Bol. Mus. Int. de Roraima v8(2): 47-52. 2014 Monteiro Neto et al. Tipos de coberturas de solo no cultivo de alface (Lactuca sativa L.) sob as condições climáticas de Boa Vista, Roraima João Luiz Lopes Monteiro Neto1,3, Auriane da Conceição Dutra da Silva1 Roberto Tadashi Sakazaki1, Luciana Baú Trassato1 & Wellington Farias Araújo2 1. Universidade Federal de Roraima – Programa de Pós-Graduação em Agronomia (POSAGRO), Centro de Ciências Agrárias, Campus Cauamé, CEP: 69.300-000, Boa Vista-Roraima. 2. Universidade Federal de Roraima, Centro de Ciências Agrárias, Campus Cauamé, CEP: 69.300-000, Boa VistaRoraima. 3. Autor para correspondência: [email protected] Recebido em: 06/10/2014 Aceito em: 26/11/2014 Publicado online em PDF: 22/12/2014. RESUMO Tipos de coberturas de solo no cultivo de alface (Lactuca sativa L.) sob as condições climáticas de Boa Vista, Roraima. Fatores climáticos como altas temperaturas, fotoperíodo longo e alta intensidade luminosa podem afetar negativamente o cultivo de alface. Esses agentes meteorológicos são característicos de Boa Vista, município que produz grande parte da alface consumida na capital roraimense. Várias práticas culturais vêm sendo usadas visando minimizar a ação desses fatores, entre elas, o uso de coberturas de solo. Com o objetivo de avaliar o efeito de coberturas de solo no cultivo de duas variedades de alface em Boa Vista, foram usados cinco tipos de coberturas: plástico preto, capim seco (Trachypogon spicatus (L. f.) Kuntze), casca de arroz, pó de serragem e sem cobertura. Dentre essas coberturas, a casca de arroz e o pó de serragem apresentaram os melhores resultados em todas as características produtivas da cultura, podendo estas serem usadas como coberturas de solo no cultivo das cultivares de alface “Verônica” e “Grandes Lagos”, em Boa Vista . PALAVRAS-CHAVE: Casca de arroz; altas temperaturas; ambiente protegido . ABSTRACT Types of soil coverage in a lettuce cultivation (Lactuca sativa L.) under weather conditions in Boa Vista, Roraima. Climatic factors such as high temperature, long photoperiod and high light intensity may adversely affect the cultivation of lettuce. These meteorological agents are characteristic of Boa Vista that produces most of the lettuce consumed in the capital of Roraima State. There are several cultural practices that are used to minimize the effect of these factors, among these, the use of cover crops. Bare soil, black plastic, dry grass (Trachypogon spicatus (L. f.) Kuntze), rice husk and sawdust: With the objective of evaluating the effect of cover crops cultivation of two varieties of lettuce in Boa Vista, five types of coverage were used. Among these coverages, rice husk and sawdust showed the best results in all productive characteristics of the crop, which can be used as ground cover for lettuce cultivars “Verônica” and “Great Lakes” in Boa Vista. . KEYWORDS: Rice husk; high temperatures; protected cultivation. INTRODUÇÃO A alface (Lactuca sativa L.) é uma hortaliça de origem asiática pertencente ao grupo das folhosas mais populares no mundo. Seu largo consumo se dá principalmente in natura, em saladas, em função de suas características nutricionais, pois é rica em vitaminas A, B1, B2 e C, além de apresentar boas concentrações de ferro, cálcio e fósforo; e ter o preço de compra reduzido ao consumidor (Resende et al. 2007; Sala & Costa 2012) O sistema produtivo da alface no Brasil é afetado por vários fatores ambientais. Dentre esses, destacam-se o fotoperíodo longo, a alta incidência luminosa e, principalmente, as altas temperaturas. A ação conjunta desses fatores pode causar danos fisiológicos às plantas, além de aumentar a evaporação da água do solo e a diminuição da atividade radicular, causando, consequentemente, perdas na produção (Muller 1991; Repke et al. 2009). Em Roraima, esses fatores ambientais são característicos durante grande parte do ano, podendo, com isso, limitar a produção de alface. No entanto, vários são os mecanismos utilizados que buscam minimizar seus efeitos. Bol. Mus. Int. de Roraima v8(2): 47-52. 2014 Entre esses, destacam-se o cultivo em ambiente protegido e o uso de coberturas de solo com plásticos e com restos vegetais, visando manter as características agronômicas desejáveis à planta (Araújo et al. 2001; Tosta et al. 2010; Viana et al. 2013). Nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo avaliar a influência de tipos de coberturas de solo no cultivo das variedades de alface, crespa e americana, nas condições climáticas de Boa Vista, Roraima. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado no Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Boa Vista, no período de 05/10 a 08/12/2013. O clima, de acordo com a classificação de Koppen, é do tipo Aw, com duas estações climáticas bem definidas, uma chuvosa (abril-setembro) e outra seca (outubromarço) (Araújo et al. 2001). Os dados meteorológicos diários do experimento, representados pelos valores médios de temperaturas máxima e mínima, e da evaporação, foram obtidos às 8 horas, através das leituras de termômetro de máxima e mínima e do Tanque Classe A, respectivamente, instalados no interior do ambiente protegido. Para a realização diária das leituras de temperatura do solo foi utilizado um geotermômetro digital, coletando os dados às 12 horas de cada dia. O solo utilizado na pesquisa foi classificado como Latossolo Amarelo distrófico, textura média com características: pH em água variando de 5,0 a 5,2; P disponível = 0,39mg dm-3; CTC total = 2,5cmolc dm-3; H+ + Al3+ = 2,2cmolc dm-3; Al3+ = 0,74cmolc dm-3; K+ disponível = 0,04cmolc dm-3; Ca2+ disponível = 0,06cmolc dm-3 e Mg2+ = 0,03cmolc dm-3. O delineamento experimental utilizado foi inteiramente casualizado, em esquema fatorial 5 x 2 com cinco repetições, proveniente da combinação de cinco tipos de cobertura: T1 solo descoberto (testemunha), T2 - plástico preto (mulching), T3 - capim Seco (Trachypogon spicatus (L. f.) Kuntze), T4 casca de arroz in natura (Oryza sativa) e T5 pó de serra (maravalha). Foram empregadas duas variedades de alface: crespa cv. “Verônica” e americana cv. “Grandes Lagos”. Vasos de polietileno de cinco litros foram utilizados como unidade experimental, totalizando 50 vasos. Cada um foi preenchido Monteiro Neto et al. com 1,2kg de brita no fundo para impedir a perda de solo e facilitar a drenagem, e 4,5kg de solo. Após esse preenchimento, realizou-se a adubação química com 9g de calcário, 6,8g de superfosfato triplo, 1,4g de cloreto de potássio (KCl) e 2,2g de ureia em cada vaso experimental. As mudas foram produzidas sob estufa agrícola, em bandejas de isopor de 128 células contendo substrato comercial, usando uma semente por célula. Após 15 dias, quando as mesmas apresentaram quatro folhas, foram transplantadas para os vasos, sendo três plantas por vaso. As coberturas foram instaladas sete dias após o transplante. Posteriormente, fez-se o desbaste aos dez dias após o transplantio deixando a planta com maior uniformidade em relação às demais. A irrigação foi realizada por aspersão elevando o teor de água do solo até à capacidade de campo durante todo o ciclo da cultura. Não houve a necessidade de aplicação de defensivos para o controle de pragas e doenças. Aos 35 dias após o transplantio realizou-se a colheita, avaliando as seguintes características agronômicas nas duas variedades de alface estudadas: altura das plantas (AP), número de folhas (NF), massa fresca (MFPA) e massa seca da parte aérea (MSPA), massa fresca das raízes (MFR) e massa seca das raízes (MSR), diâmetro médio dos caules (DC). Para essas avaliações utilizou-se uma balança eletrônica de precisão, um paquímetro eletrônico, uma régua graduada e uma estufa de circulação forçada de ar a 60ºC. Os resultados foram submetidos à análise de variância utilizando-se o software SISVAR (Ferreira 2011). Na significância das análises de variância, as médias foram comparadas pelo teste de Tukey, no nível de 5 % de probabilidade. RESULTADOS E DISCUSSÃO Durante o experimento, as médias de temperaturas mínima e máxima, dentro da estufa, foram de 23,5°C e 33,9°C, respectivamente, sendo desfavoráveis ao cultivo de hortaliças folhosas como a alface, necessitando assim o uso de práticas que minimizem seus efeitos (Silva et al. 2000). As temperaturas médias do solo para os 48 Bol. Mus. Int. de Roraima v8(2): 47-52. 2014 tratamentos: solo descoberto, plástico preto, capim Trachypogon, casca de arroz e pó de serra foram respectivamente, 26,8ºC, 27,1ºC, 27,0ºC, 25,9ºC e 26,3ºC. Com isso, observou-se que a utilização de casca de arroz sobre o solo diminuiu a temperatura média em 1,2ºC, comparada com a cobertura com plástico preto que propiciou a maior temperatura analisada. A evaporação média do tanque Classe A (ECA) foi de 2,1mm/dia. Com base nesses dados, foi possível observar quais coberturas de solo podem minimizar a ação das altas temperaturas de Boa Vista no cultivo protegido da alface. Observouse interação significativa dos tipos de coberturas x cultivares para todas as características estudadas, exceto para o diâmetro do caule, que não diferiu entre as duas cultivares. Este resultado mostrou que a cultivar “Verônica” foi superior a cultivar “Grandes Lagos” em quase todos os parâmetros agronômicos avaliados (Tabelas 1 e 2). Monteiro Neto et al. As diferenças significativas de produção entre as cultivares “Verônica” e “Grandes Lagos” eram esperadas, pois a produção de uma cultivar se dá em função de seu genótipo e de sua interação com o ambiente (Silva et al. 2000; Queiroga et al. 2001). Mógor & Câmara (2007), avaliando o efeito de coberturas de solo em cultivo orgânico, observaram que as variedades de alface crespa, lisa e americana são influenciadas diferentemente entre si pelos tipos de cobertura utilizados. Quanto as variáveis produtivas analisadas, para a altura da planta (AP), a cultivar “Verônica” foi 18,77 % superior à cultivar “Grandes Lagos”. Dentro da cultivar “Verônica”, a cobertura de solo com casca de arroz (36,32cm) foi superior às demais, sendo que o plástico preto, o capim Trachypogon e o pó de serra não diferiram entre si. Contudo, estes três últimos tratamentos foram superiores ao tratamento sem cobertura. Na análise da cultivar “Grandes Lagos”, os melhores Tabela 1. Interação tratamentos x cultivares sobre a altura da planta (AP), o número de folhas (NF) e o diâmetro do caule (DC) e as médias das coberturas sobre as cultivares analisadas em Boa Vista, Roraima. *Significativo a 5% pelo teste F, nsnão significativo, Médias seguidas de mesmas letras maiúsculas nas linhas e minúsculas nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tukey a (P<0.05). 49 Bol. Mus. Int. de Roraima v8(2): 47-52. 2014 Monteiro Neto et al. Tabela 2. Interação tratamentos x cultivares sobre a massa fresca da parte aérea (MFPA), massa seca da parte aérea (MSPA), massa fresca da raiz (MFR) e massa seca da raiz (MSR) e médias das coberturas sobre as cultivares analisadas em Boa Vista, Roraima. *Significativo a 5% pelo teste F, nsnão significativo, Médias seguidas de mesmas letras maiúsculas nas linhas e minúsculas nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tukey a (P<0.05). resultados foram obtidos com as coberturas com casca de arroz (30,34cm) e com capim Trachypogon (28,88cm), que não diferiram estatisticamente entre si, mas foram superiores às demais coberturas (Tabela 1). Para o número de folhas (NF), as coberturas mostraram ser decisivas nos 9,09 % de superioridade da cultivar “Verônica” sobre a “Grandes Lagos”, visto que, quando cultivadas sem coberturas a “Grandes Lagos” foi superior estatisticamente à “Verônica”. As coberturas com melhor desempenho para a cultivar “Verônica”, quando comparadas à cultivar “Grandes Lagos”, foram o plástico preto, capim Trachypogon e pó de serra. As coberturas com casca de arroz (12,6 folhas) e com pó de serra (12,2 folhas) apresentaram os melhores resultados estatísticos dentro da cultivar “Verônica”. Quanto na cultivar “Grandes Lagos”, a cobertura com casca de arroz (12,4 folhas) mostrou ser estatisticamente superior às demais (Tabela 1). Para a massa fresca da parte aérea (MFPA), a “Verônica” foi 42,53 % superior a “Grandes Lagos”. Entre as coberturas sobre a cultivar “Verônica”, o pó de serra (41,874g) foi 50 Monteiro Neto et al. Bol. Mus. Int. de Roraima v8(2): 47-52. 2014 superior, seguida da casca de arroz (38,882g) e das coberturas com plástico preto e com capim Trachypogon. Resultados similares de MFPA entre as cultivares foram observados na variável massa seca da parte aérea (MSPA), sendo a cultivar “Verônica” 62,55 % superior a cultivar “Grandes Lagos”. As coberturas com casca de arroz (2,180g) e com pó de serra (2,062g) proporcionaram melhores resultados sobre as demais coberturas na cultivar “Verônica”, e para “Grandes Lagos”, a cobertura com casca de arroz (1,464g) foi estatisticamente superior às demais coberturas avaliadas (Tabela 2). Quanto à massa fresca da raiz (MFR), a cultivar “Verônica” mostrou ser 44,13 % superior à cultivar “Grandes Lagos”. Os melhores resultados foram obtidos com as coberturas com pó de serra (1,364g) para a cultivar “Verônica” e com casca de arroz (0,954g) para a cultivar “Grandes Lagos”. Já para a massa seca da raiz (MSR), a cultivar “Verônica” mostrou ser 26,90 % superior a cultivar “Grandes Lagos”, devido, principalmente, a cobertura com pó de serra. As coberturas com casca de arroz (0,174g) e com pó de serra (0,182g) foram superiores para a cultivar “Verônica”, e para a cultivar “Grandes Lagos”, a cobertura com casca de arroz (0,146g) (Tabela 2). Em síntese, a utilização de diferentes tipos de coberturas de solo influenciou significativamente no desempenho das duas cultivares de alface analisadas, tendo as coberturas com casca de arroz e com pó de serra melhores efeitos sobre a maioria das características estudadas entre as cultivares “Verônica” e “Grandes Lagos”. Segundo Silva et al. (1994); Gasparim et al. (2005); Resende et al. (2005), o uso desses materiais, como a casca de arroz e o pó de serra, favorece a brotação e o crescimento das plantas por não imobilizar quantidades significativas de nitrogênio devido sua lenta decomposição, além de melhorar as condições de umidade e de temperatura do solo para as plantas, minimizando assim os efeitos causados pelas altas temperaturas, aumentando, consequentemente, a produção. Por outro lado, a utilização do plástico de coloração escura aumenta a temperatura do solo, promovendo diminuição na produção da alface, pois compromete as reações químicas e a disponibilidade de nutrientes. Além disso, o uso de plástico escuro diminui a atividade funcional das raízes e a velocidade de crescimento das plantas, além de comprometer a atividade microbiana presente no solo. De modo geral a casca de arroz foi eficiente no cultivo das duas variedades de alface, sendo este resultado importante para os produtores do município de Boa Vista, pois existe grande disponibilidade desse material proveniente da produção de arroz em Roraima. CONCLUSÕES A alface crespa cv. “Verônica” foi mais produtiva e resistente às condições climáticas de Boa Vista do que a americana cv. “Grandes Lagos”. A utilização de casca de arroz como cobertura de solo foi eficiente nos parâmetros produtivos das cultivares estudadas, podendo ser substituída pela cobertura com pó de serra, principalmente, na cultivar “Verônica”. As altas temperaturas de Boa Vista podem influenciar negativamente no cultivo de alface, caso não seja feito um manejado adequado. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS Araújo, W.F.; Andrade Júnior, A.S.; Medeiros, R.D. & Sampaio, R.A. 2001. Precipitação pluviométrica provável em Boa Vista, Estado de Roraima, Brasil. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental 5(3): 563-567. Ferreira, D.F. 2011. Sisvar: a computer statistical analysis system. Ciência e Agrotecnologia 35(6): 1039-1042. Gasparim, E.; Ricieri, R.P.; Silva, S.L.; Dallacort, R. & Gnoatto, E. 2005. Temperatura no perfil do solo utilizando duas densidades de cobertura e solo nu. Acta Scientiarum Agronomy 27(1): 107-115. Mógor, A.F. & Câmara, F.L.A. 2007. 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