O fim da filosofia e a tarefa do pensamento

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Universidade Federal da Bahia
Faculdade de Direito
Programa de Pós-graduação em Direito
Mestrado
Disciplina: Metodologia da pesquisa em direito
Professores: Rodolfo Pamplona Filho e Nelson Cerqueira
Aluno:Lucas Andrade Pereira de Oliveira
FICHAMENTOS: “Que é metafísica?”, “O fim da filosofia e a tarefa do pensamento”
“Sobre a essência da verdade”, de Heidegger.
O que é metafísica?
Se a ciência tem razão, então uma coisa é indiscutível: a ciência nada quer saber do nada. Esta
é, afinal, a rigorosa concepção científica do nada. Dele sabemos, enquanto dele, do nada, nada
queremos saber. A ciência nada quer saber do nada. Mas não é menos certo também que,
justamente, ali, onde ela procura expressar sua própria essência, ela recorre ao nada. Aquilo
que ela rejeita, ela leva em consideração. Que essência ambivalente se revela ali? (Pág.234)
Onde procuramos o nada? Onde encontramos o nada? Para que algo encontremos não
precisamos, por acaso, já saber que existe? Realmente! Primeiramente e o mais das vezes o
homem somente então é capaz de buscar se antecipou a presença do que busca. Agora,
porém, aquilo que se busca é o nada. Existe afinal um buscar sem aquela antecipação, um
buscar ao qual pertence um puro encontrar? (Pág.236)
Sem
dúvida,
a
angústia
é
sempre
angústia
diante
de,
mas
não
angústia diante disto ou daquilo. A angústia diante de é sempre angústia por
mas não por isto ou aquilo. (Pág.237)
"Estamos suspensos" na angústia. Melhor dito: a angústia nos suspende porque ela põe em
fuga o ente em sua totalidade. Nisto consiste o fato de nós próprios — os homens que somos
— refugiarmo-nos no seio dos entes. È por isso que, em última análise, não sou "eu" ou não és
"tu" que te sentes estranho, mas a gente se sente assim. Somente continua presente o puro
ser-aí no estremecimento deste estar suspenso onde nada há em que apoiar-se. (Pág.237)
O nada se revela na angústia — mas não enquanto ente. Tampouco nos é dado orno objeto. A
angústia não é uma apreensão do nada. Entretanto, o nada se torna nanifesto por ela e nela,
ainda que não da maneira como se o nada se mostrasse separado, "ao lado" do ente, em sua
totalidade, o qual caiu na estranheza. Muito antes, e isto á o dissemos: na angústia deparamos
com o nada juntamente com o ente em sua totalilade. Que significa este "juntamente com"?
(Pág.238)
Ser-aí quer dizer: estar suspenso dentro do nada. Suspendendo-se dentro do nada o ser-aí já
sempre está além do ente em sua totalidade. Este estar além do ente designamos a
transcendência. Se o ser-aí, nas raízes de sua essência, não exercesse o ato de transcender, e
isto expressamos agora dizendo: se o ser-aí não estivesse suspenso previamente dentro do
nada, ele jamais poderia entrar em relação com o ente e, portanto, também não consigo
mesmo. (Pág.239)
Este estar o ser-aí totalmente perpassado pelo comportamento nadificador testemunha a
constante e, sem dúvida, obscurecida revelação do nada, que somente a angústia
originariamente desvela. O estar suspenso do ser-aí dentro do nada originado pela angústia
escondida é o ultrapassar do ente em sua totalidade: a transcendência. (Pág.240)
Somente no nada do ser-aí o ente em sua totalidade chega a si mesmo, conforme sua mais
própria possibilidade, isto é, de todo finito. (Pág.242)
A filosofia somente se põe em movimento por um peculiar salto da própria existência nas
possibilidades fundamentais do ser-aí, em sua totalidade. Para este salto são decisivos:
primeiro, o dar espaço para o ente em sua totalidade; segundo, o abandonar-se para dentro
do nada, quer dizer, o libertar-se dos ídolos que cada qual possui e para onde costuma
refugiar-se sub-repticiamente; e, por último, permitir que se desenvolva este estar suspenso
para que constantemente retorne à questão fundamental da metafísica que domina o próprio
nada. (Pág.242)
A disposição para a angústia é o sim à insistência para realizar o supremo apelo, o único que
atinge a essência do homem. Somente o homem, em meio a todos os entes, experimenta,
chamado pela voz do ser, a maravilha de todas as maravilhas: que o ente é. Aquele que assim
é chamado em sua essência para a verdade do ser está, por isso, continuamente envolvido, de
maneira fundamental, na disposição de humor. A clara coragem para a angústia essencial
garante a misteriosa possibilidade da experiência do ser. Pois, próximo à angústia essencial,
como espanto do abismo, reside o respeito humilde. Ele ilumina e protege aquele lugar da
essência do homem no seio do qual ele permanece familiar no permanente. (Pág.247)
Na medida em que, constantemente, apenas representa o ente enquanto ente, a metafísica
não pensa no próprio ser. A filosofia não se recolhe em seu fundamento. Ela o abandona
continuamente e o faz pela metafísica. Dele, porém, jamais consegue fugir. Na medida em que
um pensamento se põe em marcha para experimentar o fundamento da metafísica, na medida
em que um pensamento procura pensar na própria verdade do ser, em vez de apenas
representar o ente enquanto ente. ele abandonou, de certa maneira, a metafísica. (Pág.254)
Se se considera que na linguagem da metafísica a palavra "existência"' designa o mesmo que
"ser-aí", a saber, a atualidade de tudo o que é atual, desde Deus até o grão de areia é claro que
apenas se desloca — quando se entende a frase linearmente — a dificuldade do que deve ser
pensado da palavra "ser-aí" para a palavra "existência". O nome "existência" é usado, em Ser e
Tempo, exclusivamente como caracterização do ser do homem. A partir da "existência"
corretamente pensada se revela a "essência" do ser-aí, em cuja abertura o ser se revela e
oculta, se oferece e subtrai, sem que esta verdade do ser no ser-aí se esgote ou se deixe
identificar com o ser-aí ao modo do princípio metafísico: toda objetividade é, enquanto tal,
subjetividade. (Pág.257)
O fim da filosofia e a tarefa do pensamento
Filosofia é Metafísica. Esta pensa o ente em sua totalidade — o mundo, o homem, Deus — sob
o ponto de vista do ser, sob o ponto de vista da recíproca imbricação do ente e ser. (Pág.269)
O fim da Filosofia é o lugar, é aquilo em que se reúne o todo de sua história, em sua extrema
possibilidade. Fim como acabamento quer dizer esta reunião. Fim é, como acabamento, a
concentração nas possibilidades supremas. Pensamos estas possibilidades de maneira muito
estreita enquanto apenas esperarmos o desdobramento de novas filosofias do estilo até agora
vigente. Esquecemos que já na época da filosofia grega se manifesta um traço decisivo da
Filosofia: é o desenvolvimento das ciências em meio ao horizonte aberto pela Filosofia. O
desenvolvimento das ciências é, ao mesmo tempo, sua independência da Filosofia e a
inauguração de sua autonomia."Este fenômeno faz parte do acabamento da Filosofia. Seu
desdobramento está hoje em plena marcha, em todas as esferas do ente. Parece a pura
dissolução da Filosofia; é, no entanto, precisamente seu acabamento. (Pág.270)
Aquilo que a Filosofia, no transcurso de sua história, tentou em etapas, e mesmo nestas de
maneira insuficiente, isto é, expor as ontologias das diversas regiões do ente (natureza,
história, direito, arte), as ciências o assumem como tarefa sua. Seu interesse dirige-se para a
teoria dos, em cada caso necessários, conceitos estruturais do campo de objetividade aí
integrado. (Pág.270)
Fim da Filosofia quer dizer: começo da civilização mundial fundada no pensamento ocidentaleuropeu. (Pág.271)
O chamado à "questão mesma" exige o método adequado da Filosofia. Todavia, o que é a
questão da Filosofia se aceita já por decidido previamente. A questão da Filosofia como
metafísica é o ser do ente, sua presença, na forma da substan-cialidade e subjetividade.
(Pág.273)
Todo o pensamento da Filosofia, que. expressamente ou não segue o chamado "às coisas
mesmas", já está, em sua marcha, com seu método, entregue à livre dimensão da clareira. Da
clareira, todavia, a Filosofia nada sabe. Não há dúvida que a Filosofia fala da luz da razão, mas
não atenta para a clareira do ser. O lumen naturale, a luz da razão, só ilumina o aberto. Ela se
refere certamente à clareira; de modo algum, no entanto, a constitui, tanto que dela antes
necessita para poder iluminar aquilo que na clareira se presenta. (Pág.276)
A Alétheia, o desvelamento, devem ser pensados como a clareira que assegura ser e pensar e
seu presentar-se recíproco. Somente o coração silente da clareira é o lugar do silêncio do qual
pode irromper algo assim como a possibilidade do comum-pertencer de ser e pensar, isto é, a
possibilidade do acordo entre presença e apreensão. (Pág.277)
A questão da Alétheia, a questão do desvelamento como tal, não é a questão da verdade. Foi
por isso inadequado e, por conseguinte, enganoso, denominar a Alétheia, no sentido da
clareira, de verdade. (Pág.278)
A Essência da Verdade
Trata-se da essência da verdade. A pergunta pela essência da verdade não se
preocupa com o fato de a verdade ser a v erdade da experiência prática da
vida ou a da conje -tura no campo econô mico, a verdade de uma reflexão
técnica ou de uma prudência polí tica; ou, mais especialmente, com o fato de
a verdade ser a verdade da pesquisa científica o u da criação artística, ou
mesmo a verdade de uma meditação filosófica ou de uma fé religiosa. A
pergunta pela essência se afasta de tudo isto e dirige seu olhar para aquilo
que unicamente caracteriza toda "verdade" enquanto tal. (Pág.32 9)
Um pensamento radical voltado para o re al deve aspirar, primeiramente e
sem rodeios, a instaurar a verdade real que hoje nos oferece medida e
segurança contra a co nfusão da opinião e do cálculo. Que importa, em nossa
indigência concreta, a questão da essência da verdade que em sua abstração
se afasta de toda realidade? Não é a questão da essência o problema mais
inessencial e mais gratuito que se possa colocar? (Pág.329)
Veritas significa por to da parte e essencialmente a convenientia e a concordância
dos entes entre si que, por sua vez, se fun dam sobre a concordância das
criaturas com o criador, "harmonia" deter minada pela ordem da criação.
(Pág.332)
A relação da enunciação apresentat iva com a coisa é a realização desta
referência: esta se rea liza. originariamente e cada vez. como o desencade ar
de um comportamento. Todo o compor tamento, porém, se caracteriza pelo
fato de, estabelecido no seio do aberto, se manter referido àquilo que é
manifesto enquanto tal. (Pág.334)
Assim, cai por terra a atribuição tradicional e exclusiva da verdade à
enunciação. tida como o único lugar essencial da verdade. A verdade
originária
não
tem
sua
morada
original
na
proposição.
Mas
surge
simultaneamente a seguinte questão: qual é o funda mento da possibilidade
intrínseca
da
abertura
que
mantém
o
comportamento
e
q ue
se
dá
antecipadamente uma medida? É somente desta possibilidade intrínseca da
abertura do comportamento que a conformidade da proposição recebe a
aparência de realizar a essência da verdade. (Pág.334)
A abertura que mantém o comportamento, aquilo que torna intrinsecamente
possível a conformidade, se funda na liberdade. A essência da verdade é a
liberdade.(Pág.335)
Situar a essência da v erdade na liberdade não significa, por acaso , entregar a
verda de ao arbítrio humano? Pode -se sabo tar mais profundamen te a verdade
do
que
a
abando nando
ao
arbítrio
deste
"caniço
instáv el"?
O
que
constantemente se impôs ao bom senso durante a discussão manifesta -se
agora de modo mais claro: a verdade é aqui deslocada para a subjetividade
do sujeito humano. M esmo que este sujeito tenha acesso a uma o bje tividade,
ela permanece, porém, do mesmo modo humana como esta subjetividade e
posta à disposição do homem.(Pág.335)
A reflexão sobre o laço essencial entre a verdade e a liberdade nos leva a
perseguir o problema da essênci a do homem, dentro de uma perspectiva que
nos garantirá a experiência de um fundamento original oculto do homem (do
ser-aí) e isto de tal maneira que esta reflexão nos transporta primeiramente
para o âmbito onde a essência da verdade se desdobra originaria mente.
(Pág.335)
A liberdade em face do que se revela no seio do aberto deixa que cada ente
seja o ente que é. A liberdade se revela então como o que deixa -ser o ente.
(Pág.336)
Deixar-ser o ente — a saber, como ente que ele é — significa entregar -se ao
aberto e à sua abertura, na qual todo ente entra e permanece, e que cada
ente traz, por assim dizer, consigo. Este aberto foi co ncebido
pelo
pensamento ocidental, desde o seu começo, como tà aléthea, o desvelado. Se
traduzimos a palavra alétheia por "desvelam ento", em lugar de "v erdade", esta
tradução não é somente mais "literal", mas ela com preende a indicação de
repensar
mais
originalmente
a
noção
corrente
de
verdade
como
conformidade da enunciação, no sentido, ainda incompreendido, do caráter
de ser desvelado e do desvelamento do ente. (Pág.336)
A liberdade não é so mente aquilo que o senso comum faz co m facilidade
circular sob tal nome: a veleidade que de vez em quando se manifesta em
nós, de oscilarmos, em nossa escolha ora para este, ora para aquele extremo.
A liberdade também não é ausência pura e simples de constrangimento
relativa às nossas possibilidades de ação ou de inação . Antes de tudo, a
liberdade é o abando no ao desvelamento do ente enquanto tal. (Pág.336)
O deixar-ser é. em si mesmo, simul taneamente, uma dissimulação. Na
liberdade ek-sistente do ser -aí aco ntece a dissimulação do ente em sua
totalidade, é o velamento.(Pág.339)
Todo o comportamento possui sua maneira de errar, correspondente à
abertura que mantém e à sua relação com o ente e m sua totalidade. O erro se
estende desde o me comum engano, inadvertência, erro de cálculo, até o
desgarramento e o perder -se de nas atitudes e nossas decisões essenciais.
Aquilo que o hábito e as doutrinas filosóficas chamam erro, isto é. a não conformidade do juízo e a falsidade do co nhecimento, é apenas um modo e
ainda o mais superficial de errar. A errância na qual a humanidade historial
se deve movimentar para que se possa dizer que sua marcha é errante é uma
componente essencial da abertura do ser -aí. A errância domina o homem
enquanto o leva a desgarrar. (Pág.341)
O ensaio aqui apresentado conduz a questão da verdade para além dos
limites tradicionais da concepção comum e auxilia a reflexão a se perguntar
se a questão da essência da verdade não deve ser. ao mesmo tempo e
primeiramente, a questão da verdade da essência. (Pág.343)
A questão da verdade da essência entende essência em sentido verbal e
pensa, nesta pala vra, ainda permanecendo no âmbito da representação
metafísica, o ser (Seyn) como a diferença que impera entre ser e ente. Verdade
significa o velar iluminador enquanto traço essencial do ser (Seyn). (Pág.343)
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