O COMPROMISSO DA CIDADE DO CABO UMA DECLARAÇÃO DE FÉ E UM CHAMADO PARA AGIR Cidade do Cabo 2010 Terceiro Congresso de Lausanne sobre Evangelização Mundial 16 a 25 de outubro de 2010 SUMÁRIO PREFÁCIO INTRODUÇÃO PARTE 1 – PARA O SENHOR QUE AMAMOS: O NOSSO COMPROMISSO DE FÉ 1. NÓS AMAMOS PORQUE DEUS NOS AMOU PRIMEIRO 2. NÓS AMAMOS AO DEUS VIVO 3. NÓS AMAMOS AO DEUS PAI 4. NÓS AMAMOS AO DEUS FILHO 5. NÓS AMAMOS AO DEUS ESPÍRITO SANTO 6. NÓS AMAMOS A PALAVRA DE DEUS 7. NÓS AMAMOS O MUNDO DE DEUS 8. NÓS AMAMOS O EVANGELHO DE DEUS 9. NÓS AMAMOS O POVO DE DEUS 10. NÓS AMAMOS A MISSÃO DE DEUS PARTE 2 - PARA O MUNDO QUE SERVIMOS: O CHAMADO À AÇÃO DA CIDADE DO CABO INTRODUÇÃO IIA TESTEMUNHANDO A VERDADE DE CRISTO EM UM MUNDO GLOBALIZADO E PLURALISTA IIB CONSTRUINDO A PAZ DE CRISTO EM NOSSO MUNDO DIVIDIDO E FERIDO IIC VIVENDO O AMOR DE CRISTO ENTRE PESSOAS DE OUTRAS CRENÇAS IID DISCERNINDO A VONTADE DE CRISTO PARA A EVANGELIZAÇÃO MUNDIAL IIE CHAMANDO A IGREJA DE CRISTO DE VOLTA À HUMILDADE, À INTEGRIDADE E À SIMPLICIDADE IIF FORMANDO PARCERIAS NO CORPO DE CRISTO PELA UNIDADE EM MISSÕES CONCLUSÃO 1 PREFÁCIO O Terceiro Congresso Lausanne sobre Evangelização Mundial (Cidade do Cabo, 16-25 de outubro de 2010) reuniu 4.200 líderes evangélicos de 198 países e se estendeu a outras centenas de milhares de líderes que participaram de reuniões, locais e online, realizadas em todo o mundo. Seu objetivo? Trazer um novo desafio à Igreja global a fim de que ela testemunhe de Jesus e de todo o seu ensinamento, em todas as nações, em todas as esferas da sociedade e em todos os campos de reflexão. O Compromisso da Cidade do Cabo é fruto desse esforço. Ele se posiciona em uma linha histórica, tendo como base tanto o Pacto de Lausanne quanto o Manifesto de Manila. Está dividido em duas partes. A Parte I estabelece as convicções bíblicas, transmitidas a nós nas escrituras, e a Parte II ecoa o chamado para ação. Como a Parte I tomou forma? Ela foi discutida pela primeira vez em Minneapolis, em dezembro de 2009, num encontro entre 18 teólogos e líderes evangélicos trazidos de todos os continentes. Um grupo menor, liderado por Dr. Christopher J H Wright, presidente do Grupo de Trabalho Teológico Lausanne, foi convidado para elaborar o documento final, a ser apresentado ao Congresso. Como a Parte II tomou forma? Um extenso processo de pesquisa iniciou-se pouco mais de três anos antes do Congresso. Cada um dos Diretores Internacionais do Movimento Lausanne organizou consultas em suas regiões, nas quais foi solicitado aos líderes cristãos que identificassem os principais desafios enfrentados pela Igreja. Seis questões principais surgiram. Essas questões (i) definiram a programação do Congresso e (ii) deram forma à estrutura do chamado à ação. Este processo de pesquisa prosseguiu durante o Congresso, enquanto Chris Wright e o Grupo de Trabalho da Declaração trabalhavam para registrar fielmente todas as contribuições. Um esforço hercúleo e monumental. O Compromisso da Cidade do Cabo atuará como um roteiro para o Movimento Lausanne durante os próximos dez anos. Esperamos que o seu chamado profético para o trabalho e para a oração leve igrejas, agências missionárias, cristãos em seus locais de trabalho e alianças estudantis em universidades a abraçar o chamado e a encontrar o seu papel neste trabalho. Muitas declarações doutrinais afirmam o que a Igreja acredita. Gostaríamos de ir além e unir crença e prática. O modelo que usamos foi o do Apóstolo Paulo, cujo ensinamento teológico foi substanciado em instruções práticas. Por exemplo, em Colossenses, sua profunda e maravilhosa representação da supremacia de Cristo resulta num ensinamento prático do que significa estar enraizado em Cristo. Podemos distinguir entre o que está no cerne do evangelho cristão, ou seja, as verdades básicas sobre as quais devemos estar unidos, e as questões secundárias, onde há divergência entre 2 cristãos sinceros no que se refere à interpretação do que a Bíblia ensina ou exige. Trabalhamos aqui para formular o princípio Lausanne de “liberdade dentro dos limites” e na Parte I esses limites estão claramente definidos. Durante todo este processo, tivemos o prazer de trabalhar em conjunto com a Aliança Evangélica Mundial. Os líderes da AEM estão de pleno acordo tanto com a Confissão de Fé quanto com o Chamado à Ação. Embora falemos e escrevamos a partir da tradição evangélica dentro do Movimento Lausanne, afirmamos a unidade do Corpo de Cristo e de bom grado reconhecemos a existência de muitos outros seguidores do Senhor Jesus Cristo no contexto de outras tradições. Na Cidade do Cabo, recebemos com alegria representantes respeitados de igrejas históricas de outras tradições, ali presentes no papel de observadores, e confiamos que o Compromisso da Cidade do Cabo seja útil para igrejas de todas as tradições. Nós o oferecemos em espírito de humildade. Qual é a nossa expectativa em relação ao Compromisso da Cidade do Cabo? Cremos que ele será comentado, discutido e valorizado como uma afirmação uníssona dos evangélicos em todo o mundo; que definirá pautas no ministério cristão; que fortalecerá formadores de opinião na arena pública; e que iniciativas e parcerias arrojadas surgirão a partir dele. Que a Palavra de Deus ilumine nosso caminho e que a graça do nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com cada um de nós. S Douglas Birdsall Presidente Executivo Lindsay Brown Diretor Internacional 3 O COMPROMISSO DA CIDADE DO CABO INTRODUÇÃO Como membros da igreja mundial de Jesus Cristo, com alegria firmamos nosso compromisso com o Deus vivo e com os Seus propósitos de salvação através do Senhor Jesus Cristo. Por Ele renovamos nosso compromisso com a visão e os objetivos do Movimento Lausanne. Isto envolve dois pontos: Primeiro: mantemos nosso compromisso com a tarefa de testemunhar de Jesus Cristo e dos seus ensinamentos em todo o mundo. O Primeiro Congresso Lausanne (1974) foi realizado visando à tarefa da evangelização mundial. Alguns dos principais benefícios deste congresso para a Igreja mundial foram: O Pacto de Lausanne; uma nova consciência do número de grupos de povos não alcançados; e uma nova descoberta da natureza holística do evangelho bíblico e da missão cristã. O Segundo Congresso Lausanne, em Manila (1989), deu origem a mais de 300 parcerias na evangelização mundial, muitas das quais envolveram co-operação entre nações de todas as partes do globo. Segundo: mantemos nosso compromisso com os principais documentos do Movimento – O Pacto de Lausanne (1974) e O Manifesto de Manila (1989). Estes documentos expressam de maneira clara verdades básicas do evangelho bíblico e as aplicam à nossa missão prática de formas ainda relevantes e desafiadoras. Confessamos que não temos sido fiéis aos compromissos assumidos com esses documentos. Mas nós os reafirmamos e os legitimamos, ao mesmo tempo em que procuramos discernir como expressar e aplicar a verdade eterna do evangelho no mundo da nossa geração, mundo este em constante mudança. AS REALIDADES DAS MUDANÇAS Praticamente todos os aspectos referentes à maneira como vivemos, pensamos e nos relacionamos uns com os outros estão se transformando em ritmo acelerado. Positivo ou negativo, sentimos o impacto da globalização, da revolução digital e da alteração no equilíbrio do poder econômico e político do mundo. Algumas situações que enfrentamos nos trazem tristeza e ansiedade: a pobreza global, a guerra, a doença, a crise do meio ambiente e a mudança climática. Mas uma grande mudança em nosso mundo é motivo de alegria: o crescimento da igreja global de Cristo. O fato de o Terceiro Congresso Lausanne ser realizado na África é prova disto. Pelo menos três quartos de todos os cristãos do mundo vivem hoje em continentes do sul e leste do globo. A composição de nosso Congresso Cidade do Cabo 2010 reflete a significativa transição ocorrida no mundo cristão durante o último século, desde a Conferência Missionária de Edimburgo em 1910. Alegramo-nos com o incrível crescimento da igreja na África e com o fato de que nossos irmãos e irmãs em Cristo, africanos sejam os anfitriões deste Congresso. Devemos responder às realidades de nossa própria geração através da missão cristã. Devemos também aprender com a combinação entre sabedoria e erros que herdamos das gerações anteriores. Nós honramos o passado e nos engajamos com o futuro. REALIDADES INALTERADAS Mas em nosso mundo em constante mudança algumas coisas se mantêm inalteradas. Estas 4 importantes verdades oferecem a lógica bíblica para nosso engajamento missional. Os seres humanos estão perdidos. A condição básica do ser humano permanece a mesma que foi descrita na Bíblia: estamos em pecado e rebelião, sob o justo julgamento de Deus e, sem Cristo, não temos esperança. O Evangelho é a boa nova. O Evangelho não é um conceito que precisa de idéias renovadas, mas uma história que precisa ser contada de uma nova maneira. É a história inalterada do que Deus fez para salvar o mundo, essencialmente nos eventos históricos da vida, morte, ressurreição e reino de Jesus Cristo. Em Cristo há esperança. A missão da igreja continua. A missão de Deus continua até os confins da terra e até o fim do mundo. Chegará o dia quando os reinos do mundo se tornarão o reino do nosso Deus e de Seu Cristo e Deus habitará com Sua humanidade redimida na nova criação. Até aquele dia, a participação da igreja na missão de Deus continua, em um alegre ritmo de urgência, e com oportunidades novas e empolgantes em cada geração, inclusive na nossa. A PAIXÃO DO NOSSO AMOR expressão do amor redentor de Deus e da graça que alcança a humanidade perdida e a criação deteriorada. Em troca, elas pedem o nosso amor. O nosso amor se manifesta através da confiança, obediência e do compromisso apaixonado com a aliança do Senhor. O Pacto de Lausanne definiu a evangelização desta forma “toda a igreja levando todo o Evangelho para todo o mundo”. Esta continua sendo nossa paixão. Por isso, renovamos esta aliança reafirmando: Nosso amor por todo o evangelho, como a boa nova gloriosa de Deus em Cristo, para todas as dimensões da sua criação, que tem sido assolada pelo pecado e pelo mal. Nosso amor por toda a igreja, como povo de Deus redimido por Cristo de todas as nações da terra e de todas as eras da história, para partilhar a missão de Deus nesta era e glorificá-lo para sempre nas eras que virão. Nosso amor por todo o mundo, tão longe de Deus, mas tão perto do seu coração, o mundo que Deus tanto amou que deu o Seu único Filho pela sua salvação. Mantendo firme este amor de três dobras, renovamos nosso compromisso de ser toda a igreja, de crer, obedecer e partilhar todo o Evangelho, e de ir por todo o mundo para fazer discípulos de todas as nações Esta Declaração foi firmada na linguagem do amor. O amor é a linguagem da aliança. As alianças bíblicas, antigas e novas, são a 5 PARA O SENHOR QUE AMAMOS: NOSSO COMPROMISSO DE FÉ PRIMEIRA PARTE 1. NÓS AMAMOS PORQUE DEUS NOS AMOU PRIMEIRO A missão de Deus flui do amor de Deus. A missão do povo de Deus flui do nosso amor a Deus e a tudo que Deus ama. A evangelização mundial é o fluir do amor de Deus para nós e através de nós. Nós afirmamos a primazia da graça de Deus e respondemos a esta graça pela fé, demonstrada através da obediência em amor. Nós amamos porque Deus nos amou primeiro e enviou Seu Filho para ser propiciação pelos nossos pecados1. a) O amor a Deus e o amor ao próximo constitui o primeiro e maior mandamento no qual residem toda a lei e os profetas. O amor é o cumprimento da lei, é o primeiro fruto do Espírito mencionado. O amor é a evidência do novo nascimento, a certeza de que conhecemos a Deus; e a prova de que Deus habita em nós. O amor é o novo mandamento de Cristo, o qual disse aos Seus discípulos que somente ao obedecerem este mandamento, a missão deles seria visível e crível. O amor cristão de um para com os outros é como o Deus invisível, o qual Se fez visível através do Seu Filho encarnado, continua fazendo-se visível ao mundo. O amor estava entre as primeiras observações e recomendações de Paulo para os novos convertidos, acompanhado da fé e da esperança. Mas o amor é o maior, pois o amor nunca acaba2. [2] 1 Gl 5:6; Jo 14:21; 1Jo 4:9, 19. Mt 22:37-40; Rm 13:8-10; Gl 5:22; 1Pe 1:22; 1Jo 3:14; 4:7-21; Jo 13:34-35; Jo 1:18 + 1Jo 4:12; 1Ts 1:3; 1 Cor. 13:8, 13. 2 b) Tal amor não é fraco nem sentimental. O amor do próprio Deus é um amor de aliança fiel, comprometido, que se doa, é sacrificial, forte e santo. Como Deus é amor, o amor permeia todo o seu ser e todas suas ações, sua justiça bem como sua compaixão. O amor de Deus se estende para toda Sua criação. Temos o mandamento para amar de modo a refletir o amor de Deus em todas estas dimensões. É isto que significa andar no caminho do Senhor3. c) Portanto, ao firmamos nossas convicções e nosso compromisso em termos de amor, estamos assumindo o desafio mais básico e difícil de todos os desafios bíblicos: amar ao Senhor nosso Deus de todo nosso coração, alma, mente e força; amar ao nosso próximo (incluindo o estrangeiro e o inimigo) como a nós mesmos; amar uns aos outros, como Deus em Cristo nos amou e; amar ao mundo com o amor daquele que deu seu único Filho para que o mundo através dele pudesse ser salvo4. d) Tal amor é o dom de Deus derramado em nossos corações, e ao mesmo tempo é o mandamento de Deus que requer rendição de nossa vontade. Tal amor significa ser como o próprio Cristo: firme na perseverança mas gentil na humildade; duro na resistência ao mal mas 3 Dt 7:7-9; Os 2:19-20; 11:1; Sl 103; 145:9, 13, 17; Gl 2:20; Dt 10:12-19. 4 Dt 6:4-5; Mt 22:37; Lv 19: 18, 34; Mt 5:43-45; Jo 15:12; Ef 4:32; Jo 3:16-17. 6 terno na compaixão pelo sofredor; corajoso no sofrimento e fiel até a morte. Tal amor foi exemplificado por Cristo na terra e é monitorado pelo Cristo ressurreto em glória5. Afirmamos que este amor bíblico tão abrangente deve ser a identidade nítida e a marca dos discípulos de Jesus. Em resposta à oração e ao mandamento de Jesus, esperamos que seja assim conosco. Infelizmente, confessamos que com frequência não o é. Por isso, renovamos nosso compromisso de aplicar todo o nosso esforço para viver, pensar, falar e agir de maneira que expressemos o que significa andar em amor, amar a Deus, amar uns aos outros e amar o mundo. 2. NÓS AMAMOS AO DEUS VIVO O nosso Deus, a quem amamos, revela-se na Bíblia como o único Deus vivo e eterno, que governa todas as coisas de acordo com sua soberana vontade, visando o seu propósito salvador. Na unidade do Pai, Filho e Espírito Santo, somente Deus é o Criador, Soberano, Juiz e Salvador do mundo6 . Por isso, amamos nosso Deus com alegres ações de graças pelo nosso lugar na criação, em submissão à sua soberana providência, com confiança na sua justiça e com louvores eternos pela salvação que ele conquistou para nós. a) Nós amamos a Deus acima de todos os rivais. Recebemos o mandamento de amar e adorar somente ao Deus vivo. Mas, assim como fez Israel no Novo Testamento, permitimos que nosso amor a Deus seja adulterado ao buscarmos os deuses deste mundo, os deuses dos povos que estão ao nosso redor7. Caímos no sincretismo, seduzidos pelos ídolos da ganância, do poder e do sucesso, servindo a Mamom em lugar de servir a Deus. Aceitamos o domínio de 5 Rm 5:5; 2Co 5:14; Ap 2:4. Dt 4:35, 39;Sl 33:6-9; Jr 10:10-12; Dt 10:14; Is 40:22-24;Sl 33:10-11, 13-15;Sl 96:10-13;Sl 36:6; Is 45:22. 7 Dt 4 e 6. 6 ideologias políticas e econômicas sem uma visão bíblica crítica. Somos tentados a fazer concessões à nossa convicção da singularidade de Cristo diante da pressão do pluralismo religioso. Como Israel, precisamos ouvir o chamado dos profetas e do próprio Jesus ao arrependimento e abandonar estes rivais e retornar ao amor obediente e à adoração unicamente a Deus. b) Nós amamos a Deus com paixão pela sua glória. A maior motivação para cumprirmos a nossa missão é a mesma que impulsiona a missão do próprio Deus – que o único Deus vivo seja conhecido e glorificado por toda criação. Este é o objetivo principal de Deus e deve ser a nossa maior alegria. “Se Deus deseja que todo joelho se dobre a Jesus e que toda língua o confesse, então é isto o que devemos fazer. Devemos ter “ciúmes”, como vemos às vezes nas Escrituras, pela honra do seu nome, nos perturbar se ele permanece desconhecido, sentir-nos feridos se for ignorado, indignados se for blasfemado e estar constantemente ansiosos e determinados a que lhe sejam dadas honra e glória que lhe são devidas. O mais elevado de todos os motivos missionários não é a obediência à Grande Comissão, mesmo importante como é, nem o amor pelos pecadores que estão alienados e perecendo (mesmo que este seja um incentivo muito forte, principalmente quando contemplamos a ira de Deus), mas o zelo verdadeiro, zelo apaixonado e consumidor pela glória de Jesus Cristo … Diante deste supremo objetivo da missão cristã, todas as outras motivações indignas definham e morrem.”8(John Stott) O motivo da nossa maior tristeza deve ser porque em nosso mundo o Deus vivo não é 8 John Stott, The Message of Romans, The Bible Speaks Today (Leicester and Downers Grove: Intervarsity Press) (tradução livre do inglês para o português do texto citado. No Brasil, A Mensagem de Romanos, ed ABU). 7 glorificado. O Deus vivo é negado por um ateísmo agressivo. O único Deus verdadeiro é substituído ou distorcido em práticas de religiões mundanas. Nosso Senhor Jesus Cristo é agredido e mal representado em algumas culturas populares. E a face do Deus da revelação bíblica é obscurecida pelo nominalismo, pelo sincretismo e pela hipocrisia cristãos. Amar a Deus em meio a um mundo que o rejeita e o distorce, exige testemunho de Deus que seja ousado e humilde; defesa firme, mas graciosa da verdade do Evangelho de Cristo, o Filho de Deus, e confiança pela oração na obra salvadora e convincente do Seu Espírito Santo. Firmamos nosso compromisso de dar este testemunho, pois se declaramos amar a Deus, devemos partilhar a principal prioridade de Deus, qual seja, que o Seu nome e Sua Palavra sejam exaltados acima de todas as coisas9. 3. NÓS AMAMOS AO DEUS PAI Através de Jesus Cristo, o Filho de Deus, - e somente através dele, como o caminho, a verdade e a vida – podemos conhecer e amar Deus como Pai. À medida que o Espírito Santo testifica com nosso espírito que somos filhos de Deus, clamamos as palavras que Jesus orou “Aba Pai”, e oramos a oração que Jesus ensinou, “Pai Nosso”. Nosso amor por Jesus, provado pela obediência a Ele, une-se ao amor do Pai por nós, uma vez que o Pai e o Filho fazem morada em nós, em uma relação mútua de dar e receber amor10. Esta íntima relação possui profundo embasamento bíblico. a) Nós amamos a Deus como o Pai do seu povo. O Israel do Antigo Testamento conhecia a Deus como Pai, como aquele que os havia trazido à existência, que os tinha guiado e disciplinado, chamado à sua obediência, ansiado pelo seu amor e exercido perdão compassivo e amor paciente e duradouro11. Todas essas coisas permanecem verdadeiras para nós, povo de Deus em Cristo, em nosso relacionamento com nosso Deus Pai. b) Nós amamos a Deus como o Pai, que tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito para nossa salvação.Como é maravilhoso o amor do Pai por nós, a ponto de sermos chamados filhos de Deus. Que imensurável o amor do Pai que não poupou seu único Filho, mas o entregou por todos nós. Este amor do Pai em dar o Filho foi espelhado no amor do Filho que Se entregou. Houve completa harmonia no propósito da obra de expiação que o Pai e o Filho realizaram na cruz, através do Espírito eterno. O Pai amou o mundo e deu seu Filho; “o Filho de Deus me amou e entregou-se por mim”. Esta unidade do Pai e do Filho, assim declarada pelo próprio Jesus, ecoa nas mais repetidas saudações de Paulo, “graça e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo, que se entregou pelos nossos pecados... de acordo com a vontade do nosso Deus e Pai, a quem seja a glória para sempre e sempre. Amém”12. c) Nós amamos a Deus como o Pai, cujo caráter refletimos e em cujo cuidado confiamos. No Sermão do Monte, repetidas vezes, Jesus aponta nosso Pai do Céu como o modelo ou foco de nossas ações. Devemos ser pacificadores, como filhos de Deus. Devemos praticar boas obras, para que nosso Pai receba o louvor. Devemos amar nossos inimigos refletindo o amor do nosso Deus Pai. Devemos fazer nossas doações, orar e jejuar diante do nosso Pai somente. Devemos perdoar aos outros como nosso Pai nos perdoa. Não devemos ser ansiosos mas confiar na provisão do nosso Pai. Com tal comportamento fluindo do caráter cristão, realmente faremos a 11 9 Sl. 138:2. 10 Jo 14:6; Rm 8:14-15; Mt 6:9; Jo 14:21-23. Dt 32:6, 18; 1:31; 8:5; Is 1:2; Ml 1:6; Jr 3:4, 19; 31:9; Os 11:2;Sl 103:13; Is 63:16; 64:8-9. 12 Jo 3:16; 1Jo 3:1; Rm 8:32; Hb 9:14; Gl 2:20; Gl 1:4-5. 8 vontade do nosso Pai no céu, dentro do reino de Deus13. Confessamos que com frequência negligenciamos a verdade da Paternidade de Deus e nos privamos das riquezas de um relacionamento com Ele. Renovamos nosso compromisso de ir ao Pai através de Jesus, o Filho, para receber e responder ao seu amor paternal; viver em obediência sob a disciplina do Pai; refletir seu caráter de Pai em todo nosso comportamento e em todas nossas atitudes; e confiar na sua provisão de Pai em qualquer circunstância que Ele nos levar a viver. 4. NÓS AMAMOS AO DEUS FILHO Deus ordenou a Israel que amasse o SENHOR Deus com lealdade exclusiva. Da mesma forma, amar ao Senhor Jesus Cristo significa que afirmamos firmemente que somente Ele é Salvador, Senhor e Deus. A Bíblia ensina que Jesus opera as mesmas obras soberanas que o próprio Deus. Cristo é o Criador do universo. Soberano da história, Juiz de todas as nações e Salvador de todos os que se voltam para Deus14. Ele partilha a identidade de Deus em igualdade divina e na unidade do Pai, Filho e Espírito Santo. Assim como Deus chamou Israel para amá-lo em fé pactual, obediência e testemunho de servo, afirmamos nosso amor por Jesus Cristo confiando nele, obedecendo-o e fazendo-o conhecido. a) Nós confiamos em Cristo. Cremos no testemunho dos Evangelhos, que Jesus de Nazaré é o Messias, escolhido e enviado de Deus para cumprir a missão singular do Israel do Antigo Testamento, qual seja, trazer a bênção da salvação de Deus para todas as nações, como Deus prometeu a Abraão. 13 Mt 5:9, 16, 43-48; 6:4, 6, 14-15, 18, 25-32; 7:21-23. Jo 1:3; 1 Cor. 8:4-6; Hb 1:2; Cl 1:15-17;Sl 110:1; Mc 14:61-64; Ef 1:20-23; Ap 1:5; 3:14; 5:9-10; Rm 2:16; 2Ts 1:5-10; 2Co 5:10; Rm 14:9-12; Mt 1:21; Lc 2:30; At 4:12; 15:11; Rm 10:9; Tt 2:13; Hb 2:10; 5:9; 7:25; Ap 7:10. 14 No nascimento de Jesus, Deus assumiu nossa forma humana e viveu entre nós totalmente Deus e totalmente humano. Na sua vida, Jesus andou em perfeita fidelidade e obediência a Deus. Ele anunciou e ensinou o reino de Deus e estabeleceu o modelo de como Seus discípulos devem viver sob o reinado de Deus. No seu ministério e nos seus milagres, Jesus anunciou e demonstrou a vitória do reino de Deus sobre o mal e sobre os poderes do mal. Na sua morte na cruz, Jesus tomou sobre si os nossos pecados em nosso lugar, assumindo todo o preço, pena e vergonha, venceu a morte e os poderes do mal e conquistou a reconciliação e a redenção de toda a criação. Na sua ressurreição, Jesus foi justificado e exaltado por Deus e se tornou o precursor da humanidade redimida e da criação restaurada. Desde a sua ascensão, Jesus reina como Senhor sobre toda a história e criação. Na Sua volta, Jesus executará o julgamento de Deus, destruirá Satanás, o mal e a morte e estabelecerá o reino universal de Deus. b)Nós obedecemos a Cristo.Jesus nos chama para o discipulado, para tomarmos nossa cruz e segui-lo no caminho da abnegação, servidão e obediência. “Se me amam, obedecerão aos meus mandamentos”, Ele disse. “Por que me chamam Senhor, Senhor e não fazem o que eu digo?”. Somos chamados para viver como Cristo viveu e para amar como Cristo amou. Confessar a Cristo e ao mesmo tempo ignorar os seus mandamento é uma insensatez perigosa. Jesus alerta que muitos que usam o seu nome em ministérios miraculosos e espetaculares serão considerados por Ele como malfeitores15. Nós 15 Lc 6:46; 1Jo 2:3-6; Mt 7:21-23. 9 atentamos ao alerta de Cristo, porque nenhum de nós está imune a este temível perigo. c) Nós proclamamos Cristo. Somente em Cristo Deus se revelou de maneira completa e definitiva, e somente através de Cristo, Deus conclui a salvação para o mundo. Portanto, nos ajoelhamos aos pés de Jesus de Nazaré e, como Pedro, lhe dizemos: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”, e como Tomé, “Senhor meu, Deus meu!”. Apesar não o termos visto, nós o amamos. E nos alegramos com esperança, aguardando pelo dia da sua volta, quando o veremos como Ele é. Até este dia, nos unimos a Pedro e João proclamando que: “Não há salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos”16. Nós renovamos nosso compromisso de dar testemunho de Jesus Cristo e de todo o seu ensinamento, em todo o mundo, cientes que somente podemos dar tal testemunho se nós mesmos vivermos em obediência ao seu ensinamento. 5. NÓS AMAMOS AO DEUS ESPÍRITO Nós amamos o Espírito Santo na unidade da Trindade, com Deus o Pai que o envia e com Jesus Cristo de quem Ele dá testemunho. Ele é o Espírito missionário do Pai missionário e o do Filho missionário, soprando vida e poder na igreja missionária de Deus. Nós amamos e oramos pela presença do Espírito Santo porque sem o testemunho do Espírito de Cristo nosso testemunho é inútil. Sem a obra de convencimento do Espírito Santo, nossa pregação é em vão. Sem o poder do Espírito, nossa missão é mero esforço humano. E sem o fruto do Espírito, nossas vidas sem brilho não podem refletir a beleza do Evangelho. a) No Antigo Testamento vemos o Espírito de Deus ativo na criação, em obras de libertação e 16 Mt 16:16; Jo 20:28; 1Pe 1:8; 1Jo 3:1-3; Atos 4:12. de justiça, enchendo e capacitando o povo para todo tipo de serviço. Os profetas cheios do Espírito ansiavam pela vinda do rei e servo que estava por vir, cuja Pessoa e obra seriam capacitadas pelo Espírito de Deus, e pela era vindoura que seria marcada pelo derramamento do Seu Espírito, trazendo nova vida e obediência renovada para o povo de Deus17. b) No Pentecoste, Deus derramou o seu Espírito Santo como havia prometido através dos profetas e de Jesus. O Espírito santificador produz Seus frutos na vida dos crentes, e o primeiro fruto é sempre o amor. O Espírito enche a igreja com seus dons e com poder para missões e para a grande variedade de serviços. O Espírito nos capacita para proclamar e apresentar o Evangelho, para discernir a verdade, para orar com eficácia e para prevalecer sobre as forças das trevas. O Espírito fortalece e consola os discípulos que são perseguidos ou que estão em tribulação por causa do seu de Cristo18. c) Nosso engajamento em missões, portanto, perde o objetivo e se torna infrutífero se não houver a presença e o poder do Espírito Santo. Isto é verdade para missões em todas as áreas: evangelismo, testemunho da verdade, discipulado, promoção da paz, envolvimento social, transformação ética, preservação da criação, vitória sobre poderes do mal, expulsão de espíritos demoníacos, cura de pessoas doentes, em sofrimento e passando por perseguição. Tudo o que fazemos em nome de Cristo deve ser capacitado pelo Espírito Santo. O Novo Testamento deixa isto claro através da igreja primitiva e do ensinamento dos 17 Gn 1:1-2;Sl 104:27-30; Jó 33:4; Ex. 35:30-36:1; Jdg. 3:10; 6:34; 13:25; Num. 11:16-17, 29; Is 63:11-14; 2Pe 1:20-21; Mic. 3:8; Neh. 9:20, 30; Zech. 7:7-12; Is 11:1-5; 42:1-7; 61:1-3; 32:15-18; Ezek. 36:25-27; 37:1-14; Joel 2:28-32. 18 Atos 2; Gl 5:22-23; 1Pe 1:2; Ef 4:3-6; 1 Cor. 12:4-11; Jo 20:21-22; 14:16-17, 25-26; 16:12-15; Rm 8:26-27; Ef 6:1018; Mt 10:17-20; Lc 21:15. 10 apóstolos. Hoje, vemos isto demonstrado através dos frutos e do crescimento das igrejas, cujos seguidores de Jesus atuam confiantemente, na dependência e expectativa do poder do Espírito Santo. outra revelação pode superá-la, e também nos alegramos porque o Espírito Santo ilumina as mentes do povo de Deus para que a Bíblia continue a falar a verdade de Deus de maneira nova em todas as culturas19. Não existe Evangelho verdadeiro nem completo, e nem missão bíblica autêntica sem a Pessoa, a obra e o poder do Espírito Santo. Oramos por um despertamento maior para esta verdade bíblica e para que isto se torne realidade em todo o corpo de Cristo em todo o mundo. Entretanto, temos consciência dos muitos abusos disfarçados com o nome do Espírito Santo, das várias formas nas quais todos os tipos de fenômenos são praticados e enaltecidos, como vemos exemplificado no Novo Testamento, que carregam as marcas de outros espíritos, não do Espírito Santo. Há grande necessidade de um discernimento mais profundo, de alertas claros contra enganos, da exposição dos fraudulentos manipuladores a seu próprio serviço, que usam poder espiritual de forma abusiva para seu próprio enriquecimento. Acima de tudo, há uma grande necessidade de ensinamento bíblico consistente e de pregação inundada por oração humilde, que capacite crentes comuns a entender e se alegrar no verdadeiro Evangelho e a reconhecer e rejeitar os falsos evangelhos. a) A Pessoa que a Bíblia revela. Amamos a Bíblia como uma noiva ama as cartas do seu noivo, não pelo papel propriamente dito, mas pela pessoa que fala através delas. A Bíblia nos oferece a revelação do próprio Deus, da Sua identidade, do Seu caráter, dos Seus propósitos e das Suas ações. Ela é a principal testemunha do Senhor Jesus Cristo. Lendo-a, encontramonos alegremente com ele, através do Espírito. Nosso amor pela Bíblia é uma expressão do amor a Deus. b) A história que a Bíblia conta. A Bíblia conta a história universal da criação, queda, redenção na história e nova criação. Esta narrativa abrangente permite que tenhamos uma visão de mundo coerente e bíblica e molda nossa teologia. No centro desta historia estão os eventos culminantes da salvação, a cruz e a salvação de Cristo, que constituem o coração do Evangelho. É esta história, no Novo e no Antigo Testamentos, que contam quem somos, por qual razão estamos aqui e para onde caminhamos. Esta história da missão de Deus define nossa identidade, impulsiona nossa missão e garante que o fim está nas mãos de Deus. Esta história deve dar forma à memória e à esperança do povo de Deus e governar o conteúdo do seu testemunho evangelístico, ao ser passado de geração a geração. Devemos usar todos os meios possíveis para tornar a Bíblia conhecida, pois sua mensagem é para todos os povos da terra. Portanto, reafirmamos nos compromisso com esta tarefa contínua de traduzir, disseminar e ensinar as Escrituras a todas as culturas e línguas, incluindo aquelas que são predominantemente orais ou nãoliterárias. 6. NÓS AMAMOS A PALAVRA DE DEUS Nós amamos a palavra de Deus nas Escrituras do Novo e do Antigo Testamento, ecoando o canto alegre do salmista no Torá: "Eu amo os teus mandamentos mais do que o ouro...Como amo a Tua lei!”. Recebemos toda a Bíblia como a Palavra de Deus, inspirada pelo Espírito de Deus, falada e escrita através de autores humanos. Submetemo-nos a ela como autoridade única e suprema, que governa nossa fé e nosso comportamento. Testificamos do poder da Palavra de Deus para cumprir o seu propósito de salvação. Afirmamos que a Bíblia é a palavra final escrita de Deus, que nenhuma 19 Sl 119:47, 97; 2Tm 3:16-17; 2Pe 1:21. 11 c) A verdade que a Bíblia ensina. Toda a Bíblia nos ensina todo o conselho de Deus, a verdade que Deus quer que saibamos. Submetemo-nos à Bíblia como verdadeira e confiável em tudo o que declara, pois é a Palavra do Deus que não mente e não erra. Ela é clara e suficiente para revelar o caminho da salvação. É o fundamento para explorar e entender todas as dimensões da verdade de Deus. Entretanto, vivemos em um mundo cheio de mentiras e de rejeição da verdade. Muitas culturas exibem um relativismo dominante, que nega que qualquer verdade absoluta exista ou possa ser conhecida. Se amamos a Bíblia, então, devemos nos levantar em defesa das verdades que ela declara. Devemos encontrar novas formas de articular a autoridade bíblica em todas as culturas. Nós reafirmamos nosso compromisso de batalhar pela verdade da revelação de Deus como parte do nosso trabalho de amor pela Palavra de Deus. d) A vida que a Bíblia requer. “A palavra está bem próxima de vocês; está em sua boca e em seu coração; por isso vocês poderão obedecerlhe”. Jesus e Tiago nos chamam para ser praticantes da Palavra e não somente ouvintes20. A Bíblia retrata uma qualidade de vida que deveria marcar o crente e as comunidades dos crentes. Desde Abraão até Moisés, com os salmistas, profetas e com a sabedoria de Israel, de Jesus aos apóstolos, aprendemos que tal estilo de vida bíblico inclui justiça, compaixão, humildade, integridade, honestidade, confiabilidade, pureza sexual, generosidade, bondade, autonegação, hospitalidade, promoção da paz, não-retaliação, fazer o bem, perdão, alegria, contentamento e amor – todas essas coisas combinando em vidas de adoração, louvor e fidelidade a Deus. Nós confessamos que facilmente declaramos amar a Bíblia sem amar a vida que ela ensina: 20 Dt 30:14; Mt 7:21-27; Lc 6:46; Tg 1:22-24. vida prática e difícil de obediência a Deus através de Cristo. E mais, “nada divulga melhor o Evangelho do que uma vida transformada, e nada traz mais descrédito do que a inconsistência pessoal. Temos sobre nós a cobrança de um comportamento digno do Evangelho de Cristo e que o “adorne”, enriquecendo sua beleza com vidas santas”21. Portanto, por causa do Evangelho de Cristo, reafirmamos nosso compromisso de provar nosso amor pela Palavra de Deus crendo nela e lhe obedecendo. Não existe missão bíblica sem vida bíblica. 7. NÓS AMAMOS O MUNDO DE DEUS Partilhamos a paixão de Deus pelo seu mundo, amando tudo o que Deus fez, nos alegrando com a providência e a justiça de Deus através da sua criação, proclamando as boas novas a toda criação e a todas as nações, aguardando pelo dia quando a terra será cheia do conhecimento da glória de Deus como as águas cobrem o mar22. a) Nós amamos o mundo criado por Deus. Este amor não é um simples sentimento afetivo pela natureza, o qual a Bíblia não ordena que tenhamos, muito menos é uma adoração panteísta da natureza, o que a Bíblia condena explicitamente. Antes é a prática lógica do nosso amor a Deus manifestado em cuidado pelo que pertence a ele. “Do Senhor é a terra e tudo o que nela existe”. A terra é propriedade do Deus a quem declaramos amar e obedecer. A terra é importante para nós simplesmente porque pertence a quem chamamos de Senhor23. A terra é criada, sustentada e redimida por Cristo24. Não podemos alegar que amamos a 21 Manifesto de Manila, parágrafo 7; Tt 2:9-10. Sl 145:9, 13, 17;Sl 104:27-30;Sl 50:6; Mc 16:15; Cl 1:23; Mt 28:17-20; Hc 2:14. 23 Sl 24:1; Dt 10:14. 24 Cl 1:15-20; Hb 1:2-3. 22 12 Deus se fazemos mau uso do que pertence a Cristo por direito de criação, de redenção e de herança. A terra é importante para nós, não como no raciocínio do mundo secular, mas por causa do Senhor. Se Jesus é Senhor de toda a terra, não podemos separar nosso relacionamento com Cristo da maneira como agimos em relação à terra. Porque proclamar o evangelho que diz “Jesus é Senhor” é proclamar o Evangelho que inclui a terra, uma vez que o Senhorio de Cristo está sobre toda a criação. O cuidado com a criação é, portanto, uma questão do evangelho no contexto do Senhorio de Cristo. Tal amor pela criação de Deus exige que nos arrependamos de nossa participação na destruição, desperdício e poluição dos recursos da terra e da nossa conivência com idolatria tóxica do consumismo. Em vez disso, firmamos nosso compromisso de responsabilidade ambiental urgente e profética e de apoiar cristãos cujo chamado missional pessoal seja defesa e ação em favor do meio ambiente. Lembramo-nos de que a Bíblia declara o propósito redentor de Deus para a criação propriamente dita. Missão integral significa discernir, proclamar e viver a verdade bíblica de que o Evangelho é a boa nova de Deus, através da cruz e ressurreição de Jesus Cristo, para indivíduos e para a sociedade, e para a criação. Estes três estão sofrendo e feridos por causa do pecado, os três estão incluídos no amor redentor e na missão de Deus; os três devem fazer parte da missão abrangente do povo de Deus. b) Nós amamos o mundo das nações e das culturas. “De um homem, Deus fez todas as nações da humanidade, para viverem sobre a face da terra”. A diversidade étnica é dom de Deus na criação e será preservada na nova criação, quando será libertada das rivalidades e divisões. Nosso amor por todos os povos reflete a promessa de Deus de abençoar todas as nações da terra e a missão de Deus de criar para si um povo vindo de toda tribo, língua e nação. Devemos amar tudo o que Deus escolheu abençoar, e isto inclui todas as culturas. Historicamente, a missão cristã tem sido atuante na proteção e preservação de culturas nativas e suas línguas. Entretanto, o amor de Deus também inclui discernimento crítico por todas as culturas e evidencia não apenas as características positivas da imagem de Deus nas vidas humanas, mas também as impressões negativas de Satanás e do pecado. Aguardamos pelo dia quando veremos o Evangelho incorporado e internalizado em todas as culturas, redimindo-as de dentro para fora, para que elas exibam a glória de Deus e a plenitude radiante de Cristo. Aguardamos ansiosos pela riqueza, pela glória e pelo esplendor de todas as culturas trazidas para a cidade de Deus, redimidas e purificadas do pecado, enriquecendo a nova criação25. Tal amor por todos os povos exige que rejeitemos os males do racismo e do etnocentrismo, e que tratemos todas as etnias e grupos culturais com dignidade e respeito, tendo como base o seu valor para Deus na criação e na redenção26. Tal amor exige também que façamos o Evangelho conhecido entre todos os povos e culturas em todo lugar. Nenhuma nação, judia e gentia está fora do escopo da Grande Comissão. O Evangelismo flui dos corações cheios do amor de Deus por aqueles que ainda não O conhecem. Envergonhados, confessamos que existem muitos povos no mundo que ainda não ouviram a mensagem do amor de Deus em Jesus Cristo. Renovamos nosso compromisso, inspirado desde o seu início pelo Movimento Lausanne, de usar todos os meios possíveis para alcançar todos os povos com o Evangelho. 25 Atos 17:26; Dt 32:8; Gn 10:31-32; 12:3; Ap 7:9-10; Ap 21:24-27. 26 Atos 10:35; 14:17; 17:27. 13 c) Nós amamos os pobres e os sofridos do mundo. A Bíblia afirma que o Senhor ama tudo o que criou, defende a causa do oprimido, ama o estrangeiro, alimenta o faminto, sustenta o órfão e a viúva27. A Bíblia também afirma que Deus deseja fazer estas coisas através de seres humanos comprometidos com tais ações. Deus tem como responsáveis principalmente os que exercem liderança política ou jurídica na sociedade28, mas todo o povo de Deus, de acordo com a Lei e os Profetas, os Salmos e a Sabedoria, Jesus e Paulo, Tiago e João, deve refletir o amor e a justiça de Deus através de amor prático e de justiça para o necessitado29. Tal amor pelo pobre exige não apenas amor, misericórdia e atos de compaixão, mas também que façamos justiça através da exposição e oposição de tudo o que oprime e explora o pobre. “Não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam”30. Envergonhados, confessamos que nesta questão não temos partilhado da paixão de Deus, não temos incorporado o amor de Deus, não temos refletido o caráter de Deus e não temos feito a vontade de Deus. Novamente nos oferecemos para a promoção da justiça, solidariedade e da defesa do marginalizado e oprimido. Temos consciência da luta que se trava contra o mal nas dimensões espirituais, a qual só pode ser guerreada com a vitória da cruz e a da ressurreição, no poder do Espírito Santo e em constante oração. d) Nós amamos nosso próximo como a nós mesmos. Jesus convocou Seus discípulos a obedecerem este mandamento como o 27 28 Sl 145:9, 13, 17; 147:7-9; Dt 10:17-18. Gn 18:19; Ex. 23:6-9; Dt 16:18-20; Jó 29:7-17; Ps 72:4, 12-14; 82; Pv 31:4-9; Jr 22:1-3; Dn 4:27. 29 Ex. 22:21-27; Lv 19:33-34; Dt 10:18-19; 15:7-11; Is 1:1617; 58:6-9; Amos 5:11-15, 21-24;Sl 112; Jó 31:13-23; Pv 14:31; 19:17; 29:7; Mt 25:31-46; Lc 14:12-14; Gl 2:10; 2Co 8-9; Rm 15:25-27; 1Tm 6:17-19; Tg 1:27; 2:14-17; 1Jo 3:1618. 30 Pacto de Lausanne, Parágrafo 5. segundo mais importante da lei, mas a seguir, no mesmo capítulo, ele aprofundou radicalmente este mandamento, de “amem o seu próximo” para “amem seus inimigo”31. Tal amor pelo nosso próximo exige de nós uma resposta para todas as pessoas, uma resposta que venha do coração do Evangelho, em obediência ao mandamento de Cristo, seguindo o Seu exemplo. Este amor ao próximo envolve pessoas de outras crenças e se estende para aqueles que nos odeiam, difamam, perseguem e até matam. Jesus nos ensina a responder à mentira com a verdade, aos malfeitores com atos de bondade, misericórdia e perdão, à violência e morte dos Seus discípulos com sacrifício próprio, a fim de atrair pessoas a ele e quebrar a cadeia do mal. Rejeitamos com veemência a violência na propagação do Evangelho e renunciamos à tentação de retaliação e à vingança contra os que nos fazem mal. A desobediência destes princípios é incompatível com o exemplo e o ensinamento de Cristo e do Novo Testamento32. Ao mesmo tempo, nosso dever de amor para com o próximo sofredor requer que busquemos a justiça em favor deles apelando para as autoridades legais e de Estado, que são servos de Deus para punição dos malfeitores33. e) O mundo que não amamos. O mundo da boa criação de Deus tornou-se o mundo da rebelião humana e satânica contra Deus. O mandamento que recebemos é para que não amemos este mundo de desejo, ganância e orgulho pecaminosos. Com tristeza confessamos que são exatamente estas marcas mundanas que com frequência distorcem nossa presença cristã e negam nosso testemunho do Evangelho34. 31 Lv 19:34; Mt 5:43-4. Mt 5:38-39; Lc 6:27-29; 23:34; Rm 12:17-21; 1Pe 3:1823; 4:12-16. 33 Rm 13:4. 34 1Jo 2:15-17. 32 14 Renovamos nosso compromisso de não flertar com o mundo caído nem com suas paixões transitórias, mas amar todo o mundo como Deus o ama. Assim, amamos o mundo esperando em santidade pela redenção e renovação em Cristo de toda a criação e culturas, pelo encontro do povo de Deus de todas as nações, até dos confins da terra, e o fim de toda destruição, pobreza e inimizade. 8. NÓS AMAMOS O EVANGELHO DE DEUS Como discípulos de Jesus, somos povo do Evangelho. A essência da nossa identidade é nossa paixão pelas boas novas bíblicas da obra salvadora de Deus através de Jesus Cristo. Somos unidos pela nossa experiência com a graça de Deus no Evangelho e pela nossa motivação em fazer este Evangelho da graça conhecido até os confins da terra, usando para isto todos os meios possíveis. a) Nós amamos as boas novas em um mundo de más notícias. O Evangelho enfoca os efeitos calamitosos do pecado, da queda e da necessidade do ser humano. O ser humano rebelou-se contra Deus, rejeitou a autoridade de Deus e desobedeceu a Palavra de Deus. Neste estado de pecado, estamos alienados de Deus, uns dos outros e da ordem criada. O pecado merece a condenação de Deus. Os que se recusam a arrepender-se e não “obedecem ao Evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo serão punidos com destruição e separação eterna da presença de Deus”35. Os efeitos do pecado e do poder do mal têm corrompido cada aspecto da vida humana, espiritual, físico, intelectual e relacional. Eles permeiam a vida cultural, econômica, social, política e religiosa de todas as culturas e gerações da história. Eles têm causado miséria incalculável para a raça humana e danos à criação de Deus. Neste quadro sombrio, o Evangelho bíblico é verdadeiramente boa nova. b) Nós amamos a história que o Evangelho conta. O Evangelho conta as boas novas dos eventos históricos da vida, morte e ressurreição de Jesus de Nazaré. Como filho de Davi, o prometido Rei Messias, Jesus é Aquele através de quem Deus estabeleceu o Seu reino e promoveu a salvação do mundo, tornando abençoadas todas as nações da terra, como havia prometido a Abraão. Paulo define assim o Evangelho: “Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, segundo as Escrituras, e apareceu a Pedro e depois aos Doze”. O Evangelho declara que na cruz de Cristo, Deus tomou sobre Si, na pessoa do Seu Filho e em nosso lugar, o julgamento que merecemos pelos nossos pecados. Neste mesmo grandioso ato salvador, Deus conquistou a vitória decisiva sobre Satanás, sobre a morte e sobre todos os poderes do mal, libertou-nos destes poderes e seus temores e garantiu a destruição final deles. Deus conquistou a reconciliação dos crentes consigo e de uns com outros, vencendo todas as divisões e inimizades. Através da cruz Deus também cumpriu o Seu propósito de reconciliação com toda a criação, e na ressurreição do corpo de Jesus nos deu os primeiros frutos da nova criação. “Deus em Cristo estava reconciliando consigo o mundo”36. Como amamos a história do Evangelho! c) Amamos a garantia que o Evangelho dá. Somente através da confiança apenas em Cristo que somos unidos com Cristo através do Espírito Santo e somos justificados em Cristo diante de Deus. Sendo justificados pela fé, temos paz com Deus e não somos condenados. Recebemos o perdão dos nossos pecados. Nascemos de novo para uma esperança viva partilhando a vida ressurreta de Cristo. Somos adotados como co-herdeiros com Cristo. Tornamo-nos cidadãos da nação em aliança 36 35 Gn 3; 2Ts 1:9. Mc 1:1, 14-15; Rm 1:1-4; Rm 4; 1 Cor. 15:3-5; 1Pe 2:24; Cl 2:15; Hb 2:14-15; Ef 2:14-18; Cl 1:20; 2Co 5:19. 15 com Deus, membros da família de Deus e morada de Deus. Por isso, ao confiar em Cristo, temos plena certeza da salvação e de vida eterna, porque nossa salvação depende não de nós mesmos, mas exclusivamente da obra de Cristo e da promessa de Deus. “Nada em toda a criação pode nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor”37. Como amamos as promessas do Evangelho! d) Nós amamos a transformação produzida pelo Evangelho. O Evangelho é o poder transformador de vida dado por Deus que opera no mundo. “É o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê”38. A fé é o único meio pelo qual as bênçãos de Deus e as garantias do Evangelho são recebidas. Entretanto, a fé salvadora nunca permanece só, mas necessariamente se mostra em obediência. A obediência cristã é “a fé manifestada através do amor”39. Não somos salvos pelas boas obras, mas tendo sido salvos somente pela graça, somos “criados em Cristo Jesus para fazermos boas obras”40. “A fé propriamente dita, se não for acompanhada de obras, está morta”41. Paulo viu a transformação ética que o Evangelho produz como a obra da graça de Deus, graça que conquistou a nossa salvação na primeira vinda de Cristo, e graça que nos ensina a viver com ética, à luz da Sua segunda vinda42. Para Paulo “obedecer ao Evangelho” significava confiar na graça e depois ser ensinado através da graça43. O objetivo missional de Paulo era gerar “a obediência que vem pela fé” entre todas as nações44. Esta forte linguagem de aliança nos remete à Abraão. Abraão creu na promessa de Deus, o que lhe foi creditado por justiça, e depois obedeceu ao mandamento de Deus em demonstração da sua fé. “Pela fé Abraão... obedeceu”45. Arrependimento e fé em Jesus Cristo são os primeiros atos de obediência exigidos pelo Evangelho; obediência contínua aos mandamentos de Deus é o modo de vida capacitado pela fé do Evangelho, através do Espírito Santo santificador46. A obediência é, portanto, a prova viva da fé salvadora e o seu fruto vivo. A obediência também é o teste do nosso amor por Jesus. “Quem tem os meus mandamentos e lhes obedece, esse é o que me ama”47. “Sabemos que o conhecemos, se obedecemos aos seus mandamentos”48. Como amamos o poder do Evangelho! 9. NÓS AMAMOS O POVO DE DEUS O povo de Deus são aqueles de todas as eras e nações que Deus em Cristo amou, escolheu, chamou, salvou e santificou com povo Seu, para partilhar na glória de Cristo como cidadãos da nova criação. Como tais, a quem Deus amou de eternidade a eternidade, por toda história marcada por turbulências e rebelião, nós recebemos o mandamento para amar uns aos outros. Porque, “visto que Deus assim nos amou, nós também devemos amar uns aos outros”, e, portanto, “ser imitadores de Deus... e viver em amor, como também Cristo nos amou e Se entregou por nós”. Amar uns aos outros na família de Deus não é simplesmente um opção desejável, mas um mandamento do qual não podemos escapar. Este amor é a primeira evidência da obediência ao Evangelho, e a força propulsora da missão no mundo49. 37 Rm 4; Phil. 3:1-11; Rm 5:1-2; 8:1-4; Ef 1:7; Cl 1:13-14; 1Pe 1:3; Gl 3:26-4:7; Ef 2:19-22; Jo 20:30-31; 1Jo 5:12-13; Rm 8:31-39. 38 Rm 1:16. 39 Gl 5:6. 40 Ef 2:10. 41 Tg 2:17. 42 Tt 2:11-14. 43 Rm 15:18-19; 16:19; 2Co 9:13. 44 Rm 1:5; 16:26. a) O amor exige Unidade. O mandamento de Jesus para que Seus discípulos amem uns aos 45 Gn 15:6; Gl 6:6-9; Hb 11:8; Gn 22:15-18; Tg 2:20-24. Rm 8:4. 47 Jo 14:21. 48 1Jo 2:3. 49 2Ts 2:13-14; 1Jo 4:11; Ef 5:2; 1Ts 1:3; 4:9-10; Jo 13:35. 46 16 outros está relacionado à oração para que eles sejam um. Tanto este mandamento como a oração são missionais, “com isso todos saberão que vocês são meus discípulos”, e “para que o mundo creia que tu *o Pai+ me enviaste”50. A marca mais convincente da verdade do Evangelho é a unidade em amor dos cristãos, superando as divisões crônicas do mundo: barreiras de raça, de cor, classes sociais, privilégios econômicos ou partidarismo político. Entretanto, poucas coisas destroem mais nosso testemunho do que a presença e ampliação destas mesmas divisões no meio cristão. Nós confessamos que não derrubamos todas as barreiras. Entre elas, uma que nos causa profunda perturbação são os contrastes escandalosos de desigualdade material dentro do corpo de Cristo. Esta desigualdade nega a instrução e aspiração de Paulo de que haja mutualidade e suficiência para todos. Condenamos a competitividade e a rivalidade que, às vezes, chega a envenenar nosso zelo pela missão. Rejeitamos o desequilíbrio de recursos disponíveis para missões em diferentes partes da igreja mundial. Buscamos com urgência um novo equilíbrio global enraizado em profundo amor e na parceria humilde dentro do corpo de Cristo em todos os continentes. A razão desta busca não visa apenas o amor de uns pelos outros que vai além das palavras, mas também o nome de Cristo e a missão de Deus em todo o mundo. b) O amor exige Honestidade. O amor fala a verdade com graça. Ninguém amou mais o povo de Deus do que os profetas de Israel e o próprio Jesus. Ao mesmo tempo, ninguém os confrontou com mais honestidade sobre a verdade do erro, da idolatria e da rebelião deles contra a aliança com o Senhor. Ao fazer isto, chamaram o povo de Deus ao arrependimento, para que fossem perdoados e restaurados para o serviço na missão de Deus. A mesma voz de 50 Jo 13:34-35; 17:21. amor profético deve ser ouvida hoje pelas mesmas razões. Esta amorosa honestidade clama para que voltemos arrependidos à humildade, integridade e simplicidade sacrificial de quem teme a Deus. Devemos renunciar às idolatrias da arrogância, do sucesso manipulado e da ganância consumista que seduz a tantos de nós e de nossos líderes. Nosso amor pela igreja de Deus sofre com tristeza por causa da feiúra entre nós que desfigura a face do nosso querido Senhor Jesus Cristo e que esconde Sua beleza do mundo – mundo este que precisa desesperadamente ser atraído a Ele. c) O amor exige Solidariedade. Amar uns aos outros inclui principalmente cuidar dos que estão sendo perseguidos e estão aprisionados por causa da sua fé e testemunho. Se uma parte do corpo sofre, todas sofrem com ele. Todos nós somos, como João, “irmãos e companheiros no sofrimento, no Reino e na perseverança em Jesus”51. Nós confessamos que nem sempre temos demonstrado amor e solidariedade para com nossos irmãos e irmãs perseguidos, e que estamos mais preocupados com nossa própria segurança. Firmamos nosso compromisso de compartilhar do sofrimento dos membros do corpo de Cristo em todo o mundo, através de informação, oração, defesa e outros meios de apoio. Entendemos que este compartilhar, no entanto, não é um simples ato de piedade, mas um desejo profundo de também aprender o que a igreja sofredora pode ensinar e dar às partes do corpo de Cristo que não enfrentam o mesmo sofrimento. Somos advertidos que a igreja que se sente tranquila e auto-suficiente, como a de Laodicéia, pode ser a que Jesus considera a mais cega quanto à sua própria 51 Hb 13:1-3; 1 Cor 12:26; Ap 1:9. 17 pobreza e na qual Ele próprio se sente um estranho52. do nosso Senhor e de Cristo e Ele reinará para todo o sempre53. Jesus chama todos os Seus discípulos para a união como uma única família entre as nações, uma comunidade reconciliada, na qual as barreiras do pecado sejam derrubadas pela Sua graça reconciliadora. Esta igreja é uma comunidade de graça, obediência e amor, em comunhão com o Espírito Santo, na qual os gloriosos atributos de Deus e as características da graça de Cristo são refletidos, e a sabedoria multiforme de Deus é manifestada. Como a mais vívida expressão do reino de Deus hoje, a igreja é a comunidade dos reconciliados, que não vivem mais para si mesmos, mas para o Salvador que os amou e se entregou em seu favor. a) Nossa participação na missão de Deus. Deus chama Seu povo para partilhar Sua missão. A igreja de todas as nações está em continuidade, através do Messias Jesus, com o povo de Deus do Velho Testamento. Com eles fomos chamados através de Abraão e comissionados para ser bênção e luz para as nações. Com eles, somos moldados e ensinados através da Lei e dos Profetas para ser uma comunidade de santidade, compaixão e justiça em um mundo de pecado e sofrimento. Fomos redimidos através da cruz e ressurreição de Jesus Cristo e capacitados pelo Espírito Santo para dar testemunho do que Deus fez em Cristo. A igreja existe para adorar e glorificar a Deus por toda a eternidade e participar da missão transformadora de Deus na história. Nossa missão deriva totalmente da missão de Deus, dirigida a toda a criação de Deus e está embasada na vitória redentora da cruz. Este é o povo ao qual pertencemos, cuja fé confessamos e cuja missão partilhamos. 10. NÓS AMAMOS A MISSÃO DE DEUS Firmamos nosso compromisso com a missão mundial, porque ela é essencial para nosso entendimento de Deus, da Bíblia, da igreja, da história humana e do futuro final. Toda a Bíblia revela a missão de Deus de convergir a Cristo, todas as coisas no céu e na terra, reconciliandoas através do sangue da Sua cruz. Ao cumprir Sua missão, Deus transformará em uma nova criação a criação destruída pelo pecado e pelo mal, na qual não exista pecado nem maldição. Deus cumprirá Sua promessa a Abraão, de abençoar todas as nações da terra, através do Evangelho de Jesus, o Messias, a semente de Abraão. Deus transformará todas as nações, tribos e línguas do mundo fragmentado sob o julgamento de Deus em uma nova humanidade, redimida pelo sangue de Cristo para adorar nosso Deus e Salvador. Deus destruirá o reino da morte, corrupção e violência quando Cristo voltar para estabelecer Seu reino eterno de vida, justiça e paz. Depois, Deus, Emanuel, habitará conosco, e o reino do mundo se tornará o Reino 52 Ap 3:17-20. b) O custo da nossa missão. Jesus deu exemplo do que ensinou, que o maior amor é dar a vida pelos seus amigos. Referindo-se a Ele mesmo e a seus discípulos disse: “se o grão de trigo não cair na terra e não morrer, continuará ele só. Mas se morrer, dará muito fruto”. A maioria de nós não será chamada para entregar a vida por amor a Cristo, mas o sofrimento é uma forma de engajamento missionário como testemunhas de Cristo, como foi para os apóstolos e profetas do Velho Testamento. Estar disposto a sofrer é um teste decisivo da genuinidade da nossa missão. Deus pode usar o sofrimento, a perseguição e o martírio para avançar sua missão. “O martírio é uma forma de testemunho para o qual Cristo prometeu honra especial”. 53 Ef 1:9-10; Cl 1:20; Gn 1-12; Ap 21-22. 18 c) A integridade da nossa missão. A fonte de toda nossa missão é o que Deus fez em Cristo para a redenção de todo mundo, conforme revelado na Bíblia. Nossa tarefa evangelística é fazer as boas novas conhecidas para todas as nações. O contexto de toda a nossa missão é o mundo no qual vivemos, o mundo do pecado, sofrimento, injustiça e desordem criacional, para o qual Deus nos envia para amar e servir por amor a Cristo. Toda nossa missão deve, portanto, refletir a integração do evangelismo e o engajamento compromissado no mundo, sendo ordenado e dirigido pela revelação bíblica do Evangelho de Deus. “Evangelização propriamente dita é a proclamação do Cristo bíblico e histórico como Salvador e Senhor, com o intuito de persuadir as pessoas a virem a ele pessoalmente e, assim, se reconciliarem com Deus...Os resultados da evangelização incluem a obediência a Cristo, o ingresso em sua igreja e um serviço responsável no mundo...Afirmamos que a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão. Pois ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e do homem, de nosso amor por nosso próximo e de nossa obediência a Jesus Cristo...A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta”54. Cristo. Se ignoramos o mundo, traímos a palavra de Deus, que nos envia para servir o mundo. Se ignoramos a palavra de Deus, não temos nada para oferecer ao mundo”55. Firmamos nosso compromisso com o exercício dinâmico e integral de todas as dimensões da missão para a qual Deus chama toda Sua igreja. Deus nos ordena a tornar conhecidos em todas as nações a verdade da revelação de Deus e o evangelho da graça salvadora de Deus através de Jesus Cristo, chamando todos ao arrependimento, à fé, ao batismo e ao discipulado obediente. Deus nos ordena a refletir o Seu caráter através do cuidado compassivo com o necessitado, e demonstrar os valores e o poder do reino de Deus na luta pela justiça e pela paz e no cuidando com a criação de Deus. Em resposta ao amor irrestrito de Deus por nós em Cristo, e por causa do nosso amor por Ele, reconsagramos nossas vidas, com a ajuda do Espírito Santo, para obedecer integralmente aos mandamentos de Deus, com abnegadas humildade, alegria e coragem. Renovamos esta aliança com o Senhor que amamos porque Ele nos amou primeiro. “Missão integral é a proclamação e a demonstração do Evangelho. Não significa simplesmente que o evangelismo e o envolvimento social tenham que ser realizados simultaneamente. Na missão integral, nossa proclamação tem consequências sociais quando convocamos as pessoas ao amor e ao arrependimento em todas as áreas da vida. Nosso compromisso social tem consequências para a evangelização quando damos testemunho da graça transformadora de Jesus 55 54 Pacto de Lausanne, parágrafos 4 e 5. Declaração Miquéias sobre Missão Integral www.micahnetwork.org/pt/page/declaração-miquéiassobre-missão-integral. 19 PARA O MUNDO QUE SERVIMOS: O CHAMADO À AÇÃO DA CIDADE DO CABO SEGUNDA PARTE INTRODUÇÃO Nossa aliança com Deus vincula o amor à obediência. Deus se alegra em ver nosso “trabalho que resulta da fé” e nosso “esforço motivado pelo amor”56, pois “somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus preparou antes para nós praticarmos”57. Como membros da Igreja de Jesus Cristo em todo o mundo, temos procurado ouvir a voz de Deus através do Espírito Santo. Ouvimos sua voz a partir da Palavra escrita na exposição de Efésios e através das vozes do seu povo em todo o mundo. Os seis principais temas do nosso Congresso oferecem a base para discernir os desafios enfrentados pela Igreja de Cristo em todo o mundo e as nossas prioridades para o futuro. Não inferimos que esses compromissos sejam os únicos que a Igreja deve considerar, nem que as prioridades sejam as mesmas em toda parte. 56 1 Tessalonicenses 1:3. Efésios 2:10. 57 IIA TESTEMUNHANDO DA VERDADE DE CRISTO EM UM MUNDO PLURALISTA E GLOBALIZADO. 1. A Verdade e a pessoa de Cristo Jesus Cristo é a verdade do universo. Como Jesus é a verdade, a verdade em Cristo é (i) pessoal bem como proposicional; (ii) universal bem como contextual; (iii) final bem como presente. A) Como discípulos de Cristo, somos chamados para ser pessoas da verdade. 1. Nós devemos viver a verdade. Viver a verdade é ser a face de Jesus, através de quem a glória do evangelho é revelada a mentes cegas. As pessoas verão a verdade na face daqueles que vivem suas vidas para Jesus, em fidelidade e amor. 2. Nós devemos proclamar a verdade. A proclamação oral da verdade do evangelho continua fundamental em nossa missão. Não pode ser separada do viver a verdade na prática. Palavras e obras devem caminhar juntas. B) Nós apelamos aos líderes da igreja, pastores e evangelistas que preguem e ensinem o evangelho bíblico na sua plenitude, como Paulo fez, na totalidade do seu escopo e da sua verdade cósmicos. Devemos apresentar o 20 evangelho não apenas como uma oferta individual de salvação nem como uma solução às necessidades que seja melhor do que os outros deuses podem oferecer, mas como plano de Deus em Cristo para todo o universo. Às vezes, as pessoas vêm a Cristo para satisfazer determinada necessidade pessoal, mas permanecem com Cristo quando encontram nele a verdade. 2. A verdade e o desafio do pluralismo A pluralidade cultural e religiosa é um fato e os cristãos da Ásia, por exemplo, convivem com isso há séculos. Cada uma das diferentes religiões afirma que o seu caminho é o da verdade. A maioria procura respeitar as diferentes declarações da verdade de outras crenças e convive com elas. Entretanto, o pluralismo relativista pós-moderno é diferente. Sua ideologia não permite a verdade universal ou absoluta. Embora tolere as declarações da verdade, as vê apenas como conceitos culturais (Esta posição é logicamente autodestrutiva. pois afirma como única verdade absoluta que não há verdade absoluta única). Tal pluralismo reivindica a “tolerância” como um valor fundamental, mas pode tomar formar opressivas em países onde o secularismo ou o ateísmo agressivo governam a arena pública. A) Esperamos ver um comprometimento maior com o duro trabalho da apologética consistente. Isso deve acontecer em dois níveis. 1. Precisamos identificar, preparar e orar por aqueles que podem se envolver na discussão e na defesa da verdade bíblica nos altos níveis públicos e intelectuais da arena pública. 2. Nós apelamos aos líderes da igreja e pastores para que equipem todos os crentes com a coragem e com as ferramentas para que relacionem a verdade com relevância profética nas conversas pública de todo dia, e também para que se envolvam em todos os aspectos da cultura em que vivemos. 3. A Verdade e o local de trabalho Na Bíblia vemos a verdade de Deus a respeito do trabalho humano, como parte do bom propósito de Deus na criação. A Bíblia traz para a esfera de ministério, todo o trabalho que executamos, como serviço para Deus em diferentes vocações. Por outro lado, a falsidade da “divisão entre secular e sagrado” tem permeado o pensamento e o comportamento da Igreja. Essa divisão nos diz que a atividade religiosa pertence a Deus, ao contrário do que acontece com outras atividades. A maioria dos cristãos passa quase todo o seu tempo no trabalho, que consideram de baixo valor espiritual (o chamado trabalho secular). Mas Deus é Senhor de toda a vida. “Tudo o que fizerem, façam de todo coração, como para o Senhor, e não para homens”58, Paulo falou, dirigindo-se a escravos no local de trabalho pagão. Apesar da enorme oportunidade de evangelismo e transformação no local de trabalho, onde adultos cristãos têm a maioria dos seus relacionamentos com não cristãos, poucas igrejas têm a visão de preparar sua congregação para aproveitar essa oportunidade. Falhamos em considerar o trabalho propriamente dito como intrínseca e biblicamente importante, pois falhamos em colocar a totalidade da nossa vida sob o Senhorio de Cristo. A) Consideramos esta divisão entre santo e secular um grande obstáculo para a mobilização de todo o povo de Deus na missão de Deus e convocamos os cristãos em todo o mundo a que rejeitem essa pressuposição não bíblica e resistam aos seus efeitos maléficos. Nós desafiamos a tendência de encarar ministério e 58 Colossenses 3:23. 21 missão (local e transcultural) como um trabalho principalmente de ministros e missionários pagos pela igreja, que correspondem a uma porcentagem muito pequena de todo o corpo de Cristo. B) Nós desafiamos todos os crentes a aceitar e confirmar como seu próprio ministério e missão diária, qualquer local para onde Deus os tenha chamado. Desafiamos pastores e líderes de igrejas a apoiar a congregação neste ministério – nas comunidades e nos locais de trabalho – “a preparar os santos para obra de ministério” – em todas as áreas de suas vidas. C) Precisamos concentrar esforços no treinamento de todo o povo de Deus para a vida de discipulado, que significa viver, pensar, trabalhar e falar a partir de uma perspectiva bíblica e com eficiência missionária em todo lugar e em toda circunstância da vida diária e do trabalho. Cristãos com diferentes habilidades, ofícios, negócios e profissões têm acesso a lugares onde tradicionais plantadores de igreja e evangelistas não têm. O que esses “fazedores de tendas” e profissionais fazem no local de trabalho deve ser valorizado como parte do ministério das igrejas locais. D) Nós apelamos aos líderes da igreja que compreendam o impacto estratégico do ministério no local de trabalho e que mobilizem, preparem e enviem os membros de sua igreja como missionários no local de trabalho, tanto em suas comunidades locais como em países que estão fechados para as formas tradicionais de testemunho do evangelho. E) Nós apelamos aos líderes missionários que integrem completamente os “fazedores de tenda” na estratégia missionária global. 4. A verdade e a mídia globalizada Nós nos comprometemos com um novo envolvimento critico e criativo com a mídia e com a tecnologia, como parte da defesa da verdade de Cristo em nossas culturas das mídias. Devemos fazer isso como embaixadores de Deus da verdade, da graça, do amor, da paz e da justiça. Nós identificamos as seguintes principais necessidades: A) Consciência de mídia: ajudar as pessoas a desenvolver uma consciência mais crítica a respeito das mensagens que recebem e da visão de mundo por trás delas. A mídia pode ser neutra e, às vezes, favorável ao evangelho. Mas também é usada para pornografia, violência e ganância. Nós incentivamos pastores e igrejas a enfrentar essas questões abertamente e a providenciar ensinamento e orientação a fim de que os cristãos resistam a tais pressões e tentações. B) Presença na mídia: desenvolver comunicadores e exemplos cristãos verdadeiros, autênticos e dignos de confiança para a mídia jornalística em geral e de entretenimento, e recomendar essas carreiras com um meio digno de influência para Cristo. C) Ministérios de mídia: desenvolver usos criativos, associados e interativos das mídias “tradicional”, “antiga” e “nova” para comunicar o evangelho de Cristo no contexto de uma cosmovisão bíblica e holística. 5. A verdade e a arte em missões Nós possuímos o dom da criatividade, pois somos feitos à imagem de Deus. A arte em suas várias formas é parte integral do que fazemos como humanos e pode refletir algo da beleza e da verdade de Deus. Os artistas, no seu melhor, são narradores da verdade e por isso a arte 22 constitui um meio importante através do qual podemos comunicar a verdade do evangelho. O teatro, a dança, a história, a música e as artes plásticas podem expressar a realidade de nossa condição de perdidos e a esperança, firmada no evangelho, de que tudo pode ser novo. No mundo das missões, a arte é um recurso ainda não explorado. De maneira ativa, nós incentivamos um envolvimento maior dos cristãos com a arte. A) Nós ansiamos ver a Igreja, em todas as culturas, usando amplamente as artes como um contexto para missões: 1. Trazendo a arte de volta para a vida da comunidade de fé como um elemento válido e valioso do nosso chamado para o discipulado; 2. Apoiando aqueles que possuem dons artísticos, principalmente as irmãs e os irmãos em Cristo, para que eles possam florescer no seu trabalho; 3. Permitindo que a arte sirva com um ambiente acolhedor no qual possamos reconhecer e conhecer o próximo e o estrangeiro; 4. Respeitando as diferenças culturais e valorizando expressões artísticas naturais do país. manipular, distorcer ou destruir, mas para preservar e permitir a completude de nossa humanidade, como aqueles que Deus criou conforme a sua imagem. Nós convocamos: A) Os líderes de igrejas locais para (i) incentivar, apoiar e questionar os membros da igreja que estejam profissionalmente engajados na ciência, tecnologia, saúde e políticas públicas, e (ii) para mostrar aos estudantes com base teológica a necessidade de cristãos que estejam presentes nessas arenas. B) Os seminários a incluir essas matérias em seus currículos, a fim de que os futuros líderes da igreja e os educadores teológicos desenvolvam uma crítica cristã bem informada sobre as novas tecnologias. C) Os teólogos e cristãos das áreas governamentais, empresariais, acadêmicas e técnicas para formar “think tanks” (usina de idéias) nacionais ou regionais, ou parcerias para engajamento com novas tecnologias e para orientar a formulação de políticas públicas com uma voz bíblica e pertinente. D) Todas as comunidades cristãs locais para demonstrar respeito pela dignidade singular e pela santidade da vida humana, através do cuidado prático e holístico, que integre os aspectos físico, emocional, relacional e espiritual de nossa humanidade criada. 6. A verdade e as tecnologias emergentes 7. A verdade e as arenas públicas Este século é amplamente conhecido como o “Século Biotech”, com avanços em todas as tecnologias emergentes (bio, info/digital, nano, realidade virtual, inteligência artificial e robótica). Este fato tem grandes implicações para a Igreja e para as missões, principalmente em relação à verdade bíblica sobre o que significa ser humano. Precisamos promover respostas autenticamente cristãs e ações práticas na arena de políticas públicas, para assegurar que a tecnologia não seja usada para As esferas interligadas das áreas Governamental, Empresarial e Acadêmica têm forte influência sobre os valores de cada nação e, em termos humanos, definem a liberdade da Igreja. A) Nós incentivamos os seguidores de Cristo a estarem ativamente envolvidos nessas esferas, tanto do serviço público como empresarial, a fim de moldar valores sociais e influenciar o 23 debate público. Nós incentivamos o apoio às escolas e universidades cristocêntricas que sejam comprometidas com a excelência acadêmica e com a verdade bíblica. B) A corrupção é condenada na Bíblia. Ela debilita o desenvolvimento econômico, distorce processos decisórios justos e destrói a coesão social. Nenhuma nação está livre da corrupção. Convidamos os cristãos nos locais de trabalho, principalmente os jovens empreendedores, a refletir de maneira criativa sobre a melhor maneira de se posicionarem contra este flagelo. C) Nós incentivamos os jovens acadêmicos cristãos a considerar uma carreira de longo prazo em universidades seculares, para (i) ensinar e (ii) desenvolver suas disciplinas a partir de uma perspectiva bíblica, e assim influenciar seu campo de ensino. Não nos atrevemos a negligenciar o meio acadêmico59. IIB CONSTRUINDO A PAZ DE CRISTO EM NOSSO MUNDO DIVIDIDO E FERIDO 1. A paz que Cristo promoveu Não se pode separar a reconciliação com Deus da reconciliação de uns com os outros. Cristo, que é a nossa paz, trouxe a paz através da cruz, e pregou a paz para o mundo dividido dos judeus e dos gentios. A unidade do povo de Deus é tanto um fato (“de dois ele fez um”) como um mandamento (“façam todo o esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz”). O plano de Deus para a integração de toda criação em Cristo está moldada na reconciliação étnica da nova 59 Pois ‘a universidade é nitidamente o sustentáculo utilizado para mover o mundo. Não há melhor maneira da Igreja prestar serviço a si mesma e à causa do evangelho do que procurar resgatar as universidades para Cristo. Não há recurso mais poderoso: mude a universidade e você mudará o mundo.’ Charles Habib Malik, ex-presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas em 1981, Pascal Lectures, A Christian Critique of the University. humanidade de Deus. Este é o poder do evangelho conforme prometido a Abraão60. Nós afirmamos que, embora os judeus conhecessem as alianças e promessas de Deus, pela forma como Paulo descreve os gentios, entende-se que eles ainda precisam de reconciliação com Deus através do Messias Jesus. Não existe diferença, afirmou Paulo, entre judeu e gentio em relação ao pecado, nem existe diferença de salvação. Somente na cruz e através dela que os dois podem ter acesso ao Deus Pai através do mesmo Espírito61. A) Continuamos, portanto, declarando enfaticamente a necessidade de toda a Igreja compartilhar com o povo judeu as boas novas de Jesus como Messias, Senhor e Salvador. E no mesmo espírito de Romanos 14-15, instamos os crentes gentios a aceitar, incentivar e orar pelos crentes judeus messiânicos, no seu testemunho entre o seu próprio povo. A reconciliação com Deus e uns com os outros é também o fundamento e a motivação da busca pela justiça que Deus requer, sem a qual, Deus afirma, não é possível haver paz. A reconciliação verdadeira e duradoura demanda reconhecimento do pecado, passado e presente, arrependimento diante de Deus, confissão para com a parte ferida, e a busca e o recebimento do perdão. Também inclui compromisso da Igreja com a busca pela justiça ou reparação, quando apropriado, aos que tenham sido atingidos pela violência e pela opressão. B) Nós ansiamos ver a Igreja de Cristo em todo o mundo, os que foram reconciliados com Deus, colocando em prática essa reconciliação uns com os outros e comprometidos com a tarefa e 60 Efésios 1:10; 2:1-16; 3:6; Gálatas 3:6-8. Ver também a Seção VI sobre a questão de unidade e parceria dentro da Igreja. 61 Efésios 2:11-22; Romanos 3:23; 10:12-13; Efésios 2:18. 24 com a luta pela pacificação bíblica em nome de Cristo. 2. A paz de Cristo no conflito étnico A diversidade étnica é dádiva e plano de Deus na criação62. Ela foi corrompida pelo pecado e pelo orgulho humano, resultando em confusão, conflito, violência e guerra entre as nações. No entanto, a diversidade étnica será preservada na nova criação, quando pessoas de toda a nação, tribo, povo e língua se reunirão como povo redimido de Deus63. Nós confessamos que muitas vezes não levamos a sério a identidade étnica e não a valorizamos, assim como a Bíblia faz, na criação e na redenção. Deixamos de respeitar a identidade étnica dos outros e ignoramos as feridas profundas que causadas por desrespeito tão duradouro. A) Nós apelamos aos pastores e líderes de igreja a que ensinem a verdade bíblica a respeito da diversidade étnica. Devemos ratificar positivamente a identidade étnica de todos os membros da igreja. Mas também devemos mostrar como nossas lealdades étnicas estão manchadas pelo pecado e ensinar os crentes que todas as nossas identidades étnicas estão subordinadas à nossa identidade redimida como nova humanidade em Cristo através da cruz. Reconhecemos com tristeza e vergonha a cumplicidade de cristãos em alguns dos acontecimentos mais devastadores de violência étnica e opressão, e o lamentável silêncio de grande parte da Igreja no decorrer dos conflitos. Tais conflitos incluem o legado do racismo e da escravidão negra; o holocausto contra os judeus; o apartheid; a “limpeza étnica”; a violência sectária entre cristãos; a dizimação de populações indígenas; a violência 62 inter-religiosa, política e étnica; o sofrimento palestino; as castas oprimidas e o genocídio tribal. Os cristãos que, por ação ou omissão, agravam o sofrimento do mundo, comprometem seriamente nosso testemunho do evangelho de paz. Portanto: B) Por causa do evangelho, lamentamos, e chamamos ao arrependimento os cristãos que têm participado da violência étnica, da injustiça e da opressão. Também chamamos ao arrependimento os cristãos que muitas vezes foram cúmplices de tais males, através do silêncio, da apatia ou de presumida neutralidade ou ainda oferecendo falsa justificativa teológica para tais atos. Se o evangelho não estiver profundamente enraizado nos contextos, desafiando e transformando cosmovisões subjacentes e sistemas de injustiça, então, quando vier o dia mau, a fidelidade cristã será descartada como uma capa indesejada e as pessoas voltarão aos antigos compromissos e atos pecaminosos. A evangelização sem discipulado, ou o avivamento sem obediência radical aos mandamentos de Cristo, não são apenas deficientes, são perigosos. Nós ansiamos pelo dia em que a Igreja será para o mundo o mais brilhante e visível modelo de reconciliação étnica e sua defensora mais presente na resolução de conflitos, Tal aspiração, enraizada no evangelho, nos chama a: C) Abraçar a plenitude do poder reconciliador do evangelho e ensiná-lo conformemente.Isso inclui um completo entendimento bíblico da expiação: que Jesus não apenas carregou nossos pecados na cruz para nos reconciliar com Deus, mas destruiu nossa inimizade, para nos reconciliar uns com os outros. Deuteronômio 32:8; Atos 17:26. Apocalipse 7:9; 21:3, onde se lê, “eles serão os seus povos” (plural). 63 25 D) Adotar o estilo de vida de reconciliação. Em termos práticos, isso é demonstrado quando os cristãos: 1. Perdoam os perseguidores, embora tenham coragem para desafiar a injustiça em favor de outros; 2. Prestam socorro e oferecem hospitalidade ao próximo que está “do outro lado do conflito”, tomando a iniciativa de transpor as barreiras e buscar a reconciliação; 3.Persistem no testemunho de Cristo em contextos de violência; e estão dispostos a suportar o sofrimento e até mesmo a morte, em vez de tomar parte em atos de destruição ou vingança; 4. Envolvem-se no longo processo de cura de feridas depois do conflito, fazendo da Igreja um lugar seguro para refúgio e cura para todos, inclusive para antigos inimigos. E) Ser farol e portador da esperança. Nós damos testemunho de Deus que estava em Cristo reconciliando consigo o mundo. Somente no nome de Cristo e na vitória da sua cruz e ressurreição que temos autoridade para confrontar poderes demoníacos do mal que agravam conflitos humanos e poder para ministrar sua reconciliação e paz. 3. A paz de Cristo para o pobre e oprimido O fundamento bíblico do nosso compromisso de buscar justiça e shalom para o pobre e oprimido está sintetizado na seção 7 (c) da Confissão da Cidade do Cabo. Com base nisso, esperamos uma ação mais efetiva da Igreja nas seguintes questões: Escravidão e tráfico humano Existem hoje mais pessoas escravizadas em todo o mundo (estima-se 27 milhões de pessoas) do que há 200 anos, quando Wilberforce lutou pela abolição do tráfico de escravos no Atlântico. Somente na Índia, estima-se que haja 15 milhões de crianças escravizadas. O sistema de castas oprime grupos de castas inferiores e exclui os Dalits. Mas infelizmente, em muitos lugares, a Igreja cristã em si está infectada com as mesmas formas de discriminação. As vozes da Igreja global devem se erguer em protesto uníssono contra o que, na verdade, é um dos sistemas de escravidão mais antigos do mundo. Mas para que esta defesa global tenha autenticidade, a Igreja deve rejeitar toda e qualquer desigualdade e discriminação dentro de si mesma. A migração em escala sem precedentes no mundo de hoje, por diversas razões, tem levado ao tráfico humano a todos os continentes, à escravidão generalizada de mulheres e crianças no comércio sexual e ao abuso de crianças através do trabalho forçado ou alistamento militar. A) Vamos nos erguer como a Igreja mundial, para combater o mal do tráfico humano e falar e agir profeticamente para “libertar os cativos”. Isso deve incluir a abordagem dos fatores sociais, econômicos e políticos que alimentam esse comércio. Os escravos em todo o mundo apelam à Igreja de Cristo: “Libertem nossas crianças. Libertem nossas mulheres. Sejam a nossa voz. Mostrem-nos a nova sociedade que Jesus prometeu”. Pobreza Nós abraçamos o testemunho de toda a Bíblia, visto que ela mostra o desejo de Deus, tanto para a justiça econômica sistêmica, quanto para a compaixão pessoal, para o respeito e a generosidade com o pobre e necessitado. Alegramo-nos, pois este ensinamento bíblico abrangente tornou-se mais integrado em nossa 26 prática e estratégia missionária, como era para a Igreja primitiva e para o Apóstolo Paulo64. sociedade como na Igreja. Deus nos chama para a justiça, a amizade, o respeito e o amor mútuos. Assim, vamos: B) Reconhecer a grande oportunidade que os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio representam para a igreja local e global. Apelamos para que as igrejas advoguem por eles junto aos governos e que participem dos esforços para eles sejam alcançados, como o Desafio Miquéias. C) Ter coragem de declarar que o mundo não consegue tratar, muito menos resolver, o problema da pobreza sem também desafiar a ganância e a riqueza excessiva. O evangelho desafia a idolatria do consumismo desenfreado. Somos chamados, como servos a Deus e não de mamon, a reconhecer que a ganância perpetua a pobreza e devemos renunciá-la. Ao mesmo tempo, nos alegramos, pois o evangelho inclui o rico no seu apelo ao arrependimento e o convida a juntar-se em comunhão àqueles que foram transformados pela graça perdoadora. 4. A paz de Cristo para as pessoas com deficiência As pessoas com algum tipo de deficiência formam um dos maiores grupos minoritários do mundo, com uma estimativa que excede os 600 milhões. A maioria delas vive nos países menos desenvolvidos e são as mais pobres entre as mais pobres. Apesar da deficiência física ou mental fazer parte da sua experiência diária, a maioria é incapacitada por atitudes sociais, por injustiça ou pela falta de acesso a recursos. Servir às pessoas com deficiência não se limita a lhes oferecer atendimento médico ou serviço social; envolve lutar ao seu lado, ao lado dos que lhes prestam cuidados e ao lado de suas famílias, por inclusão e igualdade, tanto na 64 Atos 4:32-37; Gálatas 2:9-10; Romanos 15:23-29; 2 Coríntios 8-9. A) Vamos nos erguer como cristãos em todo mundo para rejeitar estereótipos culturais, pois como comentou o Apóstolo Paulo, “a ninguém mais consideramos do ponto de vista humano”65. Feitos à imagem de Deus, todos nós temos dons que Deus pode usar no seu serviço. Nós nos comprometemos a ministrar às pessoas com deficiências, e receber delas a ministração que elas têm para dar. B) Nós incentivamos igrejas e líderes de missões a pensar não apenas em missões entre aqueles com deficiências, mas a reconhecer, afirmar e facilitar o chamado missionário de cristãos que possuam deficiências, como parte do Corpo de Cristo. C) Nós nos entristecemos, pois tantas pessoas com deficiência ouvem que sua deficiência é resultante de pecado pessoal, falta de fé ou de relutância para ser curado. Nós negamos que a Bíblia ensine isso como uma verdade universal66. Tal falso ensinamento é pastoralmente insensível e espiritualmente incapacitante; acrescenta o peso de culpa e de esperanças frustradas a outras barreiras que as pessoas com deficiência enfrentam. D) Nós nos comprometemos a fazer das nossas igrejas locais de inclusão e igualdade para pessoas com deficiência e a nos posicionar ao lado delas resistindo ao preconceito e advogando pelas suas necessidades na sociedade em geral. 65 66 2 Coríntios 5:16. João 9:1-3. 27 5. A paz de cristo para as pessoas que vivem com o HIV O HIV e AIDS constituem um grande problema em muitas nações. Milhões de pessoas estão infectadas com o HIV, muitos, inclusive, em nossas igrejas, e milhões de crianças são órfãs devido à AIDS. Deus está nos chamando para mostrar o seu profundo amor e compaixão a todos os que já foram infectados ou afetados pelo HIV e AIDS e a concentrar esforços para salvar vidas. Nós acreditamos que o ensinamento e o exemplo de Jesus, assim como o poder transformador da sua cruz e ressurreição, são essenciais para a resposta holística do evangelho para o vírus HIV e AIDS, que nosso mundo precisa tão urgentemente. A) Nós repudiamos e denunciamos toda forma de condenação, hostilidade, estigma e discriminação contra aqueles que vivem com o HIV e a AIDS. Tais atos são pecado e desgraça dentro do corpo de Cristo. Todos nós pecamos e fomos destituídos da glória de Deus; fomos salvos somente pela graça e devemos ser tardios para julgar e rápidos para restaurar e perdoar. Também reconhecemos com tristeza e compaixão que muitos são infectados com o HIV, não o fazem por erro próprio, mas, muitas vezes, por cuidarem de outros infectados. B) Nós desejamos que todos os pastores estabeleçam um exemplo de castidade e fidelidade sexual, como Paulo ordenou, e que ensinem, com frequência e clareza, que o casamento é o lugar exclusivo para a união sexual. Isso é necessário não apenas por ser o claro ensino da Bíblia, mas também porque a prevalência de parceiros sexuais simultâneas fora do casamento é um fator importante na rápida disseminação do HIV nos países mais afetados. C) Vamos, como Igreja em todo o mundo, nos levantar para este desafio em nome de Cristo e no poder do Espírito Santo. Vamos nos unir a outros irmãos e irmãs em Cristo nas áreas mais atingidas pelo HIV e AIDS, por meio de apoio prático, cuidado compassivo (incluindo o cuidado com as viúvas e os órfãos), defesa social e política, programas de educação (principalmente aqueles que orientam mulheres), e estratégias de prevenção eficazes, apropriadas para o contexto local. Nós nos comprometemos com esta ação profética e urgente, como parte da missão integral da Igreja. 6. A paz de Cristo para sua criação em sofrimento Nosso mandamento bíblico em relação à criação de Deus é apresentado na seção 7 (A) da Confissão de Fé da Cidade do Cabo. Todos os seres humanos devem ser mordomos da rica abundância da boa criação de Deus. Estamos autorizados a exercer o domínio piedoso ao usá-la tendo em vista o bem estar do ser humano e suas necessidades, por exemplo, na agricultura, pesca, mineração, geração de energia, engenharia, construção, comércio e medicina. Ao fazermos isso, também recebemos a ordem de cuidar da terra e de todas as suas criaturas, porque a terra pertence a Deus e não a nós. Fazemos isso por amor ao Senhor Jesus Cristo, que é o criador, dono, sustentador, redentor e herdeiro de toda criação. Lamentamos pelo abuso generalizado e pela destruição dos recursos da terra, inclusive de sua biodiversidade. Provavelmente o desafio mais urgente e importante enfrentado pelo mundo físico hoje seja a ameaça das mudanças climáticas. Ela afetará de maneira desproporcional os que vivem nos países pobres, pois é lá que os eventos climáticos extremos serão mais severos e onde há pouca capacidade de adaptação a eles. A pobreza mundial e as mudanças climáticas devem ser tratadas em conjunto e com a mesma urgência. 28 Incentivamos os cristãos em todo mundo a: A) Adotar estilos de vida que renunciem hábitos de consumo destrutivos ou poluentes; B) Exercer meios legítimos para persuadir os governos a colocar imperativos morais acima de interesses políticos em questões relacionadas à destruição ambiental e à mudança climática em potencial. C) Reconhecer e incentivar o chamado missionário tanto de (i) cristãos envolvidos no uso apropriado dos recursos da terra para as necessidades humanas e o bem comum através da agricultura, indústria e medicina, como de (ii) cristãos que se dedicam à proteção e restauração dos habitats da terra e das espécies por meio da conservação e defesa. Ambos compartilham o mesmo objetivo, pois ambos servem o mesmo Criador, Provedor e Redentor. IIC VIVENDO O AMOR DE CRISTO ENTRE PESSOAS DE OUTRAS CRENÇAS 1. “Ame o seu próximo como a si mesmo” inclui pessoas de outras crenças. Em vista das afirmações feitas na seção 7 (d) da Confissão de Fé da Cidade do Cabo; nós respondemos ao nosso chamado como discípulos de Jesus Cristo para ver pessoas de outras crenças como nossos próximos, no sentido bíblico. Eles são seres humanos criados à imagem de Deus, a quem Deus amou e por cujos pecados Cristo morreu. Nós nos esforçamos, não apenas para vê-los como nosso próximo, mas para obedecer ao ensinamento de Cristo sendo para eles o seu próximo. Somos chamados para ser gentis, mas não ingênuos; para discernir e não para ser simplórios, para estar atentos a qualquer ameaça que possamos enfrentar, mas não para sermos governados pelo medo. Nós somos chamados para compartilhar as boas novas através do evangelismo, mas não nos envolver em proselitismo indigno. O evangelismo, que inclui argumentação racional convincente, seguindo o exemplo do Apóstolo Paulo, é “fazer uma declaração franca e aberta do evangelho que deixe os ouvintes inteiramente livres para formar sua própria opinião”. Desejamos ser sensíveis aos de outras crenças e rejeitamos qualquer abordagem que vise forçar a sua conversão”67. Proselitismo, pelo contrário, é a tentativa de obrigar outros a se tornarem “um de nós”, para “que aceitem nossa religião”, ou mesmo a se “juntem à nossa denominação”. A) Nós nos comprometemos a ser escrupulosamente éticos em nosso evangelismo. Nosso testemunho deve ser marcado por “mansidão e respeito, conservando boa consciência”68. Por isso, rejeitamos qualquer forma de testemunho que seja coercitivo, antiético, enganoso ou desrespeitoso. B) Em nome do Deus do amor, nós nos arrependemos por não procurar criar laços de amizade com muçulmanos, hindus, budistas e pessoas de outras religiões. No espírito de Jesus, tomaremos a iniciativa de demonstrar amor, boa vontade e hospitalidade para com eles. C) Em nome do Deus da verdade, nos (i) recusamos a divulgar mentiras e caricaturas de outras crenças e (ii) denunciamos e resistimos ao preconceito racista, ao ódio e ao medo incitado na mídia popular e na retórica política. D) Em nome do Deus da paz, nós rejeitamos o caminho da violência e da vingança em todas as nossas relações com pessoas de outras crenças, mesmo quando violentamente atacados. 67 68 O Manifesto de Manila, Parágrafo 12 1 Pedro 3:15-16. Compare Atos 19:37. 29 E) Nós afirmarmos que o local apropriado para diálogo com pessoas de outras crenças são os lugares públicos, como fez Paulo ao debater com judeus e gentios em sinagogas e arenas. Este diálogo é parte legítima da nossa missão cristã e combina a confiança na unicidade de Cristo e na verdade do evangelho com a capacidade de respeitosamente ouvir outros. 2. O amor de Cristo nos chama ao sofrimento e até a morrer pelo evangelho O sofrimento pode ser necessário em nosso envolvimento missionário como testemunhas de Cristo, como foi para os seus apóstolos e para os profetas do Antigo Testamento69. Estar disposto a sofrer é um teste difícil para a genuinidade da nossa missão. Deus pode usar o sofrimento, a perseguição e o martírio para avançar sua missão. “O martírio é uma forma de testemunho pela qual Cristo prometeu honra especial”70. Muitos cristãos que vivem no conforto e na prosperidade precisam ouvir novamente o chamado de Cristo para estarem dispostos a morrer por ele. Pois muitos outros crentes vivem em meio a tal sofrimento, pagando o custo de testemunhar de Jesus Cristo em uma cultura religiosa hostil. Eles podem ter visto seus queridos martirizados, passando por tortura ou perseguição por causa da sua obediência fiel e mesmo assim continuam a amar aqueles que os feriram. A) Nós ouvimos e lembramos com lágrimas e orações os testemunhos daqueles que sofrem pelo evangelho. Oramos por graça e coragem, juntamente com eles, para “amar nossos inimigos” como Cristo nos ordenou. Oramos para que o evangelho dê frutos em lugares que são tão hostis aos seus mensageiros. Ao lamentarmos com razão por aqueles que sofrem, devemos nos lembrar da infinita tristeza de Deus por causa daqueles que 69 70 2 Coríntios 12:9-10; 4:7-10. O Manifesto de Manila, §12. resistem e rejeitam seu amor, seu evangelho e seus servos. Desejamos ardentemente que eles se arrependam, sejam perdoados e encontrem a alegria de estar reconciliado com Deus. 3. O amor em ação personifica e manifesta o evangelho da graça “Somos o aroma de Cristo”71. Nosso chamado é para viver entre pessoas de outras religiões de maneira que elas fiquem tão saturadas com a fragrância da graça de Deus que sintam o cheiro de Cristo, e venham experimentar e ver que Deus é bom. Com este amor personificado, faremos o evangelho atraente em qualquer contexto cultural e religioso. Quando os cristãos amam pessoas de outras crenças através de vidas de amor e atos de serviço, eles personificam a graça transformadora de Deus. Em culturas de “honra”, onde a vergonha e a vingança estão aliadas ao legalismo religioso, a “graça” é um conceito estranho. Nestes contextos, o amor de Deus, vulnerável e sacrificial não deve ser debatido; ele é considerado muito estranho, até repulsivo. A graça é um sabor a ser assimilado no decorrer do tempo, em pequenas doses, para os que tenham fome suficiente e se atrevam a experimentar. O aroma de Cristo permeia gradativamente tudo aquilo com o que seus seguidores entram em contato. A) Nós ansiamos para que Deus levante mais homens e mulheres da graça, que assumam compromissos de longo prazo para viver, amar e servir em lugares difíceis, dominados por outras religiões, para levar o aroma e o sabor da graça de Jesus Cristo para culturas onde isso é indesejável e perigoso. Isso requer paciência, perseverança e, às vezes o tempo de uma vida inteira e, por vezes, até a morte. 71 2 Coríntios 2:15. 30 4. O amor respeita a diversidade de discipulado vista, e manter conversas sem estridência nem condenação mútua74. Os chamados “movimentos internos” podem ser encontrados dentro de várias religiões. São grupos de pessoas que agora seguem a Jesus como seu Deus e Salvador. Elas se encontram em pequenos grupos para comunhão, ensino, adoração e oração centrados em Jesus e na Bíblia, ao mesmo tempo em que continuam a viver social e culturalmente dentro das suas comunidades, observando, inclusive, alguns de seus elementos religiosos. Este é um fenômeno 5. O amor alcança os povos dispersos complexo e existe muita discordância a respeito de como reagir a ele. Alguns recomendam tais movimentos. Outros alertam quanto ao perigo do sincretismo. Sincretismo, entretanto, é um perigo encontrado entre cristãos em qualquer lugar, ao expressarmos nossa fé dentro de nossas próprias culturas. Devemos evitar a tendência, quando vemos Deus agindo de maneira inesperada ou desconhecida, de, (i) apressadamente classificar e promover como uma nova estratégia missionária, ou (ii) condenar apressadamente, sem um sensível estudo contextual. A) No espírito de Barnabé, que ao chegar em Antioquia, “vendo a graça de Deus, ficou alegre e os animou a permanecerem fiéis ao Senhor”72, apelamos a todos que estão preocupados com esta questão a: 1. Tomar a decisão e prática apostólica como importante princípio para orientação: “não devemos por dificuldades aos gentios que estão se convertendo a Deus”73. Nunca houve tanta movimentação de povos. A migração é uma das realidades globais mais importantes da nossa era. Estima-se que 200 milhões de pessoas vivam fora de seus países de origem, voluntária ou involuntariamente. O termo “diáspora” é usado aqui para se referir a pessoas que, por alguma razão, tenham se deslocado da sua terra natal. Um grande número de pessoas, de várias religiões, inclusive cristãos, vive em condições de diáspora: migrantes econômicos em busca de trabalho; pessoas que foram desalojadas devido a guerra ou desastres naturais, refugiados e os que buscam asilo político; vítimas de limpeza étnica; pessoas que fogem de violência e perseguição religiosa; aqueles que sofrem com a fome – seja causada pela seca, por enchentes ou guerra; vítimas de pobreza rural que se mudam para centros urbanos. Estamos convencidos de que as migrações contemporâneas estão sujeitas ao propósito missional de Deus, sem ignorar o mal e o sofrimento que pode estar envolvido75. A) Nós incentivamos a Igreja e os líderes de missões a reconhecer e responder às oportunidades missionárias apresentadas pela migração global e pelas comunidades em diáspora, com planejamento estratégico, treinamento específico e recursos para aqueles que são chamados para trabalhar entre os que estão em diáspora. 2. Exercer a humildade, a paciência e a bondade para reconhecer a diversidade de pontos de B) Nós incentivamos os cristãos nos países que acolhem comunidades de imigrantes de outras religiões ao testemunho transcultural do amor de Cristo, por meio de palavras e ações, através da obediência aos mandamentos bíblicos de amar o estrangeiro e defender sua causa, de 72 74 73 Atos 11:20-24. Atos 15:19. 75 Romanos 14:1-3. Gênesis 50:20. 31 visitar os que estão na prisão, de praticar a hospitalidade, desenvolver amizades, de convidá-los às suas casas e de oferecer ajuda e assistência76. C) Nós incentivamos os cristãos que fazem parte de comunidades em diáspora a discernir a mão de Deus, mesmo em circunstâncias que eles não tenham escolhido, e a buscar qualquer oportunidade que Deus oferece para testemunhar de Cristo em suas comunidades anfitriãs e contribuir para sua prosperidade77. Sempre que houver no país anfitrião igrejas cristãs, nós apelamos às igrejas imigrantes e nativas a que ouçam e aprendam umas com as outras, e iniciem esforços cooperativos para alcançar com o evangelho todos os setores da nação. 6. O Amor trabalha pela liberdade religiosa para todos O apoio aos direitos humanos através da defesa da liberdade religiosa não é incompatível quando, diante da perseguição, escolhe-se seguir o caminho da cruz. Não há contradição entre estar pessoalmente disposto a sofrer abuso ou perda dos nossos próprios direitos por amor de Cristo e estar comprometido a ser defensor e porta-voz dos que estão emudecidos diante da violação dos seus direitos humanos. Devemos também discernir entre a defesa os direitos de pessoas de outras religiões e o endosso à verdade de suas crenças. Podemos defender a liberdade religiosa de outros e a prática da sua religião sem aceitar essa religião como verdadeira. A) Esforcemo-nos por alcançar a liberdade religiosa para todos os povos. Isso implica em interceder, junto aos governos, pelos cristãos e pelas pessoas de outras religiões que passam por perseguição. B) Vamos obedecer conscientemente o ensinamento bíblico de ser bons cidadãos, de buscar a prosperidade da nação onde vivemos, de honrar e orar pelas autoridades, de pagar impostos, de fazer o bem e de procurar viver em paz e tranquilidade. O cristão é chamado para submeter-se ao Estado, a menos que o Estado exija o que Deus proíbe, ou proíba o que Deus ordena. Se o Estado, portanto, nos obriga a escolher entre a lealdade a ele e nossa lealdade maior a Deus, devemos dizer “Não” ao Estado porque dissemos “Sim” a Jesus Cristo como Senhor78. Em meio a todos nossos esforços legítimos pela liberdade religiosa para todas as pessoas, o desejo mais profundo de nossos corações continua sendo que todos venham a conhecer o Senhor Jesus Cristo, que livremente depositem nele sua fé e sejam salvos e que entrem no reino de Deus. IID DISCERNINDO A VONTADE DE CRISTO PARA A EVANGELIZAÇÃO MUNDIAL 1. Os povos não alcançados e não incluídos O coração de Deus deseja que todos tenham acesso ao conhecimento do amor de Deus e da sua obra salvadora através de Jesus Cristo. Reconhecemos com tristeza e vergonha que há milhares de grupos de povos em todo o mundo aos quais esse acesso ainda não foi disponibilizado através do testemunho cristão. Estes são os povos não alcançados, no sentido de que não há entre eles igrejas ou pessoas reconhecidamente cristãs. Muitos desses povos também são não incluídos, no sentido de que atualmente não temos conhecimento de 76 Levítico 19:33-34; Deuteronômio 24:17; Ruth 2; Jó 29:16; Mateus 25:35-36; Lucas 10:25-37; 14:12-14; Romanos 12:13; Hebreus 13:2-3; 1 Pedro 4:9. 77 Jeremias 29:7. 78 Jeremias 29:7; 1 Pedro 2:13-17; 1 Timóteo 2:1-2; Romanos 13:1-7; Êxodo 1:15-21; Daniel 6; Atos 3:19-20; 5:29. 32 nenhuma igreja ou agência que esteja sequer tentando compartilhar com eles o evangelho. Na realidade, apenas uma pequena porcentagem dos recursos da Igreja (humanos e materiais) está sendo destinada aos povos menos alcançados. Por definição, esses são os povos que não nos convidarão para que levemos a eles a Boa Nova, pois não têm conhecimento algum dela. Entretanto, a presença deles entre nós, em nosso mundo, 2.000 anos após a ordem que nos foi dada por Jesus de fazer discípulos de todas as nações, representa não apenas uma censura à nossa obediência, não apenas uma forma de injustiça espiritual, mas também um “Chamado Macedônico” silencioso. Vamos nos levantar como Igreja em todo o mundo para enfrentar este desafio e: A) Vamos nos arrepender da nossa cegueira diante da existência continuada de tantos povos não alcançados em nosso mundo e da nossa passividade diante da urgência da evangelização entre eles. B) Vamos renovar nosso compromisso de ir aos que ainda não ouviram o evangelho, de nos envolver profundamente com sua língua e cultura, de viver o evangelho entre eles com amor encarnacional e serviço sacrificial, de comunicar a luz e a verdade do Senhor Jesus Cristo em palavra e ação, despertando-os através do poder do Espírito Santo para a surpreendente graça de Deus. C) Vamos buscar erradicar a pobreza bíblica no mundo, pois a Bíblia continua sendo indispensável para o evangelismo. Para que isto aconteça, devemos: 1. Acelerar a tradução da Bíblia para as línguas dos povos que ainda não possuem qualquer porção da Palavra de Deus em sua língua materna; 2. Tornar a mensagem da Bíblia amplamente disponível através de meios orais. (Ver também abaixo Culturas Orais) D) Ter como objetivo a erradicação da ignorância bíblica na Igreja, pois a Bíblia continua indispensável para o discipulado dos crentes à semelhança com Cristo. 1. Desejamos ardentemente ver uma convicção renovada, em toda a Igreja de Deus, a respeito da necessidade real do ensino da Bíblia para o crescimento da Igreja no que se refere a ministério, unidade e maturidade79. Nós nos alegramos por todos aqueles a quem Cristo deu o dom de pastores e mestres. Nós faremos todo o esforço para identificá-los, incentivá-los, treiná-los e apoiá-los na pregação e no ensino da Palavra de Deus. Ao fazê-lo, no entanto, devemos rejeitar o tipo de clericalismo que restringe o ministério da Palavra de Deus a alguns profissionais pagos ou a uma pregação formal nos púlpitos das igrejas. Muitos homens e mulheres, que demonstram claramente ter recebido o dom para pastorear e ensinar o povo de Deus, exercem o seu dom informalmente, ou sem estruturas denominacionais oficiais, mas com a clara bênção do Espírito de Deus. Eles também precisam ser reconhecidos, incentivados e preparados para o correto manejo da Palavra de Deus. 2. Devemos promover a instrução bíblica nesta geração que se identifica principalmente com a comunicação digital, em substituição aos livros, incentivando métodos digitais de estudo indutivo das escrituras, com a profundidade de questionamento que, hoje, necessita de papel, caneta e lápis. E) Vamos manter o evangelismo como parte central do escopo plenamente integrado de toda nossa missão, na medida em que o evangelho propriamente dito seja a fonte, o 79 Efésios 4:11-12. 33 conteúdo e a autoridade de toda missão biblicamente válida. Tudo o que fazemos deve ser tanto uma personificação quando uma declaração do amor e da graça de Deus e da sua obra salvadora através de Jesus Cristo. 2. Culturas orais A maior parte da população mundial é formada por comunicadores orais, que não conseguem ou se recusam a aprender através de meio letrado, e mais da metade deles está entre os grupos não alcançados, definidos acima. Entre esses, estima-se que existam 350 milhões de pessoas sem um único versículo das Escrituras na sua língua. Além dos “aprendizes basicamente orais”, existem muitos “aprendizes orais secundários”, que são tecnicamente alfabetizados, mas que preferem se comunicar por meios orais, com o aumento da aprendizagem visual e o domínio das imagens na comunicação. Ao reconhecer e agir sobre as questões de oralidade, vamos: A) Fazer melhor uso de metodologias orais em programas de discipulado, mesmo entre cristãos alfabetizados. B) Como questão prioritária, disponibilizar histórias bíblicas em formato de áudio nas principais línguas dos grupos de povos não alcançados ou não incluídos. C) Incentivar as agências missionárias a desenvolver estratégias orais, que incluam: gravação e distribuição de histórias bíblicas em áudio para evangelismo, discipulado e treinamento de liderança, acompanhadas do devido treinamento de oralidade aos evangelistas e plantadores de igrejas pioneiros; esses poderiam usar métodos frutíferos de comunicação oral e visual para transmitir toda a história bíblica da salvação, como, por exemplo, narração de histórias, artes, poesia, cânticos e teatro. D) Incentivar as igrejas locais no Sul Global a se envolver com grupos de povos não alcançados em sua área através de métodos orais que sejam específicos para sua visão de mundo. E) Incentivar seminários a oferecer currículos que preparem missionários e pastores em metodologias orais. 3. Líderes Cristocêntricos O rápido crescimento da Igreja em tantos lugares continua superficial e vulnerável, em parte devido à falta de líderes discipulados, e em parte porque muitos usam suas posições para obter poder secular, status arrogante ou enriquecimento pessoal. Como resultado, o povo de Deus sofre, Cristo é desonrado e a missão do evangelho é prejudicada. O “treinamento de liderança” é a solução prioritária comumente proposta. De fato, programas de treinamento de liderança de todos os tipos têm se multiplicado, mas o problema persiste, por duas prováveis razões. Primeiro, treinar líderes para que sejam piedosos e semelhantes a Cristo é o caminho inverso. Em primeiro lugar, biblicamente, apenas aqueles cujas vidas já demonstram as características básicas do discipulado maduro devem ser indicados para a liderança80.[80] Se hoje nos deparamos com muitas pessoas na liderança que mal foram discipuladas, então não há alternativa senão incluir esse discipulado básico no seu desenvolvimento de liderança. Indiscutivelmente, a escala de líderes mundanos e não semelhantes a Cristo na Igreja global hoje é prova patente de evangelismo reducionista, discipulado negligenciado e crescimento superficial. A resposta para o fracasso da liderança não é apenas mais 80 1 Timóteo 3:1-13; Tito 1:6-9; 1 Pedro 5:1-3. 34 treinamento de liderança, mas antes, melhor treinamento de discipulado. Os líderes devem primeiro ser discípulos de Cristo. Segundo, alguns programas de treinamento de liderança enfocam pacotes prontos de conhecimento, e técnicas e habilidade em detrimento do caráter piedoso. Em contrapartida, líderes autenticamente cristãos devem ser semelhantes a Cristo no que se refere a ter humildade, integridade, coração servil, ausência de ganância, vida de oração, dependência no Espírito de Deus e um profundo amor pelas pessoas. Além disso, alguns programas de treinamento de liderança não oferecem treinamento específico no ponto chave incluído por Paulo em sua lista de qualificações – a capacidade de ensinar a Palavra de Deus ao povo de Deus. No entanto, o ensino da Bíblia é o mais importante meio de fazer discípulos e a maior deficiência nos líderes da igreja contemporânea. A) Ansiamos por ver esforços intensificados na formação de discípulos, por meio do trabalho de ensino e sustento de novos crentes a longo prazo, a fim de que aqueles a quem Deus chama e entrega à igreja como líderes estejam qualificados de acordo com o critério bíblico de maturidade e serviço. B) Nós renovamos nosso compromisso de orar por nossos líderes. Desejamos que Deus multiplique, proteja e encoraje líderes a ser biblicamente fiéis e obedientes. Oramos para que Deus repreenda, remova ou leve ao arrependimento líderes que desonram o seu nome e difamam o evangelho. E oramos para que Deus levante uma nova geração de servoslíderes discipulados, cuja maior paixão seja conhecer a Cristo e ser semelhante a ele. C) Aqueles entre nós que estão na liderança cristã precisam reconhecer nossa vulnerabilidade e aceitar o fato de que temos que prestar contas dentro do corpo de Cristo. Nós recomendamos a prática de submissão a um grupo para prestação de contas. D) Encorajamos firmemente os seminários e todos os que oferecem programas de treinamento de liderança a que se concentrem mais na formação espiritual e de caráter, e não apenas na transmissão de conhecimento ou classificação de desempenho, e nos alegramos intensamente com os que já fazem isso como parte do desenvolvimento abrangente e integral da liderança. 4. Cidades As cidades são extremamente importantes para o futuro humano e para a missão mundial. Metade do mundo hoje vive em cidades. É nas cidades que se encontram os quatro principais tipos de pessoas: (i) a próxima geração de jovens; (ii) a maioria dos povos menos alcançados que migraram; (iii) os formadores de cultura; (iv) os mais pobres entre os pobres. A) Nós discernimos a soberana mão de Deus no aumento massivo da urbanização em nosso tempo e apelamos à Igreja e aos líderes de missões em todo mundo a que respondam a esse fato dando atenção estratégica e urgente à missão urbana. Devemos amar nossas cidades como Deus as ama, com discernimento santo e compaixão semelhante à de Cristo, e obedecer ao seu mandamento de “buscar a prosperidade da cidade”, onde quer que ela esteja. Vamos procurar aprender métodos adequados e flexíveis de missão que respondam às realidades urbanas. 5. Crianças Todas as crianças estão em risco. Há cerca de dois bilhões de crianças no mundo e metade delas está em risco em decorrência da pobreza. Milhões estão em risco em decorrência da prosperidade. Os filhos dos ricos e estáveis têm tudo para viver, mas nada pelo quê viver. 35 As crianças e os jovens são a Igreja de hoje e não apenas de amanhã. Os jovens têm grande potencial como agentes ativos na missão de Deus. Eles representam uma grande e pouco utilizada fonte de formadores de opinião com sensibilidade para ouvir a voz de Deus e disposição para responder a ele. Alegramo-nos com os excelentes ministérios que servem entre as crianças e juntamente com elas e desejamos que esse trabalho seja multiplicado, diante de tão grande necessidade. Como vemos na Bíblia, Deus pode usar e realmente usa as crianças e os jovens – suas orações, suas percepções, suas palavras, suas iniciativas – para transformar corações. Elas representam uma “nova energia” para transformar o mundo. Vamos ouvir e não reprimir sua espiritualidade infantil com nossas abordagens adultas e racionalistas. Nós assumimos o compromisso de: A) Levar as crianças a sério, através de estudos bíblicos e questionamentos teológicos estimulantes, que reflitam o amor de Deus e o seu propósito para elas e através delas. E redescobrir o profundo significado para a teologia e para a missão, da atitude provocadora de Jesus ao “tomar uma criança e colocá-la entre eles”81. B) Buscar treinar pessoas e fornecer recursos para atender as necessidades das crianças em todo o mundo, sempre que possível, trabalhando com suas famílias e comunidades, com a convicção de que o ministério holístico para e através de cada geração seguinte de crianças e jovens, é um componente vital para a missão mundial. 6. Oração Diante de tantas prioridades, vamos renovar nosso compromisso de orar. A oração é um chamado, um mandamento e um dom. A oração é o fundamento indispensável para todos os elementos da nossa missão. A) Nós oraremos com união, foco, persistência e esclarecimento bíblico: 1. Para que Deus envie trabalhadores para todos os cantos do mundo, no poder do seu Espírito; 2. Para que os perdidos de todos os povos e lugares sejam atraídos a Deus pelo seu Espírito, através da declaração da verdade do evangelho e da demonstração do amor e do poder de Cristo. 3. Para que a glória de Deus seja revelada e o nome de Cristo seja conhecido e louvado graças ao caráter, as obras e as palavras do seu povo. Vamos clamar pelos nossos irmãos e irmãs que sofrem por causa do nome de Cristo. 4. Pela vinda do reino de Deus, para que a vontade de Deus seja feita na terra como é feita no céu, pelo estabelecimento da justiça, pela mordomia e cuidado para com a criação e pela bênção da paz de Deus em nossas comunidades. B) Daremos graças continuamente ao presenciarmos a obra de Deus entre as nações, ansiosos pelo dia em que o reino deste mundo se tornará o reino do nosso Deus e do seu Cristo. C) Expor, resistir e agir contra toda e qualquer forma de abuso contra as crianças, seja violência, exploração, escravidão, tráfico, prostituição, sexo e discriminação étnica, alvo publicitário e negligência intencional. 81 Marcos 9:33-37. 36 IIE CHAMANDO A IGREJA DE CRISTO DE VOLTA À HUMILDADE, À INTEGRIDADE E À SIMPLICIDADE Andar é a metáfora bíblica para nosso modo de vida ou de conduta diária. Paulo, em Efésios, fala sete vezes sobre como os cristãos devem ou não devem andar82. 1. Andar de maneira diferenciada, como nova humanidade de Deus83 O povo de Deus escolhe entre andar no caminho do Senhor ou nos caminhos de outros deuses. A Bíblia mostra que o maior problema de Deus não é apenas com as nações do mundo, mas com o povo que ele criou e chamou para que fossem canal de bênçãos para as nações. E o maior obstáculo para o cumprimento desta missão é a idolatria entre o próprio povo de Deus. Pois se somos chamados para levar as nações a adorar ao único Deus vivo e verdadeiro, falhamos vergonhosamente quando nós mesmos corremos atrás de deuses falsos dos povos ao nosso redor. Quando não há diferença entre a conduta de cristãos e não cristãos – por exemplo, na prática da corrupção e da ganância, na promiscuidade sexual, no alto índice de divórcio, no retorno a práticas anteriores à religiosa cristã, na hostilidade em relação a pessoas de outras raças, nos estilos de vida consumistas, ou no preconceito social – então, o mundo está certo ao questionar se o cristianismo faz alguma diferença. Diante o mundo que nos observa, não há autenticidade em nossa mensagem. A) Desafiamo-nos mutuamente, como povo de Deus presente em todas as culturas, a encarar até que ponto estamos, consciente ou 82 Apesar da tradução ser diferente, todos os seguintes versículos usam o verbo “andar”: Efésios 2:2, 10; 4:1, 17; 5:2, 8, 15. 83 Efésios 4:16-31. inconscientemente, enredados nas idolatrias da cultura que nos cerca. Oramos por discernimento profético para identificar e expor esses deuses falsos e a sua presença dentro da própria Igreja, e por coragem para que nos arrependamos e os renunciemos no nome e na autoridade de Jesus como Senhor. B) Uma vez que não há missão bíblica sem vida bíblica, com urgência renovamos nosso compromisso e desafiamos a todos aqueles que professam o nome de Cristo a viver de maneira radicalmente diferente dos caminhos do mundo, a “revestir-se do novo homem, criado para ser semelhante a Deus em justiça e em santidade provenientes da verdade”. 2. Andar em amor, rejeitando a idolatria da sexualidade desordenada84 O plano de Deus na criação é que o casamento seja constituído pelo relacionamento fiel e comprometido entre um homem e uma mulher, no qual eles se tornem uma só carne e uma nova unidade social que seja distinta de suas famílias de origem, e que a relação sexual, como expressão daquela “uma só carne”, seja desfrutada exclusivamente dentro dos laços do casamento. Essa união sexual amorosa dentro do casamento, na qual “dois se tornam um”, reflete tanto o relacionamento de Cristo com a Igreja, como a unidade de judeus e gentios na nova humanidade85. Paulo contrasta a pureza do amor de Deus com a feiura do amor falso que se disfarça na sexualidade desordenada e em tudo o que a acompanha. A sexualidade desordenada de todo tipo, em qualquer prática de intimidade sexual antes ou fora do casamento, conforme definido biblicamente, não se alinha com as bênçãos e com a vontade de Deus na criação e na redenção. O abuso e a idolatria que cercam a 84 85 Efésios 5:1-7. Efésios 5:31, 2:15. 37 sexualidade desordenada contribuem para um declínio maior da sociedade, causando a ruptura de casamentos e famílias, e produz sofrimento incalculável de solidão e de exploração. Esta é um problema sério dentro da própria igreja e, tragicamente, uma causa comum de fracasso na liderança. Reconhecemos nossa necessidade de profunda humildade e consciência do fracasso nesta área. Ansiamos por ver cristãos desafiando as culturas que nos rodeiam vivendo de acordo com os padrões para os quais a Bíblia nos chamou. A) Nós encorajamos firmemente todos os pastores a: 1. Facilitar o diálogo mais aberto sobre sexualidade em nossas igrejas, declarando positivamente a boa nova do plano de Deus para relacionamentos saudáveis e para a vida familiar, mas também abordando com honestidade pastoral as áreas onde os cristãos compartilham as realidades disfuncionais e de ruptura de sua cultura circundante; 2. Ensinar claramente os padrões de Deus, mas fazer isso com a compaixão pastoral de Cristo pelos pecadores, reconhecendo quão vulneráveis à tentação sexual e ao pecado todos nós somos; 3. Lutar para estabelecer um exemplo positivo de vida segundo os padrões bíblicos de fidelidade sexual; B) Como membros da Igreja, nós assumimos o compromisso de: 1. Fazer tudo o que pudermos na Igreja e na sociedade para fortalecer casamentos fieis e vida familiar saudável; 2. Reconhecer a presença e a contribuição daqueles que são solteiros, viúvos ou sem filhos, assegurar-lhes que a igreja é uma família em Cristo acolhedora e amparadora, e capacitálos a exercer seus dons nos variados ministérios da igreja; 3. Resistir às múltiplas formas de sexualidade desordenada nas culturas que nos cercam, incluindo a pornografia, o adultério e a promiscuidade. 4. Procurar compreender e abordar as questões profundas do coração relacionadas à identidade e à experiência, que levam algumas pessoas à prática homossexual; alcançá-las com amor, compaixão e justiça de Cristo e rejeitar e condenar toda forma de ódio e abuso verbal ou físico e vitimização de pessoas homossexuais; 5. Lembrar que, pela graça redentora de Deus, nenhuma pessoa ou situação está além da possibilidade de mudança e restauração. 3. Andar em humildade, rejeitando a idolatria do poder86 Devido à queda e ao pecado, o poder é geralmente exercido para abusar e explorar pessoas. Nós exaltamos a nós mesmos, alegando superioridade de sexo, raça e status social. Paulo se opõe a todas essas formas de idolatria do orgulho e do poder exigindo que aqueles que são cheios do Espírito de Deus se submetam uns aos outros por amor a Cristo. Essa submissão mútua e esse amor recíproco devem ser expressos no casamento, na família e nas relações socioeconômicas. A) Nós desejamos ver todos os maridos e esposas, pais e filhos, funcionários e empregadores cristãos, praticando o ensinamento bíblico de “submeter-se uns aos outros no temor de Cristo”. 86 Efésios 5:15-6:4. 38 B) Nós incentivamos os pastores a ajudarem os crentes a entender, a discutir honestamente e a praticar a submissão mútua que Deus exige de seus filhos. Em um mundo de poder, ganância e abuso, Deus está chamando sua Igreja para ser o lugar de humildade amável e amor abnegado entre seus membros. C) Nós clamamos aos maridos cristãos de maneira particular e urgente a que observem o equilíbrio das responsabilidades entre maridos e esposas conforme o ensino Paulo. A submissão mútua significa que a submissão da esposa ao seu marido tem como alvo um homem cujo amor e cuidado por ela seja inspirado no amor abnegado de Jesus Cristo por sua Igreja. Qualquer tipo de abuso contra uma mulher – verbal, emocional e físico – é incompatível com o amor de Cristo, em qualquer cultura. Nós negamos que qualquer tradição cultural ou interpretação distorcida da Bíblia possa justificar a violência contra a mulher. Lamentamos que isso aconteça entre cristãos professos, incluindo pastores e líderes. Não hesitamos em denunciar tal ato como um pecado e chamar ao arrependimento e à renúncia dessa prática. 4. Andar em integridade, rejeitando a idolatria do sucesso87 Não podemos edificar o reino do Deus da verdade sobre fundamentos de desonestidade. No entanto, em nosso desejo por “sucesso” e “resultados” somos tentados a sacrificar nossa integridade, com alegações exageradas e distorcidas que levam a mentiras. Andar na luz, entretanto, “consiste em... justiça e verdade”88. A) Nós apelamos a todos os líderes e missionários a que resistam à tentação de ser menos do que totalmente verdadeiros na apresentação do seu trabalho. Somos 87 88 Efésios 5:8-9. Efésios 5:10. desonestos quando exageramos nossos relatórios com estatísticas infundadas, ou torcemos a verdade para nosso benefício. Oramos por uma onda purificadora de honestidade e pelo fim de tais distorções, manipulações e exageros. Apelamos a todos os que sustentam financeiramente a obra a que não façam exigências irrealistas de resultados visíveis e mensuráveis, além da necessidade da devida prestação de contas. Vamos lutar por uma cultura de total integridade e transparência. Escolheremos andar na luz e na verdade de Deus, pois o Senhor prova o coração e se agrada com a integridade89. 5. Andar em simplicidade, rejeitando a idolatria da ganância90 A pregação e o ensino generalizado do “evangelho da prosperidade” em todo o mundo levanta sérias preocupações. Definimos o evangelho da prosperidade como o ensino de que os crentes têm direito às bênçãos da saúde e da riqueza e que podem obter essas bênçãos por meio de confissões positivas de fé e da “semeadura”, através de doações financeiras e materiais. O ensino da prosperidade é um fenômeno que atravessa muitas denominações em todos os continentes91. Nós ratificamos a graça e o poder milagroso de Deus e congratulamo-nos com o crescimento das igrejas e dos ministérios que levam pessoas a exercer a fé expectante no Deus vivo e no seu poder sobrenatural. Nós cremos no poder do Espírito Santo. No entanto, negamos que o poder milagroso de Deus possa ser tratado como uma técnica automática ou à disposição 89 1 Crônicas 29:17. Efésios 5:5. 91 Ver também o texto completo The Akropong Statement, a critique of Prosperity Gospel (Declaração Akropongo, uma crítica sobre o Evangelho da Prosperidade) produzido por teólogos africanos, reunidos pelo Grupo de Trabalho Teológico Lausanne, no site: http://www.lausanne.org/akropong. 90 39 de humanos, ou ainda, manipulada por palavras, ações, dons, objetos ou rituais humanos. Nós afirmamos que existe uma perspectiva bíblica da prosperidade humana e que a Bíblia inclui o bem estar material (tanto saúde como riqueza) em seu ensinamento sobre a benção de Deus. No entanto, consideramos como contrário à Bíblia o ensinamento de que o bem estar espiritual possa ser medido em termos de bem estar material, ou que a riqueza seja sempre um sinal da benção de Deus. A Bíblia mostra que a riqueza muitas vezes pode ser obtida através da opressão, do engano ou da corrupção. Negamos também que a pobreza, a doença ou a morte física sejam sempre sinais da maldição de Deus, ou evidência de falta de fé, ou o resultado de maldição humana, já que a Bíblia rejeita tais explicações simplistas. Nós admitimos que seja bom exaltar o poder e a vitória de Deus. Mas cremos que os ensinamentos de muitos que promovem energicamente o evangelho da prosperidade distorcem seriamente a Bíblia; que suas práticas e seu estilo de vida geralmente são antiéticos e não semelhantes a Cristo; que eles costumam substituir o evangelismo genuíno pela busca de milagres, e substituem o chamado ao arrependimento pelo chamado para a contribuição financeira destinada a organização do pastor. Lamentamos que o impacto de seu ensino em muitas Igrejas seja pastoralmente prejudicial e espiritualmente doentio. É com alegria e firmeza que ratificamos toda iniciativa em nome de Cristo que busque trazer cura ao doente ou livramento duradouro da pobreza e do sofrimento. O evangelho da prosperidade não oferece nenhuma solução duradoura para a pobreza e pode desviar as pessoas da verdadeira mensagem e do verdadeiro caminho para a salvação eterna. Por essas razões, usando de sensatez, ele pode ser descrito como um evangelho falso. Por isso rejeitamos o excesso de ensino sobre prosperidade por ser incompatível com o cristianismo bíblico equilibrado. A) Com insistência encorajamos os líderes da igreja e de missões presentes em contextos onde o evangelho da prosperidade seja popular, a compará-lo com atenção e cuidado ao ensino e exemplo de Jesus Cristo. Particularmente, todos nós precisamos interpretar e ensinar, segundo seu contexto e harmonia, os textos bíblicos comumente usados para sustentar o evangelho da prosperidade. Onde houver o ensino da prosperidade no contexto de pobreza, devemos nos opor a ele, com compaixão autêntica e ação que traga justiça e transformação duradoura para o pobre. Acima de tudo, devemos substituir o interesse próprio e a ganância pelo ensinamento bíblico a respeito do sacrifício próprio e da doação generosa, como as marcas do verdadeiro discipulado de Cristo. Nós ratificamos o apelo histórico de Lausanne por estilos de vida mais simples. IIF FORMANDO PARCERIAS NO CORPO DE CRISTO PELA UNIDADE EM MISSÕES Paulo nos ensina que a unidade cristã é criação de Deus, com base em nossa reconciliação com Deus e uns com os outros. Essa dupla reconciliação foi realizada através da cruz. Quando vivemos em unidade e trabalhamos em parcerias demonstramos o poder sobrenatural e contra cultural da cruz. Mas quando demonstramos nossa desunião através da incapacidade de formar parcerias, rebaixamos nossa missão e mensagem e negamos o poder da cruz. 1. Unidade na Igreja Uma igreja dividida não tem mensagem para um mundo dividido. A nossa incapacidade de viver em unidade reconciliada é um obstáculo importante à autenticidade e eficácia em missões. 40 A) Lamentamos a divisibilidade e divisão de nossas igrejas e organizações. Temos o desejo profundo e urgente de que os cristãos cultivem um espírito de graça e que sejam obedientes ao mandamento de Paulo de “fazer todo o esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz”. B) Embora reconheçamos que nossa unidade mais profunda seja espiritual, ansiamos por maior reconhecimento do poder missional da unidade visível, prática e terrena. Portanto apelamos aos irmãos e irmãs em todo o mundo, por causa do nosso testemunho e missão em comum, que resistam à tentação de dividir o corpo de Cristo e que busquem caminhos de reconciliação e de restauração da unidade sempre que possível. 2. Parceria em missão global A parceria em missões não se trata apenas de eficiência. É o resultado prático e estratégico de nossa submissão a Jesus Cristo como Senhor. Muitas vezes nos envolvemos em missões que priorizam e preservam nossa própria identidade (étnica, denominacional, teológica etc.) e deixamos de submeter nossas paixões e preferências ao nosso único Senhor e Mestre. A supremacia e centralidade de Cristo em nossa missão devem ser mais do que uma confissão de fé; devem também reger nossa estratégia, prática e unidade. Alegramo-nos com o crescimento e a força de movimentos missionários emergentes em países em desenvolvimento e com o fim do antigo padrão “do Leste para o Resto”. Mas não aceitamos a ideia de que o bastão da responsabilidade sobre as missões tenha passado de uma parte da Igreja mundial para outra. Não faz sentido rejeitar o antigo triunfalismo do Ocidente para, simplesmente, deslocar o mesmo espírito ímpio para a Ásia, África ou América Latina. Nenhum grupo étnico, nação ou continente pode reivindicar o privilégio exclusivo de ser o único a completar a Grande Comissão. Somente Deus é soberano. A) Permanecemos unidos como líderes e missionários em todas as partes do mundo, chamados a reconhecer e a aceitar uns aos outros, com igualdade de oportunidades, para juntos contribuirmos para a missão mundial. Vamos, em submissão a Cristo, colocar de lado a desconfiança, a competição e o orgulho e estar dispostos a aprender com aqueles que Deus está usando, mesmo que não sejam do nosso continente, nem da nossa teologia em particular, nem de nossa organização ou de nosso círculo de amigos. B) A parceria vai além do dinheiro, e a injeção insensata de dinheiro geralmente corrompe e divide a Igreja. Vamos, finalmente, provar que a Igreja não opera sob o princípio de que aqueles que têm mais dinheiro têm o poder de decisão. Vamos deixar de impor em outras partes da Igreja nossos nomes, slogans, programas, sistemas e métodos preferidos. Vamos sim trabalhar por reciprocidade verdadeira entre Norte e Sul, Leste e do Oeste, por interdependência em dar e receber, pelo respeito e dignidade que caracteriza amigos genuínos e verdadeiros parceiros em missões. 3. Homens e mulheres em parceria As Escrituras afirmam que Deus criou homens e mulheres à sua imagem e que lhes deu o domínio sobre a terra. O pecado entrou na vida e na história humana através do homem e da mulher agindo em conjunto em rebelião contra Deus. Através da cruz de Cristo, Deus trouxe salvação, aceitação e unidade a homens e mulheres igualmente. No Pentecoste, Deus derramou o seu Espírito de profecia sobre toda carne, filhos e filhas semelhantemente. 41 Mulheres e homens, portanto, são iguais na criação, no pecado, na salvação e no Espírito92. Todos nós, mulheres e homens, solteiros e casados, somos responsáveis por empregar os dons de Deus para o benefício de outros, como mordomos da graça de Deus, e para o louvor e glória de Cristo. Todos nós, portanto, também somos responsáveis por capacitar todo o povo de Deus para exercer todos os dons dados por Deus em todas as áreas de serviço para as quais Deus chama a Igreja93. Não devemos apagar o Espírito desprezando os ministérios de ninguém94. Além disso, estamos determinados a ver o ministério dentro do corpo de Cristo como dom e responsabilidade no qual somos chamados a servir, e não como status ou direito que exigimos. A) Defendemos a posição histórica Lausanne: “Nós afirmamos que os dons do Espírito são distribuídos a todo o povo de Deus, mulheres e homens, e que a parceria deles na evangelização deve ser bem recebida visando o bem comum”95. Reconhecemos a enorme contribuição e sacrifício que as mulheres têm feito pela missão mundial, ministrando tanto para homens como para mulheres, desde os tempos bíblicos até o presente. B) Reconhecemos que há opiniões diferentes sinceramente sustentadas por aqueles que procuram ser fiéis e obedientes às Escrituras. Alguns interpretam o ensino apostólico de modo a inferir que mulheres não devem ensinar nem pregar, ou que podem fazê-lo, mas não como autoridade única sobre homens. Outros entendem a igualdade espiritual das mulheres, o exercício de edificação do dom de profecia por mulheres na igreja do Novo Testamento e a acolhida da igreja em suas casas, implicando que os dons espirituais de liderança e ensino podem ser recebidos e exercidos no ministério tanto por mulheres como por homens96. Convidamos aqueles que estão em lados opostos nesta discussão a: 1. Aceitar um ao outro sem condenação em relação a questões divergentes. Embora possamos discordar, não temos motivos para divisão, para palavras destrutivas, ou hostilidade de uns para com os outros97; 2. Estudar juntos as Escrituras com atenção, levando em conta o contexto e a cultura originais de seus respectivos autores e leitores contemporâneos; 3. Reconhecer que onde houver dor genuína, devemos mostrar compaixão; onde houver injustiça e falta de integridade, devemos nos opor; e onde houver resistência à manifestação da obra do Espírito Santo em alguma irmã ou irmão, devemos nos arrepender. 4. Comprometer-se com um padrão de ministério, de homens e de mulheres, que reflita o espírito de servo de Jesus Cristo e não a busca de poder e status característicos do mundo. C) Encorajamos as igrejas a reconhecer as mulheres reverentes que ensinam e são exemplos do que é bom, como Paulo ordenou98, e a abrir portas mais largas de oportunidades para mulheres na educação, no serviço e na liderança, principalmente em contextos onde o evangelho desafia tradições culturais injustas. Esperamos que as mulheres não sejam impedidas de exercer os dons de Deus ou de seguir o chamado de Deus em suas vidas. 92 Gênesis 1:26-28; 3; Atos 2:17-18; Gálatas 3:28; 1 Pedro 3:7. 93 Romanos 12:4-8; 1 Coríntios 12:4-11; Efésios 4:7-16; 1 Pedro 4:10-11. 94 1 Tessalonicenses 5:19-20; 1 Timóteo 4:11-14. 95 O Manifesto de Manila, Afirmação 14. 96 I Timóteo 2:12; 1 Coríntios 14:33-35; Tito 2:3-5; Atos 18:26; 21:9; Romanos 16:1-5, 7; Filipenses 4:2-3; Colossenses 4:15; 1 Coríntios 11:5; 14:3-5. 97 Romanos 14:1-13. 98 Tito 2:3-5. 42 4. Educação Teológica e missões O Novo Testamento mostra a estreita parceria entre o trabalho de evangelizar e plantar igrejas (por exemplo, o Apóstolo Paulo), e o trabalho de fortalecimento das igrejas (por exemplo, Timóteo e Apolo). As duas tarefas estão integradas na Grande Comissão, onde Jesus descreve o fazer discípulos em termos de evangelismo (antes de “batizando-os”) e “ensinando-os a obedecer a tudo o eu lhes ordenei”. A educação teológica é parte da missão que vai além do evangelismo99. B) A educação teológica caminha em parceria com todas as formas de envolvimento missional. Nós incentivaremos e apoiaremos todos os que oferecerem educação teológica biblicamente fiel, formal e não formal, em níveis local, nacional, regional e internacional. C) Nós apelamos às instituições e programas de educação teológica a conduzir uma “auditoria missional” em seus currículos, estruturas e etos, para assegurar que eles realmente atendam às necessidades e oportunidades da Igreja em suas culturas. A missão da Igreja na terra é servir à missão de Deus, e a missão da educação teológica é fortalecer e acompanhar a missão da Igreja. A educação teológica serve primeiro para treinar aqueles que lideram a Igreja como professorespastores, capacitando-os para ensinar a verdade da Palavra de Deus com fidelidade, relevância e clareza; e segundo, para capacitar todo o povo de Deus para a tarefa missional de entender e comunicar com relevância a verdade de Deus em qualquer contexto cultural. A educação teológica envolve guerra espiritual, uma vez que “destruímos argumentos e toda pretensão que se levanta contra o conhecimento de Deus, e levamos cativo todo pensamento, para torná-lo obediente a Cristo”100. D) Nós desejamos que todos plantadores de igreja e educadores teológicos coloquem a Bíblia no centro de suas parcerias, não apenas nas declarações doutrinárias, mas também na prática. Os evangelistas devem usar a Bíblia como fonte suprema do conteúdo e da autoridade de suas mensagens. Os educadores teológicos devem recentrar o estudo da Bíblia como disciplina fundamental na teologia cristã, integrando e permeando todos os outros campos de estudo e da aplicação. Acima de tudo, a educação teológica deve servir para preparar professores pastores para sua principal responsabilidade de pregar e ensinar a Bíblia101. A) Aqueles de nós que lideram igrejas e agências missionárias precisam reconhecer que a educação teológica é intrinsecamente missional. Aqueles que oferecem educação teológica precisam garantir que ela seja intencionalmente missional, uma vez que seu lugar na área acadêmica não é um fim em si, mas é servir a missão da Igreja no mundo. Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo. O Espírito de Deus estava na Cidade do Cabo, chamando a Igreja de Cristo para ser embaixadora do amor reconciliador de Deus para o mundo. Deus manteve a promessa da sua Palavra enquanto o seu povo se reuniu em o nome de Cristo, pois o próprio Senhor Jesus Cristo habitou entre nós e andou entre nós102. CONCLUSÃO Nós buscamos ouvir à voz do Senhor Jesus Cristo. E na sua misericórdia, através do seu 99 Colossenses 1:28-29; Atos 19:8-10; 20:20, 27; 1 Coríntios 3:5-9. 100 2 Coríntios 10:4-5. 101 2 Timóteo 2:2; 4:1-2; 1 Timóteo 3:2b; 4:11-14; Tito 1:9; 2:1. 102 Levítico 26:11-12; Mateus 18:20; 28:20. 43 Santo Espírito, Cristo falou ao povo que o ouvia. Através das muitas vozes na exposição bíblica, nas palestras de plenárias e na discussão em grupo, dois temas foram repetidos e ouvidos. A necessidade de discipulado radicalmente obediente, que conduza à maturidade, ao crescimento em profundidade, bem como ao crescimento numérico. A necessidade de reconciliação radical centrada na cruz, levando à unidade, ao crescimento em amor, assim como ao crescimento em fé e em esperança. O discipulado e a reconciliação são indispensáveis para nossa missão. Lamentamos pelo escândalo da nossa superficialidade e falta de discipulado e pelo escândalo da nossa desunião e falta de amor. Ambos prejudicaram gravemente nosso testemunho do evangelho. Nós discernimos a voz do Senhor Jesus Cristo nesses dois desafios, pois eles correspondem às duas palavras mais enfáticas de Cristo à Igreja, de acordo com os evangelhos. No Evangelho de Mateus, Jesus deu o mandamento principal – o de fazer discípulos de todas as nações. No Evangelho de João, Jesus deu o nosso método principal – o de amar uns aos outros para que o mundo saiba que somos discípulos de Jesus. Não devemos ficar surpresos, mas nos alegrar ao ouvir a voz do Mestre, quando 2 mil anos depois, Cristo diz as mesmas coisas ao seu povo reunido de todas as partes do mundo. Fazer discípulos. Amar uns aos outros. nossa missão. O chamado de Cristo à sua Igreja vem a nós, mais uma vez, das páginas dos evangelhos: “Venham e sigam-me”; “Vão e façam discípulos”. Amem aos outros Três vezes Jesus repetiu: “Um novo mandamento lhes dou: Amem-se uns aos outros. Como eu os amei, vocês devem amar uns aos outros”103. Três vezes Jesus orou: “que todos sejam um, Pai”104. Tanto o mandamento quanto a oração são missionais. ‘”Com isso todos saberão que vocês são meus discípulos, se vocês se amarem uns aos outros”. “Que eles sejam levados à plena unidade, para que o mundo saiba que tu me enviaste”. Jesus não poderia ter expressado seu desejo de maneira mais enfática. A evangelização do mundo e o reconhecimento da deidade de Cristo são auxiliados ou prejudicados conforme o obedecemos ou não na prática. O chamado de Cristo e de seus apóstolos nos é novamente apresentado: “Amemos uns aos outros”, “Façam todo esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz”105. É por amor à missão de Deus que renovamos nosso compromisso de obedecer a esta “mensagem que ouvimos desde o princípio”106. Quando os cristãos viverem na unidade reconciliada do amor pelo poder do Espírito Santo, o mundo conhecerá Jesus, de quem somos discípulos, e conhecerão o Pai que o enviou. Façam discípulos A missão bíblica exige que aqueles que reivindicam o nome de Cristo sejam como ele, tomando a sua cruz, negando a si mesmos, e seguindo-o no caminho da humildade, do amor, da integridade, da generosidade e da servidão. Falhar no discipulado e na tarefa de fazer discípulos é falhar no nível mais elementar de 103 João 13:34; 15:12; 17. João 17:21-23. 105 Efésios 4:1-6; Colossenses 3:12-14; 1 Tessalonicenses 4:9-10; 1 Pedro 1:22; 1 João 3:11-14; 4:7-21. 106 1 João 3:11. 104 44 Em nome do Deus Pai, do Filho e do Espírito Santo, e sobre o único fundamento de fé na infinita misericórdia de Deus e na sua graça salvadora, sinceramente desejamos e oramos por uma reforma do discipulado bíblico e por uma revolução de amor como o de Cristo. Fazemos desta a nossa oração e assumimos este nosso compromisso pelo Senhor que amamos e pelo mundo que servimos em seu nome. 45