Brasília, 17 a 28 de março de 2008 Nº 499 Data (páginas internas): 2 de abril de 2008 Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça. SUMÁRIO Plenário Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 1 Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 2 Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 3 Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 4 Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 5 Contrato Temporário e Competência da Justiça Comum Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 1 Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 2 Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 3 Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 4 “Amicus Curiae”: Processo Objetivo de Controle de Constitucionalidade e Interesse Recursal Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 1 Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 2 Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 3 Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 4 ADI e Atos Secundários Reclamação e Seqüestro de Rendas Públicas 1ª Turma Interceptação Telefônica e Acesso da Defesa - 1 Interceptação Telefônica e Acesso da Defesa - 2 Lei 11.596/2007: Prescrição e Acórdão Condenatório Prescrição Intercorrente e Crime Militar Recurso sem Efeito Suspensivo e Execução Provisória Trancamento de Ação Penal e Norma Penal em Branco Direito de Recorrer em Liberdade Prisão Preventiva e HC de Ofício Furto Qualificado e Hibridismo Penal Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas - 1 Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas - 2 Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas - 3 2ª Turma Prisão Preventiva: HC de Ofício e Operação Navalha Citação por Edital e Direito de Defesa - 1 Citação por Edital e Direito de Defesa - 2 Transcrições Ação Direta - Bloco de Constitucionalidade - Parâmetro de Confronto - Alteração Substancial Superveniente - Impugnação Genérica - Inadmissibilidade (ADI 514/PI) Substância Entorpecente - Porte - Crime Militar - Aplicabilidade da Norma Penal mais Benéfica (HC 94085 MC/SP) PLENÁRIO Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 1 O Tribunal iniciou julgamento de questão de ordem em recurso extraordinário na qual se discute a pertinência da própria distribuição desse recurso, em face do regime da repercussão geral dos recursos extraordinários. Trata-se, na espécie, de recurso interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que autorizara a expedição de precatório complementar para a cobrança de juros de mora no período compreendido entre a data da conta de liquidação e a da extração do requisitório. A recorrente alega presente o pressuposto da repercussão geral em decisão do Pleno no RE 298616/SP (DJU de 3.10.2003), que teria afastado a possibilidade de expedição de precatório complementar para a cobrança de juros moratórios, tendo em conta a atualização dos valores devidos em 1º de julho e o prazo constitucional de pagamento até o final do exercício seguinte, período em que inexistiria mora. RE 579431 QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 13.3.2008. (RE-579431) Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 2 A Min. Ellen Gracie, relatora, propôs solução para a questão de ordem no sentido de que o recurso extraordinário, por envolver matéria em que constatada a repercussão geral, tenha a sua distribuição denegada, bem como todos os demais que versem essa mesma matéria, com devolução dos autos à origem, para adoção de novo procedimento legal. Salientou, inicialmente, que a presente questão de ordem diria respeito aos procedimentos da implantação do regime da repercussão geral aos recursos extraordinários, relativamente às matérias que não precisariam ser levadas ao julgamento de mérito pelo Pleno, em virtude de já terem sido por ele decididas, com formação da jurisprudência da Corte. Asseverou que, no caso, a matéria já teria sido enfrentada pelo Pleno, no mencionado precedente, na linha contrária à do acórdão recorrido. Afirmou que o art. 543-A, § 3º, do Código de Processo Civil tornaria presumida a existência da repercussão geral quando o recurso extraordinário impugnasse decisão contrária à jurisprudência dominante no Plenário do Supremo (CPC: “Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo. ... § 3 o Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal.”). RE 579431 QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 13.3.2008. (RE-579431) Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 3 Reconheceu, todavia, que a lei não estabeleceu o procedimento a ser adotado tanto pelo Supremo quanto pelos Tribunais e Turmas Recursais de origem nesses casos, nem quando a decisão impugnada estivesse em consonância com a jurisprudência da Corte. Tendo isso em conta, concluiu ser necessário extrair do texto legal solução que valorizasse o regime jurídico, a efetividade, a objetividade e a finalidade do novo instituto, para assegurar prestígio à jurisprudência já consolidada, e evitar novo julgamento de cada uma das questões constitucionais já pacificadas pelo Pleno. Aduziu que a lei não afastou o regime da repercussão geral para tais situações, tendo presumido a presença do pressuposto de admissibilidade quando existente jurisprudência dominante, razão pela qual o instituto não se aplicaria somente às questões constitucionais ainda não julgadas pelo Plenário. Salientou que, assim como se dá nos casos que são levados ao Plenário Virtual, seria importante declinar, de forma expressa, os assuntos submetidos aos efeitos ora analisados. Afirmou que a existência ou não de repercussão geral seria decorrência direta da relevância social, política, jurídica ou econômica da questão constitucional suscitada no apelo extremo, que não poderia ser afastada pelo fato de já ter sido o assunto enfrentado em sucessivos julgados anteriores da Corte, fosse a decisão de origem contrária ao entendimento do Supremo ou consentânea com ele, haja vista que a existência de julgados em outros processos, indicando se tratar de matéria que ultrapassa os interesses subjetivos da causa, afirmaria a repercussão geral. Por isso, os recursos extraordinários contrários à jurisprudência da Corte não mereceriam seguimento, não por ausência de repercussão geral, mas por contrariarem a jurisprudência, caracterizando-se como manifestamente improcedentes (CPC, art. 557). RE 579431 QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 13.3.2008. (RE-579431) Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 4 Assim, reconhecida a incidência dos efeitos da repercussão geral, com associação aos precedentes do Plenário ou súmula, os Tribunais poderiam adotar o procedimento previsto no § 3º do art. 543-B, do CPC, negando admissibilidade aos recursos extraordinários e aos correspondentes agravos de instrumentos, em face da carência do pressuposto do interesse recursal. Da mesma forma, para as situações em que o acórdão recorrido fosse contrário ao entendimento consolidado no Plenário, os efeitos da repercussão geral deveriam ser estendidos. Enfatizou que a presunção do pressuposto da admissibilidade em casos assim (CPC, art. 543-A, § 3º) e a possibilidade de julgamentos monocráticos dos correspondentes recursos extraordinários e agravos de instrumento não subtrairiam do instituto da repercussão geral a totalidade dos seus efeitos, notadamente a possibilidade de retratação, pelos Tribunais e Turmas Recursais de origem, das decisões que fossem contrárias ao entendimento consolidado no STF. Esclareceu-se que, enquanto o STF não afirmasse, expressamente, a incidência dos efeitos da repercussão geral nessas hipóteses, as Presidências ou Vice-Presidências daquelas Cortes não se considerariam autorizadas a devolver os autos para efeitos de retratação pelos órgãos fracionários que houvessem proferido decisões contrárias ao entendimento aqui fixado. Para os assuntos já julgados sucessivamente pelo Plenário, a solução, no que diz respeito à repercussão geral, deveria ser a mesma. RE 579431 QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 13.3.2008. (RE-579431) Procedimento de Implantação do Regime de Repercussão Geral - 5 Em suma, entendeu adequado que para as questões constitucionais já decididas pelo Plenário fossem atribuídos os efeitos da repercussão geral reconhecida, devendo os recursos extraordinários, com tema correspondente que vierem ao STF, ser devolvidos à origem, para os procedimentos aqui autorizados, como já acontece com aqueles cujos temas são levados ao Plenário Virtual. Propôs, também, que matérias já enfrentadas pelo Pleno fossem trazidas pela Presidência, antes da distribuição, em questão de ordem, para que se afirmasse de forma objetiva, e para cada uma, a aplicabilidade da repercussão geral, sempre que presente a relevância sob os aspectos legais. Em divergência, o Min. Marco Aurélio entendeu que o recurso extraordinário deveria ser distribuído. Considerou que não se poderia interpretar o § 3º do art. 543-A do CPC para nele ver incluída uma norma que revelasse que acórdãos da Corte anteriores à regulamentação da repercussão geral tivessem eficácia da repercussão geral. Aduziu que, nesses casos, em que já houvesse jurisprudência pacificada, o processo deveria ser trazido para julgamento para surgir no mundo jurídico, pela vez primeira, um pronunciamento do Tribunal sob o ângulo formal do instituto e, somente então, as Cortes de origem terem a possibilidade, diante desse novo crivo, já sob a regência do instituto, das conseqüências próprias, que são do instituto, ante a eficácia vinculante. Após, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista da Min. Cármen Lúcia. RE 579431 QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 13.3.2008. (RE-579431) Contrato Temporário e Competência da Justiça Comum O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em reclamação proposta pelo Estado do Amazonas em face de decisão proferida pelo Juízo da 14ª Vara do Trabalho de Manaus, que antecipara os efeitos da tutela requerida nos autos de ação civil pública, bem como do processamento desta, na qual o Ministério Público do Trabalho e o Ministério Público do Estado do Amazonas pedem a nulidade de todos os contratos temporários celebrados pelo requerente na área de saúde. Entendeu-se que a decisão impugnada violou a autoridade da decisão proferida pelo Supremo na ADI 3395 MC/DF (DJU de 10.11.2006), que suspendeu toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da CF, na redação da EC 45/2004, que inclua na competência da Justiça do Trabalho a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, tendo por base vínculo de ordem estatutária ou jurídicoadministrativa. O Min. Carlos Britto, relator, asseverou ser suficiente, no caso, o fato de haver lei estadual (Lei 2.607/2000), remetendo ao Estatuto dos Funcionários Públicos. Vencido o Min. Marco Aurélio que julgava improcedente o pedido por considerar que, se a ação civil pública ajuizada o foi a partir da existência do vínculo empregatício, somente a Justiça do Trabalho poderia assentar configurado ou não esse mesmo vínculo empregatício. Rcl 5381/AM, rel. Min. Carlos Britto, 17.3.2008. (Rcl-5381) Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 1 O Tribunal iniciou julgamento de embargos de declaração opostos de decisão proferida em ação direta em que se discute o cabimento desse recurso para a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Na espécie, o Tribunal declarara a inconstitucionalidade da expressão “bem como os não-remunerados”, contida na parte final do § 1º do art. 34 da Lei 12.398/98, introduzida, por emenda parlamentar, pela Lei 12.607/99, ambas do Estado do Paraná, que incluiu os serventuários de justiça nãoremunerados pelo erário no regime próprio de previdência dos servidores públicos estaduais de cargo efetivo — v. Informativo 436. O embargante alega omissão quanto à explicitação dos efeitos da declaração da inconstitucionalidade, e, salientando o prazo de vigência da referida norma, pugna pelos efeitos ex nunc da decisão. ADI 2791 ED/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.3.2008. (ADI-2791) Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 2 O Min. Gilmar Mendes, relator, conheceu dos embargos e a eles deu provimento para esclarecer que a declaração de inconstitucionalidade não afeta os casos de benefícios previdenciários, aposentadorias e pensões já assegurados, assim como nas hipóteses em que o serventuário já preencheu todos os requisitos legais para a obtenção desses benefícios até a data da publicação da decisão de declaração de inconstitucionalidade, ocorrida em 23.8.2006. Entendeu que, nas hipóteses em que se reconhecesse que a declaração de inconstitucionalidade com efeitos limitados ou restritos seria uma imposição da própria Constituição, não se atribuiria valor definitivo a uma eventual omissão por parte do Tribunal. Assim, seria possível, em tese, identificar a omissão no âmbito dos embargos de declaração para os fins de explicitar a necessária limitação de efeitos da decisão de inconstitucionalidade. Afirmou que uma limitação de efeitos decorreria de algum princípio constitucional imanente, sobretudo da idéia de segurança jurídica. ADI 2791 ED/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.3.2008. (ADI-2791) Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 3 O relator aduziu que, como regra geral, as decisões proferidas em sede de ação direta possuem efeitos ex tunc, sendo nulo o ato impugnado desde a sua origem, mas, excepcionalmente, poderão ter eficácia ex nunc quando, por razões de segurança jurídica ou de relevante interesse social, mostrar-se oportuno que seja fixado outro momento de eficácia, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99. Considerando que, no caso, o sistema de seguridade funcional do Estado do Paraná foi instituído pela Lei estadual 12.398/98, que estava em vigor há mais de 8 anos, e que, nesse ínterim, situações jurídicas foram consolidadas, reputou evidente que o princípio da segurança jurídica teria um peso incontestável, capaz de afetar o próprio princípio da nulidade absoluta da lei inconstitucional. Frisou, no ponto, que restara demonstrado nos autos que mais de 90 serventuários da justiça não remunerados pelos cofres públicos que, durante a vigência da mencionada lei, se aposentaram ou geraram pensões, terão ou já teriam tido, com a decisão da Corte, suas aposentadorias simplesmente canceladas, devendo retornar à atividade ou procurar outro tipo de recurso. ADI 2791 ED/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.3.2008. (ADI-2791) Embargos de Declaração e Modulação dos Efeitos em ADI - 4 Em divergência, o Min. Menezes Direito conheceu dos embargos de declaração, porque tempestivos, mas os rejeitou, com base em precedentes da Corte, por não identificar omissão, visto que não se indicara, de forma expressa, na inicial da ação, a existência de pedido para a modulação de efeitos. Após os votos dos Ministros Ministros Carlos Britto, Cezar Peluso e Ellen Gracie, Presidente, que acompanhavam o voto do relator, para conhecer do recurso e provê-lo, e dos votos dos Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que acompanhavam a divergência, conhecendo do recurso, mas rejeitando-o, por não vislumbrar omissão, o julgamento foi suspenso para colher os votos dos Ministros Joaquim Barbosa, licenciado, e Celso de Mello e Eros Grau, ausentes justificadamente. ADI 2791 ED/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.3.2008. (ADI-2791) “Amicus Curiae”: Processo Objetivo de Controle de Constitucionalidade e Interesse Recursal Não são cabíveis os recursos interpostos por terceiros estranhos à relação processual nos processos objetivos de controle de constitucionalidade, nesses incluídos os que ingressam no feito na qualidade de amicus curiae. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, não conheceu de embargos de declaração opostos contra acórdão proferido em ação direta de inconstitucionalidade, em que se apontava contradição entre parte dos fundamentos e a atribuição, sem ressalva, do efeito ex nunc à declaração de inconstitucionalidade da norma impugnada. Vencidos os Ministros Carlos Britto e Gilmar Mendes que conheciam dos embargos de declaração, reputando presente o interesse recursal, ante o fato de ter havido sustentação oral do embargante. ADI 3615 ED/ PB, rel. Min. Cármen Lúcia, 17.3.2008. (ADI-3615) Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 1 A Presidência do Supremo pode suspender liminares concedidas contra o Poder Público em ações propostas perante tribunais superiores, com base no art. 4º da Lei 4.348/64, se a causa tiver fundamento constitucional. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, desproveu agravo regimental interposto pela Associação dos Servidores da Justiça Militar - ASSEJUMI contra decisão que determinara a suspensão dos efeitos do despacho do Ministro-Presidente do Superior Tribunal Militar - STM, que ordenara a aplicação do limite estipulado como teto salarial a vencimentos, proventos e pensões dos associados da agravante. SS 2504 AgR/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 17.3.2008. (SS-2504) Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 2 Inicialmente, ressaltou-se a competência do Supremo para examinar o pedido de suspensão, haja vista que a controvérsia instaurada na ação principal evidenciaria a existência de matéria constitucional, qual seja, a alegação de inconstitucionalidade da EC 41/2003. Afastou-se, em seguida, a apontada incompetência do Supremo para analisar pedidos de suspensão de decisões proferidas pelos tribunais superiores. No ponto, aduziu-se que, apesar de a Lei 8.038/90 não ter tratado das liminares de decisões concessivas de mandado de segurança perante esses tribunais, a Lei 4.348/64, com as alterações introduzidas pela Medida Provisória 2.180-35/2001, autorizou a pessoa jurídica de direito público a requerer a suspensão da execução de liminares e decisões em mandado de segurança contra o Poder Público. Frisou-se que o art. 4º da Lei 4.348/64 outorgou competência para suspender a execução de liminar ou decisão concessiva de segurança ao presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, norma esta que supriu a omissão da Lei 8.038/90 em relação aos tribunais superiores. SS 2504 AgR/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 17.3.2008. (SS-2504) Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 3 Reportando-se ao que decidido no julgamento da Rcl 543/RJ (DJU de 29.9.95), na qual o relator esclarecera que a determinação da competência do Supremo se dá em razão da existência, ou não, de temas de índole constitucional na causa principal, a ensejar a futura interposição de recurso extraordinário, concluiu-se que, se na causa principal tiver sido suscitada questão constitucional, em tese, haverá possibilidade de futura interposição de recurso extraordinário a esta Corte. No ponto, salientou-se que, no caso concreto, da decisão a ser proferida no mandado de segurança caberá, em tese, recurso extraordinário para Supremo. Afirmou-se, ainda, que a Presidência desta Corte pode suspender a eficácia de liminares concedidas no âmbito dos tribunais, independentemente de interposição de agravo contra tais liminares. SS 2504 AgR/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 17.3.2008. (SS-2504) Suspensão de Segurança e Decisão do Superior Tribunal Militar - 4 No que se refere ao mérito, entendeu-se que a decisão agravada deveria ser mantida por seus próprios fundamentos, já que a agravante não infirmara, nem elidira os fundamentos adotados, porquanto a União, ora agravada, demonstrara, de forma inequívoca, a situação configuradora da grave lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem jurídico-constitucional, na medida em que a imediata execução da decisão impugnada, em princípio, obstaria a aplicação do disposto no art. 37, XI, da CF. Por fim, destacou-se que, no julgamento do MS 24.875/DF (DJU de 6.10.2006), a ordem fora deferida pelo Plenário apenas quanto ao acréscimo de 20% sobre os proventos da aposentadoria, previsto no art. 184, III, da Lei 1.711/52, combinado com o art. 250 da Lei 8.112/90, até que o seu montante fosse absorvido pelo subsídio fixado em lei para o cargo de Ministro deste Tribunal, o que não seria a hipótese do presente caso. Vencido o Min. Marco Aurélio que provia o recurso, no que se articulava que a decisão do relator seria atacável por agravo regimental, e de que não teria sido observado o contraditório. E, quanto à matéria de fundo, entendia que se haveria de aguardar a possível interposição de recurso extraordinário contra a decisão definitiva do STM. SS 2504 AgR/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 17.3.2008. (SS-2504) ADI e Atos Secundários O Tribunal não conheceu de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Partido Liberal contra o Provimento 758/2001, do Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, que autoriza o juiz de direito, responsável pelas atividades do Juizado a tomar conhecimento dos termos circunstanciados elaborados pelos policiais militares, desde que assinados concomitantemente por oficial da Polícia Militar, e da Resolução SSP 403/2001, prorrogada pela Resolução 517/2002, ambas do Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, que estabelece que, nas áreas que elenca, o termo circunstanciado de que trata o art. 69, da Lei 9.099/95, será elaborado pelo policial civil ou militar que primeiro tomar conhecimento da ocorrência, e exige que os termos circunstanciados feitos pela Polícia Militar sejam assinados também por oficial da Corporação. Entendeu-se que os atos normativos impugnados seriam atos secundários que se prestariam a interpretar norma contida no art. 69 da Lei 9.099/95. ADI 2862/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 26.3.2008. (ADI-2862) Reclamação e Seqüestro de Rendas Públicas O Tribunal iniciou julgamento de reclamação ajuizada pelo Município de Santo André contra decisão proferida pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que deferira pedido de seqüestro de rendas públicas, tendo em conta o fato de ter sido ultrapassado o vencimento para pagamento total do décimo do débito, de acordo com o disposto no art. 78, § 4º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT. O Min. Ricardo Lewandowski, relator, conheceu em parte da reclamação, no que se refere à alegada violação ao que decidido pelo Supremo no julgamento da ADI 1662/SP (DJU de 19.9.2003), e, nessa parte, julgou improcedente a ação. Considerou o que decidido pelo Plenário na Rcl 3293 AgR/SP (DJU de 13.4.2007), e em outros precedentes, no sentido de não ter havido, no julgamento da aludida ação direta, emissão de entendimento quanto à legitimidade do § 4º do art. 78 do ADCT, ficando, dessa forma, afastada a adequação de medida reclamatória formalizada a pretexto de se ter respeitada a autoridade do acórdão prolatado. Ademais, salientou-se, no ponto, que a inserção do art. 78 do ADCT (14.9.2000) seria posterior ao ajuizamento da ADI 1662/SP (28.8.97). Quanto à assertiva de usurpação de competência do Supremo, em razão de o Presidente do Tribunal de Justiça ter deferido pedido de seqüestro enquanto em trâmite, aqui, agravo de instrumento interposto de decisão que negara seguimento a recurso extraordinário, asseverou que, em que pese a discussão travada naqueles autos tratar do valor devido a título de complementação de décimos, tal recurso seria destituído de efeito suspensivo, o que viabilizaria, desde já, a execução da decisão impugnada. Após, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau. Rcl 3084/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 27.3.2008. (Rcl-3084) PRIMEIRA TURMA Interceptação Telefônica e Acesso da Defesa - 1 A Turma deferiu habeas corpus para assegurar que a defesa tenha amplo acesso às peças de inquérito instaurado contra indiciados pela suposta prática dos delitos tipificados no art. 4º da Lei 8.137/90, no art. 1º da Lei 8.176/91 e no art. 288 do CP, cujos advogados constituídos não puderam consultar e extrair cópias do conteúdo escrito e gravado dos procedimentos resultantes de escutas telefônicas implementadas no curso da investigação. No caso, o inquérito policial apura a existência de cartel no mercado varejista de gasolina em determinada capital. Ocorre que o juízo de origem decretara a prisão temporária dos pacientes e a defesa não tivera acesso ao conteúdo dos apensos desse inquérito e do procedimento cautelar apuratório no qual autorizadas as interceptações telefônicas. Apresentado requerimento ao magistrado com o pleito de vista e de extração de cópias da investigação, na integralidade, o juízo excluíra o acesso aos áudios decorrentes das interceptações (com as correspondentes degravações) e às diligências ainda em curso. Contra essa decisão, fora impetrado habeas corpus no tribunal de justiça local, que concedera medida acauteladora tão-só em relação à tomada de depoimento dos pacientes e o indeferira no mérito, ensejando, então, idêntica medida no STJ. HC 92331/PB, rel. Min. Marco Aurélio, 18.3.2008. (HC-92331) Interceptação Telefônica e Acesso da Defesa - 2 Inicialmente, considerou-se superado o óbice do Enunciado 691 da Súmula do STF, haja vista o posterior julgamento formalizado pelo STJ, manifestando-se os impetrantes pela ausência de prejuízo no que deferida parcialmente a ordem. Em seguida, ressaltou-se que a preservação da privacidade seria a razão da cláusula final do art. 8º da Lei 9.296/96 (“A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas.”) e que o sigilo das diligências mostrar-se-ia a tônica das investigações policiais, contudo até o estágio em que já apurados os fatos, quando colacionados dados que viabilizassem o interrogatório dos envolvidos. Ademais, entendeu-se que impedir o acesso do profissional da advocacia aos autos contrastaria com o direito à assistência técnica assegurado ao acusado. Nesse sentido, asseverou-se que o sigilo próprio aos dados da interceptação telefônica estaria direcionado a proteger e não a gerar quadro em que alguém se visse envolvido, devendo comparecer à delegacia policial, sem que se lhe fosse proporcionado, e ao advogado, conhecer as razões respectivas. Concluiu-se que o sigilo pode estar ligado a investigações em andamento, mas, a partir do momento em que existe interrogatório dos envolvidos, indispensável o acesso, à defesa, ao que se contém no próprio inquérito. Fora isso, seria impossibilitar a atuação da defesa, em violação ao devido processo legal. Precedente citado: HC 90232/AM (DJU de 2.3.2007). HC 92331/PB, rel. Min. Marco Aurélio, 18.3.2008. (HC-92331) Lei 11.596/2007: Prescrição e Acórdão Condenatório A Lei 11.596/2007, ao alterar a redação do inciso IV do art. 117 do CP (“Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se: ... IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;”), apenas confirmara pacífico posicionamento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que o acórdão condenatório reveste-se de eficácia interruptiva da prescrição penal. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que pleiteada a declaração de extinção da punibilidade do paciente que, inicialmente condenado por abuso de autoridade (Lei 4.898/65, art. 4º, a), tivera sua sentença reformada, pelo tribunal de justiça local, para a prática do crime de extorsão, sendo este acórdão anulado pelo STJ no tocante à causa especial de aumento de pena. Inicialmente, aduziu-se ser juridicamente relevante a existência de dois lapsos temporais, a saber: a) entre a data do recebimento da denúncia e a sentença condenatória e b) entre esta última e o acórdão que reformara em definitivo a condenação, já que o acórdão que modifica substancialmente decisão monocrática representa novo julgamento e assume, assim, caráter de marco interruptivo da prescrição. Tendo em conta a pena máxima cominada em abstrato para o delito de extorsão simples ou a sanção concretamente aplicada, constatou-se que, no caso, a prescrição não se materializara. O Min. Marco Aurélio ressaltou em seu voto que a mencionada Lei 11.596/2007 inserira mais um fator de interrupção, pouco importando a existência de sentença condenatória anterior, sendo bastante que o acórdão, ao confirmar essa sentença, também, por isso mesmo, mostre-se condenatório. HC 92340/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 18.3.2008. (HC-92340) Prescrição Intercorrente e Crime Militar Por reconhecer a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de militar condenado pelo crime de lesão corporal culposa (CPM, art. 210, c/c o art. 70, II, l). Ressaltou-se que, na espécie, somente a defesa recorrera da sentença condenatória (2 meses e 12 dias de detenção) e que, já definida a pena máxima em concreto, o prazo prescricional ocorreria em 2 anos.Tendo isso em conta, entendeu-se que o simples julgamento da apelação no STM não interromperia o curso do lapso prescricional, o que ocorreria somente com a instauração do processo e com a sentença penal condenatória, hipóteses essas taxativamente previstas no CPM (art. 125, § 5º, I e II). Assim, ter-se-ia por marco inicial a publicação da sentença e, por final, o trânsito em julgado da apelação, para ambas as partes. HC 92574/CE, rel. Min. Carlos Britto, 18.3.2008. (HC-92574) Recurso sem Efeito Suspensivo e Execução Provisória A Turma deliberou afetar ao Plenário julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que envolvido o tema da execução provisória de sentença penal condenatória, quando ainda pendente recurso especial. Trata-se, na espécie, de recurso impetrado contra acórdão do STJ que reputara legítima a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da respectiva condenação, uma vez que os recursos de natureza extraordinária não possuem efeito suspensivo. RHC 93172/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 18.3.2008. (RHC-93172) Trancamento de Ação Penal e Norma Penal em Branco Constitui ilegalidade reparável pela via do habeas corpus fazer com que alguém responda pelo exercício ilegal de uma profissão que ainda não foi regulamentada. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu, em parte, habeas corpus para determinar, quanto à acusação de exercício ilegal da profissão de árbitro ou mediador (Lei de Contravenções Penais, art. 47), o trancamento de ação penal instaurada contra acusada também pela suposta prática dos delitos de formação de quadrilha, falsidade ideológica e usurpação de função pública (CP, artigos 288, 299 e 328, parágrafo único, respectivamente). Considerou-se que, ausente regulamentação legal das condições jurídicas necessárias ao desempenho da função de árbitro, ou mediador, não seria possível dar-se por caracterizada, nem mesmo em tese, a conduta descrita no art. 47 da LCP (“Art. 47. Exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício:”). Enfatizou-se que os requisitos referidos na figura típica devem estar regulamentados por lei, sem os quais restaria inviabilizado, no caso, o manejo da ação penal com base no art. 47 da LCP que, por se tratar de norma penal em branco, depende da indicação de lei que estabeleça as condições para o exercício de determinada atividade. Entendeu-se que, quanto aos demais crimes, a denúncia apresentaria os elementos mínimos necessários ao prosseguimento da persecução penal. HC 92183/PE, rel. Min. Carlos Britto, 18.3.2008. (HC-92183) Direito de Recorrer em Liberdade A Turma deliberou afetar ao Plenário julgamento de recurso ordinário em habeas corpus no qual se questiona a constitucionalidade do art. 594 do CPP, que condiciona a admissibilidade do recurso de apelação ao recolhimento do réu à prisão. No caso, o recorrente fora condenado pela prática dos crimes de tráfico de drogas, de associação para o tráfico (Lei 6.368/76, artigos 12 e 14) e de porte ilegal de armas (Lei 9.437/97, art. 10, § 2º), sendo-lhe negado, ante a necessidade de preservação da ordem pública, o direito de apelar em liberdade, decisão essa mantida nas demais instâncias. RHC 93123/RJ, rel. Min. Cármen Lúcia, 18.3.2008. (RHC-93123) Prisão Preventiva e HC de Ofício A Turma julgou prejudicado habeas corpus em que acusado pela suposta prática do delito de tentativa de lavagem de dinheiro sustentava a ausência de fundamentação do decreto prisional. No caso, o paciente fora preso preventivamente em decorrência de desmembramento da denominada “Operação Furacão”, instaurada para apurar o cometimento de crimes provenientes de jogo ilegal. Contra esse decreto prisional, a defesa impetrara habeas corpus sucessivos, sendo objeto da presente impugnação decisão denegatória de liminar formulada em idêntica medida perante o STJ. Tendo em conta que a concessão, pelo Min. Marco Aurélio, de medida acauteladora no writ, ensejara posteriormente a extinção dos habeas corpus impetrados respectivamente no TRF da 2ª Região e no STJ, entendeu-se que não existiria mais a liminar questionada, nem caberia o exame da incidência ou não da Súmula 691 do STF, haja vista a perda de objeto, ganhando a presente impetração autonomia. Entretanto, ressaltando-se a excepcionalidade do quadro, concedeu-se a ordem, de ofício, para afastar do cenário jurídico o decreto de prisão preventiva. Considerou-se que, no caso, o juízo de origem repetira as mesmas premissas constantes de decretos expedidos contra os co-réus, fazendo referência a crimes diversos não versados no processo em que implementada a custódia preventiva do paciente. Dessa forma, asseverou-se a falta de compatibilidade entre o decreto prisional e a denúncia, que versa unicamente sobre o crime de tentativa de lavagem de dinheiro. Enfatizou-se que o magistrado supusera, ante o que apontado como sofisticada organização criminosa, que o paciente voltaria a cometer crimes, inclusive cooptando servidores e agentes públicos. Aplicou-se a jurisprudência reiterada do STF no sentido de não se poder calcar ato de constrição à liberdade de ir e vir em conjecturas, mostrando-se essencial a menção a elemento concreto a revelar a periculosidade, o que não ocorrera na espécie. Assim, reputou-se necessária a demonstração de ato concreto a viabilizar, nos moldes do art. 312 do CPP, a preventiva, não se podendo levar em consideração a capacidade intuitiva do órgão julgador. HC 92487/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 25.3.2008. (HC-92487) Furto Qualificado e Hibridismo Penal A Turma indeferiu habeas corpus em que condenado pela prática de furto qualificado pelo concurso de agentes (CP, art. 155, § 4º, III) pleiteava a manutenção da decisão proferida pelo tribunal de origem que, ao aplicar à pena de furto simples a majorante prevista para o crime de roubo (CP, art. 157, § 2º), reduzira a sanção imposta. Inicialmente, salientou-se que a analogia in bonam parte realizada pelo tribunal de justiça estadual — que aumentara a pena-base do furto em um terço e não no dobro, como determina a lei —, ainda que com fundamento nos princípios constitucionais da proporcionalidade e da isonomia, não se mostrara de boa técnica. Esclareceu-se que o legislador estabelecera diferença entre a qualificadora existente no furto e a causa de aumento de pena disposta na hipótese de roubo. Asseverouse que, do ponto de vista técnico, não se poderia afirmar que o legislador aumentara a pena do furto no caso de concurso de agentes, mas que, na verdade, ter-se-ia novo tipo penal, cujo elemento definidor seria o concurso. Ademais, considerou-se errônea a assertiva de que o legislador, na espécie, não teria atentado para a necessária proporcionalidade entre o crime e a pena, pois ao criar novo tipo penal, com a correspondente sanção, certamente levara em conta critérios de valoração, em matéria de política criminal, que não se reduziriam a mera equivalência aritmética. Assim, entendeu-se que, em se tratando de furto qualificado, não haveria exasperação circunstancial a partir de um tipo penal básico, como ocorre no roubo, porém uma figura típica diversa para a qual cominada sanção autônoma, não se podendo concluir, dessa forma, que o aumento da pena em dobro (CP, art. 155, § 4º) violaria aos mencionados princípios constitucionais da proporcionalidade e da isonomia. HC 92626/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 25.3.2008. (HC-92626) Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas - 1 A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que denegara liberdade provisória a denunciado pela suposta prática do crime de tráfico ilícito de drogas (Lei 11.343/2006, art. 33, caput) que, preso em flagrante em 10.2.2007, alegava excesso de prazo e falta de óbices à concessão do referido benefício. Preliminarmente, tendo em conta a jurisprudência do STF no sentido de que, com a superveniência da sentença condenatória, que constitui novo título da prisão, encontra-se superada a questão relativa ao antecedente excesso de prazo da custódia, não se conheceu do writ, no ponto. Contudo, entendeu-se que, nas circunstâncias do caso, não restaria prejudicado o exame do pedido de concessão de liberdade provisória, uma vez que a solução quanto ao seu cabimento teria influência direta na discussão relativa à possibilidade de o paciente apelar em liberdade. Assim, salientouse que, se correta a tese sustentada pela defesa de que deveria ter sido concedida a liberdade provisória desde o início do processo, o paciente, ao tempo da sentença, estaria em liberdade e, portanto, poderia, em princípio, suscitar a aplicação do art. 59 da Lei 11.343/2006 (“Nos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória.”). HC 93302/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2008. (HC-93302) Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas - 2 No mérito, aduziu-se que, para a Constituição, a prisão em flagrante seria espécie de prisão processual, ficando, de regra, reservada à legislação ordinária definir se admite, ou não, a liberdade provisória, podendo tal benesse ser negada de duas formas: a) expressamente ou b) dispondo que o delito é inafiançável. Se admitida, a liberdade provisória pode dar-se com ou sem o pagamento de fiança. Nesse sentido, os incisos LXVI, (“ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com o sem fiança;”), XLII (“a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”) e XLIII (“a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos...”), todos do art. 5º, da CF. No tocante a esse último dispositivo, asseverou-se que esse inciso possuía eficácia limitada até a superveniência da Lei 8.072/90 (art. 2º, II), que proibiu a concessão de fiança e liberdade provisória aos crimes hediondos e equiparados. No ponto, esclareceu-se que, para o deslinde da presente questão, dever-se-ia analisar se a Lei 11.464/2007, ao alterar o referido art. 2º, II, da Lei 8.072/90, excluindo a expressão “e liberdade provisória”, teria possibilitado a concessão desta aos presos em flagrante pela prática de tortura, tráfico de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e delitos definidos como hediondos. HC 93302/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2008. (HC-93302) Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas - 3 Considerou-se que a inafiançabilidade imposta ao delito imputado ao paciente bastaria para impedir a concessão de liberdade provisória, sendo irrelevante a alteração efetuada pela Lei 11.464/2007 que, mantendo a vedação de fiança, somente retirara uma redundância contida no texto originário do art. 2º, II, da Lei 8.072/90. Ressaltou-se que esta Corte possui orientação consolidada no sentido de que a proibição de liberdade provisória nos processos por crimes hediondos e assemelhados decorre da própria inafiançabilidade imposta pela Constituição à legislação ordinária. Dessa forma, por maiores razões, incabível esse benefício aos presos em flagrante por tráfico de drogas. Ademais, enfatizou-se que a Lei 11.464/2007 não alcançaria os dispositivos legais que cuidam do delito de tráfico de drogas que, ao tempo da sua entrada em vigor, já contava com disciplina específica a respeito (Lei 11.343/2006: “Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico.”). Assim, reputou-se que a Lei 11.464/2007 não poderia modificar a disciplina que, quando do seu advento, já constava de lei especial, aplicável à espécie. Por fim, rejeitou-se a proposta de concessão de habeas corpus de ofício para que o paciente progredisse de regime prisional, porquanto ainda pendente de apreciação recurso da acusação que, se provido, majoraria a pena a período superior ao tempo em que custodiado o paciente. Atentou-se para o fato de que este fora preso em flagrante quando vigente a Lei 11.343/2006, que passou a exigir, na hipótese, o cumprimento de, pelo menos, 2/5 da pena para a progressão. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio que concedia a ordem, de ofício, para que o juízo de primeiro grau analisasse as condições, visando à progressão de regime de cumprimento da pena. HC 93302/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 25.3.2008. (HC-93302) SEGUNDA TURMA Prisão Preventiva: HC de Ofício e Operação Navalha A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de investigado, preso preventivamente na denominada “Operação Navalha”, por suposto envolvimento em organização criminosa constituída com a finalidade de desviar recursos públicos federais e estaduais destinados à execução de obras públicas, mediante fraudes em contratos licitatórios. No caso, a custódia embasava-se na conveniência da instrução criminal e na garantia da ordem pública e econômica. Reiterando os fundamentos expedidos no julgamento do HC 91386/BA (j. em 19.2.2007, v. Informativo 495), considerou-se patente a situação de constrangimento ilegal. Reputou-se insubsistente o decreto de custódia preventiva do paciente, porquanto ausente a indicação de fatos concretos a subsidiá-la. Salientando que, no sistema constitucional pátrio, o âmbito de proteção de direitos e garantias fundamentais recebe contornos de especial relevância, entendeu-se decisivo o fato de a prisão preventiva dos demais investigados ter sido revogada após a inquirição dos envolvidos. Por isso, afirmou-se que não faria sentido a manutenção da segregação do paciente para a mera obtenção de depoimento, aduzindo-se que a prisão é medida excepcional e não pode ser utilizada como meio generalizado de limitação das liberdades dos cidadãos. De ofício, estendeu-se a ordem, para o mesmo efeito, em favor de todos os pacientes que figuram como indiciados no Inquérito 544, em trâmite no Superior Tribunal de Justiça. HC 92599/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 18.3.2008. (HC-92599) Citação por Edital e Direito de Defesa - 1 Ante a verificação da falta de regular citação pessoal do paciente, a Turma deferiu habeas corpus para anular o processo a partir da citação editalícia levada a efeito pelo Juízo do 2º Tribunal do Júri da Capital de São Paulo. No caso, o paciente fora denunciado, com terceiro, pela suposta prática dos delitos de tentativa de homicídio simples (CP, art. 121, caput, c/c o art. 14, II) e homicídio simples (CP, art. 121, caput). Contudo, o juiz do tribunal do júri, convencido da ausência de elementos que indicassem o cometimento de crimes dolosos contra a vida, determinara a desclassificação dos delitos imputados, com a remessa dos autos ao juízo singular, que o condenara por latrocínio consumado (CP, art. 157, § 3º, 2ª parte) e por latrocínio tentado (CP, art. 157, § 3º, 2ª parte, c/c o art. 14, II). Ocorre que no curso do feito perante o tribunal do júri, em face da não localização do paciente, expedira-se mandado de prisão e a citação se realizara por edital. Diante do não-comparecimento para o interrogatório, o processo prosseguira à revelia do paciente. Não apresentada a defesa prévia, o juízo nomeara defensora ad hoc para representá-lo durante a oitiva das testemunhas arroladas pela acusação. HC 88548/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 18.3.2008. (HC-88548) Citação por Edital e Direito de Defesa - 2 Tendo em conta que, na espécie, não foram esgotados todos os meios disponíveis para a localização do paciente, entendeu-se que a citação por edital não deveria ter sido realizada. Asseverou-se que tal falta não seria sanada pela simples nomeação de defensor dativo. Considerou-se, no ponto, que não se constatando a escorreita citação do acusado, com uso de todos os meios ao alcance do juízo para que fosse localizado, negara-se-lhe o direito ao interrogatório e, em acréscimo, fora-lhe retirada a prerrogativa de, livremente, escolher o advogado incumbido de sua defesa, elegendo, junto com este, as testemunhas que caberia arrolar e as demais provas que poderia produzir. Nesse sentido, enfatizou-se que o direito de defesa constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do princípio da dignidade da pessoa humana. Ordenou-se, por fim, a renovação do feito em todos os seus demais termos, devendo o paciente ser colocado em liberdade se, por outro motivo, não estiver preso. Precedentes citados: HC 70460/SP (DJU de 4.2.94); HC 74577/SP (DJU de 28.2.97); HC 81151/DF (DJU de 22.2.2002); HC 67755/SP (DJU de 11.9.92). HC 88548/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 18.3.2008. (HC-88548) Sessões Ordinárias Extraordinárias Pleno 26.3.2008 17 e 27.3.2008 1ª Turma 18 e 25.3.2008 —— 2ª Turma 18.3.2008 —— Julgamentos 520 65 155 TRANSCRIÇÕES Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica. Ação Direta - Bloco de Constitucionalidade - Parâmetro de Confronto - Alteração Substancial Superveniente Impugnação Genérica – Inadmissibilidade (Transcrições) ADI 514/PI* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: FISCALIZAÇÃO NORMATIVA ABSTRATA. REVOGAÇÃO TÁCITA DE UMA DAS NORMAS LEGAIS IMPUGNADAS E MODIFICAÇÃO SUBSTANCIAL DO PARÂMETRO DE CONTROLE INVOCADO EM RELAÇÃO AOS DEMAIS DIPLOMAS LEGISLATIVOS QUESTIONADOS. HIPÓTESES DE PREJUDICIALIDADE DA AÇÃO DIRETA, QUANDO SUPERVENIENTES AO SEU AJUIZAMENTO. A NOÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE/INCONSTITUCIONALIDADE COMO CONCEITO DE RELAÇÃO. A QUESTÃO PERTINENTE AO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE. POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS DIVERGENTES EM TORNO DO SEU CONTEÚDO. O SIGNIFICADO DO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE COMO FATOR DETERMINANTE DO CARÁTER CONSTITUCIONAL, OU NÃO, DOS ATOS ESTATAIS. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA DEDUZIDA EM SEDE DE CONTROLE ABSTRATO. INADMISSIBILIDADE. DEVER PROCESSUAL, QUE INCUMBE AO AUTOR DA AÇÃO DIRETA, DE FUNDAMENTAR, ADEQUADAMENTE, A PRETENSÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. SITUAÇÃO QUE LEGITIMA O NÃO-CONHECIMENTO DA AÇÃO DIRETA. PRECEDENTES. - A revogação superveniente do ato estatal impugnado, ainda que tácita, faz instaurar situação de prejudicialidade, que provoca a extinção anômala do processo de fiscalização abstrata de constitucionalidade. Precedentes. - Não se conhece da ação direta, sempre que a impugnação nela veiculada revelar-se destituída de fundamentação jurídica ou desprovida de motivação idônea e adequada. Em sede de fiscalização normativa abstrata, não se admite impugnação meramente genérica de inconstitucionalidade, tanto quanto não se permite que a alegação de contrariedade ao texto constitucional se apóie em argumentos superficiais ou em fundamentação insuficiente. Lei nº 9.868/99, art. 4º, “caput”. Precedentes. - A definição do significado de bloco de constitucionalidade - independentemente da abrangência material que se lhe reconheça (a Constituição escrita ou a ordem constitucional global) - reveste-se de fundamental importância no processo de fiscalização normativa abstrata, pois a exata qualificação conceitual dessa categoria jurídica projeta-se como fator determinante do caráter constitucional, ou não, dos atos estatais contestados em face da Carta Política. - A superveniente alteração/supressão das normas, valores e princípios que se subsumem à noção conceitual de bloco de constitucionalidade, por importar em descaracterização do parâmetro constitucional de confronto, faz instaurar, em sede de controle abstrato, situação configuradora de prejudicialidade da ação direta, legitimando, desse modo - ainda que mediante decisão monocrática do Relator da causa (RTJ 139/67) -, a extinção anômala do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade. Doutrina. Precedentes. DECISÃO: Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo Governador do Estado do Piauí, com o objetivo de impugnar a validade jurídico-constitucional dos arts. 2º, “caput” e inciso V, 5º, 62 e 158 da Lei Complementar nº 2/1990; dos arts. 4º, § 2º, e 58 da Lei Complementar nº 3/1990; dos arts. 12, 17, e 28 da Lei Complementar nº 4/1990, todas editadas por essa unidade da Federação. O eminente Procurador-Geral da República, em seu douto parecer (fls. 264/269), pronunciou-se pela extinção deste processo de controle normativo abstrato, fazendo-o em parecer que tem, no ponto, a seguinte fundamentação (fls. 267/269): “6. Preliminarmente, verifica-se a prejudicialidade da ação quanto à impugnação a) dos artigos 2º, ‘caput’; e 62, da Lei Complementar nº 02/1990; b) dos artigos 4º, § 2º e 58, da Lei Complementar nº 03/1990; e, finalmente, c) do artigo 17, da Lei Complementar nº 04/1990 – que foram substancialmente alterados pelas Leis Complementares Estaduais nº 09/1992, nº 11/1993 e nº 12/1993. 7. No tocante ao art. 5º, da Lei Complementar nº 02/1990, também impugnado na presente ação, cumpre esclarecer que a norma nele inserta – que submetia à apreciação do Poder Legislativo a proposta orçamentária do Ministério Público – restou tacitamente revogada, porquanto não foi reproduzida na Lei Complementar nº 12/1993, que passou a estabelecer as normas de organização e funcionamento do Ministério Público do Estado do Piauí. 8. A presente ação direta também se encontra prejudicada quanto à impugnação do inciso V, do art 2º, da Lei Complementar nº 02/1990, uma vez que o parâmetro de constitucionalidade supostamente violado, o § 2º do art. 127 da Constituição Federal, sofreu alteração substancial em seu conteúdo com o advento da Emenda Constitucional nº 19, de 5 de junho de 1998, passando a vigorar com a seguinte redação: ‘Art. 127 (...) § 2º Ao Ministério Público é assegurada autonomia funcional e administrativa, podendo, observado o disposto no art. 129, propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política remuneratória e os planos de carreira; a lei disporá sobre sua organização e funcionamento.’ 9. O mesmo se verifica quanto à impugnação do art. 28, da Lei Complementar nº 04/1990, pois a norma inserta no artigo 93, VI, da Constituição Federal, supostamente violada, também foi substancialmente alterada com a edição da Emenda Constitucional nº 20, de 16 de dezembro de 1998, tornando inviável o controle concentrado da norma em face desse dispositivo constitucional. 10. Quanto à impugnação da expressão ‘e remuneração’ contida no art. 12, da LC nº 04/1990, cumpre, inicialmente, esclarecer que, embora este artigo tenha sido alterado pela LC nº 09/1992, a expressão impugnada foi mantida, razão pela qual não se verifica prejudicado o pedido quanto a esse dispositivo. Eis o teor do dispositivo ora em vigor: ‘Art. 12 – O Advogado Geral do Estado é o Chefe da Advocacia Geral do Estado e da Procuradoria Geral do Estado, com prerrogativas e remuneração de Secretário de Estado, nomeado em comissão pelo Governador, dentre maiores de trinta anos, de notório saber jurídico e reputação ilibada.’ (...). 11. Verifica-se, entretanto, que não merece ser conhecida a ação quanto à impugnação do artigo 12 da Lei Complementar nº 04/1990, porquanto não expôs o requerente os fundamentos jurídicos do pedido com relação ao mencionado dispositivo infraconstitucional, limitando-se a transcrevê-lo sem sequer apontar a norma constitucional supostamente violada. 12. Ante o exposto, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo não-conhecimento da ação quanto à impugnação do artigo 12, da Lei Complementar nº 04/1990; e, em relação aos demais dispositivos hostilizados, pela prejudicialidade da presente ação direta de inconstitucionalidade.” (grifei) Sendo esse o contexto, entendo aplicável, à espécie, o magistério jurisprudencial desta Suprema Corte, cujas reiteradas decisões, no tema, têm reconhecido a ocorrência de prejudicialidade da ação direta, quando, após o seu ajuizamento, sobrevém a cessação de eficácia das normas questionadas em referido processo objetivo, como sucedeu, no caso, com o art. 5º da Lei Complementar estadual nº 02/90. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a propósito de tal situação, tem enfatizado que a superveniente cessação de eficácia dos atos estatais impugnados em ação direta de inconstitucionalidade provoca a extinção anômala do processo de controle normativo abstrato, independentemente da existência de efeitos residuais concretos que possam ter derivado da aplicação dos diplomas questionados (RTJ 153/13 – RTJ 154/396-397 - RTJ 154/401 – RTJ 156/29 - RTJ 160/145 – RTJ 174/80-81, v.g.): “- A cessação superveniente da eficácia da lei argüída de inconstitucional inibe o prosseguimento da ação direta de inconstitucionalidade (...). - A extinção anômala do processo de controle normativo abstrato, motivada pela perda superveniente de seu objeto, tanto pode decorrer da revogação pura e simples do ato estatal impugnado, como do exaurimento de sua eficácia, tal como sucede nas hipóteses de normas legais destinadas à vigência temporária.” (RTJ 152/731-732, Rel. Min. CELSO DE MELLO) “A revogação superveniente do ato estatal impugnado faz instaurar situação de prejudicialidade que provoca a extinção anômala do processo de fiscalização abstrata de constitucionalidade, eis que a ab-rogação do diploma normativo questionado opera, quanto a ele, a sua exclusão do sistema de direito positivo, causando, desse modo, a perda ulterior de objeto da própria ação direta, independentemente da ocorrência, ou não, de efeitos residuais concretos.” (RTJ 195/752-754, 754, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Também tem razão o eminente Procurador-Geral da República, quando acentua a prejudicialidade desta ação direta em decorrência de substancial alteração introduzida pela superveniente promulgação das Emendas Constitucionais nºs 19/98 e 20/98, cujo teor modificou o próprio parâmetro de controle alegadamente transgredido – segundo sustenta o autor – pelos diplomas legislativos em questão. Tratando-se de fiscalização normativa abstrata, a questão pertinente à noção conceitual de parametricidade - vale dizer, do atributo que permite outorgar, à cláusula constitucional, a qualidade de paradigma de controle - desempenha papel de fundamental importância na admissibilidade, ou não, da própria ação direta (ou da ação declaratória de constitucionalidade), consoante já enfatizado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (RTJ 176/1019-1020, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Isso significa, portanto, que a idéia de inconstitucionalidade (ou de constitucionalidade), por encerrar um conceito de relação (JORGE MIRANDA, “Manual de Direito Constitucional”, tomo II, p. 273/274, item n. 69, 2ª ed., Coimbra Editora Limitada) - que supõe, por isso mesmo, o exame da compatibilidade vertical de um ato, dotado de menor hierarquia, com aquele que se qualifica como fundamento de sua existência, validade e eficácia - torna essencial, para esse específico efeito, a identificação do parâmetro de confronto, que se destina a possibilitar a verificação, “in abstracto”, da legitimidade constitucional de certa regra de direito positivo, a ser necessariamente cotejada em face da cláusula invocada como referência paradigmática. A busca do paradigma de confronto, portanto, significa, em última análise, a procura de um padrão de cotejo que permita, ao intérprete, o exame da fidelidade hierárquico-normativa de determinado ato estatal, contestado em face da Constituição. Sendo assim, e quaisquer que possam ser os parâmetros de controle que se adotem - a Constituição escrita, de um lado, ou a ordem constitucional global, de outro (LOUIS FAVOREU/FRANCISCO RUBIO LLORENTE, “El bloque de la constitucionalidad”, p. 95/109, itens ns. I e II, 1991, Civitas; J. J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional”, p. 712, 4ª ed., 1987, Almedina, Coimbra, v.g.) -, torna-se essencial, para fins de viabilização do processo de controle normativo abstrato, que tais referências paradigmáticas encontrem-se, ainda, em regime de plena vigência, pois, como precedentemente assinalado, o controle de constitucionalidade, em sede concentrada, não se instaura, em nosso sistema jurídico, em função de paradigmas históricos, consubstanciados em normas que já não mais se acham em vigor, ou, embora vigendo, tenham sofrido alteração substancial em seu texto. É por tal razão que, em havendo a revogação superveniente (ou a modificação substancial) da norma de confronto, não mais se justificará a tramitação do processo objetivo de fiscalização concentrada de constitucionalidade. Bem por isso, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, desde o regime constitucional anterior, tem proclamado que tanto a superveniente revogação global da Constituição da República (RTJ 128/515 - RTJ 130/68 - RTJ 130/1002 - RTJ 135/515 – RTJ 141/786), quanto a posterior derrogação (ou alteração substancial) da norma constitucional (RTJ 168/436 RTJ 169/834 - RTJ 169/920 - RTJ 171/114 - RTJ 172/54-55 - RTJ 179/419 - ADI 296/DF - ADI 595/ES - ADI 905/DF - ADI 906/PR – ADI 1.120/PA - ADI 1.137/RS - ADI 1.143/AP - ADI 1.300/AP – ADI 1.510/SC – ADI 1.885-QO/DF), por afetarem o paradigma de confronto invocado no processo de controle concentrado de constitucionalidade, configuram hipóteses caracterizadoras de prejudicialidade da ação direta ou da ação declaratória, em virtude da evidente perda de seu objeto: “II - Controle direto de constitucionalidade: prejuízo. Julga-se prejudicada, total ou parcialmente, a ação direta de inconstitucionalidade no ponto em que, depois de seu ajuizamento, emenda à Constituição haja abrogado ou derrogado norma de Lei Fundamental que constituísse paradigma necessário à verificação da procedência ou improcedência dela ou de algum de seus fundamentos, respectivamente: orientação de aplicar-se no caso, no tocante à alegação de inconstitucionalidade material, dada a revogação primitiva do art. 39, § 1º, CF 88, pela EC 19/98.” (RTJ 172/789-790, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei) “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL 3310/99. COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE INATIVOS E PENSIONISTAS. EC 41/2003. ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DO SISTEMA PÚBLICO DE PREVIDÊNCIA. PREJUDICIALIDADE. ...................................................... 2. Superveniência da Emenda Constitucional 41/2003, que alterou o sistema previdenciário. Prejudicialidade da ação direta quando se verifica inovação substancial no parâmetro constitucional de aferição da regra legal impugnada. Precedentes. Ação direta de inconstitucionalidade julgada prejudicada.” (ADI 2.197/RJ, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - grifei) “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. INSTRUMENTO DE AFIRMAÇÃO DA SUPREMACIA DA ORDEM CONSTITUCIONAL. O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL COMO LEGISLADOR NEGATIVO. A NOÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE/INCONSTITUCIONALIDADE COMO CONCEITO DE RELAÇÃO. A QUESTÃO PERTINENTE AO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE. POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS DIVERGENTES EM TORNO DO SEU CONTEÚDO. O SIGNIFICADO DO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE COMO FATOR DETERMINANTE DO CARÁTER CONSTITUCIONAL, OU NÃO, DOS ATOS ESTATAIS. NECESSIDADE DA VIGÊNCIA ATUAL, EM SEDE DE CONTROLE ABSTRATO, DO PARADIGMA CONSTITUCIONAL ALEGADAMENTE VIOLADO. SUPERVENIENTE MODIFICAÇÃO/SUPRESSÃO DO PARÂMETRO DE CONFRONTO. PREJUDICIALIDADE DA AÇÃO DIRETA. - A definição do significado de bloco de constitucionalidade - independentemente da abrangência material que se lhe reconheça - reveste-se de fundamental importância no processo de fiscalização normativa abstrata, pois a exata qualificação conceitual dessa categoria jurídica projeta-se como fator determinante do caráter constitucional, ou não, dos atos estatais contestados em face da Carta Política. - A superveniente alteração/supressão das normas, valores e princípios que se subsumem à noção conceitual de bloco de constitucionalidade, por importar em descaracterização do parâmetro constitucional de confronto, faz instaurar, em sede de controle abstrato, situação configuradora de prejudicialidade da ação direta, legitimando, desse modo - ainda que mediante decisão monocrática do Relator da causa (RTJ 139/67) - a extinção anômala do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade. Doutrina. Precedentes.” (ADI 595/ES, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “Informativo/STF” nº 258/2002) Cumpre ressaltar, por necessário, que essa orientação jurisprudencial reflete-se no próprio magistério da doutrina (CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, “A Fiscalização Abstrata da Constitucionalidade no Direito Brasileiro”, p. 225, item n. 3.2.6, 2ª ed., 2000, RT; OSWALDO LUIZ PALU, “Controle de Constitucionalidade - Conceitos, Sistemas e Efeitos”, p. 219, item n. 9.9.17, 2ª ed., 2001, RT; GILMAR FERREIRA MENDES, “Jurisdição Constitucional”, p. 176/177, 2ª ed., 1998, Saraiva), cuja percepção do tema ora em exame põe em destaque, em casos como o destes autos, que a superveniente alteração da norma constitucional revestida de parametricidade importa na configuração de prejudicialidade do processo de controle abstrato de constitucionalidade, eis que, como enfatizado, o objeto do processo de fiscalização abstrata resume-se, em essência, ao controle da integridade da ordem constitucional vigente. Vê-se, desse modo, que a promulgação das Emendas Constitucionais nºs 19/98 e 20/98, ocorrida em momento posterior ao do ajuizamento da presente ação direta, importou em alteração substancial das cláusulas de parâmetro invocadas para justificar a instauração deste processo de controle normativo abstrato, ensejando, assim, o reconhecimento – tal como preconizado pelo eminente Procurador-Geral da República – de uma típica situação caracterizadora de prejudicialidade apta a gerar a extinção anômala desta causa. Resta verificar, agora, se se revela viável, processualmente, a impugnação genérica deduzida contra o art. 12 da Lei Complementar nº 04/90, editada pelo Estado do Piauí. O eminente Procurador-Geral da República, ao opinar pelo não-conhecimento desta ação direta quanto a referido preceito normativo, enfatizou, com razão, que o autor, ao deduzir a sua pretensão de inconstitucionalidade, “não expôs (...) os fundamentos jurídicos do pedido com relação ao mencionado dispositivo infraconstitucional, limitando-se a transcrevê-lo, sem sequer apontar a norma constitucional supostamente violada” (grifei). Cumpre ter presente, neste ponto, considerado o que dispõe o art. 3o, I, da Lei nº 9.868/99, que não se conhece da ação direta, sempre que a impugnação nela deduzida revelar-se destituída de fundamentação jurídica, tal como ocorre, no caso, em relação ao art. 12, “caput”, da Lei Complementar nº 04/90. Cabe ressaltar, na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que nada pode justificar uma alegação meramente genérica de ofensa à Constituição, pois incumbe, a quem faz tal afirmação, o dever de indicar, fundamentadamente, as razões justificadoras do suposto vício de inconstitucionalidade. O Senhor Governador do Estado do Piauí, ao pretender a decretação de inconstitucionalidade do “caput” do art. 12 da Lei Complementar nº 04/90, deixou de fundamentar tal argüição. Ao compulsar-se a petição inicial (fls. 02/21), constata-se que o autor simplesmente não expôs qualquer fundamento jurídico que desse suporte à tese da inconstitucionalidade material do “caput” do art. 12 da Lei Complementar nº 04/90. É certo que o Supremo Tribunal Federal não está condicionado, no desempenho de sua atividade jurisdicional, pelas razões de ordem jurídica invocadas como suporte da pretensão de inconstitucionalidade deduzida pelo autor da ação direta. Tal circunstância, no entanto, não suprime, à parte, o dever processual de motivar o pedido e de identificar, na Constituição, em obséquio ao princípio da especificação das normas, os dispositivos alegadamente violados pelo ato normativo que pretende impugnar. Impõe-se, ao autor, no processo de controle concentrado de constitucionalidade, indicar as normas de referência - que são aquelas inerentes ao ordenamento constitucional e que se revestem, por isso mesmo, de parametricidade - em ordem a viabilizar, com apoio em argumentação consistente, a aferição da conformidade vertical dos atos normativos de menor hierarquia. Quaisquer que possam ser os parâmetros de controle que se adotem - a Constituição escrita ou a ordem constitucional global (J. J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional”, p. 712, 4a ed., 1987, Almedina, Coimbra) -, não pode o autor deixar de referir, para os efeitos mencionados, quais as normas, quais os princípios e quais os valores efetiva ou potencialmente lesados por atos estatais revestidos de menor grau de positividade jurídica, sempre indicando, ainda, os fundamentos, a serem desenvolvidamente expostos, subjacentes à argüição de inconstitucionalidade. Esse dever de fundamentar a argüição de inconstitucionalidade onera e incide sobre aquele que faz tal afirmação, assumindo, por isso mesmo, um caráter de indeclinável observância (ADI 561/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Não cabe, desse modo, ao Supremo Tribunal Federal, substituindo-se ao autor, suprir qualquer omissão que se verifique na petição inicial. Isso porque a natureza do processo de ação direta de inconstitucionalidade, que se revela instrumento de grave repercussão na ordem jurídica interna, impõe maior rigidez no controle dos seus pressupostos formais (RTJ 135/19, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RTJ 135/905, Rel. Min. CELSO DE MELLO). A magnitude desse excepcional meio de ativação da jurisdição constitucional concentrada do Supremo Tribunal Federal impõe e reclama, até mesmo para que não se degrade em sua importância, uma atenta fiscalização desta Corte, que deve impedir que o exercício de tal prerrogativa institucional, em alguns casos, venha a configurar instrumento de instauração de lides constitucionais temerárias. A omissão do autor - que deixou de indicar as razões consubstanciadoras da alegada ilegitimidade constitucional do “caput” do art. 12 da Lei Complementar nº 04/90 - faz com que essa conduta processual incida na restrição fixada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que não admite argüições de inconstitucionalidade, quando destituídas de fundamentação ou desprovidas de motivação específica e suficientemente desenvolvida. Considerada a jurisprudência desta Suprema Corte - que deu causa à formulação da regra inscrita no art. 3o, I, da Lei nº 9.868/99 -, não se pode conhecer de ação direta, sempre que a impugnação nela veiculada, como ocorre na espécie, revelar-se destituída de fundamentação ou quando a argüição de inconstitucionalidade apresentar-se precária ou insuficientemente motivada. A gravidade de que se reveste o instrumento de controle normativo abstrato impõe, àquele que possui legitimidade para utilizá-lo, o dever processual de sempre expor, de modo suficientemente desenvolvido, as razões jurídicas justificadoras da alegação de inconstitucionalidade. É que, em sede de fiscalização concentrada, não se admite afirmação meramente genérica de inconstitucionalidade, tanto quanto não se permite que a alegação de contrariedade ao texto constitucional se apóie em argumentos superficiais ou em fundamentação insuficiente. Essa orientação tem prevalecido, em tema de fiscalização normativa abstrata, na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, por mais de uma vez, deixou de conhecer de ações diretas, seja por falta de motivação específica, seja por insuficiência ou deficiência da própria fundamentação (RTJ 177/669, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - ADI 561/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – ADI 2.111/DF, Rel. Min. SYDNEY SANCHES): “É necessário, em ação direta de inconstitucionalidade, que venham expostos os fundamentos jurídicos do pedido com relação às normas impugnadas, não sendo de admitir-se alegação genérica de inconstitucionalidade sem qualquer demonstração razoável, nem ataque a quase duas dezenas de medidas provisórias em sua totalidade com alegações por amostragem.” (RTJ 144/690, Rel. Min. MOREIRA ALVES – grifei) “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CAUSA DE PEDIR E PEDIDO - Cumpre ao autor da ação proceder à abordagem, sob o ângulo da causa de pedir, dos diversos preceitos atacados, sendo impróprio fazê-lo de forma genérica. A flexibilidade jurisprudencial de autora não mais se justifica, isso diante do elastecimento constitucional do rol dos legitimados para a referida ação.” (ADI 1.708/MT, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei) “Insuficiência de fundamentação da inicial dado o número de dispositivos legais alterados pela Medida Provisória, sem que se particularize, pontualmente, como convém, a motivação a justificar a declaração de sua invalidade. Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida, por falta de motivação específica quanto à pretendida declaração de inconstitucionalidade.” (RTJ 173/466, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA – grifei) Nem se diga que, em ocorrendo situação como a ora exposta, impor-se-ia ao Tribunal o dever de ensejar, ao autor, a possibilidade de complementar a petição inicial. Tal providência não se revela processualmente viável, porque a Lei nº 9.868/99 - que dispõe sobre o processo e o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade - estabelece que a ausência de fundamentação autoriza o indeferimento liminar da petição inicial, por ocorrência do vício grave da inépcia. Na realidade, a Lei nº 9.868/99, ao dispor sobre essa conseqüência de ordem processual, assim prescreve em seu art. 4º, “caput”: “A petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator” (grifei). Cabe ter presente, no ponto, no sentido desta decisão, o julgamento plenário da ADI 1.775/RJ, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA (RTJ 177/669), na parte em que esta Corte afastou a proposta de que se deveria ensejar, ao autor, a oportunidade de aditar a petição inicial, quando deficientemente fundamentada. Sendo assim, e presentes tais razões, não conheço desta ação direta, no ponto em que, sem qualquer fundamentação, o autor questionou a constitucionalidade do “caput” do art. 12 da Lei Complementar nº 04/90, julgando-a prejudicada, de outro lado, no que concerne aos demais preceitos normativos que foram impugnados nesta sede de controle abstrato. A inviabilidade da presente ação direta, em decorrência das razões mencionadas, impõe uma observação final: no desempenho dos poderes processuais de que dispõe, assiste, ao Ministro-Relator, competência plena para exercer, monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, legitimando-se, em conseqüência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar. Cabe acentuar, neste ponto, que o Pleno do Supremo Tribunal Federal reconheceu a inteira validade constitucional da norma legal que inclui, na esfera de atribuições do Relator, a competência para negar trânsito, em decisão monocrática, a recursos, pedidos ou ações, quando incabíveis, inviáveis, intempestivos, sem objeto ou que veiculem pretensão incompatível com a jurisprudência predominante do Tribunal (RTJ 139/53 - RTJ 168/174-175). Impõe-se enfatizar, por necessário, que esse entendimento jurisprudencial é também aplicável aos processos de ação direta de inconstitucionalidade (ADI 563/DF, Rel. Min. PAULO BROSSARD – ADI 593/GO, Rel. Min. MARCO AURÉLIO ADI 2.060/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - ADI 2.207/AL, Rel. Min. CELSO DE MELLO - ADI 2.215/PE, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), eis que, tal como já assentou o Plenário do Supremo Tribunal Federal, o ordenamento positivo brasileiro “não subtrai, ao Relator da causa, o poder de efetuar - enquanto responsável pela ordenação e direção do processo (RISTF, art. 21, I) - o controle prévio dos requisitos formais da fiscalização normativa abstrata, o que inclui, dentre outras atribuições, o exame dos pressupostos processuais e das condições da própria ação direta” (RTJ 139/67, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Sendo assim, em face das razões expostas, e acolhendo, ainda, o parecer do eminente Procurador-Geral da República, não conheço da presente ação direta quanto ao art. 12 da Lei Complementar nº 04/90 do Estado do Piauí, julgando-a prejudicada no que se refere aos demais preceitos normativos ora questionados. Em conseqüência, declaro extinto este processo de controle normativo abstrato, restando insubsistente a medida cautelar anteriormente deferida (fls. 61/110). Comunique-se, após o trânsito em julgado da presente decisão. Arquivem-se os presentes autos. Publique-se. Brasília, 24 de março de 2008. Ministro CELSO DE MELLO Relator * decisão publicada no DJE de 31.3.2008 Substância Entorpecente - Porte - Crime Militar - Aplicabilidade da Norma Penal mais Benéfica (Transcrições) HC 94085 MC/SP* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CRIME MILITAR (CPM, ART. 290). SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 11.343/2006, CUJO ART. 28 – POR NÃO SUBMETER O AGENTE A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE – QUALIFICA-SE COMO NORMA PENAL BENÉFICA. CONTROVÉRSIA EM TORNO DA APLICABILIDADE, OU NÃO, A ESSE DELITO MILITAR (CPM, ART. 290), DO ART. 28 DA LEI Nº 11.343/2006. A QUESTÃO DA PRECEDÊNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA “LEX MITIOR” SOBRE REGRAS PENAIS MAIS GRAVOSAS, MESMO QUE INSCRITAS EM DIPLOMA NORMATIVO QUALIFICADO COMO “LEX SPECIALIS”. DOUTRINA. PRECEDENTE DO STF (2ª TURMA). INVOCAÇÃO, AINDA, DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL. POSSIBILIDADE DE SUA APLICAÇÃO AOS CRIMES MILITARES. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. DECISÃO: A presente impetração insurge-se contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribunal Militar, encontra-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 16): “APELAÇÃO. PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO DA LEI 11.343/06. IMPOSSIBILIDADE. - Não há que se falar da não aplicação do ‘caput’ do art. 290 em razão da edição da nova Lei de Tóxicos. - O princípio da insignificância igualmente não se aplica aos casos de porte de entorpecente em área sujeita à administração militar. - Recurso improvido. Decisão unânime.” (grifei) A parte ora impetrante postula a anulação da “(...) condenação, para aplicar-se o disposto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006” (fls. 04). Passo a examinar o pedido de medida cautelar formulado pela Defensoria Pública da União. E, ao fazê-lo, tenho para mim, na linha de decisão por mim proferida no HC 93.822-MC/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, não obstante julgamentos em sentido contrário emanados da colenda Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (HC 91.759/MG, Rel. Min. MENEZES DIREITO - HC 92.462/RS, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA), que se reveste de plausibilidade jurídica a tese sustentada na presente impetração, que se fundamenta na aplicabilidade, ao crime militar de porte e guarda de substância entorpecente (CPM, art. 290), da disciplina penal mais benéfica consubstanciada na Lei nº 11.343/2006, que se qualifica, sob tal perspectiva, considerado o disposto no art. 28 desse novo diploma legislativo, como verdadeira “lex mitior”. É importante registrar, neste ponto, que, com a superveniência da Lei nº 11.343/2006 – e ainda que mantida, por esta, a criminalidade do porte de drogas para consumo pessoal (RE 430.105-QO/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE) -, tal conduta, agora, não mais sofre a incidência de pena privativa de liberdade, expondo-se, ao contrário, a penas meramente restritivas de direitos. É por essa razão que os autores qualificam como juridicamente mais benigna essa nova legislação penal (GUILHERME DE SOUZA NUCCI, “Leis Penais e Processuais Penais Comentadas”, p. 303/310, 2ª ed., 2007, RT; RENATO MARCÃO, “A Nova Lei de Drogas e seus Reflexos na Execução Penal”, “in” Consulex, ano XI, nº 258, p. 58/62; LUIZ FLÁVIO GOMES, “Lei de Drogas Comentada Artigo por Artigo: Lei 11.343/2006, de 23.08.2006”, p. 155, item n. 7, 2ª ed., 2007, RT; e JOSÉ GERALDO DA SILVA, WILSON LAVORENTI e FABIANO GENOFRE, “Leis Penais Especiais Anotadas”, p. 186/200, item n. 4, 9ª ed., 2006, Millennium, v.g.), o que legitima a aplicação da cláusula inscrita no inciso XL do art. 5º da Constituição da República, cuja eficácia tem o condão de inibir a incidência de normas penais mais gravosas, à semelhança do que se registra com o art. 290 do CPM (“lex gravior”). Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, que a norma penal benéfica – como aquela inscrita no art. 28 da Lei nº 11.343/2006 (notadamente se confrontada com a regra consubstanciada no art. 290 do CPM) – reveste-se de eficácia retroativa, apta a torná-la incidente, enquanto “lex mitior”, a fatos delituosos praticados em momento anterior ao de sua vigência. Impende reconhecer, por necessário, que a eficácia retroativa da lei penal benéfica possui extração constitucional, traduzindo, sob tal aspecto, inquestionável direito público subjetivo que assiste a qualquer suposto autor de infrações penais. Esse entendimento – decorrente do exame do significado e do alcance normativo da regra consubstanciada no inciso XL do art. 5º da Constituição Federal - reflete-se no magistério jurisprudencial firmado por esta Suprema Corte (RTJ 140/514, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 151/525, Rel. Min. MOREIRA ALVES, v.g.) e, também, por outros Tribunais da República (RT 467/313 – RT 605/314 - RT 725/526 - RT 726/518 – RT 726/523 - RT 731/666): “LEI Nº 9.099/95 - CONSAGRAÇÃO DE MEDIDAS DESPENALIZADORAS - NORMAS BENÉFICAS RETROATIVIDADE VIRTUAL. - Os processos técnicos de despenalização abrangem, no plano do direito positivo, tanto as medidas que permitem afastar a própria incidência da sanção penal quanto aquelas que, inspiradas no postulado da mínima intervenção penal, têm por objetivo evitar que a pena seja aplicada, como ocorre na hipótese de conversão da ação pública incondicionada em ação penal dependente de representação do ofendido (Lei nº 9.099/95, arts. 88 e 91). - A Lei nº 9.099/95, que constitui o estatuto disciplinador dos Juizados Especiais, mais do que a regulamentação normativa desses órgãos judiciários de primeira instância, importou em expressiva transformação do panorama penal vigente no Brasil, criando instrumentos destinados a viabilizar, juridicamente, processos de despenalização, com a inequívoca finalidade de forjar um novo modelo de Justiça criminal, que privilegie a ampliação do espaço de consenso, valorizando, desse modo, na definição das controvérsias oriundas do ilícito criminal, a adoção de soluções fundadas na própria vontade dos sujeitos que integram a relação processual penal. Esse novíssimo estatuto normativo, ao conferir expressão formal e positiva às premissas ideológicas que dão suporte às medidas despenalizadoras previstas na Lei nº 9.099/95, atribui, de modo conseqüente, especial primazia aos institutos (a) da composição civil (art. 74, parágrafo único), (b) da transação penal (art. 76), (c) da representação nos delitos de lesões culposas ou dolosas de natureza leve (arts. 88 e 91) e (d) da suspensão condicional do processo (art. 89). As prescrições que consagram as medidas despenalizadoras em causa qualificam-se como normas penais benéficas, necessariamente impulsionadas, quanto à sua aplicabilidade, pelo princípio constitucional que impõe, à ‘lex mitior’, uma insuprimível carga de retroatividade virtual e, também, de incidência imediata.” (RTJ 162/483-484, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) “O sistema constitucional brasileiro impede que se apliquem leis penais supervenientes mais gravosas, como aquelas que afastam a incidência de causas extintivas da punibilidade (...), a fatos delituosos cometidos em momento anterior ao da edição da ‘lex gravior’. A eficácia ultrativa da norma penal mais benéfica - sob cuja égide foi praticado o fato delituoso - deve prevalecer por efeito do que prescreve o art. 5º, XL, da Constituição, sempre que, ocorrendo sucessão de leis penais no tempo, constatar-se que o diploma legislativo anterior qualificava-se como estatuto legal mais favorável ao agente. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.” (RTJ 186/252, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Vê-se, pois, que a circunstância de ordem temporal decorrente da sucessão de leis penais no tempo revelar-se-ia apta a conferir aplicabilidade, no caso, às disposições contidas no art. 28 da Lei nº 11.343/2006 (“lex mitior”). É certo, no entanto, que a incidência, no caso, da cláusula constitucional da norma penal benéfica supõe a resolução de uma antinomia que se registra entre o que prescreve o art. 290 do CPM (“lex specialis”) e o que dispõe o art. 28 da Lei nº 11.343/2006 (“lex generalis”), a reclamar, portanto, como fator de superação desse (aparente) conflito normativo, a aplicação do critério da especialidade. Tal matéria, contudo, deverá constituir objeto de oportuno exame, quando do julgamento final da causa por esta Suprema Corte, eis que este provimento cautelar tem, como suporte, um mero juízo de delibação. Assentadas tais premissas, torna-se imperioso salientar que assume expressivo relevo a alegação de que a cláusula da aplicabilidade dos estatutos penais benéficos, impregnada de caráter mandatório, por ostentar natureza eminentemente constitucional (CF, art. 5º, XL), tem precedência sobre quaisquer diplomas legislativos, independentemente de estes se subsumirem à noção mesma de “lex specialis”. Foi por tal motivo que o eminente Ministro GILMAR MENDES, na condição de Relator do HC 91.356-MC/SP, deferiu o provimento cautelar então postulado, fazendo-o com apoio em seu entendimento de que “o art. 28 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, poderia ser aplicado com relação ao ora paciente” (grifei), não obstante se tratasse, no caso que examinou – e tal como sucede na espécie ora em análise -, de condenação pelo crime militar de porte de substância entorpecente (CPM, art. 290). Não foi por outra razão que o Supremo Tribunal Federal, apreciando essa mesma questão, deferiu ordem de “habeas corpus” em caso rigorosamente idêntico ao que se examina na presente sede processual, e no qual proferiu decisão consubstanciada em acórdão assim ementado: “‘HABEAS CORPUS’. PENAL MILITAR. USO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO NO ÂMBITO DA JUSTIÇA MILITAR. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 1. Paciente, militar, preso em flagrante dentro da unidade militar, quando fumava um cigarro de maconha e tinha consigo outros três. 2. Condenação por posse e uso de entorpecentes (...). ....................................................... 4. A Lei n. 11.343/2006 - nova Lei de Drogas - veda a prisão do usuário. Prevê, contra ele, apenas a lavratura de termo circunstanciado. Preocupação, do Estado, em mudar a visão que se tem em relação aos usuários de drogas. 5. Punição severa e exemplar deve ser reservada aos traficantes, não alcançando os usuários. A estes devem ser oferecidas políticas sociais eficientes para recuperá-los do vício. 6. O Superior Tribunal Militar não cogitou da aplicação da Lei n. 11.343/2006. Não obstante, cabe a esta Corte fazê-lo, incumbindo-lhe confrontar o princípio da especialidade da lei penal militar, óbice à aplicação da nova Lei de Drogas, com o princípio da dignidade humana, arrolado na Constituição do Brasil de modo destacado, incisivo, vigoroso, como princípio fundamental (art. 1º, III). 7. Paciente jovem, sem antecedentes criminais, com futuro comprometido por condenação penal militar quando há lei que, em vez de apenar - Lei n. 11.343/2006 - possibilita a recuperação do civil que praticou a mesma conduta. 8. Exclusão das fileiras do Exército: punição suficiente para que restem preservadas a disciplina e hierarquia militares, indispensáveis ao regular funcionamento de qualquer instituição militar. 9. A aplicação do princípio da insignificância no caso se impõe, a uma, porque presentes seus requisitos, de natureza objetiva; a duas, em virtude da dignidade da pessoa humana. Ordem concedida.” (HC 92.961/SP, Rel. Min. EROS GRAU - grifei) Há a considerar, ainda, para efeito de exercício da jurisdição cautelar, um outro fundamento que me parece juridicamente relevante. Refiro-me à aplicabilidade, ao caso, do postulado da insignificância, cuja utilização tem sido admitida, em inúmeros casos, pelo Supremo Tribunal Federal: “O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL. - O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: ‘DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR’. - O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social.” (HC 84.687/MS, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Não custa assinalar, neste ponto, que esse entendimento encontra suporte em expressivo magistério doutrinário expendido na análise do tema em referência (LUIZ FLÁVIO GOMES, “Delito de Bagatela: Princípios da Insignificância e da Irrelevância Penal do Fato”, “in” Revista dos Tribunais, vol. 789/439-456; FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO, “Princípios Básicos de Direito Penal”, p. 133/134, item n. 131, 5ª ed., 2002, Saraiva; CEZAR ROBERTO BITENCOURT, “Código Penal Comentado”, p. 6, item n. 9, 2002, Saraiva; DAMÁSIO E. DE JESUS, “Direito Penal – Parte Geral”, vol. 1/10, item n. 11, “h”, 26ª ed., 2003, Saraiva; MAURÍCIO ANTONIO RIBEIRO LOPES, “Princípio da Insignificância no Direito Penal”, p. 113/118, item n. 8.2, 2ª ed., 2000, RT, v.g.). Revela-se significativa a lição de EDILSON MOUGENOT BONFIM e de FERNANDO CAPEZ (“Direito Penal – Parte Geral”, p. 121/122, item n. 2.1, 2004, Saraiva) a propósito da matéria em questão: “Na verdade, o princípio da bagatela ou da insignificância (...) não tem previsão legal no direito brasileiro (...), sendo considerado, contudo, princípio auxiliar de determinação da tipicidade, sob a ótica da objetividade jurídica. Fundase no brocardo civil ‘minimis non curat praetor’ e na conveniência da política criminal. Se a finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico quando a lesão, de tão insignificante, torna-se imperceptível, não será possível proceder a seu enquadramento típico, por absoluta falta de correspondência entre o fato narrado na lei e o comportamento iníquo realizado. É que, no tipo, somente estão descritos os comportamentos capazes de ofender o interesse tutelado pela norma. Por essa razão, os danos de nenhuma monta devem ser considerados atípicos. A tipicidade penal está a reclamar ofensa de certa gravidade exercida sobre os bens jurídicos, pois nem sempre ofensa mínima a um bem ou interesse juridicamente protegido é capaz de se incluir no requerimento reclamado pela tipicidade penal, o qual exige ofensa de alguma magnitude a esse mesmo bem jurídico.” (grifei) Na realidade, e considerados, de um lado, o princípio da intervenção penal mínima do Estado (que tem por destinatário o próprio legislador) e, de outro, o postulado da insignificância (que se dirige ao magistrado, enquanto aplicador da lei penal ao caso concreto), na precisa lição do eminente Professor RENÉ ARIEL DOTTI (“Curso de Direito Penal – Parte Geral”, p. 68, item n. 51, 2ª ed., 2004, Forense), cumpre reconhecer que o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. Cumpre acentuar, finalmente, por relevante, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem admitido, na matéria em questão, a inteira aplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes militares (HC 87.478/PA, Rel. Min. EROS GRAU – HC 92.634/PE, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – RHC 89.624/RS, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA). Sendo assim, em juízo de estrita delibação, e sem prejuízo de ulterior reexame da questão suscitada nesta sede processual, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, a eficácia da condenação penal imposta, ao ora paciente, nos autos do Processo nº 18/06-5 (2ª Auditoria da 2ª Circunscrição Judiciária Militar), sustando, em conseqüência, qualquer medida de execução da pena em referência, mantido íntegro o “status libertatis” de Demétrios de Araújo, medida esta que estendo, ainda, ao co-réu Ademir Schultz de Carvalho Filho (fls. 06). Caso o paciente ou o seu co-réu, por algum motivo, tenham sido presos em decorrência de mencionada condenação penal (Processo nº 18/06-5), deverão eles ser imediatamente postos em liberdade, se por al não estiverem presos. Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao E. Superior Tribunal Militar (Apelação nº 2007.01.050568-7/SP) e à 2ª Auditoria da 2ª CJM (Processo nº 18/06-5). 2. Solicite-se, à 2ª Auditoria da 2ª CJM (São Paulo/SP), informação sobre a fase em que se acha, presentemente, a execução da condenação penal imposta ao ora paciente e ao seu co-réu. Publique-se. Brasília, 28 de março de 2008. Ministro CELSO DE MELLO Relator * decisão pendente de publicação Assessora responsável pelo Informativo Anna Daniela de A. M. dos Santos [email protected]