Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200801 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS ELETRÔNICOS PARA A AUTOMAÇÃO DE EQUIPAMENTOS UTILIZADOS NO PROCESSAMENTO E NA CARACTERIZAÇÃO DE CERÂMICAS I. G. Constantino, G. A. F.A. Paredes, E. L. Veríssimo e E. N. Moreira Av. Washington Soares, 1321 Sala D – 03 60.811-341 [email protected] Universidade de Fortaleza - Centro de Ciências Tecnológicas RESUMO As cerâmicas ferroelétricas são atualmente os elementos transdutores mais utilizados nos equipamentos de ultra-som, em geral. Estas cerâmicas normalmente são sintetizadas pelo método da mistura de óxidos, sinterizadas em forno tipo mufla, e posteriormente polarizadas, em condições otimizadas, para apresentarem o efeito piezoelétrico. No referido processo de obtenção, está implícito o uso de um moinho, de um forno, de uma fonte de alta tensão, além de um sistema básico para caracterização. Neste trabalho, apresentamos os sistemas eletrônicos, desenvolvidos por alunos de engenharia eletrônica da UNIFOR, para a automatização do processo de moagem, sinterização, polarização e caracterização de cerâmicas. Estes equipamentos possibilitaram a síntese e a caracterização dielétrica básica das primeiras cerâmicas ferroelétricas produzidas na UNIFOR. Palavras chave: Automação, processamento, caracterização. INTRODUÇÃO Os materiais dielétricos de compostos cerâmicos ferroelétricos possuem como principal característica dipolos elétricos permanentes, que podem ser reorientados com a aplicação de um campo elétrico externo, e permanecer na nova configuração mesmo quando o campo elétrico externo é removido(1). Esta característica possibilita Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200802 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. o uso destes materiais como transdutores piezoelétricos, os quais são muito utilizados em sensores de vibração e atuadores eletromecânicos. Na síntese das amostras cerâmicas, por mistura de óxidos, o processo de moagem e mistura dos pós é uma etapa de vital importância, pois permite controlar variáveis como tamanho de grão, homogeneidade, etc. Usualmente, um moinho de bolas é empregado nesta etapa do processo, e deseja-se que este moinho mantenha a velocidade de moagem/mistura constante, e que permita controlar o tempo da moagem/mistura de alguns minutos até várias horas. Tanto na calcinação quanto na sinterização das amostras, é comum o uso de um forno tipo mufla, com temperatura e tempo de patamares controlados, contudo, muitas vezes não se dispõe de fornos com estas características, dificultando estes processos. Após o polimento e deposição dos eletrodos nas amostras, para que estas passem a apresentar as propriedades piezoelétricas é necessária a polarização destas. Entre as variáveis do processo de polarização estão o campo aplicado, o tempo e a temperatura de polarização. Assim, um sistema para polarização de amostras deve conter uma fonte de alta tensão e banho térmico controlados, além de um relógio temporizador. A permissividade dielétrica dos materiais cerâmicos ferroelétricos apresenta, de forma geral, alta dependência da freqüência de trabalho, temperatura e campo elétrico aplicado. Além disso, os materiais ferroelétricos apresentam condutividade e perdas dielétricas, muitas vezes não desprezíveis. Assim, a caracterização destas propriedades dielétricas é fundamental para o desenvolvimento de transdutores com estes materiais. Com o objetivo de produzir transdutores ultra-sônicos a partir de amostras cerâmicas ferroelétricas, foram desenvolvidos sistemas eletrônicos para controlar os processos de: moagem/mistura, sinterização, polarização e caracterização dielétrica das amostras sintetizadas no laboratório de novos materiais da UNIFOR. Todos os sistemas desenvolvidos são de baixo custo, podem ser adaptados aos mais diversos equipamentos comerciais, e apresentaram excelentes resultados, além de uma ótima relação custo benefício. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200803 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL Entre as motivações deste trabalho, está o desafio de montar a infra-estrutura mínima para um laboratório de pesquisa, com poucos recursos financeiros, e com alunos do curso de engenharia eletrônica. Controlador para forno tipo mufla: Dispondo de um forno tipo mufla somente com controle de temperatura, era muito inconveniente esperar a temperatura subir até a temperatura desejada para o tratamento térmico e daí começar a marcar o tempo de tratamento. Para resolver este problema desenvolvemos um sensor eletromagnético de corrente e um temporizador programável de 10 a 990 minutos. Assim que a temperatura atinge o valor programado, o sensor eletromagnético sinaliza ao temporizador o início do patamar, e este por sua vez, ao findar o tempo programado, desliga o forno. O sensor consiste em um toróide com núcleo de ferrite, o qual é atravessado por um dos fios que alimenta a resistência do forno. Por indução, quando a corrente varia, um sinal é gerado para iniciar os contadores de década do temporizador. O sistema desenvolvido pode ser adaptado em qualquer forno mufla, com controle proporcional de temperatura, sem alterar nenhuma das características do forno, visto que o sensor não é ligado ao circuito elétrico de controle de temperatura do forno, e sim, acoplado eletromagneticamente. Controlador do moinho de bolas: Foi desenvolvido na oficina mecânica da UNIFOR um moinho de bolas para a mistura e moagem dos pós cerâmicos. Desenvolveu-se para este moinho um controlador inteligente da velocidade e do tempo do processo. Este sistema é composto basicamente por: Um sensor óptico acoplado a uma roda dentada que está acoplada ao eixo do motor do moinho. Esse sensor vai gerar pulsos de tensão com freqüência proporcional à freqüência de rotação do motor; Um conversor freqüência-tensão (LM2907), que gera tensão contínua proporcional à freqüência do eixo do motor; Um estágio de comparação, composto por uma configuração de amplificadores operacionais (741 C). Este circuito compara a tensão gerada pelo conversor que Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200804 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. é proporcional à rotação do motor, com uma tensão de referência, que representa a rotação desejada ajustada pelo usuário; Um estágio de controle que, de acordo com a informação gerada pelo estágio de comparação, decide se deve aumentar ou diminuir a rotação do motor; Um estágio de potência, que amplifica a corrente do sinal de controle para alimentar o motor do moinho; Por último, foi acoplado ao moinho um circuito temporizador, similar ao desenvolvido para o forno, onde pode ser ajustado o tempo de funcionamento do moinho de 10 a 990 minutos. Entre as vantagens do moinho controlado, estão a estabilidade da velocidade de rotação independente da carga que se tem no moinho, tempo de moagem controlado, facilidade de programação da velocidade e do tempo Sistema para polarização: Para gerar alta tensão, foi desenvolvido um circuito oscilador Hartley com um transistor PNP MJ150004, mostrado na Figura 1, conectado a um “fly-back”, que é um transformador de alta-tensão muito utilizado em televisores. Com isso é possível gerar uma tensão contínua de até 20.000 volts. Na saída de alta tensão foi instalado um circuito de proteção contra curto-circuito. Este dispositivo desabilita a fonte, e impede que a amostra seja danificada por excesso de corrente. O esquema do circuito de proteção está apresentado na Figura 2. Figura 1 – Esquema do Oscilador Hartley para gerar alta tensão. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200805 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. Figura 2 – Esquema do circuito de proteção contra curto-circuito. O circuito desenvolvido para o controle da temperatura possui duas etapas. A primeira é a etapa do sensor de temperatura, onde foi utilizado o diodo 1N4148 que apresenta uma deriva térmica de –2mV/°C em uma ampla faixa de temperaturas. A outra é a etapa de controle, onde utilizando amplificadores operacionais como circuitos comparadores (LM 339), um relé é acionado para controlar uma chapa quente, de acordo com uma referência ajustada para a temperatura do óleo. O circuito temporizador desenvolvido para a fonte de alta tensão é diferenciado, pois o tempo máximo necessário para polarizar as amostras cerâmicas é de 30 minutos. Logo, foi montado um circuito onde se podem selecionar 3 tempos de funcionamento: 10, 20 ou 30 minutos. Todos os parâmetros do sistema de polarização podem ser visualizados alternadamente no display que está acoplado aos circuitos. Sistema de caracterização dielétrica: A Figura 3 apresenta um esquema do sistema de caracterização dielétrica, o qual é composto por: um amplificador Lock-in EG&G modelo 5210, um suporte de amostra; um microcomputador, um programa de interface, aquisição de dados e controle automático de medida, e um gerador de função. Ao suporte de amostra está conectado um circuito elétrico para medição, conforme ilustrado na Figura 4. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200806 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. Figura 3 Esquema do sistema de caracterização. Figura 4 - Esquema do circuito elétrico de medida Através deste esquema elétrico, nota-se que as tensões são medidas em um resistor que está associado em série com a amostra estudada, logo a corrente na amostra é a mesma do resistor e a tensão medida no resistor é proporcional a esta corrente. Tanto o resistor que está em série com a amostra, como o que está em paralelo com o RC série, devem ter um valor de sua resistência muito pequena (10 neste caso) comparado com o valor da reatância capacitiva da amostra, para não diminuir a corrente que passa pela amostra nem a tensão de saída que é aplicada nela. O microcomputador foi utilizado para controlar o sistema e coletar os dados. A interface utilizada foi a serial RS232, e utilizou-se uma linguagem de programação dedicada para instrumentação, o HPVEE versão 3.0. O diagrama ilustrado na Figura 5 apresenta as partes principais do programa desenvolvido. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200807 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. Figura 5 - Diagrama do programa de controle do sistema de caracterização Na configuração do “lock-in”, o programa ajusta os parâmetros da comunicação serial, realiza um auto-ajuste de sensibilidade, e informa a freqüência de medida que o gerador está submetendo a amostra. Considerando a amostra como um capacitor de placas paralelas, o usuário informa parâmetros como o diâmetro e espessura da amostra. Estes valores serão utilizados na etapa de conversão de valores em dados de permissividade dielétrica relativa e de fator de dissipação dielétrica. A apresentação dos resultados é feita no monitor, podendo também ser gerado um arquivo tipo texto para ser utilizado por outros programas A aferição do sistema de medida foi realizada utilizando capacitores comerciais (420pF, 1nF, 4,7nF, 10nF e 22nF) de baixo fator de dissipação na faixa de áudio freqüências. Aferiu-se o sistema nas freqüências: 100Hz, 1kHz, 10 kHz e 100 kHz. Com os dados obtidos neste processo, foram elaboradas as curvas de resposta do circuito, relacionando as correntes (tensão sobre o resistor) medidas com as propriedades dielétricas. As curvas de calibração do sistema estão apresentadas na Figura 6 e na Figura 7. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200808 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. Figura 6 – Curvas de calibração do sistema. Figura 7 Curvas de calibração do sistema. As amostras caracterizadas neste trabalho: titanato de bário - BaTiO3, titanato zirconato de chumbo modificado com lantânio - Pb0.91La0.09Zr0.65Ti0.35O3 - PLZT 9/65/35 e titanato de chumbo modificado com lantânio Pb0.80La0.20TiO3 - PLT20 foram sintetizadas pelo método convencional de mistura dos óxidos e queimadas em forno tipo mufla, com atmosfera controlada. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200809 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. RESULTADOS E DISCUSSÃO Todos os sistemas desenvolvidos apresentaram ótimos resultados quanto ao desempenho e funcionamento. O temporizador do forno apresentou um desvio máximo de 0,5% no tempo total programado, o que considera-se muito bom. O sistema de controle do moinho apresentou um desvio máximo de 7% no valor programado para a velocidade, e de 0,5% para o tempo. Estes valores de desvio observados estão dentro do previsto pelos projetos eletrônicos e pelo dimensionamento do motor do moinho. O sistema de polarização foi testado quanto ao funcionamento eletrônico das partes, contudo, ainda não se tem uma amostra polarizada neste sistema. Entretanto, o sistema de caracterização dielétrica já está totalmente operacional. Assim, a tabela I apresenta um resumo dos resultados obtidos para as propriedades dielétricas caracterizadas nas amostras cerâmicas estudadas. São apresentados também alguns valores citados em literatura, para composições similares. TABELA I - Valores da permissividade dielétrica relativa e do fator de dissipação dielétrica. ’ (1khz) ’ (ref.) tg (1 khz) tg (ref.) PLT 20 796,4 850 (2) 0,01931 --- PLZT 9/65/35 1819 4000 (3) 0,03207 0.07 (3) BaTiO3 1440 1600 (4) 0,2338 --- Amostra Observa-se que os valores obtidos para a permissividade dielétrica relativa para as amostras PLT20 e BaTiO3 estão muito próximos dos valores da literatura. Isso indica que as amostras estão na estequiometria correta e também bem densificadas, como indicam os dados referentes ao fator de dissipação. Os resultados obtidos para a amostra de PLZT 9/65/35 mostram que esta amostra não apresenta valores compatíveis com amostras de boa qualidade. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200810 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. As Figura 8 e Figura 9 apresentam o comportamento da constante dielétrica e do fator de dissipação em função da freqüência, respectivamente, obtido para a amostra de titanato de bário. Como pode-se observar, esta amostra apresenta um comportamento típico de cerâmicas ferroelétricas dentro deste intervalo de freqüência (5). Figura 8 – Constante dielétrica em função da freqüência. Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200811 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. Figura 9 – Fator de dissipação em função da freqüência. CONCLUSÃO Os resultados obtidos mostram que o sistema de caracterização automatizado apresentou uma ótima performance, fornecendo medidas das propriedades dielétricas coerentes e muito satisfatórias. O sistema mostrou-se também muito fácil de ser operado, isso porque o programa desenvolvido apresenta uma interface gráfica amigável ao usuário. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. VON HIPPEL, A. R., "Dielectric Materials and Aplications", Tecnology Press, Cambridge, Mass and New York, Ed. John Wiley & Sons, 1954. 2. HENNINGS D. and HÄRDTL K. H. , "Distribuition of vacancies in Lead Titanate", phys. Stat. Sol. (a) 3, 465, (1970). 3. GU W. Y. , FURMAN E., BHALLA A. and CROSS L.E., "Effects of thermal treatment on the electrical properties in relaxor PLZT ceramics", Ferroelectrics, 89, 221-230, (1989). Anais do 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2200812 30 de maio a 2 de junho de 2001 - Florianópolis – SC. 4. LOBO R.P.S.M., MOREIRA R.L. and MOHALLEM N.D.S., "Macroscopic behavior of the phase transitions in ferroelectric relaxors", Ferroelectrics, 133, 169-174, (1992). 5. MOREIRA E.N. "Transição de fase difusa e comportamento relaxor em materiais ferroelétricos cerâmicos", Tese de doutorado apresentada na Universidade Federal de São Carlos (1996). DEVELOPMENT OF ELECTRONIC SYSTEMS FOR THE AUTOMATION OF EQUIPMENTS USED IN THE PROCESSING AND IN THE CHARACTERIZATION OF CERAMIC ABSTRACT Ferroelectric ceramics are now the transductors elements more used in the supersonic sound waves equipments, in general. These ceramic are usually synthesized by the method of the mixture of oxides, fired in oven, and later polarized, in optimized conditions, for obtain the effect piezoelectric. In this process, it is implicit the use of a mill, of an oven, of a source of high tension, besides a basic system for characterization. In this work, we presented the electronic systems, developed by students of electronic engineering of UNIFOR, for the automation of the grinding process, sinterization, polarization and characterization of ceramic. These equipments made possible the synthesis and the basic dielectric characterization of the first ferroelectric ceramics produced in UNIFOR. Key Words: Automation, processing, characterization.