UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Verbos Médios e Anticausativos: Uma proposta no âmbito da Psicolinguística Experimental Sabrina Lopes dos Santos Rio de Janeiro Janeiro de 2012 Verbos Médios e Anticausativos: Uma proposta no âmbito da Psicolinguística Experimental Sabrina Lopes dos Santos Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal do Rio de Janeiro como requesito parcial para a obtenção do título de Mestre em Linguística Orientador: Professor Doutor Marcus Antônio Rezende Maia Rio de Janeiro Janeiro de 2012 iii Santos, Sabrina Lopes dos Verbos Médios e Anticausativos: Uma proposta no âmbito da Psicolinguística Experimental / Sabrina Lopes dos Santos – Rio de Janeiro: UFRJ/ Faculdade de Letras, 2012. xi,85f.: Il.; 30cm. Orientador Marcus Antônio Rezende Maia Dissertação (mestrado) – UFRJ / Faculdade de Letras / Programa de Pós-Graduação em Linguística, 2012. Referências Bibliográficas: f. 87-90 1. Alternância Causativa 2. Médios 3. Anticausativo 4. Psicolinguística 5. Sintaxe Experimental. I. Maia, Marcus Antonio Rezende (Orient.); II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Letras. Programa de Pós-Graduação em Linguística. III. Verbos Médios e Anticausativos: Uma proposta no âmbito da Psicolinguística Experimental iv VERBOS MÉDIOS E ANTICAUSATIVOS: UMA PROPOSTA NO ÂMBITO DA PSICOLINGUÍSTICA EXPERIMENTAL Sabrina Lopes dos Santos Orientador: Professor Doutor Marcus Antônio Rezende Maia Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos quesitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Linguística. Examinada por: _______________________________________________________ Professor Doutor Marcus Antônio Rezende Maia – UFRJ _________________________________________________ Professora Doutora Aniela Improta França - UFRJ _________________________________________________ Professor Doutor Gabriel de Ávila Othero - UFRGS ________________________________________________________ Professora Doutora Márcia Damaso Vieira – UFRJ, Suplente ________________________________________________________ Professora Érica dos Santos Rodrigues – PUC-RIO, Suplente Rio de Janeiro Janeiro de 2012 v AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço ao meu orientador, Marcus Maia, que me acolheu em seu laboratório de pesquisa – o LAPEX, do qual faço parte desde 2008. Deixo explícita aqui minha admiração e respeito por seu trabalho como professor e orientador, representando um símbolo de motivação para qualquer pesquisador, e expresso meu carinho por ter confiado na qualidade do meu trabalho e pelos “puxões de orelha”, sempre oportunos. Agradeço aos meus pais, Eunice e Genival, pela educação, incentivo aos estudos e acima de tudo aos valores que sempre me guiam nas minhas escolhas, nem sempre acertadas... Não posso deixar de agradecer aos membros do LAPEX e do ACESIN, dos quais, alguns se tornaram amigos queridos. Deixo o meu “muito obrigado” a Rossana que sempre se mostrou disponível em participar de meus experimentos, bem como me ajudar no recrutamento de participantes, e estendo esse agradecimento a todos os demais voluntários, que foram fundamentais para a realização desse trabalho. Por fim, agradeço a CAPES pela bolsa, sem a qual essa dissertação não seria possível. vi RESUMO VERBOS MÉDIOS E ANTICAUSATIVOS: UMA PROPOSTA NO ÂMBITO DA PSICOLINGUÍSTICA EXPERIMENTAL SABRINA LOPES DOS SANTOS Orientador: Marcus Antônio Rezende Maia Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística, Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Esta dissertação tem como principal objetivo discutir o fenômeno da alternância causativa que permite que verbos atuem tanto na valência transitiva quanto intransitiva. Por meio de metodologia experimental, são sugeridas classes para os verbos que se comportam dessa maneira: médios e anticausativos. O fenômeno da alternância causativa suscita grande divergência entre duas importantes abordagens no âmbito da Gramática Gerativa: lexicalistas e construcionistas. Nesse sentido, essa dissertação apresenta alguns trabalhos que vigoram dentro dessas vertentes e utilizam o fenômeno da alternância causativa para investigar as propriedades dos componentes da faculdade da linguagem que atuam no processamento linguístico. Entretanto, as assunções encontradas nesse trabalho encontram respaldo na Morfologia Distribuída, de abordagem construcionista, que parece fornecer um modelo mais favorável para justificar e representar os dados decorrentes dos experimentos psicolinguísticos realizados nesse trabalho. Esse trabalho se insere na especialidade conhecida como Processamento de Frases, no âmbito da Psicolinguística Experimental, que se ocupa das propriedades dos processos envolvidos na compreensão e produção de estruturas frasais. Dessa forma, metodologias experimentais são empregadas para testar as hipóteses levantadas sobre as especificidades dos fenômenos linguísticos estudados, no que concerne esse trabalho, a alternância causativa. Nesse sentido, foram utilizadas técnicas experimentais de julgamento de aceitabilidade/gramaticalidade e leitura automonitorada. A justificativa desse trabalho reside, portanto, em contribuir para um diálogo produtivo entre a Linguística Teórica e a Psicolinguística, no campo da chamada Sintaxe Experimental. vii Palavras-chaves: Alternância Psicolinguística, Sintaxe Experimental. Causativa, Médios, Anticausativos, viii Abstract VERBOS MÉDIOS E ANTICAUSATIVOS: UMA PROPOSTA NO ÂMBITO DA PSICOLINGUÍSTICA EXPERIMENTAL SABRINA LOPES DOS SANTOS Orientador: Marcus Antônio Rezende Maia Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística, Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Abstract The main objective of this Master’s thesis is to investigate the phenomenon of the causative alternation in Brazilian Portuguese through psycholinguistic experiments, proposing to classify verbs with transitive and intransitive valence in two classes: middle and anticausative. The study of the causative alternation has been the source of dispute between two important approaches in Theoretical Linguistics, namely, lexicalism and constructionism. This thesis reviews some relevant aspects of these two approaches and moves on to explore the phenomenon from a processing point of view. Three experiments are reported using the methodologies of speeded acceptability judgment and self-paced reading. We argue that the experimental results support the constructionist approach, more specifically the theory of Distributed Morphology (Halle & Marantz, 1993). Therefore, the work is developed within the framework of Sentence Processing, but in close dialogue with linguistic theories, seeking to contribute to the new field of Experimental Syntax. Key-words: causative alternation, middles, anticausative, psycholinguistics, experimental syntax. ix Sumário 1. Introdução.......................................................................................................12 1.1 Objetivos e Justificativa da Pesquisa................................................................12 1.2 Inacusatividade e Alternância Causativa..........................................................14 1.2.1 Denominações.......................................................................................17 1.3 Fundamentação Teórica da proposta................................................................20 1.3.1 Teoria da Morfologia Distribuída............................................................20 1.4 Aportes Experimentais......................................................................................24 1.4.1 Técnicas Experimentais...........................................................................25 2. Visão Teórica do Processo...........................................................................................................28 2.1 Construcionismo versus Lexicalismo .............................................................28 2.1.1 O Ponto de Vista Lexicalista...................................................................29 2.1.2 O Ponto de Vista Construcionista............................................................35 2.2 Discussão.........................................................................................................44 3. Aportes de Processamento..............................................................................................................46 3.1 Psicolinguística Experimental............................................................................46 3.2 Experimentos......................................................................................................47 3.3Di Sciullo et al. (2007): middles x transitivos.....................................................48 3.3.1 Resultados................................................................................................50 3.4 Experimentos 1 : Julgamento de aceitabilidade da voz média em PB.............................................................................................................................51 3.4.1 Resultados............................................................................................... 54 3.4.2 Discussão...............................................................................................56 3.5 Experimento 2: Leitura Automonitorada de sentenças Voz Média em PB.................................................................................................................................57 3.5.1 Resultados................................................................................................60 3.5.2 Discussão..................................................................................................62 3.6 Experimento 3: Julgamento de aceitabilidade médio x anticausativo..................................................................................................................64 3.6.1 Resultados................................................................................................67 3.6.2 Discussão..................................................................................................69 3.7 Conclusões..........................................................................................................70 4. Estrutura e Representação........................ .................... ..................74 x 4.1 Estrutura e representação dos verbos médios e anticausativos.........................74 4.1.1 Médios...................................................................................................75 4.1.2 Anticausativos.......................................................................................79 4.2 Conclusões.........................................................................................................80 5. Conclusão................................................................................................................84 Referências...................................................................................................................87 Anexo............................................................................................................................91 1. Lista do experimento 1......................................................................................91 2. Lista do experimento 2......................................................................................92 3. Lista do experimento 3......................................................................................95 xi Lista de Figuras Figura Descrição Página 1. Esquema da gramática na Morfologia Distribuída. 23 2. Desenho do experimento de Lee e Thompson (2011). 27 3. Gráficos com os resultados obtidos a partir dos experimentos de julgamento de aceitabilidade (Di Sciullo et al., 2007) 49 4. Desenho do experimento 1. 55 5. Gráfico e tabela com índices de rejeição (experimento 1). 56 6. Gráfico e tabela das médias de tempo de julgamento (experimento 1). 57 7. Exemplos das condições experimentais (experimento 2). 60 8. Desenho do experimento 2. 61 9. Gráfico e tabela com as médias de tempo de leitura do segmento 2 (experimento 2). 62 10. Gráfico e tabela de médias de tempo de resposta à pergunta interpretativa (experimento 2). 63 11. Desenho do experimento 3. 68 12. Gráfico e tabela de índices de aceitabilidade em valor percentual (experimento 3). 69 13. Gráfico e tabela das médias de tempo de julgamento (experimento 3). 70 Lista de Tabela Tabela 1 Descrição Índices de respostas (experimento 2) Página 63 12 CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO 1.1 Objetivos e Justificativa da Pesquisa Esta dissertação tem como objetivo principal discutir o fenômeno da alternância causativa, que permite que alguns verbos atuem em duas valências, sugerindo uma classificação para tais verbos, através do uso de metodologias experimentais. Busca-se, assim, exercitar um diálogo produtivo entre a Linguística Teórica e a Psicolinguística, no campo da chamada Sintaxe Experimental, que ainda se mostra pouco difundido no Brasil. O tema investigado tem sido amplamente discutido em Linguística, uma vez que possibilita a investigação de propriedades centrais dos subcomponentes que constituem a arquitetura gramatical (sintático, morfológico, semântico e fonológico). Sendo assim, pretendemos, mais especificamente, com esse trabalho, contribuir para as teorias sobre a interface entre o léxico e a sintaxe. Duas abordagens fundamentais, a lexicalista e a construcionista, no quadro mais amplo da Teoria da Gramática Gerativa, têm buscado explicações que deem conta dos mecanismos que atuam na restrição dos processos de valência verbal, procurando entender como e por que ocorrem mudanças na estrutura argumental de alguns verbos. Os proponentes do lexicalismo defendem a existência de um componente lexical onde estariam armazenadas as palavras adquiridas pelo falante, locus onde estariam prontas para entrar na computação no nível sintático. Nesse sentido, advogam uma tendência dos argumentos, quando ocorrem com certos papéis temáticos, a aparecerem em mesmas posições sintáticas, sendo este um indício de que as propriedades sintáticas seriam pré-estabelecidas pela semântica, com o léxico atuando na configuração da estrutura argumental dos predicados. Por outro lado, os teóricos construcionistas (não-lexicalistas) acreditam que a estrutura lexical de um verbo não interfere na sua configuração sintática, mas o que determinaria a interpretação dos argumentos seriam, ao contrário, as posições sintáticas em que aqueles são realizados. Uma proposta, no âmbito não lexicalista, que ganhará destaque nessa dissertação é a da Teoria da Morfologia Distribuída (cf. Halle & Marantz, 1993), que leva a sintaxe para dentro da palavra, propondo a existência de 13 três listas nas quais estariam contidos os traços que atuam na computação das palavras e das sentenças. A intensa discussão que se tem feito sobre o fenômeno da alternância causativa consiste, sobretudo, em determinar quais propriedades semânticas e sintáticas estão envolvidas no licenciamento desse processo complexo. Observa-se que, mesmo a terminologia cunhada para o processo está longe de ser inequívoca e desprovida de ambiguidades. Por exemplo, Ciríaco (2007) trata a alternância causativa como alternância causativo/ergativa por entender que haveria uma forma causativa básica derivando uma forma ergativa, baseando suas assunções, sobretudo, na decomposição de predicados em um nível semântico-lexical proposto por Levin e Rappaport-Hovav (1995). Alexiadou et al. (2006), por outro lado, denominam o fenômeno de alternância causativa/anticausativa, mostrando que existem evidências morfológicas que indicam não existir uma direcionalidade para o fenômeno1. Em meio a tal diversidade, assumimos, fundamentalmente, que a alternância causativa se refere a uma mudança na valência verbal que está relacionada ao número de argumentos presentes na estrutura argumental dos verbos. Por isso, por vezes, vamos nos referir a ela como sendo uma alternância de transitividade (valência ou diátese). Nesse trabalho, tentaremos responder a duas questões que são fundamentais para conferir maior acuidade a nossa proposta: (i) se existe, de fato, um sentido no processo da alternância (ergativo-causativo ou causativo-ergativo); e, em existindo uma direção, qual seria a forma básica e qual seria a derivada? (ii) qual seria o modelo mais adequado a se seguir para representar essas estruturas, tendo em vista os resultados experimentais encontrados ao longo de nossa pesquisa? Veremos nos capítulos que se seguem que a Morfologia Distribuída parece fornecer um modelo favorável aos dados dos estudos psicolinguísticos apresentados nessa dissertação. 1 Distintamente de Ciríaco (2007) e Levin e Rappaport-Hovav (2005), outros autores tais com Lakoff (1968, 1970), Dowty (1979), Williams (1991), Hale e Keyser (1986, 1987), Brousseau e Ritter (1991), Harley (1995), Pesetsky (1995) apud Schäfer (2009), postulam que a forma anticausativa estaria derivando a forma causativa num processo de causativização, ou seja, a forma básica seria a intransitiva. 14 1.2 Inacusatividade e Alternância Causativa Segundo a Generalização de Burzio2 (1981), que desenvolve a Hipótese da Inacusatividade de Perlmutter (1978), um verbo que não tem a opção de projetar um especificador não seria capaz de atribuir caso. Assim, em sentenças formadas por verbos ditos inacusativos haveria um sujeito derivado por movimento sintático, como observado nos exemplos (1) e (2): (1) Maria chegou. (2) O copo quebrou. Na derivação dessas estruturas intransitivas, os respectivos NPs (Maria e O copo) se deslocam da posição de argumento interno para a posição de argumento externo, uma vez que, na posição em que os NPs são originalmente gerados, não é possível que recebam caso. Assim, os NPs, que já receberam papel de tema ou paciente do verbo, em sua posição de origem, devem se mover para a posição de especificador de IP para receber caso nominativo, deixando um vestígio nas suas posições de base, segundo proposto por Keyser & Roeper, 1984; Roberts, 1987; Di Sciullo, 2005, entre outros. Com isso temos a representação estrutural de (1) e (2) configurada em (3): (3) [VP V NP] – estrutura inacusativa Entretanto, existem estruturas intransitivas, como (4), que não possuem sujeitos derivados via movimento sintático, ou seja, o NP não é alçado de dentro do VP. Por esta razão, essas construções não demonstram o grau de complexidade estrutural evidenciado nas estruturas inacusativas vistas acima. Tais construções, denominadas inergativas, teriam uma representação estrutural como em (4b): (4) a. Maria bebeu. 2 A Generalização de Burzio não considera sentenças como “Há cinco pessoas aqui”, onde teríamos um verbo atribuindo caso acusativo ao NP, porém não projeta um especificador. 15 b. NP [VP V] – estrutura inergativa Os verbos inacusativos não constituem uma classe fechada, isto é, nem todos apresentam as mesmas características, pois observamos comportamentos derivacionais distintos, ou seja, há verbos que permitem alternância causativa e outros que não. Observando as orações a seguir, vemos claramente essa distinção: (5) a. Maria chegou. b. *Maria chegou o menino. (6) a. O copo quebrou. b. O menino quebrou o copo. Em (5), temos um verbo inacusativo que não permite a contraparte transitiva, como visto pela agramaticalidade da oração (5b) e a esses verbos chamaremos inacusativos puros3, ou seja, não licenciam a contraparte transitiva, mas possuem sujeito derivado por movimento sintático, configurando uma estrutura monoargumental. Em (6), vemos o verbo quebrar atuando em duas valências, a intransitiva, em (6a), e a transitiva, em (6b), com estrutura biargumental. Entretanto, temos, ainda, casos como (7)-(9), no qual a estrutura inacusativa parece ser permitida somente pela presença de um adjunto, em construção média, configurando uma estrutura sintática diferente dos verbos como quebrar, também chamados, na literatura corrente sobre o tema, de incoativos. (7) No salão disseram que o cabelo cortou fácil. (8) Esse livro vende bem. (9) A caneta escreveu bastante. As estruturas em (7)-(9), chamadas de voz média, têm motivado grande discussão na literatura voltada para o fenômeno da inacusatividade e da alternância causativa. Essas estruturas têm sido analisadas em muitos trabalhos em decorrência das divergências de tratamento por parte dos autores, tais como, apenas para focalizar 3 Nomenclatura de Schäfer (2009) 16 a língua portuguesa, os estudos de Rodrigues (1998), Camacho (2003), Ciríaco (2007), Pacheco (2008), entre vários outros. Ciríaco (2007), por exemplo, faz diferenciação entre a voz média e os verbos ergativos (anticausativos), a partir da estrutura resultante da alternância de diátese. Para a autora, a construção ergativa denota o mesmo evento da sua estrutura básica (transitiva), enquanto que a voz média passa a não mais denotar um evento e sim um estado, “transformando a construção em uma sentença genérica”. Em (7) e (9), vemos que os verbos cortar e escrever, ao contrário do que afirma Ciríaco (2007), descreve um evento e não um estado o que, segundo a autora, deveria ocorrer com esses verbos na mudança para a diátese intransitiva. Keyser e Roeper (1984) entendem que a Formação Média (Middle Formation) é cabível para as duas categorias de verbos (middles e ergatives) que se diferenciam com base em onde, na gramática, as estruturas seriam geradas: middles na sintaxe e ergatives no léxico. Além do fato de que as estruturas middles precisariam do advérbio para serem consideradas gramaticais, assumindo-se que os middles sejam, na verdade transitivos, e que os ergatives seriam intransitivos. A Formação Média de Keyser e Roeper se refere, sobretudo, a sentenças genéricas, realizadas como verdades gerais, isto é, não descrevem um evento particular no tempo, como visto em (10) e (11): (10) ? Yesterday, the mayor bribed easily, according to the newspaper. (11) ? At yesterday’s house party, the kitchen wall painted easily.4 Entretanto, em Português do Brasil, parece que as construções médias não precisariam estar necessariamente no tempo presente, denotando um sentido genérico, para serem bem aceitas: (12) Ontem, o muro pintou fácil porque o tempo estava seco. (13) Ontem, a roupa lavou rápido porque a máquina era boa. (14) Ontem, a tesoura cortou fácil porque estava amolada. 4 Exemplos de Keyser e Roeper (1984:384). 17 Para fins dessa dissertação, considero a construção média ou voz média as sentenças cujos sujeitos são afetados e há necessidade de adjunção verbal para que sejam consideradas gramaticais. O tratamento a essas construções, como (12)-(14), ficará mais claro nos capítulos 3 e 4, onde apresento nosso aporte experimental e proponho uma análise para as representações estruturais dos verbos médios e anticausativos que acreditamos seja a mais adequada para explicar os nossos resultados. 1.2.1 Denominações Como estamos vendo, na tentativa de classificar os verbos que licenciam a alternância causativa, encontramos diferentes denominações, de acordo com o contexto sentencial em que esses verbos se inserem: incoativo, anticausativo, inacusativo, ergativo, voz média ou medial. Souza (1999), em sua tese de doutorado, fez uma breve distinção entre as categorias, a saber: i. Incoativo A forma incoativa estaria relacionada aos verbos que denotam início de mudança ou passagem de um estado a outro por parte do sujeito, como (15). Porém, nem sempre ocorre mudança, pode ser apenas o prosseguimento do estado anterior, como em (16): (15) O lixo queimou. (16) As folhas amarelaram. i. Anticausativo Em (17) e (18), temos estruturas anticausativas que se referem às construções com verbos que licenciam a alternância causativa, ou seja, possuem uma parte transitiva e outra intransitiva, entretanto não denotam alterações aspectuais como a forma incoativa, vista em (15) e (16): (17) A menina grudou o papel na parede. (18) O papel grudou na parede. 18 ii. Inacusativo Essa denominação pode ser entendida como resultado da Generalização de Burzio, pois afirma que um verbo que não projeta um especificador também não será capaz de atribuir caso acusativo. Porém, observando a oração em (19), vemos um verbo que não projeta especificador atribuindo caso acusativo: (19) Tinha o livro do Jô e do Jabor na livraria.5 iii. Ergativo A utilização do termo ergativo se originou na descrição das chamadas línguas ergativas que flexionam o sujeito de duas formas distintas: se o verbo é transitivo irá atribuir caso ergativo, se for intransitivo atribuirá caso absolutivo (o mesmo que o objeto direto) 6. A partir desse padrão, passou-se a utilizar o termo para os verbos cujo sujeito da variante intransitiva é o objeto na variante intransitiva, como pode ser observado em (20) . (20) a. Os operários começaram as obras no Maracanã. b. As obras começaram no Maracanã. iv. Voz média x voz medial Em sua classificação original (do Grego Antigo), a voz média se referia às construções com sujeito funcionando tanto como agente quanto afetado pela ação do verbo, ou seja, o sujeito e o afetado seriam os mesmos da voz ativa, como nos exemplos (20) e (21): (20) O sacerdote faz sacrifícios. (em benefício de outro/s)- ativa 5 Exemplo retirado de Souza (1999). 6 Cf. Souza, 1999:18. 19 Gr.: Ho hieréus thúei. (21) Xenofonte faz sacrifícios. (em benefício próprio)- média Gr.: Xenofōn thúetai. Atualmente, a expressão voz média se relaciona mais especificamente com frases como (22) e (23), que lembrariam alguns aspectos dessas estruturas do grego antigo: (22) Esse feijão cozinha bem. (23) A roupa lavou fácil. (24) Rosana cozinhou o feijão. (25) Rosana lavou a roupa. Porém, esses verbos, geralmente, têm o sujeito desempenhando função de agente da “ação” verbal (uma pessoa, por exemplo), já em (22) e (23) o que temos é o afetado no papel de agente diferente daquele que ocupa essa posição na voz ativa, em (24) e (25), como no caso da voz média propriamente dita cf. (20) e (21). A estrutura medial seria referente a sentenças que não possuam um sujeito “implícito”, geralmente ocorram no tempo presente, conotando genericidade, como é assumido por Ciríaco (2007) e exemplificado em (26) e (27): (26) Vasos quebram. (27) Pássaros voam. Em razão dessa variação, proponho aplicar-se o tratamento de anticausativos aos verbos que alternam de transitividade livremente, isto é, não necessitam de advérbio em sua estrutura para licenciarem a forma intransitiva, como em (28), e 20 médios7 para os verbos que só atuam na forma intransitiva com a adjunção, como em (29): (28) A xícara quebrou. (29) O feijão cozinhou bem. 1.3 Fundamentação Teórica da proposta As classes de verbos participantes da alternância causativa (médios e anticausativos) sugeridas nessa dissertação encontram respaldo na Teoria da Morfologia Distribuída (doravante MD), proposta inicialmente por Halle e Marantz (1993). Essa é uma teoria fundamentalmente construcionista e, como tal, apresenta propriedades que a diferenciam, sobretudo, das correntes lexicalistas. Na seção que se segue apresento um breve resumo com as principais características e princípios que embasam a teoria da MD. 1.3.1 Teoria da Morfologia Distribuída A organização da arquitetura da gramática, no âmbito da MD, está baseada em três propriedades fundamentais: Inserção Tardia (Late Insertion), Subespecificação do item de vocabulário (Underspecification of vocabulary item) e Estrutura Sintática Hierárquica (Syntactic Hierarchical Structure All the Way Down), a saber: i) Inserção Tardia: essa propriedade prevê que a expressão fonológica da estrutura sintática, em todos os casos, é fornecida no mapeamento para a Forma Fonológica (PF- Phonological Form). Diante disso, as categorias sintáticas são puramente abstratas, não possuindo conteúdo fonológico. Somente após a sintaxe são inseridas as expressões 7 Ao longo desse texto também irei me referir à voz média ou estrutura média, mas sempre relacionadas a construções do tipo O feijão cozinhou bem ou Esse muro pintou fácil. 21 fonológicas chamadas Itens de Vocabulário (Vocabular Item) nos nós terminais, por meio de um processo de Spell-out8. ii) Subespecificação dos itens de Vocabulário: significa que as expressões fonológicas não precisam ser plenamente especificadas para serem inseridas nas posições sintáticas (ou nós terminais). Somente os morfemas9 são totalmente especificados pelo seu conteúdo. Os itens de vocabulário carregam informações sintáticas, morfológicas e semânticas suficientes - resultantes das operações morfossintáticas para serem inseridas nos nós terminais, onde nenhuma outra forma mais específica está disponível. Isso quer dizer que um nó morfossintático pode conter mais informações do que o item vocabular que será inserido nessa posição, por isso podem ser subespecificados. iii) Estrutura Sintática Hierarquizada All the Way Down: implica que os nós terminais, onde os itens de vocabulário serão inseridos, se organizam em estruturas hierárquicas determinadas por princípios e operações da sintaxe. Os nós terminais nos quais os itens de vocabulário serão inseridos estão sujeitos a modificações resultantes de operações realizadas no componente morfológico. Ao propor a Teoria da MD, Halle e Marantz assumem que a realização fonológica dos elementos terminais na sintaxe é regida pelas entradas lexicais (Lista2 Vocabulário) que irão unir os de traços morfossintáticos aos traços fonológicos. Abaixo, pode-se observar o esquema da gramática na MD: 8 Mais adiante, Chomsky (1998, 1999) irá propor que os elementos computados sofrem spell-out ao longo da derivação. 9 Nos termos da Morfologia Distribuída, morfema se refere a um nó terminal (sintático ou morfológico) e a seu conteúdo de traços morfossintáticos, não sendo provido de expressão fonológica. As expressões fonológicas são fornecidas como parte do item do Vocabulário. Morfemas são entendidos como átomos da representação morfossintática e seu conteúdo na sintaxe consiste de traços semântico-sintáticos extraídos do conjunto disponível na Gramática Universal, Harley e Noyer (1999). 22 Figura 1: Esquema da gramática na Morfologia Distribuída, adaptado de Harley e Noyer (1999). Na organização da gramática, vista no esquema acima, observamos que a Lista 1 (Léxico Estrito, Marantz; 1997) contém os traços morfossintáticos (abstratos) e raízes acategoriais que irão atuar no sistema computacional através de operações de mover, concatenar e copiar. Inicialmente, ocorre uma pré-seleção dos feixes de traços 23 que serão utilizados ao longo da derivação sintática. As informações contidas nos nós resultantes das operações sintáticas são enviadas para a Forma Lógica e para o componente morfológico do sistema computacional. Ao contrário do que se assumiu nas últimas décadas pelos estudos no âmbito da Gramática Gerativa, a teoria da MD propõe que os mecanismos morfológicos estariam distribuídos entre os vários componentes da gramática e não concentrados em um componente único. A MD adiciona um nível à organização dos princípios e parâmetros da gramática: o nível da estrutura morfológica (Morphology Structure- MS). A estrutura morfológica é uma representação que serve como parte da Fonologia, onde esta é entendida como uma componente interpretativa que realiza fonologicamente as representações sintáticas. Traços fonológicos são fornecidos aos morfemas somente em MS por de meio de Inserção Vocabular. Dentro do componente morfológico, os nós terminais resultantes de operações sintáticas irão sofrer operações morfológicas (tais como Fundir e Fissionar) gerando novos nós terminais que estarão sujeitos à inserção dos itens do Vocabulário. Esse inventário de itens constitui a Lista 2 (Vocabulário) que confere conteúdo fonológico aos nós resultantes das operações morfossintáticas. Para uma determinada entrada de vocabulário ser inserida em algum morfema na sintaxe, nenhum dos seus traços morfossintáticos pode estar em conflito com algum outro traço nesse mesmo nível. A entrada vocabular deve conter um subconjunto de traços morfossintáticos dos nós terminais, isto é, não necessita conter todos os traços morfossintáticos contidos nos nós terminais que serão inseridos, o que leva a subespecificação do item do vocabulário. Dada a inserção vocabular, as expressões derivadas por esse mecanismo são enviadas para a Interface Conceptual onde irão receber “significado” fornecido pela a Lista 3 (Enciclopédia). A Lista 3 é responsável por atribuir sentido às raízes, considerando-se o ambiente sintático em que aparecem. Para entendermos melhor o mecanismo de inserção dos itens do vocabulário nos nós terminais derivados pelas operações morfossintáticas, vamos tomar como exemplo o paradigma da concordância de pessoa no pretérito imperfeito do verbo escrever: I. escrevia, escrevias, escrevia, escrevíamos, escrevíeis, escreviam 24 Podemos observar que o item do Vocabulário - a pode ser inserido tanto na 1ª quanto na 3ª pessoa do singular, o que nos mostra que esse item contém apenas o traço de número, pois se também tivesse o traço de pessoa não poderia ser inserido nos nós morfossintáticos onde esses itens devem ser inseridos. Por outro lado, o item -as contém mais traços específicos do que o item –a que fazem com que seja inserido no nó terminal de 2ª pessoa, pois se não fosse dessa forma também poderia ser inserido na 1ª e na 3ª pessoa do singular. Tendo em vista os traços que cada item do vocabulário possui, esses (-a e -as, no paradigma citado) entram em competição e aquele que possuir o maior número de traços será inserido no morfema adequado. Diante disso, na MD, as palavras, assim como as sentenças, são derivadas pela composicionalidade de traços morfossintáticos que formam complexos de núcleos sintáticos nos quais serão inseridos itens do Vocabulário. Tendo em conta, que nenhum dos traços morfossintáticos envolvidos nas operações morfossintáticas é provido de expressão fonológica. Por exemplo, partindo de uma raiz acategorial √PESC- que pode ser concatenada a um categorizador verbal (v- vezinho) derivando o verbo pescar, que encontra seu significado listado na Enciclopédia. Na concatenação da [raiz+v] ocorre uma negociação de significado de maneira arbitrária. Uma vez estabelecido esse significado, as demais derivações serão associadas a esse sentido atribuído inicialmente – pesca, pescaria, pescador, etc. 1.4 Aportes Experimentais Como já dissemos acima, a presente pesquisa conta com aporte tecnológico de cunho experimental no intuito de conferir maior acuidade às afirmações e argumentações a respeito do tema a ser estudado, no caso desta dissertação – a alternância causativa. Assumimos que para uma teoria linguística estar de fato bem fundamentada deve buscar a correspondência entre a estrutura linguística e a estrutura psicológica, e é nesse sentido que testes psicolinguísticos são aplicados aos usuários das línguas. No capítulo 3 desta dissertação, encontram-se descritos em detalhe os experimentos realizados ao longo de nossa pesquisa. Entretanto, abaixo, revisamos, brevemente, dois trabalhos no âmbito da Linguística Experimental que ilustram como 25 a metodologia psicolinguística pode ser produtivamente utilizada em favor dos estudos sobre estrutura argumental. 1.4.1 Técnicas experimentais Lee e Thompson (2011) realizaram estudo com grupos de falantes normais e afásicos10 e evidenciaram que, nos dois grupos, o processo de produção de sentenças reflete as diferenças linguísticas entre verbos inacusativos e inergativos. Para elaborar essa afirmativa os autores realizaram experimento de rastreamento ocular11, cuja tarefa dos sujeitos era produzir frases com palavras que apareciam dispostas na tela do computador, localizado imediatamente a sua frente, as sentenças deveriam ser formuladas tão logo os estímulos aparecessem na tela, como ilustrado na figura 2. Inergativo Inacusativo Figura 2: Desenho do experimento de Lee e Thompson (2011) 10 O grupo de afásicos sofria de agramatismo que se caracteriza por distúrbios de sintaxe. 11 A técnica de rastreamento ocular (eye-tracking) permite aferir tempos de fixação oculares nos segmentos relevantes e monitorar a movimentação ocular, progressiva e regressiva, de mudança de fixação de um segmento para outro, o que se denomina sacada (saccade), possibilitando estabelecer correlações entre esses padrões e diferentes processos cognitivos, tanto em paradigmas de rastreamento ocular em leitura quanto em paradigmas com input oral e imagens (visual world paradigm) 26 A distinção entre verbos inergativos e inacusativos se evidencia nesse estudo na associação de diferentes processos, em tempo real, de produção de sentenças, avaliando as medidas de tempo de movimento e fixação oculares e produção de fala. Os dois grupos mostraram mais diferenças em tempos de fixação entre as palavras não-verbais (adjetivo e nome) quando a integração de palavras dentro do enunciado envolvia uma derivação de uma sentença inacusativa. Friedmann, Taranto, Shapiro e Swinney (2008) utilizaram experimento com paradigma de cross-modal priming12 com decisão lexical para evidenciar a reativação automática do argumento movido em sentenças inacusativas ao ouvirem o verbo, enquanto que esse padrão não foi constatado em orações inergativas. Nesse teste, os participantes deveriam ouvir a sentença, e durante a audição de cada frase, um estímulo lexical era apresentado visualmente, devendo os participantes decidir rapidamente se consideravam o item visual como uma palavra ou não-palavra. Os exemplos (30), (31) e (32) ilustram os estímulos utilizados na implementação do teste e o momento em que deveriam executar a decisão lexical. Os alvos visuais apareciam nas três posições investigadas em cada sentença, indicadas pelos números sobrescritos nas sentenças abaixo. (30) Inacusativo não alternante The tailor ¹ from East Orange, New Jersey mysteriously disappeared ² when it was ³ time to adjust the tuxedos and dresses for the participants in the wedding party. (31) Inacusativo alternante The table ¹ in the basement of the old house finally dried ² after the leaking ³ window was sealed a month ago. (32) Inergativo 12 O paradigma de priming baseia-se em um efeito que se refere à influência que um evento antecedente exerce sobre outro posterior, supondo que uma palavra possa ser acessada mais rapidamente se antecedida de outra semanticamente, morfologicamente, fonologicamente ou mesmo ortograficamente a ela relacionada. A técnica cross-modal priming utiliza mais de um tipo de estímulo (visual e auditivo). 27 The surgeon ¹ with a brown felt fedora hat and matching coat eagerly smiled ² when the beautiful ³ actress walked down the corridor to exam room three. As localizações das duas primeiras posições foram determinadas estruturalmente: a primeira imediatamente após o participante ouvisse o sujeito e a segunda após ouvisse o verbo (no vestígio). A terceira posição era 750ms após a segunda posição. Os antecedentes foram reativados nos três tipos de verbos (inacusativos alternantes, inacusativos não alternantes e inergativos), porém na posição 3 ocorreu reativação somente com verbos inacusativos, mas não para os inergativos. As análises mostraram que sentenças com verbos inacusativos e inergativos são processadas diferentemente e que os sujeitos são reativados depois de verbos inacusativos, mas não são depois de verbos inergativos. Desta forma, a Hipótese da Inacusatividade, bem como as análises que apontam para um movimento da posição de objeto para a posição de sujeito, na derivação de sentenças inacusativas poderiam ser sustentadas. Esses dois trabalhos demonstram que podemos verificar a realidade psicológica mais complexa das estruturas argumentais dos verbos e, por isso, técnicas experimentais devem ser utilizadas como ferramenta comum entre os estudiosos da linguagem e das línguas, e nesse sentido, pretendemos contribuir para o desenvolvimento e a difusão das pesquisas linguísticas que constituem essa área. 28 CAPÍTULO 2: VISÃO TEÓRICA DO PROCESSO “All seemingly intransitive verbs are not created equal”.13 (Baker, 1983) 2.1 Construcionistas versus Lexicalistas Este capítulo será dedicado à descrição de algumas das abordagens teóricas a respeito do fenômeno da alternância causativa, buscando a melhor fundamentação para as hipóteses e para os resultados obtidos em nossas investigações. Nas seções 2.2 e 2.3 apresentamos alguns trabalhos que utilizam a alternância causativa como ferramenta para investigar as propriedades dos componentes da faculdade da linguagem que atuam no processamento linguístico. As análises sobre os verbos inacusativos, que admitem a alternância causativa, são foco principal de descrição, tendo em vista que o objetivo maior desse trabalho é propor a classificação desses verbos. O estudo da alternância causativa contribui para as teorias sobre interface entre léxico e sintaxe, dividindo-as em lexicalistas e construcionistas (não-lexicalistas). Do lado lexicalista, autores como Levin & Rappaport-Hovav (1995) defendem uma tendência dos argumentos quando ocorrem com certos papéis temáticos aparecerem nas mesmas posições sintáticas, sendo este um indício de que as propriedades sintáticas sejam pré-estabelecidas pela semântica, com o léxico atuando na configuração da estrutura argumental dos predicados. Por outro lado, teóricos nãolexicalistas, como Marantz (1984), acreditam que a estrutura lexical de um verbo não interfere na sua configuração sintática, mas o que determinaria a interpretação dos argumentos seriam as posições sintáticas em que são realizados. 13 “Todos os verbos aparentemente intransitivos não são criados iguais”, Baker; 1983. 29 2.1.1 O Ponto de Vista Lexicalista Levin e Rappaport-Hovav (1995, 2005), no âmbito da Semântica Lexical, advogam que os verbos participantes da alternância causativa teriam como forma básica a estrutura transitiva (causativa) e que a forma intransitiva (inacusativa) é derivada por um processo de “detransitivização”, afirmando também que em geral são verbos de mudança de estado. Essa argumentação está baseada nas propostas de Levin (1993) e Levin Rappaport-Hovav (1995), que identificam três classes de verbos baseadas em suas representações semântico-lexicais associadas à estrutura de argumentos. Segundo as autoras, existiriam três classes de verbos: os que denotam eventos causados externamente, os que denotam verbos causados internamente e os verbos de existência e aparecimento, exemplificados respectivamente em (33), (34) e (35): (33) a. O tijolo quebrou a janela. b. A janela quebrou. (34) a. A criança sorriu. b. *O palhaço sorriu a criança. (35) a. A chave sumiu. b. *O porteiro sumiu a chave. Os verbos causados externamente englobariam a maior parte dos verbos de mudança de estado e seriam basicamente causativos com representação semânticolexical diádica (dois argumentos – um externo e um interno). Os verbos causados internamente seriam monádicos (um argumento externo), constituindo, assim, a classe dos inergativos. Os verbos de aparecimento e existência são considerados inacusativos diádicos, com dois argumentos internos. As autoras postulam uma representação semântico-lexical, por meio da decomposição de predicados para verbos participantes da alternância causativa, associada às formas intransitivas e transitivas. Nesse nível, envolveriam um predicado CAUSE que toma dois subeventos: um causador e outro central, este último atrelado 30 ao participante afetado pelo evento e ao componente inerente da raiz14 verbal. Para as autoras, os verbos inacusativos alternantes são basicamente causativos e diádicos, isto é, com dois argumentos em sua representação semântico-lexical, como é representado em (36), sendo um argumento externo (causador) e um argumento interno afetado: (36) v: [[x ACT] CAUSE[y BECOME <STATE>]] quebrar: [[x ACT] CAUSE[y BECOME <QUEBRADO>]] A forma básica dos verbos inacusativos alternantes postulada pelas autoras seria mais complexa em sua representação semântico-lexical (cf. (36)), mas imporia menos restrições semânticas a seus argumentos. Por outro lado, os verbos inergativos seriam monádicos, sem o predicado CAUSE no nível semântico-lexical, em (37), e consequentemente não poderiam atuar na alternância causativa. (37) v: [x ACT] sorrir: [x <ACT> SORRIR] Levin e Rappaport-Hovav (1995), assumindo que os verbos inergativos não possuem o predicado CAUSE, atestam, assim, que esses verbos teriam um único subevento predicado - <ACT>, em (37). Os eventos causados internamente estariam relacionados a uma propriedade inerente à entidade participante do evento, ou seja, ao argumento do verbo que seria responsável pela realização do evento, atuando como um agente volicional. Em (38) e (39), os argumentos Joana e A menina carregariam, na visão de Levin e Rappaport-Hovav, as propriedades de volição sobre o evento predicado pelo verbo. (38) Joana dançou. [Joana <ACT >DANÇAR] (39) A menina riu. [A menina <ACT> RIR] 14 Raiz se refere ao componente idiossincrático do verbo, no âmbito lexicalista. 31 Com isso, verbos inergativos como rir e dançar teriam uma representação semântico-lexical monádica, com o argumento agentivo exercendo “controle” sobre a ação, o que não poderia ser aplicado a verbos como quebrar e abrir, que possuem representação semântico-lexical como (36), que repito abaixo em (40): (40) v: [[x ACT] CAUSE[y BECOME <STATE>]] Segundo as autoras, os verbos atuantes na alternância causativa seriam aqueles basicamente transitivos (diádicos) com predicado CAUSE em sua representação semântico-lexical, inferindo mudança de estado e predicando eventos causados externamente. A realização da forma intransitiva derivada da transitiva se daria pela ausência do constituinte causador no nível da estrutura dos argumentos em consequência de vinculação lexical (lexical binding) da causa externa, sendo interpretada como quantificação existencial. A eventualidade desses verbos pode ocorrer sem a intervenção direta de um agente volicional, o que possibilitaria que a causa externa não fosse projetada na sintaxe, desde que a natureza do evento causador seja subespecificada pelo verbo. Com isso, segundo as autoras, teríamos a seguinte configuração para a formação da construção intransitiva dos verbos inacusativos participantes da alternância causativa: Intransitivo (quebrar): [[x ACT] CAUSE [y BECOME <QUEBRADO>]] Vinculação lexical ø Regras de linking Sintaxe y Em (41), o sujeito da variante intransitiva e o objeto da transitiva compartilham o mesmo papel semântico, pois os sujeitos possíveis da forma intransitiva seria um subconjunto dos objetos possíveis da forma transitiva, nos termos das autoras, o que contribuiria para a postulação da forma básica causativa (diádica) para os verbos 32 inacusativos alternantes. Com isso, teríamos em (42) a representação no nível da estrutura dos argumentos, ou seja, na sintaxe: (41) a. O menino quebrou o copo. b. O copo quebrou. (42) [y BECOME <QUEBRADO>] Levin (1993) sugere que todos os verbos causados externamente devem ter uso transitivo e causativo, mas nem todos teriam a variante intransitiva na qual a causa externa estaria subsespecificada, como em (44), constituindo os verbos transitivos que não “detransitivizam”: (43) O menino cortou o cabelo (com a tesoura). (44) *O cabelo cortou. Contudo, se observarmos as sentenças (45) (46) vemos que as análises das autoras, para verbos transitivos que não “detransitivizam”, isto é, que não possuiriam a contraparte intransitiva por exigirem um agente como sujeito expresso na sintaxe, não dariam conta de verbos como cortar e limpar em Português do Brasil, pois estes possuem a forma inacusativa (intransitiva) em contexto de voz média15: (45) O cabelo cortou fácil (46) A tesoura cortou bem. (47) O homem limpou a pia com o detergente. (48) A pia limpou fácil. (49) O detergente limpou bem. Outra questão, que não parece plausível, seria a postulação de uma mesma representação para todos os verbos transitivos, uma vez que se comportam de maneira distinta. Em (45)-(49) vemos que verbos como cortar e limpar participam da alternância de transitividade em contexto de voz média, logo não poderiam ser 15 Nos termos estabelecidos no capítulo 1. 33 excluídos do grupo de verbos, que nos termos das autoras, sofrem processo de “detransitivização”. Levin e Rappaport-Hovav assumem a representação semânticolexical para verbos basicamente transitivos tal como em (36), o que englobaria tanto verbos como cortar quanto quebrar. Entretanto, não está evidente porque verbos como cortar não “detransitivizam” se possuem a mesma representação semântico-lexical, inferem um evento causado externamente e denotam mudança de estado. As propriedades destacadas pelas autoras para verbos participantes da alternância causativa revelam-se coerentes entre as línguas, mas a postulação de uma representação semântico-lexical (cf. (36)) para esses verbos não nos parece provável tendo em vista os resultados obtidos nesse trabalho. Nem todos os verbos transitivos possuem as mesmas configurações estruturais e sua proposta lexicalista não daria conta de nossos dados. No capítulo 3, estão descritos os experimentos, com seus respectivos resultados que apontam para um sistema de processamento linguístico guiado inicialmente por propriedades sintáticas. Sendo assim uma análise no âmbito lexicalista, que prevê a configuração sintática realizada por propriedades lexicais, não seria satisfatória. A postulação de uma representação no nível semântico-lexical de Levin e Rappaport- Hovav para os verbos transitivos, vista anteriormente em (36) e (40) e repetida abaixo, não daria conta das diferenças na seleção dos argumentos que encontramos na aplicação do experimento de julgamento de aceitabilidade/gramaticalidade16. (50) v: [[x ACT] CAUSE[y BECOME <STATE>]] Os resultados indicam diferenças de processamento entre verbos médios e verbos anticausativos, sugerindo que esses dois grupos possuiriam traços distintos inerentes à sua composicionalidade, assim como categorias funcionais distintas permitindo ou restringindo, no nível da sentença, a realização de estruturas semânticosintáticas. Diante disso, não poderíamos assumir uma teoria que advogue em favor de uma mesma representação para verbos que se comportam distintamente na derivação de suas estruturas argumentais. 16 A descrição desse experimento está presente na seção 3.6 do capítulo 3. 34 Ciríaco (2007) trata do fenômeno como alternância causativo-ergativo por considerar a mudança de transitividade, isto é, a existência de duas configurações sintáticas, fundamentada em propriedades semânticas. Na forma causativa, haveria um argumento causador do processo e outro afetado; na forma ergativa, haveria somente um argumento afetado pelo processo. A perspectiva de Ciríaco pode ser traduzida pelas representações propostas por Levin e Rappaport-Hovav (1995), para configurações causativo-transitivo, acima, em (50), e para configurações ergativointransitivo, como em (51): (51) v: [y BECOME <STATE>] Ciríaco adota a proposição de Levin e Rappaport-Hovav (1995), que postula a existência de uma forma básica possibilitando a construção de outra a partir de restrições semântico-lexicais, por ser mais econômico “em termos de aquisição e conhecimento de língua”. Nesse sentido, Ciríaco recorre à noção de acarretamento lexical, atribuídos pelos verbos a itens lexicais (Dowty 1989, 1991), e à proposta de papéis temáticos de Cançado (2005), postulando que um verbo é basicamente transitivo por acarretar lexicalmente a propriedade de desencadeador do processo17. A alternância causativa é vista, então, como um processo de ergativização sofrido por um verbo basicamente transitivo. Segundo a autora, a forma básica (transitiva) passa por um processo sintático de “alçamento do complemento” para a posição de sujeito, resultando em duas construções intransitivas, uma ergativa e outra medial. Porém, as duas construções derivadas da forma transitiva básica passariam por processos de formação semanticamente distintos referentes a uma alteração do aspecto lexical. A forma básica transitiva, em (52), denota um accomplishment e a forma derivada ergativa, em (53), denota um achievemennt18, resultante de um processo de ergativização. Esse processo não altera a natureza do evento; o que muda é a perspectiva que passa a ser a do argumento afetado. 17 “A propriedade de ser desencadeador é definida como ter algum papel no desenrolar do evento. Se, por exemplo, numa dada sentença x V y, é acarretada a x, no conjunto de Pn(x), a propriedade de ter um papel no desencadeamento do evento, dizemos que x tem o desencadeador como uma das propriedades de seu papel temático” (Ciríaco; 2007:36). 18 Accomplishments e Achievements são aspectos relacionados à especificidade de eventos. O primeiro descreve especificações de evento dinâmico, durativo e télico, enquanto o segundo descreve evento dinâmico instantâneo e télico. 35 (52) João quebrou o vaso. (53) O vaso quebrou. (54) Vasos quebram facilmente. Porém, a forma medial, nos termos da autora, em (54), não estaria mais relacionada a evento, pois passa a denotar um estado e seu uso estaria atrelado ao emprego do tempo presente se referindo ao uso genérico do verbo quebrar. As assunções de Ciríaco parecem realmente plausíveis de um ponto de vista semântico-lexical, mas nossas análises demonstram que a complexidade, em termos de processamento, das estruturas tratadas aqui não deriva de aspectos semânticos, como será visto no próximo capítulo, e sim de especificidades da estrutura argumental do verbo. 2.1.2 O Ponto de Vista Construcionista Do ponto de vista construcionista (ou não-lexicalista), a interpretação seria determinada de acordo com as posições sintáticas ocupadas pelos argumentos. Na proposta de Hale & Keyser (1993), a estrutura argumental de um item lexical seria propriamente uma sintaxe, não havendo separação entre o léxico e a sintaxe. Nessa análise, os autores abandonam a noção de atribuição de papel temático e definem relações temáticas nos termos de configurações estruturais simples. Isto é, o que haveria de fato seriam relações determinadas pelas categorias e suas projeções, que são restritas por uma pequena lista de categorias lexicais e por projeções nãoambíguas. Os autores, com isso, atribuem um nível temático especial para o NP na estrutura postulada para verbos transitivos, vista em (55). O NP nessa estrutura receberá o papel de “agente” levando em conta que seu status gramatical é determinado pelas relações que carregam na estrutura relacional projetada pelo núcleo lexical V. 36 (55) Em (55), os autores atestam que o NP carrega a relação de especificador dentro de um VP cujo núcleo toma um complemento que também seria a projeção de uma categoria V. Nessa configuração, as categorias lexicais são identificadas individualmente com um “tipo” nocional especial e as estruturas relacionais, que são projetadas por cada categoria, definem um sistema atrelado às relações semânticas, conferindo dessa forma um “significado elementar” (elementary meaning, Hale e Keyser, 1993:68). Tendo em vista a relação sintático-lexical nas estruturas argumentais dos itens lexicais, Hale e Keyser (1993) fazem uma adaptação da concha larsoniana19 para a representação de verbos transitivos. Com isso, irão assumir que o especificador da matriz VP é a posição temática do argumento externo, considerando a relação sintática entre o núcleo V e o VP interno correspondendo como uma “relação causal”, onde a categoria V está associada com o tipo nocional elementar de “evento”. Sendo assim, em (55), teríamos um V encabeçando a estrutura como um todo e outro V encabeçando o VP complemento. Para Hale e Keyser, o argumento externo da matriz do verbo carrega uma relação sintática não ambígua a ela e sua relação semântica com a estrutura é igualmente não ambígua como o “agente”. Nesse sentido, os autores atestam que não haveria sujeito na estrutura relacional lexical (lexical relational structure – LRS) de verbos inergativos, onde LRS seria a representação em que “cada núcleo lexical projeta sua categoria para um nível frasal e determina dentro da projeção um sistema não-ambíguo de relações estruturais que valem entre os núcleos e suas projeções categoriais e seus argumentos (especificadores, se presentes, e complementos)”, Hale 19 VP-shell, Larson (1988). 37 e Keyser, (1993:53). Essa postulação está atrelada ao princípio da Interpretação Plena (Full Interpretation20). Se o sujeito estivesse presente na LRS desses verbos, ele seria não interpretável, pois não existiria um predicado na posição de complemento para compelir a presença do sujeito no interior do VP. Portanto, o sujeito de um verbo inergativo seria um verdadeiro argumento externo que ocupa a posição de especificador (Spec) de uma projeção funcional IP para receber papel de agente. O papel de agente estaria assumindo função de predicação no processo de formação da estrutura o que estaria de acordo com as propostas de Chomsky (1981) e Marantz (1984) que entendem que o sujeito recebe seu papel semântico de VP, e não do núcleo V. Em (56), temos a estrutura de um verbo inergativo (laugh) que seria o resultado da incorporação21 (nos termos de Baker; 1988) do objeto “laugh” da estrutura relacional lexical dentro do V abstrato com o sujeito externo expresso no VP. (56) De fato, o que os autores querem sugerir é que não há mecanismos linguísticos específicos para a estrutura argumental, pois não existiriam processos de atribuição de 20 Full Interpretation: esse princípio requer que todos os elementos da Forma Fonológica e da Forma Lógica, tomados na interface da sintaxe, devem ter uma interpretação apropriada, licenciadas num sentido relevante, Chomsky (1998a). 21 Mais adiante, em Hale e Keyser (2002), a ideia de incorporação é abandonada e os autores assumem a derivação das construções denominais por meio de conflation, instanciando fonologicamente verbos leves para essas estruturas. 38 papéis temáticos independentes da predicação e não haveriam papéis temáticos separados das relações lexicais expressas em não ambiguidade. Hale e Keyser consideram que verbos inacusativos teriam a propriedade de projetar tanto sintagmas verbais transitivos quanto intransitivos. Quando um verbo inacusativo projeta um sintagma verbal intransitivo, o NP interno se desloca para a posição de sujeito [spec, IP]. Segundo as assunções de Hale e Keyser (1993), o sujeito em s-sintaxe22 é o argumento interno em LRS dos verbos inacusativos, sendo esse argumento “afetado”. Com isso, a diferença entre verbos inergativos e inacusativos seria que o sujeito em s-sintaxe de um inergativo seria externo e o de um inacusativo interno, tal como a estrutura em (57), onde X pode ser um A (adjetivo ou advérbio) ou P (preposição): (57) A proposta de Hale e Keyser (1993) define a estrutura de verbos transitivos atuando em dois núcleos separados: um V° que introduz os argumentos internos do verbo e se projeta para VP e um vº (verbo leve) que introduz, na posição de especificador, um argumento externo, que assume o VP como seu complemento. Harley (1995, 2006) e Marantz (1997), no âmbito da MD, levam essa proposta de núcleos separados, para as estruturas anticausativas, sugerindo que, nessa configuração, o verbo leve não projeta argumento externo. Marantz (1997) argumenta que entre os núcleos funcionais inseridos em ambientes cujas raízes se tornam verbos, haverá um núcleo, chamado v-1, que projeta um agente e outro núcleo v-2 que não projeta. Esses vezinhos atuariam como verbos leves e assumiriam diferentes valores para um único núcleo ou ainda poderiam ter uma unidade que possuiria um único núcleo (opcionalmente) que projeta um agente e, assim, aceita tanto v-1 quanto v-2. 22 S-sintaxe se refere à derivação da estrutura superficial a partir de uma estrutura profunda. 39 No mesmo sentido, Harley argumenta que as estruturas incoativas e causativas teriam uma raiz verbal se movendo para um núcleo vº (verbo leve) acima, que está em relação de c-comando23 com a raiz, criando uma estrutura de adjunção mais complexa que irá se mover para uma categoria funcional. A principal diferença entre as construções incoativas e causativas estaria baseada na natureza do núcleo categorizador vº. Em estruturas incoativas, o vº assumiria um valor BECOME e diante disso não projetaria argumento externo, licenciando a construção intransitiva. Enquanto que, em estruturas causativas, o núcleo categorizador vº teria valor CAUSE e projetaria argumento externo, configurando a construção causativa. Em (58) e (59), temos a representação da estrutura incoativa e causativa, respectivamente, na proposta de Harley (2006): (58) Inacusativa 23 A definição mais tradicional de c-comando prevê que um nó α c-comanda um nó β se e somente se: (i) α não domina β nem β domina α; (ii) cada nódulo ramificante γ que domina α também domina β. Em outras palavras, α c-comanda β se e somente se β é o irmão de α ou filho (ou neto, bisneto...) do irmão de α. 40 (59) Causativa Maia, Oliveira e Santos (no prelo), realizaram estudo translinguístico24, investigando o fenômeno da alternância causativa em Karajá25, Xavante26 e Português do Brasil, aplicados a nativos de cada uma das línguas. O estudo se baseava na proposta de Hale & Keyser (1993) para os verbos transitivos que estariam atuando em dois núcleos separados e nas proposições de Harley (1995, 2006) e Marantz (1997) que assumiram essa configuração também para as estruturas anticausativas (incoativas), nas quais o verbo leve não estaria projetando argumento externo. Tendo em vista essa abordagem, Maia, Oliveira e Santos esperavam encontrar evidências para a complexidade do processamento da contraparte inacusativa dos verbos que licenciam a alternância da transitividade, buscando, nesse sentido, evidenciar a realidade psicológica do vezinho. Esse estudo se insere no âmbito da Psicolinguística Experimental, nesse sentido, foram utilizados aportes tecnológicos experimentais que forneceram dados estatisticamente analisáveis, para verificar, assim, se as hipóteses levantadas são válidas ou não. Nos experimentos aplicados no estudo de Maia, Oliveira e Santos, a língua Karajá não apresentou dificuldades de processamento na contraparte intransitiva (inacusativa), uma vez que possui codificação morfológica diferenciada para 24 Foi aplicado modelo experimental de julgamento de aceitabilidade/gramaticalidade a falantes nativos das línguas. 25 Língua falada por tribo indígena na ilha do Bananal, Tocantins. 26 Língua indígena falada por cerca de 13000 pessoas, a leste do estado do Mato Grosso. 41 representar as partes verbais da alternância causativa por meio de alternância vocálica i/a, como observado em (60), (61) e (62); a presença de marca morfológica atua como facilitador no processamento dessas estruturas sintaticamente mais complexas em relação à contraparte causativa. (60) Tyky rasunyra – inacusativa roupa sujou ‘ A roupa sujou’ (61) Hirari tyky risunyra - causativa menina roupa sujou ‘A menina sujou a roupa.’ (62) Beu tyky risunyra - causativa lama roupa sujou ‘A lama sujou a roupa’ Essa facilitação não ocorre nas línguas Xavante e Português do Brasil, pois estas não apresentam codificação morfológica para marcar a mudança de transitividade. Por essa razão, postulam a realidade psicológica dos morfemas (–i-/-a-) na gramática de falantes nativos do Karajá. Os dados obtidos do Karajá contribuíram com a proposta de uma configuração estrutural com base no argumentado Marantz (1997) e Harley (2006), no âmbito da Teoria da Morfologia Distribuída, onde esses morfemas representativos da alternância causativa funcionariam como verbos leves com diferentes propriedades semânticosintáticas. Quando não introduz argumento externo e possui valor BECOME empregase o vº - a -; quando há projeção de argumento externo e possui valor CAUSE utilizase - i -, como visto acima. Essa configuração com dois núcleos também se aplicaria as demais línguas e essa proposta será levada nessa dissertação para os verbos postulados aqui como médios e anticausativos. Outra abordagem que assume os pressupostos da MD é a proposta de Alexiadou et al. (2006). Nesse trabalho, as autoras tratam o fenômeno em questão como alternância causativa/anticausativa, advogando contra um processo derivacional, onde uma forma básica estaria derivando outra. Seguindo algumas das postulações de Kratzer (2003), as autoras propõem que causativas e anticausativas se diferenciam pela 42 presença ou ausência de um núcleo VOICE que seria responsável por introduzir o argumento externo. No caso das causativas, propõem que inacusativos puros e causativos envolveriam um núcleo CAUSE. O núcleo CAUSE teria a função de introduzir uma “relação causal” entre um evento causador e o estado resultante denotado pela raiz verbal e o tema como visto em (63): (63) (64) Diante disso, anticausativos teriam sua representação em (63) e causativos em (64). Outro fator apontado por Alexiadou et al. (2005) que vai de encontro às propostas que advogam em favor de uma entrada lexical relacionada derivacionalmente a outra é a presença de marcas morfológicas para as duas variantes em diversas línguas, onde tanto a forma transitiva quanto a intransitiva pode ou não apresentar marcadores morfológicos para expressar a sua diátese. As sentenças (65)(66) exemplificam essa possibilidade, presente em Turco27: 27 Exemplos retirados de Montrul (2000). 43 (65) a. Düʂman gemi-yi bat-ir-miʂ enemy ship-ACC sink-CAUS- PAST ‘The enemy sank the ship.’ b. Gemi bat-miʂ. ship sink-PAST ‘The ship sank.’ (66) a. Hisiz pencere-yi kir-di. thief window-ACC break-PAST The thief broke the window. b. Pencere kir-il-di. window break-PASS-PAST ‘The window broke.’ Em (65a), temos no verbo a presença de um morfema (-ir-) marcando a valência causativa, enquanto que na contraparte anticausativa, em (65b), não observamos a presença de um marcador. Por outro lado, em (66) vemos que o morfema indicador da valência verbal encontra-se na estrutura anticausativa, em (66b), cujo morfema (-il-) é o mesmo encontrado em construções passivas e, ainda, que a sentença causativa, em (66a) não apresenta morfema específico para expressar a transitividade do verbo. 2.2 Discussão As propostas lexicalistas de Levin (1993), Levin e Rapapport-Hovav (1995, 2005), Ciríaco (2007), entre outros, para os verbos atuantes na alternância causativa, tais como, a propriedade de em geral inferirem mudança de estado e denotarem eventos causados externamente, se mostram de fato verdadeiras. Entretanto, sua proposta de um nível semântico-lexical baseado na decomposição de predicados não seria satisfatória diante dos resultados obtidos a partir de nossos experimentos. As análises decorrentes de nossos testes demonstram que num estágio inicial do processamento linguístico, propriedades semânticas não estariam atuando na configuração da estrutura argumental dos verbos, pelo menos não no nível postulado pelas teorias lexicalistas. Diante disso, assumimos o posicionamento construcionista 44 de Hale e Keyser, (1993), Marantz (1984, 1997), Harley (1995, 2005), entre outros, postulando, com base na Morfologia Distribuída de Hale e Marantz (1993) para validar nossas afirmações a respeito das propriedades que licenciam a alternância causativa, assim como as classes de inacusativos que resultaram dessa pesquisa. Citamos também o trabalho de Alexiadou et al. (2006) que consideram, basicamente, ocorrer uma alternância de voz (Voice), tendo em vista que esse componente seria responsável por introduzir o argumento externo, e diante da presença ou não desse núcleo a transitividade da sentença é estabelecida não havendo necessidade de postular uma forma básica em detrimento da outra. Nossa proposta estaria no mesmo sentido, pois, como veremos no capítulo 4, acreditamos que fatores morfossintáticos atuam na composição das sentenças fazendo com que a transitividade seja estabelecida, não existindo assim uma entrada lexical que pré-estabeleça a transitividade do verbo e, dessa maneira, não haveria direcionalidade de uma forma para outra. 45 CAPÍTULO 3: APORTES DE PROCESSAMENTO “Mesmo agora, no momento em que você está lendo este texto, por exemplo, você está tendo que transformar os sinais visuais constituídos de letras que compõem as palavras e as frases e o próprio texto, de maneira a também compreender o que, nesse exato momento, estamos produzindo em forma de escrita. Neste momento você está transformando a informação visual em informação linguística relevante para reconhecer as estruturas sintáticas e o conteúdo semântico do texto”. (Leitão, 2008) 3.1 Psicolinguística Experimental Esse trabalho se insere na especialidade conhecida como Sentence ProcessingProcessamento de Frases, no âmbito da Psicolinguística Experimental, que se ocupa das propriedades dos processos envolvidos na compreensão e produção de estruturas frasais. Estudos dessa natureza utilizam metodologia experimental específica, com aporte tecnológico computacional, para a obtenção de dados do processamento da linguagem, que se traduzem em índices e medidas estatisticamente analisáveis. As investigações baseadas em experimentos psicolinguísticos vêm se revelando muito eficazes nas pesquisas que buscam a descrição das propriedades e características dos componentes da gramática, uma vez que afere dados obtidos, mesmo que de forma indireta, na origem dos fenômenos, isto é, a mente dos falantes. Existem diversos modelos experimentais que funcionam como ferramenta de captura desses dados, destacando-se as técnicas de julgamento de aceitabilidade/gramaticalidade, leitura automonitorada – utilizados nesse trabalho, além do paradigma de priming e a técnica de rastreamento ocular28. Os experimentos descritos nas seções seguintes ilustram duas dessas técnicas e avaliam o desempenho do processador sintático – parser (Frazier, 1979; Frazier & Fodor, 1978), no curso temporal do processamento das estruturas inacusativas, verificando se o mesmo utiliza informações de natureza semântica e/ou pragmática em uma análise inicial ou se apenas é guiado pela sintaxe. Com isso, obtêm-se subsídios para postular 28 Essas técnicas foram brevemente exemplificadas no capítulo 1. 46 representações mentais dos fenômenos investigados, isto é, como estruturas oracionais são definidas pela gramática da competência. O desenvolvimento e aplicação dos experimentos utilizados nesse trabalho se deram via programa computacional Psyscope (cf. Cohen, J.D., et alii, 1993) para Macintosh. O programa dispõe de interface gráfica que permite ao usuário (estudantes e pesquisadores) projetar um experimento a partir de questões científicas levantadas no âmbito da sua pesquisa. Para tal, uma elaboração fatorial do experimento é arquitetada de maneira que as análises deem conta dos fatores que estão sendo investigados. Assim, promove-se a articulação do experimento por meio do delineamento exato de tipos de estímulos e sequências de eventos para cada uma das células do desenho fatorial. Nesse sentido, o programa é utilizado, no âmbito da Psicolinguística, como ferramenta na investigação de fenômenos das línguas humanas. A partir da exposição de estímulos linguísticos, que compõem o desenho do experimento, o programa irá capturar medidas que serão traduzidas em dados analisáveis estatisticamente, conferindo maior precisão às postulações de estudos dessa natureza. Desenhos experimentais podem ser contemplados nas seções seguintes desse capítulo. Todos os experimentos implementados, para fins dessa dissertação, foram realizados com voluntários, ditos sujeitos, falantes nativos de Português do Brasil, com visão normal ou corrigida no LAPEX/UFRJ29. 3.2 Experimentos Nesse estudo, foram empregados dois modelos experimentais: dois de julgamento de aceitabilidade/gramaticalidade (com input visual) e um de leitura automonitorada. O primeiro modelo consiste em um teste de julgamento imediato de aceitabilidade realizado pelos participantes a respeito dos estímulos apresentados, isto é, os participantes do experimento tiveram como tarefa avaliar se um conjunto de frases a eles apresentadas eram bem ou mal formados na língua cujo fenômeno estava sendo investigado. Essa técnica captura medidas off-line, fornecidas em um segundo 29 Laboratório de Psicolinguística Experimental (CNPq/FAPERJ), localizado na Faculdade de Letras da UFRJ. 47 estágio do curso temporal do processamento linguístico, onde informações semânticas e pragmáticas estão atuando na compreensão do estímulo. O segundo modelo é uma técnica on-line, isto é, captura medidas antes que ocorra a integração entre todos os níveis linguísticos, analisando o processamento linguístico no momento em que o mesmo está em curso. Nesse método, as frases são segmentadas e os participantes têm como tarefa a leitura de cada segmento, controlando, eles próprios, o tempo de leitura dos segmentos, que são apresentados em diferentes telas no computador. Os experimentos tinham como principal objetivo fornecer dados de processamento que refletissem as diferenças na derivação de sentenças com verbos atuantes na alternância causativa. Por essa razão, verbos inacusativos que não alternam de transitividade não fazem parte do conjunto de materiais utilizados nos experimentos. Primeiramente, verificamos se as diferenças entre transitivos (causativos) e sua contraparte inacusativa poderiam ser atribuídas à maior complexidade da estrutura argumental dos verbos que possuem sujeitos derivados de movimento sintático. Em seguida, buscamos postular classes para os verbos inacusativos que não constituem uma classe fechada, isto é, possuem verbos com grades temáticas distintas, restringindo e licenciando configurações estruturais submetidas às propriedades argumentais dos verbos. 3.3 Di Sciullo et al. (2007): middles x transitivas No primeiro momento desse estudo, o objetivo era verificar se sentenças inacusativas, em PB apresentavam diferenças de processamento em relação à contraparte transitiva (causativa). Para tal, buscamos na literatura estudos que reportassem investigações de natureza experimental sobre sentenças inacusativas. Nesse sentido, Di Sciullo et al. (2007) serviu de ponto de partida para os estudos que se seguiram na investigação da alternância causativa que culminou nessa dissertação. O trabalho citado apresenta três experimentos: dois de julgamento imediato de aceitabilidade (um com input visual e outro auditivo) e um de leitura automonitorada. Nesse estudo, os autores buscavam averiguar qual seria o fenômeno linguístico que acarretaria a dificuldade de processamento de estruturas inacusativas. Isto é, a 48 complexidade seria motivada pelo movimento de NP para a posição de Spec disponível em IP, que atribuiria caso nominativo ao sintagma movido (Keyser e Roeper, 1984 e Roberts, 1987) ou estaria relacionada à mudança da estrutura argumental do verbo acarretada pela presença de “material funcional suplementar”, nos termos de Di Sciullo (2005). Tendo em vista essas assunções, Di Sciullo et al (2007) buscaram verificar se existiria um correlato de processamento traduzido por maiores índices de rejeição e tempos de leitura das sentenças com verbos middles30 em oposição às sentenças transitivas31. Nos experimentos de julgamento de aceitabilidade, realizados por Di Sciullo et al. (2007), empregaram-se sentenças com verbos middles e transitivos nas condições experimentais, ilustradas em (67), (68) e (69), abaixo: (67) This book sells steadily. Middle (68) This store sells steadily. Transitiva inanimada (69) This clerk sells steadily. Transitiva animada O traço de animacidade do argumento externo foi manipulado entre as condições para controlar possíveis efeitos de tipicalidade da posição de sujeito, animado por excelência. Porém, a condição transitiva inanimada também parece apresentar sujeito derivado de movimento sintático – alçado da posição de adjunto. Entretanto, quando extraído dessa posição não apresenta o mesmo nível de complexidade de processamento que os sujeitos extraídos da posição de objeto, como ocorre nas orações com verbos middles. Os autores não discutem essa questão em seu trabalho e, nesse primeiro momento, também não consideramos essa derivação nos experimentos em PB, pois a condição transitiva inanimada foi utilizada para garantir que a dificuldade de processamento era devida à maior complexidade da estrutura argumental da voz média e não a efeitos de tipicalidade da posição de sujeito. 30 Di Sciullo et al. (2007) seguem a nomenclatura de Keyser e Roeper (1984) para as sentenças middles que em dois de nossos experimentos chamamos de voz média, e por fim classificamos como verbos médios. 31 As sentenças ditas transitivas se referem às condições que não teriam o sujeito derivado de movimento sintático, não entendemos o porquê de se referir a essas estruturas como transitivas, uma vez que são monoargumentais (intransitivas). Entretanto, assumimos em nossos experimentos essa denominação para ser mais fidedigno ao trabalho original de Di Sciullo et al (2007). Uma possibilidade é que os autores considerem a forma básica como sendo a transitiva. 49 No experimento de leitura automonitorada realizado por Di Siciullo et al. (2007), foram adicionadas orações na voz passiva para cada uma das condições experimentais dos testes de julgamento, fazendo adaptações quando necessário, como exemplificado em (70), (71) e (72). A nova condição tinha como objetivo comparar possíveis efeitos de movimento como se assume nas análises de middles e passivas. (70)This book was sold quickly. (71)This store was sold quickly. (72)This clerk was fired quickly. 3.3.1 Resultados Os resultados dos testes de julgamento indicaram maiores dificuldades de processamento das orações middles, evidenciadas por índices de rejeição significativamente maiores, no teste com input visual, em oposição às condições transitivas, assim como maiores médias de tempo de julgamento no teste feito com input auditivo: F(2,86)= 14.5, p< 0,0001 e F(2,86)= 31,8, p<0,0001, respectivamente. Abaixo, na figura 3, podem-se observar os gráficos resultantes das análises estatísticas desses dois experimentos: Figura 3: Gráficos com os resultados obtidos a partir dos experimentos de julgamento de aceitabilidade (Di Sciullo et al., 2007). Os dados obtidos do teste de leitura automonitorada mostraram maiores tempos de leitura para os verbos middles. 50 Os autores sugerem que os maiores tempos de leitura e índices de rejeição para middles estão relacionados a operações geradas pela estrutura desses verbos. Entretanto, esses autores não atribuem essa complexidade argumental ao movimento do NP gerado na posição de argumento interno para a posição de argumento externo, como grande parte dos estudiosos do fenômeno da Inacusatividade (Burzio, 1981; Keyser e Roeper, 1984; Hale e Keyser, 1993. Di Sciullo et al (2007) sugerem que middles sofreriam mudança de estrutura argumental em consequência da combinação de um modificador adjetival cf. (70) com um verbo inacusativo, sendo analisados nos termos de uma operação de mudança (shift) da estrutura argumental, assumindo que está pode ser flexível para esses verbos. Com isso, assumem uma operação de A-structure shift, citado em (73), que levaria a dificuldade de processamento das middles. (73) “A-structure shift Functional material brings about the shifting of the canonical argument of predicate along with the semantic type shift of its parts.”32 Nesse sentido, os verbos na voz passiva não teriam um shift da estrutura argumental não apresentando dificuldades de processamento, embora também sejam geradas por movimento sintático de NP. Afirmam também que, de um ponto de vista semântico, a natureza canônica do argumento interno (inanimado) poderia influenciar no tempo de processamento das orações com verbos middles, fazendo com que se comportassem como um agente inanimado, que assumindo a posição de argumento externo causaria um estranhamento da sentença. Entretanto, analisando esses dados de um ponto de vista não lexicalista, poder-se-ia atribuir os resultados ao movimento sintático sofrido pelo argumento interno deslocado da posição de objeto. 3.4 Experimento 1: Julgamento de aceitabilidade da voz média em PB 32 “Material funcional acarreta a mudança de estrutura argumental do predicado juntamente com a mudança de tipo semântico de suas partes” - Di Sciullo (2005). 51 A partir do trabalho de Di Sciullo et al. (2007), elaboramos um experimento de julgamento de gramaticalidade, com input visual, para avaliarmos se os resultados obtidos no teste realizado em Inglês, também se repetiriam em PB. Justificativa e Hipótese Na derivação de estruturas inacusativas, o constituinte gerado na posição de argumento interno se desloca para a posição de argumento externo, uma vez que, na posição em que é gerado, não recebe caso, segundo proposto por Keyser & Roeper, (1984); Roberts, (1987); Di Sciullo, (2005), entre outros, passando a desempenhar função gramatical de sujeito. Diante disso, esperava-se que as sentenças VM (voz média) exibissem níveis de rejeição significativamente maiores do que TA (transitiva animada) e TI (transitiva inanimada), tendo em vista a maior complexidade estrutural ocasionada pelo movimento sintático do NP argumento interno, na construção da voz média. O NP que ocupa a posição de sujeito nas sentenças na voz média é deslocado de dentro do VP, posição em que é gerado. Em sua posição inicial, recebe papel temático de paciente ou tema, mas, como o verbo middle não seria capaz de atribuir caso, o NP deve se deslocar para a posição de argumento externo para receber caso nominativo. O traço de animacidade do sujeito tem função de garantir que os maiores índices de rejeição se devem a maior complexidade estrutural das sentenças voz média (VM), e não a um efeito de tipicalidade da posição de sujeito, seguindo Di Sciullo et al. (2007). As frases que configuravam a condição transitiva animada (TA) deveriam apresentar níveis de rejeição menores, pois, além de não apresentarem derivação através de movimento sintático, o traço [+ animado] favorece a interpretação de sujeito, por excelência, tipicamente agentivo. Nas orações transitivas inanimadas (TI), o sujeito é inanimado, como em VM, mas é agente33, como em TA, com isso os índices de rejeição também seriam significativamente maiores para a condição VM, que embora tenham sujeito inanimado são derivadas de movimento sintático. As medidas de tempo das sentenças voz média deveriam ser 33 No primeiro momento da pesquisa não discutimos a natureza temática do constituinte dessa condição, pois sua implementação era de controle para garantir a comparabilidade entre as condições. 52 significativamente maiores do que as condições transitiva animada e transitiva inanimada, em consequência da complexidade da estrutura argumental das sentenças voz média. Com isso, o que de fato estávamos esperando era que sentenças como Esse feijão cozinha bem -VM- fossem significativamente mais rejeitadas quando comparadas a sentenças como Essa moça cozinha bem –TA- e Esse fogão cozinha bem - TI. Material O material utilizado consistia em três listas com 15 frases experimentais em cada uma delas: 15 sentenças na voz média – VM; 15 sentenças transitivas com sujeito animado – TA; 15 sentenças transitivas com sujeito inanimado – TI; e ainda, 30 frases distratoras. As frases experimentais foram distribuídas em quadrado latino (Latin Square), de forma que todos os sujeitos vissem todas as condições experimentais, mas não a mesma frase em cada condição. Como variáveis independentes, tínhamos o traço de animacidade dos sujeitos e a transitividade verbal; como variáveis dependentes, os índices de rejeição e as medidas de tempo de compreensão das sentenças. A tríade abaixo exemplifica o material utilizado no experimento: VM Esse feijão cozinha bem TA Essa moça cozinha bem. TI Esse fogão cozinha bem. Participantes O experimento foi realizado com 30 falantes nativos de Português do Brasil, com visão normal ou corrigida, estudantes da graduação na Faculdade de Letras da UFRJ. Todos os participantes eram adultos com idade entre 20 e 30 anos, com visão normal ou corrigida. Procedimento 53 Os participantes tinham como tarefa ler as sentenças apresentadas na tela do computador (uma por vez) e, imediatamente após a leitura, deveriam julgar se consideravam a frase bem ou mal formada na língua. Os participantes eram submetidos previamente a um treino do experimento a fim de não haver hesitação sobre como proceder durante o teste. Depois de julgada, a sentença era substituída por uma tela em branco que permaneceria até que o próprio participante acionasse a próxima sentença. Os comandos para julgamento e mudança de tela eram de próprio controle do participante, realizados por meio de uma button-box, acoplada ao computador, posicionado a frente do sujeito: botão amarelo para chamar uma nova sentença, botão vermelho para resposta NÃO e botão verde para responder SIM. A figura 4 ilustra o desenho do experimento: sentença sentença Figura 4: desenho do experimento 1. 3.4.1 Resultados Os índices de rejeição da condição voz média foram significativamente maiores do que as condições transitiva animada e transitiva inanimada indicando que as orações voz média apresentam alguma particularidade estrutural que as tornam mais complexas de serem processados. Essa dificuldade é atribuída à complexidade da estrutura argumental dos verbos configurados na voz média, derivada do movimento sintático do argumento interno para a posição de sujeito o que torna o processamento 54 dessas sentenças mais custoso ao analisador sintático. Os índices de rejeição são apresentados na figura 5, abaixo: 100% 90% 80% 70% 60% sim 50% não 40% 30% 20% 10% 0% VM TA sim não VM 60% 40% Esse feijão cozinha bem. TA 83% 17% Essa moça cozinha bem. TI 86% 14% Esse feijão cozinha bem. TI Figura 5: gráfico e tabela com índices de rejeição às condições experimentais. Os índices de rejeição da condição voz média foram significativamente maiores, em termos estatísticos, do que os índices de rejeição das condições: VMnão x TAnão - X² = 20,82, p<0,0001; VMnão x TInão - X²=40, p< 0,0001. As medidas de tempo de julgamento (figura 6) foram submetidas a um teste-T que verifica se as medias de duas matrizes X e Y diferem significativamente. A análise estatística, tomando as condições duas a duas, não apontou, no entanto, diferenças significativas entre as condições: VM x TA - t(298) =1,87; p = 0,06; VM x TI - t(298) =0,10; p = 0,9; TA x TI – t(298) = 1,20; p = 0,2. 55 4000 3500 3000 2500 sim 2000 não 1500 1000 500 0 VM TA sim não VM 2610ms 2989ms Esse feijão cozinha bem. TA 2321ms 3759ms Essa moça cozinha bem. TI 2492ms 3026ms Esse fogão cozinha bem. TI Figura 6: gráfico e tabela das médias de tempo de julgamento. 3.4.2 Discussão Embora os tempos de julgamento não tenham apresentado diferenças significativas entre as condições, o que não é incomum nesse tipo de experimento (offline), os índices de rejeição das construções voz média foram significativamente maiores do que os índices das contrapartes transitivas. Estes índices mais altos de rejeição das médias seriam provocados pela maior complexidade estrutural dessas construções que, como analisadas acima, apresentam movimento sintático da posição 56 de objeto para a posição de sujeito, enquanto as transitivas teriam seu sujeito já gerado na base. Entretanto, não podemos desconsiderar que a condição TI também poderia apresentar sujeitos derivados de movimento sintático, mas diferentemente das construções médias, teria seu sujeito extraído da posição de adjunto ou ainda se tratar de uma estrutura intransitiva que apresenta a posição de argumento externo projetada. Essa condição não apresentou índices de rejeição significativos o que aponta para a existência de alguma propriedade que facilitaria o processamento das sentenças mesmo que apresentem um processo derivacional distinto da condição TA. 3.5 Experimento 2: Leitura Automonitorada de sentenças Voz Média em PB Os resultados obtidos a partir do experimento de julgamento de aceitabilidade apontam para a real complexidade argumental das sentenças voz média, porém a técnica de julgamento de aceitabilidade não captura medidas on-line, isto é, não afere medidas no momento em que o processamento linguístico está em curso. Por essa razão, foi elaborado um experimento on-line de leitura automonitorada. Justificativa e Hipótese Nesse experimento, foi introduzido um contexto prévio para tornar as sentenças mais naturais aos participantes, e como se tratava de uma técnica on-line foi possível verificar que sentença inacusativas são realmente mais difíceis de serem processadas, não apenas julgadas. Partindo da premissa da existência de movimento do NP-objeto (argumento interno) para a posição de sujeito na derivação de sentenças inacusativas34, esperava-se que os participantes demonstrassem maior dificuldade de processamento na condição voz média. A complexidade estrutural dessas frases deveria se refletir nas variáveis dependentes: tempos de leitura do segmento crítico e compreensão das sentenças. As condições transitiva animada e transitiva inanimada não deveriam apresentar dificuldades de processamento, considerando que possuiriam históricos derivacionais menos complexos, isto é, não apresentam sujeitos 34 Burzio, 1981; Keyser & Roeper, 1984; Roberts, 1987; Hale e Keyser, 1993; Di Sciullo, 2005; entre outros. 57 derivados de movimento sintático, seguindo ainda o estudo de Di Sciullo et al. (2007). Entretanto, como já observamos, anteriormente, a condição TI também poderia apresentar alguma especificidade derivacional, mas para efeitos de comparabilidade entre as condições sua configuração sintática talvez mais complexa não influenciou nos resultados, pois sua utilização era para evitar que a dificuldade de processamento fosse devida a efeitos de tipicalidade da posição de sujeito, assim como no experimento 1. A introdução de um contexto prévio só deveria influenciar nas medidas offline, pois em um sistema modular de processamento, acredita-se que as informações de natureza semântica e pragmática atuariam apenas em um segundo estágio no curso temporal da compreensão (cf. Frazier, 1979; Ferreira & Clifton, 1983; entre outros). As medidas on-line – tempos de leitura do segmento crítico - deveriam ser significativamente maiores para a condição voz média, do que os tempos das demais condições, pois essa condição apresenta como já visto aqui, histórico derivacional mais complexo. Material O material utilizado foi constituído por três listas com 15 frases experimentais em cada uma delas: 15 sentenças voz média – VM; 15 sentenças transitivas com sujeito animado – TA; 15 sentenças transitivas com sujeito inanimado – TI; e ainda, 30 frases distratoras. Novamente, distribuíram-se as frases experimentais em quadrado latino, de forma que todos os sujeitos vissem todas as condições experimentais, mas não a mesma frase em cada condição. A tríade na figura 7 exemplifica as condições experimentais empregadas nesse experimento com os cortes em cada sentença, o segmento crítico em negrito, além da pergunta interpretativa final: 58 VM - Os grãos estavam velhos, /mas esse feijão cozinha bem,/ disse o vendedor. O feijão cozinha bem? Sim ou Não TA – Os empregados são pouco eficientes, / mas essa moça cozinha bem,/ como me disseram. A moça sabe cozinhar? Sim ou Não TI - O almoço estava atrasado, /mas esse fogão cozinha bem,/ deixando todos mais calmos. Esse fogão é bom? Sim ou Não Figura 7: exemplos das condições experimentais. As partes realçadas indicam o segmento crítico. O objetivo de se introduzir um contexto prévio era tornar essas sentenças mais naturais de serem compreendidas. A introdução de um contexto prévio não deveria facilitar o processamento das sentenças, pois estudos experimentais apontam para um parser que não considera informações de natureza semântica e pragmática num estágio inicial de processamento linguístico (Maia et al., 2003). Entretanto, não manipulamos esse contexto como uma variável independente de modo que essa afirmação pudesse ser mais fortemente sustentada aqui. Participantes O experimento foi realizado com 30 falantes nativos de Português do Brasil, com visão normal ou corrigida, estudantes da graduação na Faculdade de Letras da UFRJ. Todos os participantes eram adultos com idade entre 20 e 30 anos. Procedimentos Os participantes deveriam ler rapidamente as sentenças que eram apresentadas segmentadas em três partes, na tela do computador (uma por vez) e responder a uma pergunta interpretativa, ao final de cada frase, como ilustrado na figura 6. Os comandos eram de controle do próprio participante realizado pelo acionamento de uma button-box acoplada ao computador. Os participantes deveriam pressionar o botão amarelo para mudar de tela e ler o próximo segmento; botão vermelho para resposta NÃO e botão verde para responder SIM. Os sujeitos deveriam responder SIM para acertar as frases experimentais. Os participantes eram submetidos previamente a 59 um treino do experimento a fim de não haver hesitação sobre como proceder durante o teste. A figura 8 ilustra o desenho do experimento: segmento 1 segmento 2 segmento 3 (crítico) pergunta Figura 8: desenho do experimento. 3.5.1 Resultados A comparação das médias de tempos de leitura dos segmentos críticos das três condições experimentais mostrou-se significativamente maiores para condição VM. Esse resultado, apresentado na figura 9, está na direção da hipótese levantada, o que contribui para a afirmação de uma real complexidade no processamento das sentenças voz média. As médias de tempo de leitura do segmento crítico não apresentaram diferenças significativas entre as condições TA e TI. 60 2450 2400 2350 2300 2250 2200 Série1 2150 2100 2050 2000 1950 VM TA TI VM 2411ms /mas esse feijão cozinha bem/ TA 2127ms /mas essa moça cozinha bem/ TI 2148ms /mas esse fogão cozinha bem/ Figura 9: gráfico e tabela com as médias de tempo de leitura do segmento 2. A realização do teste T de student entre os tempos médios de leitura dos segmentos críticos, nas diferentes condições, comprovou, estatisticamente, a diferença significativa entre as condições. Obtiveram-se os seguintes valores: VM2 x TA2 t(298) =2,3; p=0,02 significativo; VM2 x TI2 - t(298) =2,1; p=0,03 significativo; porém TA2xTI2 não diferem estatisticamente: t(298) =0,17; p=0,8 não significativo. As medidas off-line não foram significativamente distintas. Os índices de resposta (tabela 1) não apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre as condições, embora apresentassem uma ocorrência um pouco maior de erros nas condições VM e TI do que em TA. As médias de tempo de resposta não foram significativamente distintas (figura 10). A análise estatística das médias de tempo de resposta revelou os seguintes dados: VMrxTAr - X2=1,17; p=0,27; VMr x TIr - 61 X2=0,007; p=0,93; TAr x TIr - X2=1,37; p=0,24. Conclui-se, portanto, que não houve diferença significativa entre as condições, nesta medida. 2700 2600 2500 2400 Série1 2300 2200 2100 VM TA VM 2647ms TI TA 2287ms TI 2503ms Figura 10: gráfico e tabela de médias de tempo de resposta à pergunta interpretativa. sim Não VM 137 13 TA 150 --- TI 136 14 Tabela1: índices de respostas. 3.5.2 Discussão Nesse segundo experimento, esperava-se que as médias de tempo de leitura do segmento crítico fossem maiores nas condições de voz média- VM- (figura 9), 62 indicando o efeito de complexidade estrutural no processamento da sentença inacusativa, configurada no experimento pela voz média. Esse resultado sugere que as sentenças com inacusativos são mais custosas ao processador sintático em decorrência do movimento de NP, conforme indicado pelos seus maiores tempos de leitura, relativamente às condições transitivas. As medidas off-line neste experimento não foram diferentes. Dado o contexto adequado, inacusativos, embora mais complexos de se processarem, como revelado pelos seus maiores tempos de leitura, são interpretados com índices e tempos semelhantes às condições transitivas. Evidenciamos a existência de maior complexidade estrutural na derivação de sentenças com verbos inacusativos em relação a estruturas menos complexas que não teriam movimento sintático na sua derivação. Porém, ficam algumas lacunas: i) parece pouco provável que a condição TI (transitiva inanimada) seja gerada por movimento sintático tendo em vista que não acarreta o mesmo custo ao processador sintático que a condição VM. Diante disso que especificidade essa condição apresentaria para ser tão prontamente processada quanto à condição transitiva animada? ii) os verbos utilizados não constituem uma única classe de verbos inacusativos, mas o que faz esses verbos se comportarem de forma distinta é uma questão que ainda fica em aberto, a qual tentarei responder mais à frente. Os verbos empregados possuem diferentes grades temáticas, isto é, são, de fato, diferentes tipos de verbos inacusativos, mas para efeito dos experimentos descritos acima essa questão não parece haver interferido nos resultados, pois todas as condições experimentais se configuravam superficialmente na valência intransitiva. Essa configuração tinha como objetivo avaliar a existência de processos derivacionais distintos, ou seja, sujeito derivado ou não via movimento sintático deslocado da posição de argumento interno (NP-objeto) o que foi evidenciado pelos resultados obtidos a partir dos experimentos de julgamento de aceitabilidade e leitura automonitorada. Quanto à condição transitiva inanimada, é ainda necessária uma investigação mais acurada para determinar se existe alguma propriedade na estrutura que facilitaria o processamento das sentenças. Mais adiante proponho uma explicação para essa questão. 63 3.6 Experimento 3: Julgamento de aceitabilidade médio x anticausativo Depois de evidenciada a maior complexidade das sentenças na voz média, que seria a contraparte inacusativa, passamos a investigação das propriedades estruturais dos verbos inacusativos, buscando uma classificação para aqueles envolvidos na alternância de transitividade. O objetivo nesse momento era determinar que propriedades semânticas e sintáticas da estrutura argumental desses verbos licenciam a atuação em duas diáteses – transitiva (causativa) e intransitiva (inacusativa). Por essa razão, foi elaborado um experimento de julgamento de aceitabilidade que fornecesse evidências empíricas para as classificações aqui propostas. Justificativa e Hipótese Keyser & Roeper (1984) apontam para a existência de um agente implícito essencial a grade temática em verbos (middles), o que não é evidenciado em anticausativas35. Schäfer (2009), afirma que a presença de um agente implícito se evidencia pelo licenciamento de adjuntos instrumentos que devem estar semanticamente relacionados a um constituinte animado/humano. Em contrapartida, verbos anticausativos não possuiriam agentes implícitos e, consequentemente, não admitiriam adjuntos de natureza instrumental alçado para a posição de sujeito; para anticausativos os adjuntos devem ter natureza causal, ocupando posição de sujeito somente em estruturas transitivas. Os sujeitos de verbos anticausativos são paciente, tema ou afetado, não admitindo um argumento externo causador quando assumem a diátese intransitiva. A partir das orações de (74) – (81), observamos os diferentes comportamentos entre verbos médios e anticausativos: (74) O menino cortou o cabelo com a tesoura. (75) *O menino abriu a porta com o vento. (76) O cabelo cortou fácil. (77) A tesoura cortou fácil. 35 Keyser & Roeper nomeiam como ergatives as sentenças aqui chamadas de anticausativas. 64 (78) A porta abriu com o vento. (79) A porta abriu. (80) O vento abriu a porta. (81) *O vento abriu. Médios admitem extração de adjunto de natureza instrumental ocupando posição de argumento externo em estrutura intransitiva, como em (77), mas parecem rejeitar a extração de argumento interno, uma vez que esse não tem um traço relacionado com agentividade, como em (76). Verbos anticausativos não licenciam extração de adjunto causa, como visto em (81); adjuntos dessa natureza só assumiriam função gramatical de sujeito em uma diátese transitiva como visto em (80). Entretanto, em (79), vemos que o deslocamento do argumento interno para a posição de sujeito não gera agramaticalidade, pois verbos como abrir não teriam um agente implícito indexado ao verbo, licenciando um constituinte com papel de tema ou paciente. Nesse sentido, elaboramos um experimento off-line de julgamento de aceitabilidade, esperando encontrar evidências empíricas que comprovem tais afirmações a respeito do fenômeno da alternância causativa. Para tal, elaboramos experimento de julgamento de aceitabilidade comparando sentenças com as seguintes configurações: verbos médios com sujeito alçado da posição de argumento – MAg; verbos médios com sujeito alçado da posição de adjunto – MAd; verbos anticausativos com sujeito alçado da posição de argumento – AAg e verbos anticausativos com sujeito alçado da posição de adjunto- AAd. As sentenças em (82)-(85) exemplificam o material utilizado no experimento: (82) O cabelo cortou fácil. - MAg (83) A tesoura cortou fácil. - MAd (84) O gelo derreteu logo. - AAg (85) O calor derreteu logo. - AAd Esperava-se que os índices e tempos de rejeição das orações AAd fossem significativamente maiores, em termos estatísticos, pois seriam menos aceitas, uma vez que, em geral, os verbos anticausativos não licenciariam um argumento externo de natureza causal, na diátese intransitiva. A condição MAd deveria apresentar índices de 65 rejeição menores em relação à MAg, pois a presença de um argumento externo de natureza instrumental infere a presença de um agente, facilitando o processamento dessa estrutura, ou seja, sentenças como (83) são mais aceitas pelos falantes do que sentenças como (82). As condições MAd e AAg não deveriam apresentar níveis elevados de rejeição considerando que seus argumentos satisfazem a grade temática exigida pelo verbo, instrumento e paciente ou tema, respectivamente, ocupando posição de argumento externo em estrutura intransitiva. Como variáveis independentes, tínhamos: sujeito extraído da posição de argumento interno e de adjunto, tipo de verbo e transitividade verbal. Os índices e medidas de tempo de aceitabilidade das sentenças configuraram as variáveis dependentes. Para efeitos de comparabilidade experimental todas as orações estão em estrutura média, nos termos estabelecidos no capítulo 1. Material O experimento era constituído de 4 listas com 20 frases experimentais em cada: 20 de médios com sujeito-argumento, 20 de médios com sujeito-adjunto, 20 de anticausativos com sujeito-argumento, 20 anticausativos com sujeito-adjunto e 56 distratoras. O cruzamento desses níveis produziu quatro condições experimentais: MAg, MAd, AAg e AAd. O quarteto abaixo exemplifica as condições experimentais: MAg O cabelo cortou fácil. MAd A tesoura cortou fácil. AAg A porteira abriu fácil. AAd A ventania abriu fácil. Participantes O experimento foi realizado com 32 falantes nativos de Português do Brasil, graduandos da Faculdade de Letras da UFRJ, com visão normal ou corrigida. Todos os participantes eram adultos com idade entre 20 e 30 anos. Procedimentos 66 Os participantes deveriam ler as sentenças apresentadas na tela do computador (uma por vez) e, na sequência, deveriam julgar se consideravam a frase bem ou mal formada na língua. As frases permaneciam na tela durante 3000ms e, em seguida, eram substituídas por uma tela contendo três pontos de interrogação, nesse momento os participantes deveriam julgar a frase. Depois de julgada a sentença, a tela era substituída por outra em branco que permaneceria até que o próprio participante chamasse a próxima frase através do acionamento de uma tecla. Os procedimentos foram previamente explicados pelo pesquisador responsável pela aplicação do experimento. Como de hábito, os participantes foram submetidos a um treino prévio, a fim de evitar possíveis dúvidas sobre como proceder durante o teste. Os comandos para julgar e para mudar a tela eram de próprio controle do participante, realizados através do próprio teclado do computador, posicionado a frente do sujeito: tecla espaço (destacada em amarelo) para chamar uma nova sentença, tecla L (em vermelho) para resposta NÃO e tecla S (em verde) para responder SIM. A figura 11 ilustra o desenho do experimento: sentença ??? sentença Figura 11: desenho do experimento. 3.6.1 Resultados A análise dos dados obtidos evidenciou que as orações com verbos médios possuem índices de aceitabilidade maiores quando apresentam sujeitos com valor 67 instrumental - condição MAd, em comparação estatística a condição MAg cujo sujeito-afetado apresenta indícios de ser derivado de movimento sintático dado os experimentos supracitados. Enquanto que verbos anticausativos são mais aceitos com sujeito-afetado – AAg, do que com sujeito com valor causa - AAd. Esses resultados estão na direção da atuação de traços inerentes na configuração estrutural do verbo, como fatores determinantes para o licenciamento da alternância causativa. A figura 12 apresenta o gráfico e a tabela com índices de aceitabilidade em dados percentuais: 80% 70% 60% 50% sim 40% não 30% 20% 10% 0% MAg MAd AAg AAd sim não 65% MAg O cabelo cortou fácil. 35% MAd A tesoura cortou fácil. 61,30% 38,70% AAg A porteira abriu fácil. 62,50% 37,50% AAd A ventania abriu fácil. 38,80% 61,20% Figura 12: gráfico e tabela de índices de aceitabilidade em valor percentual. Os cruzamentos entre os índices de sim vs não, nas quatro condições, produziram, todos, diferenças significativas, a saber: MAg sim x não: X2 (1, 160) = 18, p= 0,0001; MAd sim x não: X2 (1, 160) = 9,7, p= 0,0019; AAg sim x não: X2 (1, 160) = 11,5, p= 0,0007; AAd sim x não: X2 (1, 160) = 9,7, p= 0,0019. 68 A figura 13 apresenta as médias de tempo de julgamento, porém esses dados não apresentaram diferenças significativas. 1600 1200 sim 800 não 400 0 MAg MAd AAg sim AAd não MAg O cabelo cortou fácil. 1006ms 1327ms MAd A tesoura cortou fácil. 1267ms 1310ms AAg A porteira abriu fácil. 1127ms 1342ms AAd A ventania abriu fácil. 1472ms 1392ms Figura 13: gráfico e tabela das médias de tempo de julgamento. 3.6.2 Discussão O objetivo desse experimento era postular classes para os verbos inacusativos atuantes na alternância causativa. Apoiando-se nas premissas de Keyser e Roeper (1984), que apontam para a existência de um agente implícito presente na grade temática de verbos middles (médios), de um lado, e ausente em verbos anticausativos, de outro, e Schäfer (2009), que aponta para a relação entre adjuntos instrumentos e agente animado na configuração de construções com verbos médios. 69 Os resultados mostraram que as sentenças de verbos médios com sujeitoafetado - MAg - e anticausativos com sujeito-causa – AAd – foram, significativamente, mais rejeitadas, enquanto que as sentenças contendo médios com sujeito-instrumento – MAd - e anticausativos com sujeito-afetado – AAg - foram bem aceitas, de acordo com o previsto. Isso corrobora ainda mais para a afirmação de que orações de verbos médios com sujeito-afetado teriam sua complexidade derivacional em razão de movimento sintático, assim, como sentenças de verbos anticausativos com sujeito-afetado. Porém, não podemos deixar de comentar que as sentenças com médios com sujeito-afetado resultaram em um índice de rejeição considerável. As sentenças de verbos anticausativos com sujeito-causa - condição AAd- em geral, não seriam bem aceitas, pois um sujeito dessa natureza seria licenciado em construções intransitivas. Os anticausativos, diante do posicionamento teórico assumido até o momento e pelos resultados obtidos a partir de experimentação, não possuem um agente implícito em sua grade temática, possibilitando a construção inacusativa mesmo que não estejam inseridos em contexto de voz média – A porta abriu. A condição com verbos médios com sujeito-instrumento – MAd - são bem aceitas pela possibilidade da existência de um argumento externo implícito com valor agentivo facilitando o processamento dessas estruturas ou poderíamos pensar que os sujeitos quando possuem natureza instrumental podem ser derivados na posição de argumento externo, e ainda poderíamos pensar em “agentividade não-animada”. Tendo em vista que os dados foram na direção esperada, sendo consistentes com a fundamentação teórica postulamos duas categorias distintas para verbos inacusativos atuantes na alternância causativa calcadas em aportes de processamento linguístico: médios e anticausativos. 3.7 Conclusões Este capítulo foi dedicado à descrição dos experimentos realizados ao longo do trabalho de investigação do fenômeno da alternância causativa, buscando, sobretudo, a postulação de classes de verbos inacusativos atuantes nas duas diáteses (transitiva e intransitiva). As seções 3.1 e 3.2 fazem um breve esclarecimento sobre os objetos de estudo no âmbito da Psicolinguística Experimental, citando algumas das técnicas experimentais utilizadas por estudos dessa natureza. Nas seções 3.4, 3.5 e 3.6, encontram-se descritos os experimentos realizados durante o desenvolvimento dessa 70 pesquisa, assim como seus resultados e discussões a respeito dos dados obtidos a partir de cada um deles. Os experimentos 1 e 2, de julgamento imediato de aceitabilidade e leitura automonitorada, respectivamente, contribuíram para a afirmação da existência de maior complexidade das estruturas inacusativas em oposição às condições transitivas. Em razão dos resultados obtidos dos experimentos, assumimos as proposições que sugerem um movimento sintático sofrido pelo o NP gerado na posição de argumento interno para a posição de argumento externo que, nessa posição, irá receber caso nominativo (Burzio, 1981; Keyser e Roeper, 1984, Roberts, 1987; Hale e Keyser, 1993; entre outros). Nesse sentido, atribuímos a dificuldade de processamento das sentenças inacusativas (middles) ao movimento sintático, tendo em vista os maiores índices de rejeição (experimento 1) e maiores tempos de leitura de sentenças inacusativas (experimento 2). Distintamente de nosso posicionamento, Di Sciullo et al (2007) atribuem a dificuldade de processamento a um shift36 da estrutura argumental dos verbos, embora não neguem a existência de movimento sintático envolvendo NPs. Em seus experimentos, utilizaram orações na voz passiva, que também possui movimento sintático, mas não alteram a transitividade da estrutura, e consequentemente não apresentam dificuldades de processamento. Essa observação apesar de ser uma questão relevante para as análises de estrutura argumental não será discutida e aprofundada nesse trabalho, uma vez que orações na voz passiva não fazem parte do corpus experimental do nosso trabalho. Após a descrição dos experimentos 1 e 2, que forneceram dados para a postulação de uma real complexidade da estrutura argumental de verbos inacusativos alternantes, passou-se a descrição do experimento 3 (julgamento imediato de aceitabilidade) que possibilitou a divisão dos verbos inacusativos participantes da alternância causativa em duas classes: médios e anticausativos. A lógica desse experimento estava fundamentada nas postulações de Keyser e Roeper (1984), seguidas por Schäfer (2009), que apontam para a existência de um agente implícito atuando na grade temática dos verbos médios, advogando que o licenciamento de adjuntos instrumentais seria uma evidência da presença desse agente – A tesoura 36 Cf. seção 3.2. 71 cortou fácil. Tendo em vista o desenho do experimento, que contrastou sentenças na construção média37 contrapondo sentenças com verbos médios e sentenças com verbos anticausativos. Em relação às orações com verbos médios, verificamos que se um NP com traço instrumental (A esponja limpou bem; A vitrola tocou bem) ocupa a posição de sujeito são significativamente mais aceitas do que se o NP que ocupa essa posição é um argumento “afetado” (A pia limpou bem; A guitarra tocou bem). Isso seria um indício da existência de traço com valor instrumental inerente a raiz dos verbos que passamos a chamar de médios. Em contrapartida, verbos anticausativos não possuiriam agentes implícitos e não seriam compatíveis com traços instrumentais. O fato desses verbos não licenciarem adjuntos com esse valor seria um indício da ausência de traço que infira um agente causador, como no caso de um traço com valor instrumental, na composicionalidade desses predicadores. Os adjuntos de sentenças com verbos anticausativos devem ter natureza causal (Schäfer, 2009), ocupando posição de argumento externo somente em estruturas transitivas (O vento abriu a porta). Com isso, verbos anticausativos possuem sujeito afetado, mas rejeitam sujeito-causa em contexto intransitivo, como pode ser evidenciado pelos índices de rejeição significativamente maiores das orações contendo verbos anticausativos com sujeitocausa em oposição às orações com verbos anticausativos com sujeito-afetado. Outra característica que distingue os verbos médios dos verbos anticausativos é o contexto sentencial em que estão inseridos, isto é, enquanto esses são licenciados com ou sem a presença de um “modificador adjetival” 38 , aqueles devem estar inseridos em orações médias para assumirem a diátese intransitiva. Em suma, médios são verbos que em contexto intransitivo não aceitam livremente sujeito-afetado, embora seja possível e anticausativos são aqueles que aceitam livremente sujeito-afetado em contexto intransitivo. Diante disso, concluímos a parte de descrição experimental dessa dissertação que norteou as postulações encontradas nesse texto, mas ainda ficam duas questões: 37 Nos termos estabelecidos no capítulo1. 38 Di Sciullo, 2005. 72 como podemos representar a estrutura argumental desses verbos e qual será o melhor modelo a ser seguido? Para responder a essas questões recorremos a Teoria da Morfologia Distribuída que teve suas principais características e propriedades explicitadas no capítulo 1. 73 CAPÍTULO 4: ESTRUTURA E REPRESENTAÇÃO 4.1 Estrutura e representação dos verbos médios e anticausativos Como vimos no capítulo 1, seguindo a MD temos que as palavras, assim como as sentenças são formadas pelo mesmo processo, isto é, derivadas da composicionalidade de traços morfossintáticos que formam complexos de núcleos sintáticos nos quais serão inseridos os itens do Vocabulário. Se tomarmos os verbos quebrar e cortar, como exemplos temos em (a) e (b) a composicionalidade desses verbos: (a) (b) Nas figuras acima, vemos a formação de verbos pela concatenação de raízes acategoriais com um categorizador v (vezinho). Seguindo a ideia de Marantz (1997) que argumenta que os núcleos funcionais – “v” em (a) e (b) – podem assumir diferentes valores para um único núcleo e Harley (1995) que, no mesmo sentido, atribui valores BECOME e CAUSE aos vezinhos categorizadores; a saber, quando estes não projetam argumento externo terão valor BECOME e quando projetam argumento externo terão valor CAUSE. Tentaremos, assim, postular representações 74 estruturais para os verbos médios e anticausativos, que divido em duas seções dada a maior complexidade da configuração dos verbos médios. 4.1.1 Médios Os experimentos apresentados aqui apontam para a existência de traços distintos entre verbos que alternam de valência livremente quando possuem sujeitoafetado (quebrar, rasgar, abrir, etc.) de verbos que se configuram inacusativos em contexto de restrito (cortar, limpar, cozinhar, etc.). Isso se traduz pelas diferenças significativas entre os índices de aceitabilidade e medidas de tempo de processamento das condições testadas. Assumimos que para um verbo ser considerado médio deve obrigatoriamente estar inserido em contexto de voz média, isto é, deve ter um sujeitoafetado e adjunção verbal, sendo esta adjunção essencial para gramaticalidade da sentença, como em (86): (86) O feijão cozinhou logo. (87) A tesoura cortou fácil. Para representar os verbos que podem ser configurados como médios poderíamos pensar numa derivação tal como em (88), porém se assim fosse teríamos o mesmo processo derivacional que os anticausativos. Se observarmos os dados do processamento linguístico encontrados nos nossos estudos (cf. figura 12), veremos que verbos, como quebrar e cozinhar, possuem históricos derivacionais distintos, uma vez que médios se mostraram mais custosos ao processador sintático do que anticausativos, tendo em vista os índices e medidas aqui analisados. Diante disso, não postularemos uma representação de verbos médios por acreditarmos que os dados experimentais que temos ainda não são suficientes para tal. 75 (88) O feijão cozinhou logo. Consideramos que os dados resultantes de nossos estudos podem ser uma evidência para o que muitos autores têm assumido como um “agente implícito” na grade temática dos verbos médios (middles39), uma vez que um instrumento necessita de uma entidade animada que tenha “controle” sobre ele, isto é, o que tem sido tratado de “agente implícito” poderia ser a interpretação pragmática dada à presença desses traços na composicionalidade dos verbos e as suas relações com os demais traços presentes nos argumentos que compõe uma oração. Ainda no âmbito da MD, assumimos que, em (87) o vezinho que age na computação do verbo cortar tem um valor CAUSE e que em contexto intransitivo parece se comportar como os inergativos, entretanto não estariam denotando um evento causado internamente como postulado por Levin e Rappaport- Hovav, considerando que essa seria uma propriedade inerente aos verbos inergativos. Primeiramente, ao formularmos a lógica do experimento 3, consideramos que os NPs instrumentais, como A tesoura em (87), em posição de sujeito, seriam derivados da posição de adjunto formando uma estrutura intransitiva, o que já seriam um argumento contra as propostas de Levin e Rapapport-Hovav quanto a transitivos que não “detransitivizam”. Entretanto, no avanço da pesquisa entendemos que não se podem considerar essas estruturas como médias uma vez que o sujeito não é afetado 39 Keyser e Roeper, 1984; Hale e Keyser (1993), Schäfer (2009), entre outros. 76 pelo predicador; em uma sentença como (87), o NP-sujeito infere propriedade “agentiva”, uma vez que o sujeito possui traço instrumental, facilitando o processamento da estrutura. Enquanto que em estrutura média o NP-sujeito tem propriedade de “afetado”. Além disso, entendemos que os NPs-sujeitos de sentenças, como (89)-(91), podem ser gerados na posição de argumento externo, desde que tenham traço instrumental e o que levaria o “v”, que se concatena a raiz, assumir valor CAUSE, isto é, em razão das operações realizadas entre os traços que entram na composicionalidade do verbo e do constituinte que ocupa a posição de sujeito. Nesse caso, teríamos uma estrutura intransitiva sem grande dificuldade de processamento, como mostrado por nossos resultados experimentais. (89) A tesoura cortou fácil. (90) O detergente limpou bem. (91) Essa panela cozinha bem. Em (92), observamos que a tesoura ocupa a posição de sujeito em uma oração causativa, embora não tenha volição sobre o evento e seja inanimado, então, temos o a raiz do verbo cortar se unido ao vezinho que irá assumir valor CAUSE, derivando uma sentença causativa: (92) O arquiteto disse que a tesoura cortou a cartolina muito melhor que o estilete. De fato, o que podemos concluir de nossos experimentos, sobretudo, a partir do experimento 3, é que NP-sujeito com traço instrumental facilitam o processamento das sentenças com verbos que podem formar voz média. Na literatura corrente sobre alternância causativa, esses verbos são frequentemente tratados como causativos e não sofreriam processo de “detransitivização”, nos termos de Levin e Rappaport-Hovav (2005). Contudo nossos resultados indicam que em determinados contextos esses verbos poderiam assumir a valência intransitiva por um processo semelhante a dos inergativos, desde que o NP argumento externo possua valor instrumental, assim como, a possibilidade de construções intransitiva inacusativas na voz média (Esse feijão cozinhou rápido), porém não podemos afirmar qual valor o vezinho 77 categorizador estaria assumindo nessas construções. No caso de sentenças como (89)(90), é possível que o NP argumento externo compartilhe de traços sintáticos e semânticos, que atuam na sua composicionalidade, que estariam presentes também nos traços e itens do Vocabulário envolvidos na computação dos verbos; e as relações que se estabelecem entre os traços e os itens, bem como o ambiente sintático gerado poderiam levar a atribuição do valor CAUSE ao vezinho categorizador, projetando, assim, a posição de argumento externo. Em (94), temos uma sugestão de representação estrutural dessas estruturas coma base nos experimentos realizados ao longo desse trabalho em consonância com as postulações da Morfologia Distribuída: (94) A tesoura cortou fácil. No caso de o NP animado ocupando posição de sujeito em estrutura intransitiva de verbos como cortar, limpar ou cozinhar, temos duas possibilidades: poderíamos pensar em um objeto nulo, uma vez que temos o “v” com valor CAUSE, gerando uma estrutura causativa, mas não expressa o argumento interno ou numa estrutura inergativa (A empregada limpou muito bem/ A minha mãe disse que a empregada dela limpa muito bem). Entretanto, não vou me aprofundar nessa questão, pois nosso trabalho estava focado nas propriedades que licenciam a atuação dos verbos nas duas diáteses, bem como na postulação de classes para os mesmos, e nesse momento essa questão extrapolaria nosso objetivo principal. 78 Abaixo, exemplifico alguns verbos que consideramos configurar a classe dos médios e que foram utilizados nas listas de estímulos em nossos experimentos, em anexo ao final da dissertação. (i) cortar, pintar, limpar, lavar, remover, afiar, amolar, operar, xerocar, escrever, traduzir, fotografar, tocar, colorir, derrubar, etc. 4.1.2 Anticausativos Os verbos anticausativos teriam em sua composicionalidade o categorizador “v” assumindo valor BECOME. Isto é, as relações que se estabelecem entre os traços e os itens do Vocabulário na composicionalidade dos constituintes dessas sentenças estariam atribuindo esse valor, que não licencia a projeção de argumento externo. A postulação de muitos autores para a existência de um “agente implícito” na grade temática dos verbos middles estaria atrelada a ausência do mesmo nos anticausativos (Keyser e Roeper, 1984; Hale e Keyser, 1993; Schäfer, 2009; entre outros). Nos termos dessa dissertação, isso seria a interpretação da ausência de traços específicos que geram as relações que irão atribuir um valor CAUSE ou BECOME ao “v” que entra na computação dos predicadores e que, consequentemente, irão ou não projetar argumento externo. Em (95), apresento a representação para estruturas anticausativas tendo em vista os resultados do experimento 3 diante das postulações do modelo da MD que tem se mostrado o mais favorável para garantir a idoneidade de nossos argumentos. Estruturas anticausativas são obrigatoriamente intransitivas e possuem sujeito-afetado, porém, diferentemente de estruturas médias não exigem adjunção: 79 (95) Abaixo, exemplifico alguns verbos que classificamos como anticausativos e que foram utilizados nas listas de estímulos em nossos experimentos, em anexo ao final da dissertação. (ii) abrir, fechar, molhar, furar, estragar, afundar, quebrar, apagar, entupir, derreter, ascender, azedar, arrebentar, esvaziar, rasgar, etc. 4.2 Conclusões Nesse capítulo, entretemos tentativas de propostas para as representações das estruturas argumentais dos verbos no âmbito da Morfologia Distribuída que seja harmônica com os resultados encontrados em nossos experimentos. Assumimos, assim, que a transitividade é uma propriedade relacionada à sentença, sendo determinada de acordo com o número de argumentos presentes na estrutura e não do predicador sozinho. Nessa ótica, temos, em (96)-(98), verbo anticausativo (valência intransitiva) e, em (99-101), verbo causativo (valência transitiva). (96) O copo quebrou. (97) A roupa molhou (no varal). (98) O sorvete derreteu (fora da geladeira). (99) O menino quebrou o copo. (100) A chuva molhou a roupa. 80 (101) O calor derreteu o sorvete. Tendo em vista a possibilidade de um mesmo núcleo funcional poder assumir diferentes valores, como apontado por Marantz, identificamos que em sentenças como (96) e (98), o vezinho, que compõe o verbo, assumir valor BECOME em função das operações decorrentes da sua composicionalidade juntamente com os traços que atuam na composicionalidade dos constituintes que assumirão as posições de argumentos do verbo. Assim, em orações com verbos anticausativos como O sorvete derreteu, o NP O sorvete que ocupa a posição de sujeito será gerado na posição de argumento interno, uma vez que o valor BECOME não licencia a projeção da posição de argumento externo, ou seja, os traços que estão atuando na formação do NP não estabeleceriam as mesmas relações com os traços do verbo quando essas operações levam a atribuição de valor CAUSE ao vezinho. Então, concluímos que verbos anticausativos são aqueles que se configuram em uma estrutura intransitiva com sujeito-afetado, cf. (96)-(98). Em relação a verbos como cortar, entendemos que se configuram em estruturas intransitivas em dois contextos: voz média e com sujeito-instrumento. A seguir, em (102)-(105), podemos observar essas possibilidades: (102) O cabelo cortou fácil. (103) O feijão cozinhou logo. (104) A tesoura cortou fácil. (105) A panela cozinhou bem. Em (102) e (103), temos verbos médios em estrutura intransitiva, enquanto que em (104) e (105) temos verbos causativos em estrutura intransitiva. Harley (1995,2006) e Marantz (1997), no âmbito da MD, assumem que os vezinhos categorizadores, que se concatenam as raízes na derivação de verbos, serão responsáveis pela projeção ou não da posição de argumento externo de acordo com o valor que será assumido por ele: BECOME sem projeção de argumento externo; CAUSE com projeção de argumento externo. Seguindo essa proposta, entendemos que a classificação dos verbos, de uma forma mais abrangente, está atrelada ao contexto linguístico que está inserido e o ambiente sintático que será derivado das relações dos traços que formam uma determinada estrutura. No mesmo sentido, entendemos que a 81 valência da estrutura está relacionada com o número de argumentos presentes final da derivação das sentenças. Porém, diferentemente, desses autores não estamos assumindo que haja uma forma básica derivando outra, os dados apontam para uma não direcionalidade do fenômeno, mas essa afirmação precisa ainda de mais experimentação para ser mais veementemente sustentada. A partir das sentenças em (106)-(111), tentarei explicar de uma forma mais clara o que estamos de fato sugerindo a partir das propostas de Harley e Marantz e dos nossos dados experimentais: (106) O feijão cozinhou rápido. (107) A panela cozinhou bem. (108) O copo quebrou todo. (109) O calor derreteu logo. (110) O homem cortou o cabelo. (111) O homem furou o pneu com o prego. Em (110) e (111), dizemos que a estrutura é transitiva porque apresenta dois argumentos (um argumento externo e outro interno), nesse caso o vezinho que entra na composicionalidade do verbo terá valor CAUSE projetando posição de argumento externo ocupado nas sentenças pelo NP O homem. Nas sentenças (106) e (107), temos estruturas intransitivas com apenas de um argumento na derivação das estruturas, mas em uma análise sintático-lexical mais fina vemos que esses verbos apresentam especificidades em relação aos traços que entram na composicionalidade da derivação das estruturas, como podemos concluir a partir dos resultados obtidos no experimento 3, relatado no capítulo anterior. Em (106), temos um verbo médio de acordo com o que já foi estabelecido anteriormente, estrutura com sujeito-afetado exigindo adjunção para ser gramatical. Em (107), temos as relações, entre os traços dos elementos que entram na composicionalidade da sentença, levando ao categorizador vº assumir valor CAUSE, pois nesse caso o traço instrumental licencia que o constituinte A panela ocupe a posição de argumento externo, projetada pelo verbo leve, nesse caso assumo que o verbo causativo está configurado na valência intransitiva, não envolvendo uma derivação sintática mais complexa como no caso dos médios. Em (108) e (109), nos referimos aos verbos como anticausativos em uma estrutura intransitiva, naturalmente, 82 considerando que apresentam apenas um argumento. Nesse caso, na derivação da sentença o sujeito é o argumento interno deslocado, uma vez que o vº categorizador que atua na concatenação de [√QUEBR + v] assume valor BECOME. É importante deixar claro que os verbos anticausativos e médios também diferem em relação ao contexto em que o uso intransitivo é possível: enquanto, os médios precisam ser inseridos em contexto de voz média para serem licenciados na valência intransitiva, os anticausativos não. As sentenças como (81), onde o verbo anticausativo é expresso com o sujeito-causa que, no experimento 3, foram significativamente mais rejeitadas, mas na implementação desse experimento assumimos que não admitiriam sujeito com esse valor causa em uma valência intransitiva. Porém, em algumas sentenças, como em (109) tem sua gramaticalidade questionada, diante disso não postularemos classificações para os verbos dessas estruturas. Diante da possibilidade de o verbo como quebrar licenciar um sujeitocausa numa valência intransitiva, o processo parece ser similar ao que licencia os sujeitos com valor instrumental nos verbos como cortar, quando possuem o vº categorizador com valor CAUSE projetando argumento externo. Contudo, essa afirmação precisa de mais experimentação para que tenha uma postulação mais acurada, tendo em vista os resultados do experimento 3, como vimos no capítulo anterior. No mesmo sentido que é necessário verificar mais profundamente a natureza do movimento sintático sofrido pelos NPs. No caso do vº assumir valor BECOME o movimento sintático parece conferir maior complexidade de processamento do que quando o valor CAUSE é assumido pelo vº onde o NP não está sendo deslocado de dentro do √P.40 40 No âmbito da Teoria-X’, poderíamos pensar em oposição de movimento-A versus movimento A’. O primeiro se refere ao deslocamento de constituintes em posições argumentais e o segundo ao movimento sintático de constituintes em posições não argumentais. Com isso, teríamos em O copo quebrou um movimento-A e em A tesoura cortou fácil movimento-A’, porém essas duas condições não demonstraram diferenças significativas na análise de nossos experimentos, e se assumirmos esses movimentos em nossas análises, também teríamos que considerar uma direcionalidade para o fenômeno da alternância de transitividade, o que não achamos prudente fazer em razão da insuficiência de dados empíricos. 83 CAPÍTULO 5: CONCLUSÃO Esse trabalho teve como objetivo central a postulação de classes para os verbos atuantes na alternância causativa, buscando subsídios em aportes de experimentos psicolinguísticos. Ao final desse estudo chegamos à denominação de médios e anticausativos, quando os verbos inacusativos alternantes se encontram na diátese intransitiva. No capítulo 1, faço uma introdução sobre o fenômeno da alternância de transitividade, explicitando que esse é um tema que suscita grande divergência entre duas importantes abordagens no âmbito da Gramática Gerativa: lexicalistas e construcionistas. Faço também um breve resumo da teoria da Morfologia Distribuída, uma vez que seguimos esse modelo para validar as representações encontradas nesse texto. No capítulo 2, apresento alguns trabalhos das correntes gerativistas que se ocupam de estudos de natureza argumental, com foco na alternância causativa, mostrando as principais postulações desses trabalhos que serviram de fundamentação teórica para a implementação e realização dos experimentos apresentados no capítulo 3. Esse capítulo demonstra a real complexidade da forma inacusativa (voz média) creditada pelos dados obtidos a partir dos experimentos 1 e 2, onde a condição voz média apresentava sujeito derivado de movimento sintático em contraposição as condições transitiva animada e transitiva inanimada, que não apresentam o mesmo processo derivacional. Ainda no capítulo 3, foi apresentado o experimento que propiciou a postulação das classes de médios e anticausativos pela comparação de sentenças contendo verbos com sujeito com valor instrumental que atuou como facilitador do processamento da condição com verbos médios com sujeitoinstrumental- MAd, que inicialmente acreditávamos ser gerada pela extração de adjunto, em contraposição as condições que apresentavam sujeito derivado da posição de argumento interno, configurando os médios com sujeito-afetado- MAg e anticausativos com sujeito-afetado– AAg. Na análise dos dados obtidos a partir desse último experimento, entendemos que os médios só podem assim serem denominados em contexto de voz média, isto é, sujeito afetado e adjunção verbal, ou seja, a condição MAd não configura verbo médio e sim causativo em estrutura intransitiva como visto no capítulo anterior. Verificamos ainda que as sentenças com verbos 84 médios com sujeito-afetado -MAg- apresentavam índices de rejeição maiores do que a condição com verbos anticausativos com sujeito-afetado- AAg, embora ambos tenham sujeito derivado da posição de argumento interno. No capítulo 4, apresento uma proposta de representação para os verbos que atuam na alternância de transitividade, seguindo as propostas de Harley (1995) e Marantz (1997). Assumo que categorizador (vº) com valor BECOME, ao não projetar argumento externo, atua na configuração estrutural dos verbos quando estes se configuram anticausativos. Na configuração de verbos médios não achamos que os dados pudessem ser suficientes para a postulação de uma representação estrutural diante das divergências de processamento encontrada a partir do experimento 3, em relação à condição de anticausativos. Considerando que essa condição também apresenta sujeito derivado da posição de argumento interno, porém não apresenta o mesmo nível de complexidade de verbos médios. A atribuição de valor CAUSE ao categorizador vezinho, que projeta argumento externo, estaria atuando na configuração de sentenças com verbos causativos como A tesoura cortou fácil, tal como os inergativos. Os dados e as análises subsequentes encontradas nesse estudo indicam que o fenômeno da alternância causativa não teria uma direcionalidade, ou seja, não haveria uma forma básica derivando outra como muitos autores assumem. As formas seriam derivadas a partir do valor atribuído ao vezinho em razão das relações estabelecidas pelos traços e itens de Vocabulário que entram na computação das sentenças. Entretanto, reconhecemos a necessidade de mais experimentação para que possamos reforçar nossas postulações em decorrência das lacunas apontadas pelos diferentes índices de aceitabilidades obtidos a partir do experimento 3. Assumimos, assim, que o categorizador “v” irá ou não projetar a posição de argumento externo, dependendo do valor que irá adquirir ao longo da derivação dos verbos que atuam tanto na valência transitiva quanto na intransitiva, com isso, o valor assumido pelo vezinho acarretaria um custo maior ou menor ao processador sintático. Entretanto, não podemos deixar de comentar que a natureza dessas relações ainda precisa ser investigada mais a fundo para que possamos entender as especificidades que compõem os mecanismos da linguagem humana. De qualquer forma, acreditamos que esse trabalho contribui para demonstrar o potencial da pesquisa na interface da Psicolinguística e da Sintaxe experimentais no que se refere ao estudo da estrutura 85 argumental dos verbos, da mesma forma que favorece o estreitamento do diálogo entre as diferentes subáreas que se ocupam de teorias linguísticas. 86 REFERÊNCIAS ALEXIADOU, A., ANAGNOSTOPOULOU, E. & SCHÄFER, F. (2006) The properties of anticausatives crosslinguistically. in M. Frascarelli (ed.) Phases of Interpretation, Berlin: Mouton de Gruyter, 187-211. BAKER, M. (1983). Objects, themes, and lexical rules in Italian. In Papers in Lexical functional grammar, ed. L. Levin, M. Rappaport-Hovav and A. Zaenen, 146.Bloomington: Indiana University Linguistics Club. BAKER, M. (1988). Incorporation. Chicago: The University of Chicago Press. BURZIO, L. (1981). Intransitive verbs and Italian auxiliaries. Tese de doutorado, Boston: MIT. CAMACHO, R. (2003). 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Lista do Experimento 1 Voz Média 1) Este livro vende bem. 2) Esse papel gruda muito. 3) Esse assado corta suavemente. 4) Essa guitarra toca perfeitamente. 5) Essa batata descasca facilmente. 6) Esse azulejo limpa perfeitamente. 7) Esse feijão cozinha bem. 8) Esse muro pinta facilmente. 9) Esse piso varre bem. 10) Essa casa queima logo. 11) Essa casa aluga bem. 12) Esse texto traduz logo. 13) Essa paisagem fotografa facilmente. 14) A roupa muda sempre. 15) Essa blusa costura rapidamente. Transitiva animado 1) Este homem vende bem. 2) A menina gruda muito. 3) O cozinheiro corta suavemente. 4) O pianista toca perfeitamente. 5) O cozinheiro descasca facilmente. 6) O funcionário limpa perfeitamente. 7) Essa moça cozinha bem. 8) Esse homem pinta facilmente. 9) Essa moça varre bem. 10) O homem queima logo. 11) A senhora aluga bem. 12) O professor traduz logo. 13) Essa menina fotografa facilmente. 14) A moça muda sempre. 15) A moça costura rapidamente. Transitivo Inanimado 1) Esta loja vende bem. 2) O chiclete gruda muito. 3) A lâmina corta suavemente. 4) Essa vitrola toca perfeitamente. 5) O aparelho descasca facilmente. 6) O detergente limpa perfeitamente. 7) Esse fogão cozinha bem. 8) Esse pincel pinta facilmente. 9) A vassoura varre bem. 10) A tocha queima logo. 11) A empresa aluga bem. 12) O programa traduz logo. 13) Essa máquina fotografa facilmente. 14) O clima muda sempre. 15) Essa máquina costura rapidamente. 91 2. Lista do experiment 2 Médios 1) Ouvi dizer que essa loja está sempre vazia, / mas esse livro vende bem/ o ano inteiro. Transitivo Animado 1) A loja não faturou muito, / mas esse homem vende bem/ como me disseram. Transitivo Inanimado 1) As vendas caíram esse mês, / mas essa loja vende bem/ para surprese de todos. - Este livro vende muito? S ou N 2) Cuidado com a cola, /pois esse papel gruda muito/ como avisou a professora. -O homem sabe vender? S ou N 2) O garoto está feliz com o namoro/, mas a menina gruda muito/ como me contaram. S ou N 2) Fizeram de tudo para limpar o chão/, mas o chiclete gruda muito/ deixando a mãe irritada. - O papel gruda muito? -A menina é grudenta? -O chiclete grudou no chão? S ou N 3) As facas não estavam amoladas, / mas o assado corta suavemente/ como todos viram. S ou N 3) Todos achavam que a carne estava dura, / mas o cozinheiro corta suavemente/ como todos viram. S ou N 3) O assado não ficou muito macio, /mas a lâmina corta suavemente/ para a alegria de todos. -A loja vende muito? -O assado estava macio?S ou N -O cozinheiro cortou a carne?S ou N -A lâmina estava amolada? S ou N 4) Todos os instrumentos são muito antigos, / mas essa guitarra toca perfeitamente/ disse o vendedor. 4) Os músicos pareciam desafinados, / mas o pianista toca perfeitamente/ como ouvi no concerto. 4) As peças do brechó estavam em péssimo estado, / mas essa vitrola toca perfeitamente/ como pude observar. -A guitarra está funcionando?S ou N -O pianista toca bem? S ou N -A vitrola está funcionando?S ou N 5) Os legumes estavam um pouco velhos, / mas essa batata descasca facilmente/ disse o moço na feira. 5) O assistente tem dificuldades com os legumes, / mas o cozinheiro descasca facilmente/ o que agilizou o almoço. 5) Os legumes sempre estão ruins, / mas o aparelho descasca facilmente/ o que agilizou o almoço. -É fácil descascar essa batata?S ou N 6) O detergente sempre -O cozinheiro é habilidoso para descascar?S ou N 6) As crianças sujam -É fácil descascar com esse aparelho?S ou N 6) A louça do almoço ficou 92 acaba antes de a faxina terminar, / mas o azulejo limpa perfeitamente/ deixando a faxina mais rápida. - O azulejo fica limpo?S ou N 7) Os grãos estavam velhos, /mas esse feijão cozinha bem/ disse o vendedor. muito o pátio da escola, / mas o funcionário limpa perfeitamente/ deixando como a diretora pediu. -O funcionário é eficiente?S ou N muito suja, / mas o detergente limpa perfeitamente/ ajudando na faxina. -O detergente é muito bom? S ou N 7) Os empregados da mansão são pouco eficientes, / mas essa moça cozinha bem/ como me disseram. 7) O almoço de Natal estava atrasado, / mas esse fogão cozinha bem/ deixando todos mais calmos. -O feijão cozinha bem? S ou N -A moça sabe cozinhar? S ou N 8) A tinta que você 8) A reforma da casa comprou está muito acabou logo, / pois esse grossa, / mas esse muro homem pinta facilmente/ pinta facilmente/ o que como me disseram. facilita a reforma. -O homem sabe pintar? S - É fácil pintar o muro? S ou N ou N 9) Entrou muita poeira 9) Os empregados em casa depois da demoram a terminar o ventania, / mas esse piso serviço de casa, / mas varre bem / deixando essa moça varre bem / como antes. como me disseram. -Esse fogão é excelente? S ou N - É fácil varrer o piso? - A moça sabe varrer? S ou N 10) Os bombeiros não demoraram a chegar, / mas a casa queimou logo/ para desespero dos donos. S ou N 10) A mulher estava fazendo um ótimo churrasco, / mas o homem queimou logo/ deixando todos com fome. 8) A superfície da tela estava desgastada, / mas esse pincel pinta facilmente/ o que ajuda na restauração. - Esse pincel bom? S ou N 9) O chão estava sujo de terra, /mas a vassoura varre bem/ agilizando a limpeza. - A vassoura é boa? S ou N 10) A festa junina estava ótima, /mas a tocha queimou logo/ como sempre acontece. -A tocha apagou? S ou N -A casa pegou fogo? S ou N -O homem queimou o churrasco? S ou N 11) A vizinhança é muito 11) Ninguém achava perigosa, /mas essa casa bons imóveis alugou bem/ para a disponíveis, / mas a surpresa de todos. senhora alugou bem/ para surpresa de todos. -Conseguiram alugar a 11) Os diretores estavam preocupados com as finanças, / mas a empresa alugou bem/ deixando todos aliviados. -A empresa conseguiu um 93 casa? S ou N bom aluguel? S ou N 12) O assunto era muito complicado para essa série, / mas esse texto traduz logo/ o que ajudou os alunos. -A senhora fez um bom aluguel? S ou N 12) Os alunos não entendem os textos em Inglês, / mas o professor traduz logo/ ajudando os alunos. -O texto traduz o assunto? - O professor traduz rapidamente? -O programa é bom? S ou N 13) A neblina dificulta a visibilidade, /mas essa paisagem fotografa facilmente/ deixando todos calmos. S ou N 13) Os alunos do curso não eram muito aplicados, / mas essa menina fotografa facilmente/ para alegria do professor. 12) A aluna estava preocupada com o trabalho de Inglês, /mas o programa traduz logo/ ajudando no trabelho. S ou N -É fácil fotografar a paisagem? S ou N 14) As modelos são as mesmas, / mas a roupa muda sempre/ como sempre ouvi dizer. -A roupa sempre muda? S ou N -A menina sabe fotografar? S ou N 14) A mãe insistia para que a filha não saísse do emprego, /mas a moça muda sempre/ como me disseram. 15) A mulher ficou com a roupa rasgada, / mas essa blusa costura rapidamente / disse a vendedora. - A moça muda muito? S ou N 15) O enxoval do casamento estava atrasado, /mas a moça costura rapidamente/ como me disseram. -É fácil costurar essa blusa? S ou N - A moça sabe costurara? S ou N 13) A chuva dificultava as imagens externas, /mas essa máquina fotografa facilmente/ para a alegria de todos. -A máquina funciona bem? S ou N 14) Todos acharam que não precisavam levar casaco para praia, / mas o clima muda sempre/ como foi avisado. - O clima muda muito? S ou N 15) O vestido da noiva ainda não estava pronto, / mas essa máquina costura rapidamente/ deixando todos mais calmos. -Essa máquina é boa? S ou N 94 3. Lista do experimento 3 MAg MAd 1. O cabelo cortou fácil. 1. A tesoura cortou fácil. 2. A parede pintou mal. 2. 3. O ladrilho limpou mal. 3. Esse pano limpou bem. 4. A roupa lavou fácil. 4. O sabão lavou fácil. 5. O esmalte removeu fácil. 5. A aguarrás removeu fácil. 6. O facão afiou logo. 6. A chaira afiou logo. 7. A tesoura amolou bem. 7. Essa chaira amolou mal. 8. A perna depilou fácil. 8. A cera depilou fácil. 9. O paredão derrubou logo. 9. A marreta derrubou fácil. 10. Esse desenho coloriu bem. 10. A canetinha coloriu bem. 11. A guitarra tocou mal. 11. A vitrola tocou bem. 12. Esse vídeo gravou fácil. 12. A câmera gravou fácil. 13. A paisagem fotografou mal. 13. A máquina fotografou longe. 14. O terreno adubou fácil. 14. O esterco adubou muito. 15. O prédio demoliu rápido. 15. O trator demoliu rápido. 16. O nariz operou fácil. 16. A pinça operou fácil. 17. Esse piso encerou rápido. 17. A máquina encerou rápido. 18. O artigo xerocou rápido. 18. A máquina xerocou rápido. 19. Esse texto traduziu logo. 19. O programa traduziu bem 20. O trabalho escreveu rápido. 20. Essa caneta escreveu bastante. AAg Essa tinta pintou bem. AAd 1. A porteira abriu fácil. 1. A ventania abriu fácil. 2. A janela fechou mal. 2. O vento fechou bem. 3. O vestido molhou bem. 3. Essa chuva molhou bem. 4. O pneu furou logo. 4. O prego furou mal. 5. A fogueira apagou logo. 5. O vendaval apagou logo. 6. O feijão azedou logo. 6. O calor azedou logo. 7. Esse ralo entupiu bem. 7. O cabelo entupiu bem. 8. O gelo derreteu logo. 8. O calor derreteu muito 95 9. A fogueira ascendeu logo. 9. O álcool ascendeu logo. 10. Esse vestido desbotou bem. 10. A lavagem desbotou muito. 11. O casaco secou mal. 11. Esse vento secou bem. 12. O vestido rasgou fácil. 12. Essa queda rasgou muito. 13. Essa rede arrebentou logo. 13. Esse peso arrebentou logo. 14. A piscina esvaziou logo. 14. Essa bomba esvaziou fácil. 15. A ponte balançou bastante. 15. O vento balançou bastante. 16. A fruta estragou logo. 16. O calor estragou logo. 17. Esse navio afundou rápido. 17. Essa onda afundou rápido. 18. Esse quadro arranhou bastante. 18. A mudança arranhou bastante. 19. A madeira empenou muito. 19. Essa chuva empenou muito. 20. A empresa arruinou rápido. 20. Essa fraude arruinou rápido.