SOCIOLOGIA Profª Maria do Carmo REZENDE, Maria José de. As formas de desigualdades. In: TOMAZI, Nelson Dacio (Coord.) Iniciação à sociologia. São Paulo:Atual, 1993. cap.7, p.95-111. 1 AS FORMAS DE DESIGUALDADES Cada sociedade produz formas diferentes de expressão das desigualdades. Sociedades antigas – e a hindu – organização em castas; Sociedade feudal – estamentos; Sociedade capitalista – classes sociais 2 AS CASTAS Weber afirma que o sistema de castas é uma forma de organização social. A ordenação social baseada nesse tipo de agrupamento definia as posições dos indivíduos nos planos econômicos e políticos, assim como a forma de funcionamento de suas instituições. 3 AS CASTAS No regime de Castas há uma definição precisa do papel que os indivíduos estavam incumbidos de exercer. Aos membros de uma casta era permitido / proibido executar determinadas tarefas ou cargos. 4 AS CASTAS Pertencer a uma casta ou subcasta era o fator comprobatório da posição social e política que se ocupava dentro de uma comunidade No Egito antigo tinha-se uma ordem social em que no topo estavam os sacerdotes, os reis e os soldados; os demais – pastores, lavradores e artífices – ocupavam posições inferiores. 5 AS CASTAS Determinava-se que os ofícios que vinham dos antepassados deviam ser continuados. Assim, o filho do lavrador tinha que ocupar essa tarefa e não outra. Nenhum outro ofício era-lhe permitido. 6 AS CASTAS Ocupação de cargos públicos só era permitida àqueles que faziam parte dos agrupamentos considerados superiores. Na China, os letrados constituíram a casta dominante por vários séculos como a encarnação da sabedoria e da eficiência no exercício dos cargos públicos. 7 AS CASTAS China – se uma família rica não tivesse filhos com aptidão acadêmica, ela deveria apoiar um rapaz inteligente de uma família pobre. Dessa forma, estabelecia-se uma ligação muito forte entre esse letrado que poderia ocupar cargos públicos importantes e a família rica que tornou possível a sua instrução. 8 AS CASTAS O cargo e a riqueza eram indissociáveis. Assim, os letrados-funcionários pertenciam às famílias ricas ou estavam ligados a elas. A propriedade ou era comunal (coletiva) ou do Estado, e este tinha um caráter burocratizado 9 AS CASTAS A função dos funcionários públicos era a de fiscalizar e organizar as diversas atividades profissionais, a fim de manter e reproduzir as condições de dominação vigentes nas sociedades antigas. 10 A SOCIEDADE DE CASTAS Características: Hierarquização rígida baseada em critérios como hereditariedade, profissão, etnia, religião, que determinam uma situação de respeitabilidade e de relações sociais. 11 A SOCIEDADE DE CASTAS Definição dos critérios ocorre a partir de um conjunto de valores, hábitos e costumes definidos pela tradição. Sistema de castas assenta-se numa relação de privilégios que alguns indivíduos possuem em detrimento dos demais. 12 A SOCIEDADE DE CASTAS Pressuposto: direitos são desiguais por natureza, uma vez que os elementos que os caracterizam são definidos fora dos indivíduos. Por exemplo: o critério para a definição de cargos e profissões se dava pela hereditariedade (o guerreiro, faria seus filhos também guerreiro) 13 A SOCIEDADE DE CASTAS Sociedades antigas, a organização social baseava-se no sistema de castas. As desigualdades políticas, jurídicas, religiosas expressavam-se através do lugar que o indivíduo ocupava na estrutura de cargos e profissões, definidos pela hereditariedade, em primeiro plano. 14 A SOCIEDADE DE CASTAS Grécia antiga – exemplo da especialização hereditária – as famílias eram caracterizadas a partir de suas profissões: família de médicos, de sacerdotes, de guerreiros 15 A SOCIEDADE DE CASTAS No mundo antigo, as desigualdades sociais aparecem sem artifícios para amenizá-las: O escravo nasceu para ser escravo, da mesma forma que alguns homens nasceram para dominar. 16 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Estratificação social hindu é marcada pela hereditariedade; o nascimento era a condição básica para se definir uma dada posição na ordem social. A hierarquização é baseada na hereditariedade e nas profissões, que definiam os indivíduos como pertencentes a grupos de status diferentes 17 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Nem sempre o caráter hereditário e profissional convergiam. Por exemplo: dois indivíduos podiam desempenhar a mesma profissão, mas pertencer a castas diferentes por hereditariedade, o que não os colocava em condições de igualdade. 18 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Pertencentes à casta inferior eram considerados impuros e não podiam nem sequer prestar serviços aos membros das outras castas superiores. A idéia era de que tudo o que os impuros tocassem ficava contaminado, seja alimento, água, roupa etc... 19 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Castas puras (superiores) eram consideradas aptas a desempenhar funções públicas e a participar de determinadas atividades religiosas. Castas impuras eram praticamente segregadas, a elas não sendo permitido freqüentar escolas, templos etc... 20 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Castas principais da Índia: 1. Brâmane- casta superior a todas; 2. Chátria – casta intermediária formada pelos guerreiros 3. Vaixiá – casta intermediária formada pelos comerciantes, agricultores e pastores 4. Sudra ou pária – casta inferior 21 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Qualquer exemplo sobre a relação entre as castas na Índia tem que ser regionalizado, uma vez que cada região conserva um modo próprio de tratar essas questões. Na região de Maratha a sombra de um impuro não podia atingir um membro de uma casta superior. 22 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Na atualidade, as castas superiores não comem alimentos preparados pelos impuros, e um brâmane só se alimenta na companhia de indivíduos que fazem parte de sua casa. O trabalho é um fator relevante na definição das posições das castas já 23 AS CASTAS E A SOCIEDADE HINDU Já que as atividades consideradas degradantes são vistas como fatores que rebaixam as posições das castas na estrutura social. O sistema de castas envolve elementos econômicos, políticos e culturais configurando as desigualdades sociais. 24 OS ESTAMENTOS Sociedade feudal – séc.IX ao XIV – tinha a sua organização social baseada em estamentos ou estratos Tradição – elemento fundamental na definição do conjunto de relações estabelecidas entre os diferentes estamentos: nobreza, clero e servo. 25 OS ESTAMENTOS Hierarquização dos estamentos se estabelecia com base num conjunto de valores culturais definidos pela tradição:honra, hereditariedade e a linhagem. Os diversos estratos sociais tinham seus deveres reconhecidos pela tradição. 26 OS ESTAMENTOS Sociedade estamental produz uma situação de privilégios para alguns indivíduos, diretamente ligados à honra. Aqueles que dominavam – a nobreza e o clero – eram os que se situavam melhor no código de honrarias que vigorava na sociedade. 27 OS ESTAMENTOS Aos estamentos dominantes eram reservadas as atividades guerreiras, sacerdotais e de administração pública, bem como a propriedade da terra. 28 OS ESTAMENTOS Essa relação de privilégios que tinha fundamento na honra, só era possível porque os estratos não privilegiados também reconheciam, na hereditariedade, na linhagem, a honra do outro. 29 OS ESTAMENTOS Ou seja, os dominantes incorporavam pelo conjunto de valores culturais vigentes (disseminados e sustentados pela Igreja Católica), a idéia de que determinados indivíduos estavam, pela tradição, acima dos demais. 30 ESTAMENTOS: reciprocidade e força Feudalismo, o que alinhava as relações entre os diversos estratos era a vassalagem – relação pessoal de fidelidade. Vassalo contraía inúmeras obrigações que tinham sua contrapartida nas obrigações que o senhor assumia perante ele. 31 ESTAMENTOS: reciprocidade e força Vassalagem consistia em contrair obrigações que iam além da submissão a um determinado proprietário de terras. Era um juramento de fidelidade que repousava também na força das armas. 32 ESTAMENTOS: reciprocidade e força Vassalo era aquele que servia a um senhor numa ligação baseada na propriedade da terra. As obrigações entre eles eram diversas: ajuda de guerra, ofícios de escudeiro, funções da criadagem doméstica etc... 33 ESTAMENTOS: reciprocidade e força Vassalo tinha obrigações para com o senhor, mas este também lhe devia proteção. Era uma relação de dependência, subordinação e submissão. A vassalagem perpassava toda a hierarquização no feudalismo. 34 ESTAMENTOS: reciprocidade e força O nobre proprietário (senhor feudal) embora possuísse diversos vassalos, era também um vassalo do rei. Este último era o suserano maior e a ele todos deviam obrigações baseadas na vassalagem. 35 ESTAMENTOS: reciprocidade e força Existia uma hierarquia de vassalagem que se superpunha a todos os estamentos e os interligava. Do estrato mais inferior até o topo da pirâmide social, todos se encontravam ligados por uma trama de obrigações, reciprocidade e fidelidade. 36 A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA NA ORDEM ESTAMENTAL Weber afirma que o feudalismo é uma estruturação política patrimonialista por excelência. A organização política obedecia a uma hierarquização na qual a relação de subordinação se dava a partir das obrigações contraídas entre os diversos estratos com base na posse e no uso da terra. 37 A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA NA ORDEM ESTAMENTAL O poder vinculava-se à propriedade da terra, ou seja, os estratos dominantes tinham na posse de largas extensões de terras a fonte de seus poderes econômicos e políticos. A nobreza e o clero detinham grandes poderes porque eram proprietários de terras. 38 A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA NA ORDEM ESTAMENTAL O poder, além de estar vinculado à posse da terra, também se ligava a privilégios, honra, tradição e linhagem. Na base da dominação estamental, a nobreza ocupava a administração do Estado de forma perfeitamente afinada com os interesses clericais. 39 AS CLASSES SOCIAIS Sociedade capitalista – as classes sociais – expressam as desigualdades sociais. A complexidade da sociedade capitalista define relações que aparecem para os indivíduos de forma nebulosa. Só são visíveis e palpáveis as desigualdades gritantes. 40 AS CLASSES SOCIAIS As relações que produzem as desigualdades permanecem obscuras – isto é, os fundamentos de sua existência e as formas como elas se reproduzem. Aparentemente,as desigualdades são concebidas como naturais, ou seja, como algo sem relação com a produção da vida social. 41 AS CLASSES SOCIAIS As diferenças sociais, os privilégios, enfim as desigualdades são produzidas socialmente. A forma como o indivíduo se insere no conjunto de relações que ele estabelece no plano econômico e sócio-político é que pode explicar a divisão da sociedade em classes sociais. 42 AS CLASSES SOCIAIS No processo de produção capitalista, a apropriação e a expropriação são elementos básicos que, juntamente com outros, vão delinear o traçado de uma estruturação social desigual. O expropriado (operário) é aquele que produz, que cria as mercadorias num processo de produção que é social. Mas o capitalista apropria-se do resultado dessa produção de forma 43 privada. AS CLASSES SOCIAIS O operário é expropriado, uma vez que produz riqueza para o capitalista e a única coisa que produz para si é o salário. A expropriação, todavia, não é apenas econômica, mas também intelectual. O operário é expropriado dia a dia da possibilidade de desenvolver sua capacidade de criar, de pensar etc... 44 AS CLASSES SOCIAIS Na sociedade burguesa, o processo de reprodução social leva progressivamente à produção de interesses opostos, antagônicos, como parte do próprio movimento interno da estrutura social capitalista. 45 A PRODUÇÃO DAS CLASSES Classes sociais se constituíram de maneira oposta, fato que elimina qualquer idéia de que elas se tornaram antagônicas num segundo momento. Burguesia e operariado se definem como classes antagônicas desde os primórdios da sociedade capitalista. 46 A PRODUÇÃO DAS CLASSES Classes antagônicas, tanto no plano econômico – no nível da apropriação / expropriação, como no plano político – no nível da dominação que a classe burguesa estabelece sobre as demais. 47 A PRODUÇÃO DAS CLASSES A divisão da sociedade em classes sociais não é um dado acidental, casual, mas produzido pelas relações entre os homens; da mesma maneira que não se trata de escolha individual situar-se em uma ou em outra classe, ou seja, os indivíduos não participam de uma determinada classe por opção. 48 A PRODUÇÃO DAS CLASSES A sociedade capitalista é estruturada em classes sociais, sendo a burguesia (personificação do capital) e o operariado (personificação do trabalho assalariado) as duas classes fundamentais. 49 A PRODUÇÃO DAS CLASSES Na atualidade, existem diferenças e especificidades próprias para cada organização social capitalista, mas o seu fundamento é mantido. A organização social burguesa corresponde a uma determinada forma de produção social, que é a capitalista. 50 A PRODUÇÃO DAS CLASSES Esse modo de produção capitalista organiza o processo de trabalho de maneira própria, com um tipo de divisão do trabalho particular - livre ou assalariado, e com uma forma de propriedade – a propriedade privada. 51 A PRODUÇÃO DAS CLASSES A definição das classes sociais ocorre conforme o modo como os indivíduos se inserem nas relações de produção e reprodução social. O lugar que as pessoas ocupam na divisão do trabalho vai defini-las como pertencentes a uma dada classe social. 52 AS CLASSES SOCIAIS: UMA RELAÇÃO ANTAGÔNICA Classes sociais se constituem em relação umas com as outras. A classe operária se constitui em relação com a classe burguesa e vice-versa. Não é em si mesmas que elas se definem, mas no reconhecimento do seu oposto. 53 AS CLASSES SOCIAIS: UMA RELAÇÃO ANTAGÔNICA A classe burguesa e a classe operária estão ligadas por uma relação de antagonismo, de contradição, que se baseia no processo de apropriação econômica e de dominação política. 54 AS CLASSES SOCIAIS: UMA RELAÇÃO ANTAGÔNICA O processo de desenvolvimento capitalista trouxe no seu bojo a criação de outras classes intermediárias, como, por exemplo, os pequenos comerciantes e os pequenos proprietários rurais. 55 AS CLASSES SOCIAIS: UMA RELAÇÃO ANTAGÔNICA A burguesia e o proletariado existem em todas as sociedades capitalistas. Há, porém, especificidades na constituição, formação e atuação dessas classes em cada sociedade. Para se compreender a divisão da sociedade em classes, é preciso refletir demoradamente sobre cada estrutura social. 56 AS CLASSES SOCIAIS: UMA RELAÇÃO ANTAGÔNICA Deve-se fazer um exame acurado de cada sociedade para captar as suas particularidades com relação à divisão em classes. Pensar as classes sociais no Brasil é uma coisa, e outra bem diferente quando se consideram os EUA, a Argentina, a França, o Japão. 57 AS CLASSES SOCIAIS: UMA RELAÇÃO ANTAGÔNICA A sociedade brasileira desenvolveu uma classe média, bem como uma classe burguesa e uma classe operária com características que são específicas do Brasil, e não há como generalizá-las nem mesmo para os demais países latinoamericanos. 58 A LUTA DE CLASSES Se as classes se constituem numa relação antagônica, elas se definem como politicamente opostas e em luta. As greves, as reivindicações por melhores condições de existência, são formas de expressão da impossibilidade de conciliar os interesses de classes. 59 A LUTA DE CLASSES Por que os interesses são inconciliáveis ? A resposta a essa questão nos remete sempre à esfera política, uma vez que os interesses de classes são políticos e se definem pelas próprias práticas sociais. 60 A LUTA DE CLASSES As relações sociais estabelecidas na sociedade capitalista alicerçam o processo de dominação econômica, política, ideológica, cultural. 61 A LUTA DE CLASSES Fica evidenciado, dessa forma, o embate constante para a manutenção de posições de mando e de poder. Todas as esferas da vida social estão impregnadas dessa luta. 62 A LUTA DE CLASSES No âmbito cultural todas as manifestações artísticas – a literatura, o cinema, a música, a telenovela – expressam o processo de dominação ideológica, que é garantida pela construção de uma determinada concepção de mundo. 63 A LUTA DE CLASSES A luta de classes perpassa todos os momentos da vida social, não se manifestando apenas na esfera econômica através de greves, por exemplo. Há formas sutis, disfarçadas, de a luta de classes se manifestar no cotidiano dos indivíduos. Por ex: 64 A LUTA DE CLASSES TELENOVELA – uma forma de expressão da luta política e ideológica que se estabelece entre as classes, uma vez que difunde uma maneira de ver o mundo na qual tudo pode acontecer, todos podem ser ricos, há sempre um príncipe encantado que resolve todos os problemas da moça pobre e sem perspectivas, e assim por diante. 65 A LUTA DE CLASSES Tem-se aí a forma como se constrói e expressa uma concepção de mundo que vai dissimular as contradições nas quais os indivíduos estão envolvidos. Isso também é luta de classes. 66 A LUTA DE CLASSES Outro exemplo: a propaganda. A quem se dirige a propaganda de um carro completamente sofisticado ? De imediato pensamos: àquele que pode comprá-lo. É também mas não só a ele. Por quê? 67 A LUTA DE CLASSES A propaganda é capaz de criar nos indivíduos, mesmo naqueles que nunca poderão comprar o carro em questão, uma fantasia, uma perspectiva que os remeta a uma situação em que eles acreditam ser possível, algum dia, obter aquele produto. 68 A LUTA DE CLASSES Nas propagandas em geral aparecem homens que “venceram na vida”, ou que tiveram sucesso, o que faz com que os indivíduos construam uma concepção de mundo pautada em elementos que encobrem a sua condição real de existência. 69 A LUTA DE CLASSES A dominação ideológica é fundamental para a manutenção e reprodução da organização social pautada nas classes e um de seus papéis é o encobrimento do caráter extremamente contraditório do sistema capitalista, uma vez que mistifica o real caráter das relações estabelecidas pelos indivíduos na sociedade. 70