Microscopia: do micro ao macro A invenção do microscópio, no final do século XVI, revolucionou as ciências biológicas, pois esse instrumento permitiu descobrir que os seres vivos, apesar de diferentes, quando visualizados a olho nu, têm em comum o fato de serem formados por células. Mas como essa história toda começou? Acredita-se que o microscópio tenha sido inventado em 1591 por Hans Janssen e seu filho Zacharias, dois holandeses fabricantes de óculos. Tudo indica, porém, que o primeiro a fazer observações microscópicas de materiais biológicos foi o também holandês Antonie van Leeuwenhoek (1632-1723). Os microscópios que Leeuwenhoek utilizava eram dotados de uma única lente, pequena e quase esférica. Nesses rudimentares equipamentos, ele observou detalhadamente diversos tipos de material biológico, como embriões de plantas, glóbulos vermelhos do sangue e os espermatozóides presentes no sêmen de animais. Ele foi a primeira pessoa a visualizar bactérias ao microscópio, microrganismos consideravelmente menores que os anteriormente observados por ele, a partir do estudo de infusões aquosas de pimenta. Ele relatou suas observações em uma série de cartas enviadas à prestigiosa Royal Society of London, que as publicou, em 1684, em uma versão em inglês. Influenciado pelas investigações de Leeuwenhoek, o inglês Robert Hooke (1635-1703) construiu um microscópio dotado de duas lentes ajustadas nas extremidades de um tubo de metal. Ao contrário dos microscópios simples de Leeuwenhoek, de uma única lente, Hooke utilizou microscópios compostos, dotados de uma lente ocular, pela qual se olha, e uma lente objetiva, que vai próxima ao objeto observado. Em 1665, Hooke observou fatias muito finas de cortiça (casca de certas árvores) e descobriu que a leveza desse material se devia ao fato de ele ser formado por um grande número de caixinhas microscópicas vazias. Hooke chamou cada caixinha oca de cell, que significa cela ou cavidade. Daí o surgimento do termo célula, diminutivo de cela. Em 1667, o botânico inglês Nehemiah Grew (1647-1712), na Inglaterra, e Marcello Malpighi (1628-1694), na Itália, descobriram que a parte interna e suculenta das plantas constituía-se de estruturas microscópicas semelhantes às células que Hooke observara na cortiça. Essas células, porém, eram preenchidas por um fluido gelatinoso e semitransparente, no início denominado protoplasma e, posteriormente, citoplasma. Malpighi verificou que os animais também se compunham de células, porém mais moles e flexíveis que as das plantas. Anos mais tarde, depois de estudar os trabalhos de diversos pesquisadores, o botânico inglês Mathias Jakob Schleiden (1804-1881) e o zoólogo Theodor Schwann (1810-1882) concluíram que todas as plantas e os animais conhecidos eram formados por células. Faltava compreender, no entanto, como eram originadas novas células. Essa descoberta coube ao médico alemão Rudolf Virchow que, depois de exaustivas observações, concluiu que todas as células são provenientes de células preexistentes. Assim surgiu a Teoria celular, que defende a ideia de que a célula é a unidade morfofisiológica dos seres vivos. Tudo isso só foi possível a partir do aperfeiçoamento dos microscópios, os quais permitiam, cada vez mais, visualizar as células com maior riqueza de detalhes. A visualização de células requer, portanto, a utilização de um microscópio, podendo ele ser óptico ou eletrônico. Em geral, os microscópios ópticos são utilizados para a visualização de células intactas, com aumentos relativamente pequenos, e os microscópios eletrônicos são empregados para visualizar a estrutura celular interna, assim como os detalhes das superfícies celulares, com grande aumento. Todos os microscópios empregam lentes que ampliam a imagem original. No entanto tão importante quanto o aumento é a resolução, ou seja, a capacidade de distinguir dois objetos adjacentes como distintos e separados. Embora a ampliação possa ser virtualmente aumentada de forma ilimitada, isso não é possível no caso da resolução, pois ela é determinada pelas propriedades físicas da luz. Desse modo, a resolução e não o aumento determina aquilo que podemos ver ao microscópio. Microscopia óptica: Os microscópios ópticos modernos são descendentes do microscópio composto usado por Robert Hooke. Eles apresentam um limite de resolução de aproximadamente 0,2 micrômetros (106 m). Sendo assim, a menor distância que deve existir entre dois objetos observados ao microscópio óptico, para que eles sejam observados como objetos distintos e separados, é de 0,2 micrômetros. Essa distância é o limite de resolução do microscópio óptico. O microscópio óptico utiliza a luz visível para iluminar as estruturas celulares. Vários tipos de microscópios ópticos são comumente utilizados na biologia, podendo ser citados: o de campo claro, o de contraste de fase, o de campo escuro e o de fluorescência. Neles a luz proveniente do objeto observado atravessa as lentes objetiva e ocular e chega ao olho do observador. O aumento total de um microscópio óptico composto corresponde ao produto do aumento obtido com as lentes objetiva e ocular. Se empregarmos, por exemplo, uma lente ocular que amplie dez vezes e uma lente objetiva que amplie cem vezes, o valor final da ampliação será de mil vezes. A maioria dos microscópios utilizados em biologia possui oculares com aumento de 10-15 vezes e objetivas de 10-100 vezes. Com um aumento de 1000 vezes (10 vezes da lente ocular e 100 vezes da objetiva), um óleo óptico especial precisa ser colocado entre o espécime e a objetiva para a visualização de estruturas. A essas lentes denominamos lentes de imersão. O óleo de imersão empregado nessas lentes aumenta a capacidade de concentração de luz, permitindo que os raios luminosos que emergem do espécime formem ângulos que seriam perdidos sem o uso do mesmo. Com isso, os ângulos são coletados e a imagem é visualizada melhor. Entendido o mecanismo pelo qual um microscópio óptico funciona, conheça as partes que compõem esse equipamento: Microscopia eletrônica: Em 1947, quase três séculos depois das observações de Hooke, o microscópio eletrônico começou a ser empregado para o estudo da célula, trazendo grandes avanços. Os microscópios eletrônicos utilizam elétrons, em vez de fótons, para a visualização de células ou estruturas celulares. Eles são adaptados com câmeras, permitindo a obtenção de uma fotografia denominada micrografia eletrônica. No microscópio eletrônico de transmissão, eletroímãs atuam como lentes, com todo o sistema operando sob vácuo. Esse tipo de equipamento é chamado assim porque o feixe de elétrons é transmitido através do objeto observado para visualização. O microscópio eletrônico de transmissão é tipicamente utilizado para examinar a estrutura celular em aumento e resolução muito elevados. O poder de resolução de um equipamento desses é significativamente maior que aquele do microscópio óptico, permitindo a visualização de estruturas em nível molecular. Isso se deve ao fato de o comprimento de onda dos elétrons serem muito menores que o comprimento de onda da luz visível, e o comprimento de onda afeta a resolução. Por exemplo, enquanto o poder de resolução de um microscópio óptico de alta qualidade é de aproximadamente 0,2 micrômetros, o poder de resolução de um microscópio eletrônico de transmissão de alta qualidade é de aproximadamente 0,2 nanômetros (10 -9 m). Assim, mesmo moléculas individuais, como proteínas e ácidos nucleicos, podem ser visualizadas ao microscópio. Para obtenção de contraste suficiente, as preparações são tratadas com corantes, como ácido ósmico ou sais de permanganato, urânio, lantânio ou chumbo. Como essas substâncias são compostas por átomos de alta massa atômica, elas dispersam bem os elétrons, melhorando, assim, o contraste das imagens. O microscópio eletrônico de varredura é utilizado para estudar detalhes da superfície de objetos sólidos. Nela, o espécime é recoberto com uma fina camada de um metal pesado, como o ouro. O feixe de elétrons do equipamento realiza a varredura percorrendo o espécime para trás e para frente. Os elétrons dispersos pelo metal são coletados permitindo a obtenção de uma imagem tridimensional. Com o microscópio eletrônico de varredura, até mesmo espécimes relativamente grandes podem ser observados, sendo a profundidade do campo bastante satisfatória. Uma grande faixa de aumentos pode ser obtida com esse equipamento, desde 15 vezes até cerca de 100.000 vezes, mas apenas a superfície do objeto é visualizada. Podemos verificar, portanto, que existem inúmeras metodologias que podem ser empregadas no estudo das células. Sendo que a escolha de uma ou outra está relacionada ao objetivo traçado nos experimentos bem como a relação custo benefício da metodologia adotada. Referências Bibliográficas • AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Fundamentos de Biologia Moderna. São Paulo: Moderna, 1997. • MADIGAN, M.; DUNLAP, P.; CLARK, D. Microbiologia de Brock. 12ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. • Uzunian, A.; BIRNER, E. Biologia – Volume único – 2ª ed. São Paulo: Ed. Harbra, 2004. Imagem • http://www.wpclipart.com/