágico”, durante os shows é que se dá
essa “grande” interação do público com a trupe.
E assim, Anitelli vai traçando um paralelo entre o real e o imaginário
enquanto o público, aos poucos, vai entrando na mesma freqüência
sinestésica marcada pelo ritmo do espetáculo. No final, palco e platéia se
fundem e cada um dos presentes vai descobrindo a delícia de se permitir
ser um pouco mais de si mesmo. (O Teatro Mágico, 2009).
O segundo álbum, intitulado O segundo ato, surge após quatro anos de
trabalho, com um número bem considerável de CDs vendidos, a música bem
difundida entre o público na internet e com uma valorização do seu trabalho perante
as mídias, como jornais e televisão. Nessa etapa do projeto, a trupe se propõe “a
entrar mais fundo nos debates que cercam a sociedade desigual e desumana que
nos rodeia” (Vianna, 2008). Maíra Vianna, em texto publicado em 25 de julho de
2008, comenta:
Nesta nova fase, é como se a trupe chegasse no universo urbano com
mais profundidade , como o cotidiano dos moradores de rua citados na
canção “Cidadão de Papelão” ou a problemática da mecanização do
trabalho, citada no “Mérito e o Monstro” entre várias outras abordagens.
Indo mais além, há um debate sutil e, por vias opostas, mordaz, sobre o
amontoado de informações que absorvemos, sem perceber, assistindo aos
programas de TV. (Vianna, 2008).
A trupe que escreveu “seu nome na história da música popular brasileira com
o sucesso independente de gravadoras ou mídias de massa” (Teatro Mágico, 2009)
abre espaços para seu público, junta-se a ele, que não abrange apenas uma faixa
etária, são pessoas de várias idades, classes sociais e culturas. A internet é o
principal veículo de comunicação e divulgação do trabalho do grupo, o que também
facilita a interação das pessoas com a equipe, que além dos dois álbuns que possui,
já está planejando o terceiro álbum pré-intitulado O Terceiro Ato.
11
“A trupe”
Fonte: (http://coracao26.blogspot.com/2010/07/o-teatro-magico.html)
Defendendo bandeira da música livre e do movimento por eles criado,
chamado de MPB (Música para baixar), a atitude da trupe vai contra o modo
capitalista de produção cultural e musical que ainda existe nos dias de hoje. Para
Anitelli, esse é o objetivo: “A gente resolveu construir esse movimento para poder
cada vez mais politizar nosso público e potencializar essa discussão para além do
Teatro Mágico” (Anitelli, 2009).
Segundo Gustavo Anitelli, citando Hanna Arendt, “a cultura de massa
cumpria um papel de responder a uma necessidade biológica do indivíduo, que já
não mais possuía tempo livre, e sim um leve descanso ou pausa entre um dia e
outro na rotina do trabalho” (O Teatro Mágico, 2009). Logo, a massificação da
cultura torna-a capital de grandes empresas que visam ao lucro, difundindo essas
produções por todo o mundo, vendendo o seu produto, dando maior visibilidade aos
artistas que mais lhes convém, afinal, a gravadora geralmente era a única forma de
se produzir um álbum, devido ao grande custo de equipamentos etc.
Nos dias de hoje, com o avanço tecnológico e o maior acesso da população a
esses meios, os movimentos como a “nova” MPB ganham força. Por meio da
internet, conseguimos visualizar essa revolução na cena musical brasileira e
internacional. Para Gustavo Anitelli, irmão do criador da trupe:
Essa ferramenta que tem revolucionado o mundo foi capaz de recriar a
relação não somente do mercado com o artista, mas também do artista
com seu público, já que a comunicação livre permite a troca direta de
informações, sem a dependência dos atravessadores da indústria que
distanciavam esse elo principal. (Aniteli, 2010).
12
Assim, as produções destinadas às massas foram perdendo parte de sua
força. Agora existem vários produtores musicais independentes em diversos cantos
do mundo, surgiram novos artistas, novas possibilidades de fazer e receber música.
A cultura está se democratizando aos poucos, possibilitando o acesso a qualquer
pessoa. O Teatro Mágico colabora dessa forma com o público, além de vender seus
CDS a preços muito baixos, a trupe se mantém também com a venda de produtos
pela internet e com shows, nos quais se preocupa ainda em arrecadar doações de
alimentos para algumas entidades que necessitam de ajuda. Anitelli conta que
inicialmente vendiam os CDs, gravados na garagem de sua casa, a R$ 10,00, mas
que em seguida:
Passamos a vendê-lo por 5 reais. Nos lugares mais periféricos, mais
humildes, a gente vendia por 1 real, às vezes dávamos. Essa lógica de
espalhar a música, de ela se tornar um vírus do bem, distribuída na rede,
pelo CD a preço acessível, passou a ser nossa bandeira, nosso carrochefe. (Anitelli, 2009).
É com esse perfil questionador e socializador de cultura que o grupo age na
cena musical atual, cantando e encantando gerações entre seus fãs. O grupo tem
vários
espaços
na
internet,
entre
eles
o
site
oficial
do
grupo
www.oteatromagico.mus.br, “.mus” e não “.com”, pois “.com” vem de comércio e
“.mus”, não, pois o domínio “.mus” provém é especialmente destinado a músicos e
artistas em geral. O grupo ocupa também sites de relacionamento como orkut,
facebook, twitter e ainda sites de divulgação de música livre para baixar, como o site
do Terra com o palco mp3 e outros de exibições de vídeos, com clipes, músicas e
entrevistas, como é o caso do Youtube. Divulgando o trabalho da trupe, ainda existe
o livro intitulado O Teatro Mágico em Palavras, escrito por Maíra Viana. O livro,
assim como os demais materiais de divulgação, é vendido a preço popular pela
internet, trata-se de
Um conto inspirado em cada canção de Fernando Anitelli contidas no CD
"Entrada Para Raros". As histórias ganharam vida nos palcos do Teatro
Mágico com interpretações feitas pela trupe e também por atores
convidados. São crônicas, contos e fábulas do cotidiano. "O que ela quis
dizer com isso: será metáfora ou pé-da-letra? Será que foi isto que ela
disse? Ou seriam querubins fugidios soprando coisas nos ouvidos?",
questões pertinentes ao prefácio do livro, escrito pelo próprio Fernando
Antelli. (O Teatro Mágico, 2009)
A trupe comemorou no ano de 2010, sete anos de existência na cena musical
brasileira, sempre com uma forte ideologia independente. Mesmo já tendo recebido
13
algumas propostas de gravadoras, não se deixaram corromper pelo sistema
massificador de cultura e, quanto a essas propostas, afirmam não aceitá-las, pois
para a trupe “nenhuma delas traduzia nossas ideologias e preferimos continuar o
caminho, sozinhos” (O Teatro Mágico, 2009), complementando que “sozinhos” não,
mas sempre contando com o apoio do seu público. No ano de 2010 também foi o
lançamento do segundo livro de Maíra Viana sobre a trupe, desta vez intitulado O
Teatro Mágico em Palavras II, onde a autora “se propõe a um diálogo não só
musical e literário, mas também visual, pelas mãos talentosas do ilustrador Rodrigo
Franco, que mantém a linha regionalista da xilogravura, marca já registrada do
projeto” (idem).
O grupo já contou também com algumas apresentações em televisões
brasileiras, como é o caso da Rede Globo, onde fizeram uma participação especial
em uma novela de horário nobre da emissora, assim como participações em
programas como o “Altas Horas”, contando ainda com a divulgações no “Jornal
Hoje” da mesma emissora. É uma forma de levar a todos, sem discriminações, as
suas canções e poesias. A televisão também mostra o que o público quer ver, e o
público mostra que se identifica com o trabalho do “Teatro Mágico”, que faz seu
trabalho por “amor à música” e pela “vontade de se expressar”, como conta Anitelli
em uma entrevista ao apresentador Serginho Groisman, que define a trupe como um
“grupo que mistura a música e o circo de maneira espetacular”, e ao seu público no
programa “Altas Horas”. Termino, então, este capítulo sobre a história do grupo
citando a fala de um de seus fãs no “Jornal Hoje”. Para ele, “O Teatro Mágico é vida,
não é revolução, não é política, é vida. É acreditar no ser humano”
(http://www.youtube.com/watch?v=GshS8wnRTd8).
14
3. O TEATRO MÁGICO E AS IDENTIDADES
Atualmente, a questão da formação de identidade está sendo muito discutida,
também fala-se sobre “crise de identidade”, ou seja, como está se dando a mudança
dos processos de construção das identidades contemporâneas, o que está alterando
a forma como o indivíduo interage com o mundo. Partindo da idéia da formação da
identidade cultural no mundo pós-moderno regido pelo sistema capitalista, creio que
seja válido ilustrar a questão da analisando as principais características das obras
do grupo “O Teatro Mágico”, que age na cena artística musical de forma
independente, sem se voltar totalmente para o mercado artístico convencional e,
assim, prefere tornar a sua arte acessível para todos por meio da internet.
A identidade de cada um forma-se a partir da sua interação com a sociedade
e com a cultura em que está inserido, seja em nível étnico, racial, religioso e
nacional. Contudo, hoje em dia as identidades estão se formando de forma cada vez
mais fragmentada em razão do processo de globalização. À medida que a
sociedade sofre transformações em sua estrutura por causa da globalização, as
identidades pessoais também se alteram, são muitas ideias e informações que nos
formam como sujeitos. Podemos dizer que a identidade também é efêmera,
configurando-se, assim, a tal “crise de identidade” citada por Hall (2001). Para
Woodward (2005), essa crise de identidade se dá porque a vida moderna “exige que
assumamos diferentes identidades, mas essas diferentes identidades podem estar
em conflito” (2005, p. 31). Trago um trecho de uma composição d‟O Teatro Mágico
mostrando a questão do conflito de identidade. Ela traz o exemplo de uma senhora
que tem sua identidade formada culturalmente pelo meio em que viveu e que vem
sofrendo transformações em seu modo de pensar e entender o mundo devido à
modernidade.
Ah eu tenho fé em Deus... né?
Tudo que eu peço ele me ouci... né?
Aí quando eu to com algum pobrema eu digo:
Meu Deus! me ajuda que eu to com esse problema!
Aí eu peço muito a Deus... aí eu fecho meus olhos... né?
E Deus me ouci na hora que eu peço pra ele, né?
Eu desejo ir embora um dia pra Recife
Não vou porque tenho medo de avião, de torro...de torroristo
Aí eu tenho medo, né?
Corra tudo bem... se Deus quiser... se deus quiser... (Teatro Mágico, 2003)
15
Nesse trecho da música “Zazulejo”, composta por Anitelli, a mulher fala da
sua fé em Deus, que se contrapõe com os fatos da atualidade. É uma fala
extremamente rica, pois mostra a cultura “esquecida” em contraste com a cultura
“hoje valorizada”, revelando a formação de identidade de tal personagem. Trata-se
de uma mulher pobre, do Nordeste, portanto alguém que encarna e testemunha todo
o processo de migração dentro do país, alguém que vem de uma área
provavelmente rural para viver (ou sobreviver) no centro caótico da urbanidade.
Nota-se também a importância que a experiência religiosa tem para esse
personagem. Terminando a música, o autor nos faz pensar a respeito do que é certo
ou errado, já que o certo e errado foram criados por nós mesmos, assim como a
forma de levarmos a vida. Um dos temas desta canção é, portanto, o do preconceito
social, regional e linguístico. A voz do cantor, o eu-lírico comenta:
Mas quando alguém te disser tá errado ou errada
Que não vai S na cebola e não vai S em feliz
Que o X pode ter som de Z e o CH pode ter som de X
Acredito que errado é aquele que fala correto e não vive o que diz
"E eu sou uma pessoa muito divertida...
eles não inventavam nada... eu gostava de inventar as coisa
não sei falar direito...
inventar uma piada, inventar uma palavra, inventa uma brincadeira...
não sei falar
me da um golinho... me da um golinho...” (Teatro Mágico, 2003)
Vivemos na era chamada pós-moderna, isto é, um período em que o projeto
da modernidade passa por sua pior crise, talvez sua crise final. Como sujeitos,
constituímos a nossa identidade a partir de todo um processo histórico e social que
vivemos. Ora, a identidade é mutável, ela se transforma conforme amadurecemos e
interagimos com o mundo, conforme interpretamos e somos interpretados. Criamos
diferentes identidades, ou seja, diferentes roupagens para agir coerentemente com
os diversos círculos de convivência aos quais temos acesso. Para Woodward, “os
indivíduos vivem no interior de um grande numero de diferentes instituições, que
constituem aquilo que Pierre Bourdieu chama de „campos sociais‟, tais como as
famílias, os grupos de colegas, as instituições educacionais, os grupos de trabalho
ou partidos políticos” (Woodward, 2005, p. 30), e assim criamos uma maneira que
julgamos adequada para agir conforme o grupo com o qual estamos nos
relacionando no momento. Trago aqui uma canção d‟O Teatro Mágico, curiosamente
16
intitulada “(!)”, falando sobre essas diferentes identidades que assumimos
diariamente:
Quanta mudança alcança
O nosso ser posso ser assim daqui a pouco não
Quanta mudança alcança
O nosso ser posso ser assim daqui a pouco (!).
Vivendo em constantes transformações, a sociedade atual segue as principais
tendências de cada geração e desconstrói valores culturais que anteriormente
tinham caráter transcendental. Sendo assim, os sujeitos da atualidade formam suas
identidades de maneira fragmentada, algumas vezes manipuladas, enfim são
identidades globalizadas, inseridas no contexto pós-moderno. Essa “pluralização de
identidades” é formada ao longo da vida do sujeito inconscientemente por meio de
suas vivências, suas experiências e relacionamentos, e ainda por meio da
linguagem, que é de grande importância para a comunicação e a formação de
idéias, ideologias e identidades. As identidades não são mais formadas somente a
partir da cultura local, na modernidade, “os lugares permanecem fixos; é neles que
temos „raízes‟. Entretanto, o espaço pode ser “cruzado” num piscar de olhos – por
avião a jato, por fax ou por satélite” (Hall, 2005, p. 72-73).
A globalização nos permite a interconexão com o mundo, logo tem um papel
fundamental na formação de identidades híbridas, já que nos formamos a partir de
vários contextos culturais aos quais temos acesso e conhecimento. A partir desse
conhecimento, criamos nossas próprias identidades, que já não correspondem
somente a tempo, lugar, história e tradições culturais, mas também ao mercado
global e à vida social do presente, como afirma Woodward quando diz que “a
globalização envolve uma interação entre fatores econômicos e culturais, causando
mudanças nos padrões de produção e consumo, as quais por sua vez, produzem
identidades novas e globalizadas” (2005, p. 20).
As identidades são formadas ao longo da vida, com a interação do outro e
ainda sofrendo influência dos meios educacionais e artísticos, como a literatura, a
música, enfim, a arte, que pode também ser trada como parte de movimentos
históricos e sociais. O grupo “O Teatro Mágico” se utiliza de diversas linguagens
artísticas e traz ao seu público provocações para a reflexão sobre a reprodutibilidade
massiva dos “produtos artísticos”, sobre o que gostamos ou não e ainda sobre como
nos formamos sujeitos críticos perante o que nos é imposto pela mídia.
17
A massificação de “produtos culturais” é um dado inegável dessa
sociedade em que os produtos colocados à venda seguem o “gosto do
mercado” mais que o “gosto popular”. Na verdade, o povo, transformado
em massa, é também o mercado onde serão divulgados e vendidos esses
artigos. (Ostetto e Leite, 2004, p. 48).
Discutindo a formação de identidade no mundo moderno e capitalista,
referindo-me à massificação do mercado, trago Woodward propondo que atualmente
acontece uma certa massificação cultural de gostos e identidades, que passam de
local, ou seja, a cultura de determinado lugar, a cultura global, influenciada pela
mídia e pelo comércio. Para a autora:
A homogeneidade cultural promovida pelo mercado global pode levar ao
distanciamento da identidade relativamente à comunidade e à cultura local.
De forma alternativa, pode levar a uma resistência que pode fortalecer e
reafirmar algumas identidades nacionais e locais ou levar ao surgimento de
novas posições de identidades. (Woodward, 2005, p. 21)
O trabalho d‟O Teatro Mágico se diferencia do da maioria dos artistas e
músicos atuais pela utilização da internet e pela disponibilização gratuita de suas
canções, fazendo questionar as leis do mercado fonográfico e estimulando seu
público a pensar e refletir ainda mais sobre seu trabalho e sobre os temas discutidos
neles. Para Luciana Ostetto e Maria Isabel Leite, o gosto por algo está muito ligado à
cultura de massa imposta pela indústria, pois “o gosto não é natural, estamos
falando de uma sociedade capitalista, uma sociedade massificada, que produz
cultura de massa” (Ostetto e Leite, 2004, p. 48). Acredito que a atuação da trupe na
cena musical atual surge como um incentivo para pensar a respeito do que nos é
imposto, provocando-nos a resistir a essa massificação cultural, ou pelo menos a
nos questionarmos como sujeitos em formação, prestando mais atenção a quem
somos e quem queremos ser.
Walter Benjamin nos traz a questão da reprodução massiva e técnica das
obras de arte, aqui em específico a música, fazendo-nos pensar a respeito de como
essa reprodutibilidade técnica e massiva desvaloriza de certa maneira a poética da
obra, a sua trajetória de existência, a sua vida, e o seu “aqui e agora” (Benjamin,
1994, p. 168). Ele fala do verdadeiro valor da arte e da importância da sua
acessibilidade para a formação de bagagens artísticas e culturais dos sujeitos.
Entretanto, o mesmo autor reconhece que é por meio da reprodutibilidade que a
18
“obra” chega até o espectador. Logo, essa reprodução permite que o objeto
reproduzido se atualize conforme sua inserção na sociedade (p. 168-169).
Com a reprodução técnica da arte, ela se tornou mais acessível aos
espectadores, que também se tornaram mais números graças à disponibilidade de
exemplares disponibilizada na sociedade. Para Hall, essas experiências artísticas
também podem ser vistas como formadoras de identidades culturais à medida que
trabalham com significado e representação:
À medida em que os sistemas de significação e representação cultural se
multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade descontente e
cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos
nos identificar ao menos temporariamente. (2001, p. 13)
Partindo da ideia de que as identidades são formadas também a partir do
contato com diversas culturas, pela arte e pela interação com o outro ser social, a
reprodução técnica ganha uma certa autonomia dentro do mundo artístico, pois ela
pode “[...] colocar a cópia do original em situações impossíveis para o próprio
original. Ela pode principalmente, aproximar o espectador da obra [...]” (Benjamin,
1994, p. 168). Em contraste, a reprodução manual não consegue ganhar tal
autonomia, ainda mais hoje em dia, que temos muitos meios de comunicação
rápidos e acessíveis para interagirmos com os outros no resto do mundo por meio
da internet e da televisão, por exemplo, meios de comunicação que contribuem para
nossa bagagem cultural e construção identitária. Na composição “Xanéu nº 5”, a
trupe relata tal identificação de nós expectadores com os conteúdos expostos na
televisão, que se utiliza muitas vezes, em novelas, por exemplo, de temas comuns à
vida de todos:
A minha tv não se conteve
Atrevida passou a ter vida
Olhando pra mim.
Assistindo a todos os meus segredos,
minhas parcerias, dúvidas, medos,
Minha tv não obedece.
Mesmo com a influência dos meios de comunicação na formação dos sujeitos
atuais, o “outro” como sujeito é imprescindível para as relações sociais e de
formação de identidades. Para Bakhtin, “[a] alteridade define o ser humano, pois o
outro é imprescindível para a sua concepção: é impossível pensar no homem fora
das relações que o ligam ao outro” (Bakhtin apud Barros, 2001, p. 26). Essa
19
interação com o outro também forma nossa identidade, e hoje ela se dá também e
de forma ainda mais acessível pela internet e dos meios de comunicação que temos
à disposição. A tecnologia revoluciona o mundo e, com o mundo, as identidades se
transformam, a forma de linguagem e de comunicação se transforma. Para Bakhtin a
“linguagem é fundamental para a comunicação”, e “a interação dos interlocutores
funda a linguagem” (apud Barros, 2001, p. 28), mas que essa linguagem só se dá
pelo entendimento entre os interlocutores (p. 28). Num mundo tecnológico e
globalizado as linguagens escritas, visuais e auditivas fazem parte da forma de se
comunicar com o outro, frisando aqui o relacionamento e comunicação na internet.
Essa forma de relacionamento tecnológico já faz parte da cultura atual, porém não
substitui o contato humano, trago aqui o seguinte trecho da canção “Fé Solúvel”,
debatendo também sobre esse modo de viver e se relacionar com o mundo. Como
se pode observar, o discurso religioso e a recurso da informática se mesclam numa
canção em que a identidade parece frágil, como textos deletados pelo computador,
como mentiras bonitas em conversas.
Minha fé em pó solúvel
É... meu computador
Apagou minha memória
Meus textos da madrugada
Tudo o que eu já salvei
E o tanto que eu vou salvar
Das conversas sem pressa
Das mais bonitas mentiras
Segundo Hall, para Kevin Robin, “ao lado da tendência em direção à
homogeneização global, há também uma fascinação com a diferença e com a
mercantilização da etnia e da „alteridade‟” (Hall, 2006 p. 77). Por meio da
globalização somos induzidos a aceitar e compartilhar diversas formas de ser e
pensar. Somos criados a partir do outro, que não é só mais o outro presente, mas o
outro ausente, podendo ele estar a milhas de distância de nós, por meio das
tecnologias criadas. Para Hall, a globalização “tem um efeito pluralizante sobre as
identidades, produzindo uma variedade de possibilidades e novas posições de
identificação, e tornando as identidades mais posicionais, mais políticas, mais plurais
e diversas; menos fixas, unificadas ou trans-históricas” (idem, p. 87). O autor segue
sugerindo que no mundo atual “somos confrontados por uma gama de diferentes
identidades (cada qual nos fazendo apelos a diferentes partes de nós), dentre as
quais parece possível fazer uma escolha” (idem, p. 75). Para ilustrar essa gama de
20
identidades que formam a nossa identidade, trago um trecho de uma obra d‟O
Teatro Mágico, intitulada com o mesmo nome do grupo:
O teatro mágico é o teatro do nosso interior
A história que contamos todos os dias
E ainda não nos demos conta
As escolhas que fazemos em busca dos melhores atos,
Dos melhores sabores,
Das melhores melodias e dos melhores personagens
Que nos compõem,
As peças que encenamos e aquelas que nos encerram
Nosso roteiro imaginário é a maneira improvisada
De viver a vida
De sobreviver o dia, de ressaltar os tombos e relançar as idéias,
O teatro nosso de cada dia
Para o grupo, a identidade também parece se formar de maneira
fragmentada, o que somos hoje pode não ser igual ao que seremos amanhã, como
afirma Brait ao citar Bakthin e Medvedev, dizendo que “a criação ideológica não
existe em nós, mas entre nós” (2001, p. 77). É o que o autor chama de “dialogismo
entre sujeitos e sociedades” (idem, p. 78), que o mundo globalizado nos impõe,
sugerindo que as fronteiras sejam ultrapassadas, como diz Hall, citando McGrew
(1992):
A “globalização” se refere àqueles processos, atuantes numa escala global,
que atravessam fronteiras nacionais, interagindo e conectando
comunidades e organizações em novas combinações de espaço-tempo,
tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais interconectado.
(MecGrew apud Hall, 2005, p. 67)
Logo surge a necessidade de aceitar e pensar no que para nós é diferente.
Para Woodward “[a]s identidades são fabricadas por meio da marcação da diferença
(...). A identidade, pois, não é o oposto da diferença: a identidade depende da
diferença” (2005, p.39-40). Somente através do que é diferente é que aprendemos o
novo, classificando assim o que é mais importante para fazer significado à nossa
particularidade, construindo nossa identidade e ideologia. Os modos de pensar
divergentes são constantes no mundo atual, colocando em diálogo a formação de
identidade por meio da cultura local e étnica, assim como por meio da cultura
massiva da globalização. Para Woodward o tempo, ou seja, a época e o modo de
pensar da sociedade influenciam na formação do homem como sujeito:
As identidades são produzidas em momentos particulares no tempo. Na
discussão sobre mudanças globais, identidades nacionais e étnicas
ressurgentes e renegociadas e sobre os desafios dos “novos movimentos
sociais”e das novas definições das identidades pessoais e sexuais, surgeri
21
que as identidades são contingentes, emergindo em momentos históricos e
particulares. (Woodward, 2005, p. 38)
Pensando nesse dialogismo, nos valores culturais na formação de identidade,
trago Barros citando o dialogismo interacional de Bakhtin, dizendo que o “sujeito,
que perde o papel de centro ao ser substituído por diferentes vozes sociais que
fazem dele um sujeito histórico e ideológico” (2001, p. 28). Aqui é válido ilustrar com
este trecho de uma canção da trupe, “A primeira semana”, falando sobre as nossas
escolhas e de como nós criamos historicamente as leis sociais vivenciadas hoje.
Criou o perdão e o pecado
Criou a dor e o prazer
Criamos o certo e o errado
E o orgulho pra nos esconder
Do que prevalece em nós...
Encerro este capítulo fazendo refletir sobre quem somos, o que nos influencia
e como vivemos e pensamos o mundo. Pensando no que “prevalece em nós”,
procurando compreender e reavaliar o que selecionamos para a nossa bagagem
cultural de identidade, para nos tornarmos sujeitos cada vez melhores, temos de ser
nós mesmos. Ilustro aqui com um último trecho d‟O Teatro Mágico na música
“Camarada d‟água‟, o qual acredito ser a melhor forma de pensar em quem
realmente sou:
Viva a tua maneira
Não perca a estribeira
Saiba do teu valor
22
4. O TEATRO MÁGICO E AS MÍDIAS
Hoje a sociedade pós-moderna vive em um ritmo acelerado, são muitas
questões postas à mesa de maneira simultânea. Vivendo numa era globalizada,
temos acesso a muitas informações, o que resulta numa luta de valores, identidades
e crenças dentro de nós. Para Santaella, a internet ampliou o “poder de referência
do termo „mídias‟ que, desde então, passou a se referir a quaisquer tipos de meios
de comunicação” (Santaella apud Prado, 2002, p. 45), incluindo os programas que
nos auxiliam para tais comunicações. Para a autora, a mídia e a cultura caminham
juntas, já fazem parte do nosso modo de viver e aceitar o mundo, para ela “é a
cultura como um todo que a cultura das mídias tende a colocar em movimento,
acelerando o tráfego entre suas múltiplas formas, níveis, setores, tempos e espaços”
(Santaella apud Prado, 2002, p. 49).
Falando sobre mídias, trago Neto, lembrando que o Rádio “foi a primeira
mídia eletrônica do Brasil” (1998, p. 2) e a internet surgiu apenas na década de 90
no Brasil, mais precisamente em 1995 (1998, p. 89). Para o autor, “com a internet, o
mundo se tornou uma comunidade multicultural. A grande verdade é que a web
suprimiu a questão das fronteiras e da distância entre os continentes” (Neto, 1998, p.
90), hoje ela torna o mundo globalizado e faz parte do dia a dia da maioria das
pessoas. Segundo Santaella citando McLuah, “os meios de comunicação moldam a
organização social porque são estruturadores das relações espaço-temporais às
quais o pensamento e sensibilidade do ser humano se conformam” (2001, p. 64). A
comunicação de tempos atrás, feita somente por telefone e televisão, torna-se hoje
interativa por meio da internet. Agora os sujeitos têm a oportunidade de exprimir o
que sentem, como pensam, quais são seus ideais, enfim, exprimem o que querem
para todo o mundo em apenas alguns segundos. Com o avanço da internet, “[a] vida
comum transforma-se em algo espetacular, compartilhada por milhões de olhos
potenciais” (Lemos apud Prado, 2002, p. 114).
O
Teatro
Mágico,
como
grupo
ou
“trupe”
musical
atuante
contemporaneamente no mundo artístico, se provê da internet como principal
veículo de divulgação, além dos demais, como a televisão, por exemplo. E assim,
como toda boa arte, também influencia na formação de identidades, como foi
23
discutido no capítulo anterior. Dessa forma, denominam-se como um grupo de MPB
(Música Popular Brasileira) e criaram o movimento denominado Nova MPB (Música
para Baixar), o que torna o trabalho deles contestador, indo contra as mídias
comerciais tradicionais que temos hoje. Para Anitelli, em uma entrevista para a
revista (on line) Fórum em novembro de 2009:
As mídias comerciais tradicionais vivem querendo criar novos talentos,
novos sucessos. Por isso, um monte de gente se tranca em uma casa ou
num sítio e sai de lá artista, achando que é uma pessoa representativa. É
porra nenhuma! Não traz nada de debate, não contribui com nada. O artista
autônomo é outra coisa, ele traz consigo o debate. É militante. Não sou
artista, sou militante da música. A gente tem que pensar assim, até porque
o artista já começa a ter um significado pejorativo hoje.
Defendendo a bandeira da Música Livre, música sem “Jabá” (expressão
utilizada para a música comercial paga), Anitelli e sua trupe começaram e continuam
a agir de forma independente na cena musical. Para eles, “jabá é crime e que
ninguém deve pagar isso, nem a gravadora nem o artista” (Anitelli em entrevista à
Revista Fórum, 2009). A internet serve, então, para a divulgação gratuita dos
trabalhos da trupe. Essa ferramenta de comunicação existe e é muito forte nos dias
de hoje, concorrente forte da televisão, já que disponibiliza também programas de
vídeos como o Youtube, no qual é possível assistir a vários conteúdos, aqui
especificando a música, a qualquer hora.
Aqui no Brasil e no mundo, uma das emissoras de conteúdo musical mais
forte é a MTV, que promove intensamente a influência da internet nos
telespectadores, tendo de inovar sempre seus programas e quadros para sustentar
seu índice no Ibope, e é forte influente também na formação de identidades e gostos
musicais das massas, já que transmite o que bem entende e lhe convém. Anitelli, na
mesma entrevista à Revista Fórum em 2009 critica um programa da MTV, o VMB,
que, segundo ele, “como a festa da música brasileira, podia se chamar a “festa do
jabá nacional”. Anitelli continua sua crítica dizendo que não participaria de um
programa onde “os melhores artistas do ano” são empresariados pela mesma
pessoa, “é uma festa para promover pessoas que não fazem diferença nenhuma na
música brasileira”. Anitelli segue destacando que existem também bons artistas que
fazem parte desse mercado, mas salienta que “hoje em dia todo o mecanismo de
comunicação que você precisa está às mãos. O grande segredo é não parar de
produzir” (Anitelli, 2009).
24
O Teatro Mágico continua a produzir as suas músicas assim, de forma livre e
socializada. Na internet, contam com vários sites de relacionamentos como o
Youtube, o Orkut, o Facebook, o Twitter, entre outros, além do site oficial da trupe e
dos sites de músicas para baixar como o palco mp3 do Terra. Sua principal mídia de
divulgação é, então, a internet ou o ciberespaço, que segundo Lemos “fez com que
qualquer um possa não só ser consumidor, mas também produtor de informação,
emissor” (Lemos apud Prado, 2002, p. 114). Com a utilização da internet, vale
ressaltar que a socialização de bens culturais e artísticos fica mais acessível a
todos. Para Neto, é tão grande essa socialização, que outros meios de comunicação
também se fundem a ela. Segundo o autor:
O movimento é histórico; o poder de comunicar palavras, imagens, sons,
vídeos, já não se limita a quem possui gráficas, emissoras de televisão ou
de rádio. Hoje sabemos que o baixo custo e grande alcance da Internet
estão levando a televisão, o rádio, o jornal e a revista para a rede. (Neto,
1998, p. 90)
Com a globalização, as mídias de difusão cultural e artísticas também se
tornam comunicadoras entre si. Para Santaella, “uma mesma informação passa de
uma mídia a outra, distribuindo-se em aparições diferenciadas: partindo do rádio e
televisão, continua nos jornais, repete-se nas revistas, podendo virar documentário
televisivo e até filme ou mesmo livro” (Santaella apud Prado, 2002, p. 49). Esse
diálogo entre as mídias favorece de certa maneira bandas independentes como O
Teatro Mágico, afinal, se na internet existe uma grande procura por determinado
grupo, consequentemente outras mídias como a televisão, por exemplo, tornarão a
exibir de outra maneira o produto solicitado, como foi o caso da aparição da trupe
em uma novela da Rede Globo em horário nobre. Santaella ainda ressalta que os
meios de comunicação trazem a socialização cultural “de modo que o advento de
cada novo meio de comunicação traz consigo um ciclo cultural que lhe é próprio”
(Santaella apud Prado, 2002, p. 46).
Apesar de as mídias favorecerem a socialização cultural, elas também agem
de acordo com o sistema capitalista, visando aos índices do Ibope, lucros e vendas,
atraindo consumidores, fazendo girar a moeda, podendo-se dizer que hoje esses
meios também agem como formadores de opinião e identidades. A televisão, por
exemplo, traz em sua linguagem os comerciais, incentivando o telespectador ao
consumismo, ou seja, a colaborar com o sistema capitalista dominante na
25
atualidade. Na internet não acontece diferente, são muitos sites de compras e
vendas, além das propagandas expostas em todos os sites “gratuitos”. Santaella nos
alerta sobre essa característica das mídias e do ciberespaço, assim como Neto
também traz sua contribuição para esse alerta:
[...] longe de estar emergindo como um reino de algum modo inocente, o
ciberespaço e suas experiências virtuais vêm sendo produzidos pelo
capitalismo contemporâneo e estão necessariamente impregnados das
formas culturais e paradigmas que são próprias do capitalismo global.
(Santaella apud Prado, 2002, p. 55)
E Neto também comenta:
Hoje, já é possível comprar quase de tudo e mais um pouco na rede. As
lojas virtuais estão se multiplicando, sinalizando que a web será um
excelente canal para promover negócios, efetuar vendas e gerar lucro
financeiro.(...) Com a possibilidade de transações comerciais pela Internet,
as fronteiras desapareceram, acirrando cada vez mais a competitividade
mundial. (Neto, 1998, p. 95)
Por outro lado, Santaella nos faz refletir sobre o ciberespaço como um ótimo
meio e uma boa maneira de debate e pensamentos críticos ao que nos rodeia, afinal
ela:
Permitem que uma pletora de vozes sejam ouvidas pelo mundo por um
custo mínimo. Isso dá às redes uma constituição comunicativamente
revolucionária da qual um número incontável de organizações culturais,
artísticas, políticas e sociais está tirando vantagem e sem a qual essas
organizações estariam marginalizadas ou silenciadas. (apud Prado p. 55)
Se na era global temos a oportunidade de nos expressarmos com mais
facilidade por meio de computadores, a televisão também traz seu lado positivo.
Para Neto, a televisão como meio de comunicação “possui um grande envolvimento
com a sociedade. Tudo o que aparece na televisão tem alto poder de exposição,
tornando-a uma „janela do mundo‟, exibindo em sua tela o que está difundido na
sociedade” (1998, p. 6). Entretanto, temos de pensar a respeito do que vemos e do
perigo a que expomos nossas relações sociais ao tomarmos como exemplo para
nossas vidas o que passa nos meios de comunicação em massa, como alerta
Santaella quando diz que “quanto mais as transformações tecnológicas aceleram
seu rítmo, mais as atividades humanas se reduzem à inércia, substituídas que são
pelos aparelhos que levam à perda da sensação da duração, da vida corporal e
social” (Santaella, 2001, p. 69).
26
Essa composição de um panorama internacional pluricultural foi
intensificado, especialmente nos países centrais, a consciência das
alteridades culturais, da existência do outro na sua outridade. Graças a
bancos de dados cada vez mais potentes, a memória cultural da
humanidade começou a se acumular e se tornar cada vez mais acessível.
(...) a cultura do disponível começou a contaminar a cultura de massa com
o vírus da personalização comunicativa do qual esta jamais se livraria.
(Santaella, 2001, p. 67).
Como foi dito anteriormente, a trupe d‟O Teatro Mágico, buscando diferenciar
seu trabalho, trazendo à tona a reflexão sobre o modo de se produzir cultura e de se
expressar artisticamente, se utiliza da internet como seu principal veículo midiático e
de sobrevivência na era global capitalista. Eduardo E.S.Prado em seu site faz uma
breve esclarecimento do modo de sobrevivência do grupo:
Enquanto músicos e gravadoras do mundo todo reclamam dos prejuízos
causados pela troca de arquivos na internet e pela cópia de CDs e DVDs,
o Teatro Mágico usa isso a seu favor. É assim que o trabalho deles é
divulgado e mais e mais fãs se somam aos já existentes. O grosso do
faturamento vem dos shows, sempre sucessos de público, e da venda
direta (na lojinha do site ou nas apresentações do grupo) de cds, dvds e
artigos como camisetas.(Prado, 2010)
É através desse meio que a trupe se comunica com o seu público, tornando
mais viável a comunicação entre fãs e artistas. Em uma entrevista a um blog,
Fernando Anitelli traz a visão da trupe perante o público que busca alcançar, e ainda
qual a responsabilidade, digo aqui como artistas que visam em relação ao mesmo:
Poxa, a gente sente o peso dessa responsabilidade, a gente sente a cada
dia que passa, a cada momento que aumenta o número de pessoas que
nos acompanham no Twitter, nos acompanham nas comunidades, o
número de pessoas que começam a aparecer nas apresentações… E eu
sempre disse que o artista tem uma responsabilidade social, ele não pode
achar que circular de maneira colorida e entreter está de bom tamanho.
Isso não nos cabe e não nos serve, a gente não quer isso, a gente quer
justamente trazer esse debate, certas colocações, algumas críticas. Tudo o
que a gente sempre fez foi junto ao público, o público sempre participou e
até hoje é cada vez maior a participação dele de uma maneira colaborativa
junto com o Teatro Mágico. É o público que alimenta o site com fotos,
vídeos, textos, é o público que nos ajuda a arrumar lugares para a gente
tocar. Nas comunidades, a gente vai e pergunta “sabe de algum lugar?”. O
público dá ideia, indica. Então essa maneira de se fazer música, de se
trabalhar música e se comercializar inclusive… todo nosso conteúdo foi
sempre gratuito, você consegue tudo de graça na Internet, na rede, ou por
5 reais no saquinho, 10 reais na caixinha e 15 reais o DVD, todas as
possibilidades para a pessoa ter acesso ao nosso material. Então é dentro
desse “case”, dessa vivência, dessa experiência que a gente passa para o
público essa experimentação, essa vontade de fazer as coisas junto. Tudo
o que é feito de uma maneira colaborativa nos surpreende no resultado
final. (Vianna, 2010).
27
A partir dos breves esclarecimentos sobre as mídias e sobre a forma de
socialização cultural e de bens artísticos, podemos perceber como é feito o trabalho
de artistas independente, não deixando de usufruir dos meios de comunicação, já
que esses fazem parte da nossa cultura atual, que Santaella chamaria de “cultura
midiática” ou ainda, referindo-se a uma sociedade “cibercultural”, na qual a utilização
desses elementos torna-se indispensável na nossa formação cultural como sujeitos
globalizados. A trupe vem na era da internet, mas se põe contra a indústria cultural,
utilizando-se desse meio para expressar sua arte, tornando-a mais acessível a
todos, usando a internet de maneira crítica e consciente como um meio de
sobrevivência do grupo e de socialização de ideias.
28
5. LINGUAGENS ARTÍSTICAS
“Linguagem é a faculdade que temos de representar” Turin
Desde a pré-história o homem vem tentando expressar sua vida, seus
sentimentos, seu cotidiano por meio de diversas linguagens artísticas e técnicas.
Passando por vários períodos e fatos históricos, culturais e sociais, o ser humano,
“fazendo arte”, sempre se preocupou em representar de alguma forma seus valores.
Para ilustrar essa afirmação, podemos citar o quadro de Manet, “Almoço na Relva”
(anexo A), no qual é retratada uma cena cotidiana do século XIX. Podemos ainda
fazer um paralelo com a obra de Picasso intitulada “Guernica” (anexo B), onde o
artista representa, além do fato histórico, a dor sofrida pelas pessoas que habitavam
Guernica, cidade bombardeada. Se compararmos essa obra com a de Manet, acima
citada, é possível perceber o quanto nos envolvemos com os sentimentos trazidos
pelas imagens com as quais temos contato. Além das imagens, nos dias atuais
temos também a música, o teatro e a dança, que também podem nos fazer pensar e
sentir. A arte não está somente em museus, galerias e espaços específicos; a arte
está nas ruas, na internet, na música, no cinema, enfim, hoje a arte vai muito além
do academicismo plástico.
Nós sabemos que não precisaríamos entrar em museus para visitar
exposições de fotos de guerra, ou folhear os jornais diariamente, para ver
retratos da dor, basta olhas para a calçada, seja da janela do nosso carro
ou da rápida caminhada pelas calçadas das grandes cidades no mundo,
que nos deparamos frequentemente com estas cenas. (Vitelli, 2003, p. 34)
Nos dias de hoje, encontramos à nossa volta as mais diversas imagens e
produções artísticas que possuem significado, expressam sentimentos, comunicam
mensagens, etc. Tais idéias muitas vezes não são devidamente assimiladas por nós,
espectadores, afinal vivemos em meio a um bombardeio de informações. Logo, a
arte vem nos instigar a refletir sobre essas mesmas cenas cotidianas e ainda sobre
as produções artísticas e culturais que se tornam parte de nossa bagagem cultural.
A trupe d‟O Teatro Mágico defende a arte independente, a música livre e que
deve ser acessada por todos, independentemente da classe social ou da raça, cor
etnia, afinal a arte é um bem universal e deveria ser acessível a todos.
29
Ao vermos a apresentação d‟O Teatro Mágico ou os DVDs da trupe, podemos
observar que trata-se de um grande sarau, com muito teatro, dança, poesia e
música. A trupe se utiliza de diversas linguagens artísticas em suas apresentações.
O palhaço é um dos personagens principais, caracterizado por Anitelli e pelos
demais artistas. No decorrer das apresentações surge um mundo mágico, com
bailarinas, malabaristas e palhaços interpretando canções e poemas em sincronia
com a música. O conjunto forma um verdadeiro espetáculo artístico em que público
e artistas se fundem em uma só voz. O público interage com o grupo,
caracterizando-se como “personagem-palhaço” também, colaborando com a
performance e ressignificando o trabalho do grupo.
Falando sobre as linguagens artísticas utilizadas pelo grupo, creio que seja
válido esclarecer um pouco sobre cada uma delas. Começo, então, pela linguagem
do teatro. O teatro nacional começou a se desenvolver de forma tardia,
aproximadamente 20 anos após a Semana da Arte Moderna de 1922, quando,
segundo Cacciaglia, chegou ao Brasil o diretor polonês Zbigniew Ziembinski e trouxe
consigo contribuições de grande importância para o teatro atual brasileiro.
O polonês revelou o simbolismo, o expressionismo, os cenários sintéticos,
a importância do som e da luz, os ritmos da dança e da mímica, as últimas
inovações dos teatros alemão e russo, o teatro totalmente naturalista.
(Cacciaglia, 1986, p. 107)
Segundo Carlson, “[n]os anos 80, a intensa preocupação da teoria semiótica
com o papel da platéia envolveu naturalmente
uma atenção maior ao
posicionamento social, cultural e político do evento teatral como um todo” (1997, p.
503). Na história do teatro Brasileiro, um dos grandes nomes que acredito ser válido
relembrar é o do diretor Nelson Rodrigues, quando “voltou sua atenção também para
a triste realidade dos subúrbios cariocas, representada pelos mitos populares
alimentados pela imprensa marrom, pelo rádio e pela televisão”. (Cacciaglia, 1986,
p. 109), discutindo temas sociais e fazendo as pessoas pensarem a respeito de tudo
que as rodeava.
Entrando no tema de teatro popular, trago Garcia afirmando que o teatro
popular, feito a princípio por trabalhadores, também conhecido como “teatro de rua”,
trouxe questionamentos a respeito da arte e suas concepções.
A presença de uma “massa” de operários sem acesso à produção artística
estimulou a reflexão sobre a arte, em especial o teatro, enquanto meio pelo
30
qual se poderia mobilizar os trabalhadores e fazer avançar a luta
revolucionária” (Garcia, 2004, p. 3)
Movimentos como o do teatro popular ocorreram antes em países
desenvolvidos como a Alemanha, por exemplo. Segundo Garcia, surgiu nesse país
um grupo intitulado Agritop, cujo intuito era de fazer oposição e resistência política, e
no Brasil ele surgiu como um grupo que pensava politicamente, “contaminada por
uma vanguarda militante e inovadora” (Garcia, 2004, p. 207), com pensamentos
socialistas, mas trazendo consigo “a marca de uma outra tendência política, de raiz
ibérica e italiana, e de um padrão muito mais tradicional de produção artística” (idem,
p. 208).
Em comparação com essas contribuições à nossa história teatral, analiso o
trabalho do Teatro Mágico em um de seus DVDs. Logo no início podemos observar
a preocupação da trupe com a arte e alguns aspectos do teatro, com a iluminação
do palco e com a performance de entrada dos músicos, atores, dançarinos.
Personagens são interpretados, roupas e figurinos, tudo é pensado para o grande
espetáculo. Fernando Anitelli, com ironia e entusiasmo, começa o show convidando
o público ao espetáculo, como se estivesse em uma arena de circo: “Senhoras e
Senhores, respeitável público pagão... bem-vindos ao Teatro Mágico”. Em seguida,
ele começa uma canção em que o trecho principal diz: “Por que é que não se junta
tudo numa coisa só”. Nesse momento, surgem no palco os mais variados
personagens: malabaristas, flautistas, cuspidores de fogo, enfim músicos e outros
artistas caracterizados de palhaço, tocando e dançando ao mesmo ritmo com o
público, que parece tomado por uma grande emoção, alguns se caracterizando
como a trupe, embalados pela harmonia e pela energia que toma conta do lugar.
Em outra composição, “O Catador de Papelão”, ocorre uma encenação, em
que o personagem tema, o catador de papelão, usa uma máscara neutra e um saco
de plástico (de lixo) como objeto cênico. Segundo Costa, no teatro a máscara neutra
permite que o ator relacione-se “com o mundo sob a perspectiva de um outro ser, e
se opera na fronteira entre o perigo e o aconchego” (Costa, 2005, p. 34). Ele passa a
ser um corpo sem rosto que se expressa e tem vida, se identifica ainda mais com as
pessoas e se relaciona de forma instantânea com os objetos, que por sua vez
ganham um maior destaque na cena. No teatro, com a utilização da máscara, o ator
31
precisa se expressar por meio do seu corpo, buscando um tempo de atuação
perfeito, improvisando e lidando com as reações do seu público.
O jogo com a máscara requer, antes de tudo a investigação corporal. Ao
subtrair o sistema de expressão do rosto, desvela-se o corpo que torna a
ferramenta da tessitura gestual no espaço. (Costa, 2005, p. 29)
Na mesma canção existem outros personagens, mas foco duas em
específico, duas mulheres lendo jornal e olhando a cena do catador de papelão, o
que parece sugerir a mensagem de que “o que lemos nos jornais todos os dias está
à nossa volta e nem ao menos prestamos atenção”. São tais as linguagens teatrais
utilizadas nas apresentações d‟O Teatro Mágico, todas regadas pelas letras das
canções e pela melodia, com muita mímica e expressões corporais e circenses.
Falando, ainda, sobre o teatro, trago a questão do circo-teatro. O circo,
segundo Paulo Ricardo Merisio em seu artigo intitulado “Influências da indústria
cultural no universo circense teatral na década de 1970”, explana sobre as
mudanças ocorridas na linguagem circense ao longo do século XX (2001). Ele
explana que o circo traz elementos tradicionais passados de pai para filho, como os
malabaristas, os palhaços e os trapezistas. Entretanto, com as mudanças sociais e
culturais, o circo não pode se ater somente a essas heranças tradicionais, mas abriu
suas portas às peças teatrais. Segundo Merisio, os “momentos de crise,
determinados quase sempre pelo afastamento do público, tendem a gerar mudanças
na estrutura de seus espetáculos, que se abrem então para a absorção de novos
elementos” (Merisio, 2010). Merisio ainda nos fala sobre como a economia
influenciou essas mudanças, citando Duarte:
3
O espetáculo tradicional de circo, assentado nas variedades (acrobatas,
palhaços e malabaristas), era apresentado na primeira parte, e, na
segunda, podia-se assistir às peças. Essa fórmula permitia às companhias
certa economia na estrutura do espetáculo, que excluía números mais
dispendiosos, “tais como a apresentação de animais, motivo de gastos
enormes para as companhias dados os custos de sua aquisição,
alimentação e cuidados especiais”. (Duarte, 1995 apud Merisio, 2010)
Além dos fatores acima mencionados, Merisio cita mais dois fatores que
alteraram significativamente arte produzida pelo circo-teatro:
O primeiro se refere à migração da população rural para as grandes
cidades brasileiras (principalmente nas décadas de 1960 e 1970) e traz
consigo uma persistente gama de costumes que deveriam manter-se
incorporados ao cotidiano citadino.
32
O segundo fator de ordem mais ampla a influenciar fortemente
transformações no circo-teatro está ligado à ampliação da rede dos meios
de comunicação, que tende a cumprir dominantemente o papel inverso,
levando para o interior o universo das grandes cidades. (Merisio, 2001)
Maria Lúcia Montes (apud Merisio, 2001) nos traz uma breve reflexão sobre o
que é o circo e como ele se constituiu como circo-teatro no decorrer dos tempos,
lembrando ainda que hoje em dia alguns circos incluem em seus espetáculos
performances e peças musicais:
O circo é antes de tudo arte profissional de palhaços, acrobatas e
domadores, mas essa arte, em testemunho de seus próprios produtores,
se acha em decadência e o desdobramento da segunda parte do
espetáculo, a comédia ou o drama, que convivia com a arte do picadeiro,
acabou quase que por eliminá-la do espetáculo, dando origem aos circosteatros que se especializam unicamente nesta forma de apresentação.
Isto aliado à introdução no circo dos cantores de música sertaneja, muitas
vezes eles próprios autores de dramas e comédias, é considerado por
alguns artistas circenses como a causa da decadência do circo, enquanto
outros vêem aí o único caminho para a salvação. O fato é que a
conivência entre a arte tradicional do circo e a cultura dos meios de
comunicação de massa é complexa e delicada. Como espetáculo
propriamente dito e como forma de entretenimento, o circo se acha mais
próximo dos produtos da indústria cultural, mas apresenta uma versão
própria destes no chanchar de um texto ou na paródia de um programa de
sucesso na tevê. A produção deste espetáculo passa por uma rede que
atravessa seletivamente os meios de comunicação de massa e compete
com eles por um público acostumado a programas que vão de Zé Betio a
cantores de música sertaneja, de Barros de Alencar ao Clube dos Artistas,
passando por cantores e comediantes, que depois de firmada a sua
reputação no circo podem ir depois para a tevê, nada excluindo que
voltem ao circo para apresentações esporádicas. (Montes, 1978 apud
Merisio, 2001)
Sobre a linguagem da música, trago indagações sobre o seu real valor,
citando Swanwick quando diz que “todos nós temos bens a negociar com os outros
e somos parte de um sistema de mercado, somos parte da vida” (2004, p. 18).
Olhando a música como um bem negociável, o autor nos propõe a possibilidade da
ressignificação musical do sujeito que escuta a canção, da troca que existe entre ela
e o seu ouvinte. Para o autor, a música pode ser vista como uma antiga forma de
discurso, “um meio no qual as idéias acerca de nós mesmos e dos outros são
articulados (sic) em formas sonoras” (2004, p. 19). Logo, a música toma um papel
muito importante em nossas vidas, ela tem a capacidade de nos fazer refletir e
compreender melhor o mundo e nós mesmos.
A música faz parte da nossa vida, do nosso sistema cognitivo, “é um caminho
de conhecimento, de pensamento, de sentimento” (Swanwick, 2004, p. 23) e, assim
como as outras artes, desenvolve e possibilita a imaginação, a socialização de
33
aprendizados, a relação que da música com o mundo, o despertar de nossos
sentimentos. É por meio de metáforas que nos relacionamos com a arte, e é nesse
processo que temos a possibilidade de ver as coisas e pensá-las de forma diferente,
de forma pessoal e de acordo com nossas bagagens culturais e de aprendizados
que formamos ao longo da vida e que nos constitui como sujeitos. É a partir desses
conhecimentos prévios que reconhecemos formas e as associamos às linguagens.
É a partir das semelhanças entre as coisas que aprendemos a formar o
pensamento metafórico, “o processo metafórico reside no coração da ação criativa,
capacitando-nos a abrir novas fronteiras, tornando possível para nós reconstruir
idéias, ver as coisas de forma diferente” (Swanwick, 2004, p. 26), possibilitando ao
sujeito tornar-se cada vez mais humano. O processo musical metafórico acontece
quando escutamos notas como melodias, e essas nos remetem a alguma emoção
ou sentimento. O sujeito assume uma nova relação com a música, ressignificação
de acordo com suas experiências e, quando escuta os sons da música, prestando
atenção nos sons isoladamente, percebendo “um sentido de peso, espaço, tempo e
fluência. Normalmente fazemos isso facilmente, exceto quando a música é muito
diferente para nós” (idem, 2004, p. 30). É por esse processo metafórico que o
criador de música e o ouvinte percebem o verdadeiro valor da música para si, pois é
um valor que se dá de maneira dialógica.
O autor também nos remete à questão da diversidade cultural e suas
influências nos modos de fazer e ouvir música. Sendo a música um discurso
metafórico, ela pode ir além da sua ideia inicial e ser compreendida de diferentes
maneiras, conforme cada um que a escuta.
A música não somente possui um papel na reprodução cultural e afirmação
social, mas também potencial para promover o desenvolvimento individual,
a renovação cultural, a evolução social, a mudança. (Swanwick, 2004, p.
40)
Para Swanwick, a música “como todas as formas de discurso liga o espaço
entre indivíduos e entre diferentes grupos culturais” (2004, p. 42). Muitas pessoas se
caracterizam e se formam como sujeitos participativos de grupos sociais por meio da
música, mas o importante é que aconteça a troca entre “grupos sonoros”, para que
se transcenda a realidade e se recriem novas maneiras de pensar e ver o diferente,
para que enfim se crie uma bagagem musical.
34
Nas apresentações d‟O Teatro Mágico, as músicas são compostas com
instrumentos tradicionais, tais como violão, violino, flauta, bateria, etc. e com a
utilização de instrumentos e efeitos sonoros, como sons de cachorro latindo, buzinas
de carros etc., além de sons como o beatbox, expressão em inglês que significa
caixa de batida, referindo-se à “percussão vocal do hip-hop” (Wikipédia) e de
instrumentos diferentes para a nossa cultura, como é o caso do didgeridoo, “um
instrumento de sopro muito antigo dos aborígenes australianos. “Estudos
arqueológicos baseados em pinturas rupestres sugerem que o povo aborígine da
região de Kakadu já utilizava o didjeridu há cerca de 1.500 anos” (Wikipédia), o que
nos remete à discussão sobre identidades e culturas.
Ainda é válido citar o músico que toca percussão, ele se veste de palhaço,
estilizado, meio africano tribal, e também faz refletir sobre a questão da discussão
sobre a identidade cultural. Assim como na canção em que diz “como pode um peixe
vivo viver fora d‟água fria”, canção popular brasileira em nova versão, com direito a
apresentação teatral e de dança. Anitelli convida o público a cantar junto com ele,
quando saem de traz do palco vários bailarinos segurando vários arcos grudados
uns nos outros e enfeitados com tiras de pano, como se fosse a água e as pessoas
os peixes, mostrando uma bela coreografia de dança com o auxílio desse objeto que
traz mais movimento à expressão corporal.
Ao ouvirmos uma música, podemos senti-la de diversas formas, com o
coração, sentimentalmente, identificando nossa vida com a trilha sonora, com o
nosso intelecto, pensando a respeito do que está sendo dito, utilizando os
conhecimentos prévios adquiridos, como perceber o som de certos instrumentos,
reconhecendo a linguagem técnica da música e ainda com o corpo, sentindo o ritmo,
“dançando conforme a música”. Esse ditado popular pode refletir muito sobre o que
é a dança. Para Klauss Vianna, “a expressão corporal reflete tudo que sou: minha
história, o que penso, como sinto. Vida interior e expressão corporal são coisas
inseparáveis” (2005, p. 148). Corpo e mente em movimento, sincronicamente
exprimindo sentimentos, revelando o eu-interior de cada um através do movimento
corporal. “O homem é uno em sua expressão: não é o espírito que se inquieta nem o
corpo que se contrai – é a pessoa inteira que se exprime” (Vianna, 2005, p. 150).
A trupe d‟O Teatro Mágico traz em sua essência todas essas linguagens
artísticas, trazendo elementos do circo, a poesia, a música, a dança e a performance
35
no palco como um sarau, misturando diversas linguagens que se completam nas
suas apresentações. Atuam de maneira similar ao circo, que se situa “a meio
caminho entre a indústria cultural e as manifestações espontâneas, mas não é
simplesmente um repetidor de uma e outras, pois quando delas se apropria
submete-as a um processo de reelaboração, recodificação, produzindo assim um
discurso que leva a sua marca” (Magnani, 1984, p. 47). Como sugere a citação de
Magnani sobre o circo, acredito que a trupe criou a sua marca com todas essas
linguagens, trazendo por meio da arte a mensagem ou a crítica, ou ainda buscando
que seu público reflita a respeito da realidade.
36
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Debruçar-se sobre uma produção cultural que é
dominantemente percebida como popular requer
difícil exercício metodológico. É preciso levar em
conta as características específicas do universo
que está sendo analisado para que se possam
perceber em seu interior sistemas definidores de
suas estruturas artísticas.” (Paulo Ricardo Merísio)
Lembrando as palavras citadas acima de Merísio, concluo esta monografia
percebendo que muito ainda há de se pesquisar sobre, por exemplo, as linguagens
artísticas, as mídias e a formação de identidades. Busquei aqui esclarecer como se
dão esses processos, analisando em específico o trabalho e a forma de fazê-lo da
trupe do O Teatro Mágico. Como artistas, eles são formadores de opinião, têm em
seu trabalho um perfil de resistência à cultura massiva que nos assedia todos os
dias. Trazendo questões sobre como se dá a formação da nossa identidade cultural
e ainda sobre a subjetividade de cada cultura, busquei discutir a formação de
identidade a partir do próprio grupo, com suas canções e modo de pensar e agir
quanto artistas.
O Teatro Mágico, banda formada em Osasco (SP) no ano de 2003 e autodenominada independente e adepta do movimento MPB (Música para Baixar), busca
com essa atitude socializar a sua arte, que tem características questionadoras e
contestadoras ao desenvolverem temas sociais, como o analfabetismo, o
capitalismo, o preconceito, etc. Disponibilizando seu trabalho gratuitamente pela
internet, o grupo se apresenta como “livre e resistente” à indústria fonográfica,
conseguindo formar uma legião de fãs que acompanham seu trabalho pela internet e
assistindo aos shows. Alguns buscam até mesmo se caracterizar como os
integrantes da trupe, que ainda tem como diferencial o grande número de seus
integrantes-artistas, entre eles, músicos, malabaristas, atores, dançarinos, palhaços
e trapezistas. É misturando “Tudo numa coisa só‟, como diria uma das canções d‟O
teatro Mágico, que se dá a apresentação da trupe, que busca revelar para si e para
o outro os inúmeros personagens que assumimos diariamente. Pensando nesses
personagens internos é que Fernando Anitelli, resolveu nomear o primeiro disco da
trupe como Entrada para Raros, também no ano de 2003, inspirado no livro O Lobo
37
da Estepe, do escritor Hermann Hesse, no qual uma das personagens vive em
conflito com suas diversas identidades.
Falando sobre personagens internos, trouxe neste trabalho alguns teóricos
conceituados, como Stuart Hall, para falar sobre a formação de identidade. Ao longo
da nossa vida, assumimos diversas identidades conforme os círculos sociais com os
quais nos relacionamos. O “palhaço” surge nas apresentações da trupe como esses
personagens internos que descobrimos dentro de nós diariamente. Hoje em dia, com
a globalização, a formação de identidade se dá de forma cada vez mais fragmentada
e o contato com o outro é modificado pelo advento da internet. As identidades se
chocam, afinal são as diversas informações e modelos de identidades herdadas
culturalmente e socialmente com as quais temos de lidar para formar a nossa
própria forma de agir, pensar e ainda de aceitar o outro que, como sujeito, também
carrega suas particularidades, enfim suas identidades.
As mídias são importantes veículos de comunicação e têm, perante as
grandes massas, um papel fundamental na formação de opinião e na socialização
da arte assim como dos pensamentos. A internet fez implementar a globalização,
com o livre acesso e trânsito de informações a todos os cantos do mundo. O Teatro
Mágico se utiliza da internet para divulgar de forma acessível o seu trabalho,
preferindo não se adaptar cegamente à indústria musical, que de certa forma cria
artistas que lhe convém, buscando muitas vezes somente o valor comercial, não
levando em consideração o verdadeiro valor artístico e crítico da arte.
Como arte, o trabalho da trupe vem questionando e buscando mostrar
diversas linguagens artísticas, como o teatro, quando em seus shows fazem
encenações durante as músicas, a própria música, que é carregada de valores
estéticos, trazendo em sua poesia temas a serem refletidos socialmente, sobre o
nosso cotidiano moderno e sobre as coisas que acontecem diariamente e às vezes
nem percebemos pela correria do dia-a-dia. A dança, carregada de coreografia,
misturada a malabares e trapézio, mostra a arte realizada com o próprio corpo,
misturando tudo como um grande circo. Assim O Teatro Mágico se expressa e
mantem seu lugar garantido na cena musical contemporânea.
38
7. Anexos
Anexo A
http://assuntosdaana.blogspot.com/
39
Anexo B
http://www.cursodehistoriadaarte.com.br/lopreto/index.php/page/39/
40
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