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ANÁLISE DA FACTIBILIDADE DE USO DE CURATIVOS DE
QUITOSANA
E
ALGINATO
COMO
ABORDAGEM
ALTERNATIVA PARA A ADMINISTRAÇÃO DE IMIQUIMODE
VISANDO A TERAPIA DE TUMORES DE PELE
L. G. CAMARGO e A. M. MORAES
Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Química, Departamento de Engenharia
de Materiais e Bioprocessos
E-mail para contato: [email protected]
RESUMO – Imiquimode (IM) é um antineoplásico utilizado no tratamento de tumores de
pele, compondo até 5% de cremes terapêuticos. Neste trabalho investigou-se a
incorporação direta do mesmo a membranas de quitosana (Q) e alginato (A) em duas
diferentes proporções (0,1 g e 1,0 g de IM em 0,9 g de Q e 0,9 g de A) como alternativa à
sua veiculação na forma de creme. Observou-se visualmente e por análise da morfologia
em escala micrométrica que quanto maior a quantidade de fármaco adicionado, mais
opaca, quebradiça e esbranquiçada torna-se a membrana. Notou-se ainda redução no
diâmetro de até 21% e aumento na espessura de até 200%. Quando imersa em solução
hidro-etanólica, a membrana preparada com 1,0g de IM apresentou, nas primeiras 6 h,
liberação de 11% da droga incorporada, o que representa 60% da dose comumente
disponibilizada pelo creme Aldara® (Bayer), enquanto a obtida com 0,1 g liberou 13%
do material originalmente presente. O sistema produzido mostrou-se, assim, apropriado
para a finalidade proposta.
1. INTRODUÇÃO
O Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA, 2016) estima a ocorrência
de 181 mil novos casos de cânceres de pele no Brasil no ano de 2016, um número bastante
expressivo, visto que este é um dos mais frequentes no Brasil, correspondendo a até 25% dos tumores
malignos registrados, sendo classificados em dois grandes tipos, melanoma e não melanoma.
As diretrizes diagnósticas e terapêuticas empregadas nos tratamentos de melanomas malignos
cutâneos locais é determinada pela Portaria 357, redigida pelo Ministério da Saúde (2013). Existem
três rotas de tratamento, a cirúrgica, curativa em 70 a 90% dos casos, a radioterapia e o tratamento
adjuvante sistêmico, podendo ser recomendada a combinação de mais de uma destas rotas.
Com isso em mente, neste trabalho objetivou-se o desenvolvimento de um dispositivo para
tratamento adjuvante local, na forma de uma membrana polimérica com um fármaco incorporado.
Tal abordagem viabilizaria a farmacoterapia tópica de maneira alternativa ao uso convencional
de cremes, a qual representa expressiva parte dos tratamentos onde não há excisão tumoral. Dentre os
fármacos elegíveis, tais como 5-Fluorouracil, Imiquimode, Diclofenaco, Mebutato de Ingenol e
Retinoides, selecionou-se o Imiquimode, com base nos trabalhos de Micali et al. (2014a-b), devido a
seu prolongado uso clínico, amplo suporte da literatura e à sua ação como modificador de resposta
imune.
Membranas poliméricas são já costumeiramente utilizadas na administração de uma variedade
de fármacos, como hormônios, podendo ser constituídas tanto por polímeros sintéticos quanto de
origem biológica. Neste trabalho, optou-se pelo uso de membranas formadas pela complexação de
quitosana e alginato, já que estes apresentam custo relativamente baixo, baixa toxicidade e ainda
biocompatibilidade adequada (Chandy e Sharma, 1990).
Portanto, para analisar a factibilidade da utilização deste tratamento, utilizou-se membranas de
Quitosana e Alginato (QA), com diferentes quantidades de Imiquimode adicionadas durante sua
confecção, quantidades estas definidas com base no trabalho realizado por Donnelly et al. (2006), no
qual o dispositivo produzido foi comparado com o creme Aldara® disponível comercialmente.
Decidiu-se, assim, trabalhar com a mesma carga de fármaco por cm² utilizada por estes autores, e
ainda com uma segunda formulação com apenas 10% desta quantidade, comparando-se os efeitos
destas adições à membrana sem fármaco a partir de diversas caracterizações, tais como diâmetro,
espessura, opacidade e microscopia eletrônica de varredura (MEV) e avaliando-se também a cinética
de liberação resultante.
2. MATERIAIS E MÉTODOS
2.1. Preparação das Membranas
Na preparação de todas as membranas envolvidas neste trabalho, adaptou-se o procedimento
pré-estabelecido por Bueno e Moraes (2011), utilizando-se os polímeros quitosana (Sigma-Aldrich,
lote STBF3507V, com grau de desacetilação 96%) e alginato de média viscosidade (Sigma Aldrich,
lote 058K0126), com a mudança apenas da adição do Imiquimode (gentilmente doado pela empresa
EMS, lote número M626368) seguido de mais um período de agitação de 10 minutos antes da
desaeração para as formulações contendo o fármaco.
2.2. Caracterização das Membranas
Para caracterizar as membranas, seguiu-se também os procedimentos propostos por Bueno e
Moraes (2011), realizando-se a análise quanto à microscopia eletrônica de varredura (MEV),
espessura, diâmetro, opacidade e cinética de liberação do fármaco em solução hidro-etanólica.
A análise por MEV foi realizada no LRAC (Laboratório de Recursos Analíticos e Calibração,
FEQ/UNICAMP), utilizando-se o microscópio LEO 440, onde as amostras devidamente
criofraturadas em nitrogênio líquido foram fixadas em suporte adequado e metalizadas (Sputter coater
Polaron modelo SC 7620, Microtech) com a deposição de uma fina camada de ouro.
A avaliação da espessura foi realizada com o auxílio de um micrômetro Digimess e do
diâmetro, com uma régua de 30 cm (Marte) aferida.
O ensaio de opacidade foi realizado utilizando-se do colorímetro Hunterlab (Colorquest II,
Faifax, EUA), com os padrões CIELab, seguindo o método Hunterlab (Hunter Associates Laboratory,
1997).
Finalmente, o ensaio de cinética de liberação foi feito a partir da imersão de amostras de 2 cm
por 2 cm de membranas das duas formulações em 50 mL de solução hidro-etanólica na proporção de
80:20 (v/v), em frascos armazenados a 37°C e 100 rpm de agitação. Em intervalos pré-determinados
alíquotas de 1 mL foram coletadas e analisadas em espectrofotômetro a 245,5 nm e posteriormente
retornadas ao frasco.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Análise da Morfologia por Microscopia Eletrônica de Varredura
Os resultados da análise por microscopia eletrônica de varredura realizada para os três tipos de
formulações de membranas podem ser vistos na Figura 1.
Pode-se verificar que a estrutura da membrana com formulação apenas de quitosana e alginato,
apresenta-se bastante lisa e fina, sem grandes rugosidades ou imperfeições.
Já quando se adicionou 0,1 g do fármaco, embora a semelhança mantenha-se bastante grande, é
possível observar dezenas de pequenas bolsas na estrutura da membrana, onde os cristais do fármaco
alojaram-se. Mais claramente ainda é o corte transversal, onde pequenos cristais do fármaco podem
ser vistos, ainda que levemente fraturados.
Finalmente, a adição de 1,0 g de Imiquimode alterou drasticamente a topografia da membrana,
sendo que ambas as vistas, tanto superficial quanto transversal, mostram a membrana toda tomada
pelos depósitos dos cristais de Imiquimode, mostrando que a superfície da membrana deixou sua
forma lisa para adquirir uma forma bastante corrugada no âmbito micrométrico, com mais bolsas de
fármaco que espaços vazios distribuídos em sua estrutura.
Figura 1 – Visão da superfície (imagens à esquerda) e corte transversal (imagens à direita) de
membranas de QA sem fármaco (a e b), com adição de 0,1 g de Imiquimode (c e d) e com adição de
1,0 g de fármaco (e e f).
3.2. Diâmetro e Espessura
É possível observar através das Figuras 2 e 3 que a adição do fármaco Imiquimode proporciona
uma compactação na estrutura do polieletrólito, fazendo com que suas cadeias poliméricas se
rearranjem devido provavelmente à interação do grupo amina presente na estrutura do Imiquimode
com os grupos carboxila do alginato, de modo que o diâmetro da membrana diminui, e a sua
espessura aumenta.
Enquanto o diâmetro sofre uma redução de aproximadamente 6% para adição de 0,1 g e de 19%
para 1,0g, a espessura aumenta em aproximadamente 39% na primeira formulação com o fármaco, e
mais de 213% na segunda.
Figura 2 – Efeito da adição de Imiquimode no diâmetro de membranas de QA.
Figura 3 - Efeito da adição de Imiquimode na espessura de membranas de QA.
3.2. Opacidade
Como pode ser visto na Figura 4, assim como foi possível observar com a espessura, a adição
do fármaco à formulação das membranas de quitosana e alginato proporcionou um aumento de 10%
na opacidade quando adicionado 0,1 g de Imiquimode, e um aumento de 18% com 1,0 g, fato que
pode ser explicado pela grande quantidade incorporada de fármaco, o qual é um pó branco e fino.
Figura 4 - Efeito da adição de Imiquimode na opacidade de membranas de QA.
3.1. Cinética de Liberação
Na Figura 5 estão apresentados os dados obtidos com o ensaio de cinética de liberação. É
possível observar que o Imiquimode apresenta uma liberação máxima entre aproximadamente 10 e
15 horas em contato com solução.
O mecanismo dominante de liberação deste fármaco deve ser provavelmente o de difusão lenta,
entretanto, podem ter também papel significativo o intumescimento da matriz e a cinética de
dissolução dos cristais de Imiquimode.
Resumidos na Tabela 1 estão os valores observados em aproximadamente 6 horas, dados estes
utilizados para a comparação com a literatura e para a análise de viabilidade de utilização prática
desta composição. É possível observar que a membrana com formulação contendo maior quantidade
de fármaco liberou nas 6 primeiras horas aproximadamente 60% da massa disponibilizada pelo creme
disponível comercialmente, mostrando-se uma possível alternativa.
Figura 6 – Massa de Imiquimode (mg) liberado com o tempo (h) para as formulações de 0,1 g de
fármaco (○) e 1,0 g (▲) à temperatura de 37ºC e agitação de 100 rpm.
Tabela 1 – Massa de Imiquimode liberada após 6 horas para diferentes veículos de liberação.
a
Formulação
Massa de Imiquimode liberada
após 6 h (mg)
Fração de Imiquimode
liberada após 6 h (%)
Creme Aldara®
2,00 ± 0,15a
11,93 ± 0,87a
QA+0,1 g Imiquimode
0,17 ± 0,01
12,87 ± 3,06
QA+1,0 g Imiquimode
1,23 ± 0,39
10,85 ± 3,64
Dados de Donnelly et al (2006)
4. CONCLUSÕES
As membranas de quitosana e alginato mostraram-se possíveis alternativas ao presente
dispositivo de liberação comercial em creme existente. Através de estudos preliminares foi possível
determinar que a membrana com formulação de 1,0 g de Imiquimode em sua composição foi capaz de
liberar nas 6 primeiras horas aproximadamente 60% da quantidade liberada pelo creme.
5. AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à CAPES e ao CNPq pelo apoio e à EMS pela gentil cessão do fármaco
Imiquimode.
6. REFERÊNCIAS
BUENO, C. Z.; MORAES, Â. M. Development of Porous Lamellar Chitosan-Alginate Membranes:
Effect of Different Surfactants on Biomaterial Properties. J. Appl. Polym. Sci., v. 122, n. 1, p. 624631, 2011.
CHANDY, T.; SHARMA, C. P. Chitosan-as a Biomaterial. Artif. Cells, Blood Substitutes
Biotechnol., v. 18, n. 1, p. 1–24, 1990.
DONNELLY, R. F.; MCCARRON, P. A.; ZAWISLAK, A. A.; WOOLFSON, D. A. Design and
physicochemical characterisation of a bioadhesive patch for dose-controlled topical delivery of
imiquimod. Int. J. Pharm., v. 307, n. 2, p. 318-325, 2006.
INCA. Instituto Nacional de Câncer. Estimativa 2014 – Síntese de Resultados e Comentários, 2014.
Disponivel em: <http://www.inca.gov.br/estimativa/2014/sintese-de-resultados-comentarios.asp>.
Acesso em: 06 Fevereiro 2016.
HUNTER ASSOCIATES LABORATORY. Universal software, version 3.2. Reston. 1997.
MICALI, G.; LACARRUBBA, F.; NASCA, M. R.; SCHWARTZ, R. A. Topical pharmacotherapy
for skin cancer - Part I. Pharmacology. J. Am. Acad. Dermatol., v. 70, n. 6, p. 965e1 - 979e12, 2014a.
MICALI, G.; LACARRUBBA, F.; NASCA, M. R.; SCHWARTZ, R. A.; FERRARO, S. Topical
pharmacotherapy for skin cancer - Part II. Clinical applications. J. Am. Acad. Dermatol, v. 70, n. 6, p.
965.e1 - 965.e12, 2014b.
MINISTÉRIO DA SAÚDE, S. D. A. À. S. Ministério da Saúde - Secretaria de Atenção à Saude.
Portaria Nº 357, de 8 de Abril de 2013 - Aprova as Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do
Melanoma
Maligno
Cutâneo.,
2013.
Disponivel
em:
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/sas/2013/prt0357_08_04_2013.html>. Acesso em: 06
Fevereiro 2016.
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