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A LÓGICA CONSTITUÍDA PARA A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES
COMO ESTRUTURANTE PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA
Odeti Zanchet – CFET/UFPEL
1. A LÓGICA DO DISCURSO CONSTITUÍDO NA FORMAÇÃO DO
PROFESSOR: A PROVOCAÇÃO INICIAL
O arcabouço histórico conceitual do entendimento da docência e da mudança
paradigmática, que vem afetando a concepção de conhecimento e incluindo novas
racionalidades, tem tido importante influência no campo da formação de professores. A
histórica premissa construída para formar o professor, é materializada na idéia de que a
função docente resume-se em ensinar um corpo de conhecimentos estabelecidos e
legitimados pela a ciência e cultura, especialmente pelo valor intrínseco que os mesmos
representam. Para esta perspectiva a erudição seria a qualidade mais reconhecida no
docente que representaria um depositário do saber cuja palavra estaria pré-ungida de
legitimação, como nos ensina Cunha (2004). O elemento fundamental do ensino, nesta
perspectiva, é a lógica organizacional do conteúdo a ser ensinado, suas partes e prérequisitos, sem maiores preocupações com os sujeitos da aprendizagem e o contexto em
que essa deveria acontecer. O conhecimento, tido como puro reflexo dos objetos, se
organiza sem a mediação dos sujeitos. Na mesma direção, as características do trabalho
do professor, também são tributárias da lógica e da neutralidade: segurança, erudição,
metodologia da demonstração, parâmetros únicos de avaliação, disciplina silenciadora
dos estudantes, etc. O silêncio, de acordo com Santos (2000, p 30), junto com a
diferença, “é a expressão de uma sociologia das ausências, uma construção que se
afirma como sintoma de um bloqueio, de uma potencialidade que não pode ser
desenvolvida”. Enfim, a formação do professor é um intenso processo regulatório no
sentido
da
garantia
da
permanência
de
práticas
pedagógicas
consolidadas
tradicionalmente, que incluem os conceito de controle e poder. Bernstein (1998, p. 37)
diferencia essas duas dimensões explicitando que “o controle estabelece formas de
comunicação legítimas e o poder, as relações legítimas entre categorias”. Assim, o
poder vincula-se às relações que se instituem na prática pedagógica e o controle referese aos dispositivos do discurso pedagógico que regula as mesmas. Para o autor, “a
prática pedagógica pode ser entendida como um dispositivo transmissor, um transmissor
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cultural. Um dispositivo unicamente humano, tanto para a reprodução como para a
produção da cultura”. Bernstein (1990, p.68). Suas reflexões, aliadas às contribuições de
Santos, servem para que se compreenda que o sentido da docência não é arbitrário, pois
sempre revela e contém formas de controle e poder ou, dito de outra forma, de
regulação. No caso da educação essas formas se materializam na prática pedagógica,
pois é a sala de aula o lócus privilegiado onde atua o professor.
Acreditamos que no espaço da sala de aula, o professor reflete sobre o que
sabe, expressa o que sente e se posiciona quanto à sua concepção de sociedade, de
homem, de educação, de universidade, de aluno e de docência, enfim produz saberes
acerca de seus processos de ensinar e das condições sociais concretas que condicionam
suas próprias experiências. Também entendemos que é nela que se materializam os
conflitos entre as expectativas sociais, os sonhos individuais e os compromissos
coletivos, bem como a transmissão e/ou a produção de conhecimento.
Cientes dos condicionantes externos às práticas do professor, mas mobilizados
pelas reflexões anteriores investimos no delineamento, aplicação e pesquisa sobre uma
prática pedagógica em Matemática que tentou romper com a concepção de um ensino
transmissivo e reprodutivo centrado fortemente no professor e, através dos resultados
discutir com os docentes outras possibilidades para pensar o ensino dessa disciplina.
2. A PRÁTICA PEDAGÓGICA ANALISADA: APONTANDO AS TRILHAS
PARA A PESQUISA
Vários são os conteúdos da Matemática escolar que merecem atenção quando
nos dispomos discutir questões como as aqui apresentadas. Mas, em especial, dedicamonos a álgebra por entender que, cada vez mais, ela se faz presente no cenário da
sociedade contemporânea, tanto pela marcante presença da tecnologia, como pelo alto
grau de imprevisibilidade que caracteriza nossos dias. No cenário de uma sociedade em
constantes mudanças culturais, torna-se necessário refletir sobre as informações que os
jovens recebem na escola e sobre os efeitos delas provenientes. Torna-se fundamental
estimular nos alunos o desenvolvimento de habilidades, valores, comportamentos os
quais lhes possibilitem interpretar e compreender os fenômenos que estão presentes nas
diversas áreas do conhecimento e são permeados pela Matemática. Como a álgebra
constitui uma possibilidade para desenvolver essas competências, nossa experiência
privilegiou-a como objeto para a prática e para o estudo. A sala de aula tornou-se o
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locus da experiência porque nela se estabelecem interações entre professor e alunos,
bem como dos alunos entre si. Nessa relação, existe um elemento que orienta as
interações entre os parceiros: o conhecimento. É o compromisso com o aprender/ensinar
que perpassa a comunicação estabelecida na sala de aula, criando um sentimento
coletivo que dá sentido às atividades cotidianas dessas pessoas.
Ao optarmos por desenvolver em sala de aula uma experiência que trabalhasse
algum assunto da álgebra, foi preciso uma definição quanto ao conteúdo a ser abordado.
O critério de escolha considerou que, dada a importância da compreensão dos conceitos
iniciais em uma nova aprendizagem, seria importante privilegiar as primeiras
considerações que são feitas em álgebra. Portanto, a experiência metodológica tomou as
equações de 10 grau como o tema a ser trabalhado dentro do assunto escolhido. O
conteúdo de ensino encaminhou a escolha de uma 6a série do ensino fundamental para a
realização da experiência, pois é nessa série que se desenvolve esse tema. A Escola na
qual se desenvolveu o trabalho, a julgar pelo seu interior, poderia ser igualada a todas as
outras. Mas, não foi. A sua administração era composta por pessoas que promoviam e
incentivavam um ensino inovador, o qual trazia no seu interior a possibilidade de
formação de alunos reflexivos. Lutando com dificuldades financeiras, sem equipes
especializadas e sem pessoal de apoio, mas contando com o entusiasmo daqueles que
dela faziam parte, essa Escola representava uma possibilidade de construção de um
projeto pedagógico próprio.
Em linhas gerais, a proposta envolvia o desenvolvimento de um material
concreto o qual auxiliasse a construção e a compreensão dos conceitos que envolvem a
construção e resolução de equações de 10 grau. A abordagem do material visava tanto a
estimular a discussão sobre o assunto, como tornar o conteúdo atrativo. Acreditávamos
que a manipulação do material, sendo realizada pelo próprio aluno, permitir-lhe-ia a
organização das idéias que iríamos trabalhando e favoreceria a abstração que se faz
necessária em álgebra. Nosso objetivo com esse material não foi concretizar a álgebra,
mas olhar a experiência didática sob o ponto de vista da produção de significados para
os assuntos, percebendo qual poderia ser sua contribuição para uma mudança de
comportamento dos alunos em relação à Matemática. Ao planejarmos esse trabalho,
assumimos, junto com a professora, a decisão de que deixaríamos de falar sobre alguns
tópicos que comumente antecedem o estudo de equações. Tomamos essa decisão por
acreditarmos que esse conhecimento pode não se fazer necessário no momento em que
se introduz esse conteúdo, como é o caso de sentenças matemáticas. Em contrapartida,
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fizemos o resgate de conceitos importantes que se fazem presentes em álgebra. Esse
trabalho em sala de aula teve duração de aproximadamente três meses. Mas o contato
com a professora deu-se durante o resto do ano letivo, para um acompanhamento e
avaliação do trabalho como processo.
Através da prática pedagógica desenvolvida pudemos percorrer um caminho
para o ensino de equações de 10 grau que permitiu observar indicadores de que a
aprendizagem foi significativa para os alunos e que proporcionou alguma mudança,
tanto nos sujeitos como na atual estrutura apresentada para os conteúdos de álgebra.
Verificou-se que as dificuldades enfrentadas por os alunos na aprendizagem da álgebra
são decorrentes da forma como esse assunto é tratado, ou seja, decorre da forma abstrata
e descontextualizada como é ensinado, em uma estrutura em que se recorre a várias
definições fragmentadas para depois se chegar ao assunto propriamente definido. Na
experiência realizada houve uma ruptura com a forma tradicional de ensinar equações,
que concebe a necessidade de uma série de definições teóricas como pré-requisitos para
a aprendizagem; houve a redefinição da relação teoria/prática em Matemática,
rompendo com a concepção de que a prática é o exercício da teoria; os alunos tornaramse partícipes no processo de construção do conhecimento; e o professor foi o orientador
no processo, buscando o trânsito entre o conhecimento do cotidiano e o conhecimento
acadêmico A experiência pedagógica proporcionou entender os acontecimentos na sua
gênese, discuti-los teoricamente e construir um conhecimento sobre eles.
3. NAS
TRILHAS
INVESTIGATIVAS:
DIALOGANDO
COM
OS
INTERLOCUTORES
No empenho de compreender como vem se dando a tensão entre a condição da
prática dos professores de Matemática em sala de aula, a formação acadêmica recebida,
as possibilidades e os desafios na direção de outras alternativas para o trabalho
pedagógico, realizamos uma investigação com professores de 6a série do Ensino
Fundamental e com os docentes formadores desses professores, na tentativa de
apreender suas compreensões e concepções a respeito do ensino da Matemática.
A primeira aproximação ao campo de pesquisa foi realizada com os
professores universitários que trabalham nos Cursos de Formação de Professores de
Matemática sob o pressuposto de que eles teriam uma visão ampla das atuações dos
professores em sala de aula em relação à formação recebida favorecendo o cruzamento
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e a intersecção com as caracterizações das práticas dos professores. No segundo
momento, a aproximação foi com os professores que trabalham em turmas de 6a série.
As questões das entrevistas foram elaboradas levando em conta os resultados obtidos na
experiência metodológica citada anteriormente e questões que os provocassem a falar
sobre as práticas pedagógicas que realizam e sobre aspectos relacionados à formação
acadêmica.
Conforme característica da entrevista semi-estruturada, as questões procuraram ser
provocadoras das reflexões e narrativas permitindo a espontaneidade das conversas.
Todas as entrevistas foram degravadas para mapeamento dos dados, que foram
agrupados por temas, como uma primeira forma de categorização. O resultado dessa
etapa resultou em um quadro analítico dos depoimentos de cada um dos sujeitos da
pesquisa.
Os dados foram analisados usando os princípios da analise de conteúdo. Esse
enfoque, “refere-se a um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter,
por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,
indicadores que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção destas mensagens”. Bardin (1979, p. 42).
A análise dos depoimentos dos professores universitários foi de muito valor
para compreender como as concepções antagônicas em relação ao ensino da
Matemática, na perspectiva da formação de professores, estão acontecendo na
universidade. As respostas permitiram-nos compreender que vivemos momentos de
muita controvérsia entre os docentes universitários que trabalham em cursos de
formação de professores, principalmente, quando discutimos aspectos epistemológicos
do conhecimento matemático e questionamos a possibilidade de outra lógica para o
ensino dessa disciplina.
O depoimento de um dos professores universitários, sobre a hipótese de se
trabalhar com o pensamento algébrico desde os primeiros anos do ensino fundamental,
foi interessante pois ele disse que quando passo a trabalhar com os alunos na direção
da cooperação e não da coação, as fronteira se dilatam, se tornam fluidas. Então eu
posso trabalhar, por exemplo, com elementos do raciocínio algébrico com uma criança
que está trabalhando lá na base aritmética, sem problemas. Mas o aluno não precisa
saber, nem ter definição nenhuma.
Em contrapartida, outro professor universitário, insiste em que a álgebra deve
começar com um assunto determinado e em uma série específica, declarando que
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aritmética é quando se trata com números, divisibilidade, algoritmo da divisão, fator
comum. Álgebra passaria para os problemas com letras. Bota um pequenino problema,
mas se fazem equaçõezinhas nos anos iniciais do ensino. Se põe um quadradinho mais 5
igual a nove ( + 5 = 9 ). Seria a primeira equação, mas não precisa complicar,
dizendo que é equação, mas sim sentença matemática aberta, que pode ser verdadeira
ou falsa dependendo do valor do quadradinho. Mais adiante substitui por uma letra,
então é álgebra. O exemplo dado pelo professor aponta a possibilidade para pensarmos
a álgebra apenas quando trabalhamos com letras, o que leva o aluno a ter uma visão da
Matemática como disciplina acabada e com uma estrutura definida a priori, onde cada
assunto está definido por alguma forma de apresentação, do tipo: se trabalha com
números é aritmética, se trabalha com letras é álgebra. No mesmo depoimento diz,
ainda, que não precisa complicar, dizendo que é equação, mas introduz sentença
matemática aberta que, no nosso entender, se torna mais abstrato para os alunos nessa
faixa etária. Ele admite a hipótese de se trabalhar um pequenino problema onde se
fazem equaçõezinhas nos anos iniciais do ensino mas, ao mesmo tempo, determina que
a fala de álgebra na 6a série é para se falar de coisas literais. Quando soma frações
algébricas, está fazendo álgebra. Em outra fala expôs que hoje, se ensina a mesma
coisa que se ensinava antigamente. Não mudou o programa.... os problemas são
exatamente os mesmos... os alunos, futuros-professores têm que saber a fundo os
conhecimentos da Matemática. A Matemática não está ensinando para a vida, mas
ninguém está. Para ele, o futuro professor precisa saber a fundo os conhecimentos da
Matemática, bem como precisa saber transmiti-los. A concepção de que a universidade
precisa preparar os professores para trabalharem com outras racionalidades não se fez
presente na compreensão desse professor. Nessa direção, reforçou sua concepção
relatando o fato que tem uma aluna que está pesquisando, para uma monografia de
especialização, os alunos do interior de sua cidade, para buscar os tipos de problemas
de Matemática que são usados no meio rural. Poderá ser um bom trabalho, mas
independente dele, a professora, em seu curso de aperfeiçoamento, deve estudar todo o
conhecimento matemático que está determinado no currículo, e não ficar só na
pesquisa. A argumentação usada pelo professor é de que hoje, a professora trabalha no
nível fundamental de ensino, mas um dia ela poderá trabalhar em outro nível, como o
terceiro grau, e precisará de tais conteúdos. Essa argumentação traduz a concepção de
um ensino reprodutivo que não admite outro tipo de racionalidade para produzir o
conhecimento matemático que não seja o do paradigma científico. Precisamos pensar a
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sala de aula como espaço propício para a produção de conhecimento matemático que
possa interagir com o conhecimento legitimado e que tenha como ponto de partida o
conhecimento cotidiano. A função do conhecimento trabalhado, tanto na universidade
como na escola, está além da formação científica, ele precisa desenvolver qualidades,
como ação, reflexão crítica, curiosidade, questionamento exigente, inquietação e
incerteza, o que se torna mais difícil quando usamos apenas a transferência do
conhecimento existente.
O conhecimento que se trabalha na escola é “produzido longe das salas de aula,
por pesquisadores, acadêmicos, escritores de livros didáticos e comissões oficiais de
currículo, mas não é criado e re-criado pelos estudantes e pelos professores nas salas de
aula”, como nos ensina Freire (1986, p.19). Talvez essa seja uma das razões que levam
os alunos a não encontram motivação para estudar um currículo de Matemática
composto por conhecimentos desvinculados de sua realidade. Ao professor cabe a tarefa
de orientar o processo de ressignificação do conhecimento, de forma que o aluno
encontre razões para estudá-lo.
Essa perspectiva está presente na compreensão de outro interlocutor, também
professor universitário, quando expõe que o conhecimento matemático é um
conhecimento que é bastante amplo, profundamente amplo. O que a escola faz? A
escola faz alguns recortes. Quem define esses recortes? A sociedade define. Eles são
aleatórios, eles têm uma finalidade, um objetivo político, ideológico, que é atender ao
sistema. No momento em que se começa a trabalhar o conhecimento escolar como
conhecimento humano, para o sujeito ser feliz, evoluir, pensar, raciocinar, para mim é
tranqüilo que essas fronteiras que a gente estabelece
se ampliam...... dentro das
possibilidades dos alunos e do professor...
É oportuno que essa compreensão seja trabalhada nos Cursos de Formação de
Professores, e que exista a preocupação em alertar os futuros professores quanto à
contextualização histórica destes, desenvolvendo-lhe a percepção de que o
conhecimento apresentado foi construído sob uma determinada lógica e dentro de um
determinado contexto. Como exemplo, o mesmo docente continuou argumentando que
o que é visto hoje dentro da escola? Bom, é visto um monte de coisas inúteis. Por quê?
Porque elas ficaram historicamente colocadas dentro dos conteúdos, dos programas.
Tem uma série de coisas que entraram em determinado momento para dentro da
Matemática porque eram importantes, ou consideradas importantes pelos cérebros
iluminados da época. Isto é histórico.
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Entretanto, essa concepção sobre os conteúdos da Matemática e o ensino dessa
disciplina não é hegemônica. Há docentes que acreditam na visão positivista de ciência
e alicerçam sua proposta de formação de professores nessa concepção, como nos disse
um interlocutor que o professor de Matemática só usa esse conhecimento enquanto está
dentro da sala de aula. Fora disso, ele só sabe. O conhecimento de Matemática é usado
para selecionar (fez referências a concursos, como o vestibular). Eu acredito que se
afrouxou muito o ensino, a educação e o conhecimento.
Esse respondente admite que o conhecimento transmitido aos futuros
professores só lhes é útil enquanto tiverem oportunidade de reproduzi-lo aos seus
alunos, não admitindo a hipótese de ressignificá-lo, adequando-o ao contexto atual,
dando-lhes a oportunidade de perceber a Matemática como um conhecimento dinâmico.
Há professores que rompem com o conceito “moderno” de ciência e de
conhecimento e partem para a construção de novas formas de ensino através da crítica e
da reconstrução da história, como afirma um interlocutor: Eu tenho tentado,
conversando com meus alunos, futuros professores, fazer com que eles consigam,
através de sua própria história, resgatar a história da construção do conhecimento
matemático.....fazê-los observar como a própria humanidade necessitou reconstruir.
Em contrapartida, outros professores tentam perpetuar a idéia de que a
Matemática constitui-se em um corpo de conhecimentos que deve ser transmitido aos
alunos sempre da mesma forma. Percebemos essa posição no depoimento do professor
universitário que explicitou que o Curso de Licenciatura deveria ter disciplinas de
Matemática bem feitas. O bom professor deveria saber análise, álgebra...Na minha
época eu fiz assim.... Porque se podia fazer isso naquela época? Hoje também deveria
ser assim. Aliás nunca devia de ter deixado de ser assim. Encontramos, de um lado
professores que consideram o ensino como processo de construção, e de outro lado, os
que o consideram como saber pronto para ser transmitido. Para Pimentel (2001, p.35),
ainda existem,
entre ambas, todas as combinações possíveis de paradigmas
emergentes
e
dominantes,
gerados
pela
imprecisão
epistemológica que os impede de mudar de perspectiva para se
lançarem, com segurança, na insegurança assumida. Ao lado de
propostas de trabalho criativas, apresentam outras, residuais
talvez, apoiadas historicamente em modelos do passado.
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Quando entrevistamos professores de 6a séries pudemos observar como ficou
incorporado, em suas práticas, a lógica que presidiu sua formação. Suas falas
demonstraram a formação positivista recebida e a forte presença da lógica da
fragmentação dos conteúdos. O depoimento de uma das entrevistadas quando provocada
a falar sobre as possibilidades de trabalhar outras hipóteses que não estão presentes nos
problemas dos livros didáticos e que rompem com a ordem preestabelecida dos
conteúdos, é esclarecedor dessas hipóteses e está ilustrado através do diálogo a seguir:
- E sobre as frações algébricas?
- Não é na 6a série, é na 7a , e eu não tenho essa série.
- Como tu identificas problemas como esse: 3 x 7 =  então  + 5 = 26, que aparecem
sob o título de: Use a cuca.
- É na 5a série...
Pudemos observar nas expressões dos professores que estão fortemente
presente as estruturas tradicionais, ainda que alguns admitam um novo discurso no
sentido de trazer para a prática de sala de aula elementos do cotidiano dos alunos.
A mesma interlocutora diz: eles (os alunos) entendem de futebol, então eu falo
para eles a regra de sinais como se fosse um jogo... isso para eles é mais fácil, então se
interessam. Mas, ao mesmo tempo, quando trata de álgebra, faz outras construções,
dizendo que lembro da minha professora. Aprendi assim com ela e continuo ensinando
assim. E é assim. Eu explico para eles o que é variável, que a gente procura um valor
para ela, porque o nome já está dizendo” variável” , e vou inventando na hora...
Os professores de Matemática que se consideram “formados” não concebem a
formulação de propostas alternativas para as situações de ensino vividas nas escolas,
especialmente em álgebra, por se tratar de um assunto caracterizado pelo alto grau de
abstração. Continuam repetindo práticas pedagógicas, muitas vezes ineficazes, por
considerá-las como únicas capazes de fazerem os alunos aprenderem. Entendemos que
essa concepção é fruto da formação tradicional recebida e da falta de reflexão desse
professor sobre a relação de seu trabalho com a realidade de seus alunos.
Romper com a linearidade e a seqüência dos assuntos é um desafio para os
professores. Entretanto, mesmo que minoritários, alguns depoimentos evidenciaram
uma vivência nessa direção e a percepção de que outras alternativas são possíveis para a
prática pedagógica em Matemática. Explicitam sua reflexão em relação a álgebra
dizendo que antes eu chegava e explicava o que era sentença aberta, fechada, quando é
que era equação, quando não era e eles (os alunos) não tinham noção do que isso
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significava e por que aparecia o x e o y. Na verdade, sentenças matemáticas.... eu vejo
que não servem para mais nada. Os livros didáticos mandam na ordem dos conteúdos.
Se o conteúdo está assim no livro deve ser assim. Outra professora destaca a
importância da ruptura na dimensão da ousadia, e declara que embora tenhamos medo,
considero que esse medo nos impulsiona para frente. Isso é bom, porque aprendemos a
ousar, romper com padrões de educação que muitas vezes nos impedem de falar o que
se está pensando. Um trabalho pedagógico nessa direção, nos faz ver a necessidade de
ousarmos. Assim aprendemos a usar a ousadia em outras coisas na vida, não só no
trabalho escolar.
Sabe-se que, em Matemática, são possíveis diversas formas de se resolver um
mesmo problema, por que, então exige-se do aluno obediência a um modelo uniforme e
fixo? Soluções alternativas devem ser bem recebidas pelo professor. Muitas vezes, o
professor de Matemática entende que só é possível ensinar se os alunos ficarem
imobilizados e em total silêncio. Essa paralisação imposta impede o diálogo e não
permite as trocas coletivas que, muitas vezes, contribuem para o entendimento das
questões.
Esse fato pode estar atrelado à formação positivista que prepondera ainda hoje nos
Cursos de Formação de Professores de Matemática, pois poucas vezes lhes são dadas
oportunidades de empreenderem uma discussão que possibilite pensarem o ensino da
Matemática numa outra visão. Assim, forma-se nesses professores a concepção de que a
Matemática é um conhecimento pronto e acabado, restando ao professor dominá-lo para
poder transmiti-lo. Admite-se que a forma de ensino até possa ganhar nova roupagem, e,
sob pressupostos diversos, alguns professores passam a utilizar materiais concretos ou
analogias como possibilidade para suas práticas.
A idéia de múltiplas possibilidades nos processos de ensinar e de aprender está
presente em professores que trabalham com seus alunos na direção de pesquisa como
princípio educativo, quando eles solicitam que seus alunos decidam sobre possíveis
alternativas para resolver as situações-problemas propostas por um projeto de trabalho.
Da mesma forma, é importante a tarefa de organizar reflexões sistemáticas sobre a
história, a filosofia e a epistemologia que envolvem os conhecimentos da Matemática.
Nessa direção, pensamos que o processo de reflexão, tanto cursos de formação como
das práticas pedagógicas, pode ser uma alternativa para provocar a necessidade de uma
re-contextualização fazendo emergir discussões de base epistemológica para sustentação
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de novas propostas curriculares e para o desenvolvimento de novas práticas pedagógicas
em Matemática.
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