Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Bases de Reflexão para um PROGRAMA NACIONAL DE SAÚDE DA VISÃO 1 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Grupo de Trabalho criado por Despacho de 12 de Fevereiro de 2003, do Director-Geral e Alto Comissário da Saúde Professor Doutor António Castanheira Dinis Professor Doutor António Marinho Professor Doutor Eugénio Leite Professor Doutor Fernando Falcão Reis Professor Doutor Joaquim Murta Professor Doutor José Guilherme da Cunha Vaz Professor Doutor José Rui Faria de Abreu Professor Doutor Luis Metzner Serra Professor Doutor Luis Nuno Ferraz de Oliveira Professor Doutor Manuel Monteiro Grillo Professor Doutor Paulo Torres Professor Doutor Rui Proença 2 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 ÍNDICE 1- Plano Nacional de Saúde da Visão – Orientações Gerais 1.1 - Introdução 1.2 - Estratégia Oftalmológica Nacional 1.3 - Plano de Acção 1.3.1 - Diagnóstico, Tratamento e Reabilitação 1.3.2 - Prevenção Primária, Rastreio e Detecção Precoce 1.3.3 - Ensino e Formação dos Profissionais de Saúde 1.3.4 - Investigação 2- Identificação das Patologias a Combater 2.1 - Ambliopia 2.2 – Diabetes e Retinopatia Diabética 2.3 – Erros Refractivos 2.4 – Degenerescência Macular Relacionada com a Idade 2.5 – Glaucoma 2.6 – Catarata 3- Bases para um Plano Nacional de Saúde da Visão 3.1 – Introdução 3.2 – Objectivos 3.3 – Princípios Orientadores 3.4 – Cuidados Primários e Actividades de Rastreio 3.5 – Caracterização dos Serviços de Oftalmologia Hospitalares 3.6 – Concretização da Proposta de um Plano Nacional de Oftalmologia para Portugal. Definição das Unidades Funcionais de Saúde da Visão (UFSV) nas Três Regiões de Assistência de Portugal (Norte, Centro e Sul e Ilhas) 3.7 – Execução da Proposta 3.8 – Acompanhamento e Excecução 3.7 – Actividades de Ensino e Investigação 3 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 4- Referências Bibliográficas 1 - PLANO NACIONAL DE SAÚDE DA VISÃO – ORIENTAÇÕES GERAIS 1.1 - INTRODUÇÂO O sentido da visão representa, na actualidade, um meio de comunicação fundamental para a relação entre as pessoas, com elevado significado social e um dos mais importantes, na vertente e diversidade profissional. Neste contexto, a visão deve ser preservada em toda a população, desde o nascimento e ao longo da vida, sendo, ainda, mandatório que a doença visual seja prevenida e tratada com o fim de evitar morbilidade a qual tem sempre implicações familiares, profissionais e sociais, e representa custos muito elevados. A evolução técnica e científica vieram a permitir evitar-se a cegueira em elevado número de pessoas – a chamada cegueira curável – e a estabelecerem-se metodologias de apoio para as situações de cegueira já estabelecidas ou possíveis de virem a acontecer. É princípio universal que a maior parte da patologia oftalmológica pode ser prevenida quando se utilizam acções adequadas a cada entidade nosológica e reconhece-se que, que r na criança quer no adulto, a prevenção se baseia, principalmente, no diagnóstico, se bem que o reconhecimento de grupos susceptíveis, possa ter significado na planificação e estratégia de rastreios sistemáticos. Sendo a prevenção em Oftalmologia predominantemente diagnóstica, deve o Plano Nacional de Saúde da Visão fixar princípios orientadores que encaminhem o possível doente para o oftalmologista que não só estabelece o diagnóstico como, de imediato, institui a terapêutica adequada a cada caso. Em suma, deve instituir o diagnóstico precoce e promover o tratamento imediato. Neste sentido, o Plano Nacional de Saúde da Visão deve definir as entidades nosológicas mais frequentes e susceptíveis de provocar a cegueira ou morbilidade visual, deve planificar e encontrar a melhor estratégia para os rastreios sistemáticos, deve definir a rede de referenciação e fluxograma orientador dos doentes diagnosticados e, por fim, definir a modalidade organizativa das unidades assistenciais intervenientes, em recursos humanos, em instalações e em equipamentos, tendo em conta o seu nível de referenciação e a sua diferenciação. 4 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Isto é, um Plano Nacional que se adeque às três principais Regiões do País e às Regiões Autónomas e que se apoie, com algumas actualizações, nos princípios e elementos já anteriormente definidos e que dizem respeito à rede de referenciação das Unidades Funcionais, aos recursos humanos, às instalações e ao equipamento. 1.2 - ESTRATÉGIA OFTALMOLÓGICA NACIONAL Pretende-se, com a concretização deste Plano, alcançar os níveis de Sanidade e os padrões assistenciais, na área da Saúde da Visão semelhantes aos dos restantes países comunitários, preenchendo o espaço que existe entre o potencial de conhecimentos técnicos e de disponibilidade tecnológica e as necessidades assistenciais nesta área da Saúde, tendo em conta a importância da Saúde da Visão para o bem estar e contribuição económica e social da população portuguesa. 1. A Saúde da Visão é fundamental para o bem estar e actividade económica da população. As necessidades nesta área são cada vez maiores, tendo em conta o predomínio da comunicação visual na vida actual. As consequências negativas da baixa de visão são muito graves acarretando encargos importantes económicos para o País. Portugal, um país em desenvolvimento acelerado no contexto da comunidade europeia, deverá ter como prioridade sanitária uma acção eficaz na preservação da Saúde da Visão. 2. A melhoria da acessibilidade e tratamento oftalmológicos exigem o desenvolvimento de uma política de coordenação, interacção e complementaridade dos Serviços de Saúde a todos os níveis. Pretende-se o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis. 3. A Oftalmologia, especialidade médico - cirúrgica que se dedica à preservação da Saúde da Visão é uma actividade médica que se realiza em melhores condições quando efectuada em instituições hospitalares e em equipa. 4. Os recursos em meios de assistência oftalmológica, tanto de pessoal como de equipamento, devem portanto, ser agrupados em unidades oftalmológicas de estrutura hospitalar, localizadas quer nos próprios centros hospitalares quer em postos avançados 5 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 dependentes de uma unidade hospitalar. 5. Estas unidades hospitalares oftalmológicas devem ser articuladas, em níveis de diferenciação assistencial de acordo com razões de distribuição geográfica, populacional e técnicas em Unidades Funcionais da Saúde da Visão. Cada Unidade Funcional deverá ser coordenada por um Serviço Oftalmológico altamente diferenciado que deverá preencher as condições técnicas e científicas definidas como necessárias para obter a designação de Serviço Oftalmológico Central. 6. As Unidades Funcionais, assegurarão a coordenação das acções a desenvolver a nível de cada Área de Saúde da Visão Portugal. 7. A caracterização das unidades oftalmológicas hospitalares e a sua diferenciação será condicionada a uma programação tecnológica e económica. 8. A formação profissional no âmbito dos cuidados da Saúde da Visão de médicos oftalmologistas, enfermeiros e técnicos auxiliares de Oftalmologia será considerada actividade prioritária. 9. Devem as instituições vocacionadas para a investigação, realizar actividades de investigação que são consideradas essenciais para a melhoria constante da Saúde da Visão e formação duma Política de Saúde coerente. 1.3 - PLANO DE ACÇÃO 1.3.1 - Diagnóstico, Tratamento e Reabilitação O diagnóstico, tratamento e reabilitação do doente oftalmológico pressupõe a existência à escala nacional de Serviços e instituições devidamente coordenadas com uma organização e funcionamento articulados de acordo com o seguinte esquema: 1. Criação de Unidades Funcionais de Saúde da Visão nas principais Regiões de Saúde de 6 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Portugal (Norte, Centro e Sul) que assegurem a articulação e a coordenação funcional entre Serviços Oftalmológicos Centrais e Serviços de Oftalmologia localizados em Hospitais mais periféricos. 2. Cada Área Assistencial, definida com base em critérios geográficos, populacionais e técnicos deverá ter como Unidade Coordenadora um Serviço Oftalmológico Central, altamente diferenciado. 3. As Unidades Funcionais de Saúde da Visão (UFSV) terão como funções: - Fomentar a interligação regular e permanente entre os Especialistas localizados nos diversos Serviços e avaliar a sua eficiência e eficácia. - Criar um esque ma escalonado e organizado de Urgência Oftalmológica, integrado numa Rede Nacional de Urgência Oftalmológica. - Garantir a circulação de informação clínica entre os Serviços. - Avaliar as realidades, prioridades e necessidades de cada Área Assistencial do País. - Propor aos Organismos Estatais Superiores medidas concretas no sentido de resolução de problemas identificados na respectiva Área Assistencial. - Recolher os dados estatísticos que se definam importantes e manter a sua actualização. - Fazer as ligações necessárias com as Administrações Regionais de Saúde. 4. Apetrechamento em Pessoal e Equipamento das Unidades Oftalmológicas Hospitalares que forem progressivamente identificados como unidades essenciais à boa execução do Plano Nacional de Saúde da Visão. 5. Os Serviços Oftalmológicos Centrais que terão funções de Coordenação de Unidades Funcionais são os seguintes: Serviços de Oftalmologia do Hospital de S. João e do Hospital de Stº. António, na Região Norte, Serviço de Oftalmologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra na Região Centro e Serviços de Oftalmologia do Hospital de Egas Moniz, Hospitais Civis de Lisboa, Hospital de Stª. Maria, e o Instituto de Oftalmologia Dr. Gama Pinto na Região Sul. 1.3.2 - Prevenção Primária, Rastreio e Detecção Precoce A prevenção primária e a redução de risco, o rastreio e a detecção precoce, anterior à 7 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 manifestação dos primeiros sintomas, constituem as medidas mais eficazes e determinantes na redução das taxas de incidência e morbilidade das doenças da visão. Tem-se, no entanto, presente que muitas destas acções, nomeadamente o rastreio e a detecção precoce só têm verdadeira utilidade desde que esteja assegurada a resposta às necessidades levantadas pela próprio Rastreio. Existem diferentes definições para cuidados primários de saúde e, como tal, no que respeita à Oftalmologia, este facto deve motivar uma cuidadosa reflexão para a definição de Cuidados Primários de Saúde da Visão. Estes podem ser sumariados como o provimento do primeiro contacto de cuidados para todas as situações oftalmológicas e o seguimento, prevenção e reabilitação de situações oftalmológicas seleccionadas. O conteúdo clínico dos cuidados primários consiste na primeira apresentação da doença, o tratamento de doenças menores e traumatismos, a recorrência da doença, o seguimento e suporte de algumas doenças crónicas, e o fornecimento de cuidados preventivos de saúde. Assim, os Cuidados Primários de Saúde da Visão seriam o provimento do primeiro contacto de cuidados para as principais causas de alterações ou doenças oculares que são: (1) erros de refracção; (2) doenças da córnea e conjuntiva; (3) catarata; (4) glaucoma; (5) doenças da retina e coroideia; (6) diabetes; (7) ambliopia e estrabismo. A sua estruturação permitiria, ainda, o fornecimento de cuidados preventivos de saúde através da realização de rastreios e programas da saúde específicos. Para serem considerados Cuidados Primários, os Serviços têm de ser caracterizados por: (1) primeiro contacto; (2) acessibilidade, quer geográfica quer organizacional; (3) continuidade, onde os cuidados são prestados de forma continuada (o mesmo médico) ou pela disponibilidade de registos médicos; (4) longitudinalidade, onde os indivíduos se identificam com a unidade de saúde como sendo própria; (5) disponibilidade de um largo leque de serviços para uma larga quantidade de problemas, prestado directamente ou noutras unidades, após referenciação fácil; (6) coordenação, através da disponibilidade de informação dos problemas anteriores e serviços, reconhecimento do seu significado e transferência da informação para outros profissionais de saúde para os quais são referenciados; (7) equidade, em que os serviços são prestados a todos os indivíduos da população sem distinções; (8) responsabilidade, em que o serviço é responsável pelos pressupostos anteriores e os doentes 8 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 responsáveis por manter esta relação, tomar medidas preventivas e participar em programas de diagnóstico e tratamentos precoces. Por tudo isto consideramos estas actividades com uma responsabilidade corolário natural das actividades das unidades hospitalares integradas nas diversas Unidades Funcionais. A - Prevenção Primária Considera-se importante adoptar um conjunto de acções de protecção da Saúde da Visão nomeadamente: 1. Divulgação de cuidados a ter com a Saúde da Visão, nomeadamente nas escolas e locais de trabalho. 2. Fomentar o estabelecimento de organismos encarregados do controle de qualidade e normas de segurança de instrumentação óptica, condições de iluminação das habitações, escolas, locais de trabalho, etc. 3. Promover a caracterização da correlação entre a luz ambiental e a incidência das afecções oftalmológicas em Portugal nas diferentes regiões Geográficas do País. B - Rastreio A actividade de Rastreio deverá constituir um objectivo importante deste Plano logo que estejam asseguradas a cobertura assistencial oftalmológica do País pelo eficiente funcionamento das Unidades Coordenadoras Funcionais de Zona. 1. Rastreio Sistemático Recomenda-se a seguinte orientação sobre o rastreio sistemático: a) Rastreio Visual na Infância: No período peri- natal No período pós-natal, até aos 2 anos de idade. No período dos 2 aos 5 anos de idade (período pré-escolar) e depois dos 5 anos (período escolar). b) Rastreio visual na Idade Adulta: Com duas vertentes principais, epidemiológico e laboral e particular 9 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 incidência, incluindo exames anuais nos indivíduo com idade superior a 60 anos de idade. O Programa Nacional de Diagnóstico Sistemático da Retinopatia Diabética, já a decorrer, é considerado como de grande importância e de utilidade indiscutível. 1.3.3 - Ensino e Formação dos Profissionais de Saúde O ensino pré-graduado e pós-graduado de Oftalmologia constitui um componente essencial deste programa Nacional de Saúde da Visão. Sem recursos humanos qualificados, médicos, enfermeiros e técnicos, não será possível implementar as acções previstas no Plano Nacional de Saúde da Visão. Os Serviços Oftalmológicos Centrais deverão constituir Centros de Formação Permanente que se responsabilizem, pela formação dos recursos humanos a todos os níveis e para todas as categorias de pessoal e que permita a realização de estágios programados dos elementos dos outros hospitais mais pequenos. A. Ensino Pré -Graduado O curriculum de curso médico deve manter uma disciplina/área de Oftalmologia que aborde de uma forma prática os aspectos relacionados com o diagnóstico das alterações mais frequentes da Saúde da Visão. B. Ensino Pós-Graduado a) Internatos da Especialidades Deve o Internato de Oftalmologia ser realizado apenas em instituições idóneas para a sua formação, devendo sempre ser realizado sob responsabilidade e na maioria do tempo de internato nos Serviços Oftalmológicos Centrais com funções de Unidade Coordenadora. A atribuição de internatos deve ser feita com base nas necessidades nacionais de assistência oftalmológica mas deve procurar em princípio garantir um número mínimo de três elementos por Serviço Oftalmológico Central para que o ensino se faça em condições adequadas. 10 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 b) Formação especializada em Áreas Específicas de Oftalmologia Os Serviços Oftalmológicos Centrais responsáveis pelas Unidades Coordenadoras Funcionais de Zona devem colaborar entre si na formação de Centros de Formação Permanente em Oftalmologia, no Porto, Coimbra e Lisboa os quais terão por funções: - Realizar anualmente Reuniões de Actualização para Especialistas e Internos de Especialidade, Enfermeiros e Técnicos. - Criar Ciclos de Estudos Especiais ou Programas Nacionais de Formação. - Realizar Cursos Práticos e Estágios de Reciclagem para os médicos dos Hospitais mais periféricos. c) Enfermeiros Os Centros de Formação Permanente deverão realizar 1 ou mais Cursos Pós-Graduados de Enfermagem Oftalmológica em cada ano. d) Técnicos As Unidades Coordenadoras em colaboração com as Escolas Técnicas do Serviço de Saúde deverão promover a formação de Técnicos Auxiliares de Oftalmologia nas diversas áreas de assistência técnica oftalmológica, nomeadamente, e no momento actual: perimetria, ecografia, imagiologia, angiografia, electroretinografia e refractometria automatizada. 1.3.4 - Investigação A - Cooperação de Investigadores O Plano de Saúde da Visão terá de considerar entre os seus objectivos o desenvolvimento de um programa de fomento da investigação básica e clínica em Ciências da Visão. Considera-se essencial a criação de condições que permitam acções concertadas interinstitucionais a nível nacional ou no âmbito da comunidade, através da formação de Redes 11 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 de Ciências da Visão. Esta metodologia de investigação aumenta a eficiência pelas sinergias resultantes da multidisciplinariedade, cria melhores condições para análises estatísticas, permite estudos multicêntricos e um melhor aproveitamento dos recursos disponíveis. B - Fomento da Investigação Oftalmológica Considera-se que a realização da investigação é uma condição fundamental para a procura de excelência nos cuidados assistenciais. Reconhece-se também a complexidade e multidisciplinariedade da investigação na Área das Ciências da Visão, bem como o desenvolvimento já atingido pelo País nalgumas áreas específicas. Deverá pois criarem-se condições para a formação nos Serviços Oftalmológicos Centrais de Centros de Investigação Clínica de Ciências da Visão. A sua diferenciação em áreas específicas de Oftalmologia, i.e., Retina, Glaucoma, Cirurgia Refractiva, Oftalmologia Pediátrica, etc. deve ser apoiada. Para apoiar este processo dinâmico e concertado deverá existir uma Comissão Nacional para o Plano de Saúde da Visão com a participação de representantes dos Serviços Oftalmológicos Centrais. C - Centros de Investigação Clínica e Projectos de Investigação Propõe-se o Conselho do Plano Nacional de Saúde da Visão criar um Gabinete de Fomento da Investigação Oftalmológica para colaborar na definição de estratégias de desenvolvimento de investigação em Ciências da Visão. D - Laboratórios de Investigação Básica em Ciências da Visão Deverá ser fomentada a realização de investigação experimental e laboratorial em Ciências da Visão em colaboração íntima com as unidades de investigação clínica. Para o efeito deverão ser prioritariamente criadas todas as condições para o desenvolvimento de mecanismos de colaboração. Tem-se presente que os objectivos só serão atingidos na sua plenitude quando se estabelecer uma simbiose entre o Laboratório e a Clínica. Neste mesmo espírito considera-se essencial atrair para os Centros de Investigação Clínica de Ciências da Visão licenciados em Física, Farmácia, Química, Biologia, Engenharia, etc. 12 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 E - Bolsas Deverão ser criados sob propostas da Comissão Nacional do Plano de saúde da Visão Bolsas para a realização de Estágios no País ou no Estrangeiro, quando tal for de interesse para a criação de capacidades não existentes no País 13 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 2 – IDENTIFICAÇÃO DAS PATOLOGIAS A COMBATER As deficiências visua is são dominadas pelos problemas de refracção acessíveis à correcção óptica: miopia, hipermetropia, astigmatismo e presbiopia. Neste capítulo, para além dos erros refractivos, faz-se referência às principais doenças susceptíveis de acarretar, mais ou menos a longo prazo, perda de visão (catarata, doenças maculares, glaucoma). Aplicam-se noções definidas pela O.M.S. de «cegueira total», «cegueira legal» (AV corrigida inferior a 1/10 no melhor olho; campo visual estreito e inferior a 5 graus) e de «má visão» (AV corrigida inferior a 3/10 no melhor olho; campo visual inferior a 20 graus). 2.1 - AMBLIOPIA Ambliopia é uma diminuição da visão que resulta de uma deficiente estimulação do sistema visual durante os primeiros anos de vida. 2.1.1 – Prevalência Estima-se uma prevalência de 1,00 a 2,5 % de ambliopía entre as crianças. Estas estimativas não derivam directamente de estudos populacionais, mas antes dados inferidos a partir dos estudos feitos sobre a hipovisão monocular. A ambliopía é uma das três principais causas de hipovisão monocular em idades entre os 18 e os 85 anos. Este facto revela que a ambliopía é uma doença que persiste e resiste ao tratamento. Os factores de risco (factores ambliogénicos) devem ser a foco da atenção dos programas de combate à doença. Entre os principais factores ambliogénicos encontram-se a existência de um elevado erro refractivo, anisometropia elevada ou estrabismo. O papel dos factores ambliogénicos e o rastreio precoce têm sido alvo de atenção particular de alguns investigadores com resultados controversos. 2.1.2 - Impacto económico Existem pouco dados referentes aos custos reais da ambliopia. Nos Estados Unidos os custos do rastreio da ambliopia foram estimados em cerca de $385 USD por cada caso detectado (1996). O rastreio de cada criança custaria cerca de $2 USD, e tendo em conta uma 14 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 prevalência próxima dos 4%, sendo o custo da observação pelo oftalmologista de $100 USD. O sucesso da terapia da ambliopia está inversamente relacionado com o tempo de tratamento. Este facto parece esconder factores fisiopatológicos desconhecidos, ausência de compliance com os meios erapêuticos mais do que a ausência de efeito benéfico da terapia. 2.1.3 - Patogénese Ambliopia é um defeito do desenvolvimento da visão cujo sintoma principal é a perda de acuidade visual. Está quase sempre associada com a presença de estrabismo, anisometropia ou a privação do estímulo visual em idade precoce. A perda da função visual pode ser monocular ou binocular. Ao contrário do sistema auditivo onde o limiar do recém nascido (RN) é igual ao do adulto, o limiar visual é muito inferior no RN. O sistema visual do RN requer experiência visual, e ao que parece uma experiência visual interactiva entre os dois olhos para gerar os níveis de função visual do adulto. O estudo do desenvolvimento do sistema visual revelou a existência de períodos críticos. O conceito de plasticidade e desenvolvimento visual contínuo vieram substituir os antigos dogmas. 2.1.4 - Apresentação Clínica Emboram existam bastantes factores de risco descritos, são três os principais factores para o desenvolvimento de ambliopia: estrabismo, anisometropia e privação da imagem. Verificar a existência de uma ambliopia numa criança em fase pré-verbal não é tarefa fácil. A incapacidade de manter a fixação em condições binoculares, resistência à oclusão de um olho ou a existência de uma assimetria na identificação dos caracteres de Teller são pistas importantes para o diagnóstico. Numa criança em fase verbal a tarefa é mais fácil. O registo da acuidade visual do olho amblíope é um passo fundamental no exame oftalmológico da criança amblíope. Para além da evidente relevância diagnóstica tem interesse para determinar a resposta ao tratamento e o prognóstico. 2.1.5 - Prevenção O estudos no que respeita à prevenção da ambliopia são confusos. Alguns estudos não 15 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 demonstraram beneficio claro na correcção precoce dos factores ambliogénicos enquanto que outros demonstraram claramente que a detecção precoce de hipermétropes acima das +3 D, e a sua correcção precoce preveniriam o aparecimento de um estrabismo acomodativo, por si só precussor de ambliopia 2.1.6 - Rastreio e Tratamento Apesar de controversos, os programas de rastreio têm um papel importante em função dos poucos conhecimentos actuais acerca da totalidade dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos. Estudos populacionais revelaram a existência de grupos de risco como os prematuros e as crianças com atraso de desenvolvimento. São fundamentos empíricos que continuam na base do rastreio de factores refractivo s, doenças orgânicas ou estrabismo que possam estar nas base do desenvolvimento de ambliopia. O tratamento da ambliopia assenta essencialmente na oclusão do olho normal. Embora exista um consenso generalizado acerca da sua validade, restam muitas divergênc ias acerca do tipo de oclusão (total ou parcial), extensão e duração. A análise dos estudos dos últimos 30 anos revela que a idade de início de tratamento e a profundidade da ambliopia são os dois principais factores prognósticos. Mais recentemente têm sido realizados estudos acerca da validade de agentes farmacológicos ou ópticos no tratamento da ambliopia. A penalização do olho não amblíope com atropina ou lentes de elevada potência negativas ou positivas têm-se revelado tão eficazes como a oclusão em pacientes com ambliopias moderadas. 2.2 - DIABETES E RETINOPATIA DIABÉTICA A retinopatia diabética é a alteração vascular e parenquimatosa da retina secundária à microangiopatia que afecta o leito vascular retiniano. É a complicação da diabetes mais frequente a nível ocular e constitui uma das quatro principais causas de cegueira (cegueira legal AV<20/200). Cerca de 25% da população diabética apresentará em alguma altura retinopatia diabética. Antes do aparecimento da insulina a sobrevida dos diabéticos não permitia que desenvolvessem retinopatia grave. Hoje em dia representa um grave problema de saúde pública para o qual todos os clínicos gerais, internistas e endocrinologistas devem 16 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 estar alertados. A prevalência e a incidência da retinopatia diabética estão relacionadas com o tipo, duração e tratamento da diabetes (insulina ou não), com alguns factores sistémicos como a hipertensão arterial (HTA) e o controlo da glicémia nos primeiros momentos da doença. Em alguns estudos epidemiológicos a prevalência aos 10 anos de doença é de 15% sendo de 90% aos 30 anos. Nos diabéticos tipo 1 muito raramente existe retinopatia aos 5 anos ou em período prépuberal. O aparecimento da retinopatia e o desenvolvimento da retinopatia proliferativa estão associados a períodos de glicémia elevados. 2.2.1 - Fisopatologia da Retinopatia Diabética O edema macular é a causa mais frequente de perda visual nos pacientes com retinopatia diabética não proliferativa. Pode surgir numa fase muito precoce da evolução da retinopatia. A prevalê ncia de edema macular está relacionada directamente com a duração e a gravidade da retinopatia variando de 3% na retinopatia na fase inicial até 71% na retinopatia diabética proliferativa. O curso natural da doença segue diferentes etapas do quadro patológico: formação de microaneurismas nos capilares retinianos, aumento da permeabilidade vascular, oclusão vascular, formação de novos vasos e de tecido fibroso sobre a superfície retiniana e disco óptico, contracção da proliferação fibrovascular e do vítreo o que provoca hemorragia do vítreo e descolamento da retina. 2.2.2 - Diagnóstico O diagnóstico da retinopatia diabética é feito inicialmente pelo exame do fundo do olho realizado com o oftalmoscópio. A retinografia consiste em fotografar o fundo ocular, o que permite a melhor valorização das alterações encontradas. A angiografia fluoresceínica, onde um corante é administrado ao doente por via intravenosa, consiste em fotografar seriadamente o fundo ocular à medida que o corante passa pelas diversas estruturas oculares. Tem o interesse de caracterizar funcionalmente as alterações fundoscópicas e serve de registo para avaliar a evolução. A angiografia com verde de indocianina, uma macromolécula que não atravessa a barreira hemato-retiniana está indicada para alterações da vascularização 17 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 coroideia como isquémia e neovascularização. A ultrassonografia tem indicações particulares na avaliação da retinopatia diabética. Tem particular interesse em doentes que apresentem hemorragia de vítreo ou catarata que impossibilite a observação do fundo ocular. 2.2.3 - Epidemiologia da Retinopatia Diabética O Wiscounsin Epidemiologic Study of Diabetic Retinopathy (WESDR) é um estudo epidemiológico em progressão. Entre 1979 e 1980 foram admitidos neste estudo 1210 pacientes com diabetes tipo 1 e 1780 com diabetes tipo 2. O seguimento destes doentes permitiu obter alguns dados importantes. A duração da diabetes está directamente associada com um aumento da prevalência de retinopatia diabética tanto na diabetes tipo 1 como na diabetes tipo 2. Ao fim de 20 anos de diabetes, perto de 100% dos doentes com diabetes tipo 1 e cerca de 60% dos pacientes com diabetes tipo 2 apresentam algum grau de retinopatia diabética. No WESDR cerca de 3,6% dos pacientes com diabetes tipo 1 e 1,6% dos pacientes com diabetes tipo 2 eram legalmente cegos. Daqueles que eram legalmente cegos e tinham diabetes tipo 1, 86% eram legalmente cegos pela retinopatia diabética. No grupo dos diabéticos tipo 2 apenas 1/3 eram cegos pela retinopatia diabética. Este estudo, apesar de ter sido um importante marco no conhecimento da retinopatia diabética apresenta como principal bias o facto de apenas incluír caucasianos. O National Health and Nutrition Examination Survey III da diabetes tipo 2 mostrou que a prevalência de retinopatia diabética era superior em afroamericanos e hispânicos do que em brancos. 2.2.4 - Tratamento da Retinopatia Diabética O tratamento é inicialmente médico controlando os níveis de glicemia e hemoglobina glicosilada. A fotocoagulação com laser usa-se para tratar o edema macular nos seus diversos estadios e/ou para atrasar a progressão de retinopatia diabética não proliferativa para proliferativa. O tratamento pode estar indicado mesmo que não existam sintomas e a visão se mantenha conservada. A panfotocoagulação laser é feita para induzir a regressão dos neovasos e para prevenir a formação de novos vasos, destruindo a retina isquémica e possivelmente aumentando a oxigenação na restante retina. A crioterapia tem hoje indicações mais limitadas. Está reservada para pacientes que não toleram a vitrectomia por uma patologia sistémica e não apresentam transparência de meios para poder tratar a retina com laser. A vitrectomia via pars plana é um poderoso meio terapêutico que foi introduzido nos 18 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 anos 70. O vitréctomo permite eliminar o vítreo alterado, as hemorrogias e as proliferações fibrovasculares que traccionam a retina. 2.2.5 - Dados relativos à situação em Portugal A prevalência da diabetes, segundo os estudos realizados pela Universidade de Coimbra, é na Região Centro de Portugal 2,5% de acordo com os doentes registados nos Centros de Saúde. No Distrito de Coimbra é de 3,2% e no Concelho do Cartaxo, considerado um concelho modelo, era de 3,3%. Em estudos epidemiológicos populacionais verificou-se que para cada diabético conhecido havia um que desconhecia a doença. Projectando para Portugal devem existir entre 400.000 e 500.000 diabéticos, 250.000 dos quais já referenciados nos Serviços de Saúde. No estudo populacional do Cartaxo verificou-se que cerca de 72% dos diabéticos não têm uma assistência oftalmológica adequada: 27.5% nunca tinham sido observados pelo Oftalmologista e 44% não tinham sido observados nos últimos 12 meses. Nos primeiros 18 meses de um Rastreio conduzido pelos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) foram fotografados 18.384 diabéticos (1/3 dos diabéticos identificados) e verificou-se que 13,1% apresentavam lesões na mácula e 3,2% retinopatia proliferativa. Nos HUC verificou-se que dos doentes convocados pelo Centro de Referência 11,7% não necessitavam de laser (falsos positivos). Verificou-se ainda que a diabetes de tipo 2 correspondia a cerca de 90% dos diabéticos e, que entre estes, cerca de 2/3 não tinham lesões. O risco de um doente de tipo 2 evoluir para retinopatia de risco foi relativamente baixo nos 2 anos seguintes. Um aumento da produtividade com experiência adquirida, por um lado, e a autorização para provocar midríase que estava interdita pela Direcção Geral de Saúde (DGS) poderá tornar possível uma aceitável cobertura oftalmológica sem grandes gastos. Com base nestes e outros dados é possível fazer a seguinte projecção para Portugal: Doentes diabéticos: 500.000; Diabéticos conhecidos: 250.000; Diabéticos necessitando de cuidados diferenciados: cerca de 41.000; Diabéticos com necessidade de Laser - Cerca de 36.000; Diabéticos em risco de cegueira: 15.000. 19 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 2.3 - ERROS REFRACTIVOS 2.3.1 - O sistema óptico ocular O olho é composto por uma membrana sensível à luz, a retina, e por um sistema óptico ocular que faz chegar a luz a essa membrana. A refracção é a alteração da trajectória e velocidade que um raio luminoso experimenta ao passar de um meio a outro. Os raios de luz exterior atravessam a córnea e o cristalino até chegarem à retina. A imagem produzida na retina será uma imagem real, invertida e de menor tamanho. O poder refractivo do olho é resultante da interacção geométrica do poder refractivo da córnea, poder refractivo do cristalino, profundidade da câmara anterior e comprimento axial do olho. O poder refractivo da córnea e do cristalino modificam-se durante os dois primeiros anos de vida assim como o comprimento axial do olho. No fim do segundo ano de vida o segmento anterior do olho atinge as proporções de adulto, no entanto as curvaturas das superfícies refractivas sofrem continuamente a alterações até ao início da idade adulta. O olho emetrope é aquele que estando em repouso, não acomodado, ao receber os raios luminosos paralelos provenientes do infinito, forma a sua imagem no plano retiniano. Olho ametrope é aquele que recebendo a luz nas mesmas circunstâncias não consegue formar a sua imagem na retina. A ametropia produz-se por anomalia ou desproporção entre os seguintes factores: diâmetro antero-posterior do olho, curvatura e índice refractivo de cristalino e córnea, posição dos meios ópticos (ex: subluxação do cristalino). Este último mecanismo é raro. 2.3.2 - Prevalência A elevada prevalência de perturbação da função visual devido a erros refractivos não corrigidos ou corrigidos de forma inadequada foi mencionada por múltiplos estudos no passado nomeadamente o Baltimore Eye Survey, o Blue Mountains Eye Study, Victoria Visual Impairment Project e o Andhra Pradesh Eye Disease Study. A existência de um erro refractivo incorrectamente corrigído era responsável pela hipovisão (AV< 20/40) de 2,5% da população com mais de 40 anos no estado de Vitória, Austrália. Outros locais no mundo têm conduzido os seus próprios estudos e feito referência à existência de erros refractivos não 20 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 corrigidos. A elevada prevalência destes erros refractivos e a melhoria da qualidade de vida conseguida com a simples correcção óptica tem feito do rastreio e correcção dos erros refractivos uma importante meta de saúde pública em todo o mundo. Um estudo realizado nos Estados Unidos em 1971-72 estimou a prevalência de miopia em 25% da população entre os 12 e os 54 anos. O Framingham Eye Study verificou uma prevalência de miopia de 17,6 % na população entre os 52 e os 85 anos. Existem dados que permitem verificar que a epidemiologia dos erros refractivos entre crianças em idade escolar e adultos jovens universitários não terá variado muito nos últimos 100 anos. 2.3.3 - Tipos de Erros Refractivos Distinguimos dois tipos de ametropias: as esféricas e as não esféricas. Nas esféricas a curvatura de cada uma das superfícies dióptricas é uniforme, esférica. A este grupo pertencem a miopia e a hipermetropia. A miopia caracteriza-se por um sistema óptico excessivamente convergente e como consequência a imagem de um ponto situado no infinito forma-se à frente da retina. Na hipermetropia, pelo contrário, o olho apresenta dificuldade de convergência o que determina que essa imagem foca atrás da retina. Dentro das ametropias não esféricas encontra-se o astigmatismo. Nesta ametropia o raio de curvatura de algumas superfícies do dióptro não é uniforme. A cada ponto de objecto não corresponde um ponto focal de imagem mas sim uma linha focal, resultante das diferentes potências refractivas dos diferentes meridianos refractivos. A - Miopia A miopia elevada encontra-se associada a outras condições que podem provocar perda grave da função visual como descolamento da retina e degenerescência retiniana miópica. Factores de risco da miopia Para o aparecimento e progressão de miopia parecem contribuir factores genéticos e ambientais. Os factores de risco epidemiologicamente associados são QI elevado, realização frequente de trabalho a pequenas distâncias, prematuridade, baixo peso ao nascimento e história familiar. Alguns estudos realizados na Austrália, Singapura, Hong Kong e Taiwan sugerem um aumento da prevalência de miopia nas últimas décadas. Este aumento parece estar associado ao maior nível de educação e consequentemente ao maior volume de trabalho 21 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 realizado a curta distância apesar de não existir ainda um mecanismo de explicação concreto. A miopia parece ser mais frequente em mulheres. Nos EUA prevalência de miopia é maior entre os americanos de origem asiática, menor nos afroamericanos e intermédia na população branca. O olho míope é um olho que apresenta excesso de convergência; os raios luminosos com ponto de partida no infinito focam-se à frente da retina. À medida que o míope aproxima os objectos vai conseguindo ver com maior nitidez de tal forma que a determinada distância vai obter uma imagem nítida. Este ponto chama-se ponto remoto e é dependente da magnitude da ametropia. O ponto remoto de um míope de uma dioptria é a um metro. O ponto remoto de um míope de 3 D é a 1/3 D, ou seja 0,33m. Existem vários tipos de miopia, mediante a sua forma de evolução e gravidade. A miopia simples, de uma forma geral não ultrapassa as 6 D, afectando perto de 10% da população. Apresentam dificuldade na visão para longe e de forma geral obtém uma excelente visão apenas com correcção óptica adequada. A miopia degenerativa ou maligna é uma verdadeira doença ocular e surge quando o defeito refractivo ultrapassa as 6 D, associando-se a importantes alterações sobretudo na retina e coroideia que comprometem seriamente o futuro visual do paciente. É muito menos frequente do que a miopia ligeira ou moderada e é mais frequente em mulheres. O principal sintoma é a dificuldade de visão para longe e nem sempre corrige com a correcção óptica adequada. As principais alterações degenerativas são o adelgaçamento coroideu, degenerações retinianas preferencialmente maculares e periféricas, degeneração do vítreo que perde as suas propriedades de gel. A complicação mais temível é o descolamento de retina. B - Hipermetropia Este erro refractivo caracteriza-se por um defeito de convergência dos raios luminosos em relação ao comprimento axial do olho. Caracteristicamente têm dificuldade em obter uma imagem nítida sobretudo para objectos a pequenas distâncias onde o poder de convergência requisitado é maior. O indivíduo jovem pode recorrer a esforço de acomodação e aumentar o poder de convergência do sistema óptico. 22 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 A visão será normal à custa do esforço acomodativo ou será enovoada se a capacidade acomodativa não ultrapassar o erro refractivo. Na infância pode aparecer um estrabismo convergente associado a esta ametropia, estrabismo acomodativo. A principal complicação que pode ocorrer associada a este quadro é a ambliopia. A ambliopia é decorrente da má estimulação do sistema visual em idade precoce e compromete definitivamente a função visual. A hipermetropia ligeira não apresenta sintomas até cerca dos trinta anos quando o doente inicia um quadro de astenopia em função do esforço acomodativo a que é obrigado. O glaucoma de angulo fechado é mais frequente em doentes com hipermetropia superiores a 2 D. A hipermetropia associa-se a um eixo antero-posterior do olho demasiado pequeno. Com o crescimento do olho durante a infância a hipermetropia geralmente diminui. C - Astigmatismo O que caracteriza esta ametropia é que o raio de curvatura de alguma das superfícies do dióptro não é uniforme e como tal a convergência não é igual em todos os meridianos. O defeito encontra-se numa das superfícies da córnea ou do cristalino. O paciente com astigmatismo não vê com nitidez a nenhuma distância. No astigmatismo a hipovisão é devida na maioria dos casos a diferentes raios de curvatura nos diferentes meridianos da córnea o que pode ser confirmado por queratometria. O astigmatismo ligeiro é muito frequente na população geral sendo menos frequentes os astigmatismos elevados. D - Acomodação e Presbiopia Acomodação é o fenómeno pelo qual o cristalino pode aumentar a sua potência como lente. O poder acomodativo é máximo na infância e vai diminuído com a idade. A presbiopia é um defeito fisiológico da acomodação que se manifesta no olho emétrope pelos quarenta a quarenta e cinco anos e que dificulta a visão para perto. A presbiopia corrige-se com lentes convexas de valor progressivo com a idade até perto dos 60 anos quando o poder acomodativo é quase nulo. 23 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 E - Custos Económico-Sociais dos Erros Refractivos A correcção dos erros refractivos é um encargo económico individual e social significativo. Não há informação relativa ao nosso país, mas sabe-se que mais de metade dos Norte Americanos usam óculos ou lentes de contacto. Foram gastos 8 biliões de dólares em 1990 em produtos relacionados com a visão, e desses, 4,6 biliões de dólares foram gastos para o tratamento da miopia. A miopia é uma causa considerável de hipovisão desde a idade precoce. A miopia acima de 8 D é a 7ª causa de cegueira reversível nos Estados Unidos. A correcção refractiva por intervenção cirúrgica laser é uma técnica que ganha cada vez mais popularidade. Nos paises desenvolvidos existem muitos métodos disponíveis para corrigir os erros refractivos incluindo óculos, lentes de contacto e mais recentemente a cirurgia refractiva. A problemática dos custos da correcção dos erros refractivos é uma problemática cada vez mais actual. Até agora a correcção com óculos e lentes de contacto era a solução mais económica e por isso foi ganhando espaço nos programas de financiamento governamentais e sociais. Hoje em dia a cirurgia refractiva começa a ser encarada como uma solução potencialmente económica a longo prazo e começa a ser comparticipada pelos seguros de saúde. Para além dos custos de correcção dos erros refractivos, estes implicam custos inerentes à baixa produtividade por hipovisão associada. Apesar de não se encontrarem calculados estima-se que estes correspondam a uma fatia significativa dos custos totais com os erros refractivos. 2.4 - DEGENERESCÊNCIA MACULAR RELACIONADA COM A IDADE (DMRI) A degenerescência macular relacionada com a idade é uma doença da área macular (visão central) que se manifesta clinicamente acima dos 50 anos de idade. A perda da visão central é a principal característica clínica e decorre em função da deposição de material anormal na membrana de Bruch. Apresenta 2 formas: I. Maculopatia precoce: presença de drusen moles ( >/= 63 micra) hiper ou hipo despigmentações. Não existe qualquer intervenção terapêutica demonstrada sobre este estadio. II. Maculopatia tardia ou DMRI 24 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 II.1. Atrofia geográfica: observam-se áreas redondas ou ovais de diâmetro superior a 175 micra, de bordos muito bem delimitados, de despigmentação ou hipopigmentação com ausência aparente de epitélio pigmentado tornando aparente os vasos coroideus. Não existe qualquer intervenção terapêutica sobre este estadio. II.2 DMI neo-vascular (ou exsudativa). Podem ser observados: descolamento do epitélio pigmentado (EP), membrana neo- vascular sub-epitelial ou sub-retiniana, tecido glial, fibrótico ou semelhante a fibrina epi, intra ou sub-retiniano, hemorragia subretiniana não relacionada com patologia vascular da retina, exsudatos duros não relacionada com patologia vascular da retina. A - Prevalência A DMRI é a causa de hipovisão irreversível mais frequente no mundo ocidental acima dos 50 anos de idade. A prevalência de hipovisão grave aumenta com a idade. A incidência e prevalência da DMRI em Portugal são mal conhecidas, razão pela qual usamos como referência o estudo de Roterdão, o maior estudo realizado na Europa com cerca de 10 000 doentes e o estudo realizado em Wisconsin- Beaver Dam, U.S.A. com cerca de 4800 doentes. Dos 65 aos 75 anos a prevalência da DMRI é inferior a 1.5 %. Não há diferença na prevalência entre as formas atrófica e neo-vascular. Acima dos 75 anos a prevalência situa-se entre os 5.2 % e os 7,1 %. Neste grupo etário a forma exsudativa predomina. B - Factores de risco Estudos recentes têm revelado um aumento da incidência de comprometimento funcional grave pela DMRI. O principal efeito da doença é a diminuição da capacidade individual de autonomia em resultado do comprometimento da visão central. Está associada a um aumento da probabilidade de depressão e dependência. A DMRI é mais frequente nos caucasianos. Parece ser uma doença em que os factores ambientais modulam a existência de uma predisposição genética, não sendo porém clara a forma como tal acontece. O tabagismo parece ser o único factor de risco provado que é modificável. A luz solar, particularmente a radiação ultra- violeta, é outro factor ambiental 25 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 bem identificado. C - Custos Sociais e individuais A impossibilidade de obter uma recuperação funcional grande e o custo económico exponencial das fases mais avançadas acentua a importância da detecção precoce desta patologia . D - Tratamento O tratamento da DMRI com terapia fotodinâmica, em alternativa ou no seguimento do tratamento tradicional com laser de argon abre novas perspectivas no que respeita à qualidade de vida destes doentes. O encargo económico envolvido, apesar de elevado, é superado pelas potencialidades de tratamento. E - Dados relativos à situaçáo em Portugal O Instituto Nacional de Estatística prevê para 2005 que 15 % da população terá 65 anos ou mais de idade: 65-69 anos : 481 484 indivíduos a que corresponde 4,76% da população 70-74 anos : 438 378 indivíduos a que corresponde 4,34% da população 75-79 anos : 348 129 indivíduos a que corresponde 3,44% da população 80-84 anos : 222 162 indivíduos a que corresponde 2,2% da população 85 ou mais anos : 118 202 indivíduos a que corresponde 1,16 % da população Com base nestes números é possível estabelecer uma previsão para Portugal no que respeita à DMRI- forma neo- vascular. 65-74 anos: 919 862 indivíduos, entre 3680 a 6 440 doentes. 75 anos ou mais: 688 493 indivíduos, entre 23 410 a 32 360 doentes. 2.5 - GLAUCOMA Glaucoma é a denominação genérica de um grupo de doenças que partilham o facto de se constituírem como neuropatia óptica com perda de campo visual associada e com hipertensão ocular como principal factor de risco documentado. O intervalo normal da pressão intra- 26 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 ocular (PIO) na população geral é de 10-22 mmHg, estando esta dependente da taxa de produção de humor aquoso, da resistência à drenagem do humor aquoso pela malha trabecular e finalmente pela pressão das veias episclerais. A - Factores de risco Muitos factores de risco, entre os quais alguns permanecem desconhecidos, aumentam o risco de desenvolvimento de glaucoma. Os factores de risco mais relevantes que, para além da hipertensão ocular, são conhecidos por aumentarem o risco de desenvolver glaucoma são a idade avançada, raça negra e história familiar de glaucoma. B - Classificação Classicamente o glaucoma é dividido em glaucoma primário e secundário e, em função das propriedades do ângulo irido-corneano, em glaucoma de ângulo aberto e glaucoma de ângulo fechado. A diferenciação entre glaucoma de ângulo aberto e ângulo fechado tem importância clínica e terapêutica. A classificação entre glaucoma primário e secundário, apesar de útil, reflecte a ausência de conhecimentos em relação ao processo fisiopatológico que envolve o glaucoma. O glaucoma de ângulo aberto é classificado como primário quando não é detectada uma causa identificável que possa levar à obstrução à drenagem do humor aquoso mas em que, apesar de tal, a pressão intra-ocular (PIO) permanece elevada. É classificado como secundário quando existe uma anomalia e se supõe que essa anomalia possa desempenhar algum papel no processo fisiopatológico. Actualmente postula-se que todos os glaucomas tenham por base um processo fisiopatológico com base numa anomalia estrutural ou funcional, e como tal, à medida que o conhecimento avança a divisão entre glaucoma primário e secundário torna-se artificial. A questão tem ainda maior complexidade quando existe mais do que um processo fisiopatológico envolvido, com é o caso dos glaucomas de mecanismos combinados. C - Aspectos epidemiológicos do glaucoma O glaucoma primário de ângulo aberto representa um problema significativo de saúde pública. Não há informação relativa a Portugal mas nos Estados Unidos estima-se que cerca de 2,25 milhões de indivíduos com mais de 45 anos de idade possam padecer desta patologia. Os mesmos dados revelam que entre 84,000 e 160,000 possam estar bilateralmente cegos 27 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 (cegueira legal- AV inferior a 20/200 ou campo visual menor que 5º) em função desta patologia. O glaucoma primário de ângulo aberto é uma importante causa de cegueira nos Estados Unidos sendo a causa mais frequente de hipovisão irreversível em afroamericanos. Num levantamento realizado pela Organização Mundial Saúde (OMS) no fim dos anos oitenta e início dos anos noventa estimou-se que cerca de 104,5 milhões de pessoas tivessem hipertensão ocular (PIO> 21 mmHg). A incidência de glaucoma primário de ângulo aberto foi estimada em cerca de 2,4 milhões de pessoas /ano. A prevalência de cegueira por todos os tipos de glaucoma estimou-se em cerca de 5,2 milhões de pessoas, sendo 3 milhões da responsabilidade do glaucoma primário de ângulo aberto. Quinze por cento dos casos de cegueira, devem-se ao glaucoma como entidade fisiopatológica genérica englobando todos os subtipos. O glaucoma é a terceira causa de cegueira a nível mundial logo a seguir à catarata e ao tracoma. Apesar da relevância dos dados revelados por este levantamento ainda nos faltam muitas informações no que respeita aos aspectos epidemiológicos do glaucoma nomeadamente no que respeita aos efeitos psicológicos provocados pelo conhecimento de uma doença crónica que pode potencialmente levar a cegueira, aos efeitos debilitantes do tratamento e sobretudo no que respeita à qualidade de vida em função da perda funcional. Adicionalmente, não existem ainda dados no que respeita aos custos sociais envolvidos na detecção, reabilitação e tratamento destes doentes. D - Prevalência O glaucoma primário de ângulo aberto revela um padrão de distribuição díspar em função da raça. A prevalência em diferentes populações a nível mundial foi consistentemente de 1,1% a 2,1%. A prevalência entre populações de negros foi consistentemente 3 a 4 vezes superior. A prevalência aumenta com a idade sendo 3 a oito vezes superior na oitava década quando comparada com a quinta década. E - Factores de Risco A identificação de factores de risco é prioritária no sentido de definir subgrupos populacionais que devam ser sujeitos a programas de rastreio particulares em função de uma quantificação global de risco. Uma das dificuldades no diagnóstico do glaucoma é a dificuldade de reconhecer as formas iniciais da doença. Acresce que o diagnóstico precoce é em grande parte dependente dos critérios diagnósticos definidos. A existência de glaucoma é 28 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 geralmente determinada pela presença de um defeito do campo visual característico e por vezes, na ausência de defeito do campo visual, pela constatação de uma aparente lesão do nervo óptico. Clinicamente, doentes que revelem quaisquer destas anomalias devem ser seguidos de forma apertada para documentação da progressão, o único critério definitivo para estabelecer o diagnóstico da doença clinicamente significativa. Os factores de risco para o desenvolvimento de glaucoma primário de ângulo aberto têm sido amplamente debatidos e investigados e a sua associação clínica tem sido estabelecida com maior ou menor evidência. A hipertensão ocular, idade, raça negra e factor hereditário são genericamente reconhecidos como os principais factores de risco. Algumas séries demontraram a diabetes e a miopia como factores de risco, apesar da sua evidência científica não ser tão consistente. Mais controversos são alguns factores sistémicos tais como hipertensão arterial, aterosclerose e doença vascular isquémica em que as séries estudadas não permitem definir o seu estatuto com clareza. F - Glaucoma primário de ângulo fechado Comparativamente ao glaucoma primário de ângulo aberto a epidemiologia do glaucoma primário de ângulo fechado recebeu muito menor atenção. A prevalência do glaucoma primário de ângulo fechado é variável nos diferentes grupos étnicos. Entre a população branca dos Estados Unidos e da Europa é de aproximadamente 0,1%. Os nativos das regiões árticas têm a maior prevalência de glaucoma primário de ângulo fechado podendo chegar a uma prevalência 20 a 40 vezes superior. A prevalência entre a população asiática é intermédia entre estas duas populações. A prevalência do glaucoma primário de ângulo fechado entre os negros é semelhante aos brancos, apesar de assumir um carácter mais crónico. As mulheres desenvolvem três a quatro vezes mais glaucoma primário de ângulo fechado do que os homens. Estudos em olhos normais revelaram que as mulheres têm câmaras anteriores mais baixas do que os homens. A câmara anterior torna-se mais baixa com a idade. Estas alterações predispõem para o bloqueio pupilar, e assim o glaucoma decorrente deste bloqueio torna-se mais prevalente com 29 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 a idade. O glaucoma agudo de ângulo fechado é mais freqüente entre os 55 e os 65 anos de idade embora possa ocorrer em adultos jovens e tenha sido descrito em crianças. O menor volume e profundidade da câmara anterior mais pequena em olhos hipermetropes explica porque é que o glaucoma primário de ângulo fechado ocorre com maior frequência em olhos hipermetropes, embora possa ocorrer em olhos com todos os tipos de refracção. Algumas das características anatómicas do olho que predispõe para bloqueio pupilar, nomeadamente a inserção anterior e o diâmetro do cristalino são hereditárias. Desta forma os familiares dos pacientes com glaucoma primário de ângulo fechado estão em maior risco de desenvolverem glaucoma primário de ângulo fechado do que a população normal apesar da estimativa do risco ser muito variável. G - Hereditariedade e factores genéticos A história familiar é um factor de risco major para o desenvolvimento de glaucoma primário de ângulo aberto. A prevalência de glaucoma entre irmãos é de cerca de 10% e o risco absoluto de desenvolver glaucoma até aos 89 anos de idade é dez vezes maior em familiares directos de doentes com glaucoma do que na população geral. O mecanismo provável de hereditariedade não é conhecido mas a existência de um único gene de susceptibilidade parece ser altamente improvável. O mecanismo parece envolver mais do que um gene (poligénico), apresentar uma grande variabilidade na idade de início, penetrância incompleta e sofrer uma considerável influência ambiental. Os estudo genéticos demonstraram a existência de genes para o glaucoma juvenil de ângulo aberto (cr. 1q21-q31) e para algumas alterações morfo- funcionais relacionadas com glaucoma tais como o síndrome de Axenfe ldRieger (4q25 ou 4q27). A identificação dos genes responsáveis pelo glaucoma primário de ângulo aberto poderá vir a revolucionar quer a compreensão da patologia quer a abordagem terapêutica. 2.6 - CATARATA O cristalino, ou lente, é ao longo da vida alvo de um processo de envelhecimento que se encontra na base do processo fisiopatológico que culmina no desenvolvimento da catarata senil. O mecanismo fisiopatológico não é totalmente claro e os processos preventivos são 30 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 altamente controversos. A - Factores de risco Embora sejam conhecidos alguns factores de risco para o desenvolvimento de catarata (radiação ultravioleta B, diabetes, fármacos, tabagismo, alcoolismo e “stress” oxidativo) a informação em seu redor que possa levar ao formular de recomendações no sentido de prevenir o seu aparecimento é muito insuficiente. A catarata é a primeira causa de cegueira a nível mundial. A sua natureza prevenível e a existência de mecanismos de tratamento reconhecidamente eficazes fazem da sua história uma das de maior sucesso da medicina moderna. A facectomia com colocação de lente intraocular é provavelmente o procedimento cirúrgico de maior sucesso da história da medicina. Nos Estados Unidos são realizadas anualmente mais de 1,3 milhões de cirurgia de catarata. A hipovisão decorrente da facoesclerose motiva 8 milhões de consultas anuais aos Oftalmologistas. Com o envelhecimento generalizado da população a prevalência da hipovisão dependente da existência de opacidades lenticulares aumenta a cada ano. As cataratas são a causa de cegueira reversível em 15 milhões de pessoas a nível mundial e estima-se que este número possa chegar aos 50 milhões no ano 2025. B - Tratamento Uma vez que a intervenção cirúrgica é a única forma de tratamento eficaz de opacidades lenticulares clinicamente significativas, a necessidade de recursos humanos e técnicos que permitam a cirurgia é o principal factor a determinar os elevados custos sociais desta patologia. No entanto, este tratamento continua a ser um tratamento altamente rentável se considerarmos que permite a reabilitação de um indivíduo para a sociedade. O impacto económico da cirurgia de catarata nos Estados Unidos é estimado em 3 biliões de dólares anualmente. Adicionalmente a este valor, acrescem os custos dos procedimentos técnicos e humanos que constituem o pré e o pós-operatório. C - Prevalência A prevalência e incidência de catarata não é fácil de definir. A principal razão é a dificuldade 31 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 no estabelecimento de critérios que definam opacidade do cristalino. O tamanho, forma, densidade e localização das opacidades relacionadas com a idade e variável. A maioria das definições da catarata implica a existência de uma diminuição considerável da acuidade visual e a verificação da existência de uma opacidade à lâmpada de fenda. Grande parte dos estudos de prevalência de catarata senil são realizados em grupos particulares em vez da população geral. Por outro lado pode coexistir outra patologia ocular que provoque diminuição da acuidade visual e ser erroneamente atribuída à catarata senil. Foram realizados dois estudos de larga escala no final dos anos oitenta. O Beaver Dam Study que verificou que 38,8% dos homens e 49% das mulheres com mais de 74 anos apresentavam cataratas com perda significativa da acuidade visual. Um outro estudo, o Baltimore Eye Survey, verificou que a catarata era a causa mais freqüente de cegueira (AV < ou = 20/200) entre a população com mais de 40 anos de idade. A catarata não tratada era a causa de cegueira de 27% dos afroamericanos e 13% dos caucasianos. O Longitudinal Study Of Cataract concentrou-se no aparecimento de novas opacificações do cristalino e na progressão das opacidades existentes. Para tal recorreu a um sistema experimental conhecido como LOCS III ( Lens Opacities Classification System III). A idade média era de 65 anos e a incidência de novas opacificações era de 65% ao fim de dois anos entre os pacientes que não apresentavam opacidades nucleares inicialmente. A progressão das opacidades já existentes foi muito maior: 35,8% progrediram ao fim de 2 anos e 45,8% progrediram ao fim de 5 anos. O grupo que revelou maior progressão foi o das opacidades corticais ou subcapsulares posteriores em doentes com idade menor que 65 anos. D - Avaliação e tratamento dos doentes com catarata A existência de uma catarata em determinado doente implica um conhecimento rigoroso da história e exames oftalmológicos como também de determinantes pessoais e familiares de cada doente. Existem algumas questões que devem ser respondidas antes de colocar qualquer tipo de indicação cirúrgica em cada doente. A existência de uma patologia sistémica que possa estar na origem da catarata deve ser excluída. A opacidade existente pode ou não justificar a magnitude da hipovisão. Perturbações visuais de igual natureza e magnitude assumem importância diferente em função da personalidade, ocupação e exigência de cada doente. A existência de uma patologia oftalmológica concomitante, mesmo por vezes sem comprometimento da acuidade visual pode aumentar o risco cirúrgico para níveis 32 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 inaceitáveis. E - Sinais e sintomas A baixa da acuidade visual para longe e para perto é o principal sintoma da catarata. Diferentes tipos de catarata podem perturbar a visão de forma diferente. Cataratas subcapsulares posteriores, mesmo pouco densas, podem diminuir de forma muito acentuada a acuidade visual. Neste tipo de cataratas a visão para perto pode estar mais afectada do que a visão para longe. Pelo contrário cataratas nucleares podem diminuir de forma mais significativa a acuidade visual para longe e preservar a acuidade visual para perto. As cataratas corticais podem evoluir durante anos sem perturbar a acuidade visual o que só ocorre quando as opacidades corticais atingem o eixo visual. O encandeamento é outra perturbação visual freqüentemente descrita. Este sintoma é particularmente frequente nas cataratas subcapsulares posteriores mas também ocorre com frequência nas cataratas corticais. Este fenómeno é menos frequente nas cataratas nucleares, A pesquisa da acuidade visual per se parece pois não ser suficiente para avaliar a incapacidade produzida por uma catarata. O desenvolvimento de uma catarata pode aumentar o poder dióptrico do cristalino causando um desvio miópico leve a moderado. Este sintoma pode ser vivenciado como um fenómeno positivo pelo doente presbíope que sente transitoriamente menor necessidade de recorrer a óculos para ler. Em casos menos frequentes, o desvio miópico assimétrico pode condicionar o aparecimento de uma anisometropia, sendo nesse caso indicação para intervenção cirúrgica. Cataratas nucleares são frequentemente responsáveis pelo aparecimento de diplopia monocular. A segunda imagem não é uma verdadeira imagem sendo denominada imagem fantasma. A avaliação do comprometimento da qualidade de vida é o melhor método de avaliar a verdadeira necessidade de intervenção cirúrgica. Existem alguns questionários padronizados tais como o VF-14 e o ADVS. A cirurgia é geralmente proposta inicialmente para o olho com pior função visual dependente do processo fisiopatológico. A indicação cirúrgica do segundo olho ficará dependente do sucesso e segurança da primeira intervenção. 33 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3 – BASES PARA UM PLANO NACIONAL DE SAÚDE DA VISÃO 3.1 - INTRODUÇÃO Oftalmologia Portuguesa tem tradições muito valiosas, tendo ocupado ao longo dos anos uma posição digna no contexto da Europa Ocidental. Nas últimas décadas a Oftalmologia Portuguesa não só se tem mantido actualizada como tem em certos casos liderado o Oftalmologia internacional, realizando-se nos melhores centros uma Oftalmologia de muita qualidade. O ensino da especialidade é exigente e caracteriza-se por níveis de qualidade que é dos melhores da Oftalmologia Europeia. A actividade assistencial tem-se diferenciado em subespecializações cultivadas por oftalmologistas de óptima craveira técnica e científica, permitindo afirmar que de modo geral se realizam em Portugal todas as técnicas oftalmológicas médicas e cirúrgicas que se efectuam nos países mais avançados como por exemplo, nos Estados Unidos da América do Norte. Na área da investigação científica tem também a Oftalmologia Portuguesa podido atingir nível internacional. Há no Porto, em Lisboa e em Coimbra, centros de investigação oftalmológica em que se realiza investigação multidisciplinar com íntima colaboração entre ciência básica, laboratorial e ciência clínica. Por exemplo o Instituto Biomédico de Investigação da Luz e Imagem, em que as Ciências da Visão ocupam um lugar proeminente foi recentemente avaliado pela Fundação da Ciência e Tecnologia, tendo- lhe após avaliação realizada sido atribuída a classificação de “Excelente”. Há, portanto, qualidade na Oftalmologia Portuguesa, existem Médicos Oftalmologistas, Professores Universitários, Escolas que garantem o futuro da Oftalmologia Portuguesa e a Saúde da Visão dos Portugueses. Há, em suma, uma boa Base sobre a qual se pode construir um Programa de Acção que se deseja eficaz, um verdadeiro Plano Nacional de Saúde da Visão. É preciso, no entanto, conseguir o melhor aproveitamento do que já existe, oferecer 34 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 condições apropriadas para o crescimento do que já é excelente, preencher lacunas, diminuir desigualdades através da melhoria do que ainda é deficiente. É preciso planificar, criar um programa de acção que permita uma acção concertada para que num futuro próximo, caminhando em passos seguros, se possam corrigir as deficiências onde elas existam e elevar o nível da Oftalmologia Portuguesa de maneira a garantir a Saúde da Visão. 35 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.2 - OBJECTIVOS 1. Definir claramente, a nível nacional, a distribuição geográfica e o número de Unidades de Assistência Oftalmológica (Hospitais Centrais, Regionais e Distritais). 2. Reformular a Assistência Oftalmológica estabelecendo: 2.1. Programas de informação à população em geral. 2.2. Definição de competência das diversas estruturas assistenciais. 2.3. Caracterização das unidades assistenciais. 2.4. Articulação de assistência oftalmológica - circulação da informação clínica entre os diferentes níveis de cuidados oftalmológicos e coordenação dos serviços. 3. Rentabilizar os recursos existentes de molde a diminuir drasticamente as listas de espera existentes. 4. Criar quadros próprios (enfermeiros, técnicos de ortóptica e oftalmologistas) nas diversas unidades oftalmológicas. 5. Criar condições que assegurem a formação contínua dos profissionais de saúde na área de oftalmologia. 6. Estabelecer e garantir o funcionamento de um sistema que monitorize e avalie os programas propostos. 7. Criar condições que permitam o desenvolvimento de investigação no âmbito de oftalmologia. 8. Definir programas de rastreio visual na infância e no adulto. 36 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.3 – PRINCÍPIOS ORIENTADORES Os cuidados de saúde oftalmológicos são de importância vital para todos os Portugueses. O valor da visão é fundamental numa sociedade moderna, pela sua contribuição para a aprendizagem, uso de instrumentos e ferramentas, mobilidade e, por fim, qualidade de vida. A visão, no mundo actual, é sem dúvida o bem mais apreciado pelo ser vivo. A sua manutenção é condição necessária para o desenvolvimento do País. Os cuidados de saúde oftalmológicos têm características próprias que importa desde já realçar. Por um lado, o desenvolvimento científico e tecnológico da Oftalmologia tem, nos últimos anos, criado melhores condições para uma assistência eficaz. Por outro lado, as necessidades da saúde da visão têm aumentado em progressão geométrica devido ao aumento da população e ao seu envelhecimento. É reconhecido internacionalmente que as necessidades em assistência oftalmológica estão directamente relacionadas com o desenvolvimento dum País, e com o seu desenvolvimento cultural, científico e tecnológico. É pois perante uma procura cada vez maior de cuidados de saúde oftalmológicos que é preciso definir um Plano Nacional que possa responder a essa procura tendo presentes as realidades nacionais. As doenças dos olhos e do sistema visual são extremamente frequentes na população em geral. Calcula-se que em Portugal 4.000.000 de pessoas sofrem de doenças oculares, havendo 700.000 que apresentam uma baixa de visão não corrigível com lentes; destes, 40.000 são cegos, metade dos quais com uma idade inferior a 65 anos. As principais causas de alterações ou doenças oculares são, como já se referenciou: - Erros de refracção – 20% das crianças e metade da população adulta portuguesa sofrem de erros refractivos significativos; assim, mais de 5.000.000 de pessoas em Portugal usam óculos ou beneficiariam com o seu uso. - Doenças da córnea – as doenças da córnea incluindo as doenças da conjuntiva que lhe é adjacente, são responsáveis por cerca de 210.000 casos de diminuição da visão e 1300 casos de cegueira. - Catarata – a catarata apesar de poder desenvolver-se em qualquer idade, é mais frequente em idades mais avançadas; 6 em cada 10 pessoas com mais de 60 anos apresentam 37 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 sinais de catarata. Pensa-se que haverá em Portugal 170.000 pessoas a sofrer de catarata, havendo 35.000 cegos por esta doença. Esta situação é curável com uma assistência oftalmológica oportuna. - Glaucoma – cerca de 100.000 pessoas sofre de glaucoma em Portugal, havendo 33.000 que apresentam uma cegueira irreversível. O glaucoma é uma doença cuja evolução para a cegueira pode ser prevenida através de assistência oftalmológica adequada. - Doenças da retina e coroideia – a retina e a coroideia são duas estruturas do globo ocular extremamente complexas e sensíveis, sendo particularmente vulneráveis a doenças. Todos os anos 35.000 pessoas em Portugal sofrem de baixa de visão relacionada com esta patologia. Uma das suas principais entidades, a degenerescência macular ligada à idade, afecta 5% das pessoas com mais de 45 anos e uma em cada 10 com mais de 60 anos. - Diabetes – haverá em Portugal cerca de 500.000 diabéticos dos quais 15.000 estão em risco de cegueira. Sabe-se por outro lado que as consequências devastadoras da retinopatia diabética podem ser prevenidas ou tratadas através de fotocoagulação da retina por laser. - Ambliopia e estrabismo – estas entidades podem ocorrer separada ou conjuntamente e afectam cerca de 300.000 pessoas em Portugal. Ao analisarmos estes números constatamos que é da maior urgência a elaboração de um Plano Nacional que permita de uma forma eficaz manter a Saúde da Visão da população Portuguesa. O número de Portugueses que recebem assistência oftalmológica tem aumentado progressivamente nos últimos anos. No entanto, o número de pessoas que necessitam de cuidados oftalmológicos tem aumentado ainda mais. Pelo menos 4 factores contribuíram decisivamente para este aumento: - O aumento da população em geral. - O envelhecimento progressivo da população portuguesa. - Uma população melhor informada que obviamente procura e exige uma visão melhor. - Os enormes avanços que foram observados nos últimos anos no tratamento das doenças oftalmológicas, e que possibilitam, hoje em dia, a prevenção e o tratamento de doenças incuráveis há alguns anos atrás. 38 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Sabe-se que aproximadamente um terço de todas as novas cegueiras podem ser evitadas se as pessoas tiverem acesso ou puderem beneficiar de toda a tecnologia existente. No entanto, mais de 1/3 dos diabéticos nunca foram examinados ou não são examinados regularmente por um oftalmologista, a maioria dos casos de glaucoma ou de degenerescência macular ligada à idade recorrem unicamente à assistência oftalmológica em situações tardias em que já não é possível fazer tratamento eficaz, etc. Um Plano Nacional de Saúde da Visão terá pois por finalidade dar, preservar e restaurar a melhor visão possível a todos os Portugueses. Para que ele seja eficaz e coordenado, a Comissão sente a necessidade de apresentar soluções globais, estruturadas, realistas e economicamente viáveis que possam responder eficazmente ao desafio que lhe foi apresentado pelo Ministério da Saúde. Alguns princípios básicos, obviamente interrelacionados entre si, foram considerados à partida como muito importantes: 1. Os cuidados de saúde oftalmológicos são um componente fundamental dos cuidados de saúde em geral, e devem ser considerados como parte importante de um sistema integrado de assistência. 2. Os cuidados de saúde oftalmológicos devem ser de qualidade, pois só assim podem preservar e recuperar a saúde dos olhos dos Portugueses. 3. O acesso a cuidados de saúde oftalmológicos de boa qualidade exige o acesso a oftalmologistas, enfermeiros e técnicos qualificados. 4. Cuidados de saúde oftalmológicos de boa qualidade devem ser acessíveis do ponto de vista económico a todos os Portugueses. 5. Tanto os oftalmologistas como outros profissionais de saúde devem construir a sua educação ao longo das suas carreiras de molde a manter a qualidade necessária nas suas actividades, e a utilizar os mais recentes progressos científicos nos cuidados de saúde oftalmológicos que prestam. 6. Uma melhor informação da população sobre os cuidados de saúde oftalmológicos e a sua necessidade e oportunidade é condição fundamental para a melhoria da saúde oftalmológica da população. 7. A apresentação e divulgação de orientações e recomendações acerca dos cuidados 39 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 relacionados com a saúde da visão reveste-se da maior importância pois define as modalidades de tratamento oftalmológico apropriadas e encoraja os Serviços de Oftalmologia e os seus profissionais a praticar cuidados de saúde de elevada qualidade e reconhecidos universalmente. 8. A investigação em Ciências da Visão deve ser componente importante de qualquer Plano de Cuidados de Saúde da Visão pois só através de coexistência com a criação de novos conhecimentos é possível estar cientificamente actualizado e realizar cuidados de saúde oftalmológicos de qualidade. Para além destes princípios gerais que permaneceram presentes ao longo da preparação do Plano Nacional de Saúde da Visão, outros princípios básicos foram objecto de discussão, tendo-se chegado a posições maioritárias claras sobre os seguintes aspectos: A. Compatibilidade e complementaridade de uma Oftalmologia de Estado com uma Oftalmologia Privada É importante a existência de uma Oftalmologia Privada, sem obstáculos, que contribua decisivamente para uma melhor distribuição da cobertura Oftalmológica Nacional. É igualmente importante que os organismos assistenciais do Estado mantenham uma oftalmolo gia de elevada qualidade, baseada num apetrechamento em pessoal e material adequados. A competitividade entre ambas só poderá ser salutar, desde que a ambas sejam permitidas as mesmas condições de trabalho. A colaboração entre ambas deve também ser apoiada. B. Unidade Primária de Assistência Oftalmológica B.1 - A unidade primária de Assistência Oftalmológica deve ser constituída por um médico Oftalmologista, no mínimo, mas, com vantagem, deverá ser um médico Oftalmologista + técnico auxiliar de Oftalmologia. Este médico Oftalmologista deverá estar integrado no quadro da unidade hospitalar responsável pela Área da Assistência. B.2 - A sua actividade deverá localizar-se na Unidade Hospitalar mais simples da Área respectiva Assistencial, ou em Centro de Saúde, nos dias em que para tal função seja destacado. Aqui articular-se- iam com os Clínicos Gerais (Médicos de Família) neles existentes, clínicos esses a quem seria dada, pelo serviço de referência, formação básica 40 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 adequada para serem capazes de desempenharem o papel de articulação orientadora desejável. Seria deste modo ultrapassada a dificuldade de comunicação entre Oftalmologista e Clínico Geral. Atribuição destas consultas será feita pontualmente de acordo com as necessidades de cobertura assistencial da população portuguesa e tendo em conta as condições existentes. B.3 - Estes cuidados implicam a existência de meios humanos e materiais qualitativa e quantitativamente adequados. O equipamento mínimo necessário terá que ser: - Local apropriado. - Posto de consulta completo (equipamento para determinação e correcção da acuidade visual, biomicroscópio, tonómetro de aplanação, oftalmoscópio, oftalmómetro e frontofocómetro). B.4 - Todo o esquema da consulta para ser eficiente terá de assentar no princípio da articulação e coordenação com o hospital de apoio. B.5 - Da referida articulação resultará a definição correcta dos critérios de triagem e transferência atempada, em face dos recursos disponíveis em cada nível de cuidados. C. Instituição Coordenadora de Assistência Oftalmológica, Hospital Central O Hospital Central deve, em cada Zona Assistencial, ser a Unidade Coordenadora duma Pirâmide de Assistência Oftalmológica. Deve ser o Hospital Central que estabelece as ligações necessárias com as outras Unidades Assistenciais Oftalmológicas e a transferência dos doentes deve seguir princípios orientadores ditados pelo Organismo Responsável, o Hospital Central da Área Respectiva. D. Unidades Funcionais de Saúde da Visão Para que haja uma melhoria de assistência oftalmológica à população em geral é de capital importância a interligação entre o Serviço Central e os Serviços de Oftalmologia localizados em Hospitais mais periféricos (Hospital Regional e Hospital Distrital). Torna-se pois imperiosa a criação de estruturas nas principais regiões (Norte, Centro e Sul) que assegurem a articulação e a coordenação funcional entre aqueles mesmos cuidados assistenciais, estruturas que propomos designar-se por Unidades Funcionais de Saúde da 41 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Visão. D.1 - As UFSV integrarão os seguintes membros: - Directores dos Serviços de Oftalmologia dos Hospitais Centrais ou médicos dos quadros dos respectivos Serviços por eles designados. - Directores dos Serviços de Oftalmologia dos Hospitais Regionais ou Distritais ou médicos do quadro dos respectivos Serviços por eles designados. D.2 - As UFSV serão presididas pelo Director de Serviço Central a quem compete convocar as reuniões, definir a respectiva ordem de trabalhos, formular e divulgar as suas conclusões e estabelecer a ligação nos 2 sentidos com outras estruturas eventualmente envolvidas. D.3 - As funções das UFSV serão as seguintes: - Fomentar a interligação regular e permanente entre os Especialistas Hospitalares dos diversos Serviços e avaliar a sua eficiência e eficácia. - Garantir a circulação de informação clínica eficaz entre os Médicos Especialistas Hospitalares, nos 2 sentidos. - Avaliar as realidades, as prioridades e as necessidades de cada Unidade Funcional. - Propor às Administrações Regionais de Saúde medidas concretas no sentido de resolução de problemas identificados na respectiva área. - Recolher os dados estatísticos que se definir importantes e manter a sua actualização. - Estimular a elaboração de estudos epidemiológicos que conduzam a um melhor conhecimento da realidade local. E. Conselho dos Directores de Serviços dos Hospitais Centrais Os Directores dos Serviços dos Hospitais Centrais devem reunir no mínimo, uma vez por ano, no sentido de definir uma política de actuação comum. Este Conselho será ainda convocado sempre que for julgado conveniente pela Comissão Executiva do Plano Nacional de Saúde da Visão presidida pelo Senhor Ministro da Saúde. F. Unidades de Rastreio O Rastreio tem maior eficiência desde que tenha assegurado à partida a resposta para as 42 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 necessidades levantadas pelo próprio Rastreio. Assim, os Programas Nacionais de Rastreio devem ser realizados com a participação activa dos Hospitais Centrais. 43 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.4 – CUIDADOS PRIMÁRIOS E ACTIVIDADES DE RASTREIO Presentemente, os Cuidados Primários de Saúde da Visão em Portugal são praticados a diferentes níveis, de forma não organizada, caótica mesmo, variando na qualidade da assistência prestada e na acessibilidade para o doente. Os Cuidados Primários de Saúde da Visão, como disciplina estruturada, permanece por desenvolver, seguindo o que se com outras especialidades, apesar da sua especificidade e da existência de uma Oftalmologia clínica no seio do Sistema Nacional de Saúde, altamente qualificada e reconhecida a nível internacional. É necessária uma mudança porque a Oftalmologia em Portugal, tal como noutros países, se distingue por uma série de características que a diferenciam de outras especialidades no que respeita a Cuidados Primários, como sejam (1) a necessidade de instrumentação e diferenciação tecnológica avançadas para um diagnóstico inicial correcto; (2) o treino oftalmológico limitado dos médicos de Clínica Geral; (3) a associação frequente de doenças oftálmicas com patologia não-oftálmica; (4) o aumento progressivo da procura de cuidados oftalmológicos; (5) a orientação cirúrgica da especialidade de Oftalmologia desproporcionada com o volume de consultas; (6) a associação de muitas doenças oftalmológicas com as idades extremas (infância e terceira idade); (7) o facto de um diagnóstico tardio, um tratamento incorrecto, com poucas excepções, conduzir à cegueira e não à morte. O desafio para os Oftalmologistas, interessados em melhorar e reformar a actual situação, consiste em, utilizando os meios actualmente disponíveis, reuni- los num sistema coerente, funcionando em harmonia, e que proporcione uma melhoria dos indicadores de Saúde da Visão em Portugal. Isto passa pela criação de um Plano Nacional de Saúde da Visão e, obrigatoriamente, por uma estruturação dos Cuidados Primários de Saúde da Visão. Os Cuidados Primários de Saúde da Visão são suficientes mas necessitam ser melhor definidos e mais estruturados bem como serem urgentemente reconhecidos e adoptados formalmente pelo Serviço Nacional de Saúde e pelos oftalmologistas. 3.4.1 - – Prestadores de Cuidados Primários de Saúde da Visão O planeamento dos Cuidados Primários de Saúde da Visão tem que ter em consideração a necessidade de diferenciação requerida para as categorias de doenças em questão, o que tem 44 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 um impacto considerável na qualidade dos cuidados prestados. Devem ser os Oftalmologistas assumir uma função de primeira linha, dada a natureza específica da sua especialidade. Os médicos de Clínica Geral podem prestar correctamente cuidados primários em situações oftalmológicas banais, mas não possuem nem o conhecimento nem dominam os meios tecnológicos actualmente necessários para efectuar um diagnóstico diferencial da maioria das situações oftalmológicas, o qual lhes permita prescrever um tratamento adequado. É por esta razão que existe um treino específico em Oftalmologia, uma especialização de 4 anos para além do curso de Medicina, para aquisição do conhecimento e treino necessários. Outra consideração, de natureza exclusivamente financeira deve ser colocada: o reenvio sistemático e quase sempre obrigatório, de doentes do foro oftalmológico, pelo médico de Clínica Geral, às Unidades Hospitalares, o que traz uma despesa suplementar inútil e uma sobrecarga das Unidades de Cuidados Diferenciados. Por outro lado, o tratamento de situações oftalmológicas por não- médicos origina uma situação médico-legal cujo prestador é responsabilizado em caso de erro de diagnóstico ou de tratamento. Situações frequentes como a queratite herpética, as uveítes, o glaucoma e outras, podem ser responsáveis por cegueira se não diagnosticadas atempadamente ou em caso de tratamento incorrecto. Por estes motivos, devem ser os Oftalmologistas a ter a responsabilidade da prestação de Cuidados Primários de Saúde da Visão, devidamente auxiliados por Enfermeiros e Técnicos Auxiliares de Oftalmologia, com a devida formação específica. 3.4.2 - Atributos dos Cuidados Primários de Saúde da Visão Os princípios para alcançar bons cuidados primários de saúde devem incluir: (1) qualidade, tendo os profissionais o conhecimento das situações clínicas que se apresentam nos cuidados primários e da população à qual prestam serviços; (2) equidade, não devendo os serviços prestados variar em diferentes áreas do País; (3) acessibilidade, devendo os serviços ser razoavelmente acessíveis quando clinicamente necessários, independentemente da idade, sexo ou estado de saúde; (4) capacidade de resposta, devendo os serviços reflectirem as preferências e necessidades das populações que os utilizam e as necessidades demográficas e sociais da área que serve m; (5) eficiência, sendo os serviços prestados baseados em evidências científicas e utilizando os recursos existentes de um modo eficiente. 45 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.4.3 - Actividades de Rastreio A - Rastreio Visual na Infância O rastreio da infância desenvolve-se, essencialmente em três fases: a primeira que vai do nascimento aos 2 anos de idade; a segunda, dos 2 aos 5 anos, e a terceira, depois dos 5 anos. Na primeira fase devem ser considerados dois períodos, o período peri- natal e o período pósnatal. No período peri- natal, a equipa de rastreio deve ser fixa e constituída por um Oftalmologista, com a colaboração de um Pediatra, já que no peri- natal têm de ser obrigatoriamente prestados cuidados oftalmológicos especializados a todos os recémnascidos em risco de cegueira. Durante o período pós-natal, entre o período peri-natal e os 2 anos de idade, devem ser constituídas equipas de rastreio, situadas em Centros de Rastreio Visual a definir pelo Hospital Central Coordenador da respectiva área. Estas equipas serão constituídas por um Oftalmologista e por um Técnico de Ortóptica. Durante este período a equipa do rastreio terá especialmente em atenção a quaisquer alterações da fixação ou da motilidade ocular. As crianças detectadas serão depois dirigidas para os centros oftalmológicos da respectiva área. Nos mesmos Centros de Rastreio devem ser organizadas equipas móveis constituídas por técnicos de ortóptica que se deslocarão às unidades pré-escolares e escolares da respectiva área para aí procederem, em colaboração com os médicos escolares, ou, na falta destes, com o médico pediatra ou com o médico de família, ao rastreio da acuidade visual e dos desequilíbrios oculomotores das crianças com idades compreendidas entre os 2 e os 5 anos (período pré-escolar) e depois dos cinco anos (período escolar). Todas as equipas terão sempre a assessoria dos Serviços de Oftalmologia colocados superiormente na escala hierárquica das responsabilidades oftalmológicas cometidas e previamente definidas pelos Hospitais Centrais. A coordenação geral deverá ser efectuada por um adequado sistema de informática. B - Rastreio visual nos adultos O rastreio visual dos adultos compreende duas vertentes: 46 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 1. Vertente epidemiológica. 2. Vertente laboral. A vertente epidemiológica ligada ao levantamento das causas de cegueira do País, deverá ser organizada e coordenada pelo Hospital Central da respectiva área, devendo assinalar-se que para os Hospitais Centrais com responsabilidade de ensino universitário esta valência tem especial importância. É particularmente importante, em situações como a retinopatia diabética, em que o tratamento realizado a tempo pode impedir a evolução para a cegueira. A vertente laboral, destinada principalmente à prevenção da cegueira e à definição das condições de iluminação nos locais de trabalho, será constituída por equipas de rastreio formadas por um oftalmologista e por um engenheiro especializado em técnicas de iluminação. 3.4.4 - Estruturação dos Cuidados Primários de Saúde da Visão – Unidade Primária de Oftalmologia ou Centro de Rastreio Esta unidade constitui a unidade mais simples de cuidados de saúde oftalmológicos e estará localizada junto da população, seja utilizando instalações da A.R.S., seja instalações de Hospitais Distritais ou outras equiparadas por contrato. O pessoal médico, técnico e de enfermagem não será fixo e funcionará sempre em destacamento do Quadro do Pessoal do Hospital que terá a seu cargo a cobertura oftalmológica da Região a que pertence o local de actuação. Pessoal Mínimo: Um Médico Oftalmologis ta - destacado do Quadro do Hospital da Região Um Técnico ou Enfermeiro especializado - destacado do Quadro do Hospital da Região Equipamento: Posto de exame oftalmológico completo, com equipamento para determinação e correcção da acuidade visual, biomicroscópio, tonómetro de aplanação, oftalmoscópio, oftalmómetro e 47 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 frontofocómetro. Em casos específicos poderá ser constituída por um técnico com um sistema de registo de imagens ou outros dados que são posteriormente enviados para avaliação por pessoal treinado e supervisionado por médico oftalmologista (exemplo: Programa Nacional de Diagnóstico Sistemático da Retinopatia Diabética). O reequacionamento dos Cuidados Primários de Saúde da Visão e Actividades de Rastreio implicaria: (1) A localização dos Cuidados Primários de Saúde da Visão mais próximo das populações (Unidade Primária de Assistência Oftalmológica), na sua área de implantação, cobrindo o universo da população portuguesa, em todas as faixas etárias. Estes cuidados compreenderiam a primeira apresentação da doença, o tratamento de doenças menores e traumatismos, a recorrência da doença, o seguimento e suporte de algumas doenças crónicas, e o fornecimento de cuidados preventivos de saúde, nomeadamente a realização de rastreios e programas da saúde específicos. (2) Os recursos humanos desta estratégia pressuporiam que as Unidades Hospitalares mais simples das Áreas Assistenciais ou os Centros de Saúde não teriam Oftalmologistas nos seus quadros. Os que actualmente ocupam essa posição constituem um verdadeiro desperdício, condenados a fazer apenas cuidados primários, sendo elementos de baixa rentabilidade perante as necessidades públicas assistenciais, nomeadamente de Serviços de Urgência e Cirurgia. Estes oftalmologistas, por um lado, vinha m reforçar as equipas dos Hospitais no atendimento de todos os seus objectivos e, por outro, teriam assim garantida a evolução qualitativa das suas aptidões e aspirações. (3) A implementação das Unidades Primárias de Assistência Oftalmológica permitiria libertar os Hospitais Centrais do bloqueio absorvente da avalanche de doentes que a eles recorre, de doentes com questões elementares, próprias de Cuidados Primários de Saúde. Esta libertação permitir- lhes- ia assumir em plenitude qualitativa os seus objectivos de centros de cuidados diferenciados de oftalmologia e cultivar, devidamente, o ensino e a investigação pré e pós-graduada. 48 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.5 - CARACTERIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE OFTALMOLOGIA HOSPITALARES É aqui proposto um Plano Geral para os Serviços de Oftalmologia Hospitalares tendo em conta a sua função e grau de especialização e a necessidade de eficiência e qualidade de serviço. Alguns pontos aceites e nos quais se baseia, em parte, a proposta: 1. Considera-se a vantagem de ramificar e estender a acção dos Hospitais Centrais e Regionais à população através da realização de consultas gerais de Oftalmologia (triagem, receituário de lentes e cuidados primários) em instalações disponíveis da A.R.S. ou em Postos Hospitalares mais periféricos (Hospitais Distritais). Encontram-se duas vantagens nesta solução: A. Aproximar os cuidados de Oftalmologia da população. B. Realizar estas consultas com elementos médicos do quadro hospitalar, os quais manterão assim a ligação com o Serviço, poderão ter também actividades diferenciadas noutros dias da semana e usufruirão da actualização contínua que lhes garante a permanência numa Unidade Hospitalar. 2. Necessidade de uma adequada definição dum mapa da área de Urgência e Serviços responsáveis. 3. Organização de tipo departamental para os Serviços Hospitalares Centrais de Oftalmologia. Esta proposta prevê a diferenciação de unidades ou Secções nos Serviços, a sua avaliação de rentabilidade e, por fim, a possibilidade dos Serviços disporem de verbas correspondentes ao seu rend imento. 4. Considera-se ainda que os Serviços Hospitalares Centrais de Oftalmologia estarão envolvidos e serão encorajados a se envolver com actividades de ensino e investigação, 49 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 principalmente clínica, e de acordo com as diferenciações atingidas e vocações existentes em cada serviço. 5. Aceita-se que é necessário rentabilizar as instalações hospitalares e que os serviços funcionarão de manhã e de tarde, tanto na realização de consultas, como na realização de cirurgia. Estas actividades serão realizadas até o limite das instalações disponíveis e de acordo com as necessidades assistenciais, listas de espera, etc., estabelecendo-se para o efeito horários adequados do pessoal. Registe-se, no entanto, que a ideia geral desta proposta é que o que interessa manter é a qualidade do trabalho assistencial e a eficiência, satisfazendo as necessidades, e de maneira nenhuma, o cumprimento simples de horários. Os horários do pessoal médico, deverão ser, pois, variáveis e adequados às necessidades do Serviço e diferenciação do médico (especialização) e baseados no tempo completo. 6. Dentro do espírito de organização de tipo Departamental e de subespecialização das diferentes Unidades ou Secções, considera-se a necessidade de preencher os quadros dos Serviços com pessoal diferenciado, com as subespecializações necessárias. Assim, propõe-se uma organização relativamente uniforme para os diversos Serviços que cubra as principais valências da Oftalmologia moderna. Neste sentido, ainda, os concursos para preenchimento dos quadros terão de ser definidos quanto ao perfil do lugar que irá ser preenchido. Na Proposta irão ser sucessivamente analisados: 1. Orgânica do Serviço. 2. Pessoal. 3. Equipamento. 50 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 HOSPITAL DISTRITAL ORGÂNICA DE UM POSTO DE HOSPITAL DISTRITAL Neste nível realizar-se-á apenas consulta de Oftalmologia e actividades de rastreio. Funcionará como um destacamento de pessoal médico e técnico do pessoal do quadro do Serviço de Oftalmologia do Hospital Regional a que está organicamente adstrito. Este destacamento será rotativo com maior ou menor duração conforme decisão da Unidade Coordenadora Funcional da Saúde da Visão (UCSF). a. Consulta Geral Disporá de 1 ou 2 postos de consulta b. Não terá internamento, nem Bloco Operatório, nem Urgência c. A actividade assistencial será do ponto de vista estatístico atribuída ao Serviço de Oftalmologia do Hospital Regional a que está adstrito. 2. EQUIPAMENTO Postos de consulta oftalmológica com equipamento para determinação e correcção da acuidade visual, biomicroscópio, tonómetro de aplanação, oftalmoscópio, oftalmómetro e frontofocómetro. 51 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 HOSPITAL REGIONAL ORGÂNICA DE UM SERVIÇO DE OFTALMOLOGIA DE HOSPITAL REGIONAL a. Direcção do Serviço b. Consulta Geral - 2 postos de consulta autónoma no Hospital e 1 ou mais postos em Hospitais ou Centros de Saúde mais Periféricos. c. Internamento – 5 a 10 camas, não necessariamente autónomas d . Bloco Operatório - 1 sala equipada com microscópio operatório onde seja possível realizar anestesia local e geral (+ 1 sala para pequena cirurgia). e. Urgência Permanente ( 24 horas por dia) f. Unidades de Observação e Tratamento 1. Glaucoma com gabinete de Perimetria. 2. Estrabismo e Oftalmologia Pediátrica. 3. Retina com gabinetes de Lasers e Angiografia e Retinografia. Equipamento de vitrectomia. 4. Cirurgia Implanto-Refractiva com gabinetes de Ecografia e Contactologia. g. Gabinetes de Diagnóstico e Tratamento - Exames Complementares 1. Perimetria. 2. Angiografia e Retinografia. 3. Ecografia. 4. Contactologia. 5. Ortóptica e Refracção. 6. Lasers (YAG, Argon). 52 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 h. Sala de Reuniões do Serviço com acesso bibliográfico i. Administração e Secretaria 2. PESSOAL A. Pessoal Médico - Quadro médico mínimo de 10 elementos, devendo ser aumentado caso a caso conforme as necessidades de cobertura concelhia do Distrito e as instalações disponíveis para consulta oftalmológica nos diversos concelhos adstritos. B. Administrativo - Mínimo de 3 elementos administrativos - Secretária Clínica junto do Director (1) - Elemento Administrativo responsável pelo Internamento , Bloco Operatório e Laser (1) - Elementos Administrativos responsáveis pelas Consultas das Unidade e Exames Complementares (1) C. Pessoal de Enfermagem - mínimo 10 elementos de enfermagem, sendo um (1) Enfermeiro Chefe do Internamento e Bloco Operatório e nove (9) Enfermeiros do Bloco Operatório, Urgência e Internamento D. Pessoal Técnico (Carreira de Técnico de Ortóptica) - 4 elementos. Sendo um (1) Contactologia e Recuperação de grandes Ambliopias, dois (2) Ortóptica e Refracção Automática e um(1) Perimetria e outras Técnicas 3. EQUIPAMENTO (ver em Anexo) 53 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 HOSPITAL CENTRAL ORGÂNICA DE UM SERVIÇO DE OFTALMOLOGIA DE HOSPITAL CENTRAL a. Direcção do Serviço b. Consulta Geral - Postos de consultas no Hospital, mais os que estiverem localizados em outras unidades da ARS, junto da população. c. Internamento – Entre 10 a 20 camas autónomas d. Bloco Operatório - Mínimo de 2 salas para anestesia geral e 1 para cirurgia ambulatória (anestesia local). Com instalação de Lasers cirúrgicos. e. Áreas de especialização sugeridas (Exemplos): Glaucoma; Oftalmologia Pediátrica e Estrabismo; Retina Médica e Cirúrgica; Neuroftalmologia; Imunopatologia Ocular; Cirurgia Plástica, Orbita e Anexos; Cirurgia Implanto-Refractiva; Córnea e Patologia Externa. N.B.- Estas áreas de especialização já existem em vários Hospitais Centrais f. Gabinetes de Diagnóstico e Tratamento 1. Electrofisiologia 2. Perimetria 3. Angiografia e Retinografia 4. Imagiologia 5. Ecografia 6. Visão Cromática e Exames Psicofísicos 7. Contactologia 8. Ortóptica 9. Refracção 10. Próteses e Recuperação de Grandes Ambliopias 11. Lasers 54 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 12. Banco de Olhos e Patologia h. Biblioteca e Salas de Reuniões / Aulas i. Administração e Secretaria 2. PESSOAL A. Pessoal Médico: - Chefes de Serviço: 8 - 10 Assistentes Hospitalares: 20 - 25 Médicos Anestesistas: 4 Total de pessoal médico: Mínimo de 30 Oftalmologistas + 4 Anestesistas (34) Sendo as seguintes posições de chefia: 1. Director de Serviço - 1 2. Internamento - Chefia - 1 3. Consulta Geral - Chefia - 1 4. Bloco Operatório - Chefia - 1 5. Chefia das Unidades de Observação e Tratamento que existem. Por exemplo: Glaucoma; Estrabismo e Oftalmologia Pediátrica; Retina Médica e Cirurgia do Vítreo e Retina; Imunopatologia Ocular; Cirurgia Plástica, Órbita e Anexos; Cirurgia Implanto-Refractiva, Córnea e Patologia Externa - (caracterização e denominação poderão variar em diferentes serviços de Hospitais Centrais). Actuação como Assistentes nas Secções e como responsáveis pelos Gabinetes de Diagnóstico e Tratamento, acumulando ou não funções com actividades nas Unidades de Observação e Tratamento, Consulta Geral, Internamento, Bloco e Urgência, conforme quadro organizativo junto. Médicos Anestesistas - formando um grupo fixo, diferenciado, especialmente treinado e garantindo efectiva utilização do Bloco Operatório - 2 Chefes de Serviço e 2 Assistentes. Hospitais Universitários - 4 elementos supra-numerários (Chefes de Serviço e /ou Assistentes 55 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Hospitalares) com funções definidas nas tarefas de Ensino Pré-Graduado, num tempo parcial. B. Pessoal Administrativo: Mínimo de 12 elementos administrativos. - Administrador: responsável pela organização económica do serviço e com funções de assessor do Director do Serviço. - Elementos com funções administrativas e de secretaria: Secretária Clínica, junto do Director - 1 Secretária, junto do Administrador, responsável pela Estatística, etc. - 1 Secretária Clínica, junto dos Chefes de Serviço - 1 Elementos Administrativos responsáveis pelas Consultas das Unidades e pelos Gabinetes - 6 Elementos Administrativos responsáveis pelo Bloco Operatório e Lasers - 1 Elemento Administrativo responsável pelo Internamento - 1 NB. Poderão estar associados a este Quadro como supranumerários os elementos administrativos dos postos da A.R.S. adstritos a Serviço Hospitalar. C. Pessoal de Enfermagem: Mínimo 32 elementos de enfermagem. Enfermeiro - Chefe do Internamento - 1 Enfermeiro - Chefe do Bloco Operatório - 1 Enfermeiros - adstritos aos Exames Complementares e Consultas - 1 Enfermeiros no Bloco Operatório e Urgência - 13 Enfermeiros no Internamento - 13 (36h por semana) Instrumentistas no Bloco Operatório - 3 D. Pessoal Técnico: Mínimo 14 técnicos auxiliares de Oftalmologia 2 técnicos de manutenção de equipamento * O pessoal técnico desempenha um papel fundamental num Serviço de Oftalmologia de 56 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Hospital Central dada a sua grande diferenciação técnica e sofisticação de equipamento. Neste sentido, propõem-se os seguintes técnicos, distribuídos pelos Gabinetes de Diagnóstico e Tratamento: Electrofisiologia e Psicofísica - 1 Perimetria - 1 Angiografia e Retinografia - 1 Imagiologia (OCT, Confocal, etc.) - 2 Contactologia - 1 Ortóptica e Refracção Automática 3 Próteses, Recuperação de grandes Ambliopias - 1 Ecografia - 1 Bloco Operatório e Lasers - 2 Banco de Olhos e Patologia - 1 Técnico de manutenção - este elemento ou elementos são considerados de importância capital num Serviço dotado de material altamente sofisticado. E. Pessoal Auxiliar: Depende de contratos de manutenção e limpeza. Necessidade de pessoal fixo no Bloco e nos Exames Complementares (equipamento extremamente caro). N.B. - A abertura dos quadros do Pessoal propostos será realizada de uma forma progressiva e seguindo os números propostos. 4. EQUIPAMENTO (ver Anexo ) 57 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.6 - CONCRETIZAÇÃO DA PROPOSTA DE UM PLANO NACIONAL DE OFTALMOLOGIA PARA PORTUGAL DEFINIÇÃO DAS UNIDADES FUNCIONAIS DE SAÚDE DA VISÃO (UFSV) NAS TRÊS REGIÕES DE ASSISTÊNCIA DE PORTUGAL (NORTE, CENTRO E SUL E ILHAS) Serviram de base os seguintes números: Actividade média de um Serviço de Oftalmologia de Hospital Central a. Consultas - 15 unidades de consulta 6 doentes por período de 2 horas de consulta 3 períodos de consulta/dia 15 x 3 = 45 unidades em 3 períodos de consulta 45 x 6 = 270 doentes/dia 270 x 250 dias úteis/ano = 67 500 b. Exames e Consultas nos Gabinetes (números aproximados e variáveis segundo os Serviços): Electrofisiologia - 9/dia Perimetria - 17/dia Laser - 25/dia Eco + Contactologia - 13/dia Angiografia - 15/dia Imagiologia - 33/dia c. Consulta no Internamento: Internamento: 10 - 20 camas (2-3% do Hospital) Percentagem de Ocupação: 90% Número de consultas diárias - 15/dia Média total de consultas/ano : 103 000 Média de Cirurgia/ano : 2 500 - 3 000 58 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Necessidades de Pessoal Médico 1. Hospital Central - considerando 30 médicos do quadro (25 + 4 na cirurgia + 1 folga) e 12 internos resulta que para um total de 103 000 consultas/ano, cada médico realizará 2783 consultas/ano (103.000:37), ou seja, 11 doentes por dia, para 48 semanas de trabalho por ano (de notar que os internos têm um tempo de observação de doente maior) 2. Para os Hospitais Regional e Distrital os cálculos serão os mesmos, excluindo aqui, naturalmente, os internos. Confirma-se assim a necessidade para um Hospital Central de 30 médicos do quadro, para os hospitais não universitários e 34 para os hospitais universitários (4 médicos envolvidos em actividades directas de ensino). Devemos ter em conta que existem a nível das 3 Zonas Assistenciais do País (Norte, Centro e Sul) Actividades de Anestesia de Oftalmológica localizadas a nível de Hospitais Militares que prestam assistência à Família Militar. População das Zonas de Assistência do País: Norte - 3 000 000 Centro - 2 500 000 Sul e Ilhas - 4 500 000 Número de consultas/ano - 1 consulta/ano em dez (10) habitantes "Ratio" de 1 Oftalmologista por cada 15 000 a 17 000 habitantes segundo a Organização Mundial de Saúde. 59 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 QUADRO MÉDICO GENÉRICO A PROPOR PARA AS DIFERENTES ZONAS DO PAÍS NÍVEL DE HOSPITAL HOSPITAL CENTRAL Nº DE M ÉDICOS OBS . 34 UNIVERSITÁRIO HOSPITAL CENTRAL 30 HOSPITAL REGIONAL 10 8 (Urgência) + 1 (folga) + 1 (direcção) HOSPITAL DISTRITAL 3 1 (serviço hospitalar) + 1(serviço de rastreio) estes elementos serão incluídos nos Quadros H3) Números mínimos 60 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.6 - EXECUÇÃO DA PROPOSTA - Realização por Fases Foram analisadas as condições existentes e a possibilidade de concretização das propostas para constituição de quadros e equipamento das unidades referidas como Hospital Central Universitário, Hospital Central, Hospital Regional e Hospital Distrital, nas diferentes zonas do País, Norte, Centro e Sul e Ilhas (Anexo - 2; Quadros 1,2). Foi decidido que a aplicação desta proposta devia seguir princípios genéricos que permitissem a sua efectivação progressiva de acordo com os meios financeiros e de pessoal disponíveis. Assim, considera-se que a concretização por fases do Plano Nacional de Saúde da Visão deve fazer-se começando pelo preenchimento dos requisitos estabelecidos para os Hospitais Centrais, a que se seguirá o preenchimento de quadros e atribuição de equipamento aos Hospitais Regionais, terminando pelos Hospitais Distritais. Em relação aos Hospitais Regionais dever-se-á ter em conta os quadros já existentes e prioritizar os Serviços que possam funcionar a mais breve prazo como Unidades completas de Urgência Permanente. Só assim será possível assegurar à partida o funcionamento eficaz das Unidades Assistenciais mais Diferenciadas, para depois estender a Rede de Urgência ao País e garantir progressivamente uma Assistência Oftalmológica mais eficiente e de melhor qualidade. As necessidades em Pessoal, Equipamento e Instalações são muitas, como se poderá entrever dos Quadros de Quantificação, mas é preciso também ter em conta que: Pessoal - O preenchimento das vagas a criar deverá ser progressivo, começando pelos Hospitais Centrais, seguida pelos Regionais e por fim os Distritais. Entretanto e até se atingir este desiderato, propõe-se que sejam contratados, com contrato anual renovável, por proposta de respectivo Director de Serviço e com a coordenação da UFSV, e na qualidade de consultores, médicos oftalmologistas, não pertencentes aos quadros hospitalares e que exerçam a sua actividade na zona onde existam faltas. Equipamento - O equipamento deverá ser atribuído às Unidades Hospitalares respondendo às suas necessidades, enunciadas no Anexo 1, começando igualmente pelos Hospitais Centrais, atendendo a seguir os Regionais e depois os Distritais. Note-se que, particularmente, os 61 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Serviços dos Hospitais Centrais se encontram já apetrechados na grande maioria dos equipamentos solicitados. Este facto é de ter em conta pois permitirá que os encargos financeiros não atinjam de imediato grandes valores. Instalações - O que foi dito a respeito do equipamento aplica-se também, em grande parte, às instalações. As necessidade maiores são, neste momento, nos Hospitais Regionais, o que permite um fraccionamento das despesas necessárias por fases. A execução deste Plano irá diminuir as listas de espera em todo o País, rentabilizará os recursos existentes bem como assegurará progressivamente uma melhor qualidade de assistência oftalmológica a todos os Portugueses. 3.7 - ACOMPANHAMENTO E EXECUÇÃO A execução deste Plano deverá acompanhada por uma Comissão Nacional presidida pelo Senhor Ministro da Saúde ou seu Representante. A constituição desta Comissão deverá ser decidida pelo Senhor Ministro da Saúde, aceitando-se desde já a possibilidade de ser aquela que preparou este Documento, aproveitando assim o trabalho já realizado. 62 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 3.8 - ACTIVIDADES DE ENSINO E INVESTIGAÇÃO 3.8.1. Actividades de Ensino e Actualização Contínua As actividades de Ensino de Oftalmologia devem ser asseguradas com boa qualidade a vários níveis, pois só assim será possível criar condições que assegurem no futuro de qua lquer Plano Nacional de Saúde da Visão. A educação e o treino oftalmológico, incluindo a avaliação regular do conhecimento, são necessários para assegurar uma educação oftalmológica a todos os estudantes da Licenciatura em Medicina, um avanço progressivo dos programas de Ensino da Especialidade de Oftalmologia bem como melhorar o treino dos Técnicos Auxiliares de Oftalmologia. A - Ensino da Especialidade de Oftalmologia nas Unidades Hospitalares Centrais – Internato Complementar de Oftalmologia (4 anos). A educação e os objectivos de treino de um Interno de Oftalmologia visam instilar os conhecimentos, as perícias e os valores profissionais que qualificam um médico para a prevenção, diagnóstico, tratamento médico, tratamento cirúrgico e reabilitação das doenças do globo ocular e sistema visual. São elementos essencias as manifestações oftalmológicas de doenças sistémicas como a hipertensão arterial, as doenças metabólicas como a diabetes mellitus, e as doenças neurológicas; doenças oculares como a ambliopia, o estrabismo, a catarata, o glaucoma, a retinopatia diabética, a degenerescência macular relacionada com a idade, a uveite, as doenças inflamatórias infecciosas e não- infecciosas; doenças degenerativas e genéticas do globo ocular; traumatismos do globo ocular e sistema visual; erros refractivos. São igualmente componentes essenciais da educação e treino oftalmológicos a avaliação regular dos conhecimentos, uma vasta interacção com Oftalmologistas experientes, uma interacção com Médicos dedicados a outras áreas da Medicina bem como trabalho conjunto com outros Técnicos de Oftalmologia. Dever-se-à procurar pois um desenvolvimento e disseminação de um curriculum de educação e treino de oftalmologistas aplicável universalmente, desenvolver um modelo de ensino e avaliação da cirurgia oftalmológica incluindo a avaliação pré-operatória e os cuidados pósoperatórios bem como a utilização por todos os Internos de Oftalmologia de um sistema objectivo de avaliação dos conhecimentos. 63 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Prevê-se desde já a vantagem de criar um embrião de subespecializações através da diferenciação em áreas específicas (Retina Médica, Cirurgia do Vítreo Retina, Cirurgia Implanto Refractiva, Glaucoma, Estrabismo, etc) no último ano (4º) do internato para os candidatos mais aptos na avaliação dos 3 primeiros anos. Pretende-se criar um Plano Nacional de Ensino que siga a política traçada a nível da Europa pelo EUPO (European Association of the University Professors of Ophthalmology) de acordo com o plano de harmonização formativa e de defesa profissional da UEMS (Union Européene des Medecins Specialistes). Portugal está representado nestas duas organizações. Assim, o ensino teórico agrupar-se-á em quatro áreas principais, tal como se segue: - Óptica e Retina - Estrabismo e Neuro-Oftalmologia - Catarata e Glaucoma - Córnea e Órbita e Anexos as quais serão leccionadas a nível teórico, uma por ano, em conjunção com o programa da EUPO na Comunidade Europeia. B - Ensino de Oftalmologia aos alunos da Licenciatura em Medicina A educação oftalmológica de todos os alunos da Licenciatura em Medicina deve incluir, pelo menos, o conhecimento teórico e prático necessários a providenciar os cuidados oftalmológicos primários bem como reconhecer as situações clínicas que exigem referenciação para um tratamento oftalmológico especializado. A educação deve igualmente incluir um conhecimento básico da anatomia e fisiologia do globo ocular e do sistema visual, das causas de cegueira preveníveis mais frequentes em Portugal e o seu tratamento, das manifestações oftalmológicas de doenças sistémicas como a hipertensão arterial, as doenças neurológicas e a diabetes mellitus bem como informação acerca do diagnóstico e tratamento das principais doenças oftalmológicas como a ambliopia, o estrabismo, a catarata, o glaucoma, a degenerescência macular relacionada com a idade e a uveite. O desenvolvimento e a disseminação de um curriculum em Oftalmologia baseada na evidência para todos os estudantes em Medicina, que defina os conhecimentos e perícias necessários, incluindo a avaliação dos conhecimentos, é obrigatório. Informação sobre o Plano Nacional de Saúde da Visão será igualmente facultada. 64 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 C - Ensino Contínuo e Reciclagem dos Oftalmologistas A Educação Oftalmológica Contínua prolonga-se por toda a vida profissional de um Oftalmologista e compreende o desenvolvimento e disseminação de programas de educação que permitam ao Oftalmologista manter e melhorar progressivamente o seu nível de conhecimentos e perícias de molde a poder prestar os melhores cuidados de saúde da visão à população. Isto implica por parte do Oftalmologista um compromisso no sentido de uma educação e desenvolvimento progressivo dos seus conhecimentos e capacidades durante toda a sua carreira profissional. Para que se atinjam os resultados pretendidos dever-se-à promover o compromisso e encorajamento do Oftalmologista para a necessidade de uma educação contínua como parte essencial de sua carreira profissional, identificar programas e cursosde educação contínua de elevada qualidade científica, ident ificar programas e cursos de educação contínua de elevada qualidade científica para utilização de Oftalmologistas que se dedicam em áreas mais subespecializadas, promover a avaliação periódica dos conhecimentos e perícias desenvolvidas. Estes Cursos Programados regulares deverão ser integrados num contexto Nacional e também realizados dentro de cada UFSV. A realização de estágios de elementos dos quadros dos Hospitais Regionais em Unidades Hospitalares Centrais deverá ser um componente importante deste ensino de actualização e reciclagem. - Apoio à criação nas Universidades de Mestrados e Programas de Doutoramento com importante componente de investigação. - Ensino de Técnicos Auxiliares de Oftalmologia em condições adequadas, nas suas múltiplas funções e em colaboração com as Escolas Técnicas de Saúde e os Serviços Hospitalares Centrais. A criação de programas de treino de Técnicos Auxiliares de Oftalmologia visa formar pessoal profissionalizado com diferentes qualificações e perícias de molde a tornar mais competente e eficiente o sistema de cuidados de saúde da visão. Dever-se-à pois preparar um relatório que identifique os princípios inerentes à educação dos Técnicos Auxiliares de Oftalmologia bem como desenvolver e disseminar um modelo de 65 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 curriculum para Técnicos Auxiliares de Oftalmologia, reconhecendo a necessidade de uma série de programas em função dos vários níveis de educação e treino; todos os profissionais com experiência e conhecimentos no treino e avaliação de técnicos devem ser consultados. Para as diversas categorias de Técnicos Auxiliares de Oftalmologia, os curriculum deverão ser coordenados com avaliações objectivas de conhecimentos e perícias de molde a promover a formação de profissionais de elevada qualidade. - Ensino dos Técnicos de Óptica Ocular para que as empresas que dispensam próteses oculares actuem adequadamente, na sua área técnica, no contexto dos Cuidados de Saúde Oftalmológicos. - Ensino de Enfermagem no sentido da sua actualização e diferenciação, nomeadamente na sua actividade no Bloco Operatório de Oftalmologia. 3.8.2 - Actividades de Investigação A realização de Investigação em Ciências da Visão é um elemento fundamental para que os cuidados de saúde oftalmológicos possam atingir o melhor nível. Aliás, Portugal tem nesta Área de Investigação uma actividade muito significativa que lhe permite uma boa competitividade a nível internacional, mesmo no interior da Comunidade Europeia. Há, na realidade, no Porto, em Lisboa e em Coimbra uma Investigação Activa, da melhor qualidade a nível internacional, que deve ser apoiada. Considera-se como ponto de partida que "research should be accepted as a «sine qua non» for good medical practice". Finalmente, propõe como medida prioritária a identificação de Centros de Investigação Clínica em Serviços Hospitalares, fomentando a colaboração íntima entre investigação básica laboratorial e investigação clínica. Estes Centros de Investigação Clínica desempenhariam um papel fundamental criando oportunidades para participação dos futuros oftalmologistas em períodos de formação em investigação. Seriam também de grande importância na formação de elementos orientados 66 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 para uma carreira de investigação e que, deverão fazer futuramente parte dos quadros das Unidades mais diferenciadas da Assistência Oftalmológica do País. Considera esta comissão que será importante preparar um horizonte a médio prazo que promova a existência de tais Centros de Investigação Clínica de Oftalmologia, em Portugal. Num horizonte mais imediato julga-se que será oportuno reconhecer desde já Centros de Investigação de Oftalmologia, em Portugal, no Porto, Lisboa e Coimbra, por nestes locais já existirem, de facto, actividades de colaboração íntima entre o Laboratório e a Clínica, nomeadamente nos Hospitais de S. João, no Porto, nos Hospitais da Universidade de Coimbra, em Coimbra e no Instituto Gama Pinto, em Lisboa. É fundamental que este reconhecimento implique a atribuição de lugares de investigadores e técnicos, abertos a elementos de carreiras de Biologia, Química, Física, etc. Estes Centros, após o seu reconhecimentos pelo Ministério da Saúde deverão constituir um componente importante do Plano Nacional de Saúde da Visão e ser compreendidos como o melhor garante duma melhoria progressiva da qualidade da Assistência e da Saúde da Visão dos Portugueses. 67 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 ANEXOS: Anexo 1 - Equipamento Anexo 2 - Quadros de Distribuição das Unidades Funcionais de Saúde da Visão (UFSV) 68 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 ANEXO 1 1. EQUIPAMENTO DE UM HOSPITAL REGIONAL (apenas incluído quando superior a 100 contos, aproximadamente) a. Direcção do Serviço - 1 posto de Consulta completo b. Consulta Geral - 2 postos de Consulta completos c. Internamento - 1 posto de Consulta completo d. Bloco Operatório - 1 sala com possibilidade de anestesia local e geral Microscópio Operatório com X -Y, co-observador, zoom, etc. Diatermia (1 unidade) Crioterapia (1 unidade) Vitrectomo Automático (1 unidade) Electroíman (1 unidade) Material Cirúrgico Aparelho de Anestesia Geral ( 1 unidade) Monitor Cardíaco (1 unidade) Desfibrilhador e. Gabinetes de Diagnóstico e Tratamento Perimetria - Perímetro de Goldmann (1) Angiografia - Angiógrafo (1) Retinografia - Retinógrafo (1) Fotografia - Sistema de macrofotografia (1 unidade) Ecografia - Ecografia A e B e Biometria Ocular Contactologia - Unidade de Ensaio Ortóptica - Sinoptóforo, etc. Laser - Laser de Argon Refracção - Unidade Computorizada de refracção (1) f. Administração Computadores compatíveis com sistema Central do Hospital 69 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 2. EQUIPAMENTO DE UM HOSPITAL CENTRAL (apenas será incluído da. superior a 100 c. aproximadamente). a. Direcção do Serviço - 1 posto de Consulta, completo. b. Consulta - 16 postos de Consulta c. Internamento - 1posto de Consulta, completo. d. Bloco Operatório - 2 salas com anestesia geral, mais 1 sala para cirurgia ambulatória. Microscópios Operatórios - 3 sendo 2 c/ X-Y, co-observação, fenda móvel, zoom, etc. Diatermia - 3 unidades Crioterapia (-80º C) - 2 unidades Vitrectomos - 2 unidades Endolaser - 1 unidades Electroíman de grande potência - 1 unidade Unidades de aspiração automática - 2 unidades Material cirúrgico Aparelhos de Anestesia Geral - 2 unidades Monitor cardíaco - 3 unidades Circuito Fechado T.V. (ensino) - Bloco para Salas de Aulas. Desfibrilhador e. Gabinetes de diagnóstico e tratamento Electrofisiologia - Aparelhagem para E.R.G., E.O.G., P.E.V., "pattern", etc. Perímetro - Perímetros de Goldman (1) Perímetro computorizado (2) Angiografia - Angiógrafos (2) Retinografia - Retinógrafo Imagiologia - Sistema de macrofotografia. Eq uipamento de Câmara Escura, ampliação, etc. Biomicroscópio Fotográfico. Biomicrocópio Especular. Queratoscópio Fotográfico. Ecografia - Ecografia A e Biometria Ocular Ecografia Paquimetria 70 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 Visão Cromática - Farnsworth 100 Contactologia - Unidades de ensaio Ortóptica - Sinóptóforos (2) CAM, "Vectograph", etc. Refracção - Unidades computorizadas de refracção (1) Próteses, Baixa Visão - Unidades de ensaio Lasers - Laser Argon. Kripton, YAG Laser Fluorofotometria - Fluorofotómetro Banco de Olhos e Patologia Oftálmica - Biomicroscópio, Criostato, Microscópio com fotografia automático, Micrótomo, Frigorífico, Estufas, Arquivos e. Administração Computadores compatíveis com o sistema Central do Hospital. N.B. Deve-se ter em atenção que existem Serviços de Oftalmologia já, parcialmente ou totalmente, equipados com material proposto. 71 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 ANEXO 2 - Quadros de Distribuição das Redes de Assistência Oftalmológica ou Unidades Funcionais de Saúde da Visão de Zona (UFSV) nas Zonas Norte, Centro e Sul e Ilhas. 1 - Zona Norte UFSV do Hospital de Santo António UFSV do Hospital de São João 2 - Zona Centro UFSV dos Hospitais da Universidade de Coimbra 3 - Zona Sul e Ilhas UFSV do Hospital de Santa Maria UFSV do Hospital Dr. Gama Pinto UFSV do Hospital Egas Moniz UFSV dos Hospitais Civis 72 Documento de Trabalho Contributos para o Plano Nacional de Saúde 2004 - 2010 4 – Referências Bibliográficas 1-Vision Problems in the US, Prevent Blindness America,1994 2-The burden of age-related macular degeneration: results of a cohort study in two French referral centres. 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