ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUARTA CÂMARA CÍVEL SESSÃO DO DIA 27 DE JULHO DE 2010 APELAÇÃO CÍVEL N.º ÚNICO 0000074-13.2010.8.10.0111, N.º PROCESSO 014917-2010 – PIO XII/MA APELANTE: Maria Neide da Silva e Silva ADVOGADA: Hilda do Nascimento Silva APELADO: Pedro Antonio da Silva RELATOR: Des. JAIME FERREIRA DE ARAUJO REVISORA: Desa. Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz ACÓRDÃO N.º 96.479/2010 APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO DIRETO LITIGIOSO. CITAÇÃO POR EDITAL. DESCONHECIMENTO DO ENDREÇO DO CÔNJUGE. BASTANTE A AFIRMAÇÃO DA PARTE AUTORA. FALSA AFIRMAÇÃO. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE MULTA E NULIDADE DA CITAÇÃO. I – Para a citação por edital, o Código de Processo Civil não faz menção ao esgotamento de todos os meios suasórios para localização do réu, se contentando com o fato de estar ele em lugar ignorado, incerto ou inacessível, bastando, para tanto, a afirmativa do autor quanto a uma dessas circunstâncias.. II – Deve o magistrado dar crédito à afirmação feita pelo autor, de modo que, sendo posteriormente comprovado que era falsa essa afirmativa, contra a parte que faltou com a verdade incidirá multa que reverterá em benefício do citando e nula será a citação realizada por edital. Inteligência do art. 247, CPC. III – Apelação conhecida e provida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível, sob o n.º 14917/2010, em que figuram como recorrente e recorrido os acima enunciados, pelos desembargadores da Quarta Câmara Cível, que “unanimemente e em desacordo ACiv-14917-2010/jsg Des. Jaime Ferreira de Araujo 1 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA com o parecer do Ministério Público, conheceram e deram provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator”. Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz – Presidente, Jaime Ferreira de Araujo – Relator e José Stélio Nunes Muniz. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Teodoro Peres Neto. São Luís, 27 de julho de 2010. Desembargador JAIME FERREIRA DE ARAUJO Relator RELATÓRIO Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por Maria Neide da Silva e Silva contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Titular da Comarca de Pio XII que, nos autos da Ação de Divórcio Litigioso (processo n.º 7413.2010.8.10.0111) julgou extinto o feito em face da inépcia da inicial. O magistrado sentenciante explicitou que não restou comprovada a plausibilidade da citação por edital em razão de não ter havido o esgotamento dos meios para localização do requerido (fls. 12-13), tendo, inclusive, oportunizado a emenda da exordial para a apelante informar o endereço dele ou requerer o que fosse de direito (fls. 08-09). Em resposta ao despacho, a recorrente afirmou não saber o endereço do seu cônjuge, nada requerendo naquela oportunidade (fl. 11). Nas razões recursais (fls. 16-18) sustenta o apelante, em síntese, que a lei processual não exige, para que a citação seja realizada por edital, se esgotem todos os esforços para a localização, mas sim que se afirme estar o réu em lugar incerto, ignorado ou inacessível, nos termos dos artigos 231 e 232, CPC. Alega ainda não se tratar de ausência de endereço do recorrido, mas em desconhecimento, por ter ele tomado rumo incerto e ignorado, não havendo, pois, que se falar em inépcia da petição inicial. Por último, ressalta que o pedido formulado visa apenas a dissolução ACiv-14917-2010/jsg Des. Jaime Ferreira de Araujo 2 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA da sociedade conjugal, sem pleito alimentar ou patrimonial, não havendo, outrossim, nenhum prejuízo ao réu. Com base nesses argumentos, pugna pela anulação da sentença com a determinação do retorno dos autos à Comarca de origem para regular processamento do feito. Em despacho de fls. 19-26, o juiz a quo afirma que várias são as ações de divórcio litigioso, naquela Comarca, oriundas do mesmo escritório de advocacia e ajuizadas na mesma data, em que figuram nos polos passivos réus que estão em lugar incerto e não sabido. Diante dessas circunstâncias, informa que determinou abertura de prazo para que a ora recorrente informasse o endereço ou requeresse o que fosse de direito. Manteve a sentença por entender que a extinção do processo sem resolução de mérito não obstruiria posterior ajuizamento de nova ação pela parte. Sem contrarrazões. Instada a se manifestar, a PGJ opinou pelo conhecimento e desprovimento do presente recurso (fls. 35-38). É o relatório. VOTO Merece ser conhecido o presente apelo por estarem presentes os pressupostos de admissibilidade. Como cediço, a citação por edital é utilizada sempre quando não for possível a citação pessoal, ou seja, nas circunstâncias enumeradas no art. 231 1, CPC, dentre elas quando ignorado o lugar em que se encontrar o réu, como no caso dos autos. Observo que o juiz singular oportunizou à recorrente emendar a inicial, tendo ela ratificado a inicial afirmando não saber informar o endereço do seu marido, uma vez que tomou ele rumo incerto. Ora, se a apelante não sabe onde reside o seu marido, decerto que não poderá informar um provável endereço a fim de que seja ele localizado, 1 Art. 231. Far-se-á a citação por edital: I - quando desconhecido ou incerto o réu; II - quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar; [...] (original sem grifos). ACiv-14917-2010/jsg Des. Jaime Ferreira de Araujo 3 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA restando-lhe apenas pedir a sua citação por edital. Registre-se que não se trata, in casu, de ausência de endereço do recorrido, mas em desconhecimento do seu paradeiro. Convém ressaltar que a recorrente não mais convive com o seu cônjuge em virtude de encontrar-se ele em lugar ignorado, repise-se, hipótese em que a lei autoriza a citação por edital. Ademais, se falsa for a afirmação da apelante, sofrerá ela as consequências jurídicas do seu ato. FREDIE DIDIER JR.2, ao escrever sobre à responsabilidade do promovente da citação-edital, esclarece que “se o autor agir maliciosamente, fazendo afirmação falsa, além de ser nula a citação (art. 247, CPC), incorrerá em multa de cinco vezes o salário-mínimo vigente na sede do juízo, que reverterá em benefício do citando. O CPC condiciona a punição à conduta dolosa da parte, que se equipara ao erro grosseiro.” Nesse mesmo sentido leciona MISAEL MONTENEGRO FILHO ao afirmar que “nas situações dos incisos I e II do art. 231, o magistrado confia na afirmação feita pelo autor, de modo que, sendo posteriormente provado que era inverídica, contra a parte incidirá multa, no valor correspondente a cinco vezes o salário mínimo vigente na sede do juízo, sendo revertida ao réu, pelo prejuízo processual que lhe foi causado.”. 3 Imperioso destacar, ainda, que não havendo a possibilidade de a apelante realizar diligências mínimas na tentativa de localização do endereço do apelado – porquanto afirmou não saber o lugar onde se encontra seu cônjuge –, agiu o magistrado com excesso de zelo ao extinguir o processo sem resolução de mérito ao invés de determinar a citação por edital. Observe-se, dos arestos dos Tribunais pátrios adiante transcritos, que a afirmação do demandante de encontrar-se a outra parte em local não sabido é suficiente para que se proceda a citação por edital, litteris: TJMS-031146. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESCISÃO DE CONTRATO - ALEGAÇÃO DE PROCURAÇÃO DESPIDA DE ASSINATURA - VÍCIO SANADO NO CURSO DA LIDE - NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL - RÉU EM LOCAL INCERTO E NÃO SABIDO - AFIRMAÇÃO DO AUTOR - POSSIBILIDADE - ART. 232, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRÊNCIA PRELIMINARES REJEITADAS - CONTRATO DE LOCAÇÃO DE 2 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. 1. 7.ed. Salvador: JusPodivm, 2007, p. 437. 3 MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil. São Paulo: Atlas, 2009, p. 238. ACiv-14917-2010/jsg Des. Jaime Ferreira de Araujo 4 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SERVIÇOS - AUSÊNCIA DE CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO POR QUALQUER DAS PARTES - DECRETAÇÃO DE RESCISÃO E EXTINÇÃO DO PACTO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO PROVIDO. Sanado o defeito na representação da parte no curso da lide, deve ser rejeitada a preliminar em que se sustenta ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo. A afirmação do autor de encontrar-se o réu em local incerto e não sabido é suficiente para que se proceda a citação por edital, nos termos do art. 232, I, do Código de Processo Civil. [...]. (Apelação Cível - Ordinário nº 2009.002676-4/0000-00, 1ª Turma Cível do TJ/MS, Rel. Joenildo de Sousa Chaves. unânime, DJ 09.02.2010). TJ/MG. AGRAVO DE INSTRUMENTO - CITAÇÃO POR EDITAL - CABIMENTO - REQUISITOS - CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA - NULIDADE - INOCORRÊNCIA - A citação por edital deve ser realizada quando o réu se encontrar em lugar ignorado, incerto ou inacessível. Para isto basta que, o autor afirme, ou o oficial (art. 232 do CPC) certifique as circunstâncias assim previstas no art. 231 do CPC. (Agravo de Instrumento, n.º processo 1.0223.07.236981-0/001(1), Numeração única: 236981084.2007.8.13.0223, 16ª Câmara Cível do TJ/MG, Rel. Batista de Abreu, j. 20.01.2010, DJ 05.03.2010). Original sem grifos. Fonte: CD Juris Plenum Ouro. Número 13. Maio de 2010. TRF3-086957. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PARTE RÉ QUE NÃO FOI LOCALIZADA PELO OFICIAL DE JUSTIÇA. DEFERIDO PEDIDO DE SOBRESTAMENTO DO FEITO PELO PRAZO DE TRINTA DIAS, APÓS O QUAL O PROCESSO FOI JULGADO EXTINTO, SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 267, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOCORRENTE A AVENTADA INÉPCIA DA INICIAL. PROCESSO QUE JÁ HAVIA ULTRAPASSADO A FASE DE EMENDA DA PEÇA VESTIBULAR. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO PROVIDA. I - O artigo 267, inciso I, do Código de Processo Civil, trata da extinção do processo decorrente do indeferimento da petição inicial, situação que não se verificou no presente feito, porquanto não configurada as hipóteses previstas no artigo 295 da lei processual. II - A exígua fundamentação jurídica da sentença refere-se à falta de informação, pela ora apelante, do endereço atual do réu, situação diversa de inépcia da peça vestibular. III - O fato de o réu estar em lugar incerto e não sabido é insuficiente para acarretar a extinção do processo, uma vez que a lei faculta a citação por edital em hipóteses como a dos autos (CPC, art. 231, inciso II), possibilidade que deve ser garantida à apelante, inclusive em atenção ao princípio da economia ACiv-14917-2010/jsg Des. Jaime Ferreira de Araujo 5 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA processual. Precedente da Turma. IV - Apelação provida. Sentença anulada. (Apelação Cível nº 1122171/SP (2003.61.19.007963-2), 2ª Turma do TRF da 3ª Região, Rel. Henrique Herkenhoff. j. 23.09.2008, unânime, DJF3 03.10.2008). Original sem grifos. Fonte: CD Juris Plenum Ouro. Número 13. Maio de 2010. Assim, verifico que as alegações apresentadas pelo recorrente são fatores determinantes para anulação da sentença hostilizada, pois os artigos 231 e 232, ambos do CPC, não fazem menção ao esgotamento de todos os meios para localização do “réu”, mas tão apenas dispõe sobre estar ele em lugar ignorado, sendo a afirmação do “autor” (no caso, a apelante) quanto a essa circunstância suficiente para a citação por edital. Destarte, impõe-se o retorno dos autos à Comarca de origem para o regular andamento do feito, devendo, para tanto, ser cassada a sentença hostilizada a fim de que o magistrado a quo determine a citação editalícia do recorrido, nos termos dos artigos 231 e 232, ambos do CPC. Com base em todo o exposto, e em desacordo com o parecer ministerial, voto pelo conhecimento e provimento do apelo, consoante acima disposto. É como voto. Sala das Sessões da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 27 de julho de 2010. Desembargador JAIME FERREIRA DE ARAUJO Relator ACiv-14917-2010/jsg Des. Jaime Ferreira de Araujo 6