UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM SELEÇÃO 2012 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGUÍSTICOS Nome do(a) candidato(a): ___________________________________ INSTRUÇÕES 1. Use caneta de tinta azul ou preta. 2. Identifique-se de forma legível nesta folha de rosto. 3. Considerando que, para a correção, esta prova será desidentificada, não assine e nem faça, no espaço destinado às respostas definitivas, qualquer marca que possa identificá-lo(a). 4. A prova terá a duração de 04 (quatro) horas, não havendo tempo adicional para transcrição das respostas definitivas. 5. Se quiser, utilize as folhas de rascunho. 6. Todo o material da prova será recolhido. ATENÇÃO: Dentre as questões abaixo, escolha DUAS e responda-as. OBS 1: Para os candidatos à área de Filologia, uma das questões, obrigatoriamente, será a nº 1. OBS 2: Para os candidatos a vagas oferecidas pelo Prof. Dr. Sergio Flores, uma das questões, obrigatoriamente, será a nº 2. 1. Carolina Michaëlis de Vasconcelos, citada em Andrade (2007, p.9), afirma: Filologia é, portanto, etimologicamente: amor à ciência; o culto da erudição ou da sabedoria em geral e em especial, o amor e culto às ciências do espírito (Geisteswissenschaften), sobretudo da ciência da linguagem [...]. Comente esta frase e discorra sobre Filologia: concepções, funções, objeto de análise e as ciências que a auxiliam. 2. Em Identidade e discurso (CORACINI, 2003), é abordada a identidade enquanto propiciadora da materialização da linguagem verbal e não-verbal. Comente um dos artigos presentes na obra, referindo-se ao modo como se sustenta a relevância do componente identitário na linguagem. 3. Discuta, com base na bibliografia indicada, a afirmação abaixo: Uma das razões que explicam o fracasso do ensino da produção escrita, e também da leitura, é a artificialidade com que tais atividades são propostas na escola (GERALDI, 1993; LOPES ROSSI, 2002). Sem ter o que dizer, nem razão para fazêlo, já que não se estabelece uma finalidade para sua produção escrita; sem ter um interlocutor a quem dizer o que tem a dizer, uma vez que somente o professor ocupa esse lugar; sem dominar os mecanismos lingüísticos e discursivos que permitem a transformação da língua em discurso, além da instauração de um locutor desse discurso e da sua construção coesa e coerente, o aluno não é chamado a fazer parte do seu próprio processo de ensino-aprendizagem. Essa exclusão traz a conseqüência óbvia da reprodução, isto é, da não-aprendizagem, da qual todos os professores se ressentem, independentemente de nível ou grau de ensino (PETRONI, 2008, p. 10). 4. Leia o trecho a seguir: Nosso principal objetivo foi reunir textos em sintonia com abordagens críticas direcionadas para a relação entre educação linguística e mudança social, atendendo as transformações decorrentes do conhecimento científico que afetam as concepções de linguagem e educação, produzindo reformas educacionais. No Brasil, por exemplo, os documentos oficiais passaram a postular um novo modelo educacional, centrado na formação integral do profissional cidadão-crítico, capaz de se engajar e engajar outros no discurso, de modo a poder agir no mundo social [...] (BARROS & ASSIS-PETERSON, 2010, p.09). Com base nesse trecho e em suas leituras, discorra sobre a noção de educação crítica e seu efeito no processo de ensino/aprendizagem de língua. 5. Leia este trecho de uma obra bakhtiniana e, com base no que foi exposto, responda às duas questões abaixo (de forma associada, se desejar): Quanto melhor dominamos os gêneros tanto mais livremente os empregamos, tanto mais plena e nitidamente descobrimos neles a nossa individualidade (onde isso é possível e necessário), refletimos de modo mais flexível e sutil a situação singular da comunicação; em suma, realizamos de modo mais acabado o nosso livre projeto de discurso. Desse modo, ao falante não são dadas apenas as formas de enunciado para ele obrigatórias, isto é, os gêneros do discurso: estes são tão indispensáveis para a compreensão mútua quanto as formas da língua. Os gêneros do discurso, comparados às formas da língua, são bem mais mutáveis, flexíveis e plásticos; entretanto, para o indivíduo falante eles têm um significado normativo, não são criados por ele mas dados a ele. Por isso um enunciado singular, a despeito de toda a sua individualidade e do caráter criativo, de forma alguma pode ser considerado uma combinação absolutamente livre de formas da língua, como o supõe, por exemplo, Saussure (e muitos outros lingüistas que o secundam), que contrapõe enunciado (la parole) como ato puramente individual ao sistema da língua como fenômeno puramente social e obrigatório para o indivíduo. A imensa maioria dos lingüistas, se não na teoria, na prática está na mesma posição: vêem no enunciado apenas uma combinação individual de formas puramente da língua (léxicas e gramaticais), e na prática não enxergam nem estudam nela nenhuma outra forma normativa (BAKHTIN, 2003, p. 285-286). a) O que significa dizer que os gêneros do discurso têm, para o falante, um significado normativo? Exemplifique b) Por que Bakhtin diz que um enunciado singular não pode ser considerado, conforme quis Saussure, uma combinação absolutamente livre de formas da língua? 6. Leia o excerto abaixo, extraído do volume “Por uma vida melhor”, da coleção VIVER, APRENDER, adotada pelo MEC para a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em maio deste ano, o conteúdo deste trecho motivou uma ruidosa polêmica amplamente promovida e divulgada pela mídia. Nessa contenda, sujeitos alinhados com a gramática normativa e sujeitos alinhados com a linguística se bateram belicosamente. Basicamente, o pivô da discórdia é a postura assumida por uns e outros diante das variações do português brasileiro. Depois de ler cuidadosamente o excerto seguinte, assuma o viés da sociolingüística e/ou da análise de discurso e comente a polêmica em questão. “A concordância entre as palavras A concordância entre as palavras é uma importante característica da linguagem escrita e oral. Ela é um dos princípios que ajudam na elaboração de orações com significado, porque mostra a relação existente entre as palavras. Verifique como isso funciona: Alguns insetos provocam doenças, às vezes, fatais à população ribeirinha. insetos (mascu doenças (feminino, plural) <= fatais (feminino, plural) população (feminino, singular) <= ribeirinha (feminino, singular) As palavras centrais (insetos, doenças, população) são acompanhadas por outras que esclarecem algo sobre elas. As palavras acompanhantes são escritas no mesmo gênero (masculino/feminino) e no mesmo número (singular/plural) que as palavras centrais. Essa relação ocorre na norma culta. Muitas vezes, na norma popular, a concordância acontece de maneira diferente. Veja: Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado. livro (masculino, singular) => os (masculino, plural) ilustrado (masculino, singular) interessante (masculino, singular) emprestado (masculino, singular) Você acha que o autor dessa frase se refere a um livro ou a mais de um livro? Vejamos: O fato de haver a palavra os (plural) indica que se trata de mais de um livro. Na variedade popular, basta que esse primeiro termo esteja no plural para indicar mais de um referente. Reescrevendo a frase no padrão da norma culta, teremos: Os livros ilustrados mais interessantes estão emprestados. Você pode estar se perguntando: “Mas eu posso falar ‘os livro?’.” Claro que pode. Mas fique atento porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas. O falante, portanto, tem de ser capaz de usar a variante adequada da língua para cada ocasião. Existe outro tipo de concordância: a que envolve o verbo. Observe seu funcionamento: O menino pegou o peixe. menino => singular pegou => singular Os meninos pegaram o peixe. meninos => plural pegaram => plural O menino pegou o peixe. menino => 3.ª pessoa pegou => 3.ª pessoa Eu peguei o peixe. eu => 1.ª pessoa peguei => 1.ª pessoa Na norma culta, o verbo concorda, ao mesmo tempo, em número (singular/plural) e em pessoa (1.ª/2.ª/3.ª) com o ser envolvido na ação que ele indica. Na variedade popular, contudo, é comum a concordância funcionar de outra forma. Há ocorrências como: Nós pega o peixe. nós => 1.ª pessoa, plural pega => 3.ª pessoa, singular Os menino pega o peixe. menino => 3.ª pessoa, ideia de plural (por causa do “os”) pega => 3.ª pessoa, singular Nos dois exemplos, apesar de o verbo estar no singular, quem ouve a frase sabe que há mais de uma pessoa envolvida na ação de pegar o peixe. Mais uma vez, é importante que o falante de português domine as duas variedades e escolha a que julgar adequada à sua situação de fala.” (AGUIAR, C. A. de et alii. Por uma vida melhor. Coleção Viver, Aprender. São Paulo: Editora Global, 2011, p. 14-16).