Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 PKS PUBLIC KNOWLEDGE PROJECT OJS REVISTA DE GEOGRAFIA (UFPE) www.ufpe.br/revistageografia OPEN JOURNAL SYSTEMS O GERENCIAMENTO COSTEIRO DO LITORAL NORTE DO ESTADO DE SÃO PAULO – UMA ANÁLISE COM DESTAQUE PARA O MUNICÍPIO DE UBATUBA Monika Richter1; Elizabeth Maria Feitosa da Rocha de Souza2 Professor Doutor – Departamento de Educação e Sociedade - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Av. Roberto da Silveira s/n – Moquetá – Nova Iguaçu - RJ, Email:[email protected]; 1 2 Professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro Email:[email protected] RESUMO O gerenciamento costeiro é um importante instrumento de planejamento ambiental. O histórico apresentado para o município de Ubatuba em SP representa um importante exemplo de amadurecimento e integração de ações e atores para a implantação desse instrumento. Apesar de várias estratégias e a implantação de regras definidoras de uso, o rápido crescimento populacional não impediu a degradação dos recursos, e a pressão antrópica nas áreas que deveriam ser conservadas. Todavia, dentro dessa gestão integrada, observou-se uma lacuna com respeito à aplicação de um dos principais instrumentos do gerenciamento costeiro: o sistema de informação. A disponibilidade da informação geraria um novo quadro participativo, minimizando inclusive a especulação imobiliária sobre as áreas com maiores restrições ambientais, consequentemente minimizando as pressões sobre elas. Palavras-chaves: Gerenciamento costeiro, geoprocessamento, análise ambiental COASTAL MANAGEMENT IN THE NORTH COAST OF SÃO PAULO STATE - AN ANALYSIS WITH REFERENCE TO THE CITY OF UBATUBA ABSTRACT The coastal management is an important tool for environmental planning. The situation presented to Ubatuba's town in SP represents an important example of maturity and integration of actions and actors for the implementation of this instrument. Although various strategies and implementation of rules defining the use, rapid population growth has not prevented the degradation of resources, and human pressure on areas that should be preserved. However, within this management integrated, there was a gap with respect to the application of one of the main instruments of coastal management: the information system. The availability of information would create a new participatory framework, including minimizing speculation about the areas with greater environmental restrictions, thus minimizing the pressure on them. Keywords: Management of coastal, geoprocessing, Environmental analysis Richter e Souza, 2012 6 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 desordenado ao longo da costa, esta deve INTRODUÇÃO A problemática ambiental da zona costeira é facilmente constatada pelo grau de degradação de seus ambientes naturais em decorrência da ocupação acelerada e inadequada do solo, uso irracional dos recursos marinhos, pressão demográfica, expansão urbano-industrial, exploração turística, dentre outros (MMA, 2005). Todos esses fatores de degradação aceleraram-se nas últimas décadas gerando impactos sem precedentes (Moraes, 1999). A zona costeira é definida como “espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra incluindo os seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre” (PNGC, 1988). Sua delimitação brasileira na faixa terrestre se dá a partir dos municípios que sofrem influência direta dos fenômenos ocorrentes na faixa marítima, compreendendo cerca de 395 municípios em 17 estados, num total de 8.698km de costa (MMA, 2006). Em toda a sua extensão, diversos são os ecossistemas: manguezais, restingas, costões rochosos, estuários, lagoas, etc, que somados às peculiaridades enorme locais, diversidade demonstram de a comunidades naturais. Em razão da forte concentração populacional - cerca de ¼ do País (ibid) – aliada a Richter e Souza, 2012 um padrão de ocupação apresentar gerenciamento particular devido à complexidade e singularidade da dinâmica dos processos ambientais e sociais típicos dos ambientes litorâneos (MMA, 1996). Dessa forma, com o objetivo de descentralizar o gerenciamento dessa complexa faixa a Lei Federal no 7.661/88, que dispõe sobre o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro estabelece que, cada estado e município instituam seu respectivo plano em conformidade com a legislação federal. Especialistas (Cicin-Sain & Belfiore, 2005; Pollete & Silva, 2003) reforçam que aliado a esse planejamento descentralizado, deve-se considerar os princípios do gerenciamento integrado que busca compatibilizar a utilização e a ocupação da zona costeira com os mais diversos interesses políticos, sociais, econômicos e conservacionistas. Nesse sentido, o Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro de São Paulo, promulgado em 1998 e regulamentado para o litoral norte do estado em 2004, apresenta abordagens integradoras, envolvendo diversos atores sociais como órgãos governamentais e não governamentais, assim como a iniciativa privada (SMA, 1996). O estado de São Paulo, com cerca de 700 km de extensão de zona costeira, possui áreas ainda bem 7 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 preservadas como o complexo Estuarino- estado de São Paulo, destacando o Lagunar de Iguape e Cananéia, áreas com município de Ubatuba, por apresentar ocupação urbana muito intensa como a atualmente o mais acelerado processo de região da Baixada Santista e áreas, como o ocupação de todo o litoral paulista em litoral norte, cuja taxa de urbanização atual função do aumento na demanda de apresenta-se acima das médias estaduais, segundas residências. Para tanto, foram conflitando levantados com os objetivos de dados secundários das conservação da Mata Atlântica e dos características socioambientais da área de ecossistemas costeiros. Os estudos para o estudo, zoneamento do litoral norte se iniciaram regulamentação da ocupação do solo em 1990 em nível municipal com o (Zoneamento Costeiro), realizadas visitas objetivo de também subsidiar a elaboração de campo e entrevistas junto aos órgãos dos planos diretores municipais. Todos os estaduais produtos gerados foram discutidos em sediados no município, bem como foram diversas reuniões públicas realizadas na gerados dados primários a partir da procura de soluções conjuntas para os construção do mapa temático de uso e problemas detectados (SMA, op. cit). ocupação atualizado do município. sobre de o processo licenciamento de ambiental No entanto, além da abordagem integradora é de suma importância para a implantação do monitoramento Zoneamento, frequente e o uma II. DISCUSSÃO O Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro (PEGC) Em fiscalização atuante e bem estruturada. Como se trata de ordenamento territorial com cunho ambiental envolvendo um conjunto considerável de dados e informações geográficas, os sistemas de informações tornam-se estratégicos como ferramenta de análise e de monitoramento, tendo sido, portanto, previstos em lei (SIGERCO e os SIs estaduais e O presente trabalho teve como analisar foi o Programa Estadual de Gerenciamento Costeiro de São Paulo, através de convênio com o governo federal e coordenado pela Comissão Interministerial para os Recursos do Mar – CIRM (SMA, 1996). E, sendo o macrozoneamento preliminar e condição etapa necessária as atividades posteriores de gerenciamento e o processo de do estado iniciou seu processo de implementação do programa na região de gerenciamento costeiro do litoral norte do Richter e Souza, 2012 instituído monitoramento (Moraes, 1993), o governo municipais). objetivo 1987 7 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 maior crescimento do estado: o Litoral ocasião dos respectivos zoneamentos, Norte (SMA, op cit). tendo por objetivo identificar as unidades A construção da proposta foi desenvolvida territoriais segundo características físicas, a partir da análise de um conjunto de biológicas critérios gerais de enquadramento de considerando também a dinâmica e os unidades territoriais em cinco zonas-tipo contrastes internos. (apresentadas no item Decreto Estadual Nº 49.215/2004), que tiveram e Finalmente socioeconômicas, em dezembro de como 2004, mais de dez anos após o inicio dos embasamento para a sua deleimitação a estudos e da realização de audiências setorização funcional e públicas com a participação da sociedade, preservação, turismo de o governo do estado edita o Decreto segunda residência, e pólos de comércio e Estadual no 49.215, que dispõe sobre o serviços) e a compartimentação ambiental Zoneamento Costeiro do Litoral Norte de (ibid). São Paulo. (conservação e ocupação No entanto, em 1995 entrou em pauta o projeto de lei do plano estadual, O Litoral Norte de São Paulo e o Decreto 49.215/04 acirrando diversos conflitos de interesse e - Caracterização da Área paralisando temporariamente o processo de Este setor costeiro do estado elaboração do zoneamento do litoral norte compreende uma faixa litorânea de 161 (SMA, 2006). Km, que se estende de São Sebastião até Posteriormente, a lei estadual n° Ubatuba na divisa com o estado do Rio de 10.019 de 3 de julho 1998 institui o PEGC, Janeiro, englobando 4 municípios, 164 incorporando as zonas tipo definidas praias e 17 ilhas. O Litoral Norte recebe durante o estudo para o macrozoneamento cerca de um milhão de visitantes entre do litoral norte. Esta incorporação resultou janeiro na divisão da zona costeira em quatro paisagístico principal é, além da costa grandes áreas de planejamento: litorânea, a Serra do Mar e a Mata 1. Litoral Norte; 2. Baixada Santista; 3. Complexo fevereiro. recurso No estado de São Paulo restam 1,7 Estuarino Vale do Ribeira. Cada setor costeiro terá sua milhão de hectares de Mata Atlântica, sendo que cerca de 80% estão localizados no litoral. Parte desta floresta está delimitada pelos 300 mil hectares do caracterização e delimitação descritos por Richter e Souza, 2012 Seu Atlântica. Lagunar de Iguape-Cananéia; e 4. e 8 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 Parque Estadual da Serra do Mar, que impostos abrange grande parte do território de todos segunda residência. os municípios do Litoral Norte (SMA, op referentes aos O turismo no SOS Mata Atlântica entre 1985 e 1990, relacionadas ao mar. As 17 ilhas são uma das maiores áreas contínuas de consideradas os mais belos locais da região desmatamento dessa região localiza-se e várias delas são visitadas por turistas em entre passeios de barco. No município de coincidindo São com Sebastião, manchas de empreendimentos imobiliários. Dentre atividades Ubatuba, a Ilha Anchieta é uma das mais visitadas por ser Parque Estadual, possuir municípios, base do projeto TAMAR e devido à Caraguatatuba é considerado o mais existência das ruínas de um presídio. O povoado com aproximadamente 100 mil turismo ligado a esportes, tem havido o habitantes de acordo com a contagem do crescimento IBGE obtida pelo CENSO, e cerca de 500 "trekking", passeios de barco nos rios e em mil trilhas com observação de fauna e flora. visitantes os em Norte concentra-se e orla, Litoral de cit). Segundo levantamento da Fundação Bertioga na imóveis durante a temporada. de atividades Informações da Prefeitura local revelam Estas que em relacionadas à preservação da paisagem, Caraguatatuba perto de 20 milhões de aumentando sobremaneira a importância dólares, o que equivale a um quarto do da Mata Atlântica como recurso turístico. orçamento anual do município (fonte: - os visitantes deixam, www.litoralnorte.com.br). Os demais figuram como como atividades Conflitos de interesses Economicamente Ubatuba, municípios, São Sebastião, Ilha Bela e Caraguatatuba, São Sebastião e Ilhabela Ubatuba, este atualmente com a maior são dependentes do turismo de segunda pressão (ibid), residência, que para crescer depende da recebem também um fluxo significativo de expansão urbana e da infraestrutura, turistas e veranistas, a chamada população trazendo mais problemas ambientais do flutuante, que colabora sobremaneira com que retorno econômico (SMA, 2006). imobiliária da região a receita municipal, sendo considerados a Esse conflito de interesse - base propulsora de suas economias. A conservação ambiental versus especulação maior parte dessas receitas provém da imobiliária - é tão intenso, que a discussão arrecadação do zoneamento durou mais de dez anos. gerada pelos empreendimentos de comércio e serviços Nesse voltados ao atendimento dos turistas e dos condomínios cresceram significativamente Richter e Souza, 2012 período, os loteamentos 9 e Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 e fizeram as zonas 3 (Complexo Estuarino Z1 - Zona que mantém os ecossistemas Lagunar de Iguape-Cananéia) e 4 (Vale do primitivos em pleno equilíbrio ambiental, Ribeira) e aumentarem antes mesmo de ocorrendo uma diversificada composição serem 2006). de espécies e uma organização funcional Portanto, a principal meta do zoneamento capaz de manter, de forma sustentada uma ecológico-econômico do Litoral Norte é a comunidade de organismos balanceada, mudança desse modelo econômico e de integrada e adaptada, podendo ocorrer ocupação da região, buscando conciliar os atividades interesses locais com a conservação dos impactante; ecossistemas costeiros e a melhoria da Z2 - Zona que apresenta alterações na qualidade ambiental, que já se apresenta organização funcional dos ecossistemas comprometida em alguns trechos desse primitivos, mas capacitada para manter em setor. equilíbrio uma comunidade de organismos O Decreto Estadual Nº 49.215, de 7 de em graus variados de diversidade, mesmo Dezembro de 2004: com a ocorrência de atividades humanas oficializadas O (SMA, de baixo efeito Ecológico- intermitentes e/ou de baixos impactos. Em Econômico do Litoral Norte, definido pelo áreas terrestres a zona pode apresentar Decreto Zoneamento humanas Estadual no 49.215/04, está assentamentos humanos dispersos de baixa delimitado cartograficamente em mapas densidade, e pouco integrados; oficiais de Z3 - Zona que apresenta os ecossistemas Geografia e Estatística (IBGE), em escala primitivos parcialmente modificados, com 1:50.000, cujos originais, encontram-se na dificuldades de regeneração natural pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e exploração, supressão ou substituição de nas Prefeituras Municipais. Engloba os alguns ecossistemas terrestres, marinhos e de ocorrência de assentamentos humanos com transição, maior integração entre si; do Instituto sendo que, Brasileiro por suas de seus componentes pela características especiais, os ecossistemas Z4 - Zona que apresenta os ecossistemas de primitivos significativamente modificados transição tiveram suas normas, diretrizes e metas estabelecidas ora no pela supressão Zoneamento Terrestre, ora no Zoneamento descaracterização dos substratos terrestres Marinho, ou em ambos. Compreendem as e marinhos, necessitando de intervenções cinco zonas-tipo terrestres caracterizadas a para seguir: Apresenta alteração das drenagens ou da sua de componentes, regeneração parcial. hidrodinâmica, bem como a ocorrência, Richter e Souza, 2012 10 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 em áreas terrestres, de assentamentos orla no litoral norte de são Paulo e os rurais ou peri-urbanos intercalados; e desafios. Z5 - Zona que apresenta a maior parte dos componentes dos ecossistemas primitivos 3. degradada ou suprimida e a organização conservação funcional eliminada. Palestrante: Sergio Salazar Salvati do projeto de Ecoturismo na Mata atlântica da Continuidade do processo de Turismo como instrumento de e desenvolvimento. Secretaria Estadual de Meio Ambiente de gestão após a promulgação do ZEE Em agosto de 2005, oito meses São Paulo (SMA) após a publicação do ZEE, o Grupo 4. Setorial do Litoral Norte realizou um Unidades de Conservação. Palestrante: workshop com o objetivo de apresentar aos Maria Cecília Wey de Brito, Presidente do atores envolvidos, o Plano de Ação e Instituto Gestão para a região com os seguintes Apresentou o sistema de Unidades de temas colocados para debate (SMA, 2006): Conservação do Estado, a infraestrutura 1. Decreto Federal no 5.300/04 – e disponível, o sistema de monitoramento, a suas implicações situação atual dos remanescentes de Palestrante: na Ademilson região costeira. Zambone da Proteção da Biodiversidade e as Florestal vegetação, as de principais Paulo. ameaças conservação Assentamentos Urbanos e do Projeto de desafios. Gestão Integrada dos Ambientes Marinhos 5. do Palestrante: Eduardo Tranni, Arquiteto da Federal. Apresentou os biodiversidade Habitação e de e à Secretaria de Qualidade Ambiental nos Governo da São os Urbanização. antecedentes do gerenciamento costeiro, o Companhia Desenvolvimento Grupo de integração do Gerenciamento Habitacional e Urbano. Apresentou as Costeiro (GI-GERCO); o resumo histórico carências de habitação no litoral norte, os da construção do decreto federal, e seus projetos em execução e os desafios. Todo esse processo de elaboração principais aspectos. O projeto Orla. A palestrante do ZEE, sua implantação, as audiências Márcia Oliveira apresentou os principais participativas e a elaboração dos planos de objetivos do projeto, a sua base legal, o ação arranjo institucional, as atribuições das amadurecimento do processo de gestão da coordenações e zona costeira paulista, sendo fundamental municipal, resultados alcançados, o projeto a sua continuidade. No entanto, cabe 2. federal, estadual ressaltar Richter e Souza, 2012 e gestão, que a demonstram participação 11 o da Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 administração municipal será decisiva para veraneio, que apresentam vantagens como a eficiência ou não do zoneamento custo menor quando rateado, em relação à ecológico-econômico do litoral norte, e acomodação na rede hoteleira, além desta consequentemente gerenciamento não possuir leitos em número suficiente à costeiro. Com diretrizes abrangentes, o demanda na alta temporada. Pesquisas zoneamento depende dos planos diretores realizadas junto a imobiliárias demonstram municipais para detalhar questões de que o retorno do aluguel de temporada é paisagem e ordenamento urbano. tão vantajoso que se torna difícil, encontrar do NO imóveis para aluguel definitivo. Assim, MUNICÍPIO DE UBATUBA E O para a maioria dos proprietários de imóveis GERENCIAMENTO COSTEIRO no município, o retorno do investimento é A OCUPAÇÃO Partindo-se DO SOLO das informações garantido, cobrindo todas as despesas levantadas, verificou-se que os principais fiscais e de manutenção do mesmo. Essa impactos favorabilidade identificados dentro do do mercado e da município de Ubatuba dizem respeito à proximidade com São Paulo e cidades do ocupação do solo, em particular das áreas vale do Paraíba (sem contar os atrativos urbanizadas ou em vias de urbanização naturais de beleza impar), fizeram a (SMA, 1996, 2006; Afonso, 1999). São ocupação do solo crescer assustadoramente eles: poluição de água doce e das praias; após a abertura da Rio – Santos e da desmatamentos e extração mineral para melhoria do sistema viário que liga o Vale construção civil (saibro, areia e seixos). ao litoral. Essa demanda de parcelamentos do solo e mapeamento do uso do solo de Ubatuba de ocupação é resultante principalmente do utilizado turismo de segunda residência. Segundo macrozoneamemto foi obtido a partir de dados da Companhia de Turismo de fotos pancromáticas verticais nas escalas Ubatuba (COMTUR), a população fixa em 1:8.000 e 1:45.000, e fotos oblíquas de 2010 era de aproximadamente 79.000 1987. Entretanto, no mesmo documento habitantes, população não constam informações sobre a legenda flutuante na alta temporada mantém por adotada, nem as quantificações relativas às dia uma média de 300.000 turistas com classes de uso. Dessa forma, o presente permanência de 7 a 10 dias, chegando a trabalho gerou, a partir de classificação picos de 800.000 turistas nos feriados de automática digital aliada a interpretação Ano Novo e Carnaval. A grande parte visual de imagem do Landsat 7 ETM+ sendo que a Segundo a SMA (1996), o para o diagnóstico desse contingente se acomoda em casas de Richter e Souza, 2012 12 do Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 datada de 26/06/00, o mapa de uso do solo e cobertura vegetal para o município. Figura 1 – Mapa de Uso do solo e Cobertura vegetal gerado a partir de imagem do Landsat7. Assim, o mapa de uso do solo e do Parque Estadual da Serra do Mar, cobertura vegetal gerado e apresentado na (geralmente acima da cota 100m), e o Figura 1, indica que 92% do município tombamento da Serra do Mar pelo apresenta-se conservado, ocupado ainda CONDEPHAAT (áreas acima da cota 40), pela Mata Atlântica e seus ecossistemas restringem ainda mais o processo de associados (manguezais e restingas), e ocupação. somente 8% do município com áreas apresentou-se de maneira rarefeita ao urbanas, áreas alteradas e atividades longo da costa até meados da década de agrícolas. dá 60, com exceção da parte central, onde se principalmente pela recente urbanização localiza a sede municipal. Sua principal do município e pela dificuldade de ligação se dava com o Vale do Paraíba ocupação das áreas interioranas (precário através da rodovia SP-125 que vai de sistema viário, declividade acentuada em Ubatuba à Taubaté. Após a implantação da diversos trechos e fiscalização ambiental BR-101, a porção sul do município até a atuante). Dentro do município, a criação central foi rapidamente ocupada por Richter e Souza, 2012 Essa característica se A urbanização do município 13 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 loteamentos de segundas residências, sítios e chácaras de parte da população entremeados por pequenos núcleos de fixa. Excluí-se aí, o sertão da Quina população fixa, comércio e serviços. Já no (contíguo à praia de Maranduba, na porção trecho norte, da porção central até a divisa sul), com lotes que variam de 200 a com o estado do Rio, esse processo de 600m2. Na porção norte, próximas a sede ocupação foi mais lento (SMA, 1996). municipal, as praias de Itamambuca, Félix Uma vez que a região serrana é quase que e Promirim apresentam ocupação quase integralmente Parque que contínua por população flutuante, com Estadual da Serra do Mar - PESM, a maior grandes lotes e residências de alto padrão. pressão concentra-se nas pequenas faixas Enquanto que as mais afastadas como planas localizadas nas baixadas e nos Puruba, costões, esta devido à oferta paisagística, apresentam apesar das dificuldades para ocupação. Na comunidades área central, a ocupação é contínua organizadas constituída basicamente por população aparecer algumas moradias de população fixa, principalmente nas praias do Itaguá, flutuante. Com relação ao uso agrícola, a Pereque-açu e nas margens da SP-125 e cultura mais expressiva é a da banana, BR-101, em direção ao Rio. Essas áreas embora economicamente não apresente compreendem relevância. Já a exploração mineral é protegida a pelo maioria dos Ubatumirim ocupação caiçaras em vilas, Picinguaba rarefeita de tradicionais começando concentrada predominando a construção civil, localizando-se em todo o construção civil e apoio ao turismo. Na município, com maior expressão nos rios parte sul, a praia Grande (mais próxima ao Ubatumirim, e Comprido (SMA, op cit.). centro), Toninhas, Enseada, Saco da Destaca-se também como atividade, a Ribeira e Lázaro, possuem população exploração do granito verde Ubatuba basicamente flutuante, totalmente ocupada (charnokito), com cerca de 21 pontos de por loteamentos de padrão mais alto junto extração de rocha ornamental (SMA, 96). a orla, com residências de um a dois Em alguns casos, essa situação resultou da pavimentos, a exceção da praia Grande, mobilização e solicitação dos produtores com edifícios geralmente de 4 a 5 andares. rurais junto às audiências públicas para A se alteração das taxas inicialmente propostas expandido no sentido das planícies mais como no caso de parte do sertão do interiorizadas denominadas sertões, ainda Ubatumirim que foi de Z1 e Z2 para Z3 com ocupação rarefeita, onde predominam (figura 02). ocupação Richter e Souza, 2012 dessa voltados região para vem materiais 7 para a estabelecimentos de comércio e serviços, os sobre e a Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 Também as como a planície do Itaguá, onde as solicitações para o sertão do Puruba, do residências unifamiliares cada vez mais Itamambuca e a Casanga, enquadrados em cedem espaço para os edifícios com cerca Z3 a partir da Br 101. Dentre as sugestões, de 5 andares. Segundo o coordenador do uma nem Programa de Gerenciamento Costeiro da parcialmente foi no sertão da praia de Secretaria Estadual de Meio Ambiente “A Picinguaba por estar dentro do Parque expansão de condomínios verticais não é (PESM), apesar do mapa de uso ter ruim por princípio, pois em questão de apresentado a maior mancha contínua de saneamento é mais fácil fiscalizar um uso agrícola (19.5ha). Segundo dados da condomínio do que casa por casa de um prefeitura, o zoneamento tenderá a induzir loteamento” (SMA, 2006), sendo esta uma à verticalização no município, processo já opção municipal. que não foram foi atendidas atendida observado nas localidades mais centrais Figura 2 – Zoneamento do sertão e da praia do Ubatumirim. Z1 em verde, Z2 em amarelo, Z3 em rosa e Z4 em marrom. Fonte: SMA, (2006). Segundo a imagem do Landsat 7 à direita, observa-se pequenas manchas de ocupação rarefeita em matriz predominantemente florestal Richter e Souza, 2012 8 Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 Dentre as áreas ocupadas com loteamentos previa uma ocupação de até 60% , mas voltados para segundas residências e que acabou ficando numa categoria de 40%, o ainda aspecto que foi possível porque o loteamento já relativamente natural, sendo as mais estipulava esse índice de ocupação de uso valorizadas atualmente de acordo com as direto”, conta o coordenador do Programa imobiliárias de Gerenciamento Costeiro (SMA, 2006). preservam o seu pesquisadas, destacam-se Itamambuca, Felix, e Promirim, com taxas Essas áreas que ainda apresentam seu de ocupação que variam de 20 a 40% da aspecto natural, mas que já possuem área, a exceção de parte do Felix, onde o alguma infraestrutura são bastante atrativas zoneamento restringiu consideravelmente à ocupação. Segundo Macedo (2004), o a ocupação (10%), apesar de seu contato modelo de casa isolada e do bairro verde no mesmo loteamento ser com Z4 (taxa de persiste no ideário das camadas mais 40%), o que contriz as noções básicas de abastadas que ao possuírem condições para planejamento territorial, manter uma segunda residência optam pela quando se deve atentar para uma gradação construção seguindo tais padrões, ou seja, em relaçao as restrições de uso e coupação. “essa forma de ocupação visa basicamente Esse trecho apresenta remanescentes de a apropriação de um valor paisagístico”. O Mata Atlântica em estagio médio e autor ressalta que a paisagem local avançado submetida a esse modelo de bairro-jardim ambiental de e regeneração, com a ocorrência de espécies ameaçadas de causa extinção, como o palmito Jussara (Euterpe paisagísticos e ambientais da região, uma edulis). No entanto a mesma situação é vez observada na área definida como Z4 e em formalização do cenário ideal de habitação outra porção do bairro em contato com a urbana, onde a residência é implantada em localidade vizinha – praia do Prumirim, meio a jardins organizados, guardando enquadrada como Z2. A restrição na distância conveniente de seus vizinhos. O ocupação tenderá a desvalorizar os lotes Processo de autorização para construção (com áreas entre 600 a 1.000m2) e a forçar dentro do município em áreas ainda com o remembramento com o objetivo de vegetação, é muitas vezes complicado e aumentar Em demorado necessitando do envolvimento dos de diversos órgãos e não somente do proprietários brigou para que o loteamento alvará concedido pela prefeitura. Por fosse enquadrado em um padrão mais apresentar uma fiscalização rigorosa e restritivo do que o proposto. “O local devido às restrições de ocupação, alguns a Itamambuca Richter e Souza, 2012 taxa a de ocupação. organização perdas que o reais produto 20 dos final valores exalta a Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 imóveis a venda são mais valorizados ocupação em locais próximos ao limite de apenas por já apresentarem autorização duas zonas do ZEE litoral norte. para supressão de vegetação. Dentro do dificuldade município, a CETESB é o órgão de decorrente principalmente da ausência de licenciamento ambiental responsável pela um sistema de informações integrado autorização de supressão de vegetação contendo todos os dados já levantados e nativa (em qualquer estágio sucessional). É existentes, responsável também pelas intervenções organizada e permitindo a rápida consulta realizadas preservação por parte dos interessados. As análises se permanente, ou seja, ao longo de cursos baseiam em mapas em formato analógico, d’água, encostas declivosas, manguezais e dificultando a localização precisa de restingas, sendo estas situações comuns no imóveis município. Além deste, faz-se necessário o entendimento do contexto espacial, já que alvará municipal de acordo com o plano as informações não são visualizadas de diretor, datado de 1984 (Lei nº 711), que maneira integrada. Para o cidadão, torna-se estabelece seu zoneamento em função da fundamental o pedido de consulta prévia, cota do que assegure o cumprimento do objetivo o indicando se um imóvel poderá ou não ser empreendimento se localizar acima da cota executado, demandando mais controle dos 40m. Em simulação para aquisição de órgãos ambientais. Essa necessidade de imóvel realizada junto a CETESB, um fato consulta prévia mesmo para pequenas que se destaca é a informação de que para construções gerou um mercado paralelo de se obter a autorização de supressão de profissionais vegetação, houver condução dos processos de licenciamento impedimento, exige-se o cumprimento do ambiental, que poderiam ser simplificados artigo 17 do decreto federal 5.300/04, ou com a disponibilidade de equipamentos seja , para cada área a ser ocupada que para implicar na retirada de vegetação nativa, ambientais e na prefeitura. será compensada por averbação de no os mínimo uma área equivalente na mesma indiscutivelmente zona afetada. Observou-se também certa ferramentas dificuldade monitoramento ou simples consulta já que em áreas altimétrica, e CONDEPHAAT, o parecer quando quando dos de não técnicos consultados, de resposta precisa estruturados urbanos, de são tratam nas o da agências Atualmente, informação poderosas planejamento, análise, incluindo os da Prefeitura, de fornecerem possibilitam informações precisas sobre as taxas de armazenamento de um volume de dados Richter e Souza, 2012 a de é forma como que consulta alocados sistemas de bem liberais Essa manipulação 21 e o Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 considerável. Permitem que, de forma para a integração de todos os atores rápida e precisa, se possa avaliar se um envolvidos. Essa região apresenta uma dado empreendimento ocorre em área forte e acelerada ocupação do solo sujeita a restrições, quais são elas e em que conflitando contexto se encontra. Devem ser acessíveis conservação dos recursos naturais. Os também para consulta pela sociedade de instrumentos legais são diversos e criados maneira que possa por si só avaliar uma com o intuito de minimizar a degradação situação de interesse imobiliário sem haver dos ecossistemas como o tombamento da a necessidade de consultar os órgãos serra do mar e a criação do PESM, além do públicos, bem como facilitaria a sua próprio código florestal que protege as participação áreas na já teriam Infelizmente, todos esses instrumentos não conhecimento do que é permitido ou não. foram suficientes para minimizar ou Ou seja, a implementação de qualquer impedir a rápida ocupação desordenada instrumento legal de uso e ocupação do das solo dependerá de sua aplicação e da apresentem um baixo percentual relativo participação dos envolvidos em escala considerando local, já que a velocidade de transformação paisagem do espaço é mais rápida do que a surpreendente capacidade ambientais do estado, a partir de uma forte de monitoramento fiscalização somente dos e órgãos preservação a e que de com fiscalização monitoramento, no incisivamente áreas pressão costeiras, de de a matriz permanente. que embora florestal Ubatuba, geram demanda dos ocupaçao em da uma órgãos locais ambientais. O apoio de todos os agentes inadequados, como ocorre na faixa dos envolvidos, que frequentemente tem a 300m em ambiente de restinga a partir da intenção de auxiliar nesse processo, é linha de preamar (área de preservação fundamental já que geralmente apresentam permanente de acordo com a Resolução o interesse em evitar a degradação do seu CONAMA no 302/02) proveniente da entorno. especulação imobiliária, uma vez que CONSIDERAÇÕES FINAIS quanto mais próximo a orla maior o valor O gerenciamento costeiro no município de do Ubatuba demonstrou a partir do decreto zoneamento costeiro, para que se possa que dispõe sobre o ZEE (resultante de um executar qualquer projeto de ocupação do trabalho o solo é preciso considerar também o que processo, dispõe o ZEE, sendo ainda necessário que apresentando características fundamentais o empreendedor apresente autorização da de mais amadurecimento Richter e Souza, 2012 de do 10 anos), imóvel. Com a implantação 22 do Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 CETESB para supressão de vegetação, informação geraria um novo quadro caso com participativo, minimizando inclusive a remanescente de vegetação seja ela em que especulação imobiliária sobre as áreas com estágio maiores se encontre em sucessional se área encontrar. restrições Usualmente para a autorização, exige-se consequentemente que seja averbada área igual a ser ocupada pressões sobre elas. minimizando como área verde, assegurando o disposto no artigo 17 do decreto federal no 5300/04. Sendo este um exemplo dos esforços entre União e estado no sentido de minimizar o processo de degradação da zona costeira. Todavia, dentro dessa gestão integrada, observou-se uma lacuna com respeito a aplicação de um dos principais instrumentos do gerenciamento costeiro: o sistema de informação. Sem esse instrumento, o que se observa é a tentativa dos técnicos envolvidos com o licenciamento, sejam do poder público municipal sejam do estadual, de averiguar se o empreendimento em análise ou sob fiscalização encontra-se em local apropriado ou não e em qual contexto se insere. Sendo assim, as possibilidades de erro são consideráveis podendo gerar sérios atritos e desgastes frente a credibilidade dos órgãos de fiscalização atuantes. Um recurso simples e de custo reduzido comparado ao de geração da informação já existente, seria um sistema de informações de fácil manuseio alocado nas agências ambientais e na prefeitura à disposição para a consulta de qualquer interessado. Richter e Souza, 2012 A disponibilidade ambientais, da 23 as Revista de Geografia (UFPE) V. 29, No. 2, 2012 BIBLIOGRAFIA LEITE, D. M. & BRUNA, G.C. (2006) PNGC - Plano Nacional de Gerenciamento Ubatuba: Costeiro – LEI Nº 7.661, DE 16 DE MAIO Planejamento Territorial. São Paulo, 9p. 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